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– ABORDAGENS PRÁTICAS
AULA 6
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como as narrativas nacionais dos Estados europeus e as figuras-chave delas, o
que contribuiu bastante nesse sentido.
Diante disso, as fontes orais foram, por muito tempo, rejeitadas ou
colocadas em segundo plano. Com efeito, a incorporação de novas tipologias de
fonte advindas dos debates historiográficos surgidos entre o início meados do
século XX aconteceu graças às gerações de historiadores ávidos por novos
temas e problemáticas, no bojo dos novos paradigmas historiográficos que
surgiram naquele contexto (Lozano, 2011). Como explica Gortázar (2013, p.
530), a História-disciplina fez ali o movimento de “anexar novos territórios”,
dialogando com outras áreas do conhecimento e ampliando seu campo de
documentos, o que possibilitou o aumento do território de atuação do historiador.
Trebitsch (1994) explica que o boom da história oral na historiografia veio
nos anos 1960, em grande parte vindo de historiadores que a valorizavam no
sentido de construir uma “outra história” que dialogasse com um período de
grandes contestações e pautas políticas, incorporando narrativas históricas de
sujeitos por muito tempo excluídos da produção histórica como um todo.
Mais que isso, a valorização da oralidade não somente incorporava esses
sujeitos, como também dialogava com novas epistemologias de se pensar o
fazer histórico, entendendo, por exemplo, tradições transmitidas pela oralidade
ou pela memória compartilhada como fontes validadas de acesso a
conhecimentos do passado.
A história oral e as variadas abordagens da oralidade como fonte histórica
trazem uma série de questões importantes ao historiador. Uma que salta aos
olhos é sua natureza, a princípio, inter e transdisciplinar, uma vez que a história
oral dialoga, inicialmente, com a antropologia, mas traz consigo elementos e
possibilidades de aproximações com diversas outras áreas do conhecimento que
trabalham com essa forma de acessar o passado, embora com outras finalidades
e objetivos.
Nesse sentido, a oralidade oferece algumas possibilidades, mas também
limitações, devido à distinção das fontes escritas. Isso altera de forma
substantiva aspectos da crítica documental que o historiador deve executar na
construção da pesquisa histórica. Vamos explorar alguns desses aspectos a
seguir.
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1.1 Diálogos com outras ciências
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Por isso, os autores concordam que a história oral abrange metodologias
e epistemologias muito mais complexas do que técnicas e tratamentos
relacionados a lidar com ou fazer entrevistas (Mattos; Senna, 2011). No caso, a
história oral possui objetos e objetivos próprios e oferece potencialidades de
acesso a testemunhos do passado que extrapolam esse campo de técnicas.
Lozano (2011) explica, por exemplo, que a história oral também se vale
de um constante diálogo com a Psicologia, em pelo menos dois aspectos
fundamentais. Um deles é que a oralidade e o testemunho, por exemplo, tendem
a ser afetados por alguns fatores que permeiam uma entrevista e que requerem
atenção do pesquisador/historiador. Além disso, existe a relação entre a
oralidade e a memória, com a qual nos ocuparemos mais detidamente à frente.
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As fontes orais, como toda fonte, precisam passar por exame crítico,
principalmente porque elas possibilitam acessar testemunhos de realidades
históricas sob perspectivas que são, via de regra, acessíveis à memória. E a
memória possui algumas limitações e características que merecem toda a
atenção. É sobre isso que discutiremos a seguir.
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realidades muito próximas que, muitas vezes, podem “trair” o
pesquisador/historiador que quer chegar ao passado por meio delas.
Por essas questões metodológicas enunciadas aqui é que devemos ter
bastante atenção quanto às fontes orais, nunca as entendendo como relatos
ingênuos ou pouco complexos do passado. A memória (assim como as fontes
escritas, como vimos anteriormente) não traz o passado como ele é nem faz o
contrário, ou seja, um passado distorcido ou enviesado (por isso, descartável)
pela perspectiva memorialística do indivíduo. Como documento, a memória
oferece chaves de leitura do passado, informações preciosas e dados a serem
problematizados pelo pesquisador/historiador. Aqui, levantaremos alguns pontos
que merecem atenção específica.
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também para a análise de culturas cujos registros não escritos tiveram ou têm
centralidade quanto à produção e ao compartilhamento de seus registros.
Barbosa, Fagundes e Mezacasa (2018) mostram como uma aproximação
entre etnografia e história oral tem sido importante para os estudos históricos
sobre os povos indígenas. Os métodos de ambas as áreas permitem que suas
formas de ver o mundo e as tradições orais representem um rico escopo de
fontes históricas. Bringmann (2012), sobre o mesmo tema, mostra o quanto
esses aparatos metodológicos podem ser importantes no sentido de superarem
paradigmas tradicionais da historiografia de uma “história oficial”, da qual os
indígenas são sistematicamente excluídos.
Aqui também se tornam acessíveis, em grande parte, a memória histórica
e os significados culturais construídos e compartilhados, além de cosmologias,
interpretações de mundo e representações do tempo histórico vistos por esses
povos. Por isso, é fundamental entender o fato de que a história oral permite
acessar tais conhecimentos e compreender a transmissão desses
conhecimentos e sua complexidade.
É por esse caminho, por exemplo, que boa parte da historiografia sobre
as religiões de matriz africana no Brasil tem sido desenvolvida. Por se tratar de
religiões que não possuem sistematizações dogmáticas ou doutrinárias em livros
sagrados, suas práticas, crenças e visões de mundo são transmitidas mormente
pela oralidade, juntamente com uma série de outros aparatos inscritos nas
tradições, como materialidade, memória histórica, entre outros aspectos.
Elementos que vão das crenças aos mitos de fundação dos terreiros, passando
por trajetórias históricas, têm sido analisados por pesquisadores de várias áreas,
recorrendo-se a métodos da história oral (Silveira, 2003; Pereira, 2017).
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Moderna, apontando para a riqueza, do ponto de vista metodológico, desse
diálogo para o fazer histórico.
Ginzburg (2007a, 2007b) propõe aos pesquisadores/historiadores que
analisam os processos inquisitoriais tendo em vista a sua dimensão dialógica,
ou seja, considerá-los como registros de um diálogo. Naqueles processos, como
aponta, há uma diversidade de vozes (dos réus, dos inquisidores, dos
funcionários da Inquisição, das testemunhas etc.), conferindo-lhes uma polifonia.
O historiador, como o antropólogo, deverá organizar e dar sentido àquelas vozes
identificadas no texto de maneira a produzir o conhecimento histórico com base
naquele testemunho.
Há outras tipologias documentais escritas em que encontramos marcas
de oralidade. Na escrita lírica, por exemplo, essa característica é bem marcada.
Não obstante, essa particularidade aparece também em documentos escritos
que se baseiam em transcrições orais, como fontes processuais e notas
taquigráficas, que registram, por exemplo, discursos e sustentações orais em
tribunais de justiça e parlamentos e podem servir como um importante
documento histórico.
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O que se deve frisar aqui é que todo o roteiro de uma entrevista, seus
objetivos e limites (decidir o que não deve ser perguntado também é importante),
deve ser elaborado metodicamente, com todo o rigor, antes de qualquer
entrevista acontecer.
No caso de uma pesquisa histórica, é preciso ter em vista o que a
entrevista poderá contribuir para a pesquisa proposta. Isso será possível com as
informações obtidas no andamento da pesquisa, com leitura de fontes,
bibliografia e desenvolvimento do tema.
Existe também o momento pós-entrevista. Uma vez que ela tenha sido
feita, o pesquisador/historiador deverá tratá-la como fonte histórica e, dessa
maneira, organizá-la, catalogá-la, classificá-la e guardá-la como se faz com
qualquer documento.
Núcleos de pesquisa que trabalham com história oral, via de regra, criam
ricos bancos de dados com entrevistas recolhidas, assim como alguns fundos
disponibilizam transcrições de discursos, debates, discussões e sustentações
orais. Algumas dissertações de mestrado e teses de doutorado também
costumam disponibilizar as entrevistas usadas como fonte nos anexos dos
trabalhos. Isso é importante também como forma de conferir acesso de mais
pesquisadores aos dados usados naquela pesquisa.
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4.4 Ética de pesquisa e uso de entrevistas
Por fim, e o mais importante, é que existem diversos limites éticos no uso
de entrevistas como fonte. Inicialmente, o pesquisador/historiador deve mostrar
à pessoa entrevistada o uso de sua entrevista, ou seja, o sujeito tem todo o direito
de saber o uso e a destinação de sua fala. Assim, cabe ao
pesquisador/historiador mediar esse acesso entre a pessoa que contribuiu com
sua pesquisa e a pesquisa propriamente dita.
Já dissemos anteriormente que não se deve usar partes ou trechos que a
pessoa entrevistada não queira disponibilizar ou registrar. Em alguns casos,
serão necessárias a omissão ou a supressão de nomes em função da natureza
do objeto da entrevista.
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respeito a situações que ligam pessoas, clãs, famílias, grupos etc., ou
circunstâncias que dão relativa unidade ao destino de pessoas, como
eventos traumáticos (Meihy; Holanda, 2010). Compreende vivências
coletivas, experiências, dramas subjetivos e outros tipos de realidades
históricas que produzem esse tipo de ligação interindividual e
intersubjetiva. Como exemplos, podemos citar: sobreviventes do
Holocausto, eleitores de determinado candidato nas últimas eleições
presidenciais, membros de um determinado sindicato durante a Ditadura
Militar etc.
• Colônia: seria, grosso modo, uma subdivisão da comunidade de destino.
Uma vez delimitada uma comunidade de pessoas ligada por elementos
objetivos e subjetivos, busca-se uma divisão ainda mais específica dela.
Por exemplo, sendo a comunidade de destino “membros de determinado
sindicato durante a Ditadura Militar”, poderiam ser delimitadas nessa
categoria “colônia” as mulheres filiadas a esse sindicato.
• Redes: aqui, será feita uma subdivisão ainda menor: a categoria colônia
pode ser fragmentada em outras unidades mais específicas referentes ao
objeto de pesquisa, de acordo com a problemática desenvolvida.
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Há também algumas matérias mais sensíveis, que envolvem desde
experiências traumáticas até questões pessoais que podem, via de regra, fazer
com que pessoas se recusem a dar a entrevista. Nesse caso, é importante
planejar algumas alternativas, como outras possibilidades de entrevista em
mente ou alguma documentação complementar às informações esperadas.
Uma vez feita a escolha das pessoas a serem entrevistadas e o contato,
é fundamental também deixá-las à vontade quanto a locais e datas em que
acontecerá a entrevista. Nesse ponto, é necessário lembrarmos de aspectos já
mencionados sobre a história oral dialogar com a Psicologia e sobre o conceito
de comunidade de destino, ou seja, locais específicos podem trazer
determinadas lembranças, ser gatilhos com relação a traumas e mais uma
infinidade de possibilidades que podem até mesmo inviabilizar uma entrevista.
Isso também vale para a datas e possíveis significados subjetivos ou culturais
relacionados a elas.
Além disso, é necessária uma profunda empatia com a pessoa
entrevistada. Isso implica, por exemplo, evitar ao máximo induzir respostas ou
corrigir dados factuais, ainda que toque em temas polêmicos ou problemáticos.
Um exemplo nesse sentido é o livro Ernesto Geisel, que foi produto de 19
sessões de entrevistas com o penúltimo governante do regime militar, feitas
entre 1993 e 1994 por Maria Celina D’Araújo e Celso Castro (1997). É difícil
imaginar que haveria uma boa condução da pesquisa, que resultou em um best-
seller no Brasil, além de grande referência acadêmica no que tange à história
oral e à historiografia da Ditadura Militar, se as entrevistas terminassem em
confrontos de leituras dos historiadores e do militar sobre aquele período.
É fundamental também reforçarmos a importância daquilo que discutimos
sobre a ética no uso das entrevistas e testemunhos orais na pesquisa. Antes de
uma entrevista, autorizações necessárias devem ser pedidas e condições que
forem pedidas devem ser cumpridas. Sem isso, mesmo que a entrevista
aconteça, seu uso e sobretudo a publicação poderão trazer problemas diversos
ao pesquisador/historiador.
Por isso, é imprescindível estar em posse de um termo de autorização de
uso da entrevista. Ele deverá ser assinado pela pessoa entrevistada. Os diversos
núcleos de pesquisa em história oral, centros de pesquisa e programas de pós-
graduação costumam ter seus próprios modelos. Caso não os tenha, o próprio
pesquisador/historiador pode elaborar o seu.
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O que se deve frisar é que o papel do entrevistador é de um especialista
e pesquisador que coleta informações que, posteriormente, serão analisadas e
tratadas como fonte histórica. Por isso, devemos sublinhar novamente que ter
todos os recursos para se gravar adequadamente, de maneira nítida e audível
as entrevistas, é fundamental. Além disso, é importante que o
pesquisador/historiador que trabalha com a história oral tenha um treinamento a
respeito de transcrição de entrevistas, uma atividade bastante trabalhosa e
necessária ao tratamento desse tipo de fonte. Existem alguns softwares, como
o Cogi, o Transcribe, o Speech, o Dragon e o Transana, que são bastante úteis
para transcrever áudios.
NA PRÁTICA
FINALIZANDO
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REFERÊNCIAS
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LOZANO, J. E. A. Prática e estilos de pesquisa na história oral contemporânea.
In: FERREIRA, M. de M.; AMADO, J. Usos & abusos da história oral. Rio de
Janeiro: FGV, 2011.
MATTOS, J. J.; SENNA, A. K. de. História oral como fonte: problemas e métodos.
Historiæ, Rio Grande, v. 2, n. 1, p. 95-108, 2011.
MEIHY, J. C. S. B.; HOLANDA, F. História oral: como fazer, como pensar. São
Paulo: Contexto, 2010.
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