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A perspectiva liberal
Alguns estudiosos afirmam nño existir uma teoria liberal da econOmia po-
litica, porque o liberalismo distingue a economia da politica e entende que
cada esfera funciona de acordo com regras e lñgica prsprias.' Mas esse ponto
de vista é em st mesmo uma posipño ideolñgica, e os tefiricos do liberalismo
preo- cupam-se tanto com os assuntos politicos como com os economicos. Assim,
podemos falar de uma teoria liberal da economia politica, teoria esta que esta
explicita on implicita nos seus escritos.
Por tras das teorias liberais da economia e da politica ha um conjunto de
valores politicos e econñmicos, os quais no mundo modemo tern surgido
reunidos (Lindblom, 1977). A teoria econsmica liberal esta comprometida
com o livre mercado e com um ivinimo dc intcrven ao estatal, embora,
conforme vamos mostrar mais adiante, varie a énfase relativa nessas duas
idéias. De seu lado, a teoria politica liberal tern um compromisso com a
igualdade e a liberdade individu- als, embora também possa haver uma
diferenpa de énfase. Aqui estamos inte- ressados primordialinente no
componente eeonomico da teoria liberal.
A perspectiva liberal da economia politica esta incorporada na disciplina
da economia comu eta sc desenvolveu no Reino Unido, nos Estados Unidos e
na Europa Ocidental. Desde Adam Smith ate os contemporaneos, os pensado-
res libera is tém compartilhado um conjunto coerente de premissas e cren§as
sobre a natureza dos seres humanos, a sociedade e as atividades econñml-
cas. O liberalismo ja assumiu muitas formas — tivemos o liberalismo
classico, neoclassico, keynesiano, monetarista, austriaco, das expectativas
racionais, etc. Essas variantes incluem desde as que priorizam a igualdade e
tendem para a democraeia social, e aceitam o intervencionismo estatal para
alcan ar seus objetivos, ate aquelas que enfatizain a llberdade e a nño-
intervenpio governa- mental, a custa da igualdade social. No entanto, todas as
formas do I beralismo economieo estño comprometidas com o mercado e
com o mecanismo dos pre- Nos como o meio mais eficiente de organizar as
relapñes economicas internas e internacionais. Com efeito, o liberalismo pode
ser definido como uma doutrina e um conjunto de principios para organizar e
admin›strar uma economia de mer- cado, de modo a obter o maximo de
eficiéncia, crescimento econñmieo e bem- estar individual.
0 termo “liberal" é usado ncste i ivro no sentido europeu, isto é, significando o compromisso
com o individualismo, o livre mercado e a propriedade privada. Essa é a perspectiva predomi-
name namaioriadoseconomistasnone-americanose
nadiscplnadaeconomiaconformec ensinada nas universidades dos Estados Unidos. Assim,
a despeito de difere• sas importances
nas suas idéias pallticas e teoricas, tanto Paul Samuelson como Milton Friedman sâo conside-
rados aqui coino reprcsentantes da tradigño liberal norte-americana.
A economia politica das rel a oes internacionais 45
' O método da eslatica comparativa foi in ventado por David Ricardo. Consiste em um
modelo de iriercado em estado de equi!ibrio, no qua I e introduzida uma varia vet exñgena,
calculando-se o novo estado de equilibrio. Como de modo geral essa forma de analise nio
A economia politica das rela oes interrtacionais 4
se preocupa com as origens da variavel exñgena, seu uso fica l imitado ao exame do proble-
ma das mudan9as na economia.
5 Robert Gi I
A perspective nacionalista
' Podemos identificar Friedrich List corn a posipño mercantilista benigna. h.ist acrcditava que o
verdadeiro cosinopol itismo so seria possivel quando todos os paises se tivesseni desenvoivi-
do. Vide uma discussâo sobre o mercantilismo benigno e malévolo em Gilpin 1975, p. 234-
5 Robert Gi I
237 e no Cap. 10, adiante.
A economi a politica das relagoes i nternacionais 5
A perspectiva marxista
' Embora houvesse diferen9as importantes entre o pensamcnto de Engels e o de Marx, ao longo
desta discussño vou tomar os escritos de Marx como contribui ño conjunta de airbos.
5 Robert G il
capital pelo capital, ou seja, do capital industrial pelo capital financeiro, represen-
tava o estagio mais avanpado do desenvolvimento capitalista.
Para ele, o capitalismo tinha escapado das trés leis que o dirigiam pelo
imperialismo ultramarino. A aquisipao de colñnias dera as economias
capitalis- tas a possibilidade de dispor das mercadorias produzidas e que nao
encontra- vam mercado dentro dos seus paises; de adquirir re(:::rsos a baixo
custo e exportar seu excesso de capital. E a exploraqao des: a: colonias
proporcionaria mais-valia adicional com a qual os capitalistas poderio i› .,
âquirir a lideranpa do seu prñprio proletariado. Para Lenin, o imperialismo
colonialista passara a ser uma caracteristica necessaria do capitalismo
avangado. A medida que suas fork as produtivas se desenvolviam e
amadureciam, a economia capitalista pre- cisava expandir-se no exterior e
capturar colñnias para nao ser vltimada pela estagnapño e pela revoluqño.
Lenin identificava essa expansao necessaria como a causa da destrui ao
eventual do sistema capitalista internacional.
A esséncia do argumento de Lenin é o de que a economia capitalista
inter- nacional promove o desenvolvimento mundlal, mas de forma desigual,
As eco- nomias capitalistas crescem com taxas diferenciadas, e esse aumento
diferen- cial do poder nacional é responsavel pelo imperialismo, pela guerra e
pelas mudanpas political internacionais. Ao reagir ao argumento de Kautsky de
que os capitalistas eram por demais racionais para entrar em conflito a
propñsito das colfinias, e se associariam na exploragño conjunta dos povos
coloniais (a doutrina do “ultra-imperialismo”), Lenin afirma que isso era
impossivel pelo que se tornou conhecido como a “lei do desenvolvimento
desigual”:
7
Pile B laug (1978, p. 717) sobre o emprego de hipoteses ad hoc para explicar previsñes
equivocadas.
6 Robert Grip
Cada uma das trés perspectivas que descrevemos tern pontos fortes e
fracos, que vamos explorar mais adiante. Embora nenhuma dcJas nos propor-
cione uma compreensao tompleta e satisfatoria da natureza e do dinamismo
da economia politica intemacional, em conjunto, ela s nos dao uma boa visao
desse aspecto da realidade, e também levantam questñes que serao desen-
volvidas nos capitulos seguintes.
' l4a muitos livros sobre a economia politica das tarifas e de outras formas de protecionismo
comercial, com o objetivo de produzir recursos. Como jâ notamos, o tema do processo de
forinapño da politica econñmica excede o escopo deste trabalho. Grey ( 1984b) apresenta
uma cxcclente discussño dessa abordagem a politica tarifaria e a assuntos correlatos.
A economia politica das rela§oes internacionais 6
Cornwall (l 977) propse mm argumento representativo das vantagens da industria com rela to
a agricultura no desenvolvimento econñmico.
6 Robert 6
dades puderam se desenvolver sem passar antes por uma revolu ao agricola, a
qual lhe den um nivel elevado de produtividade no campo (Lewis, 1978a).
Com efeito, algumas das economias mais prñsperas como a Dinamarca, o
farm belt norte-americano e o Canada ocidental estao baseadas em uma
agricultura efi- ciente (Viner, 1952). Além disso, em todas essas sociedades
for o Estado que promoveu o desenvolvimento agricola,
Conclui-se, assim, que os nacionalistas estao essencialmente corretos na
sua crenpa de que o Estado precisa ter um papel importante no
desenvolvimen- to econsmico. E preciso um Estado forte para promover a
indñstria e, em al- guns casos, para protege-la, assim como para criar uma
agricultura eficiente. Contudo, embora esse papel ativo do Estado seja uma
condipao necessaria, nño é suficiente. A existéncia de um Estado forte e
intervencionista nao garan- te por si so o desenvolvimento econsmico; na
verdade, pode mesmo retarda-lo. A condipao suficiente é uma organizapño
econñmica eficaz da agricultura e da industria, e na maioria dos casos isso se
consegue por meio do mercado. Essas duas condipñes politicas e econñmicas
tém caracterizado as economias desen- volvidas e os paises de rapida
industrializapño no sistema intemacional contem- porñneo.
E importante perceber que, quaisquer que sejam seus méritos ou suas de-
ficiéncias relativas, o nacionalismo etonfimico tern um apelo persistente. Em
toda a histfiria modema, a localizapao intemacional das atividades
econñmicas tern sido uma preocupapño importante dos Estados, os quais
desde o século XVII tém seguido politicas conscientes de desenvolvimento
industrial e econS- mico. Mas, para conseguir um poder militar estavel e
movido pela cren a de que a indñstria oferece um maior “acréscimo de valor”
a produpao do que a agricultura {vide Cap. 3, nota 26), o Estado nacional
moderno adotou como um dos seus objetivos mais importantes a criapiio e a
protepao do poder industrial. Enquanto eKistir um sistema intemacional
competitivo, o nacionalismo econñ- mico continuara a exercer uma forte
atrapño.
' O volume editado por Krasner (! 982c) contém uma ampla discussâo do conceito dos
regimes intemacionais.
7 Robert
' ' Wiles (1968) apresenta uma analise valiosa do comportamento contrastante das economias
capitalistas e comunistas.
A economia politica das rela§oes internacionais 7
'' Herbert Feis (1964 [1930] e Eugene Staley (1935) apresentaram efetivamente esse argu-
A economia politica das 7â
7 Robert G i1 rela§oes internacionais
foi um século de Pax Brifannica que terminou quando a metr‹ipole mais im-
portante passou a nao poder mais liderat e a impor a sua paz em uma parte
tño ampla do mundo” (idem, ibidem). Parece impossivel dizer mais do que
isso sobre as relapñes entre o crescimento econfimico e os conflitos militares.
'° Michael Doyle (1983) argumentou, em excelente artigo dividido em duas partes, que as
econo- mias liberais (que ele, ao contrârio de Schumpeter, distingue das economias
capitalistas) tém de fato pouca propensño para a guerra, comparativamente a outras
sociedades liberais.
7 Robert
T BELA
Anula$ño das leis marxistas pelo welfare state
' Rousseas (1979) contém uma excelcnte exposi9ao das suas ideias.
A economia politica das rela§oes internacionais 8
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