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Teoria da História
A História Oral –
reflexões e testemunhos
Docente:
Professor José Neves
Discentes:
Joana Clara Freire Ribeiro, n.º 2020118128
Miguel Augusto Luís, n.º 2020129451
Lara Patrícia Oliveira Rodrigues, n.º 2020130310
Vanessa Maria Ferreira Carvalho, n.º 2020131234
Mário Fernando Lopes Sequeira, n.º 2020128305
Rodolfo Miguel da Silva Matoso Aguiar Cunha, n.º 2020131003
1
Índice
1. Introdução...............................................................................................3
2. O que se entende por História Oral.........................................................3
3. Testemunhos de resistência nos campos alentejanos no trabalho de
Paula Godinho...............................................................................................5
4. Conclusão..............................................................................................10
Elementos bibliográficos.............................................................................11
2
1. Introdução
Optámos pelo tema da história oral devido a uma certa ideia de que através da
história oral se vão descobrir partes do passado que estavam ocultas promovendo o
diálogo entre o passado e o presente. A primeira parte do ensaio consistirá
essencialmente em análises de artigos e a segunda incidirá sobre um caso específico em
concreto. Iremos procurar reflectir de que formas é que a história oral poderá contribuir
para o conhecimento acerca do passado, ou seja, até que ponto é que pode ser uma
ferramenta valiosa para compreendermos melhor o nosso passado e para enriquecer as
nossas memórias ajudando a construir um futuro melhor.
As décadas de 1930 e ’40 podem ser apontadas como o começo desta prática
historiográfica, destacando-se a importância do Columbia Oral History Research Office,
cuja acção se focava na conservação dos testemunhos históricos prestados pelos ditos
“grandes homens”. Mas ao longo dos anos ’60, junta-se a esta história oral focada nas
elites uma outra, ligada à História Social que se desenvolve na mesma década, que foca
a sua acção na história de grupos subalternizados (os proletários, as mulheres, grupos
racializados…), ignorados pelas fontes tradicionais da historiografia.
1
THOMPSON, Paul, “História oral e Contemporaneidade”, p. 9.
3
Assim, se por um lado o historiador deve ter cuidado com estes desvios da realidade,
historiadores como Portelli chamam à atenção o facto de que estas narrativas, o contra-
factual, as falsas memórias – podem dar ao trabalho historiográfico uma profundidade
maior do que se estas fontes não fossem utilizadas, porque nos dão uma relação entre os
acontecimentos que faz sentido para quem os viveu, mas que seria talvez mais difícil
fazer apenas com base nas fontes tradicionais.2
Por este motivo, compreende-se a história oral como uma prática interdisciplinar por
excelência; várias áreas de estudo estão envolvidas na interpretação destas fontes: a
Sociologia, a Antropologia, a Linguística, por exemplo.
Luísa Tiago de Oliveira fez um retrato sobre o recurso à História Oral no panorama
português e faz uma critica de que os testemunhos orais não foram frequentemente
utilizados como recurso nas investigações recentes que centram o seu objeto de estudo
no período do Estado Novo ou no 25 de Abril, sendo que no seu artigo “A História Oral
em Portugal” constatou o atraso da afirmação da História Oral enquanto disciplina
institucionalizada.
6
CRUZEIRO, Manuela Maria, História Oral – Dilemas e Perspectivas, parágrafo 2.
7
COIMBRA, Maria Natércia, “O arquivo de história oral no Centro de Documentação 25 de Abril da
Universidade de Coimbra: entrevistas: conceito, natureza e direitos de uso e divulgação envolvidos”, pp.
516-517.
8
Ibidem.
5
No entanto, a autora refere teses e estudos recentes que utilizam a história oral,
apesar de não ser numa dimensão hegemónica, como metodologia qualitativa durante o
processo de investigação, enumerando o caso de Paula Godinho. 9 Podemos notar que o
recurso à história oral em Portugal, eleva vozes de resistência e vivências oprimidas
durante o Estado Novo, assim como integra memórias orais durante a conjuntura
revolucionária portuguesa.10
Assim, a história oral apresenta-se como uma metodologia que dá acesso a passados
silenciados, que Miguel Cardina alude como fundamental para compreender processos
históricos contemporâneos.12 Isto verifica-se também através da inclusão na recolha de
testemunhos de mulheres, por vezes não mencionados nas memórias masculinas. 13
Deste modo, a recolha de testemunhos orais de mulheres permite conhecer a sua
participação neste processo de luta, onde sobressai a questão das tradicionais
construções de género.14 Por isso, importa mencionar as “Mulheres do Couço”, entre
elas, por exemplo, Maria Carmina ou Rosa Viseu, que refere a participação da mulher
na reivindicação de direitos ao lado dos homens.15
9
OLIVEIRA, Luísa Tiago de, “A História Oral em Portugal” pp. 139-140.
10
Ibidem, p. 147.
11
Ibidem, pp. 141-142.
12
CARDINA, Miguel “História Oral. Caminhos, problemas e potencialidades”, in GODINHO, Paula,
Usos da Memória e Práticas do Património, p. 34.
13
GODINHO, Paula, Memórias da resistência rural no sul – Couço (1958-1962), p. 361. “Um dos
processos constituídos pela PIDE abrange 17 mulheres e dá conta da acção colectiva feminina, omitida
por esquecimento nas memórias masculinas recolhidas no início da estadia no terreno.”
14
Ibidem, p. 362. “Quando o José Dias Coelho foi assassinado eram as mulheres, eu e várias, que íamos
com os retratinhos do José Dias Coelho e que punhamos nas paredes, com a grande repressão que estava
no Couço. Os homens eram presos, mas ficavam as mulheres na retaguarda dos homens. Ficavam as
mulheres a trabalhar. Quando nós chegámos à prisão, fomos nós que levámos, que nos batiam muito e
que nos torturavam mesmo quase até à morte, porque viam que nós estávamos a fazer já o serviço dos
homens.” (Olímpia Brás)
15 ?
MUSEU DO ALJUBE, Morreu uma das Mulheres do Couço, a resistente antifascista Maria
Carmina, 2021. “As mulheres do Couço estiveram sempre ao lado dos homens na luta; deram o seu
6
Na tese Memórias de Resistência rural no Sul – Couço (1958-1962), a autora
reflecte acerca do papel da memória e dos testemunhos orais como instrumentos que
determinam a acção dos indivíduos enquanto agentes sociais de mudança.
Nomeadamente, a tese foca-se na análise das diversas formas e meios de resistência ao
Estado Novo por parte de grupos de militantes comunistas presentes na aldeia do Couço
na região do Alentejo. Grande parte da base na qual a tese se funda consiste no registo e
na interpretação de testemunhos sobre o passado dos indivíduos, centrando-se
essencialmente na história oral e cuja utilização se refere às lutas políticas desenroladas
no Couço entre 1958 e 1962. O significado dos acontecimentos segue um caminho de
particularização para os entrevistados tendo em conta o imperativo obscurecimento que
advém da opção pela reconstituição de um tempo determinado. 16 Neste aspecto,
verifica-se o já apontado por Thompson no sentido de que a história oral é mais
prevalecente no seio de certas comunidades, neste caso, na do Couço.
contributo pela conquista de direitos; lutaram nas praças de jorna, nas lutas das oito horas, nas lutas para a
formação de um sindicato que nos defendesse, nas lutas contra as burlas eleitorais, nas lutas das malditas
prisões, e, nas horas amargas da tortura, estiveram sempre, sempre ao lado dos homens, seus
companheiros.”
16
GODINHO, Paula, op. cit., p. 38.
17
Ibidem.
18
CARDINA, Miguel, “Introdução”, in: PORTELLI, Alessandro, A morte de Luigi Trastulli e outros
ensaios. Ética, memória e acontecimento na História Oral, pp. 7-9.
7
Perante a possível subjectividade dos testemunhos recolhidos, a autora não hesita
em recorrer ao pensamento de Jean-Paul Sartre mencionando que o subjectivo é um
momento necessário do objectivo.19 Assim, a restituição da memória colectiva
possibilita uma certa imagem partilhada do passado, isto porque as vidas e experiências
individuais podem constituir um caminho para o conhecimento da sociedade.20
Para a autora, o método utilizado permite que a história surja a partir dos relatos
individuais e igualmente que a mesma se democratize ao dar voz a grupos sociais
subordinados, que introduz rupturas com uma visão diacrónica exclusivamente das
elites.21 Não existe um carácter cronológico necessário na narrativa dos entrevistados
porque para a autora não existem no passado origens legitimadoras de um lugar social. 22
A autora relembra que, enquanto a memória dos grupos possidentes usufruiu de
materialidade garantida através de dispositivos físicos cujo propósito é facilitar a
rememoração, é de notar que os grupos despossuídos não têm acesso aos mesmos
meios, o que promoveria as diferenças entre as classes sociais. 23 Assim, o papel da
oralidade e o uso da história oral na representação do passado prendem-se muito com
esta possibilidade de incluir grupos sociais habitualmente ostracizados, uma vez que
muitos dos que são parte destes grupos excluídos não são capazes de utilizar a palavra
escrita.24 Para além disso, perscrutar sobre a História Oral é ter consciência da sua
enorme contribuição como técnica de investigação complementar para a história,
mediante a inclusão dos seus relatos pessoais e observar os sentimentos destes grupos
sociais, que permite conhecer as suas visões do passado que tendem a ser
subalternizadas pela história escrita.25
19
GODINHO, Paula, op. cit., p. 44.
20
Ibidem.
21
Ibidem.
22
Ibidem.
23
Ibidem.
24
Ibidem, p. 43.
25
NEVES, José, “Paula Godinho. Memórias da Resistência Rural no Sul – Couço (1958-1962)”,
parágrafos 1-3
8
entre as formas oral e escrita de uma narrativa.26 Ou seja, por um lado temos a oralidade,
que tende em favor da emoção, da subjectividade e de um pendor crítico reduzido, e por
outro lado existe a escrita mais racional e crítica.27
Tal pode ser explicado no sentido de que a firme associação entre modos de
pensar, de produzir o pensamento e de o reproduzir, proporciona que o sentido crítico
seja menos susceptível de existir quando não existe um suporte físico para o que é
transmitido, que se limita por isso apenas a certas circunstâncias temporais e espaciais,
estando fora do alcance de quem pretenda no futuro submetê-las a novas análises e
avaliações.28 Consequentemente, a autora argumenta que por esta via a oralidade torna-
se mais persuasiva uma vez que a crítica que lhe possam fazer perde acutilância porque
obriga a uma reacção imediata.29
Conforme refere Luísa Tiago de Oliveira, e tal como já tinha feito Portelli, Paula
Godinho procura interligar as realidades de grupo com as vivências individuais
realçando o papel essencial da memória na construção de uma identidade individual e
colectiva no âmbito das lutas e das resistências ocorridas num certo enquadramento
histórico.30
26
Ibidem.
27
Ibidem, p. 45.
28
Ibidem, p. 46.
29
Ibidem.
30
OLIVEIRA, Luísa Tiago de, op. cit., pp. 141-142.
31
GODINHO, Paula, op. cit., pp. 409-410.
32
Ibidem.
9
fundamental aquilo que a autora denomina como cultura de resistência e que é um
verdadeiro pano de fundo dos testemunhos orais que permeiam a tese.33
4. Conclusão
A história oral parte do pressuposto de que as fontes escritas podem ter
limitações em permitir conhecer o passado porque são fontes do poder, daqueles que
têm a possibilidade de escrever. A história oral, ao levar-nos a estudar as práticas
memorialísticas em geral, defende que a memória não é muito diferente das práticas
historiográficas. Mas ao mesmo tempo, a história oral é uma história do presente, o
historiador procura a dialéctica entre o entrevistador e o entrevistado.
Elementos bibliográficos
33
Ibidem.
34
Ibidem.
35
Ibidem.
36
Ibidem.
10
CARDINA, Miguel, “História Oral: Caminhos, problemas e
potencialidades” in: GODINHO, Paula, Usos da Memória e Práticas do
Património, Lisboa: Colibri: IELT – Instituto de Estudos de Literatura
Tradicional, 2012, pp. 27-43, disponível em:
https://eg.uc.pt/bitstream/10316/43879/1/Hist%C3%B3ria
%20Oral_caminhos%20problemas%20e%20potencialidades.pdf, consultado
em 20/01/2023 às 10:01.
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LOZANO, Jorge Eduardo Aceves, “Prática e estilos de pesquisa na História
Oral Contemporânea” in FERREIRA, Marieta de Morais; AMADO, Janaína
(org.), Usos e abusos da História Oral, Rio de Janeiro: Fundação Getúlio
Vargas, 1996, pp. 15-25.
12