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HISTÓRIA DE VIDA

A história de vida é um procedimento de investigação que consiste, fundamentalmente,


numa recolha intensiva de dados de carácter biográfico, sobre uma ou mais pessoas,
sendo que o próprio ou os próprios são a fonte principal da informação, embora não
necessariamente a única.

Segundo, CHIZZOTTI, (2000) «a história de vida é um instrumento de pesquisa que


privilegia a coleta de informações contidas na vida pessoal de um ou vários
informantes».

Segundo CHIZZOTTI (2000), «a história de vida ou relato de vida pode ter a forma
autobiográfica, onde o autor relata suas percepções pessoais, os sentimentos íntimos
que marcaram a sua experiência ou os acontecimentos vividos no contexto da sua
trajetória de vida. Pode ser um discurso livre de percepções subjetivas ou recorrer a
fontes documentais para fundamentar as afirmações e relatos pessoais».

Na história das ciências sociais ela surgiu e difundiu-se pelos anos 20 e 30 do século
XX, nomeadamente no contexto da sociologia americana e no seio de escolas que
procuraram compreender por dentro os fenómenos sociais. A história de vida foi
durante algum tempo desprezada por alguns pesquisadores defensores de técnicas
quantitativas de pesquisa. Contudo, revitalizou-se em seguida principalmente a partir do
final do século XIX e primeiras décadas do século XX “ introduzida pela Escola de
Chicago e desenvolvida por Znaniescki, na Polônia”, como meio sistemático de
pesquisa:

O uso da história de vida como meio de pesquisa tem uma evolução crescente.
Introduzida pela Escola de Chicago, em 1920, e desenvolvida por Znaniescki, na
Polônia, foi preferida pelas técnicas quantitativas e proscrita dos meios de pesquisa. A
partir dos anos 60, a história de vida procura superar o subjetivismo impressionista e
formular o estatuto epistemológico, estabelecer as estratégias de análise do vivido e
constituir se em método de coleta de dados do homem concreto. No contexto da
pesquisa, tende a romper com a ideologia da biografia modelar de outras vidas para
trabalhar os trajetos pessoais no contexto das relações pessoais e definir se como relatos
práticos das relações sociais. (CHIZZOTTI, 2000, p.96).

Como estratégia de pesquisa, insere-se no contexto da abordagem qualitativa de


investigação, sendo utilizada nas mais diversas áreas do conhecimento humano:
Antropologia, história social, psicologia, social, educação e, ainda pelas mais
diferentes escolas de pensamento tais como: Empirismo, marxismo, fenomenologia,
dramaturgia, dentre outras.

Esta técnica procura reduzir o volume amplo de informações contidas em uma


comunicação a algumas características particulares ou categorias conceituais que
permitam passar dos elementos descritivos à interpretação ou investigar a compreensão
dos autores sociais no contexto cultural em que produzem a informação ou, enfim,
verificando a influência desse contexto no estilo, na forma e no conteúdo da
comunicação.
Hoje, apesar de ainda bastante criticada e censurada, principalmente pela estrutura
considerada pouco precisa e pela concepção de ausência ou pouca imparcialidade do
pesquisador e do colaborador frente ao objeto do discurso, a história de vida está muito
presente na literatura científica sendo vista como importante estratégia de pesquisa por
sua capacidade de transformar os objetos de estudo em sujeitos. Característica que pode
contribuir para uma história que não só é mais rica, mais viva e mais comovente, mas
também mais verdadeira. (Thompson, 1992, p. 137).
Ou seja, representa uma maneira de recolar o indivíduo no social e na história: Inscrita
entre a análise psicológica individual e a dos sistemas socioculturais, permitindo captar
o modo pelo qual os indivíduos buscaram as tintas para escrever suas próprias histórias,
modelando a sociedade e ao mesmo tempo sendo moldados por ela, como defende
LAVILLE; DIONE (1999, p. 159)
Seu foco está na coleta de informações da vida pessoal de um ou de vários informantes
objetivando compreender o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou
latente, as significações explícitas ou ocultas. Neste sentido, é uma estratégia que
procura reduzir o amplo volume de informações contidas em uma comunicação a
algumas características particulares que permitam passar dos elementos descritivos à
interpretação, ou investigar a compreensão dos atores sociais no contexto cultural em
que produzem a informação, ou, enfim, verificar a influência desse contexto no estilo,
na forma e no conteúdo da comunicação.
O que se torna perfeitamente possível uma vez que, conforme CHIZZOTTI: « A
proposta metodológica de história de vida, por ser um instrumento de pesquisa, assegura
a cientificidade da técnica, a qualidade das informações recolhidas, seu registro e a
redução do volume de dados a elementos passíveis de análise. Esses cuidados incluem
além da posição atitudinal do entrevistador, formas adequadas de registro, redução e
análise dos dados». (CHIZZOTTI, 2011, p. 95). O importante para o historiador é não
apenas armazenar na memória os fatos, mas também promover um processo ativo de
criação de significações.
A história de vida é categorizada por FERRAROTTI (1983) e BERTAUX (1997),
citados por CHIZZOTTI (2011), como: abordagem biográfica ou método biográfico.
Tal abordagem ou método pode ser concebido como “produção controlada de uma
narrativa sobre a vida de uma pessoa, através de um sistema teoricamente orientado de
procedimentos explícitos”.
Etimologicamente o termo Biografia é de origem no grego βιογραφία, onde βíος ou
bíos , significa vida; tempo ou duração de vida e γράφειν ou gráphein ou grafia que
traduz-se em escrever. A abordagem biográfica dedica-se à descrição ou narrativa da
vida de uma pessoa. Uma biografia reporta-se à extensão da vida do biografado com a
intenção de recontar e de recriar a sua trajetória e história de vida por meio do resgate
da imagem do personagem, de como é, era e foi. A gênese desta abordagem volta-se
para a interpretação de fenômenos trazidos pelo homem tal como foi experienciado por
quem o viveu, tomando o seu ponto de vista como referencia fundamental, tendo como
objetivo obter informações sobre eventos do passado.
O método biográfico oportuniza diferentes maneiras de trabalho ao pesquisador
comportando também diferentes gêneros quais sejam: biografia, autobiografia,
testemunho, etnobiografia, história oral, conforme diz, CHIZZOTI (2011).

HISTORIA ORAL
A história oral é uma história do tempo presente, pois implica uma percepção do
passado como algo que tem continuidade hoje e cujo processo histórico não está
acabado. A presença do passado no presente imediato das pessoas é razão de ser da
história oral.
A história oral é muitas vezes vista, como sendo uma metodologia de pesquisa que
consiste em realizar entrevistas gravadas com pessoas que podem testemunhar sobre
acontecimentos, conjunturas, instituições, modos de vida ou outros aspectos da história
contemporânea, porém é interessante notar que, entre os diversos autores que escrevem
sobre história oral, ou que a utilizam, não há um consenso sobre o seu conceito.
Para, MEIHY (2002) a história oral é um processo sistêmico de uso de depoimentos
gravados, vertidos do oral para o escrito, com o fim de promover o registro e o uso de
entrevistas realizadas com sujeitos que testemunham sobre suas trajetórias, conjunturas,
instituições ou outros elementos da história que compõem a trama histórica de suas
vidas.
Ainda segundo o autor:
«A história oral é um recurso moderno usado para a elaboração de documentos,
arquivamento e estudos referentes à vida social de pessoas.» (MEIHY, 2002, p.13)
Já para ALBERTI (1990, p. 1-2)
História oral é um método de pesquisa (histórica, antropológica, sociológica, etc.) que privilegia
a realização de entrevistas com pessoas que participaram de, ou testemunharam,
acontecimentos, conjunturas, visões de mundo, como forma de se aproximar do objeto de
estudo. Como conseqüência, o método da história oral produz fontes de consulta (as entrevistas)
para outros estudos, podendo ser reunidas em um acervo aberto a pesquisadores. Trata-se de
estudar acontecimentos históricos, instituições, grupos sociais, categorias profissionais,
movimentos, etc, à luz de depoimentos de pessoas que deles participaram ou os testemunharam.
(ALBERTI 1990, p. 1-2)
A técnica da história oral começou a ser utilizada nos Estados Unidos, nos anos de
1950, após a invenção do gravador. Pouco a pouco foi ganhando adeptos entre
profissionais das mais diversas áreas do conhecimento nas ciências humanas e sociais,
como: Antropólogos, sociólogos, pedagogos, cientistas políticos, dentre outros.
Segundo THOMPSON (1992), Jules Michelet foi um dos pioneiros na utilização da
história oral como técnica de pesquisa. Thompson também empregou a técnica para
sistematizar a sua pesquisa no livro “A voz do passado: história oral”, considerado um
clássico, por ser um dos primeiros a abordar a história oral e sua sistematização.
Para MEIHY (1996), a primeira experiência da história oral como atividade organizada
é de 1948, quando o professor Allan Nevis lançou The Oral History Project na
Universidade de Columbia, nos Estados Unidos. Isso se deu depois da Segunda Guerra
Mundial, quando a combinação de avanços tecnológicos com a necessidade de propor
novas formas de captação de experiências importantes como as vividas então por
combatentes, familiares e vítimas dos conflitos passou a indicar uma nova postura dos
pesquisadores em face das entrevistas. Nessa época, o rádio já era um importante meio
de divulgação e as entrevistas tornaram-se populares. O jornalismo, portanto, deu um
auxílio significativo para o avanço da história oral.

«É uma técnica que se constitui em um recurso moderno usado para a elaboração de


documentos, arquivamento e estudos referentes à experiência social das pessoas e de
grupos». (MEIHY, 2005, P. 17). Na qual permite resgatar o indivíduo como sujeito no
processo histórico reativando o conflito entre liberdade e determinismo. Diante desse
aspecto, legitima a história de vida, tornando-a, também, mais verdadeira, pois, devolve
a história às pessoas em suas próprias palavras. Como defende THOMPSON (1992).
Segundo THOMPSON (1992), a história oral, é uma história construída em torno de
pessoas. Ela é a vida para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação.
Admite heróis vividos não só dentre os líderes, mas dentre a maioria desconhecida do
povo; estimula professores e alunos a se tornarem companheiros de trabalho; traz a
história para dentro da comunidade e extrai a história de dentro da comunidade; ajuda
os menos privilegiados, especialmente os idosos, a conquistar dignidade e
autoconfiança; propicia o contato – e, pois, a compreensão – entre classes sociais e entre
gerações.Contribui para formar seres humanos mais completos. (THOMPSON, 1992, p.
44).

Na história oral são levados em consideração os sonhos, angústias, expectativas, enfim,


os sentimentos próprios que contribuíram para elevar, não somente o trabalho
individual, mas a contribuição deixada para a coletividade, como refere ISHII (2008, p.
19).
Considerando que a memória de um pode ser a memória de muitos, tal contribuição, por
meio das diversas vozes, se faz possível, porque jamais estamos sós, sempre levamos
conosco e em nós certa quantidade de pessoas. (HALBWACHS, 2006, p. 30). Nesse
sentido, a partir do passado, a história oral permite construir novas perspectivas para o
resgate de homens e mulheres como sujeitos protagonistas no processo histórico.
Dinâmica esta que talvez não fosse executável se não por meio do resgate da memória,
instrumento precioso se desejamos constituir a crônica do quotidiano. O resgate da
memória é essencial, pois são nas reminiscências que se encontram recursos passados,
experiências esquecidas que ajudam a lidar com o novo. Pode-se dizer que, pelo resgate
da memória, os sujeitos reconstroem seu elo com o mundo e com sua origem, dando um
significado nas suas vidas e fortalecendo o sentimento de pertença ao mundo, que,
muitas vezes, os colocam à margem da vida.
Deste modo torna-se necessário a validade e significância da técnica da história oral
uma vez que possibilita o registro das memórias individuais, a reinterpretação do
passado, enfim, uma história alternativa à história oficial essencial para a recuperação
do vivido e do construído ao longo da história da humanidade e dos sujeitos que a
compõem dando-lhes vida e colorido e ao mesmo tempo sendo coloridos e ganhando
vida nela.
A história oral se apresenta como forma de captação de experiências de pessoas
dispostas a falar sobre aspectos de sua vida mantendo um compromisso com o contexto
social. A base da história oral é o depoimento gravado; portanto, os três elementos que
constituem a condição mínima da história oral são:
1. O entrevistador (que pode ser mais de um);
2. O entrevistado (que podem ser vários);
3. A aparelhagem de gravação ou seja o gravador (que pode ser apenas de som,
como também de imagem, com filmagens, envolvendo outros participantes,
além do entrevistador, e com outras implicações).

Na história oral, o entrevistado é, ele próprio, um agente histórico, fazendo-se assim, de


suma importância resgatar sua visão acerca de sua própria experiência e dos
acontecimentos sociais dos quais participou. Pois, embora seja o pesquisador que
escolhe o tema e que formule as questões esboçando um roteiro temático, é o narrador
que decide o que e como narrar

Para MEIHY (1996), há três modalidades de história oral:


I. História oral de vida
II. História oral temática
III. Tradição oral.

Na história oral de vida, o sujeito tem maior autonomia para dissertar o mais livremente
possível sobre sua experiência pessoal; a ele é dado espaço para que sua história seja
encadeada segundo a sua vontade.

Na história oral temática há maior objetividade: A partir de um assunto específico e


preestabelecido, busca-se o esclarecimento ou opinião do entrevistado sobre algum
evento definido. Ela tem características bem diferentes da história oral de vida, pois
detalhes da vida pessoal do narrador apenas interessam na medida em que revelam
aspectos úteis à informação temática central.

Na tradição oral, o foco é a permanência dos mitos, a visão de mundo de comunidades


que têm valores filtrados por estruturas mentais asseguradas em referências do passado
remoto, que se manifestam pelo folclore e pela transmissão geracional.

A grande potencialidade da história oral, segundo Freitas (2002), é que ela permite a
integração com outras fontes, a confrontação entre as fontes escritas e orais e sua
utilização multidisciplinar.
Segundo ALBERTI (1990), «fazer história oral não é simplesmente sair com um
gravador em punho, algumas perguntas na cabeça, e entrevistar aqueles que cruzam
nosso caminho dispostos a falar um pouco sobre suas vidas».(ALBERTI , 1990, p. 29).
Uma vez que o simples fato de gravar depoimentos não exime o pesquisador da
atividade e da responsabilidade com a prática da pesquisa, realizar história oral exige
um caminho, um método, procedimentos a serem seguidos, como:
 O local e horário para coleta da narrativa são definidos pelo entrevistado,
devendo-se evitar locais públicos.
 O pesquisador define o tema e dirige a entrevista por meio de um guião
previamente estabelecido, evitando interrupções, questionamentos duplos e
fazendo uma pergunta de cada vez não prejudicando a reconstituição mental do
período vivido pelo entrevistado. Não discordar do narrador e não induzir
respostas ou complementá-las é condição.
 Evitar prosseguir caso o entrevistado apresente sinais de cansaço, de fadiga,
também é essencial, demonstra sensibilidade e respeito pelo outro. Nesse caso,
não prejudica os resultados da pesquisa marcar um novo encontro.
 Registrar os depoimentos em fitas ou equipamentos digitais, imagem e som.
Pois, o registro das experiências vividas pelos sujeitos sociais que contribuem
para a compreensão do passado recente é também documento histórico.
 As entrevistas devem ser gravadas e transcritas. A transcrição deve ser fidedigna
a fala do entrevistado. Deve haver legitimação, conferência e autorização dos
direitos de uso do depoimento por meio da assinatura de uma carta de
autorização.

Quanto ao número de sujeitos colaboradores na história oral, este é orientado, em um


primeiro momento, pelos objetivos da pesquisa, sendo necessária a escolha de
entrevistados que efetivamente possam contribuir no alcance dos objetivos propostos.
Não há um número preciso a ser delimitado, nem tampouco se preza pelo quantitativo, a
seleção deve preocupar-se com a posição do entrevistado no grupo, no universo da
pesquisa, no significado que sua experiência pode ter e trazer no desvelamento do
objeto da pesquisa. Deste modo, «convém selecionar os entrevistados entre aqueles que
participaram, viveram, presenciaram ou se inteiraram de ocorrências ou situações
ligadas ao tema e que possam fornecer depoimentos significativos». (ALBERTINI,
1990, p. 31-2).

Nesta medida, a história oral não só oferece uma mudança para o conceito de História,
mas, mais do que isto, ela garante sentido social à vida de depoentes e leitores que
passam a entender a seqüência histórica e a sentirem-se parte do contexto em que
vivem. Ela é uma alternativa à história oficial, consagrada por expressar interpretações
feitas, quase sempre, com o auxílio exclusivo da documentação escrita e oficial.

A história oral é um conjunto de procedimentos que se inicia com a elaboração de um


projeto e continua com a definição de pessoas a serem entrevistadas, com o
planejamento da condução das gravações, com a transcrição, com a conferência do
depoimento, com a autorização para o uso, arquivamento e com a publicação dos
resultados os quais, regra geral, devem, a priori, voltar aos entrevistados para revisão.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
CHIZZOTTI, Antônio. 4ªed. São Paulo. Cortez, 2000 «PESQUISA EM CIÊNCIAS
HUMANAS E SOCIAIS»
THOMPSON, Paul. 3ª Ed. Paz e Terra, 2002. « A VOZ DO PASSADO: HISTORIA
ORAL»
LAVILLE, Christian; DIONE, Jean. 1ª Ed. São Paulo. UFMG, 1999. « A
CONSTRUÇÃO DO SABER».
ALBERTI, V. 2 Ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2004. «MANUAL DE
HISTÓRIA ORAL».
MEIHY, J.C.S.B. São Paulo: Loyola, 2002. «MANUAL DE HISTÓRIA ORAL»
FERREIRA, Marieta de Moraes (Coordenação); ABREU, Alzira Alves.1ª Ed. Rio de
Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1998. «ENTRE-VISTAS: Abordagens e usos da
história oral».

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