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MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA

SECRETARIA DE MINAS E METALURGIA

PALEONTOLOGIA DAS BACIAS DO


PARNAÍBA, GRAJAÚ E SÃO LUÍS

Maria Eugenia de Carvalho Marchesini Santos


Marise Sardenberg Salgado de Carvalho

Rio de Janeiro 2009


Departamento de Apoio Técnico
Sabino Orlando C. Loguércio

Divisão de Editoração Geral


Valter Alvarenga Barradas

EQUIPE DE PRODUÇÃO

Editoração

Pedro da Silva
Agmar Alves Lopes
José Luiz Coelho
Andréia Amado Continentino
Laura Maria Rigoni Dias
Hélio Tomassini de Oliveira Filho
Sérgio Artur Giaquino

Santos, Maria Eugênia de Carvalho Marchesini


Paleontologia das bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís /
Maria Eugênia de Carvalho Marchesini Santos [e] Marise
Sardenberg Salgado de Carvalho. – Rio de Janeiro : CPRM
Serviço Geológico do Brasil – DGM/DIPALE - 2009.
215 p.

Programa Geologia do Brasil – PGB.

1. Paleontologia – Brasil – Nordeste. 2. Bacias sedimentares.


3. Estratigrafia. 4. Paleoecologia. 5. Paleogeografia. I. Carvalho,
Marise Sardenberg Salgado de. II. Título.

DD 560.9813
APRESENTAÇÃO
E ste trabalho narra a história geológica e paleontológica de parte do território brasileiro compreendido
pelos estados do Maranhão, Piauí e parte do Tocantins, Pará e Ceará. É nessa região que estão situadas
as bacias sedimentares do Parnaíba, São Luís e Grajaú, cujos sedimentos ocupam uma área de cerca de
2
600 mil km com uma espessura máxima de 3400 metros de sedimentos.
A CPRM-Serviço Geológico do Brasil, desde 1973, tem realizado nessas bacias projetos de mapeamento
geológico, metalogenético, hidrogeológico e de prospecção mineral, sobretudo para carvão e fosfato, con-
tribuindo de forma determinante com um incontável número de dados geológicos e paleontológicos, cuja in-
terpretação permitiu uma ampla correlação dessas áreas sedimentares a nível local, regional e continental.
O estudo dos sedimentos de afloramentos e de subsuperfície ao longo da coluna estratigráfica, forne-
ceu os melhores exemplos das sucessões de faunas e floras, dentro de um panorama evolutivo e de diver-
sidade da vida. Além dos registros geológicos, biológicos e dos eventos extremos, como as inovações e
extinções, foram também identificados os paleoambientes e as mudanças climáticas ocorridas na região.
A história mais recente é representada pelas pinturas rupestres registradas nos paredões e cavernas das
rochas paleozóicas da bacia do Parnaíba.
O conjunto desses conhecimentos está aqui expresso numa série de ilustrações que reconstituem as
antigas e diferentes paisagens que existiram nos estados do Maranhão e do Piauí, permitindo dessa forma
um melhor entendimento dos sítios geológicos e das paisagens que integram a geografia e a história geo-
lógica da região.
Diversos parques nacionais e reservas naturais aí localizados são constituídos pelas unidades geológicas
examinadas no trabalho. Explicações simples para essa geologia local podem ser acrescentadas aos roteiros
utilizados na indústria do turismo, atividade capaz de gerar emprego e renda para as populações locais.
A ilustração e divulgação desses dados geológicos, das inovações e extinções biológicas, das mudanças
paleoambientais e da deriva dos continentes, podem subsidiar o sistema educacional do Brasil, da América
do Sul, África e outros continentes, que outrora estiveram unidos na Pangea e no supercontinente Gondwana.
Com a divulgação deste trabalho, a CPRM através do Programa Geologia do Brasil está cumprido com
sua missão de geração e divulgação do conhecimento das geociências no país e contribuindo com Ano
Internacional do Planeta Terra (AIPT), programa da Organização das Nações Unidas que está sendo reali-
zada entre os anos de 2007 e 2009.

Agamenon Sérgio Dantas Manoel Barretto


Diretor-Presidente Dretor de Geologia
Este trabalho é uma homenagem à memória de saudosos companheiros
que compartilhavam o mesmo interesse pela Bacia do Parnaíba: os geólogos
Atahualpa Valença Padilha, da CPRM e Rodi Ávila Medeiros da Petrobras,
que muito nos incentivaram e o paleontólogo Murilo Rodolfo Lima da USP, pelas
pesquisas pioneiras em palinologia.

AGRADECIMENTOS
O Projeto Paleontologia da Bacia do Parnaíba foi desenvolvido pela Divisão de Paleontologia no Departa-
mento de Geologia (DEGEO), da Diretoria de Geologia e Recursos Minerais da Companhia de Pesquisa de Re-
cursos Minerais (CPRM), sob coordenação das autoras. Parte dos resultados foi apresentada pela primeira au-
tora como tese de doutorado no Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em
1998. A redação final foi examinada e criticada pelo Prof. Emérito Dr. Cândido Simões Ferreira e pelos Drs. Dia-
na Mussa, Norma M. Costa Cruz, Victor Klein, Ismar de Souza Carvalho e Narendra K. Srivastava.
Agradecemos o apoio recebido na CPRM, no decorrer da execução do Projeto, dos geólogos Carlos Oiti
Berbert e Sabino Orlando C. Loguércio, do engenheiro de minas Idelmar Cunha Barbosa, e da paleontóloga
Norma Maria da Costa Cruz, chefe da Divisão de Paleontologia (DIPALE).
Nos trabalhos de campo, agradecemos o apoio da Residência de Fortaleza (REFO), com os geólogos José
Alcyr Pereira Ribeiro e José Felicíssimo Melo, e da Superintendência de Salvador, com o geólogo José Augusto
Pedreira, com quem fizemos a identificação dos principais afloramentos da Bacia do Parnaíba.
No Setor de Paleontologia do Departamento Nacional da Produção Mineral, foram realizados os trabalhos de
laboratório. Agradecemos ao geólogo Diógenes de Almeida Campos e às paleontólogas Rita de Cássia Tardin
Cassab (MCT/DNPM) e Vera Maria Medina da Fonseca (MN/UFRJ) pelo acesso ao material da Coleção de Fós-
seis e aos dados do Projeto Localidades Fossilíferas. Rita de Cássia Tardin Cassab foi de inestimável ajuda na
leitura crítica, correções e finalização de edição.
Pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do
Rio de Janeiro (FAPERJ), que financiou trabalho de campo do Projeto Paleontologia e Estratigrafia do Cretáceo
da Bacia do Parnaíba, em 1990, cujos resultados estão incorporados ao presente trabalho.
Agradecemos pela cooperação e troca de informações sobre a Bacia do Parnaíba, aos paleontólogos Ro-
berto Iannuzzi da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Eva Caldas, da Universidade Federal do Ceará.
Pela cessão de documentação fotográfica aos geólogos Samir Nahass e José Augusto Pedreira, da CPRM, e
Ismar Souza de Carvalho, da UFRJ. Agradecemos ainda a Milena Salgado de Carvalho, que fotografou o mate-
rial fóssil apresentado neste trabalho e aos companheiros do DEGEO Martin Elias Dias e Henrique Alves de
Lima, que confeccionaram figuras e tabelas. Os desenhos e reconstituições paleobiológicas foram elaborados
pelo desenhista Mario Roberto Santos.
Pela editoração do trabalho aos geólogos Fernando P. de Carvalho e Valter Alvarenga Barradas, pela diagra-
mação a Pedro da Silva e Agmar Alves Lopes, pela arte-final a Andréia A. Continentino e Laura Maria Rigoni Dias e
revisão ortográfica e técnica a Sergio A. Giaquinto e Hélio T. de Oliveira Filho.
RESUMO
A Bacia sedimentar do Parnaíba, situada em
área epicontinental, tem registros de antigas faunas
nífero Inferior, foram acentuados no Permiano com
paleolatitudes tropicais. Os fatores climáticos pro-
e floras, indicativas da alternância de influências piciaram estímulos a biodiversidade.
continentais e marinhas, durante a história fanero- No Cretáceo, as correlações das faunas são com
zóica. Estas faunas e floras possibilitam as análises a Margem Leste Brasileira e a costa ocidental da
estratigráficas referenciadas às variações globais África. Os eventos biológicos são relacionados com
do nível do mar. o desenvolvimento do oceano Atlântico Sul e evolu-
A História Geológica compreende as interações ção da Margem Continental. No Aptiano/Albiano, as
entre os fenômenos geológicos e biológicos, pela bacias do Parnaíba, Araripe e Sergipe/Alagoas
reconstituição de antigos ecossistemas. Estes são apresentam como evento biológico em escala regi-
correlacionados com as sucessivas posições do onal, uma ictiofauna, onde estão registrados novos
continente em movimento, variações climáticas e gêneros, documentando alto índice de processos
as histórias biogeográficas dos hemisférios norte e macroevolutivos e coevolução. No Albiano a sedi-
sul. mentação da Bacia do Parnaíba é encerrada.
As faunas marinhas do Siluriano, Devoniano e Em superfície, a sedimentação final do Cretáceo
Carbonífero são aparentadas com faunas de pro- pertence às bacias de Grajaú e São Luís. Os fósseis,
víncias biogeográficas da margem oeste da Améri- de idade cenomaniana são representantes de inver-
ca do Sul, e registram as conexões com o protocea- tebrados marinhos, peixes, répteis, plantas e pega-
no Pacífico. As floras do Carbonífero Inferior e floras das de dinossauros.
e faunas terrestres do Permiano são portadoras de Algumas ocorrências do Cenozóico foram anali-
gêneros endêmicos, o que caracteriza incidência sadas. São as faunas e floras de Terciário, mamífe-
de processos macroevolutivos. Estes processos ros do Pleistoceno e o homem primitivo e suas pin-
iniciados em paleolatitudes temperadas, no Carbo- turas rupestres.

–xi–
ABSTRACT
T he Parnaíba sedimentary basin, situated in an
epicontinental area, has records of Phanerozoic
The biological events are connected with the open-
ing of the South Atlantic and the evolution of the
fauna and flora. Its historical reconstitution is based Continental Margin. A regional bioevent is recorded
on paleobiological studies of the interactions among in Parnaíba, Araripe and Sergipe/Alagoas basins
geological and biological events. The ecosystems during the Aptian/Albian stage. The ichthyofauna
are correlated with the geological processes, conti- shows a high level of macroevolutive processes
nental drift, paleoclimates, and biogeographical his- and coevolution. The Parnaíba basin sedimentation
tories between Northern and Southern hemispheres. ended in the Albian.
The Silurian, Devonian and Carboniferous marine Cenomanian fossils occurrences are situated in
faunas are related to biogeographical provinces of the São Luis Basin, a rift basin developed in the Bra-
the West Margin of South America. The Carbonifer- zilian Equatorial Margin. The fossils are represented
ous and Permian floras are correlated with the by marine invertebrates, fishes, reptiles, plants, and
Northern hemisphere. During the Paleozoic, the dinosaurian footprints.
Permian is characterized by a high incidence of en- Some Cenozoic occurrences were studied as the
demic genus involving a macroevolutive process. Tertiary floras and faunas and the Pleistocene mam-
In the Cretaceous, the fauna shows correlations mals. The rupestral pictures of the primitive man
with the East Brazilian and West African Margins. were registered in Serra da Capivara National Park.

–xiii–
SUMÁRIO
Resumo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . xii
Abstract . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . xiii
Capítulo 1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
Capítulo 2 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
Capítulo 3 Geologia Regional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10. . . . . .
3.1 Limites Geológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10. . . . . .
3.2 Litoestratigrafia, Espessura e Extensão dos Sedimentos. . . . . . . . . . . 13. . . . . .
3.3 Evolução de Conceitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13. . . . . .
3.4 Tectônica e Estratigrafia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13. . . . . .
3.5 Paleozóico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15. . . . . .
3.6 Distensão e Magmatismo Associados à Abertura do Atlântico . . . . . . . . . . . . 15
3.7 Subsidência Relacionada ao Rifte Atlântico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
Capítulo 4 Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
4.1 Reconstituição de Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
4.2 Coleta de Dados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.3 Métodos Estratigráficos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.3.1 Seqüências Deposicionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.3.2 Sistemas Deposicionais e Análise de Fácies . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.4 Paleobiologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
4.4.1 Eventos na História da Vida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
4.4.2 Processos Evolutivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
4.4.3 Paleoecologia e Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
4.4.4 Classificação Sistemática e Distribuição Estratigráfica dos Peixes
nas Bacias do Parnaíba, Grajaú, São Luís e Nova Iorque. . . . . . . . . . . . . 28
4.4.5 Infra-Estrutura da Paleobiologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

–v–
Capítulo 5 Sítios Naturais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
5.1 Parque Nacional de Ubajara . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
5.2 Parque Nacional de Sete Cidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
5.3 Floresta Petrificada em Teresina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
5.4 Parque Nacional da Serra da Capivara . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
5.5 Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses e Delta do Rio
Parnaíba . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
Capítulo 6 Siluriano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
6.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
6.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
6.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
6.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
6.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
6.6 Deriva/Clima/Bioeventos/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
Capítulo 7 Devoniano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
7.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
7.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
7.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
7.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
7.4.1 Eoeifeliano - Formação Itaim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
7.4.2 Neoeifeliano - Formação Pimenteira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
7.4.3 Eogivetiano - Formação Pimenteira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
7.4.4 Eogivetiano - Formação Cabeças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
7.4.5 Neofrasniano/Eofameniano - Formações
Pimenteira e Cabeças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
7.4.6 Neofameniano - Formação Longá . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
7.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
7.5.1 Microfósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
7.5.2 Macrofósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
7.5.2.1 Eoeifeliano - Formação Itaim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
7.5.2.2 Neoeifeliano - Formação Pimenteira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
7.5.2.3 Eogivetiano - Formação Pimenteira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
7.5.2.4 Eogivetiano - Formação Cabeças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
7.5.2.5 Neofrasniano/Eofameniano -
Formações Pimenteira e Cabeças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
7.5.2.6 Neofameniano - Formação Longá . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
7.6 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
7.7 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
7.8 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
7.9 Paleoecologia/Comunidades Bentônicas/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . 61
7.10 Paleobiogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
7.11 Paleoclima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
7.12 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

–vi–
Capítulo 8 Mississipiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
8.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
8.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
8.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
8.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
8.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
8.5.1 Microfósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
8.5.2 Flora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
8.5.3 Fauna . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
8.6 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
8.7 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
8.8 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
8.9 Paleoecologia/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
Comunidade Bentônica de Plataforma Marinha Rasa . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
Comunidade Florística em Ambiente Terrestre Litorâneo. . . . . . . . . . . . . . . . . 74
8.10 Paleobiogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
8.11 Paleoclima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
8.12 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
Capítulo 9 Pensilvaniano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
9.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
9.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
9.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
9.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
9.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
9.5.1 Microfósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
9.5.2 Faunas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
9.5.3 Flora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
9.6 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
9.7 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
9.8 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
9.9 Paleoecologia/Comunidades Bentônicas/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . 83
9.10 Paleobiogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
9.11 Paleoclima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
9.12 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
Capítulo 10 Permiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
10.1 Formação Pedra de Fogo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
10.1.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
10.1.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
10.1.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
10.1.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
10.1.5 Fósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
10.1.5.1 Estromatólitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90

–vii–
10.1.5.2 Flora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
10.1.5.3 Fauna . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
10.2 Formação Motuca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94
10.3 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94
10.4 Eventos Biológicos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94
10.5 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
10.6 Paleoecologia/Comunidades Bentônicas/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . 95
10.7 Paleobiogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
10.8 Paleoclima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
10.9 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
Capítulo 11 Triássico e Jurássico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
11.1 Formação Sambaíba. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
11.2 Formação Mosquito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
Capítulo 12 Cretáceo (Barremiano). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .98
12.1 Formação Pastos Bons . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
12.1.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
12.1.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
12.1.3 Geocronologia e Idade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
12.1.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
12.1.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
12.1.5.1 Microfósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
12.1.5.2 Fauna . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
12.2 Formação Corda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
12.2.1 Histórico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
12.2.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
12.2.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
12.2.4 Sedimentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
12.2.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
12.3 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
12.4 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
12.5 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
12.6 Paleoecologia/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
12.7 Paleobiogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
12.8 Paleoclima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
12.9 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
Capítulo 13 Cretáceo (Aptiano/Albiano). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108
13.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108
13.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
13.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
13.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
13.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
13.5.1 Microfósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109

–viii–
13.5.2 Flora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
13.5.3 Fauna . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
13.6 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
13.7 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
13.8 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
13.9 Paleoecologia/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
13.10 Paleobiogeografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116
13.11 Paleoclima. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116
13.12 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116
Capítulo 14 Cretáceo (Albiano) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
14.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
14.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
14.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
14.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
14.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
14.5.1 Microfósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
14.5.2 Fauna . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
14.6 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
14.7 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
14.8 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124
14.9 Paleoecologia/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124
14.10 Paleobiogeografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124
14.11 Paleoclima. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124
14.12 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124
Capítulo 15 Cretáceo (Cenomaniano). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 126
15.1 Histórico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 126
15.2 Área de Ocorrência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 126
15.3 Geocronologia e Idade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
15.4 Sedimentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
15.5 Fósseis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
15.5.1 Microfósseis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
15.5.2 Fauna . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
15.5.3 Flora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132
15.6 Paleogeografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132
15.7 Eventos Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132
15.8 Tafonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133
15.9 Paleoecologia/Antigos Ecossistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133
15.10 Paleobiogeografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133
15.11 Paleoclima. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133
15.12 Deriva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133
Capítulo 16 Cenozóico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137
16.1 Plioceno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137

–ix–
16.2 Mamíferos do Pleistoceno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137
16.3 Ocupação Humana. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 138
Capítulo 17 Conclusões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 146
Capítulo 18 Localidades Fossilíferas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149
18.1 Listagem das Localidades Fossilíferas (Siluriano-Devoniano-
Carbonífero-Permiano-Cretáceo) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151
Referências Bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 194

–x–
Introdução

1
INTRODUÇÃO
O s conteúdos geológicos e paleontológicos
ocupam cerca de um quarto do território do Brasil e
processos geológicos que modificaram os ecossis-
temas.
são repositórios das manifestações pretéritas da A organização e o tratamento de dados foram
vida durante o Fanerozóico. A bacia sedimentar do baseados em Paleobiologia, parte da Paleontolo-
Parnaíba, também denominada de bacia do Mara- gia que estuda a Biosfera em evolução. O estudo foi
nhão e bacia do Meio Norte, uma das maiores baci- efetuado por eventos biológicos, definidos como
as paleozóicas, possue uma área de cerca de 600 mudanças nas faunas e floras, motivadas por pro-
mil quilômetros quadrados. Recobre os estados do cessos evolutivos de inovação, radiação, rápida
Maranhão, Piauí e parte dos estados de Tocantins, distribuição geográfica e extinção.
Pará e Ceará, entre as coordenadas 02°00’- As informações reunidas compreendem as inte-
12°00’S e 40°30’- 52°00’W (Figura 1.1). rações entre os fenômenos geológicos e biológicos
Os registros de fósseis de diversas idades geoló- abrangidos nas disciplinas de Estratigrafia e Pale-
gicas, são evidências da presença de antigas fau- ontologia. O arcabouço estratigráfico, que foi orga-
nas e floras, que subsidiam as inferências sobre as nizado inicialmente para a bacia do Parnaíba, so-
sucessivas posições do continente em movimento. freu alterações no decorrer das pesquisas.
Fornecem indicações de variações climáticas e as A análise por Paleoecologia Evolutiva, demons-
correlações entre a evolução geológica dos hemis- trou que os seres marinhos estiveram estreitamente
férios norte e sul. A História Geológica é apresenta- vinculados à evolução da bacia, enquanto os seres
da através da reconstituição de antigos ecossiste- terrestres tiveram uma autonomia maior. Para os
mas. antigos ecossistemas, deveria ser considerado o
Nas bacia do Parnaíba, São Luis-Grajaú, situa- conceito de região geográfica, como nos estudos
das em área epicontinental, as influências conti- de Ecologia.
nentais e marinhas se alternaram ao longo da histó- Os dinossauros, com indícios encontrados no
ria fanerozóica. É uma característica que possibilita Cretáceo Inferior da bacia do Parnaíba (pegadas
que as análises estratigráficas sejam referenciadas na Formação Corda e ossos e dentes no Albiano da
às variações globais do nível do mar. Ao mesmo Formação Itapecuru), deixaram também pistas no
tempo, os aparecimentos e desaparecimentos de Cretáceo Superior da pequena bacia de São Luís
grupos de organismos são correlacionados aos (Formação Itapecuru e Cenomaniano). Estes são

– 1–
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

registros que apontam a presença destes animais como as extinções decorrentes da atividade huma-
em ecossistemas favoráveis, abrangendo uma re- na. Evidenciam o longo tempo geológico necessá-
gião geográfica ampla, que ultrapassava os limites rio para o equilíbrio dos processos evolutivos.
geológicos das bacias. Entretanto, deve ser obser- Para Divulgação e Educação, nos objetivos do
vado que para a preservação dos registros (Tafo- Ano Internacional do Planeta Terra, são de interes-
nomia), os fatores de sedimentação foram essenci- se para os sistemas de educação nos diferentes ní-
ais (controle das bacias). veis fundamental, médio e superior.
Após o encerramento, no Cretáceo, dos ciclos A série de ilustrações reconstituindo as antigas e
sedimentares da bacia do Parnaíba e São Lu- diferentes paisagens que existiram nos estados do
ís-Grajaú, os ecossistemas terrestres permanece- Maranhão e Piauí, permite a compreensão dos aflo-
ram nesta área geográfica. Ocorreram deposições ramentos geológicos, sítios e paisagens que se in-
em pequenas bacias terciárias, com floras que são tegram à geografia, à história da região, aos par-
indicadoras climáticas e os terrenos foram percorri- ques nacionais e reservas naturais que contém as
dos pelos grandes mamíferos do Pleistoceno. No formações geológicas examinadas no presente tra-
Holoceno, as rochas da bacia forneceram abrigo balho. São contribuições que podem ser acrescen-
para o homem primitivo que, nos seus paredões, tadas aos roteiros turismo, uma atividade de impor-
deixou impressa uma bela arte rupestre. tância para a geração de renda para as popula-
Estes resultados constituem uma contribuição ções locais. Roteiros mais amplos na região nor-
dentro do tema científico Terra e Vida, para o Ano deste, com exposições simples de Geologia e Vida
Internacional do Planeta Terra (AIPT), programa da do passado são possibilidades para incremento do
Organização das Nações Unidas, realizado entre turismo, dentro do conceito de sustentável.
os anos de 2007 e 2009, com ênfase em 2008. As formas de vida são os arquivos geológicos de
São representativos da participação da Paleon- inovações e extinções biológicas dos antigos ambi-
tologia em projetos de mapeamentos geológicos e entes e da deriva de continentes. As ilustrações
pesquisa mineral realizados pela CPRM, desde constituem apoio aos sistemas educacionais do
1973, em bacias sedimentares. Com a interpreta- Brasil, da América do Sul, da África e outros conti-
ção de dados para integração ampla e correlações nentes, que outrora estiveram unidos nos super-
a nível local, regional e, continental. continentes Gondwana e Pangea.
Os dados de Paleontologia foram aplicados em Nas bacias do Parnaíba e São Luís estão impres-
Estratigrafia nos mapeamentos e pesquisa mineral sos os registros de eventos biológicos únicos e sin-
executados pela CPRM para substâncias destina- gulares. Entretanto, um maior volume de pesquisas,
das ao uso em energia, materiais industriais e de principalmente de classificação sistemática é im-
construção. São substâncias, de grande demanda, prescindível para esclarecer a organização da vida.
nas regiões urbanas, necessárias ao desenvolvi- Neste atual estágio de conhecimento das baci-
mento sustentável. as, os nomes de formação assumem característi-
Para os estudos de Meio Ambiente, a orientação cas peculiares, derivadas do modo como aos pou-
da pesquisa foi para compreensão dos processos cos os conceitos foram estabelecidos. É um bloco
geológicos e biológicos naturais do passado. São que preserva aspectos de idade, litologia, fósseis e
temas atuais nas indagações sobre as ameaças ambientes.

– 2–
Introdução

Figura. 1.1 – Mapa de Localização das bacias sedimentares do Parnaíba, Grajaú e São Luís.

– 3–
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

2
HISTÓRICO
O s primeiros conhecimentos geológicos obtidos
na área da Bacia do Parnaíba são devidos ao conde
Reconhecimentos geológicos foram realiza-
dos nos rios Araguaia e Tocantins (Moraes Rego,
Francis de Castelnau que, em 1846, realizou uma via- 1931 e 1933; Loefgren, 1936) e verificadas as
gem pelo rio Araguaia, colhendo algumas informa- possibilidades de ocorrências de carvão nos va-
ções litológicas. Posteriormente, a designação da les dos rios Parnaíba e Tocantins. Com a revela-
Bacia do Parnaíba foi proposta por Derby (1884). ção das floras do Carbonífero, começaram os tra-
O interesse pela Bacia ocorreu a partir do início balhos pela procura de carvão no Piauí (Paiva &
do século, com a procura de bens de natureza eco- Miranda, 1937).
nômica como combustíveis – carvão e petróleo, e Barbosa & Gomes (1957) realizaram estudos so-
águas subterrâneas. bre o carvão mineral na Bacia Tocantins-Araguaia,
Em 1909, Arrojado Lisboa e o topógrafo Hans nas proximidades de Carolina, sugerindo modifica-
Baumann, do Serviço Geológico e Mineralógico do ções na coluna estratigráfica.
Brasil realizaram um reconhecimento geológico no Pioneiro nas pesquisas paleontológicas, com
Norte e Nordeste, para verificar ocorrências de ma- inúmeros trabalhos de campo na bacia, L. I. Price
deiras silicificadas referidas ao gênero Psaronius. (Figura 2.1) dedicou-se ao estudo dos vertebrados.
As formações foram nomeadas nos registros de Registrou fósseis de dinossauros nas rochas cretá-
Lisboa (1914) e publicado um esboço geológico do ceas da ilha do Livramento, litoral do Maranhão e
Piauí e Maranhão. Small (1913 e 1914) realizou es- descreveu o primeiro anfíbio fóssil do Brasil, de ida-
tudos geológicos para águas subterrâneas no Cea- de permiana (Price, 1947 e 1948). Colaborou com o
rá e Piauí. Conselho Nacional do Petróleo (CNP) em reconhe-
Nas localidades fossilíferas do Maranhão, des- cimentos e mapeamentos geológicos, quando fo-
critas por Gonzaga de Campos, foram estabeleci- ram delineadas as relações entre novas unidades
das as distinções entre os sedimentos com Psaro- da Bacia (Campbell, 1949 e 1950; Campbell et al.,
nius e os do Cretáceo. Pela primeira vez, são men- 1948 e 1949a, b; Plummer et al., 1948).
cionadas, as ocorrências de folhelhos fossilíferos, Com a descoberta de fósseis devonianos, Price
próximo a Floriano, Piauí, e considerados mesozói- e Kenneth Caster, da Universidade de Cincinnati, fi-
cos (Campos 1925). zeram campanhas de campo na região de Picos,

– 4–
Histórico

O conhecimento da Bacia progrediu com a atua-


ção da Petróleo Brasileiro S/A – PETROBRAS, que
realizou mapeamentos sistemáticos, organizando
as unidades litoestratigráficas representadas pelas
formações. Estas denominações, com algumas
modificações são utilizadas até nos trabalhos mais
recentes.
Os mapeamentos foram executados pelas equi-
pes de jovens geólogos provenientes dos novos
cursos de Geologia, criados nas universidades
brasileiras. Pertenciam às memoráveis TGs – Tur-
ma de Geologia (Figura 2.4).
Destes trabalhos, a maioria relatórios internos,
são citados: Aguiar (1961, 1964, 1969, 1971);
Anderson & Mendonça (1960); Andrade (1968);
Blankennagel (1952, 1954); Carneiro (1974); Carnei-
ro & Perillo (1968); Cunha (1964, 1966); Cunha &
Carneiro (1972); Della Piazza & Andrade (1969); Del-
la Piazza & Santos (1967); Kremer & Campos (1955);
Melo (1965, 1968); Melo & Porto (1965); Melo & Pra-
de (1968); Molnar & Urdineia (1966); Northfleet
Figura 2.1 – LLEWELLYN IVOR PRICE (1905-1980). Pa- (1965); Northfleet & Neves (1967); Northfleet & Melo
leontólogo do Departamento Nacional da Produção Mi- (1967), Ojeda y Ojeda & Bembom (1966); Ojeda y
neral desde 1944. Foi o grande iniciador das pesqui- Ojeda & Perillo (1967); Perillo & Nahass (1968).
sas em anfíbios e répteis fósseis no Brasil. Sua valiosa
contribuição científica abrange trabalhos realizados
em todas as bacias brasileiras.

no Piauí, coletando fósseis e descrevendo a geolo-


gia local (Caster, 1948).
Em uma fase mais avançada de pesquisa do
CNP, foram efetuadas duas sondagens na região
de Balsas-Carolina. A análise dos testemunhos de
Carolina foi realizada por Kegel (1953) que deu
continuidade aos estudos do Devoniano e de ou-
tras idades do Paleozóico (Kegel, 1951, 1952,
1954, 1955, 1956, 1957, 1961, 1965, 1966 e Kegel
& Costa, 1951).
O trabalho de Wilhem Kegel (Figura 2.2) sobre a
geologia do Devoniano, é uma importante referência
até a data atual. Foi realizado no sudeste do Piauí,
compreendendo os arredores das cidades de Pi-
cos, Oeiras e Valença do Piauí, em área de impor-
tância histórica. Oeiras foi a primeira área coloniza-
da, com fazendas de gado estabelecidas no início
do século 18. A população cresceu em torno da ca-
pela, mais tarde matriz de Nossa Senhora da Vitó-
Figura 2.2 – WILHELM KEGEL (1890-1971). Nascido na
ria, datada de 1733 (Figura 2.3) e o povoado, quan- Alemanha, emigrou para o Brasil, depois da 2ª Guerra
do elevado à cidade, foi a primeira capital do Piauí. Mundial, em 1949. Geólogo de experiência reconhecida
A denominação Oeiras está ligada ao vocabulário em sua terra natal, realizou no Brasil, importantes pes-
geológico, pois Kegel atribuiu este nome a um quisas sobre a geologia e a tectônica do Nordeste, atu-
membro da Formação Cabeças, contendo os belos ando no Departamento Nacional da Produção Mineral e
arenitos ruiniformes que ocorrem na área. na Escola de Geologia do Rio de Janeiro.

– 5–
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 2.3 – Igreja de Nossa Senhora da Vitória, catedral de Oeiras. A edificação iniciada em
1733 é típica da arquitetura austera dos jesuítas. Foi executada parceladamente, pois recebeu
apenas uma das torres do par previsto. As pilastras, frisos, portadas e as junções em ângulo
são esculpidas em arenitos vermelhos do Devoniano local.

Figura 2.4 – TG - Turma de Geologia da PETROBRAS. Seus componentes participaram


da execução do primeiro mapeamento geológico sistemático na Bacia, na década de 60.
A vida em semanas e meses de acampamentos – campanas rústicas e com repastos frugais,
era por vezes difícil.

– 6–
Histórico

Com os furos estratigráficos da PETROBRAS, Müller Grajaú (Cretáceo) e Espigão Mestre (Cretáceo),
(1962) elaborou a primeira divisão bioestratigráfica nos trabalhos de Góes (1995) e Góes & Coimbra
da Bacia. As unidades litoestratigráficas então esta- (1996).
belecidas foram reunidas nas integrações de Mesner Pelo estudo da evolução tectono-sedimentar
& Wooldridge (1964), Aguiar (1971), e no mapa, es- das bacias de São Luís e Grajaú, que mostram
cala 1:1.000.000, de Aguiar & Nahass (1969). continuidade de sedimentação Góes & Rossetti
O mapeamento da Bacia do Parnaíba foi objeto (2001) adotaram a denominação de Bacia de São
de relatórios de graduação da Escola de Geologia Luís-Grajaú para uma área de cerca de 140 mil
da Universidade Federal de Pernambuco, em con- quilômetros quadrados, correspondente aos sedi-
vênio com o Departamento Nacional da Produção mentos cretáceos. As pesquisas estão em parte
Mineral, no final da década de 60. Com isso, surgi- divulgadas por Rossetti et al. (2001), correspon-
ram trabalhos dos professores Mabesoone (1965, dendo à tectônica, análise de fácies, estratigrafia
1970, 1975, 1977) e Beürlen (1965, 1971a, b). de seqüências e paleontologia.
No final da década de 60, foi implantado, pelo De- Os peixes fósseis, de longa data utilizados
partamento Nacional da Produção Mineral, o Projeto como elementos de correlação, foram estudados
RADAM, destinado a realizar a interpretação de da- pelo ictiólogo Rubens da Silva Santos (Figura 2.5).
dos geológicos, geomorfológicos, fitogeográficos e Suas publicações iniciadas com o Lepidotes (San-
pedológicos, utilizando imagens de radar (Brasil, tos, 1945) abrangem o Paleozóico, o Mesozóico e o
1973 a, b, c). Pela primeira vez foi obtido um mapa Cenozóico (Santos, 1974b, 1985, 1994a).
de uso potencial da terra. A região das rochas cretáceas, situada no centro
No início da década de 70, o contínuo trabalho do estado do Maranhão está ligada à sua história
da PETROBRAS, evoluiu com a tectônica de pla- econômica. Os solos derivados das formações
cas, surgindo estudos de integrações regionais geológicas ocorrentes foram propícios a culturas
(Rezende & Pamplona, 1970; Rezende, 1971 e Miu- relacionadas ao mercantilismo agrícola, criando o
ra & Barbosa, 1972). surto de desenvolvimento no século 18.
A Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
(CPRM), na sua criação no ano de 1969, recebeu
as atribuições da extinta Comissão do Plano de
Carvão Nacional. Esta Comissão, durante a déca-
da de 60, teve a incumbência de pesquisar carvão
nas bacias paleozóicas, porém com investimentos
muito limitados.
A CPRM em convênio com o DNPM realizou pes-
quisas para carvão (Cruz et al., 1973a, 1973b; Leite
et al., 1975) fosfato (Oliveira & Barros, 1976); além
de mapeamento geológico (Costa et al., 1973); in-
tegração geológica-metalogenética (Lima & Leite,
1978) e levantamento hidrogeológico (Silva & Soa-
res Filho, 1979; Silva, 1979; Araujo & Miranda, 1979;
Araujo, 1979; Soares Filho, 1979; Miranda, 1979).
Comentários sobre a evolução das seqüências me-
sozóicas e o relacionamento com os processos ge-
omorfológicos que atuaram na Bacia foram realiza-
dos por Caldasso (1978).
Os trabalhos referenciados por análise de bacia,
estudo de fácies, sistemas e seqüências deposicio-
nais foram divulgados em cursos periódicos elabo-
rados por técnicos da PETROBRAS. Della Fávera Figura 2.5 – RUBENS DA SILVA SANTOS (1918-1996).
(1990) enfatizou a sedimentação episódica nas se- Paleontólogo do Departamento Nacional da Produção
qüências paleozóicas. Mineral e professor da Universidade Estadual do Rio
A Bacia do Parnaíba foi dividida em quatro bacias de Janeiro. Desenvolveu a paleoictiologia do Brasil,
menores, com gêneses distintas: Parnaíba (Siluria- com trabalhos em diversas bacias brasileiras. Publicou
no-Triássico), Alpercatas (Jurássico-Eocretáceo), dezenas de trabalhos a partir de 1945.

– 7–
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

O Maranhão foi importante produtor e exportador palmente em sedimentos litorâneos permitiram o


de algodão, alimentando com matéria prima a revo- registro de importantes sítios paleontológicos com
lução industrial no hemisfério norte. De ciclos mais pegadas de dinossauros (Carvalho 1994b, 1994c,
recentes da industrialização no estado, são os pré- 1994d, 1995; Carvalho & Gonçalves, 1994). Na ci-
dios remanescentes das fábricas de tecidos dade de Alcântara, onde ocorre um dos mais im-
(Figura 2.6). portantes sítios, parte desta coleção foi incorpora-
Pesquisas de ocorrências fósseis no Cretáceo, da ao Museu Histórico, como incentivo cultural de
iniciadas pelo Professor Emérito Candido Simões preservação (Figura 2.9).
Ferreira, do Museu Nacional, da Universidade Fe- A Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
deral do Rio de Janeiro (Figura 2.7) versaram sobre executou nas áreas das bacias do Parnaíba e São
a geologia e paleontologia do litoral e centro do es- Luís, pelo Programa Levantamentos Geológicos
tado do Maranhão. Os resultados foram divulgados Básicos do Brasil, o Projeto Especial Mapas de Re-
por Klein & Ferreira (1979), Cunha & Ferreira cursos Minerais de Solos e de Vegetação para a
(1980), Ferreira & Cassab (1987), Carvalho & Cam- área do Programa Grande Carajás. Os resultados
pos (1988). Desse esforço, foi originado o Projeto estão divulgados, em vários trabalhos, na escala
Paleontologia e Estratigrafia da Bacia do Parnaíba, 1:250.000 (Colares & Araujo, 1990; Colares et al.,
da UFRJ, que ampliou significativamente o conhe- 1990; Souza et al., 1990; Figueiredo et al., 1994; Lo-
cimento dos fósseis da bacia, com novas desco- vato et al., 1994; Rodrigues et al., 1994a, 1994b;
bertas, como os ossos de dinossauros na Forma- Almeida et al., 1995; Lovato et al., 1995).
ção Itapecuru (Figura 2.8) (Ferreira et al., 1991, Com a descoberta de um rico jazigo fossilífero na
1992, 1995a, 1995b e Ferreira, 1992). ilha do Cajual, está sendo revelada uma importante
Na continuidade destes trabalhos, foi estabeleci- fauna de dinossauros que mostra estreita afinidade
do um convênio entre a UFRJ e a Universidade Fe- com gêneros do norte da África (Medeiros &
deral do Maranhão. As novas descobertas, princi- Schultz, 2001; Vilas Bôas & Carvalho, 2001).

Figura 2.6 – Na cidade de Codó, o prédio desativado de antiga fábrica de tecidos, com arquitetura industrial
característica de influência inglesa.

– 8–
Histórico

Figura 2.7 – CÂNDIDO SIMÕES FERREIRA. Nasceu


no estado de Minas Gerais, em 1921. Desde 1948,
exerce funções em Geologia e Paleontologia no Museu
Nacional. Este professor emérito da Universidade
Federal do Rio de Janeiro é apaixonado incentivador
das atividades científicas dos estados do Pará e
Maranhão. Na foto no rio Itapecuru, participando da
descoberta de ossos de dinossauros, em 1990.

Figura 2.9 – Praça central de Alcântara, onde está


localizado o Museu Histórico com as pegadas de
dinossauros em seu acervo. O pelourinho da foto
é considerado o mais antigo do Brasil e testemunha
a contribuição dos negros, cuja herança cultural
permanece até a data de hoje. Alcântara é Cidade
Histórica e Monumento Nacional.

Figura 2.8 – Descoberta de ossos de dinossauros na


Formação Itapecuru, a beira do rio e na cidade de
mesmo nome, pelo Projeto Estratigrafia e Paleontologia
da Bacia do Parnaíba, da UFRJ, em 1990.

– 9–
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

3
GEOLOGIA REGIONAL
3.1 Limites Geológicos A formação da Bacia do Parnaíba foi classificada
por Figueiredo & Raja Gabaglia (1986) como poli-
A área de trabalho compreende a Bacia intracra- genética, iniciando-se como fratura interior conti-
tônica do Parnaíba e a pequena Bacia marginal de nental, durante o Cambro-Ordoviciano, passando a
São Luís. A Bacia do Parnaíba foi recentemente in- sinéclise interior continental, a partir do Siluriano.
terpretada por Góes (1995) e Góes & Coimbra Em 1978, Fortes aplicou a denominação de anfícli-
(1996) e redefinida como Província Sedimentar do se proposta por Muratov (1972), para bacias con-
Meio Norte. Foi dividida em quatro bacias menores, tendo extenso vulcanismo, na área total da Bacia
com gêneses distintas: Parnaíba (Siluriano-Triássi- do Parnaíba.
co), Alpercatas (Jurássico-Eocretáceo), Grajaú Góes (1995) redefiniu a área aflorante da Bacia
(Cretáceo) e Espigão Mestre (Cretáceo). Góes & do Parnaíba e denominou as rochas provenientes
Rosseti (2001) demonstraram que as bacias do Gra- de vulcanismo como Anfíclise de Alpercatas. Estas
jaú e São Luís pertencem ao mesmo arcabouço es- rochas básicas e as pertencentes às formações
trutural, tendo história evolutiva e sedimentação re- Corda e Pastos Bons, demarcadas pelo elemento
lacionadas, denominando a área como Bacia de estrutural de Xambioá, de orientação leste-oeste,
São Luís- Grajaú. passaram a compor a Bacia de Alpercatas (Góes &
Os limites com o embasamento são efetuados ao Coimbra, 1996). Os trabalhos nesta área não são
norte pelo Cráton de São Luís; a oeste pelo Cráton suficientes para adoção desta nomenclatura.
do Amazonas, a Faixa de Dobramentos Para- As unidades litoestratigráficas aflorantes que fo-
guai-Araguaia e o Maciço de Goiás; ao sul pela Fai- ram mapeadas pela CPRM (Lima & Leite, 1978) e
xa de Dobramentos Brasília, e a leste pelo Cráton adotadas no mapa geológico do Brasil, escala
do São Francisco e pela Faixa de Dobramentos 1:2.500.000 (Schobbenhaus et al., 1981) foram as
Nordeste. A compartimentação estrutural é feita utilizadas no presente trabalho (Figura 3. 2). A Bacia
pelo Arco do Tocantins localizado a noroeste, se- do Espigão Mestre (Góes, 1995 e Góes & Coimbra,
parando-a das bacias de Marajó e Médio Amazo- 1996), de idade cretácea, e situada ao sul da Bacia
nas; pelo Arco de São Francisco situado a sul e su- do Parnaíba foi mapeada como parte do extre-
deste, separando-a da Bacia Sanfranciscana (Fi- mo-norte na Bacia Sanfranciscana por Lima & Leite
gura 3.1). (1978), e não está incluída no presente trabalho.

– 10 –
Geologia Regional

Figura 3.1 – Limites geológicos das bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís.

– 11 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 3.2 – Mapa Geológico das bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís.
(baseado em Lima & Leite, 1978 e Schobbenhaus et al., 1981).

– 12 –
Geologia Regional

A forma elíptica arredondada da grande área se- vadas, pois, durante esta fase, cada unidade é co-
dimentar da Bacia do Parnaíba, com o diâmetro berta por superposições de sedimentos.
maior orientado no sentido nordeste-sudoeste, ins- As fases regressivas, entretanto, que se situa-
crita em uma geometria hexagonal, é derivada es- vam no final de cada ciclo, não foram preservadas,
truturalmente de tectônica linear evidenciada pelos pois à medida que se formavam tinham os topos
falhamentos, flexuras e lineamentos que deram ori- dos sedimentos expostos e erodidos.
gem ao mosaico de blocos escalonados. São os A correlação destes ciclos e de outros identifica-
elementos estruturais que condicionaram a distri- dos nos demais continentes, mostrou que estes
buição dos eixos deposicionais e dos estratos (Ca- eram mecanismos globais, controlados pelas varia-
rozzi et al., 1975; Fortes, 1978; Góes et al., 1990). ções do nível do mar (Miall, 1984).
O estudo de relações de rochas sedimentares,
3.2 Litoestratigrafia, Espessura e Extensão por seqüências deposicionais delimitadas por dis-
dos Sedimentos cordâncias ou concordâncias relativas foi aplicado
na Bacia do Parnaíba. O Paleozóico é dividido em
Na primeira síntese da Bacia (Mesner & Wool- três seqüências deposicionais por Mesner & Wool-
dridge, 1964), a sedimentação foi apresentada em dridge (1964), Cunha (1986), Della Fávera (1990),
três megaciclos, demarcados por discordâncias Góes & Feijó (1994) e Góes (1995). A primeira se-
regionais. qüência, de influência marinha, corresponde ao
Os ciclos são de idades neo-ordoviciana a eo- Grupo Serra Grande (fase talassocrática de Almei-
carbonífera; neocarbonífera a jurássica; e cretáci- da, 1969 e beta de Soares et al., 1974 e 1978). A se-
ca, com coberturas do Terciário e do Quaternário. gunda seqüência corresponde às formações Itaim,
Em subsuperfície a coluna de sedimentos tem Pimenteira, Cabeças, Longá e Poti (fase talasso-
cerca de 3.400 m (Góes et al., 1990). A pequena es- crática e gama). A terceira seqüência, que encerra
pessura e ampla distribuição dos sedimentos são o Paleozóico, compreende as idades do Carbonífe-
atribuídas a uma lenta subsidência (Cunha, 1986). ro Superior ao Triássico. É a fase geocrática e delta
Aguiar (1971), Cordani et al. (1984), Caputo & com as formações Piauí, Pedra de Fogo e Motuca e
Lima (1984) e Della Fávera (1990) consideraram delta a com a Formação Sambaíba.
que a atual extensão de sedimentos é o remanes- Góes & Rosseti (2001), por interpretação de da-
cente de uma área originalmente maior. Indícios de dos de superfície e subsuperfície mostraram que
sedimentos paleozóicos com características estra- havia ampla correlação nas áreas de sedimenta-
tigráficas e sedimentológicas semelhantes suge- ções da Bacia de São-Luís Grajaú, e que o Arco
rem conexões com a Bacia do Amazonas e bacias Ferrer-Urbano Santos não representou uma barrei-
de áreas extracontinentais como as situadas em ra topográfica para a deposição destes sedimen-
Gana, na África. tentos. Rosseti (2001) reconheceu nesta área três
seqüências deposicionais, de idade aptiana e neo-
3.3 Evolução de Conceitos cretácea.

Almeida (1969), que é autor da primeira integra- 3.4 Tectônica e Estratigrafia


ção e síntese da geologia da plataforma brasileira,
definiu dois ciclos de sedimentação na evolução Carozzi et al. (1975); Fortes (1978); Cunha (1986)
geológica do Fanerozóico – as fases talassocrática e Cordani et al. (1994) reconheceram as estruturas
e geocrática. Soares et al. (1974 e 1978) reconhe- do Ciclo Brasiliano que atuaram na compartimenta-
ceram em análise estratigráfica nas bacias intra- ção da Bacia, durante o Paleozóico. São perten-
cratônicas do Amazonas, Parnaíba e Paraná, sete centes à direção nordeste do Lineamento Trans-
ciclos de sedimentação relacionados com a subsi- brasiliano, noroeste do Lineamento Picos-Santa
dência das bacias e variação da curva do nível do Inês e norte-sul do Lineamento Tocantins-Araguaia
mar. (Figura 3.3).
Estes resultados são correlacionáveis com os di- Após o término do Ciclo Brasiliano (Cam-
vulgados por Sloss (1963) que apontou, nas áreas bro-Ordoviciano), por subsidência termomecâni-
do cráton do continente norte-americano, seis se- ca, os grabens foram preenchidos pelo progressi-
qüências maiores separadas por discordâncias vo afundamento ao longo das faixas tectonicamen-
marcantes. Cada discordância era seguida por te instáveis, a partir do final do Ordoviciano (Caputo
uma fase transgressiva, com as camadas preser- & Lima, 1984).

– 13 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

entação leste-oeste, situado no centro da bacia; o


Arco Ferrer-Urbano Santos delimitando as peque-
nas bacias marginais associadas à abertura do
Atlântico Sul Equatorial, e o Alto do Rio Parnaíba
(Aguiar, 1969; Rezende & Pamplona, 1970; Hasui
et al., 1991, Góes, 1995) (Figura 3.4).
No Jurássico e Cretáceo, os derrames e diques de
diabásio, que são rochas de ambientes distensionais
indicam os efeitos da separação dos continentes. As
unidades litoestratigráficas do Cretáceo Inferior e
início do Cretáceo Superior estão associadas com a
subsidência relacionada ao desenvolvimento do rif-
te atlântico. Pelos eventos biológicos identificados,
são reconhecidas as correlações com as megasse-
quências diferenciadas para as bacias marginais do
leste (Chang et al., 1990b; Ponte, 1994).
As unidades litoestratigráficas do Paleozóico ao
Triássico correspondem à Bacia do Parnaíba. No
Jurássico e Cretáceo Inferior as unidades de diabá-
sio-basaltos, e as formações Corda e Pastos Bons
correspondem à Bacia de Alpercatas, demarcada
pelo elemento estrutural de Xambioá, de orientação

A - Lineamento Tocantins-Araguaia
B - Lineamento Picos- Santa Inês
C - Lineamento Transbrasiliano

Figura 3.3 – Estruturas do Ciclo Brasiliano de comparti-


mentação no Paleozóico (segundo Fortes, 1978).

No Paleozóico, os eventos que ocorreram na


margem oeste da América do Sul, então pertencen-
te ao continente Gondwana, tiveram influência na
Bacia do Parnaíba. Em termos paleobiogeográfi-
cos, as faunas marinhas do Siluriano, Devoniano e
Carbonífero mostram afinidades com outras de mes-
ma idade, registradas no proto-oceano Pacífico.
No Carbonífero, foram iniciados os movimentos
precursores de agregação do supercontinente Pan-
gea, ligado à Orogenia Eoherciniana (Góes & Feijó,
1994). O primeiro reflexo foi o arqueamento do Alto
do Rio Parnaíba (Castelo Branco & Coimbra, 1984),
deslocando o depocentro da bacia para noroeste.
No Permiano, a Antéclise Tocantins-Araguaia e o
Arco Tocantins se elevaram, e as comunicações
entre as Bacias Amazonas e Parnaíba foram encer-
radas. Na continuidade até o Triássico, a área de- D- Arco Ferrer-Urbano Santos Alto estrutural
posicional foi deslocada para o centro da bacia fi- E- Anfíclise de Xambioá
nalizando o ciclo continental com as formações Mo- F- Alto do Rio Parnaíba Baixo deposicional
tuca e Sambaíba.
No Mesozóico, os principais elementos tectôni- Figura 3.4 – Estruturas de compartimentação no
cos regionais foram a Estrutura de Xambioá de ori- Mesozóico (segundo Góes, 1995).

– 14 –
Geologia Regional

leste-oeste, que de alto interno no Paleozóico pas- Os sedimentos se iniciam com indicadores gla-
sou a eixo deposicional no Mesozóico. Esta bacia ciais, intercalados com deposição marinha. Caroz-
ainda é pouco estudada. Na Bacia de São Luís- zi et al. (1975) descreveram três fases de superpo-
Grajaú as unidades com idade entre Aptiano e Neo- sição fluviomarinha com distributários deltaicos, e
cretáceo, compreendem as formações Grajaú, plataformas marinhas.
Codó, Itapecuru , Alcântara e Cojupe. A influência das variações do nível do mar foi
Para a compatibilização da terminologia local, muito importante no controle da bacia, durante o
baseada em datações bioestratigráficas elabora- Paleozóico. As interpretações estratigráficas per-
das principalmente para as bacias da Margem mitiram identificar três seqüências deposicionais
Continental Leste (Feijó, 1994) e a geocronologia do Neopaleozóico (Della Fávera, 1990). A primeira
formal e internacional é apresentada a tabela de seqüência, no Devoniano apresenta plataformas
correlação do Cretáceo (Figura 3.5). marinhas de tempestade. A segunda seqüência
A tabela de síntese dos conceitos geocronológi- devono-mississipiana tem o primeiro intervalo
cos e litoestratigráficos, aplicada à sistematização transgressivo correspondendo à Formação Longá
dos eventos biológicos apresentada na Figura 3.6 inferior e o segundo intervalo regressivo correspon-
reúne os dados das cartas cronolitoestratigráfica de ao topo da Formação Longá e à porção basal da
de Góes et al. (1990) e Góes & Feijó (1994), acresci- Formação Poti. A terceira seqüência mississipiana
das de modificações de Lima & Campos (1980) e corresponde ao topo da Formação Poti compreen-
Rosseti et al. (2001). dendo um sistema transgressivo com lobos sigmoi-
dais deltaicos e tempestíticos. Plataformas terríge-
nas apresentam eventual formação de pântanos e
3.5 Paleozóico lagunas, em áreas batidas por tempestades (Ian-
nuzzi, 1994).
Do Ordoviciano/Siluriano ao Mississipiano, a se- No Pensilvaniano e Permiano há um desseca-
dimentação é clástica, predominantemente mari- mento geral da bacia. No Pensilvaniano, a sedi-
nha, marcada por acentuada subsidência na bor- mentação eólica é seguida de sedimentação mari-
da leste com atuação da direção nordeste e noro- nha transgressiva (Formação Piauí). Os ambientes
este. são de linha de costa mista clástica/carbonática,
oscilante, intercalando zonas de restrição de eva-
FORMAL
poritos (Lima Filho, 1992; Lima Filho & Rocha Cam-
PERÍODO IDADE LOCAL pos, 1993; Santos, 1994).
ÉPOCA
No Permiano ocorreu novo rebaixamento do ní-
SENONIANO
vel de base com sedimentação eólica seguida por
CENOMANIANO elevação do nível dos corpos aquáticos interiores
em ambientes lacustres e evaporíticos (Formação
ALBIANO Pedra de Fogo). Os ambientes quentes e áridos da
Formação Motuca propiciaram a formação de eva-
ALAGOAS
C R E T Á C E O

GÁLICO poritos. Na sedimentação eólica, em região semi-


APTIANO desértica com dunas (Formação Sambaíba), data-
JIQUIÁ da possivelmente como Triássico, não foram evi-
BARREMIANO BURACICA
denciados registros de atividade orgânica.

ARATU
3.6 Distensão e Magmatismo Associados à
HAUTERIVIANO
Abertura do Atlântico
NEOCOMIANO
VALANGIANO RIO DA SERRA Góes (1995) propôs a denominação Anfíclise de
BERRIASIANO
Alpercatas, para a unidade morfológica correspon-
dente ao expressivo processo magmático, intrusivo
JURÁSSICO TITONIANO DOM JOÃO e extrusivo, que ocorreu no Mesozóico. Esta deno-
minação foi baseada na serra das Alpercatas de
Figura 3.5 – Geocronologia do Mesozóico, no Nordes- orientação ENE-WSW, localizada no estado do Ma-
te do Brasil (adaptado de Góes & Feijó, 1994). ranhão.

– 15 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

MILHÕES GEOCRONOLOGIA
DE LITOESTRATIGRAFIA
ANOS PERÍODO ÉPOCA IDADE

SENONIANO COJUPE

100 CENOMANIANO ALCÂNTARA

ITAPECURU
ALBIANO
CRETÁCEO GÁLICO
ALAGOAS CODÓ/GRAJAÚ
APTIANO

130 BARREMIANO BURACICA CORDA/PASTOS BONS

NEOCOMIANO SARDINHA

200
JURÁSSICO
MOSQUITO

TRIÁSSICO
SAMBAÍBA

250 TATARIANO MOTUCA

NEO KAZANIANO

UFIMIANO

PERMIANO KUNGURIANO

ARTINSKIANO PEDRA DE FOGO


EO
SAKMARIANO

ASSELIANO

STEFANIANO PIAUÍ
300
VESTFALIANO
PENSILVANIANO
NAMURIANO
CARBONÍFERO

VISEANO
MISSISSIPIANO POTI
TOURNAISIANO
350

FAMENIANO
NEO LONGÁ
FRASNIANO
CABEÇAS
PIMENTEIRA
GIVETIANO
MESO ITAIM
DEVONIANO EIFELIANO

EMSIANO
400 EO PRAGIANO
LOKOVIANO

PRIDOLIANO JAICÓS
LUDLOVIANO
SILURIANO
VENLOKIANO TIANGUÁ
LANDOVERIANO IPU

Figura 3.6 – Unidades geocronológicas e litoestratigráficas das bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís
(modificado de Góes et al., 1990 e Góes & Feijó, 1994).

– 16 –
Geologia Regional

O elemento tectônico de destaque é a Estrutura marinho do hemisfério norte e migraram para ambi-
de Xambioá, de orientação leste-oeste. Situada no entes lacustres. A Bacia Recôncavo-Tucano abri-
centro da Bacia, foi um alto interno durante o Paleo- gou a maior variedade de representantes, nos quais
zóico (Aguiar, 1969). No Mesozóico, a fragmenta- os Lepidotes (Semionotidae) são os mais numero-
ção do Pangea modificou o arcabouço tectônico sos. O gênero ocorre na Bacia do Parnaíba e em
da bacia, passando a Estrutura de Xambioá a outras bacias cretáceas interiores. Seu apareci-
compor um novo eixo deposicional (Hasui et al., mento assim como a freqüente ocorrência dos con-
1991), alterando localmente as conformações dos chostráceos é um evento biológico relacionado aos
estratos. eventos geológicos de abertura da Margem Leste
A conceituação de anfíclise proposta por Góes do Atlântico e ao estabelecimento de conexões en-
(1995) é restrita para as rochas derivadas do vul- tre bacias (Carvalho & Santos, 1994).
canismo fissural. São os derrames da Formação A Formação Pastos Bons, pelo conteúdo em pei-
Mosquito, do Triássico-Jurássico, situados na bor- xes fósseis era considerada de idade jurássica, e
da oeste da bacia, e as soleiras e os diques de dia- como tal situada estratigraficamente entre os derra-
básio da parte oriental, equivalentes no tempo à mes Mosquito e os diabásios Sardinha. Posterior-
Formação Sardinha, do Eocretáceo (Lima & Leite, mente, as formações Corda e Pastos Bons foram
1978). consideradas de mesma idade por seus invertebra-
Os derrames basálticos intercalam sedimentos dos fósseis (Lima & Leite, 1978). A datação por pali-
que alguns autores atribuem à Formação Corda. nomorfos da Formação Pastos Bons no Andar Bura-
Santos et al. (1984) citam que o contato superior cica, revelam uma posição no Cretáceo Inferior-
dos basaltos com a Formação Corda é discordante Barremiano (Lima & Campos, 1980).
e marcado por uma superfície de erosão acentua- Os sedimentos Pastos Bons preenchem as de-
da. pressões dos grábens alinhados sobre a antiga
área do Arco de Xambioá e a Anfíclise de Alperca-
3.7 Subsidência Relacionada ao Rifte Atlântico tas (Góes, 1995). Extravasam seus limites e reco-
brem discordantemente as formações paleozóicas
Pela fragmentação do bloco afro-brasileiro e de- Poti, Piauí, Pedra de Fogo e Motuca. Em ambiente
senvolvimento da Margem Continental Leste do de baixa energia, conservam as faunas de peixes e
Brasil, foram diferenciadas, na Bacia Recôncavo- de conchostráceos. São correlacionáveis com as
Tucano e em outras bacias marginais, quatro se- faunas que ocorrem nas bacias interiores, e na Mar-
qüências sedimentares (Asmus, 1984): gem Continental Leste.
As formações Pastos Bons e Corda são coloca-
Fase pré-rifte: seqüência de continente, no final
das na Bacia do Grajaú, até que novas pesquisas
do Jurássico;
detalhem a geologia da área.
Fase rifte: seqüência de lagos, no Cretáceo
No Aptiano-Albiano, a ruptura do Gondwana pro-
Inferior basal.
piciou o desenvolvimento da Margem Atlântica Sul
Fase pós-rifte: seqüência de golfo, de idade Ala-
Equatorial. A ela estão associadas as pequenas ba-
goas, no estágio de proto-oceano;
cias marginais, um sistema de riftes costeiros e a evo-
Seqüência de mar: após o Albiano, evolução do ocea-
lução estrutural do Arco Ferrer-Urbano Santos (Re-
no Atlântico.
zende & Pamplona, 1970 e Miura & Barbosa, 1972).
Com a progressiva abertura do Atlântico Sul, o O arqueamento do Alto Rio Parnaíba e do Arco
deslocamento do continente para oeste, e a rota- de Xambioá comportando-se como uma antéclise,
ção horária do pólo, os esforços criaram pequenas propiciou o soerguimento da área central, delimi-
bacias em grábens nas zonas do embasamento tando uma nova área de subsidência. Góes (1995)
(Szatmari et al., 1987), durante o Cretáceo Inferior. a definiu como a Bacia de Grajaú, com o limite nor-
A geração de baixos deposicionais, com sedimen- te do Arco Ferrer-Urbano Santos, separando as
tação subaquática propiciou a expansão das mani- bacias de São Luís e Barreirinhas. O preenchimen-
festações de vida, com o evento biológico repre- to foi efetuado com depósitos eólicos e marinhos do
sentado pela freqüente ocorrência de conchostrá- Aptiano/Albiano das formações Grajaú e sedimen-
ceos e uma associação de peixes. tos fluviais e estuarinos do Albiano da Formação
A composição da fauna de peixes da seqüência Itapecuru.
sedimentar de lagos é formada por grupos de ca- A Bacia de São Luís é associada ao sistema de
racterísticas arcaicas, que derivaram do Jurássico riftes costeiros e delimitada pelos Arco do Rosário a

– 17 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

leste, Arco Ferrer-Urbano Santos a sul e Arco To- tem predominância de sedimentação clástica, situ-
cantins a leste. A depressão formada a partir do ando-a na base do Grupo Itapecuru, datada no
Aptiano foi preenchida por sedimentos das forma- Meso/Neoalbiano.
ções Codó e Grajaú e no Albiano pelos sedimentos Os peixes fósseis que ocorrem em carbonatos
da Formação Itapecuru. Durante o Cenomaniano a na região de Codó e Brejo caracterizam dois even-
Bacia de São Luís evoluiu com sedimentação mari- tos biológicos correlacionáveis com os que ocor-
nha rasa, e seu preenchimento continuou até o Ter- rem em carbonatos nos membros Crato e Romual-
ciário (Aranha et al., 1990). Nos sedimentos de co- do da Formação Santana.
bertura da parte emersa da Bacia de São Luís data- No primeiro evento do Aptiano, os fósseis do cal-
dos no Cenomaniano, ocorrências de fósseis são cário laminado são mantidos na Formação Codó, e
registradas na região de litoral, em torno da baía de são correlacionados ao Membro Crato da Forma-
São Marcos. Compreendem faunas marinhas e ter- ção Santana. Estão de acordo com o trabalho de
restres e floras terrestres. Paz & Rossetti (2001).
Rossetti & Truckenbrodt (1999) apresentaram O segundo evento datado do Albiano, é repre-
uma nova nomenclatura estratigráfica para a Bacia sentado pela característica e diversificada fauna
de São Luís. Na base colocaram a Formação Codó, de peixes, idêntica à do Membro Romualdo, For-
com idade aptiana. Considerando que o termo Ita- mação Santana, da Bacia do Araripe, e Formação
pecuru englobava várias unidades, elevaram-nas à Riachuelo da Bacia Sergipe/Alagoas. Ocorrem em
categoria de Grupo Itapecuru. Está dividido em carbonatos, e na Bacia do Araripe são interpreta-
Unidade Indiferenciada (Albiano), Formação dos como ocorrentes uma superfície de inundação
Alcântara do Albiano Superior ao Cenomaniamo e marinha (Ponte & Ponte-Filho, 1996). Como não
Formação Cojupe do Turoniano ao Paleoceno. estão registrados por Rosseti et al. (2001) e Paz &
Em trabalho posterior, Góes & Rossetti (2001) in- Rossetti (2001), são mantidos como unidade su-
terpretaram que a sedimentação entre as bacias de perior da Formação Codó, até que novos estudos
Grajaú e São Luís era contínua, denominando a definam as nomenclaturas estratigráficas mais
área como Bacia São Luís-Grajaú. A nova nomen- apropriadas.
clatura foi aplicada para as áreas da bacia do Gra- A outra observação é referente ao uso da deno-
jaú. minação de Formação Itapecuru para a área geo-
No estudo dos eventos biológicos, que são os gráfica de Itapecuru-Mirim. Como a Formação Ita-
elementos operacionais de correlação aplicados pecuru é uma unidade operacional de mapeamen-
na estratigrafia de eventos (Kauffman, 1987), o uso to reconhecida e utilizada nos trabalhos da área,
desta nomenclatura estratigráfica apresentou algu- com precisão superior à denominada Unidade Di-
mas dificuldades. Como os bioeventos represen- ferenciada, foi mantida no presente estudo.
tam a resposta biológica à dinâmica de mudança Os trabalhos que estão sendo realizados na re-
em intervalos de tempo determinados, devem ter gião do rio Itapecuru, por pesquisadores da UFRJ,
uma posição estratigráfica definida. desde 1990, visam entre seus objetivos, o estudo
A primeira dificuldade é referente ao Cretáceo. de fósseis associados à seção-tipo da Formação
Rosseti et al., (2001) e Paz & Rossetti (2001) conclui- Itapecuru no sentido definido por Campbell (1949).
ram que havia duas seqüências deposicionais da Nesta área, e em níveis estratigráficos foram regis-
região de Codó, separadas por uma descontinui- trado organismos de ambiente continental: verte-
dade de caráter regional. A unidade inferior neoap- brados e invertebrados.
tiana era correspondente à descrição original de Na pequena área em estudo, os sedimentos de co-
Lisboa (1914), para a Formação Codó. Colocaram bertura da Bacia de São Luís, datados como Ceno-
a unidade superior na Unidade Indiferenciada, que maniano são enquadrados na Formação Alcântara.

– 18 –
Antigos Ecossistemas

4
ANTIGOS ECOSSISTEMAS
A metodologia para a reconstituição de anti-
gos ecossistemas, foi estabelecida por técnicas
do nível do mar. Os fósseis, enfocados como mani-
festações pretéritas de atividade dos organismos
pertencentes às disciplinas de Estratigrafia e Pa- vivos, foram objeto de organização classificatória,
leontologia. As concepções são de Análise de da paleoecologia e da tafonomia. Foram estudados
Bacias e Paleobiologia, constituídas por interpre- por eventos biológicos, tais como morte rápida, su-
tações sistêmicas, com a visualização das rela- cessão de comunidades, evolução pontuada, evo-
ções de interdependência entre os fenômenos na- lução explosiva e colonização rápida.
turais. A análise sedimentológica, essencial para esta-
A pesquisa das manifestações de vida no passa- belecer as interações entre os componentes bióti-
do geológico visou a obtenção de modelos ade- cos e abióticos dos antigos ecossistemas, forne-
quados aos eventos geológicos e biológicos ocorri- ceu os parâmetros das condições físicas do local
dos na Bacia. As metodologias integram o reconhe- onde os organismos viveram e/ou foram enterra-
cimento de processos da evolução da crosta ter- dos.
restre e da Biosfera. No passado geológico, as flutuações do nível do
mar exerceram ação direta na diversidade biológi-
ca das bacias. Mantiveram correlações com a
4.1 Reconstituição de Antigos Ecossistemas ocorrência de organismos marinhos e cadeia de
energia de produtores e consumidores terrestres,
Para o estudo das associações de faunas e flo- pela influência exercida nos climas continentais, na
ras, os intervalos de tempo foram fundamentados formação de solos e na vida vegetal.
em tabelas cronoestratigráficas fornecidas por mi- Sedimentos e fósseis dão as inferências sobre
crofósseis. ambientes continentais e marinhos, linhas de cos-
Durante o trabalho, ficou evidenciado que havia ta, batimetria, paleotemperaturas, paleoclimas,
uma relação dos marcos de tempo, faunas e floras afinidades florísticas e faunísticas e províncias pa-
evolutivas e eventos biológicos com as variações leobiogeográficas.

– 19 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

4.2 Coleta de Dados ciam as variações do nível do mar, em linhas de


tempo que permitem as correlações cronoestrati-
As informações foram inicialmente recuperadas gráficas, em escala mundial, regional e local.
em projetos desenvolvidos pela CPRM, comple- A atuação de fatores como elevação eustática,
mentadas com a bibliografia especializada e atuali- subsidência regional e razão de sedimentação de-
zação de conceitos. vem ser diferenciadas. Eustasia e subsidência
As interpretações de Estratigrafia e Paleontolo- combinadas produzem as variações relativas do ní-
gia, apresentam para as unidades cronoestrati- vel do mar.
gráficas e litoestratigráficas um arcabouço bási-
co com os dados estratigráficos, compilados de 4.3.2 Sistemas Deposicionais e Análise de
mapas-base, na escala 1: 2.500.000 (Schobbe- Fácies
nhaus et al, 1981) e mapas geológicos na escala
1: 250.000 e 1: 1.000.000 (Lima & Leite, 1978) e as O conceito e os modelos de sistemas deposicio-
seqüências e sistemas deposicionais (Della Fáve- nais foram introduzidos por Fisher & Brown (1972).
ra, 1990; Chang et al.,1990b; Ponte, 1994). Um sistema deposicional antigo é definido como
Para a elaboração das listagens das localidades uma associação tridimensional de fácies sedimen-
fossilíferas e respectivos mapas, foram consulta- tares unidas geneticamente por ambientes sedi-
dos os registros de ocorrências em bibliografia na- mentares inferidos e processos deposicionais. É
cional e internacional, dados do Projeto “Localida- uma interpretação holística das rochas, baseada
des Fossilíferas”, do DNPM, e a BASE-PALEO, a em análogos modernos. A unidade fundamental é a
Base de Dados Paleontológicos da CPRM. fácies, definida em termos de composição, litolo-
A compilação de dados paleontológicos incluiu gia, geometria, e outras características relaciona-
os aspectos descritivos e classificatórios dos fós- das aos processos deposicionais.
seis. Os exemplares estudados e fotografados são Para a análise de fácies, em perfis verticais e
na maior parte pertencentes às coleções do Institu- correlações laterais os critérios são variáveis. Sel-
to de Geociências e do Museu Nacional da UFRJ e ley (1970) cita os parâmetros para sua determina-
do Museu de Ciências da Terra do MME. As pesqui- ção: geometria, litologia, estruturas sedimentares,
sas de campo foram realizadas no centro do estado paleocorrentes e fósseis.
do Maranhão em 1990, com um auxílio da Funda- A identificação dos processos físicos que forne-
ção de Amparo à Pesquisa no Estado do Rio de Ja- cem as informações básicas para a interpretação da
neiro (FAPERJ), e na região leste e centro da Bacia, deposição é obtida pelo estudo das estruturas sedi-
no estado do Piauí e no Maranhão, em 1993, com fi- mentares primárias, orgânicas e inorgânicas. As es-
nanciamento da Companhia de Pesquisa de Re- truturas sedimentares são basicamente as feições
cursos Minerais. de superfície de deposição e as de acamamento, in-
cluindo as marcas de superfície, formas de acama-
mento, geometria das camadas, estruturas de bio-
4.3 Métodos Estratigráficos turbação e deformação penecontemporânea.

Para os modelos de antigos ecossistemas, que 4.4 Paleobiologia


ilustram os eventos da Bacia do Parnaíba, o arca-
bouço estratigráfico é composto por uma matriz dis- A Paleobiologia é um sistema conceitual desen-
ciplinar (Vera Torres, 1994). As unidades são hierar- volvido para a pesquisa das influências dos paleo-
quizadas das maiores para menores em: seqüên- ambientes nos processos evolutivos. São concei-
cia deposicional, sistema deposicional, elemento tos para o estudo da Biosfera Evolutiva durante os
deposicional, associação de fácies e fácies (Figura tempos geológicos passados, e envolve fatores
4.1). responsáveis pela existência, diversidade, evolu-
ção e distribuição dos organismos.
4.3.1 Seqüências Deposicionais Como sistema aberto admite diferentes enfoques
de organização temática, para recuperar os possí-
As seqüências deposicionais são conjuntos de veis significados biológicos das mudanças evoluti-
rochas, delimitadas por superfícies isócronas, re- vas. Os dados foram analisados seguindo uma
presentadas por descontinuidades, que são even- adaptação da organização de Briggs & Crowther
tos de natureza física, química e biológica. Referen- (1990).

– 20 –
Antigos Ecossistemas

Figura 4.1 – Matriz disciplinar do arcabouço estratigráfico (Vera Torres, 1994).

– 21 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

4.4.1 Eventos na História da Vida Em nível global, correlacionam a evolução dos


continentes que estimulam as maiores mudanças
A elaboração das tabelas cronoestratigráficas, nos processos evolutivos, principalmente aquelas
historicamente, está baseada em evoluções bioló- observadas em níveis taxonômicos superiores. No
gicas, marcadas por extinções e/ou inovações, isto nível regional, trata da interpretação e correlação
é, o desaparecimento ou o aparecimento de gru- de bacias, as adequações ecológicas dos grupos,
pos taxonômicos. aberturas ou extinção dos biótopos.
No decorrer do século 19, os cientistas associa- Deslocamentos de linhas de costa são muito im-
ram as sucessões dos registros fossilíferos com a portantes e em geral as categorias taxonômicas
seqüência de tempo geológico. Os intervalos mais dão as respostas evolutivas abaixo de famílias.
longos que definem o Paleozóico, o Mesozóico e o Corresponde aos gêneros endêmicos. Em nível lo-
Cenozóico foram reconhecidos por representar cal, relaciona os organismos com o paleoambiente,
fenômenos de caráter mundial, como extinções através do estudo da estrutura de uma comunidade
em massa e/ou inovação de grupos taxonômicos fóssil.
de hierarquia superior, como classes e ordens.
As mudanças evolutivas ao nível de gênero e fa- 4.4.2 Processos Evolutivos
mília, estão compreendidas por dezenas a centenas
de milhões de anos e delimitam os períodos geológi- Os eventos biológicos ou bioeventos são defini-
cos. Os andares são os intervalos de tempo mais dos por Walliser (1986) como as mudanças nas fau-
curtos, caracterizados por menores mudanças de nas e floras, motivadas por processos evolutivos de
fauna e flora. inovação, radiação, rápida distribuição geográfica
O reconhecimento de fósseis distintivos possibi- e extinção.
litou as correlações das unidades estratigráficas Seus estudos relacionam os processos geológi-
em diferentes locais. Contribuiu para a elaboração cos, correspondentes à criação ou a mudanças
das histórias evolutivas dos grupos pertencentes nos ecossistemas, que levaram ao aparecimento
às divisões do mundo orgânico (Ziegler, 1983), com ou desaparecimento de grupos de organismos, e
os representantes da flora (Figura 4.2) e da fauna estabelecem as correlações com os eventos de na-
(Figura 4.3). tureza física e química.
Nas últimas décadas, os trabalhos desenvolvi- De acordo com Kauffman (1986), os eventos bio-
dos relacionam a evolução dos seres vivos com os lógicos são analisados e interpretados em três es-
processos da crosta terrestre (Holland & Trendall, calas:
1984; Eisele & Seilacher, 1982; Bayer & Seilacher, − em nível global, quando correlacionados à evolu-
1985). ção dos continentes, estimulando as maiores
As grandes extinções e inovações ocorridas mudanças em processos evolutivos. São obser-
nas passagens das eras geológicas correspon- vados principalmente, nos níveis taxonômicos
dem a fatores geológicos reconhecidos como mu- superiores.
danças de longo termo: as derivas de continentes − em nível regional, na interpretação de uma bacia,
e as variações globais do nível do mar. Os even- ou correlação entre bacias, os processos evoluti-
tos de menor duração registrados nos estratos re- vos e as adequações ecológicas são analisados
fletem os diferentes estágios de isolamento nas em função de aberturas ou extinção dos bióto-
bacias. As mudanças definem respostas ecológi- pos. Em geral, as respostas evolutivas são nas
cas locais. Correspondem às substituições de es- categorias de família, gênero e espécie.
pécies e gêneros, que acompanham os processos − em nível local, quando a estrutura de uma comu-
evolutivos através do tempo geológico. nidade fóssil é estudada relacionando os orga-
Na Bacia do Parnaíba as mudanças tectônicas e nismos com os paleoambientes.
as variações globais do nível do mar que causaram
a abertura ou o fechamento das passagens mari-
nhas e conexões interiores estão evidentes. Os bió- 4.4.3 Paleoecologia e Tafonomia
topos foram criados e/ou destruídos, propiciando a
colonização dos novos organismos, ou sua substi- As regiões da Biosfera, onde estão consubstan-
tuição nas comunidades. Estas correlações entre ciados os processos biológicos, físicos e químicos
os eventos geológicos e biológicos são sistemati- constituem os ecossistemas, estudados pela Eco-
zadas na Figura. 4.4. logia (Figura 4.5).

– 22 –
Antigos Ecossistemas

ZOSTEROPHYLLOPSIDA

GYMNOSPERMOPSIDA
TRIMEROPHYTOPSIDA

ANGIOSPERMOPSIDA
SPHENOPSIDA
RHYNIOPSIDA

FILICOPSIDA
BRYOPHYTA

LYCOPSIDA
CENOZÓICO

NEÓGENO

PALEÓGENO
MESOZÓICO

CRETÁCEO

JURÁSSICO

TRIÁSSICO

PERMIANO

CARBONÍFERO
PA L E O Z Ó I C O

DEVONIANO

SILURIANO

ORDOVICIANO

CAMBRIANO

Figura 4.2 – Distribuição estratigráfica das plantas fósseis (Santos, M. 1992).

– 23 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 4.3 – Distribuição estratigráfica dos animais fósseis (Santos, M. 1992).

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Antigos Ecossistemas

Figura 4.4 – Correlações entre eventos geológicos e biológicos (modificado de Santos, M. 1992).

– 25 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 4.5 – Estruturas gerais de ecossistemas terrestres e aquáticos (Odum, 1969).

A Paleoecologia tem por objetivo a pesquisa de Na maioria dos textos de Paleobiologia, a Paleo-
relações entre os organismos fósseis e os ambien- ecologia e a Tafonomia se complementam. A Tafo-
tes de vida, em idades passadas. É uma escola de nomia é definida como a identificação dos proces-
trabalho diretamente desenvolvida dentro da filoso- sos de fossilização, nos três estágios: morte, enter-
fia do Atualismo, como descrito em vários textos ramento e diagênese (Figura 4.7).
básicos. As inferências paleoecológicas enfocam Outros aspectos das relações da Tafonomia são
as relações entre organismos e ambientes no re- investigados por Fernández López (1986-87) de
gistro fóssil, ao nível de espécies individuais e gru- escola independente situada na Península Ibérica,
pos taxonômicos. Identificam a morfologia cons- com dois subsistemas conceituais: Paleobiologia e
trucional, as características das fácies e das as- Tafonomia.
sembléias fósseis, com observações sobre os há- A Paleobiologia é integrada pelas Paleoecolo-
bitos de vida, como habitat, alimentação, respira- gia, Paleobiogeografia e Paleontologia Evolutiva, e
ção e reprodução (Figura 4.6). se baseia na Neontologia e Tafonomia.

– 26 –
Antigos Ecossistemas

A Tafonomia se ocupa das mudanças que as en- As disciplinas são a Tafonomia Funcional que é o
tidades experimentaram na litosfera, desde sua estudo do comportamento funcional dos organis-
produção biogênica até os dias atuais, com dois mos e das relações entre eles e seus respectivos
subsistemas conceituais – a Bioestratinomia e a ambientes. A Tafogeografia é o estudo da distribui-
Fossildiagênese. ção geográfica dos organismos. A Tafonomia Evo-
A Bioestratinomia é a parte que se ocupa dos lutiva considera que os objetos investigados são
processos sofridos pelos organismos após sua sistemas organizados que puderam sofrer proces-
morte, até seu enterramento final, segundo o con- sos evolutivos e são susceptíveis de integração em
ceito clássico, ou até o enterramento inicial, segun- sistemas mais complexos. A fossilização é vista
do Fernándes López. como uma destruição seletiva da variabilidade pa-
A Fossildiagênese compreende os processos so- leobiólogica e implica na perda desta informação.
fridos pelos organismos conservados após seu en- A fossilização é uma seqüência sistemática e
terramento inicial. Assim como uma unidade produ- evolutiva de uma produção biogênica e tafogênica.
zida pode não chegar a ser conservada, também A fossilização aumenta a informação tafonômica.
uma conservada pode não chegar a ser registrada. Os sistemas tafonômicos são constituídos por com-
A Tafonomia é baseada na Paleobiologia, na ponentes inter-relacionados nos quais devem ser
Estratigrafia e na Petrologia. observados a composição, a estrutura e o ambien-
te externo.
MORFOLOGIA Os fósseis não são entidades paleobiológicas,
abordagem filogenética embora eles contenham informações paleobiológi-
abordagem construcional cas que foram produzidas no passado. Os fósseis
coevolução
são as entidades conservadas, devidas à produ-
COMPOSIÇÃO DAS PARTES DURAS ção biogênica, isto é, a processos tafonômicos/pa-
ISOLADOS leoecológicos.
POPULAÇÕES
Entidades previamente produzidas e conserva-
das podem desaparecer ou ser destruídas. Porém,
MODOS DE VIDA
AQUÁTICOS se sofrem ação de processos de fossilização estas
PLANCTÔNICOS entidades são registradas. Constituem as evidências
NECTÔNICOS observáveis de entidades paleobiológicas.
BENTÔNICOS isolados
coloniais
recifes 1 MORTALIDADE
estromatólitos 2 REGISTRO DOS COMPONENTES ORGÂNICOS
incrustantes
3 DURABILIDADE DAS PARTES DURAS
TERRESTRES
4 DESINTEGRAÇÃO
ANIMAIS
- INVERTEBRADOS
PLANTAS
- VERTEBRADOS
MODOS DE NUTRIÇÃO - PLANTAS

MICRÓFAGOS em suspensão 5 TRANSPORTE


infauna e epifauna Formação das assembléias fósseis
em depósito 6 ENTERRAMENTO
epifauna RÁPIDO “obtution”
HERBÍVOROS pastadores concentração
ESCAVADORES estagnação
CARNÍVOROS
PREDADORES 7 DIAGÊNESE
CARBONATOS
PIRITA
COMPORTAMENTO - icnofósseis
FOSFATOS
ESTRUTURAS BIOGÊNICAS CARVÕES
(segundo Frey & Pemberton, in Walker, 1984)
8 PRESERVAÇÃO
BIOEROSÃO perfuradores LANGERSTATTEN FÓSSEIS
BIOESTRATIFICAÇÃO estromatólitos PLANTAS FÓSSEIS
BIOTURBAÇÃO escavadores
BIODEPOSIÇÃO pelotas fecais
Figura 4.7 – Principais aspectos da Tafonomia
Figura 4.6 – Tópicos da Paleoecologia (Santos, M. 1992). (Santos, M. 1992).

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

O básico para o estudo da Tafonomia Evolutiva, mação Poti), Permiano Inferior (Formação Pedra de
é a parte prática de reconhecimento dos três esta- Fogo) e Cretáceo Inferior da Bacia do Grajaú (for-
dos de preservação como fóssil : mações Pastos Bons, Codó e Itapecuru) com ocor-
• acumulação - quando a produção biogênica cai rências também no Plioceno da Bacia de Nova Ior-
no substrato, produzindo restos ou traços. Neste que.
processo não há transporte; Na Bacia de São Luís peixes Chondrichthyes e
• ressedimentação - é o deslocamento no substra- Osteichthyes são distribuídos no Cretáceo Superior,
to, antes que os elementos preservados sejam Cenomaniano da Formação Alcântara.
enterrados (com ou sem transporte); Os fósseis são considerados membros de unida-
• reelaboração - exumação e deslocamento no des biogeográficas e paleoecológicas cuja evolu-
substrato, depois do enterramento dos elemen- ção pode ser observada por série de ambientes.
tos preservados (com ou sem transporte) Estes conceitos foram aplicados por Boucot (1971,
Outro aspecto é referente às relações espaciais 1974, 1990b) para estudos de Ecoestratigrafia. Pei-
entre entidades biológicas, preservadas e registra- xes fósseis são bons elementos para a correlação
das: As entidades paleobiológicas podem ser: das seqüências sedimentares das bacias do Cretá-
• eudêmicas vivem e se reproduzem na área; ceo do Nordeste do Brasil. Há uma bem marcada
• miodêmicas vivem e não se reproduzem na área; sucessão de faunas, nas fases diferenciadas como
• paradêmicas não se reproduzem na área e so- lagos, golfo e mar aberto (Asmus, 1975). O diversifi-
freram transporte; cado registro fossilífero dos peixes permite correla-
• adêmicas são encontradas fora da área. ções entre bacias costeiras e interiores, relacionan-
As entidades conservadas podem ser: autóctones do as associações faunísticas com os paleoambi-
quando encontradas no mesmo local onde foram entes.
produzidas ou alóctones quando foram transporta- Pelos conceitos de estratigrafia por eventos, na
das lateralmente, do local onde foram produzidas. correlação pelas variações do nível do mar, as inte-
As entidades registradas são: rações entre os processos sedimentares e respos-
• in situ quando estão em situação original; tas biológicas vão desde o tipo de lagos, golfo a ba-
• ex situ quando foram transportadas para uma cias em mares de plataforma na margem continen-
nova situação estratigráfica. tal e mares epicontinentais. As aplicações são reali-
zadas pelos estudos de eventos biológicos
relacionando os processos geológicos e levando a
4.4.4 Classificação Sistemática e Distribuição mudanças de ecossistemas, que por sua vez, con-
Estratigráfica dos Peixes nas Bacias do duzem ao aparecimento de um determinado grupo
Parnaíba, Grajaú, São Luís e Nova Iorque de organismos.
Não existe um táxon “Pisces”: são incluídas nes-
O desenvolvimento dos peixes das águas de anti- te conceito, formas fósseis e atuais, marinhas e de
gos mares e rios até a terra significou um dos maio- água doce, de animais pertencentes a três grandes
res eventos na evolução da vida. Eles evoluíram grupos: Hyperotreti, Hyperoartia e Gnathostomata
como as primeiras criaturas a terem um esqueleto, (Janvier, 1996).
tornando-se ancestrais de todos os vertebrados: Os Hyperotreti (peixes-bruxa ou mixinas) e os
anfíbios, répteis, aves e mamíferos. Alguns grupos Hyperoartia (lampreias) são desprovidos de maxilas
de peixes estranhos e diferentes evoluíram no início (agnatas) e de apêndices pares. As formas atuais
da Era Paleozóica mas não tiveram sucesso e possuem esqueleto predominantemente cartilagi-
grande parte desta história estava localizada nas noso e conservam a notocorda, eixo de sustenta-
águas do antigo supercontinente Gondwana sendo ção corporal que surgiu nos primeiros Chordata. As
que muitos dos mais bem preservados peixes fós- formas fósseis, com exoesqueleto ósseo, eram an-
seis ocorrem em algum lugar remanescente desse teriormente incluídas entre os “ostracodermos”.
continente, como a América do Sul, África, Índia, Alguns podiam alcançar 1m de comprimento, mas
Austrália e Antártica (Long, 1995). na maioria eram pequenos, com 10 a 20cm. Habita-
Na Bacia do Parnaíba, os primeiros representan- vam águas doces e salgadas, e eram geralmente
tes de vertebrados fósseis foram os peixes Chon- bentônicos, filtrando o lodo para se alimentar. A im-
drichthyes, que apareceram no Devoniano Médio possibilidade de triturar alimentos foi o maior fator
da Formação Pimenteira. Posteriormente a fauna contra seu desenvolvimento. O representante mais
de peixes se distribuiu do Carbonífero Inferior (For- antigo foi assinalado, com dúvida, no Neocambria-

– 28 –
Antigos Ecossistemas

no dos Estados Unidos, e no Neodevoniano o gru- maioria extintos. Os atuais estão representados por
po começou a declinar, extinguindo-se. Não há re- quatro gêneros: o Actinistia Latimeria, marinho e os
gistro fóssil no Brasil. Dipnoi, dulcícolas, Protopterus, Lepidosiren e Neo-
No final do Ordoviciano, algumas modificações ceratodus.
surgiram nos dois primeiros arcos branquiais, dan- O sistema de classificação que estabeleceu as
do origem às maxilas dos Gnathostomata. Com o regras de uma nomenclatura binominal para ani-
aperfeiçoamento da maxila e dos dentes, os meca- mais e plantas foi introduzido pelo naturalista sueco
nismos de alimentação diversificaram-se, surgindo, Carolus Linnaeus, no século XVIII, e é até hoje usa-
então, os predadores. Além disso, o desenvolvimen- do universalmente. Com base em níveis hierárqui-
to de nadadeiras pares permitiu que a natação rápi- cos, como reinos, classes e ordens, consta sempre
da substituísse o hábito sedentário, auxiliando ainda de dois nomes para cada espécie, o primeiro de-
mais a predação. O grupo dos Gnathostomata en- signando o nome genérico e o segundo o nome es-
globa os Placodermi, um grupo extinto sem repre- pecífico.
sentantes fósseis no Brasil, os Chondrichthyes, os Atualmente os trabalhos de classificação dos
Acanthodii e os Osteichthyes. exemplares são efetuados por um sistema criado
Os Chondrichthyes (tubarões, raias e quimeras) em 1966 pelo entomólogo alemão Will Henning. A
possuem esqueleto formado por cartilagem e com escola classificatória de Sistemática Filogenética,
uma outra cobertura de cartilagem calcificada pris- ou Cladismo propõe um método que estabelece re-
mática (tesserae), estruturas de difícil preservação. lações entre os organismos, usando características
Excepcionalmente, pode ocorrer esta preservação evolutivas em vez de similaridades entre eles, e es-
como em exemplares encontrados na Chapada do tas relações são representadas em um cladogra-
Araripe. Na maioria das vezes, são registrados ma. Os peixes foram um dos primeiros grupos a ser
dentes e espinhos. Entre os mais antigos represen- objeto de revisões por esta nova análise.
tantes estão escamas de tubarões do Ordoviciano A tabela (Figura 4.8) inclui representantes dos
dos Estados Unidos e do Siluriano da Mongólia, Chondrichthyes e Osteichthyes, ordenados de
com idade entre 450 e 420 milhões de anos, res- acordo com a classificação sistemática tradicional
pectivamente. e a respectiva distribuição estratigráfica das espé-
Os Acanthodii são grupo-irmão dos Osteichthyes cies em formações do Paleozóico, Mesozóico e Ce-
formando um grupo denominado Teleostomi. Algu- nozóico.
mas sinapomorfias de Teleostomi são boca em po- As ocorrências de dentes e espinhos de Chon-
sição terminal, duas fissuras neurocranianas e a drichthyes da Bacia do Parnaíba englobam quatro
presença de otólitos. Possuíam espinhos em gêneros descritos, dois atribuídos às ordens incer-
todas as nadadeiras, exceto a caudal, e o corpo tae sedis: Eugeneodontida e Petalodontida e dois
coberto por pequenas escamas. Viveram do Eo- dos Elasmobranchii das ordens Xenacanthiformes
siluriano ao Permiano, a maioria em ambientes e Ctenacanthiformes. Os Hibodontiformes encon-
marinhos. trados não foram determinados.
Os Osteichthyes constituem os vertebrados Espinhos de nadadeiras de “Ctenacanthus”
aquáticos dominantes durante os últimos 180 mi- ocorrem no Devoniano da Formação Pimenteira
lhões de anos. Possuem endoesqueleto ósseo e são (Kegel, 1953; Santos, 1961). A primeira referência
divididos em dois grupos: Actinopterygii e Sarcop- de vertebrado no Carbonífero da Formação Poti foi
terygii. A principal diferença reside no esqueleto a descrição do espinho cefálico de Xenacanthus
das nadadeiras, que nos Actinopterygii são radia- tocantinsensis. Foi também a primeira ocorrência
das e nos Sarcopterygii, lobadas. As radiadas são de um espinho cefálico de Chondrichthyes no Bra-
formadas por longos raios dérmicos suportados em sil (Santos & Salgado, 1970).
sua base por uma série de pequenos ossos, em ge- No Permiano, as citações são mais numerosas e
ral quatro, denominados radiais. As lobadas possu- deve ter havido um ambiente propício na Formação
em um único elemento ósseo que se articula com Pedra de Fogo, onde todas as ocorrências foram
as cinturas. Os primeiros representantes dos Acti- assinaladas. Espinhos de “Ctenacanthus” sp. e
nopterygii foram encontrados no Siluriano Superior dentes de Xenacanthus sp. (Scislewski et al.,
da Rússia e China. Este grupo inclui a grande maio- 1983), dentes e espinhos de “Xenacanthus”
ria dos peixes ósseos atuais, os Teleostei. Os Sar- albuquerquei, “Ctenacanthus” maranhensis e
copterygii surgiram no Devoniano e englobam além Anisopleurodontis pricei (Santos, 1946b; Santos,
de todos os tetrápodas, outros grupos de peixes, a 1990b; Santos, 1994b).

– 29 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Dentes de Itapyrodus punctatus ocorrem na For- Pedra de Fogo associado com restos de xenacantí-
mação Pedra de Fogo, representados pela família deos, ctenacantídeos, petalodontídeos, dipnóicos e
Petalodontidae, que é essencialmente marinha. do anfíbio Prionosuchus (Cox & Hutchinson, 1991).
Seus fósseis estão associados com xenacantídeos Os Pycnodontiformes representam uma extinta
e dipnóicos, de ambiente de água doce (Santos, linhagem, caracterizados por um arranjo particu-
1994b) lar de suas placas dentárias e algumas peculiari-
Há citações de ocorrência de espinhos de dades no crânio. São representativos por 170 mi-
Acanthodii (?)“Machaeracanthus” e (?)“Devon- lhões de anos, do Triássico ao Eoceno. Três frag-
canthus” no Devoniano da Formação Pimenteira, mentos de placas dentárias e dois dentes isolados
associados com espinhos de “Ctenacanthus” (Ke- formam a primeira ocorrência deste grupo no
gel, 1953, Santos, 1961). Também há registros no Albiano da Formação Itapecuru, associados com
Devoniano Inferior da Bacia do Amazonas, Forma- fauna de água doce (D’Arrigo, 1993; Pedrão et al.,
ção Manacapuru (Janvier & Melo, 1992). 1994; Carvalho, 1997). Distribuem-se em ambien-
Os primeiros representantes dos Osteichthyes, tes quase sempre marinhos mas foram encontra-
ocorrem na Bacia do Parnaíba. dos também em ambientes estuarinos, águas sa-
Podemos dividir os Actinopterygii em dois gru- lobras e dulcícolas.
pos-irmãos: Cladistia e Actinopteri (Patterson, 1982). Algumas escamas atribuídas a Semionotiformes
Os Cladistia conhecidos desde o (?) Cretáceo, são foram assinaladas nas localidades de Itapecu-
representados por apenas alguns fragmentos fósseis ru-Mirim, Coroatá e Alcântara no Albiano e Ceno-
e dois gêneros africanos, recentes, de água doce: maniano da Bacia de São Luís-Grajaú (Dutra & Ma-
Polypterus e Erpetoichthys. Fragmentos atribuídos a labarba, 2001).
Cladistia foram assinalados no Albiano da Formação Exemplares completos de Lepidotes piauhyen-
Itapecuru (Dutra & Malabarba, 2001). sis ocorrem no Cretáceo (idade Buracica) da For-
Atualmente os Actinopteri são divididos em mação Pastos Bons, associados a outros atribuídos
Chondrostei e Neopterygii. Chondrostei é um grupo às famílias Macrosemiidae e Pleuropholidae (Roxo
restrito aos representantes recentes: esturjões & Lofgren, 1936; Santos, 1945; Schaeffer, 1947;
(Acipenser) e peixes-espátulas (Polyodon) e seus Santos, 1974a; Brito & Gallo, 2002). Escamas dis-
fósseis relacionados. O grupo dos Neopterygii é persas de Lepidotes ocorrem no Albiano da For-
formado pelos Ginglymodi, Halecomorphi e Teleos- mação Itapecuru na Bacia do Grajaú e no Ceno-
tei conhecidos, no passado, como “holósteos” e maniano da Bacia de São Luis, Formação Alcânta-
“teleósteos”. ra (Carvalho & Silva, 1992) e em várias outras for-
Ginglymodi englobam os gêneros Lepisosteus e mações cretáceas fornecendo conexões entre as
Atractosteus que vivem atualmente nas Américas do bacias da seqüência dos lagos. Na Formação
Norte e Central e no mar do Caribe e pelos fósseis Codó, Albiano, ocorre Araripelepidotes temnurus,
distribuídos do Cretáceo ao Terciário. Os mais anti- mesma espécie da Formação Santana, Bacia do
gos foram descritos no Cretáceo Inferior do Brasil, Araripe (Santos, 1990a e 1994a).
no Araripe (Obaichthys) e África (Paralepidosteus). Do grupo dos Halecomorphi, dentes atribuídos a
No Cenomaniano da Bacia de São Luís foram assi- Amiiformes foram assinalados no Albiano e no Ceno-
naladas escamas atribuídas a Lepisosteidae (Dutra maniano das bacias de São Luís-Grajaú (Dutra & Ma-
& Malabarba, 2001). labarba, 2001). Há representantes da família Amiidae
Existem, entretanto, vários táxons cujo posiciona- na Formação Codó – Calamopleurus cylindricus e
mento filogenético dentro de Actinopterygii é incer- esta mesma espécie ocorre também no Araripe
to, tais como as ordens Paleonisciformes, Pycno- (Santos, 1960; Santos, 1994a; Grande & Bemis,
dontiformes e Semionotiformes. 1998). Esta família vem do Jurássico Superior com
Os Paleonisciformes formam um dos primeiros representantes marinhos, e seus fósseis diferem
grupos de peixes de nadadeira radiada e caracteri- apenas em alguns detalhes do único representante
zados por escamas duras e ganóides. Na Bacia do atual, Amia calva, peixe de água doce, dos Estados
Parnaíba, estas escamas estão representadas no Unidos e Canadá, que, como seu antepassado,
Carbonífero da Formação Poti e no Permiano da For- também é um predador.
mação Pedra de Fogo (Duarte, 1936; Plummer et al., Durante o Mesozóico, os peixes de nadadeiras
1948; Santos & Salgado, 1970; Santos, 1990b). radiadas evoluíram para formas mais eficientes,
Além das escamas, um crânio pertencente a Brazi- tanto para a natação quanto para a alimentação. Os
lichthys macrognathus é assinalado na Formação primeiros teleósteos apareceram no Triássico Mé-

– 30 –
Antigos Ecossistemas

dio, há aproximadamente 220 milhões de anos, e A ocorrência de Cladocyclus gardneri na Bacia


no Cretáceo habitavam ambientes marinhos e de do Grajaú é correlacionada com o Albiano das ba-
água doce. cias de Sergipe/Alagoas, Formação Riachuelo e da
Entre os Teleostei estão assinalados alguns Bacia do Araripe, Formação Santana, onde em
exemplares atribuídos à família Pleuropholidae no brânquias de um de seus exemplares foi encontra-
Cretáceo da Formação Pastos Bons (Santos, do um copépodo exclusivamente marinho (Cres-
1974a; Brito & Gallo, 2002). sey & Patterson, 1973).
A família Aspidorhynchidae constitui um grupo Entre os Elopomorpha, a família Pachyrhizo-
monofilético comprendendo três gêneros Aspi- dontidae é formada pelos gêneros cretáceos:
dorhynchus, Vinctifer e Belonostomus (Brito, 1997). Pachyrhizodus, da América do Norte, Inglaterra e
São conhecidos em depósitos marinhos e conti- Austrália, Notelops do Brasil (formações Santana
nentais do Jurássico Médio ao Cretáceo Superior. e Riachuelo) e Rhacholepis conhecido da Colôm-
“Belonostomus” carinatus é encontrado no Neoco- bia, Venezuela, México e Brasil (formações Codó,
miano da Bahia. Brito (1997) não considera a vali- Santana e Riachuelo) (Forey, 1977). Inclui, tam-
dade desta espécie e afirma que as escamas atri- bém, Brannerion e Paraelops do Cretáceo do Bra-
buídas ao táxon poderiam pertencer a algum “ho- sil.
lósteo”. Vinctifer comptoni é descrito na Formação Brannerion foi posicionado entre os Elopomorpha,
Codó (Santos, 1994a), nas formações Santana, Mu- de acordo com a osteologia (Figueiredo & Santos,
ribeca e Riachuelo; no Cretáceo da Venezuela, For- 1990). Brannerion latum, que ocorre nas forma-
mação Apon (Aptiano/Albiano) associado com ções Codó e Santana é, até o presente, o mais pri-
amonitas e outros peixes (Moody & Maisey, 1994) e mitivo membro conhecido dos Albuloidei (Maisey,
na Formação Morelos Albiano do México (Brito, 1993).
1997). Vinctifer longirostris (Santos, 1990c) ocorre Influências marinhas são indicadas pelo apareci-
no Cretáceo (Aptiano) da Formação Marizal (Bahia) mento dos elopomorfa. Seus representantes possu-
e nas argilas da parte inferior da Formação Santana em uma fase larval especializada, com a larva pene-
(Brito, 1997). Vinctifer araripinensis foi assinalado trando em estuários e rios e retornando ao mar quan-
na Formação Santana (Santos, 1994c) e Vinctifer do adultos. Com a abertura do Atlântico Sul e eleva-
sp. no Barremiano da Formação Brejo Santo (Brito ção do nível do mar, houve uma rápida inundação
et al., 1994). São de importância paleoecológica de de mares epicontinentais rasos, e novos biótopos
transição entre ambientes de bacias fechadas para propiciaram a diversificação, com provincialismo
condições marinhas. Vinctifer era marinho mas po- em adaptação às novas condições ecológicas. As
deria ter se aventurado em águas doces ou salo- evidências de tolerância à salinidade variável são
bras da América do Sul onde seriam presas para o fornecidas pela expansão dos Elopomorpha e por
grande amiídeo Calamopleurus. representantes da família Chanidae.
Ichtyodectiformes são extintos teleósteos que Os Clupeomorpha têm uma característica fileira
apareceram no Jurássico Superior e tornaram-se de grandes escamas (escudos) abdominais. Re-
um grupo formado por grandes predadores mari- presentantes da família Clupeidae são assinala-
nhos. No Cretáceo, Cladocyclus ocorria em ambi- dos, com dúvida, a “Knightia” brasiliensis, um pe-
entes marinhos e de águas doces. A Formação queno peixe de água doce do Plioceno da Bacia de
Codó contém exemplares de Cladocyclus gardne- Nova Iorque, no Maranhão. Segundo Grande
ri, um predador, como indica seus grandes dentes, (1982) esta espécie é questionável.
e por terem sido encontrados em seu conteúdo es- Santos (1994a) criou Codoicthys carnavali, um
tomacal restos de Rhacolepis e Tharrhias. Como os Clupeomorpha que só ocorre na Formação Codó.
teleósteos modernos, eles têm modificações na Neste grupo assinalamos também Santanichthys
musculatura e no esqueleto caudal indicando uma diasi, contendo os menores exemplares da fauna,
hidrodinâmica apropriada para natação e perse- com mais ou menos 5cm de comprimento, que
guição de presas. ocorrem, também, nas bacias do Araripe e Sergi-
Este melhoramento seria suficiente para que nas pe/Alagoas.
rotas dos mares epicontinentais se tornassem ca- As bacias epicontinentais do Cretáceo do Nor-
çadores e predadores dos cardumes de Rhacole- deste são modelos de bacias abertas e em comuni-
pis e Tharrhias. A família é assinalada em sedimen- cação, onde as mudanças paleoecológicas corres-
tos marinhos e apenas Cladocyclus é registrado, ponderam à presença de conjuntos de espécies
também, em depósitos de água doce. comuns entre as mesmas.

– 31 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

A ocorrência de peixes cretáceos nas associa- A ordem Dipnoi ou peixes pulmonados está re-
ções que correspondem ao Albiano Inferior, Forma- presentada na Formação Pedra de Fogo por den-
ção Riachuelo (Sergipe/Alagoas), topo da Forma- tes isolados das famílias Sagenodontidae, Neoce-
ção Santana (Araripe) e topo da Formação Codó ratodontidae e Lepidosirenidae (Santos,1989b,
(Grajaú) mostra maior diversificação e demonstra a 1990b e 1994b). Uma placa dentária de Asiatoce-
evolução biológica por inovação representada por ratodus sp. ocorre no Albiano da Formação Itape-
grande número de gêneros novos: Calamopleurus, curu (Dutra & Malabarba, 2001) e dentes de Neoce-
Vinctifer, Cladocyclus, Rhacolepis, Tharrhias (San- ratodus africanus ocorrem no Cenomaniano da Ba-
tos, 1985a,b; Maisey, 1991; Carvalho & Santos, cia de São Luís (Cunha & Ferreira, 1980; Medeiros
1993). Foi uma inovação explosiva, pois além da di- & Schultz, 2001). As espécies fósseis são comuns à
ferenciação de gêneros novos, também ocorreu África e América do Sul.
uma população numerosa. Linhagens de peixes mais modernos encerram
O registro foi de natureza pontuada provavelmente os registros, no Terciário. São assinalados os Cha-
por abertura de novos biótopos, em condições ambi- raciformes Procharax minor e Triportheus altus e os
entais favoráveis. A teoria do equilíbrio pontuado é Perciformes, Macracara prisca. Estes três gêneros,
uma das teorias evolutivas e se contrapõe com a evo- juntamente com “Knightia” brasiliensis e vários
lução gradualista ou lenta (Eldredge & Gould, 1972). fragmentos de Arius sp. são representantes da Ba-
Os gêneros endêmicos são de famílias dos ma- cia pliocênica de Nova Iorque, no Maranhão, cujos
res epicontinentais do Jurássico, onde houve for- afloramentos foram inundados pelas águas da re-
mação de biótopos com a abertura do Atlântico presa Boa Esperança.
Norte. O progressivo aumento de biótopos epicon-
tinentais, com a abertura do Atlântico Sul, permitiu a 4.4.5 Infra-Estrutura da Paleobiologia
evolução de novas formas. Este evento biológico é
bem preservado na Formação Santana, Bacia do Briggs & Crowther (1990) enumeram os itens de
Araripe, correlacionado com outras formações das infra-estrutura necessários para alcançar o objetivo
bacias do Grajaú e Sergipe/ Alagoas. da Paleobiologia, como ciência da história evolutiva
Como inovação há o aparecimento dos Gono- da Biosfera. As modernas tecnologias de equipa-
rynchiformes com os táxons relacionados Tharrhias mentos de trabalho são valorizadas pelos museus e
araripis e Dastilbe elongatus. Dastilbe ocorre nas sociedades científicas que constroem a história da
formações Marizal (Tucano), Maceió (Sergipe/ Paleontologia.
Alagoas), Cabo (Cabo), Quiricó (Sanfranciscana); Além dos museus, é de acentuada relevância a
seção inferior de Santana (Araripe) e Codó (Grajaú) preservação dos sítios paleontológicos, pois es-
e também na África, na Guiné Equatorial. Tharrhias tão diretamente relacionado com o desenvolvi-
ocorre nas formações Santana, Codó e Riachuelo. mento dos sistemas conceituais da Paleontolo-
São da seqüência de golfo, idade aptiana/albia- gia.
na, e a composição da fauna indica a influência da O estudo dos fósseis deve ser comparativo com
elevação do nível do mar e do nível de base de cor- o ambiente geológico externo onde são encontra-
pos aquáticos interiores. dos, para a constituição de dados objetivos deriva-
Dos interessantes Sarcopterigii ou peixes de na- dos dos registros paleontológicos e estratigráficos.
dadeira lobada ocorrem os celacantos representa- Observações de campo são necessárias para es-
dos por escamas e um osso basisfenóide de (?) tabelecer corretamente as diferentes relações en-
Spermatodus, no Permiano da Formação Pedra de tre fósseis e as matrizes litológicas.
Fogo. Aparecem também nas formações Codó, Ita- Portanto, além de museus, que são instituições
pecuru e Alcântara com exemplares de Axelro- tradicionalmente organizadas para a preservação
dichthys e Mawsonia gigas (Carvalho & Maisey, de coleções, a proteção aos sítios fossilíferos é co-
1999; Dutra & Malabarba, 2001; Medeiros & locada como uma atividade básica na infra-estrutu-
Schultz, 2001). ra da Paleontologia.

– 32 –
Antigos Ecossistemas

Figura 4.8 – Classificação sistemática e distribuição estratigráfica dos Peixes nas bacias do Parnaíba, Grajaú, São Luís e Nova Iorque.

– 33 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

5
SÍTIOS NATURAIS
A s fisiografias dos estados do Maranhão, Piauí,
Tocantins, Pará e Ceará condicionadas pelas ro-
relatas. Como o conhecimento paleontológico da
grande área das bacias do Parnaíba, Grajaú e São
chas sedimentares são de altitudes moderadas e Luís está ainda no início, estudos futuros poderão
regulares. As rochas paleozóicas circunscrevem contribuir para responder a questões referentes à
as rochas mesozóicas e cenozóicas, que são de re- organização dos seres vivos.
levos planos e altitudes reduzidas.
Pela evolução geomorfológica, que atenuou a
forma dos estratos, foram originadas belas paisa- 5.1 Parque Nacional de Ubajara
gens. Estas são protegidas por leis e compreen-
dem os Parques Nacionais de Ubajara, Sete Cida- O Parque Nacional de Ubajara, criado em 1959,
des, Serra da Capivara, Lençóis Maranhenses, e o está localizado no estado do Ceará, na serra de
Parque Municipal de Teresina. Ibiapaba, município de Ubajara, próximo ao limite
Na legislação que trata da proteção dos sítios com o estado do Piauí. O acesso é dado pela es-
naturais há uma lei específica de proteção aos de- trada BR-222, que liga Teresina (PI) a Fortaleza
pósitos fossilíferos. Deve ser ressaltado que é sem- (CE).
pre de grande interesse a preservação dos sítios A região de relevo suave retém umidade e o cli-
paleontológicos, onde estão impressos os registros ma é mais ameno do que o circundante, quente e
de eventos biológicos singulares. É importante ga- semi-árido. Na região, as cotas médias são de 600
rantir a continuidade da existência física dos regis- a 700 metros, nos capeamentos “cuestiformes” de
tros paleontológicos, pois eles constituem as evi- arenitos do Grupo Serra Grande que circundam a
dências observáveis de atividades de vida no pas- bacia.
sado. Principalmente nesta fase de expansão da Os atrativos são as grutas calcárias situadas em
Paleontologia, em que os estudos visam incluir to- cota mais baixa e alcançadas por teleférico (Figura
dos os aspectos da vida no planeta. 5.1). A mais importante é a Gruta de Ubajara (Figu-
A preservação dos sítios paleontológicos consti- ra 5.2) com grandes salões interligados, produzi-
tui um dos requisitos de infra-estrutura para o de- dos pela dissolução dos carbonatos de rochas pro-
senvolvimento da Paleobiologia e de ciências cor- terozóicas.

– 34 –
Sítios Naturais

Figura 5.1 – Teleférico situado em cotas de 600 a 700 metros sobre as exposições de
arenitos do Grupo Serra Grande. Parque Nacional de Ubajara, município de Tianguá, Ceará.

Figura 5.2 – Gruta de Ubajara formada pela dissolução dos carbonatos de rochas
proterozóicas. Parque Nacional de Ubajara, município de Tianguá, Ceará.

– 35 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

5.2 Parque Nacional de Sete Cidades A paisagem é dominada por extensos chapa-
dões, com vales e reentrâncias denominados bai-
O Parque Nacional de Sete Cidades, criado em xões (Figura 5.6). São os arenitos pertencentes à
1961 está situado nos municípios de Piracuruca e Formação Ipu do Grupo Serra Grande que ocorrem
Piripiri (PI) , e é alcançado pela estrada BR-222 que no limite do embasamento proterozóico.
liga Teresina (PI) a Fortaleza(CE). Esta área contém um sítio arqueológico que ocu-
O conjunto de rochas é constituído por arenitos pa área de 40.000 km2, sem equivalência na histó-
devonianos da Formação Cabeças, esculpidos por ria da humanidade (Guidon, 1991). Foi o abrigo do
erosão. Mostram uma diversidade e complexidade homem pré-histórico, que ali registrou sua cultura,
de formas que guardam ainda as geometrias origi- em uma extensa variedade de pinturas rupestres
nais da deposição de grandes ondas nas antigas (Figura 5.7).
tempestades de plataformas marinhas (Figura 5.3). Durante as pesquisas da equipe da Drª Niede Gui-
A administração do parque oferece um roteiro don, foram descobertos ossos de mamíferos pleisto-
que apresenta as trilhas que podem ser percorri- cênicos nas cavernas calcárias do embasamento
das e assinala as denominações assumidas pelas proterozóico. As pesquisas do Parque Nacional da
rochas de acordo com as semelhanças de sua for- Serra da Capivara são o principal fator de desenvol-
ma, como exemplo o “casco de tartaruga” (Figura vimento para a região. Em São Raimundo Nonato foi
5.4). criado o Museu do Homem Americano, construído
um hotel turístico e um aeroporto, além de serem
5.3 Floresta Petrificada em Teresina promovidas obras de cunho social.

Na margem direita do rio Poti, dentro da área ur- 5.5 Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses
bana de Teresina estão localizados os troncos mi- e Delta do Rio Parnaíba
neralizados em posição de vida (Figura 5.5). Situ-
am-se a 1,2km da ponte que liga os bairros Ilhotas e Na baixada litorânea dos estados do Maranhão e
Noivos, compreendendo uma área de cerca de Piauí estão situados o Parque Nacional dos Lençóis
9.000km2. Maranhenses e a área de proteção ambiental do
Este material pertencente à Formação Pedra de delta do rio Parnaíba.
Fogo, de idade permiana, foi pesquisado por Cal- O Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses foi
das et al. (1989). Neste afloramento a posição dos criado em 1981, e está localizado a leste de São
troncos foi mapeada, analisadas as características Luís. Compreende uma extensão de 155.000 hec-
sedimentológicas e descrito um novo gênero. Ou- tares de terrenos arenosos marcados por ambiente
tras ocorrências semelhantes, registradas por es- eólico e formação de grandes dunas.
ses autores, estão situadas a cerca de 15km a mon- Os rios quando alcançam a planície costeira
tante do rio. passam a interagir com os fatores oceanográficos
A área está sob jurisdição do Departamento de atlânticos, formando depósitos por progradação e
Meio Ambiente da Prefeitura de Teresina. É sujeita agradação.
às inundações, durante as cheias periódicas do rio. O delta do rio Parnaíba, de idade holocênica está
situado no limite entre os dois estados. O curso atual
5.4 Parque Nacional da Serra da Capivara do rio Parnaíba é conseqüência do condicionamen-
to de eventos geológicos mais antigos ligados aos
O Parque Nacional da Serra da Capivara, criado sistemas de falhamentos na bacia, (Fortes, 1978).
em 1979, está em parte localizado no município de Os sedimentos clásticos grosseiros são carreados
São Raimundo Nonato no sudoeste do estado do para a construção da foz, e aí são distribuídos pela
Piauí, distando cerca de 500km de Teresina. O interação de fatores oceanográficos, isto é: as ma-
acesso é feito pela BR-324 a partir da cidade de rés de grande amplitude, a deflexão pela corrente
Floriano. das Guianas, e o regime de ventos locais.

– 36 –
Sítios Naturais

Figura 5.3 – Vista aérea dos arenitos devonianos da Formação Cabeças, no Parque Nacional de Sete Cidades, município de Piripiri, Piauí.

Figura 5.4 – Estruturas denominadas “cascos de tartaruga”, da Formação Cabeças, no Parque Nacional
de Sete Cidades, município de Piripiri, Piauí.

– 37 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 5.5 – Madeiras silicificadas, em posição de Figura 5.6 – Parque Nacional da Serra da Capivara, município de São Raimundo Nonato,
vida. Localidade situada à margem direita do Piauí. Vista aérea do Baixão das Andorinhas. Formação Ipu.
rio Poti,Teresina, Piauí.

– 38 –
Sítios Naturais

Figura 5.7 – Parque Nacional da Serra da Capivara, município de São Raimundo Nonato,
Piauí. Baixão da Pedra Furada. Sítio da Toca do Boqueirão. Pinturas rupestres nos
depósitos de barra de canal da Formação Ipu.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

6
SILURIANO
A seqüência mais antiga da Bacia sedimentar
do Parnaíba corresponde à unidade estratigráfica
da Serra Grande, aplicaram a denominação de For-
mação Jaicós, proposta por Plummer (apud Plum-
denominada Grupo Serra Grande, composta de ro- mer et al., 1948).
chas clásticas. Em superfície apresenta grandes Este esquema foi modificado por Caputo & Lima
exposições, formando serras e chapadas, nas bor- (1984), que propuseram, de acordo com o Código
das nordeste e leste da bacia. de Nomenclatura Estratigráfica, o termo Formação
Ipu (substituindo o nome Mirador) e mantiveram as
6.1 Histórico formações Tianguá e Jaicós.

O termo “Série Serra Grande” foi proposto por 6.2 Área de Ocorrência
Small (1914) para englobar arenitos, conglomera-
dos e calcários da borda oriental da bacia. Este As áreas de maior ocorrência e espessura, em
conceito foi revisto por Kegel (1953), que redefiniu superfície, estão situadas nos flancos nordeste,
a Formação Serra Grande, excluindo os calcários leste e sudeste da bacia. Nestas regiões, os atuais
dobrados do embasamento, que ocorrem sotopos- limites da bacia são bem marcados pelo pacote de
tos e em discordância angular com os arenitos. arenitos, formando chapadas, com terminação
A espessa seção sedimentar foi elevada à cate- abrupta, “cuestiforme”.
goria de Grupo Serra Grande por Carozzi et al. Caputo & Lima (1984) indicam, pelo mapa de
(1975). A unidade de base, composta por arenitos isópacas do grupo, que no Siluriano o depocentro
grossos, foi denominada Formação Mirador, e sua da bacia era situado a leste/nordeste, próximo à ci-
idade estabelecida no Landoveriano (Siluriano Su- dade de Ipu. De acordo com Lima & Leite (1978),
perior). A unidade média, estabelecida por Rodri- era a região de maior subsidência do sistema de
gues (1967) como Formação Tianguá, foi confirma- blocos associados ao Lineamento Sobral-Pedro II,
da e colocada também no Landoveriano. É com- de direção nordeste. As maiores espessuras estão
posta por folhelhos, siltitos e arenitos finos, com es- situadas a nordeste, com adelgaçamento para su-
cassa associação palinológica. Para a seqüência deste e sul. De acordo com Kegel (1953) preen-
superior, com arenitos grossos, muito grossos e chem as irregularidades do embasamento sobre o
conglomerados, que ocorrem a leste, nas escarpas qual os sedimentos se depositaram.

– 40 –
Siluriano

As espessuras máximas, em subsuperfície, são: 6.4 Sedimentação


350 metros na Formação Ipu, 200 metros na Forma-
ção Tianguá e 360 metros na Formação Jaicós Os ciclos sedimentares são diferenciados pelo
(Góes & Feijó, 1994). início de um ciclo continental fluvial, sobreposto por
um ciclo marinho e terminando por um ciclo conti-
nental fluvial (Caputo & Lima, 1984).
6.3 Geocronologia e Idade Os ambientes de deposição foram estudados
nas exposições da borda leste da bacia (Santos et
Os sedimentos marinhos que forneceram os mi- al., 1994), na serra de Ibiapaba (Formação Tian-
crofósseis para datação ocorrem em subsuperfície guá), em Jaicós (Formação Jaicós) e na serra da
e foram obtidos e estudados em pesquisas realiza- Capivara (Formação Ipu).
das pela PETROBRAS. A idade siluriana foi forneci- No município de São Raimundo Nonato, as ro-
da no trabalho pioneiro de Müller (1962), e mantida chas da Formação Ipu são arenitos e arenitos con-
por uma série de divulgações (Brito & Santos, 1965; glomeráticos com matriz arenosa e conglomera-
Brito, 1966, 1967b, 1969, 1971, 1976). dos. Foram depositados em depressões do emba-
Daemon (1976) registrou para o membro mé- samento composto de xisto e calcários. Formam a
dio do que denominou como Formação Serra serra da Capivara, que exibe escarpas e paredões
Grande, litologias ricas em microfósseis mari- decorrentes da erosão. Os arenitos conglomerá-
nhos, como quitinozoários, acritarcas e algas ticos brancos a creme e maciços apresentam es-
Tasmanites, que documentavam a presença da tratificação cruzada acanalada ou festonada. Os
época Landoveriano. clastos são mal selecionados, imbricados e, por ve-
Quadros (1982) atribuiu aos quitinozoários e zes, sem matriz (Figura 6.1). Os arenitos de grânu-
acritarcas uma distribuição bioestratigráfica no los mais grossos, com geometria de depósitos resi-
intervalo basal do Devoniano Inferior – Gediniano duais de canal, cortam abruptamente arenitos com
(= Lokoviano). granulometria fina, indicativa de fácies de barra de
As datações do Siluriano foram restabelecidas canal (Figura 6.2). As medidas de paleocorrente in-
por Caputo & Lima (1984), que realizaram
estudos palinológicos na Formação Tian-
guá. Apresentando uma detalhada lista
de microfósseis – quitinozoários, acritar-
cas e miósporos, comparáveis àqueles de
bacias silurianas da África, Europa e
América do Norte.
Por relações estratigráficas, colocam a
unidade de base, Formação Ipu, afossilífera,
no topo do Ordoviciano e início do Siluriano.
É correlacionada pelos diamictitos que
ocorrem na borda oeste com os tilitos do
topo da Formação Nhamundá, da Bacia do
Amazonas. É sobreposta, concordante-
mente, pela Formação Tianguá.
A Formação Jaicós, do topo, concordan-
te com a Formação Tianguá, jaz discordan-
temente sob a Formação Itaim. Grahn
(1992) identificou microfósseis na Forma-
ção Jaicós que indicam uma sedimentação
do Siluriano e Devoniano (Lockoviano e
Emsiano).
Em revisão interna da PETROBRAS, Melo
et al. (1992, apud Góes & Feijó, 1994) res-
tringem o Grupo Serra Grande ao Siluriano,
atribuindo às épocas Landoveriano, Ven- Figura 6.1 – Formação Ipu. Estratificação cruzada acanalada.
lockiano, Ludloviano e Pridoliano. Sítio Perna 1. Parque Nacional da Serra da Capivara, Piauí.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

dicam direções para norte e para oeste. A exposi- dão direção noroeste e norte/noroeste. Os depósi-
ção das estruturas sedimentares nos paredões do- tos residuais de canal apresentam níveis de seixos
cumentam vários ciclos de alta energia, em um sis- na base. Correspondem a sistemas de leques alu-
tema de leques aluviais. viais.
Em afloramentos entre São Raimundo Nonato e
São João do Piauí, ocorrem, na base da Formação 6.5 Fósseis
Ipu, diamictitos com matriz rosa e seixos pequenos
de xisto, quartzo e granito, com paleocorrentes ori- Os microfósseis foram identificados por Müller
entadas para norte. Os depósitos sedimentares (1962). A descrição sistemática e as ilustrações fo-
para esta associação foram interpretados como le- ram apresentadas por Brito & Santos (1965), Brito
ques glaciais (Caputo & Lima, 1984). (1966, 1967b, 1969, 1971) e Daemon (1976).
A erosão diferencial nestes ciclos deposicionais Os fósseis foram atribuídos ao Devoniano Inferior-
propiciou um abrigo natural para os antigos ho- Gediniano, considerando a ausência de graptólitos
mens que habitaram a região. Os arenitos mais (Quadros,1982). É o único trabalho que apresenta
grossos, de maior energia, provenientes de depó- descrição sistemática e ilustra as formas de micro-
sitos residuais de canal, foram mais resistentes fósseis (Figura 6.7):
aos agentes de erosão e mantiveram a forma origi- Tendo em vista possíveis revisões, reproduzi-
nal, projetados como chão e teto do abrigo (Figura mos nas legendas das figuras do Siluriano (Figura
6.3). Os sedimentos resultantes de deposição em 6.7) e do Devoniano (Figura 7.5), as citações origi-
menor energia e, portanto, de granulometria mais nais do autor.
fina, sofreram desgaste mais acentuado, e atual- Caputo & Lima (1984) reafirmaram a datação do
mente são as reentrâncias naturais (Figura 6.4). Siluriano, assinalando maior número de espécies
Funcionaram como paredes dos abrigos, entre os de quitinozóarios e acritarcas, correlacionando es-
baixões, oferecendo um grande painel para as be- tes sedimentos aos da Formação Pitinga, da Bacia
las pinturas rupestres que narram a presença de do Amazonas. Registraram, na Formação Tianguá,
sucessivos povoamentos dos antigos habitantes a presença do graptólito Monograptus, que refor-
da região. çava a datação como Siluriano, estudado por Cruz
A parte média do Grupo Serra Grande corres- & Sommer (1985).
ponde à Formação Tianguá, composta de folhe- Grahn (1992) ampliou o conhecimento sobre os
lhos, siltitos e arenitos finos. Os afloramentos locali- microfósseis do Grupo Serra Grande. Reafirmou a
zados na serra de Ibiapaba, a nordeste da bacia, idade siluriana da Formação Tianguá, identificando
estão alçados acima de 100 metros da base da se- o graptólito Climacograptus cf. scalaris. Na parte su-
dimentação. perior da Formação Ipu, cita a ocorrência de Spina-
Dentro do Parque Nacional de Ubajara, municí- chitina erichseni, identificada como espécie comum
pio de Tianguá, ocorrem os arenitos em bancos ho- com as fácies laterais da Formação Tianguá.
rizontais e estratificação cruzada espinha-de-peixe
(Figura 6.5). São interpretados como deposição em 6.6 Deriva/Clima/Bioeventos/Antigos
ambiente marinho raso, sob ação de ondas. Os are- Ecossistemas
nitos capeiam e preservam os calcários epimeta-
mórficos do embasamento (Figura 6.6), que mos- As seqüências sedimentares do Grupo Serra
tram, nas encostas, morfologia de dolinas. As ca- Grande são correlacionadas com unidades estrati-
vernas que pertencem ao Parque Nacional de Uba- gráficas sincrônicas das que ocorrem na África e
jara se formaram por dissolução dos calcários. América do Sul. São evidências que comprovam a
A Formação Jaicós apresenta arenitos e conglo- união pretérita no supercontinente Gondwana e as
merados que formam a Serra Grande situada a les- mudanças sofridas neste arranjo ao longo da deriva.
te da Bacia. Apresentam grandes exposições, em Os sedimentos da unidade basal, Formação Ipu,
afloramentos próximos à cidade de Jaicós. Os are- são considerados por Caputo & Crowell (1985)
nitos são de cor cinza esbranquiçada, com granu- como depósitos glaciogênicos retrabalhados por
lometria de médios, grossos, muito grossos e grâ- curso de transbordamento periglacial. Os seixos e
nulos, com matriz arenosa e arenitos conglomeráti- cascalhos seriam transportados por fluxos de alta
cos com matriz suportada por seixos de até 3cm. energia, quando blocos erráticos se deslocavam
As estratificações cruzadas são tabulares, acana- de frentes de geleiras para uma planície de inunda-
ladas e festonadas. As medidas de paleocorrente ção.

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Siluriano

Figura 6.2 – Formação Ipu. Geometria de depósitos residuais de canal, cortando depósitos de barra de canal.
Sítio Perna 2. Parque Nacional da Serra da Capivara, Piauí.

Figura 6.3 – Formação Ipu. Depósitos residuais de canal, Figura 6.4 – Formação Ipu. Desenho
resistentes à erosão, e depósitos de barra de canal, esquemático da Toca do Paraguaio.
formando as reentrâncias. Sítio da Toca do Paraguaio. Parque Nacional da Serra da
Parque Nacional da Serra da Capivara, Piauí. Capivara, Piauí.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figua 6.5 – Formação Tianguá. Bancos horizontais com estratificações cruzadas


tipo “espinha-de-peixe”. Parque Nacional de Ubajara, Ceará.

Figura 6.6 – Formação Tianguá - Arenitos com acamamento horizontal capeando


calcários epimetamórficos do embasamento, com dolinas. Serra de Ubajara,
Parque Nacional de Ubajara, Ceará.

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Siluriano

QUITINOZOÁRIOS ACRITARCAS
1 - Ancyrochitina ancyrea Eisenack, 1955 5 - Baltisphaeridium sp.
2 - Conochitina dolosa Lanfeld, 1967 6 - Dactylofusa maranhensis Brito & Santos, 1965
3 - Cyathochitina sp. 7 - Leiofusa bersnega Cramer, 1964
4 - Desmochitina sp. 8 - Leiofusa striatifera Cramer, 1964
9 - Micrhystridium stellatum Deflandre, 1942
10 - Veryhachium carminae Cramer, 1964
11 - Veryhachium trispinosum (Eisenack) Cramer, 1964

Figura 6.7 – Microfósseis da Formação Tianguá (segundo Quadros, 1982).

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

As correlações da Formação Ipu com a Forma- deriam pertencer à meiofauna, isto é à fauna mari-
ção Nhamundá da Bacia do Amazonas foram es- nha intersticial, que vive nos espaços dos grãos de
tendidas por Caputo & Lima (1984) para as forma- areia, e assim estariam na cadeia alimentar bentô-
ções de mesma idade e com litologia de caracterís- nica (Cruz, 1994).
ticas glaciais que ocorrem na África. São perten- As ocorrências destes microfósseis são eventos
centes ao Grupo Tichit da Bacia de Taoudeni; as biológicos importantes, amplamente utilizados em
formações Asemkaw e Ajua da Bacia de Accra, Bioestratigrafia, permitindo seguras correlações
Gana e a Série N’Khom do Gabão. entre bacias. São bioeventos regionais, como de-
Segundo Caputo & Lima (1984) e Caputo & monstrado pelas correlações bioestratigráficas en-
Crowell (1985) o centro de glaciação estava tre poços da Bacia do Parnaíba (Quadros, 1982), e
localizado no norte da África, no sul do Saara, na na correlação entre esta e as bacias do Amazonas
direção do golfo da Guiné. No Siluriano Inferior, os e Paraná (Grahn, 1992).
centros de glaciação migraram no supercontinente Boucot (1974 e 1990a) diferenciou, no Siluriano,
de Gondwana, do norte para o sul da África, e para as comunidades bentônicas de províncias biogeo-
sudoeste da América do Sul. Este afastamento dos gráficas do hemisfério norte e do hemisfério
centros glaciais provocou degelo e elevação sul-Malvinocráfica. As faunas bentônicas da Pro-
eustática do nível do mar. víncia Malvinocráfica são de águas frias com baixa
A Formação Tianguá corresponde à primeira diversidade. Ocorrem no Peru, Bolívia, Argentina,
transgressão marinha na Bacia do Parnaíba, com África do Sul e Bacia do Amazonas.
entrada do mar pelo oeste. As correlações no Brasil Na Bacia do Parnaíba situada na faixa da Provín-
são com a Formação Pitinga da Bacia do Amazo- cia Malvinocráfica, entretanto, o ecossistema mari-
nas e Formação Vila Maria da Bacia do Paraná. Na nho do Siluriano era empobrecido, com microorga-
África do Norte é correlacionada com a Formação nismos planctônicos, e raros graptólitos, sem regis-
Imirhou, que são os folhelhos graptolíticos do Saara tros de faunas bentônicas.
argelino, e ao arenito Elmina da Bacia de Accra, Os processos biológicos foram controlados pelos
Gana. Na África do Sul é correlacionada com a For- fatores alocíclicos como a elevação do nível do mar
mação Pakhuis e os folhelhos Cedarberg, do Grupo que propiciou o aparecimento de vida planctônica.
Table Mountain (Caputo & Lima, 1984). Outros processos geológicos como as glaciações e
Os fósseis marinhos registrados são de hábito ne- as mudanças climáticas decorrentes das posições
rítico. Predominam os acritarcas e quitinozoários. dos continentes em deriva, devem ter influído nos
Daemon (1976) registrou algas marinhas e espo- biótopos. A sedimentação fluvial de alta energia foi
ros. Caputo & Lima (1984) e Grahn (1992) identifi- um reflexo de mudanças climáticas e degelos du-
caram os hemicordados, graptólitos. rante as migrações de centros de glaciação, pela
As afinidades biológicas dos acritarcas e quiti- África e América do Sul.
nozoários são ainda motivo de indagações e pes- Na borda leste, o basculhamento de blocos, ao
quisas. Os acritarcas estão entre os mais antigos longo dos antigos lineamentos do embasamento,
eucariotas registrados em sedimentos marinhos ra- propiciou uma rede de captação da drenagem flu-
sos. São considerados como prováveis algas vial para o interior da bacia. A granulometria gros-
planctônicas que se expandiram nos mares paleo- seira dos sedimentos poderia refletir erosão por fal-
zóicos. Os quitinozóarios classicamente colocados ta de cobertura vegetal no solo, quando as floras
entre os protozoários, têm hoje a sua origem mono- vasculares ainda não estavam desenvolvidas. As
filética contestada, podendo ser representantes de descargas de sedimentos grossos prejudicariam o
várias classes de metazoários, e não necessaria- estabelecimento de cadeias de vida bentônica (Fi-
mente formas planctônicas. Como metazoários po- gura 6.8).

– 46 –
Siluriano

Figura 6.8 – Reconstituição do ambiente marinho e relações com os sistemas fluviais do Grupo Serra Grande.

– 47 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

7
DEVONIANO
A s mais extensas transgressões marinhas do
Fanerozóico da América do Sul estão registradas
pelíticas, inferior e superior (Della Piazza & Santos,
1967).
no Devoniano. Estruturas sedimentares presentes A estratigrafia do Devoniano da Bacia do Parnaíba foi
em pelitos e psamitos, depositados em mares bati- revista por Kegel (1953) que dividiu a Formação Pimen-
dos por tempestades, juntamente com os fósseis teira nos membros Itaim (inferior) e Picos (superior), e
marinhos da fauna evolutiva paleozóica (Sepkoski, manteve as unidades superiores Cabeças e Longá. Na
1990) são os indicativos dessas transgressões na síntese de mapeamentos realizados pela PETROBRAS,
Bacia do Parnaíba. Mesner & Wooldridge (1964) conservaram a seqüência
litoestratigráfica proposta por Kegel.
7.1 Histórico A coluna estratigráfica, com pequenas varia-
ções, foi conservada em trabalhos posteriores. Ca-
Small (1914) denominou os sedimentos Pimentei- rozzi et al. (1975) interpretaram os ambientes de se-
ra, pela identificação de folhelhos e siltitos cinza e dimentação, e Della Fávera (1990) apresentou a
arroxeados que afloravam próximo à vila de Pimen- Estratigrafia de Seqüências.
teiras, Piauí. Plummer et al. (1948) empregaram a
denominação de Small, porém consideraram que 7.2 Área de Ocorrência
as camadas eram subjacentes às unidades Serra
Grande. As unidades litoestratigráficas do Devoniano
A Formação Cabeças foi definida originalmente afloram nas regiões leste e oeste, com os estratos
por Plummer et al. (1948) para arenitos que afloram orientados norte-sul, infletidos para sudeste e su-
na borda leste da bacia. Foi dividida em três mem- doeste, acompanhando o atual contorno da bacia
bros – Passagem, Oeiras e Ipiranga, com a se- do Parnaíba. Na região sul são recobertos por sedi-
ção-tipo situada na cidade de Dom Expedito Lopes mentos da Bacia Sanfranciscana, e a norte por se-
(antiga Cabeças), Piauí. dimentos mesozóicos e cenozóicos.
A Formação Longá foi proposta por Albuquer- As áreas de maiores espessuras em superfície e
que & Dequech (1946), para folhelhos cinza-escu- subsuperfície estão situadas nos flancos nordeste,
ros, que ocorrem no vale do rio Longá, próximo a leste e sudeste da bacia. Nessas regiões, os areni-
Campo Maior, Piauí. Posteriormente foi dividida tos aflorantes formam elevações moderadas, em
em três subunidades: uma arenosa, média e duas continuidade aos contrafortes internos das serras

– 48 –
Devoniano

que delimitam a bacia. No Devoniano, pelo mapa O ciclo transgressivo/regressivo de idades eifelia-
de isópacas, as regiões leste/nordeste formavam o na e eogivetiana é o principal portador de ocorrên-
depocentro da bacia (Aguiar, 1971). O controle foi cias fossilíferas. Compreende a Formação Itaim, a
do sistema de blocos associados ao Lineamento parte basal e média da Formação Pimenteira e a
Sobral-Pedro II, de direção nordeste (Fortes, 1978). parte basal da Formação Cabeças. Nos intervalos
As principais ocorrências de fósseis são registra- regressivos do Neogivetiano e Eofameniano, não
das nos afloramentos da borda leste. estão registrados elementos para datação.
As maiores espessuras são na Formação Itaim, de No topo das formações Pimenteira e Cabeças
260 metros; na Formação Pimenteira, de 320 metros; ocorre nova transgressão no Neofrasniano-Eofa-
na Formação Cabeças, de 350 metros; e na Forma- meniano.
ção Longá, de 220 metros (Góes & Feijó, 1994). Nesta idade, a superfície de inundação máxima
na Formação Pimenteira apresenta alto teor de car-
7.3 Geocronologia e Idade bono orgânico, indicado na perfilagem de raios-
gama, pelos conspícuos picos radioativos.
A primeira atribuição de idade devoniana na Bacia No Neofameniano, a seqüência transgressiva da
do Parnaíba feita por Plummer et al. (1948), utilizando Formação Longá apresenta a superfície de trans-
invertebrados marinhos, foi corroborada por Kegel gressão máxima no topo da metade inferior, a partir
(1953). O detalhamento em tabelas cronoestratigráfi- daí é regressiva em direção ao topo.
cas foi realizado com as pesquisas em subsuperfície
da PETROBRAS, iniciadas por Müller (1962). 7.4.1 Eoeifeliano - Formação Itaim
Tabelas de intervalos bioestratigráficos e cronoes-
tratigráficos baseadas nas associações palinológi- Os depósitos da Formação Itaim foram acumu-
cas e nos microfósseis marinhos, foram publicadas lados pelo efeito do aumento da lâmina d’água
por Brito (1965, 1966, 1967a, b, 1968, 1969, 1971, quando foi estabelecida uma plataforma marinha
1976); Brito & Santos (1965); Daemon (1974 e 1976); proximal, batida por tempestades. São o limite in-
Carozzi et al. (1975); Quadros (1982); Brito & Qua- ferior do sistema deposicional transgressivo na
dros (1984 e 1985); Grahn (1992) e Loboziak et al. plataforma.
(1992). A seqüência transgressiva é discordante em rela-
A coluna estratigráfica de Grahn (1992) baseada ção a unidade inferior, compreendida pelas fácies
em quitinozoários, que constitui uma atualização fluviais anastomosadas da Formação Jaicós. Inicia-
dos conhecimentos anteriores, modificada por Melo da no Eoeifeliano é composta por camadas de are-
et al., 1992 (apud Góes & Feijó, 1994) foi adotada no nitos que ocorrem com pequena espessura em su-
presente trabalho. À Formação Itaim (definição de perfície, no flanco leste da bacia. Correspondem li-
Kegel, 1953) é atribuída a idade eifeliana. A base da toestratigraficamente à Formação Itaim. Em aflora-
Formação Pimenteira é colocada no topo do Eifelia- mentos próximos à cidade de Itainópolis, Piauí
no, e a base (Membro Passagem) da Formação Ca- (Figura 7.1) são arenitos sílticos finos a médios, re-
beças no Givetiano. O topo da Formação Pimenteira lativamente bem classificados, argilosos, amare-
atinge a parte superior do Frasniano e o restante da los a vermelhos, micáceos, apresentando estrutu-
Formação Cabeças desenvolve-se através do Fras- ras de lobos sigmoidais. São recobertos por areni-
niano atingindo a base do Fameniano. A datação da tos com estratificações cruzadas do tipo hum-
Formação Longá, por microfósseis marinhos, é res- mockys, da parte basal da Formação Pimenteira
trita ao Neofameniano. De acordo com os mióspo- (Fonseca & Melo, 1987; Della Fávera, 1990).
ros, as indicações para o topo da Formação Longá
são do limite Devoniano/Carbonífero (Daemon, 1974 7.4.2 Neoeifeliano - Formação Pimenteira
e Loboziak et al., 1992). Góes & Feijó (1994) assina-
lam seu topo no Eotournasiano. As atuais conceituações da Formação Pimentei-
ra alteraram as definições originais de Kegel
7.4 Sedimentação (1953). O Membro Itaim passou a Formação Itaim, e
o pacote litológico e fossilífero, anteriormente de-
Para a síntese das relações dos eventos geológi- signado como Membro Picos, assumiu a designa-
cos e biológicos, foram adotadas as seqüências ção de Formação Pimenteira.
deposicionais do Devoniano estabelecidas por A camada basal da Formação Pimenteira, deno-
Della Fávera (1990). minada por Kegel (1953) de banco branco, é for-

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 7.1 – Formação Itaim na base, com arenitos com lobos sigmoidais. Formação Pimenteira basal no topo,
com arenitos com estratificações cruzadas em hummockys, corte em catenária.
Localidade: Rio Itaim, próximo à cidade de Itainópolis, Piauí.

mada por folhelhos e folhelhos sílticos cinza-es- calam folhelhos com laminações em ondas (wavy)
branquiçados ou verde-claro. e lenticular (linsen). As formas geométricas dos
É registrada no flanco leste, entre as cidades de arenitos são bem separadas por pelitos (Figura
Piripiri, ao norte, e São João do Piauí, ao sul. Apre- 7.2).
senta indícios de sedimentação carbonática e oolí- São interpretados como plataformas terrígenas,
tica nas suas exposições (Oliveira & Barros, 1976). com barras costa afora (offshore bars) dominadas
Nos afloramentos de Itainópolis, no contato ba- por tempestades. Representam eventos episódi-
sal com os arenitos Itaim, os folhelhos e arenitos da cos rápidos, com tempestades de grande intensi-
Formação Pimenteira apresentam estratificações dade, que quando cessam formam depósitos de
cruzadas de tipo hummockys, com corte em cate- menor energia sob ação de ondas, tais como os fo-
nária (Figura 7.1). Correspondem as fácies tempes- lhelhos com as laminações wavy e linsen. São indi-
títicas situadas abaixo da ação da base de onda e cativos de lâmina d’água elevada, possivelmente a
indicam uma contínua elevação do nível do mar, na parte extrema da transgressão.
seqüência transgressiva. São plataformas terríge- Nos morros do Ipueiro e do Colégio, em Picos, os
nas, com barras costa afora (offshore bars) domi- depósitos tempestíticos estão associados com evi-
nadas por tempestades. dências biológicas de proximidade de costa, como
as concreções contendo restos de vegetais terres-
7.4.3 Eogivetiano - Formação Pimenteira tres (Krausel & Dolianiti, 1957).
Os depósitos tempestíticos com as camadas de
O primeiro intervalo regressivo de idade eogive- estratificação cruzada tipo hummockys são marca-
tiano é correspondente à parte média da Formação dos por níveis de hardground, com icnofósseis per-
Pimenteira. Em afloramento que ocorre na entrada furantes (Kegel, 1966). Significam parada da sedi-
da cidade de Picos, os corpos de arenitos amalga- mentação após a tempestade. Entre os tratos de
mados, em laminações gradadas, com grandes sistemas de nível de mar alto são os que indicam o
ondas, truncadas em catenária (hummockys) inter- início do intervalo regressivo.

– 50 –
Devoniano

Figura 7.2 – Formação Pimenteira, parte média. Arenitos com laminações com grande comprimento de onda, com estratificações cruzadas truncadas
(hummockys) e em catenária. Intercalam os folhelhos com estruturas wavy e linsen. As formas geométricas dos arenitos são bem separadas pelos
pelitos. Localidade: Entrada da cidade de Picos, Piauí.

– 51 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

7.4.4 Eogivetiano - Formação Cabeças ças (Caputo, 1984). Em Gaturano, os diamictitos


ocorrem sobrepostos às sigmóides da Formação
Na região de Picos ocorrem também arenitos Cabeças.
médios a grossos que apresentam estruturas de lo- Andrade & Daemon (1974), Daemon (1976) e
bos sigmoidais de topo plano (Figura 7.3) e lobos Quadros (1982) dataram os diamictitos do topo da
sigmoidais com arenitos proximais e folhelhos dis- Formação Cabeças no Fameniano, os quais são da
tais, com laminações em ondas e lenticulares. São mesma idade dos diamictitos encontrados nas ba-
mudanças laterais de fácies e caracterizam o deno- cias do Solimões e Amazonas.
minado Membro Passagem da Formação Cabe- Esta seqüência foi seguida por uma regressão
ças. São indicadores de lobos sigmoidais de maré no Mesofameniano.
na porção proximal passando a depósitos tempes-
títicos até lamitos nas regiões distais.
No Parque Nacional de Sete Cidades, no Piauí, a 7.4.6 Neofameniano - Formação Longá
nordeste da bacia, os arenitos da Formação Cabe-
ças apresentam modelados semelhantes às deno- Camadas de folhelhos bem laminados e siltitos
minadas sand waves (Walker, 1984). Estas unida- bioturbados, que caracterizam a Formação Longá,
des fisiográficas atualmente são encontradas nos sobrepõem-se em contato superior com os arenitos
arenitos de áreas rasas das plataformas continen- da Formação Cabeças, acentuando uma abrupta
tais. mudança litológica. Na parte basal, os icnofósseis
abundantes e uma fauna de invertebrados estão as-
sociados a folhelhos e siltitos. Representam o início
7.4.5 Neofrasniano/Eofameniano - de uma seqüência transgressiva, datada no Neofa-
Formações Pimenteira e Cabeças meniano (Figura 7.4).
A parte média da formação é marcada por areni-
Uma nova transgressão está assinalada nos inter- tos amarelados a esbranquiçados, argiláceos com
valos entre as idades compreendidas pelos Neo- estratificações cruzadas e delgados leitos de cal-
fransniano e Eofameniano. Corresponde às sedi- cários argilosos. O contato superior, com a Forma-
mentações de siltitos e arenitos das camadas exis- ção Poti, é, em geral, concordante e gradacional,
tentes nas metades superiores das formações Pi- embora possa ser localmente brusco (Della Fávera,
menteira e Cabeças. 1990).
Na Formação Pimenteira ocorrem folhelhos pre- Os depósitos da Formação Longá são interpreta-
tos, radioativos, com alto teor de carbono orgânico. dos como o registro de um mar epicontinental, com
Estão indicados pelos conspícuos picos na perfila- ambiente deposicional variando de infranerítico nas
gem de raios gama. Della Fávera (1990) os identifi- unidades basais e superiores, a litorâneo nas se-
cou como uma superfície de inundação máxima. ções médias. Os sedimentos com a predominância
Icnofósseis e algas Protosalvinia são citadas por de clásticos finos da unidade inferior refletem um rá-
Grahn (1992). pido afogamento do sistema marinho raso da For-
Na borda oeste da bacia, na parte superior da mação Cabeças, pela elevação do nível do mar, no
Formação Cabeças, ocorrem arenitos cinza a bran- final de uma glaciação. Os folhelhos laminados com
cos com estratificação cruzada, conglomeráticos, estratificação cruzada hummockys indicam uma se-
com seixos intercalados. Estruturas de escorrega- dimentação mais profunda, com tempestades.
mento sinsedimentares são comuns e localmente
os arenitos são cortados por canais rasos e amplos. 7.5 Fósseis
Classificados como diamictitos, são interpretados
como uma progradação e integração rápida de le- 7.5.1 Microfósseis
ques aluviais, leques deltaicos e frentes deltaicas,
com lobos glaciais no topo. Constituem o registro Após o trabalho em palinologia de Müller (1962),
de um evento glacial ocorrido ao norte da América que elaborou a primeira tabela cronoestratigráfica,
do Sul (Caputo, 1984, 1985; Caputo & Lima, 1984; para o Devoniano da Bacia do Parnaíba, Daemon
Caputo & Crowell, 1985). (1974) divulgou a síntese com a correlação entre os
Na borda leste, no estado do Piauí, próximo a palinomorfos, estabelecendo intervalos bioestrati-
Canto de Buriti, os diamictitos ocorrem junto com gráficos do Devoniano nas bacias do Amazonas e
superfícies estriadas no topo da Formação Cabe- Parnaíba.

– 52 –
Devoniano

Figura 7.3 – Formação Cabeças. Arenitos com lobos sigmoidais de topo plano. Localidade: Estrada Floriano-Oeiras.
BR-230 - 8km a oeste de Oeiras, Piauí.

– 53 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 7.4 – Formação Longá. Arenitos muito finos, cinza-escuros e siltitos intercalados. Localidade: Estrada
Teresina-Picos. Rodovia BR-316, km 168,5, região de Valença do Piauí (segundo Carvalho, 1995).

Os microfósseis marinhos, acritarcas e quitino- pode significar variação climática ou elevação do


zoários foram estudados com descrição sistemáti- nível do mar. O conjunto de microfósseis indica am-
ca e por possuírem uma nítida diferenciação morfo- biente marinho raso e proximidade da costa.
lógica são excelentes índices (Brito, 1965, 1966, Quadros (1982) descreveu e figurou as associa-
1967a, b, 1968, 1969, 1971, 1976; Brito & Quadros, ções na cenozona Ramochitina ramosi (Figura
1984 e 1985; Brito & Santos, 1965 e Quadros, 7.5).
1982). As associações palinológicas e de microfós- Grahn (1992) atribuiu a parte média da Forma-
seis marinhos estão contidas em trabalhos de natu- ção Pimenteira, ao Eogivetiano, com represen-
reza estratigráfica, publicados por Daemon (1974 e tantes dos quitinozoários Ancyrochitina langei e
1976), Carozzi et al. (1975), Grahn (1992) e Loboziak Gotlandochitina milanensis. O Membro Passa-
et al. (1992). gem da Formação Cabeças foi datado no Eogive-
No Meso e Neodevoniano as formas de quitino- tiano. Observa este autor que, no Neofrasniano, a
zoários e acritarcas se diversificam, em evolução transgressão inicial do Neodevoniano em outras
rápida. Seu declínio e extinção global no topo do bacias do mundo, originou um empobrecimento
Devoniano é um bioevento mundial. No final do De- da fauna e uniformização das bacias até o Neofa-
voniano, associações de esporomorfos ocorrem, meniano. Porém, nas bacias do Parnaíba e Jato-
sobretudo nas subturmas Pseudosaccitriletes e Zo- bá, a fauna de quitinozoários é composta por
notriletes. mais de 30 espécies, em contraste com poucas
De acordo com Grahn (1992), nos sedimentos da espécies de outras bacias. A fauna é endêmica e
Formação Itaim (definição de Kegel, 1953), os micro- um gênero, Sommerochitina (Cruz & Quadros
fósseis marinhos apontam a idade mesoeifeliana, ci- 1985), aparece pela primeira vez no Fameniano,
tando como exemplo o quitinozoário Ramochitina ra- possivelmente em conexão com a glaciação do fi-
mosi. A Formação Itaim é correlacionada com o Mem- nal do Devoniano.
bro Lontra da Formação Maecuru. A base da Forma- A Formação Longá, que de acordo com Daemon
ção Pimenteira é colocada no Neoeifeliano. Os (1976) contém esporos indicativos do limite Devo-
quitinozoários apresentam maior percentagem de niano/Carbonífero, foi posicionada por Grahn
espécies cosmopolitas que no Eodevoniano. (1992) e Loboziak et al. (1992) no Neofameniano.
Segundo Daemon (1976), o Eifeliano é uma ida- Góes & Feijó estendem sua ocorrência para o Eo-
de marcada por uma rápida mudança da flora, que tournasiano.

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Devoniano

QUITINOZOÁRIOS ACRITARCAS
1 - Ancyrochitina ancyrea Eisenack, 1955 10 - Veryhachium rabiosum Cramer, 1964
2 - Alpenachitina eisenacki Dunnn & Miller, 1964 11 - Micrhystridium stellatum Deflandre, 1945
3 - Ancyrochitina langei Sommer & van Boeckel, 1964 12 - Veryhachium trispinosum (Eisenack) Cramer, 1964
4 - Cladochitina biconstricta Lange, 1967 13 - Baltisphaeridium sp.
5 - Angochitina implicationis Urban, 1972 14 - Triangulina alargada Cramer, 1964
6 - Angochitina cf. A. capillata Eisenack, 1937 15 - Poliyedryxium decorum Deunff, 1955
7 - Ramochitina ramosi Sommer & van Boekel, 1964 16 - Navifusa brasiliensis Brito & Santos, 1965
8 - Ancyrochitina cf. A. desmea Eisenack, 1964 17 - Navifusa cylindrica Brito & Santos, 1965
9 - Angochitina mourai Lange, 1952 18 - Estiastra sp.
19 - Duvernaysphaera tessella Deunff, 1964
20 - Baltisphaeridium dilatispinosum Downie, 1963
21 - Evittia sommeri Brito, 1967
22 - Maranhites brasiliensis Brito, 1965

Figura 7.5 – Microfósseis da cenozona Ramochitina ramosi, do Eifeliano (segundo Quadros, 1982).

– 55 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

7.5.2 Macrofósseis sp. e “Cranaena” sp. e os trilobitas Metacryphaeus


e Burmeisteria (Kegel, 1953; Melo, 1985; Fernan-
7.5.2.1 Eoeifeliano - Formação Itaim des, 1985; Carvalho, 1995).
Na borda oeste, Melo (1985) identificou um aflora-
Os restos de invertebrados bentônicos mais anti- mento situado três metros acima do embasamento,
gos estão registrados nos afloramentos da Forma- em Lajedo e fazenda Pé de Buriti, noroeste de Gua-
ção Itaim, situados na borda leste da bacia. São da- raí, Tocantins, como pertencente à parte basal da
tados no Mesoeifeliano, e a sedimentação é de pla- Formação Pimenteira. Os fósseis são o celenterado
taforma marinha proximal. Conularia; os braquiópodos: Orbiculoidea, “Spiri-
A esparsa fauna marinha é composta por Buca- fer”, “Australocoelia” e o vegetal Spongiophyton
nella (?), Nuculites entre outros moluscos; os bra- (Andrade Ramos & Barbosa, 1967; Barbosa et al.,
quiópodos Orbiculoidea (Figura 7.6) e “Craniops”; 1966; Melo, 1985).
os icnofósseis Zoophycos (=Spirophyton) e rastros
atribuídos a trilobitas homanolotídeos. Indicando a 7.5.2.3 Eogivetiano - Formação Pimenteira
proximidade da linha de costa são citados restos
de pequenos vegetais Psilofitales (Kegel, 1953; A parte média da Formação Pimenteira, de ida-
Melo, 1988). de Eogivetiana, de composição arenosa, ocorre em
superfície, na borda leste, nos arredores de Picos,
7.5.2.2 Neoeifeliano - Formação Pimenteira no limite com o Membro Passagem.
A fauna (Figura 7.7) contém o trilobita Burmeiste-
As assembléias fossilíferas que ocorrem nos fo- ria notica, os biválvios Nuculites africanus, Nuculites
lhelhos das camadas basais da Formação Pimen- sp. e Paleoneilo sp., os conularídeos Ctenoconularia
teira, na borda leste da bacia são compostas por tri- undulata e Mesoconularia africana, os braquiópo-
lobitas, ostracodes, braquiópodos, biválvios, gas- dos Chonetes freitasi, Lingula, Orbiculoidea, os gas-
trópodos, conulariídeos, tentaculídeos, hiolitídeos, trópodos Plectonotus derbyi e Hyolithes, o incertae
escolecodontes, peixes e restos vegetais, datados sedis Tentaculites; o icnofóssil Cruziana e o peixe
no Neoeifeliano (Fonseca & Melo, 1987; Carvalho, (?)Machaeracanthus (Kegel, 1953 e 1966; Santos,
1995). 1961; Brito & Santos, 1965; Castro, 1968; Brito,
Uma associação fóssil apresenta braquiópodos 1971; Melo, 1985; Campos, 1985; Lima Filho & Cal-
inarticulados Orbiculoidea; terebratulídeos Crana- das, 1987).
ena sp., “Paranaia” sp. e Derbyina smithi. A ocor- Os vegetais são Protolepidodendron kegeli,
rência de Tropidoleptus carinatus no Mesodevonia- Archaeosigillaria picosensis, Palaeostigma sewar-
no da Bacia do Parnaíba caracteriza a expansão di, Spongiophyton e um ramo de Archaeosigillaria
mundial da espécie a partir do Eodevoniano da re- (Krausel & Dolianiti, 1957).
gião renano-boêmia (Fonseca & Melo, 1987). As re- Os fósseis procedem dos arredores da cidade
lações com a Província Malvinocráfica foram esta- de Picos. As camadas revestidas por alteração su-
belecidas por Melo (1985) que comparou os exem- perficial de ferro formam hardground, com os icno-
plares da Bacia do Parnaíba com material tipo da fósseis Neoskolithos picosensis (Kegel, 1966). O
Chapada dos Guimarães, depositado no Museu material que ficou exposto aos fenômenos de oxi-
Nacional. dação no piso marinho formou nódulos hematíticos
Os trilobitas são o homalonotídeo Burmeisteria e o em torno de fragmentos do trilobita Burmeisteria.
calmonídeo Metacryphaeus kegeli, este último de
família da Província Malvinocáfrica (Carvalho, 1995; 7.5.2.4 Eogivetiano - Formação Cabeças
Carvalho et al., 1997). Os moluscos são Nuculites,
Bucanella, e Hyolithes e o incertae sedis Tentaculi- O Membro Passagem da Formação Cabeças,
tes. Os restos de peixes são Ctenacanthus e Ma- com maior percentagem em arenitos, é datado no
chaeracanthus (Santos, 1961). Os icnofósseis, ras- Eogivetiano, e como variação lateral de fácies tem
tos de vermes do grupo Nereites (Kegel, 1966) e Zo- uma composição de fauna diferente da que ocorre
ophycos, além de vegetais atribuídos a Spon- na Formação Pimenteira.
giophyton (Fonseca & Melo, 1987). Os braquiópodos são referidos a Tropidoleptus
Em outra associação fóssil estão representados o carinatus, Pustulatia ou Plicoplasia, Pleurochone-
celenterado Mesoconularia africana; os braquiópo- tes, Mucrospirifer, Rhipidothyridae ou Mutationelli-
dos Orbiculoidea sp., Derbyina smithi, “Paranaia” dae.

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Devoniano

0
Orbiculoidea sp.
Localidade: Estrada Araripina-Picos km 109, Piauí.
1 Coleção DGM.

2cm

Figura 7.6 – Fósseis da Formação Itaim.

1
0 3

2cm 0

2cm

4
0 2 0

2cm 5

10mm

5 0

1 1

2cm

2cm

1 Burmeisteria notica. Localidade: Picos, Piauí. 4 Metacryphaeus kegeli (segundo Carvalho et al., 1997). Localidade:
Coleção: DGM 5005-I. Cerca de 11km ao sul de Pimenteiras, Piauí. Coleção: DGM 6133-I.

2 Burmeisteria notica. Localidade: Picos, Piauí. 5 Plectonotus sp. Localidade: Picos, Piauí.
Coleção: DGM 5007-I. Coleção: DGM 6197-I.

3 Cruziana isp. Localidade: Região de Picos, Piauí. 6 Ctenoconularia cf. C. undulata. Localidade: Região de Picos, Piauí.
Coleção: DGM 6200-I. Coleção: DGM 6196-1.

Figura 7.7 – Fósseis da Formação Pimenteira.

– 57 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Os biválvios são Nuculites aff. N. oblongatus, Nu- sophycus piauiensis, Neonereites uniserialis, Su-
culites cf. N. triqueter, Nuculoidea(?) bellistriata blorenzinia pauciradiata e Palaeophycus isp. (Mu-
parvula, Palaeoneilo sp. A e Palaeoneilo sp. B, niz, 1981 e 1982).
Grammysioidea (?) lundi, Sanguinolites karsteni, Outras citações de icnofósseis são: Crossopodia
Spathella pimentana e Grammysiidae indet. Os estrellada em Elesbão Veloso (Albuquerque &
gastrópodos são Plectonotus derbyi e (?)Platyosto- Dequech, 1946; Kegel, 1957); Asteriacites isp., nas
ma baini e o cefalópodo é referido a Michelinoceras proximidades de Oeiras (Santos & Campanha,
bokkeveldensis. O trilobita Metacryphaeus austra- 1970; Brito, 1977); e Cruziana aff. C. lobosa,
lis (Castro, 1968) foi colocado na nova espécie Me- Asteriacites stelliforme e (?)Crossopodia
tacryphaeus meloi (Carvalho et al., 1997). São cita- estrellada, Conichnus conicus, em Rio Grande do
dos euripterídeos, Tentaculites e os icnofósseis, Piauí e Valença do Piauí (Muniz, 1982). Há citação
Rusophycus isp. e Cruziana isp. (Kegel, 1953 e de Crossocorda maranhensis, no furo 2 VG-1-MA,
1965; Oliveira & Barros, 1976; Lima & Leite, 1978; Vargem Grande, Maranhão (Kegel, 1966; Quadros,
Melo, 1985; Fonseca & Melo, 1987; Fonseca, 1994; 1982).
Carvalho et al.; 1997, Carvalho, 1995).
A fauna do Membro Passagem (figura 7.8) está 7.6 Paleogeografia
depositada na base dos arenitos da seqüência re-
gressiva, que ocorrem na margem leste. É correla- A paleogeografia do Devoniano na América do
cionada com a fauna das formações Maecuru e Sul foi discutida por Barrett & Isaacson (1988) que
Ererê. atualizaram o clássico modelo de Harrington
(1962). Foram relatadas as principais ocorrências
7.5.2.5 Neofrasniano/Eofameniano - ao longo dos Andes, desde a Venezuela, em dire-
Formações Pimenteira e Cabeças ção ao sul, através da Colômbia, Peru, Bolívia , Chi-
le e Argentina. Analisaram também as bacias intra-
A transgressão do Neofrasniano/Eofameniano cratônicas do Brasil, Paraguai e Argentina. Pela ta-
está identificada nos sedimentos da parte superior bela de correlação entre as bacias, foi verificado
das formações Pimenteira e Cabeças. Está marca- que na maior parte das ocorrências de Devoniano,
da por esparsos restos orgânicos com as algas as sedimentações são iniciadas no Emsiano ou Ei-
Protosalvinia e o traço fóssil Spirophyton (Grahn, feliano. São atribuídas a uma transgressão marinha
1992). por elevação do nível do mar que, em caráter mun-
Um indicador de atividade de microorganismos dial, ocorreu no Mesodevoniano. Há uma discor-
são os folhelhos pretos radioativos, conspícuos na dância de caráter continental correspondente ao in-
perfilagem gama (Della Fávera, 1990). tervalo do Devoniano Inferior, que Góes & Feijó
(1994) correlacionam com o reconhecido Ciclo oro-
7.5.2.6 Neofameniano - Formação Longá genético Caledoniano, do final do Siluriano.
Na Bacia do Parnaíba, os condicionamentos re-
Uma fauna de invertebrados, da base da Forma- gionais continuaram controlados pelos lineamen-
ção Longá, de idade Neofameniana, é registrada tos Transbrasiliano Picos-Santa Inês (Cunha,
na Fazenda Barreiras, próximo da cidade de Valen- 1986), com os depocentros localizados na região
ça do Piauí, Piauí (Kegel, 1953; Melo, 1988; Carva- da atual borda leste da bacia.
lho, 1995). Modelos paleogeográficos nos diversos andares
As assembléias consistem de biválvios alonga- do Devoniano na Bacia do Parnaíba foram estabele-
dos, cilíndricos modiomórficos – Solemya (Janeia) cidos por Melo (1988), em correlações das bacias
sp., (?) Modiomorphidae; braquiópodos Lingula, do Paraná, Amazonas e Parnaíba com a América
Orbiculoidea; “Schuchertella” sp.; Chonetes; pe- do Sul e África. Este autor ampliou modelos anterio-
quenos trilobitas Metacryphaeus sp. com afinidade res de Lange & Petri (1967) e Lange (1972). A trans-
malvinocáfrica (Figura 7.9); ostracodes Kloedenia, gressão do Eifeliano conectou as bacias do Ama-
Primitia; possíveis Tentaculites e restos de peixes zonas, Parnaíba e Paraná com a margem oeste da
(Kegel, 1953; Melo, 1985; Carvalho & Melo, 1984; América do Sul, e propiciou a colonização das zo-
Carvalho, 1995). nas bentônicas. A noroeste da Bacia do Parnaíba
Os icnofósseis são abundantes, especialmente houve a conexão com o Cráton Oeste Africano,
em afloramentos próximos à cidade de Campo com deposição de grande espessura de folhelhos
Maior, Piauí. Ocorrem Bifungites cruciformis, Ru- (Carozzi et al., 1975).

– 58 –
Devoniano

1 Gyrophyllites (?) sp. Localidade: Antigo km 5,5 da 5 Nuculites sp. Localidade: Antigo km 5,5 da rodovia Picos-Oeiras,
rodovia Picos-Oeiras, Piauí. Coleção: DGM 6163-I. Piauí. Coleção DGM 6158-I.
2 Família Mucrospiriferidae - valva branquial e 6 Metracryphaeus meloi (segundo Carvalho et al., 1997).
Metacryphaeus-Pigideos. Localidade: Região de Localidade: Oitis, na junção da rodovia Valença do
Picos, Piauí. Coleção: DGM 6194-I. Piauí-Pimenteiras, Piauí. Coleção: MCT 6822-I.
3 Família Chonetidae, Subfamília - Notiochonetinae. 7 Cálice de Crinóide. Localidade: km 36 a noroeste
Localidade: Antigo km 5,5 da rodovia Picos-Oeiras, de Canto do Buriti, próximo à entrada para Floriano, Piauí.
Piauí. Coleção: DGM s/nº. Coleção: DGM.
4 Família Mutationellidae. Localidade: Vertente
oriental da serra Pedro II, Piauí.
Coleção: DGM 6135-I.

Figura 7.8 – Fósseis da Formação Cabeças.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

1 e 2 Metacryphaeus sp.
Localidade: Fazenda Barreiras, Valença do Piauí, Piauí.
Coleção: DGM 5566-I (segundo Carvalho, 1995).

Figura 7.9 – Fósseis da Formação Longá.

7.7 Eventos Biológicos flora, motivadas por mudanças climáticas e eleva-


ção do nível do mar.
Seis eventos biológicos foram reconhecidos no Estes fatores associados com a deriva continen-
Devoniano da Bacia do Parnaíba (Carvalho et al., tal possibilitaram ainda o bioevento global de ex-
1996). As formações das assembléias bentônicas pansão do braquiópodo Tropidoleptus carinatus, a
estiveram relacionadas com mecanismos alocícli- partir de província biogeográfica do hemisfério nor-
cos, isto é, a fenômenos gerados externamente às te (Fonseca & Melo, 1987).
bacias sedimentares. São os fatores correlaciona-
dos com as variações do nível do mar e climáticos 7.8 Tafonomia
que, provocando mudanças no nível de base, influ-
enciaram a dinâmica dos seres vivos em mares epi- Nas séries tafonômicas evolutivas, os elementos
continentais. e associações registrados são abordados como
Os bioeventos estão diferenciados, segundo sistemas tafonômicos ou tafossistemas (Fernán-
Kauffman (1986), em bioeventos locais, que cor- dez-López, 1991). Os componentes que podem
respondem no Eifeliano, ao aparecimento de vida ser observados em diferentes estágios de organi-
bentônica na bacia. Um biovento florístico de natu- zação são inter-relacionados ao ambiente externo,
reza regional é indicado nas correlações entre as interpretados pelas seqüências, sistemas e ambi-
bacias sedimentares do Amazonas, Parnaíba e Pa- entes deposicionais.
raná. Daemon (1976) assinalou um conjunto de mi- A preservação dos elementos fósseis foi na maior
crofósseis representativo de rápidas mudanças da parte causada por episódios de tempestades, que

– 60 –
Devoniano

transportaram as entidades produzidas, de dife- Tipo 2 - comunidade de mutationélida, com bra-


rentes habitats, para regiões mar adentro. Em ge- quiópodos incluindo os gêneros Derbyina e Para-
ral, as conchas e outros fragmentos de partes de naia, o ortídeo Tropidoleptus e o trilobita Burmeiste-
maior durabilidade se acumularam como conglo- ria. São de plataforma interna proximal.
merado basal de tempestitos. Tipo 3 - comunidade de conetáceos, com espiri-
Entretanto, não foram de longa conservabilida- ferídeos, ambocoelídeos (Plicoplasia ou Pustula-
de, pois a maioria das entidades é registrada por tia), terebratulídeos (Rhypidothyris e Mutationella),
moldes internos e externos, sem vestígios das con- e o trilobita calmonídeo Metacryphaeus. São de
chas originais. As valvas de braquiópodos estão plataforma interna distal.
desarticuladas, mas nos moldes estão impressos
detalhes de ornamentação. Indicam que houve so- MESOEIFELIANO - O início da seqüência trans-
terramento rápido após o transporte por fluxos de gressiva do Mesoeifeliano está representado por
correntes (Johnson, 1960). arenitos com lobos sigmoidais de pequena espes-
Representam uma tafocenose com mistura de sura da Formação Itaim.
entidades preservadas transportadas lateralmen- Os fósseis representam o primeiro bioevento de
te, do local da plataforma onde foram produzidas. colonização bentônica na bacia. O registro de fau-
São bioeventos locais de soterramento e preserva- na bentônica e de plantas indica que as condições
ção, em regiões localizadas da bacia sedimentar. ecológicas foram alcançadas, permitindo o estabe-
Os gêneros identificados dão as informações lecimento de metazoários.
paleobiológicas que diferenciam as associações A rápida mudança da flora registrada significaria
bentônicas por regiões da plataforma (Boucot, uma variação climática ou elevação do nível do mar.
1971 e 1975), e demonstram que na maioria dos re- O bioevento local de colonização bentônica e o bio-
gistros houve mistura de elementos procedentes evento florístico de caráter regional, documentado
de litoral e plataforma rasa. por Daemon (1976) são possivelmente associados
A preservação foi por ressedimentação, com com mudanças climáticas, em conseqüência de um
deslocamento ao longo do substrato, antes que os evento geológico global.
elementos preservados fossem enterrados. Os ic- Pela elevação do nível do mar, ocorreu a seqüên-
nofósseis foram preservados por acumulação. São cia transgressiva, com os arenitos com lobos sig-
da produção biogênica, traduzida pelos traços no moidais depositados em plataforma marinha rasa.
substrato. É um processo onde não há transporte. Os escassos fósseis registrados são os biválvios
Os braquiópodos do Membro Passagem da nuculídeos, os gastrópodos belerofontídeos e res-
Formação Cabeças, estão depositados em ban- tos de trilobitas homalonotídeos.
cos de arenitos na base de tempestitos. Constitu- Entre os braquiópodos foi identificado Orbiculoi-
em um bioevento local de soterramento e preser- dea, que é característico das comunidades mari-
vação da fauna. As conchas desarticuladas, pou- nhas litorâneas. Restos de pequenos vegetais sig-
co fragmentadas, com a ornamentação bem con- nificam também proximidade à linha de costa.
servada tiveram pequeno transporte e soterra-
mento rápido (Johnson, 1960). NEOEIFELIANO - Durante a seqüência trans-
gressiva do Neoeifeliano, pelo aumento da lâmina
7.9 Paleoecologia/Comunidades Bentônicas/ d’água nos mares submetidos a tempestades, fo-
Antigos Ecossistemas ram originados os depósitos de plataforma. As
acumulações de assembléias de invertebrados, e
Pelas entidades registradas, foram obtidas as evi- raros vertebrados, são compostas por trilobitas,
dências das quais derivam as informações paleo- ostracodes, braquiópodos, biválvios, gastrópo-
biológicas. São reconhecidas as associações ben- dos, conularídeos, tentaculítídeos, hiolitídeos, es-
tônicas em plataformas marinhas rasas, nas comuni- colecodontes, restos vegetais e peixes (Kegel,
dades malvinocáfricas (Boucot, 1971 e 1975). Os 1953; Melo, 1985).
gêneros determinados indicam a presença de: É uma assembléia misturada por soterramento e
Tipo 1 - comunidade de Lingula - caracterizada preservação da fauna por fluxos de correntes de
por braquiópodos lingulídeos e discinidas (Orbicu- tempestades em porções localizadas da bacia se-
loidea). Estão em associação com os biválvios nu- dimentar. As conchas estão desarticuladas, mas,
culídeos, os gastrópodos belerofontídeos, e os tri- preservando a ornamentação, demonstram acu-
lobitas homalonotídeos. São de região litorânea. mulação após transporte e soterramento rápido.

– 61 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Os elementos mais numerosos da fauna bentôni- sentantes de floras fossem preservados (Kraüsel &
ca são de plataforma marinha rasa. Pertencem às Dolianiti, 1957).
comunidades de mutationélidas, com os gêneros
Derbyina e Paranaia, o ortídeo Tropidoleptus e o tri- EOGIVETIANO - As acumulações de fósseis no
lobita Burmeisteria. Apresentam ainda mistura com Membro Passagem da Formação Cabeças, corres-
representantes de comunidades de lâmina d’água pondem a um bioevento do início do intervalo re-
mais rasa como os nuculídeos e belerofontídeos e gressivo. São trilobitas, braquiópodos, Tentaculi-
outros espécimens como os conularídeos. tes, biválvios e gastrópodos. Embora sejam consi-
derados da mesma idade da fauna da Formação
EOGIVETIANO - A fauna situada na parte média da Pimenteira, sua composição é diferente.
Formação Pimenteira, é considerada desta idade Boucot (1971) registra que podem haver várias
(Carvalho, 1995). São trilobitas, braquiópodos, bi- comunidades adjacentes em um tempo geológico
válvios, gastrópodos e representantes de floras de curto, que seriam causadas por razões de sedi-
ambientes terrestres. As camadas arenosas que mentação rápida em oposição a uma subsidência
ocorrem na região de Picos estão no limite com o lenta, ou em regiões que representam a extremida-
Membro Passagem da Formação Cabeças. de da transgressão. As duas causas geológicas
Na parte média da Formação Pimenteira, os ma- estão presentes aquí.
crofósseis e icnofósseis são indicativos de ambien- Os gêneros que representam a comunidade são
te litorâneo. O tipo de comunidade inferido pelos os conetáceos, espiriferídeos, ambocoelídeos (Plico-
grupos que predominam na associação é de litoral, plasia ou Pustulatia), terebratulídeos (Rhypidothyris e
pois ocorrem Lingula, Orbiculoidea, gastrópodos, Mutationella), e o trilobita calmonídeo Metacrypha-
belerofontídeos, biválvios nuculídeos e o trilobita eus. Em termos de composição é comunidade do
Burmeisteria. Apresentam ainda mistura com re- tipo 3, que Boucot (1971), considera de ocorrência
presentantes de conularídeos. em maior profundidade. São de plataforma interna
É um bioevento local de preservação da fauna distal, e sua ocorrência estaria influenciada por um
por fluxos de correntes de tempestades, em partes substrato arenoso e mais firme para fixação. As es-
localizadas da bacia sedimentar. As conchas de- truturas sedimentares associadas com a assem-
sarticuladas, mas com a ornamentação preserva- bléia fóssil indicam a deposição em ambiente sub-
da, o são por ressedimentação, isto é, soterramen- maré.
to rápido após transporte. Os braquiópodos conetáceos são abundantes e
Os nódulos hematíticos são abundantes nos pertencem aos Pleurochonetes. Estão presentes
afloramentos nos arredores da cidade de Picos. também espiriferídeos (V.M. Fonseca, inf. verbal).
Revestem fragmentos do trilobita Burmeisteria. Tropidoleptus carinatus permaneceu como bioe-
Carvalho (1995) lembra que esta freqüência de vento global de expansão da espécie originária de
fragmentos pode significar a presença de carapa- províncias faunísticas do Hemisfério Norte (Fonse-
ças vazias, deixadas durante o processo de muda ca & Melo, 1987).
ou ecdise. O grande número de nódulos com trilo- Carvalho (1995) estudou os trilobitas descritos
bitas inteiros indica acumulação in situ. por Castro (1968) como Metacryphaeus australis,
Os icnofósseis Neoskolithos (Kegel, 1966) mos- uma espécie da Bacia do Paraná. Considerou que
tram episódios de colonização intermitentes em ca- os espécimens pertenciam a uma nova espécie da
madas endurecidas por alteração superficial de família Calmonidae, que é restrita à Província Malvi-
ferro. O traço foi formado no topo da camada por nocáfrica.
animais endobiontes, que perfuraram após cada Para o topo da Formação Cabeças, não foram re-
parada da tempestade. O icnogênero Neoskolithos gistradas ocorrências fósseis, em superfície. Grahn
ocorre em sucessivos hardgrounds (paradas de (1992) assinalou o declínio das microfósseis mari-
sedimentação), nos ciclos tempestíticos. O nível nhos durante a regressão do Givetiano, nas bacias
pode ser seguido em extensão nos paredões da re- do Parnaíba, Paraná e Amazonas.
gião de Picos.
A substituição dos pelitos pelos psamitos, obser- NEOFRASNIANO-EOFAMENIANO - A elevação eus-
vada nos arredores e dentro da cidade de Picos, tática do nível do mar, de idade Neofrasniano-Eofa-
marca a superfície de inundação máxima. Com o meniano é expressa pelo bioevento de anoxia repre-
nível de mar mais alto, os ambientes terrestres pró- sentado pelos folhelhos negros radioativos que ocor-
ximos foram inundados, possibilitando que repre- rem na parte superior da Formação Pimenteira.

– 62 –
Devoniano

Raros registros fósseis são Spirophyton e Proto- Tipo 1 - Nuculites, que estariam em planície de
salvinia correlacionáveis com as camadas inferio- maré, na região de litoral. As litologias correspon-
res da Formação Curiri, da Bacia do Amazonas dentes a estes biótopos não foram preservadas no
(Grahn, 1992). A sedimentação correspondeu à registro sedimentar. Estariam situadas em posição
maior elevação do nível eustático e atingiu as três mais a leste da atual linha de afloramento e foram
grandes bacias paleozóicas – Amazonas, Parnaíba removidas por erosão.
e Paraná (Della Fávera, 1990). Tipo 2 - mutationélidas com Tropidoleptus estariam
em bancos arenosos em profundidades rasas.
NEOFAMENIANO - Na Formação Longá, que cor- Tipo 3 - de conetáceos estariam em bancos are-
responde a uma transgressão do Neofameniano, o nosos aonde chegavam os lobos sigmóides.
regime sedimentar com predominância de clásti- Os fósseis foram transportados e soterrados por
cos finos, demonstra que a sedimentação foi efetu- tempestades, e não estavam em seus habitats ori-
ada em uma zona de plataforma mais distal. ginais. Durante os episódios de tempestade, as for-
Nas camadas basais da Formação Longá, com- mas das diferentes associações foram misturadas.
posta de pelitos, há o evento de colonização por fau- Pela interpretação dos paleoambientes e fósseis,
na bentônica, com biválvios, braquiópodos inarticu- as indicações são para uma plataforma marinha de
lados (Lingula e Orbiculoidea), articulados (“Schu- litorânea a rasa (Melo, 1988; Carvalho et al., 1997).
chertella”), Tentaculites e o trilobita Metacryphaeus Entretanto, não são diferenciáveis as regiões de
de afinidade Malvinocáfrica. plataforma interna e externa com os gradientes
É uma fauna de menor diversidade que as mais existentes nas plataformas atuais.
antigas, pertencentes às formações Pimenteira e
Cabeças. Os biválvios são representantes da in-
fauna, onde se enterram no substrato mole de re- 7.10 Paleobiogeografia
giões litorâneas, se alimentando de material em
suspensão. Estão acumulados em áreas de sedi- Boucot (1974) reconheceu no Devoniano três
mentação tempestítica, e mostram que sofreram províncias biogeográficas:
transporte. A Província faunística do Velho Mundo, de águas
Carvalho (1995) considera que pertencem às as- quentes, ocupando as regiões de latitudes baixas,
sociações 2 e 3 de Boucot (1975), onde o braquió- correspondentes à Europa, África do Norte, Ásia,
podo “Schuchertella” e o trilobita calmonídeo são tí- Austrália, Nova Zelândia e ao oeste da América do
picos de região offshore. Norte.
Os abundantes traços fósseis são estruturas de A Província faunística Americana Oriental situa-
bioturbação (Frey & Pemberton, 1984). Os gêneros da entre latitudes baixas a médias, com águas tépi-
descritos indicam predomínio da icnofácies de das a temperadas no leste da América do Norte,
Cruziana, da zona sublitoral, e condições de off- Colômbia, Venezuela.
shore de energia baixa a moderada. A Província faunística Malvinocáfrica, caracteri-
Asteriacites é interpretado como traço de re- zada pela baixa diversidade taxonômica e ende-
pouso de equinodermata. Eram animais que se lo- mismo acentuado, era situada em regiões de altas
calizavam pouco abaixo da superfície e migravam latitudes, abrangendo os mares rasos e frios, no
na vertical para evitar o soterramento decorrente sul da América do Sul, África do Sul e Antártida.
da sedimentação rápida e episódica que corres- A paleobiogeografia no Devoniano das bacias
ponde às tempestades (Santos & Campanha, brasileiras e da América do Sul foi discutida por
1970). Melo (1988). Na Bacia do Paraná, as afinidades
são malvinocáfricas e nas bacias do Amazonas e
ECOSSISTEMAS - As comunidades bentônicas Parnaíba são malvinocáfrica e americana oriental.
são de um antigo ecossistema marinho raso de Nas três bacias, o braquiópodo Tropidoleptus
plataforma epicontinental (Figura 7.10). As re- carinatus, assinalado por Fonseca & Melo (1987)
constituições paleobiológicas foram feitas no ciclo representa a expansão da espécie originária da re-
transgressivo/regressivo de idade givetiana, se- gião Renano-Boêmia (que inclui a África do Norte),
gundo o modelo paleoecológico de Fonseca & pertencente a províncias faunísticas do Velho Mun-
Melo (1987). As associações são diferenciáveis do. A presença deste elemento provavelmente
segundo a distância em relação à linha de costa ocorreu por mudanças dos padrões de circulação
em três tipos: e aquecimento de correntes.

– 63 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Os trilobitas que ocorrem na Bacia do Parnaíba (Caputo, 1985). Porém, a mistura de gêneros de
foram estudados por Carvalho (1995) e indicam in- províncias biogeográficas Malvinocáfrica abran-
fluência austral. O homalonotídeo Burmeisteria e o gendo os mares frios, e Americana Oriental de
calmonídeo Metacryphaeus, são de afinidade com águas tépidas a temperadas, demonstra que na
a província malvinocáfrica, pois o primeiro é repre- Bacia do Parnaíba havia alternância destes pa-
sentante de espécie da Bacia do Paraná e o segun- drões climáticos. A introdução de Tropidoleptus
do é de família restrita à província. carinatus da província faunística do Velho Mundo,
O gênero Metacryphaeus ocorre nas bacias do de águas quentes, evidencia mudanças climáticas,
Amazonas, Parnaíba e Paraná, camadas Bokke- com provável aquecimento por correntes mari-
veld na África do Sul, folhelho de Accra em Gana, nhas, num sistema complexo de circulação.
formações Belén, Icla e Gamoneda, na Bolívia, e
nas ilhas Falklands. 7.12 Deriva
O gênero cosmopolita Burmeisteria fornece
comparação das bacias do Parnaíba e Paraná, Nas reconstituições do Supercontinente Gond-
com o Grupo Bokkeveld da África do Sul e Série wana, as estimativas das paleolatitudes foram fei-
Accraiana em Gana. tas pelo exame das associações de determinadas
Carvalho, M. (1995) considerou B. notica da For- litofácies e suas características em faixas climáti-
mação Pimenteira no Piauí correlacionável com for- cas. Caputo (1985) e Caputo & Crowell (1985) pe-
mas de Burmeisteria do equivalente estratigráfico las indicações de sedimentos glaciogênicos na
da África, os folhelhos de Accra - Série Accraiana. América do Sul, consideraram que o pólo no Siluria-
no estivera situado ao norte da África, migrando
7.11 Paleoclima pelo centro da África em direção ao sul do Conti-
nente Gondwana, durante o Devoniano.
O paleoclima do Devoniano na América do Sul é Barrett & Isaacson (1988) estimaram que a parte
inferido principalmente pelos tipos de sedimentos e norte da América do Sul era situada entre as latitude
composição das comunidades pertencentes às pro- de 30° e 40°, e a parte mais ao sul, entre 60° e 90°.
víncias biogeográficas. De acordo com Barrett & No Gondwana, a faixa compreendida pelo norte da
Isaacson (1988), as águas eram frias nas latitudes África e norte da Austrália, onde são registradas di-
médias e altas. Havia um clima árido a úmido, com versas ocorrências de carbonatos e evaporitos, es-
temperatura fria a temperada nas regiões situadas tariam em paleolatitudes mais próximas da linha do
mais ao norte da América do Sul, enquanto que nas Equador. Scotese & Barrett (1990) apresentaram a
regiões situadas mais a sul o clima seria subpolar e revisão destes dados para o Devoniano Inferior, Mé-
seco. dio e Superior, situando o Pólo Sul no centro-sul da
Na Bacia do Parnaíba, a presença de clima frio é Argentina. Estes dados foram utilizados por Scotese
sugerida pela baixa diversidade da fauna e pelos & McKerrow (1990) para a elaboração dos ma-
sedimentos glaciogênicos da Formação Cabeças pas-múndi de reconstituição do Paleozóico.

– 64 –
Devoniano

Figura 7.10 – Reconstituição paleobiológica do Mesodevoniano - Bacia do Parnaíba.

– 65 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

8
MISSISSIPIANO
A Formação Poti é a unidade litoestratigráfica do
Mississipiano que marca o início de recuo dos ma-
da preliminarmente por Oliveira (1934, 1935). As
ocorrências registradas nas camadas superiores
res interiores, com interrupção das ligações com a da Formação Poti foram descritas por Dolianiti
Bacia do Amazonas. O intervalo deposicional com- (1954, 1980) e datadas no Mississipiano (Mississi-
preende uma idade que está preservada apenas piano). Nesses trabalhos as afinidades euro-ameri-
nestas duas bacias brasileiras. canas da flora foram ressaltadas.
A possibilidade de existência de carvão nesta Em nova etapa, as pesquisas nas associações
unidade, fornecida por indícios em afloramentos tafoflorísticas, foram iniciadas por Rösler & Ciguel
com folhelhos carbonáceos, e uma pequena flora (1985), e as revisões sistemáticas, estão nos traba-
carbonífera foi pesquisada por várias décadas. lhos de Iannuzzi (1994 e 1996) e Iannuzzi & Rösler
Contudo, os resultados foram negativos e as cau- (1991, 1993 e1997).
sas estão na própria dinâmica da bacia, que so- A separação da Formação Poti em dois membros
freu soerguimento, entre o Mississipiano e Pensil- foi proposta inicialmente por Mesner & Wooldridge
vaniano (1964). Esta divisão foi adotada nos relatórios da
CPRM para as pesquisas de carvão e mapeamento
8.1 Histórico de superfície (Cruz et al., 1973a e 1973b; Leite et
al., 1975; Lima & Leite, 1978).
A primeira referência ao nome Poti foi feita por Lis- Della Fávera (1990), pelo estudo da Estratigrafia
boa (1914) para designar folhelhos carbonáceos de Seqüências, identificou na seqüência devo-
que afloram no rio Poti. A designação litoestratigrá- no-mississipiana, intervalos que correspondem ao
fica foi proposta por Paiva & Miranda (1937a). Duar- topo da Formação Longá e à porção basal da For-
te (1936) e Kegel (1954) registraram na seção infe- mação Poti, e na seqüência mississipiana, o inter-
rior da Formação Poti uma fauna marinha pouco di- valo que compreende o topo da Formação Poti.
versificada, composta de biválvios e um braquió- Góes (1995) pela análise de fácies em superfície e
podo inarticulado. subsuperfície reconheceu na Formação Poti um
A flora descoberta na sondagem 125 realizada conjunto de parasseqüências e seus ambientes
em 1933, pelo SGM, em Teresina, Piauí, foi estuda- deposicionais.

– 66 –
Mississipiano

8.2 Área de Ocorrência marinho raso. Os superiores são arenitos com inter-
calações de lâminas de siltitos e folhelhos carbono-
Os arenitos da Formação Poti afloram nas bor- sos, restos vegetais, interpretados como de ambi-
das leste e oeste da bacia, com os estratos orienta- entes fluviodeltaicos (Mesner & Wooldridge, 1964;
dos norte-sul, e infletidos para sudeste e sudoeste, Cruz et al., 1973b; Leite et al., 1975 e Lima & Leite,
acompanhando o atual contorno da bacia. Na re- 1978).
gião sul é recoberto por sedimentos da Bacia San- O contato inferior com a Formação Longá é con-
franciscana, e a norte por sedimentos mesozóicos cordante e o contato superior com a Formação Piauí é
e cenozóicos. A maior parte das ocorrências de flo- nitidamente discordante, marcado por superfícies
ra está registrada na borda leste da bacia. erosivas (Aguiar, 1971; Schobbenhaus et al., 1984;
A espessura máxima de 320 metros foi indicada Della Fávera, 1990; Lima Filho, 1992).
por Góes & Feijó (1994). Na seqüência devono-mississipiana, o primeiro
intervalo transgressivo corresponde à Formação
8.3 Geocronologia e Idade Longá inferior, seguido pelo intervalo regressivo
compreendido pelo topo da Formação Longá e
Na Formação Poti foram indicadas por microfós- pela porção basal da Formação Poti. A seqüência
seis as idades Tournaisiano (mais antiga) e Viseano mississipiana corresponde ao topo da Formação
(mais nova) (Daemon, 1974; Lima & Leite, 1978; Poti compreendendo um sistema transgressivo
Sundaram et al., 1981; Quadros, 1982). Loboziak et com lobos sigmoidais deltaicos e tempestíticos
al. (1992), estudando material de poços da (Della Fávera, 1990).
PETROBRAS localizados no centro da bacia, deter- Góes (1995) apresentou um trabalho detalha-
minaram na coluna de sedimentos da Formação do com análise de fácies, em superfície e subsu-
Poti idades que estariam apenas restritas ao Tour- perfície da Formação Poti. Por correlações em
naisiano. Na atualização de dados da bacia, Góes subsuperfície reconheceu um conjunto de três
& Feijó (1994) utilizaram a datação de Tournaisiano. parasseqüências. Nos afloramentos foram identi-
Contudo, no material coletado no topo da forma- ficados depósitos fluviais (granodecrescência
ção na borda leste, existem indicações de ocorrên- ascendente) e de plataforma com tempestades
cia do Viseano. Esta idade está registrada em níveis (pelitos laminados, lamas de offshore, estratifi-
carbonosos, em amostras de subsuperfície estuda- cações cruzadas hummockys). As estruturas lin-
das por Norma M. Costa Cruz para os projetos de sen (Figura 8.1) correspondem às áreas de depó-
carvão (Cruz et al., 1973a, 1973b), e de superfície, sitos litorâneos e marinhos rasos de uma costa re-
onde Iannuzzi (1994) estudou os palinomorfos as- cortada por baías, deltas e estuários.
sociados aos espécimens vegetais, datando-os no Os restos vegetais ocorrem em afloramentos
Viseano Superior. com arenitos finos tabulares com laminação pla-
A flora inicialmente datada como Pensilvaniano no-paralela, com sucessão de perfurações por raí-
(Oliveira, 1934 e 1935), foi colocada por Dolianiti no zes de plantas (Iannuzzi, 1994). São interpretados
Mississipiano (1954). Esta datação foi confirmada como barras de areia emersas fixando a vegetação
por Rigby (1969) que sugeriu o Neomississipiano. terrestre, na antiga linha de costa (Figura 8.2). Inter-
Pelo grau evolutivo, as estruturas vegetativas e fér- calam camadas de folhelhos laminados que seriam
teis da flora correspondem às formas registradas depósitos de lagos ou lagunas portando os frag-
na região euro-americana entre o Mississipiano (Vi- mentos vegetais (Figura 8.3). Os fragmentos de
seano) e início do Pensilvaniano. Esta idade mais restos vegetais depositados sobre as superfícies
nova foi atribuída por Rocha Campos & Archan- onduladas entre as camadas com laminações pa-
gelsky (1985) à flora Poti. Entretanto, as afinidades ralelas, por vezes com wavy e linsen e climbling rip-
devonianas dos componentes da flora foram men- ples estão bem preservados (Figura 8.4). Indicam
cionadas por Rösler & Ciguel (1985). que estes restos sofreram pouco transporte e foram
depositados por ação de pequenas correntes junto
8.4 Sedimentação aos bancos de areias marginais. São regiões da
planície costeira com um sistema de ilha-barreira
A Formação Poti é dividida em dois membros. Os com fácies de barra e lagunares (Rainson, 1979).
depósitos inferiores são constituídos por arenitos Estes são ambientes concordantes com o pro-
médios, cinza-esbranquiçados, com lâminas es- cesso regressivo da tendência de continenta-
parsas de siltito cinza-claro, interpretados como lização na Formação Poti.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 8.1 – Formação Poti. Seqüência do topo com arenitos e siltitos com estruturas linsen.
Localidade: na rodovia BR-23, distante 8km a leste de Floriano, Piauí.

Figura 8.2 – Formação Poti. Arenitos finos com laminação plano-paralela, com sucessão de perfurações por
raízes de plantas. Interpretados como barras de areia emersas fixando a vegetação terrestre.
Localidade: Fazenda Curral de Pedra, Monsenhor Gil. Rodovia BR-316, km 63, Piauí.

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Mississipiano

Figura 8.3 – Formação Poti. Arenitos finos com laminação plano-paralela, tabulares.
Intercalam camadas de folhelhos laminados.
Localidade: Fazenda Curral de Pedra, Monsenhor Gil. Rodovia BR-316, km 63, Piauí.

Figura 8.4 – Perfil composto da Fazenda Curral da Pedra, município de Monsenhor Gill, Piauí (Iannuzzi, 1994).
Fragmentos de restos vegetais depositados entre camadas com laminações paralelas.
Região de planície costeira com fácies de barra e lagunas.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

8.5 Fósseis niti (1972) fez menções à flora da Formação Poti


para comparação e análise da evolução paleoflo-
8.5.1 Microfósseis rística.
O estudo e a revisão sistemática da flora de pe-
Os microfósseis (esporomorfos) ocorrem ao lon- queno porte composta por vegetação herbácea e
go de todo o pacote de sedimentos e indicam o in- arbustiva foram realizados por Iannuzzi (1994) (Fi-
tervalo de idade que varia do Tournaisiano ao Visea- gura 8.5). Engloba o material resultante de novas
no (Daemon, 1974; Quadros, 1982). coletas e o descrito (Dolianiti, 1954, 1962 e 1980;
Loboziak et al. (1992) revisaram o zoneamento pali- Rigby, 1969; Rösler & Ciguel, 1985).
noestratigráfico proposto por Daemon (1974), aplican- Com este estudo taxonômico dos gêneros com-
do o zoneamento de miósporos da Europa Ocidental preendendo fragmentos de folhagens preservados
em material de três furos da PETROBRAS. Determina- por impressão/compressão, o número de espécies
ram, na Formação Poti, a idade Tournaisiano. O ma- descritas foi reduzido.
terial encontrado compreende as espécies Spelaetri- A flora revela a existência de endemismo em
letes pretiosus, Raistrickia clavata, Colatisporites de- nível específico e genérico; mostrada pelos
corus, Prolyspora rugulosa. Esta datação é aceita por gêneros Paulophyton e Kegelidium estabelecidos
Góes & Feijó (1994) no trabalho de atualização de da- por Dolianiti (1954). Além do reestudo da espécie-
dos da bacia. tipo Paulophyton sommeri, um novo material foi
Iannuzzi (1994) examinou amostras procedentes referido a Paulophyton sp 1 e redescrito o pequeno
dos níveis da paleoflora encontrando uma primeira arbusto Kegelidium lamegoi.
associação com os palinomorfos – Punctatispori- As novas combinações taxonômicas propostas
tes, Laevigatosporites, Foveosporites, Apiculatis- são Diplothmema gothanica (Dolianiti), Adiantites
porites, Botryococcus, Verrucosisporites, Auroras- sp., e nova espécie do gênero Triphyllopteris.
pora. Como forma-guia ocorreu em baixa freqüên- O material de Rhacopteris sp. (Dolianiti, 1980) foi
cia, apenas o Verrucosisporites 2411 indicando Vi- incluído no gênero Nothorhacopteris do Gondwana
seano. da Argentina.
A matéria orgânica do tipo lenhosa indica uma in- Iannuzzi (1994 e 1996), no reexame das amos-
fluência terrestre nos depósitos. Também foi en- tras da sondagem 125 (Teresina, Piauí), identificou
contrada a alga Botryococcus de águas doces a no pela primeira vez, cúpulas, órgãos reprodutores
máximo, salobras. das plantas. Foram referidas com dúvida a Stam-
Na associação de esporos identificada nas len- nostoma sp., do Mississipiano da região euro-ame-
tes carbonosas que correspondem a deposição ricana.
em ambiente de baixa energia, há dominância de
esporos triletes lisos, seguidos por proporção de-
crescente de formas apiculadas, verrucosas e frag- 8.5.3 Fauna
mentos de colônias de Botryococcus.
Os esporos lisos são vinculados a grupos de ve- A fauna é restrita em níveis na parte inferior da
getais higrófilos (psilófitas, licófitas, articuladas e Formação Poti onde está densamente acumulada.
fetos verdadeiros), que viviam às margens dos cor- Kegel (1954) diferenciou sete espécies do biválvio
pos d’água. Edmondia, que fornecem indicações marinhas e
são relacionadas com formas ocorrentes na Europa
8.5.2 Flora e na América do Norte (Figura 8.6). Dos vertebra-
dos há descrito um espinho do peixe condricte Xe-
A flora da Formação Poti foi inicialmente estuda- nacanthus e restos de Paleoniscidae (Duarte, 1936;
da por Oliveira (1934 e 1935). Em pesquisas poste- Santos & Salgado, 1970).
riores, Dolianiti (1954) descreveu e classificou a
maior parte das formas atualmente conhecidas, da- 8.6 Paleogeografia
tando-as no Mississipiano e estabelecendo suas
relações com a flora euro-americana. Dolianiti No Mississipiano, a sedimentação continuou
(1962) descreveu Cyclostigma brasiliensis, ocor- condicionada aos eixos deposicionais controlados
rente da borda oeste da bacia, porém Iannuzzi (inf. pelo Lineamento Transbrasiliano Picos-Santa Inês
verbal) situa este material na Formação Pedra de (Cunha, 1986), sob controle estratigráfico da varia-
Fogo, de idade permiana. Em complemento, Dolia- ção do nível do mar.

– 70 –
Mississipiano

1 Paulophyton sommeri
Dolianiti, 1954.
Localidade: Sondagem 125,
Teresina, Piauí.
Coleção: DG-USP 4460.

2 Kegelidium lamegoi
Dolianiti, 1954.
Localidade: Fazenda Curral
das Pedras. BR-316 km 63,
próximo a Monsenhor Gil,
Piauí.
Coleção: DGM 1019-Pb.

3 Diplothmema gothanica
(Dolianiti, 1954).
Localidade: Sondagem 125.
Teresina, Piauí.
Coleção: DGM 682-Pb.

4 Triphyllopteris sp.
Localidade: Riacho do
Roncador, Barra do Lança,
Piauí.
Coleção: DGM 1681-Pb.

5 Stamnostoma sp.
Localidade: Sondagem 125
Teresina, Piauí.
Coleção: DGM 1006-Pb.

6 Adiantites sp.
Localidade: Fazenda Curral
das Pedras. BR-316 km 63,
próximo a Monsenhor Gil,
Piauí.
Coleção: DGM 1914-Pb.

Figura 8.5 – Flora da Formação Poti (segundo Iannuzzi, 1994).

– 71 –
Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Um mar interior (seaway) conectava as bacias deposicional foram criados novos biótopos. Fo-
do Parnaíba, Amazonas com o Cráton Oeste Africa- ram os habitats favoráveis à colonização de fau-
no, e eram ligados ao paleoceano do Tétis (Della nas do hemisfério norte, como evidenciado por
Fávera, 1990). Edmondia.
Os sedimentos da parte inferior da Formação No segundo bioevento para colonização do am-
Poti indicam sistemas de superposição fluvial, so- biente terrestre, o evento geológico local represen-
bre os da Formação Longá. Nestes sedimentos tado por áreas de progradação com subsidência
arenosos houve posteriormente o abandono deltai- foi fundamental. A influência terrestre é confirmada
co, com retrabalhamento marinho, em mares de pela matéria orgânica lenhosa, e esporos dos gru-
tempestade. Os depósitos superiores apresentam pos de vegetais higrófilos (psilófitas, licófitas, arti-
características para maior proximidade da linha de culadas e fetos verdadeiros), que viveram às mar-
costa sob influência de maré. gens dos corpos d’água (Iannuzzi, 1994).
Nas regiões litorâneas, em ambientes flu- A flora de parentesco euro-americano, pela com-
viodeltaicos com progradação na linha de costa, posição é correlacionada com o reino florístico Pa-
ocorrem os folhelhos carbonosos e a flora terrestre. racas, de clima temperado que ocorre no sul do
Indicam a influência da subsidência local, além da Peru. Representa uma expansão para o sul desta
variação do nível do mar (Cruz et al., 1973b). província biogeográfica, possivelmente pela ame-
Evidências de tectonismo na parte superior da nização de clima para temperado, uma vez que
Formação Poti estão assinaladas por Góes houve o distanciamento do supercontinente em re-
(1995), que identificou canais fluviais entrelaça- lação ao pólo, durante o processo de deriva.
dos em contato com sedimentos de maré, inter-
pretados como uma paleodrenagem com rápido
afogamento, onde a tectônica predominou sobre 8.8 Tafonomia
a eustasia.
Este evento precede à discordância erosiva Os dois eventos biológicos identificados repre-
identificada entre o Mississipiano e o Pensilvaniano sentam sistemas tafonômicos distintos.
desde o primeiro trabalho de integração da bacia O primeiro é um nível de concentração de con-
(Mesner & Wooldridge, 1964). Pelo mapa de con- chas de biválvios, que segundo Kegel (1954) está
torno estrutural do topo da Formação Poti/base da situado na parte basal da formação, em horizontes
Formação Piauí apresentado por Cruz et al. 5 a 10 metros acima do contato Longá/Poti. São de-
(1973b), é mostrado o soerguimento de blocos na pósitos de plataforma marinha, relacionados com
borda sul da bacia. uma transgressão e acumulados como tempestitos
Representa o arqueamento do Alto do Parnaíba proximais.
registrado por Castelo Branco & Coimbra (1984), e As conchas referidas a Edmondia estão concen-
que é correlacionado por Góes & Feijó (1994) ao tradas e cimentadas por arenito de granulação mui-
evento geológico global, a Orogenia Eoherciniana. to grossa. Abaixo ocorre, em contraste, um nível de
arenito de granulação fina a média, o que sugere
entre os dois níveis, uma brusca diferença entre os
8.7 Eventos Biológicos processos hidrodinâmicos, com maior agitação da
água nos níveis de maior granulometria. O nível das
Os dois eventos biológicos são as ocorrências conchas é revestido de uma película de óxido de
de: invertebrados marinhos relacionados com a ferro, indicativo de um hardground, e parada na se-
transgressão na base da formação e a flora terres- dimentação (Figura 8.7).
tre, relacionada com condições continentais da O material original que constituiu as conchas
fase de progradação, na parte superior da forma- está dissolvido. As unidades registradas se apre-
ção. sentam como moldes internos de valvas isoladas
Os mecanismos alocíclicos de deriva, clima e va- direitas e esquerdas, em igual proporção e volta-
riação do nível do mar influenciaram os bioeventos das para cima. Parte do material se apresenta com
sob aspecto regional, global e local. Houve cone- as valvas unidas. Mostram que, no processo tafo-
xão com o paleoceano de Tétis, comprovado pelo nômico, primeiro as conchas foram acumuladas
gênero cosmopolita dos biválvios marinhos. A ele- sem exposição e transporte. Posteriormente, por
vação do nível do mar propiciou a abertura de no- ressedimentação, sofreram deslocamento no
vas passagens, e com a geração de espaço substrato e enterramento.

– 72 –
Mississipiano

1 3

1 Edmondia obliquata Kegel, 1953


Localidade: Campo Maior, Piauí.
Coleção: DGM 4393-I.
2
2 Edmondia corpulenta Kegel, 1954
Localidade: Campo Maior, Piauí.
Coleção: DGM 4394-I.

3 Edmondia dequechi Kegel, 1954


Localidade: Campo Maior, Piauí.
Coleção: DGM 4392-I.

Figura 8.6 – Fauna da Formação Poti.

Figura 8.7 – Placa com conchas de Edmondia. Localidade: Serra de Campo Maior, Campo Maior,
Piauí. Coleção DGM.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Nos processos sofridos pelos exemplares con- Simões (1997), este gênero teria o hábito escava-
servados após seu enterramento inicial, isto é, a dor raso, e vivia em fundos arenosos e firmes, em
fossildiagênese, as conchas originais devem ter ambientes de média energia.
sido dissolvidas após a ressedimentação. Se o fos-
sem antes, os moldes teriam se dissolvido no pro- COMUNIDADE FLORÍSTICA EM AMBIENTE
cesso de erosão e suspensão, durante a agitação TERRESTRE LITORÂNEO - Os fitofósseis interpre-
dos sedimentos pelos fortes fluxos que geraram a tados como acumulação in situ, indicam a coloniza-
concentração das conchas. ção do ambiente terrestre, em intervalo progradan-
O segundo sistema tafonômico compreende as te. As fácies sedimentares de ilha-barreira são as-
ocorrências da flora, relacionadas com condições sociadas de um sistema deposicional transicional.
continentais da fase de progradação, na parte su- Na reconstituição do antigo ecossistema (Figura
perior da formação. O material composto por frag- 8.8) estão as formas de hábito psilofítico
mentos de frondes, caules e frutificações preserva- (Paulophyton e Kegelidium) consideradas como
dos por compressão e/ou impressão, contém nor- higrófilas, colonizadoras de margens lacustres ou
malmente restos de películas carbonosas, sem cu- estuarinas. As frondes do tipo Diplothmema,
tículas ou estruturas anatômicas. A conservação foi Adiantites, Nothorhacopteris e Triphyllopteris são
propiciada pela acumulação próxima à fonte, pois relacionadas a ambientes higro-mesófilos, em
as plantas delicadas conservaram a estrutura ana- áreas proximais ao longo dos corpos d’água.
tômica.
As perfurações por raízes de plantas estão pre- 8.10 Paleobiogeografia
servadas por acumulação in situ, nas camadas de
arenitos das barras emersas associadas aos folhe- PROVÍNCIA PALEOFITOGEOGRÁFICA - A flora
lhos laminados com os fragmentos vegetais. Por- da Formação Poti, por suas afinidades representa
tanto, decorrem de entidades paleobiológicas eu- uma extensão para leste do Reino Paracas, existen-
dêmicas, isto é, que viveram e se reproduziram na te durante o Carbonífero do Peru. Este reino expres-
área (conceito de Fernández López, 1986-87). sa uma zona paleoflorística de clima temperado/
quente, situado entre os reinos Tetiano (ou Eu-
8.9 Paleoecologia/Antigos ro-Americano) e o Gondwanico.
Ecossistemas A flora da Formação Poti compreende uma
unidade intermediária, com gêneros que a situa
Os paleoambientes e fósseis representam dois entre os reinos Gondwanico e Euro-Americano. Na
diferentes tipos de comunidades: a primeira é uma composição, possui gêneros cosmopolitas, tais
comunidade bentônica de plataforma marinha como, Adiantites, Diplothmema e Triphyllopteris;
rasa, e a segunda uma comunidade florística em outros restritos ao Gondwana, como Paulophyton e
ambiente terrestre litorâneo. Nothorhacopteris, e um exclusivo desta flora,
Kegelidium.
COMUNIDADE BENTÔNICA DE PLATAFORMA
MARINHA RASA - No modelo de fácies para os 8.11 Paleoclima
tempestitos (Della Fávera, 1990), os sedimentos de
granulometria de grânulos a grossos são transpor- A interpretação para um clima temperado a frio,
tados nos surtos de tempestade, quando o mar lo- seco a árido, nas condições existentes durante o Mis-
cal está mais alto. Estes são depositados na base sissipiano, é fornecida pelas características da paleo-
dos tempestitos nas fases transgressivas. As con- flora (Iannuzzi, 1994). Incluem a baixa diversidade,
chas são as partículas mais grossas, e foram trans- com elevado número de indivíduos por táxon, peque-
portadas e depositadas distante de seu ambiente no porte dos exemplares com tamanho situado entre
de vida. herbáceo e arbustivo, e o caráter das frondes conten-
Os biválvios que pertencem ao gênero marinho do folhagens de limbos resistentes a coriáceos.
Edmondia, apresentam as características funcio- Condições periglaciais durante a deposição da
nais de biválvios isomiários, com charneira fina e Formação Poti foram sugeridas pelos dados litoló-
sem dente, sem marcas da edentação de um sinus gicos observados por Lima & Leite (1978), Caputo
palial. Foram sésseis, e deveriam viver com as con- & Crowell (1985) e Della Fávera (1990). Entretanto,
chas semi-enterradas no substrato, em comunida- Góes (1995) que exaustivamente analisou os pro-
des de plataforma rasa. De acordo com Kotzian & cessos deposicionais da formação, em superfície e

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Mississipiano

subsuperfície, concluiu não ter encontrado evidên- Região Norte do Brasil e também do superconti-
cias de sedimentação de origem glacial. nente, no Mississipiano, havia alcançado as latitu-
des médias. Esta evidência é corroborada pelos
8.12 Deriva sedimentos clásticos e ausência de sedimentos
químicos. Por estes elementos, é deduzido que o
A ocorrência da flora Poti é uma inferência paleo- supercontinente estava localizado ainda a uma re-
climática para latitudes temperadas. Indica que a lativa distância da linha do Equador.

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Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís

Figura 8.8 – Reconstituição paleobiológica do Mississipiano da Bacia do Parnaíba (segundo Iannuzzi, 1994).

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