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Poesia com elos

23ª edição
Pamela Facco
Poesia com elos

Mais um ensaio para conta do poesia com elos e


mais um show de pluralidade tanto de peles e
formas quanto de personalidades.
O projeto é uma grande peneira que revela as
melhores almas da nossa sociedade. Gente humana,
caridosa, curiosa, investigativa e porosa.
Mais um ensaio riquíssimo, mais composições inte-
ressantes e mais uma experiência exclusiva e única
para esse grupo que se revelou no último dia 20.
Apresento essa unidade artística composta por
indivíduos absolutamente plurais.
Que prazer compor com eles, que prazer dividir
isso com vocês.
Espero que apreciem tanto quanto nós!
Poesia com elos

QUE SAIBAMOS A NãO SER SÓ

Quanto maior a sensibilidade, mais escandalosos


são os desastres, é verdade, mas esse texto não é
sobre isso.
É sobre verbalizar escolhas, pensamentos, aflições
e pedidos.
É sobre entender quem se é, o que se quer, onde e
com quem pretende chegar.
É sobre narrar sua caminhada em voz alta e convidar
quem te interessa a estar junto nessa.
Que saibamos a não ser só.
Quando eu tinha vinte e poucos anos, eu não gostava
de ser eu e fugia do espelho(ideia) como se fosse
uma vampira. Não podia ver a minha imagem, não
podia me debruçar sobre quem eu era e tudo que me
distanciava mais e mais de mim, eu escolhia.
Eram atividades que eu não me identificava,
trabalhos que eu detestava, festas em que eu não
pertencia, amores que não me permitiam respirar e
sonhos que qualquer mulher padrão copiava.
Por medo de fracassar a expectativa que o mundo
detinha sobre mim, eu me encolhia, me escondia,
adormecia e murchava. “Vencia”.
Eu provava uma vida que não me cabia, vestia
sapatos demasiadamente largos e tropeçava a cada
três passos. Ninguém me ajudava, porque eu não
sinalizava que estava no chão e com fantasias
e máscaras todo corpo parece feliz, toda boca
parece sorrir.
Hoje eu não finjo mais e nem tenho a pretensão de
atender as expectativas de ninguém.
Vou falhar em tudo, vou falhar diversas vezes, vou
falhar e chorar pelas minhas falhas.
Vou chorar pelas falhas do mundo também e por todas
as vezes que eu me sentir negligenciada, silencia-
da e desacolhida.
Eu vou chorar e vou contar que estou triste aos
quatro cantos, porque o sofrimento não comparti-
lhado dói ainda mais e eu não aguento com nem mais
uma grama de dor.
Hoje eu entendo que não há saída em canto algum
e por mais que a vida ainda não me agrade por
completo, eu percebo que quanto mais eu me perco
dos padrões do mundo, mais eu acho significados e
respostas dentro em mim.
Hoje eu não detesto quem sou, não fujo de mim.
Me responsabilizo e me identifico em todas as minhas
escolhas e as minhas tristezas eu as encaro sem
anestesias.
As vezes parece que não vou suportar, mas de uma
forma ou de outra, sempre dou conta:
sublimo/ressignifico.
A resposta certa não é a felicidade.
O grande triunfo da vida não é a vitória.
E o sonho, é só mais um devaneio do nosso incons-
ciente.


Quanto mais eu me perco dos
padrões do mundo,
mais eu acho significados e
respostas dentro em mim.


O conceito do homem contemporâneo de reproduzir,
copiar e colar, imitar comportamentos e acreditar
que nesse individualismo coletivo vai estar a
solução da charada da sua vida privada é a maior
cilada dos nossos tempos.
O caminho não é de fora para dentro e sim ao
contrário, mas também não podemos estagnar e enlou-
quecer nas profundidades do nosso eu.
Isolados não comprovamos tese nenhuma, não dissol-
vemos nós, nem cicatrizamos grandes feridas.
As respostas devem reverberar como ondas, e
sinalizar essa solvência para o nosso entorno.
A vida humana é dada em coletivo, não há filosofia,
análise, psicoterapia, yoga, reflexões, afirmações
positivas, arte nem poesia que consiga transformar
a dor do homem que não compartilhe as suas desco-
bertas, respostas ou angústias.
No individual, no Narciso, no espelho(objeto), no
hedonismo, está a cicuta.
Enquanto estivermos acreditando que nossa estrada
será trilhada a sós, caminharemos inutilmente em
círculos.
Enquanto você divide o quanto cresce, o seu entorno
cresce junto e tendo um time que dobra de tamanho
pelo apoio mútuo a comunidade se salva.
Estenda as suas mãos constantemente, seja para
pedir ajuda ou para oferecer suporte.
Descruze esses braços, seja mais uma parte do todo.
Seja um elo, conectado, dependente e necessário.
Esqueça todas as mensagens sobre aprender a ser
só: essa é uma ideia fajuta, que não se sustenta
em nenhum âmbito.
Profunda gratidão à todos Elos da minha poesia.
Junho de 2020

Poesia com elos


23ª edição
Pamela Facco

Abril de 2022

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