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RESUMO
PALAVRAS-CHAVE
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E-mail:mlmartinelli@terra.com.b
SUMMARY
The aim of this essay is to bring to debate some key elements of Oral History,
including its interfaces with the memory and highlighting its importance in conducting
researches aimed at understanding the historical processes experienced by social subjects.
KEY WORDS
Penetrar nesse denso tecido e conhecer esses sujeitos e seus modos de vida
exige do pesquisador uma postura política, teórico-crítica, no sentido de colocar-se à escuta,
de interrogar os silêncios e de querer efetivamente conhecer a história a partir da narrativa
acerca dos caminhos percorridos por aqueles que estiveram envolvidos com os
acontecimentos que queremos estudar.
Nossas temáticas de estudo não são apenas acadêmicas, são problemáticas sociais,
contêm camadas de história e um rico repertório de histórias de vida, onde se entrelaçam
dimensões políticas da vida pública e privada que só podem ser desvendadas quando nos
dispomos a ouvir histórias pessoais, cotidianas.
Nesta perspectiva, “a memória não é apenas um lugar para recordar” (Portelli, 2002, p.
28) ou para preservar o passado. Muito mais do que isto, é um espaço vivo de lembranças, um
processo de atribuição de significados, um rico potencial para conhecermos a história.
Cada acontecimento individual tem múltiplas relações com os acontecimentos mais
gerais. Ao pesquisador cabe conhecer a interação entre os fatos, entre o antes e o depois do
fato narrado, incluindo “acontecimentos imaginários e falsas recordações”. (Portelli, 2002,
p.10)
Como a história oral não busca generalizações, mas sim explicações históricas e
culturais circunscritas, conhecer essas formas peculiares de entendimento da realidade social é
um importante requisito a ser atendido pelo pesquisador.
O discurso humano e o silêncio, como seu contraponto, são recursos valiosos, que lhe
permitem trabalhar com a dimensão política da subjetividade, pois os fatos são colhidos pela
narrativa dos sujeitos, com todas as suas implicações.
Essas narrativas nos dizem muito sobre o sentido que as pessoas atribuem às suas
experiências, nas quais há certamente dimensões sociais que só são alcançadas quando
historicizamos o sujeito, quando aguçamos o nosso “olhar político sobre o passado” (Sarlo,
2005, p. 58-59), e conseguimos visualizar as perspectivas de futuro presentes em suas
narrativas.
Portelli (2000, 125-134), reportando-se ao estudioso jesuíta Walter J. Ong, afirma que
a oralidade não produz texto, mas performance. Não estamos diante de um discurso
concluído, mas em realização e que, ademais, não obedece a uma cronologia ou a uma lógica
do pesquisador. O que impera é a lógica do sujeito, é a forma pela qual ele mobiliza sua
memória, o que frequentemente ocorre através “de fragmentos, ou melhor, de unidades de
memória que não estão necessariamente conectadas em uma narração, em um relato
cronológico ou em uma sequência lógica, contudo se associam, cada vez de maneira distinta,
buscando uma relação entre eles na criação de sentido que todos estes fragmentos constroem
juntos.” (Portelli, 2002, p. 45)
Por todos estes motivos, não falamos em informantes ou testemunhas, mas sim
em sujeitos, protagonistas históricos, cujas memórias pessoais são de interesse social. A
história oral é também a história da memória que, embora se construa no contexto social, é
sempre memória pessoal.
Todas estas circunstâncias deixam claro que o documento final que decorre de
uma pesquisa realizada com a metodologia da história oral tem peculiaridades que o
caracterizam.
Há uma estética muito especial a ser observada neste momento, pois ao mesmo
tempo em que queremos apresentar a narrativa na sua completude, temos que nos deter em
várias passagens que foram significativas no decorrer da entrevista. Uma pausa, uma lágrima,
um sorriso, uma lembrança fugidia, um silêncio podem ser muito expressivos e merecem
registro, sempre que possível, com as próprias associações de ideias, tempos verbais e
conexões de palavras que o sujeito utilizou.
Afinal, se trabalhamos com a história oral é porque temos um real interesse em
conhecer essas experiências individuais, articulando-as aos processos sociais mais amplos.
Torna-se desnecessário enfatizar que o trabalho com fontes orais deve atender
a todos os cânones científicos, sendo submetido aos procedimentos usuais de tratamento do
material empírico.
Em geral, não se faz pesquisa utilizando um único recurso ou uma única fonte;
a fonte oral é um elemento a mais do qual o pesquisador se vale e que, articuladamente aos
demais, lhe possibilitará construir o texto de sua pesquisa, com vistas aos objetivos
estabelecidos.
Sua tarefa é, então, construir um texto no qual tanto ele quanto os sujeitos
estejam vivamente presentes e que permita lançar luzes sobre os acontecimentos narrados,
reconstruindo sentidos para os fatos passados, através do trabalho da memória, e trazendo
novos registros para a história do tempo presente.
Cabe destacar, também, o crescimento que a história oral teve nas últimas
décadas, expandindo-se pelos diferentes quadrantes do mundo, permitindo que os
pesquisadores se organizassem em associações nacionais e internacionais e se inserissem de
maneira expressiva no contexto acadêmico.
A história não se faz por si só, somos nós que a fazemos com nossas próprias
histórias, com nossas lutas políticas e sociais, pois somos realidade e somos palavra.
O método é uma opção política e decorre de uma teoria, que tem uma direção
social com a qual o pesquisador se identifica a partir de seu projeto político, não há
neutralidade possível. Suas pesquisas devem ser expressões claras de tais posicionamentos,
tendo sempre uma dimensão social mais ampla.
É por isto tudo que podemos afirmar que é possível trabalhar com a história oral na
perspectiva do enfrentamento dos desafios contemporâneos.
• Burke, Peter (org.). A escrita da história. São Paulo, Ed. Unesp, 1992, p. 39-62.
• Hoggart, Richard. The uses of Literacy. Londres, Chatto and Windus, 1957.