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TORNE-SE PRESENTE

Não confia no futuro, por agradável que seja!


Deixa o passado morto enterrar seus mortos!
Age — age no presente vivo!
Coração dentro, e Deus no alto!
— HENRY WADSWORTH LONGFELLOW

A decisão, em 2010, de intitular a retrospectiva das quatro décadas da carreira de


Marina Abramović no MoMA, em Nova York, de A artista está presente foi
influência para a monumental performance criada para o evento. Naturalmente,
Marina precisaria estar presente de uma maneira ou de outra.
Mas ninguém teria ousado pensar que ela de fato estaria lá... o tempo todo.
Quem conceberia que um ser humano poderia ficar sentado em silêncio numa
cadeira, completamente imóvel, por um total de 750 horas durante 79 dias, em
frente a 1.545 estranhos, sem ajuda, sem distração, sem sequer ir ao banheiro?
Quem imaginaria que ela iria querer fazer isso? Que ela conseguiria?
Como seu ex-companheiro e colaborador Ulay disse quando lhe perguntaram
o que pensava da possibilidade: “Não tenho opiniões, somente respeito.”
A performance foi tão simples quanto direta. Marina, de 63 anos, seu cabelo
longo trançado e sobre o ombro, entrava naquela sala enorme, sentava-se numa
cadeira dura de madeira e apenas olhava fixamente para a pessoa diante dela.
Elas chegaram uma após outra, hora após hora, dia após dia, por quase três
meses. Após cada uma, ela baixava os olhos, recompunha-se e em seguida
voltava a olhar para o novo rosto.
Como Marina diria sobre sua arte: “A proposta aqui é apenas esvaziar o eu.
Ser capaz de estar presente.”
Será assim tão difícil estar presente? O que há de tão especial nisso?
Ninguém no público que se sentou em frente a ela faria perguntas como essas.
Para aquelas almas afortunadas o bastante para ver a performance pessoalmente,
foi quase uma experiência religiosa. Vivenciar outra pessoa por completo no
momento é uma coisa rara. Senti-la envolver-se com você, dando toda a energia
a você, como se não houvesse mais nada que importasse no mundo, é ainda mais
raro. Ver alguém fazer isso por tanto tempo, tão intensamente?
Muitos espectadores choraram. Todos disseram que as horas na fila valeram a
pena. Era como olhar numa espécie de espelho, onde eles podiam sentir sua
própria vida pela primeira vez.
Imagine: se a mente de Marina se deixasse levar, se ela devaneasse, a pessoa
diante dela imediatamente sentiria que a artista estava em algum outro lugar. Se
ela desacelerasse demais a mente e o corpo, poderia adormecer. Se ela se
permitisse ter sensações físicas normais — fome, desconforto, dor, necessidade
de ir ao banheiro —, seria impossível não se mover ou levantar. Se tentasse
adivinhar quanto tempo de performance restava no dia, o tempo se reduziria a
um arrastar intolerável. Assim, com a disciplina de um monge e a força de um
guerreiro, ela ignorava essas distrações para existir exclusivamente no momento
presente. Precisava estar onde estavam seus pés, precisava se importar com a
pessoa à frente e com a experiência compartilhada acima de tudo.
“As pessoas não entendem que o mais difícil na verdade é fazer algo próximo
de nada”, disse Abramović sobre a performance. “Exige tudo de você... não há
nenhum objeto atrás do qual se esconder. É só você.”
Estar presente exige tudo de nós. Não é nada. Talvez seja a coisa mais difícil
do mundo.
Quando estamos no pódio, prestes a fazer um discurso, nossa mente está
concentrada não em nossa tarefa, mas no que todos vão pensar de nós. Como é
que isso não afeta nosso desempenho? Quando enfrentamos uma crise, nossa
mente repete em looping como aquilo é injusto, como é insano que continue
acontecendo e que não pode continuar assim. Por que estamos nos esvaziando de
energias emocionais e mentais essenciais justo quando mais precisamos delas?
Mesmo durante um entardecer tranquilo em casa, tudo em que pensamos é a
lista de melhorias que precisam ser feitas. Pode haver um belo pôr do sol, mas,
em vez absorvê-lo, estamos tirando uma foto dele.
Não estamos presentes... por isso acabamos perdendo a chance. De viver. De
ser o melhor que podemos. De ver o que está ali.
Muitas das pessoas na fila para ver a performance de Marina Abramović
acidentalmente ilustram esse fenômeno. Entrando apressadas ao abrir das portas,
elas passaram voando por obras igualmente impressionantes da carreira da
artista, pois assim seriam as primeiras na obra “especial”. Na fila, permaneciam
agitadas, conversando umas com as outras para matar o tempo de espera.
Cochilavam, apoiadas umas nas outras. Checavam seus celulares... e depois os
checavam de novo. Imaginavam as reações que teriam na vez delas e
especulavam sobre como seria. Algumas planejavam em segredo pequenos
estratagemas que esperavam lhes render quinze segundos de fama.
Para quantas maravilhas corriqueiras elas fechavam suas mentes?
Isso nos faz pensar. Depois que as pessoas tinham sua experiência
transcendental com Marina — ficar face a face com uma verdadeira presença —,
quando deixavam o museu e entravam numa rua movimentada de Nova York,
será que elas respiravam de um modo diferente o ritmo vibrante da selva urbana,
ou, o mais provável, retomavam imediatamente suas vidas agitadas, cheias de
distração, ansiedade, sonhos, inseguranças e ego?
Em suma, será que faziam exatamente o que todos nós fazemos quase todos os
dias?
Nós não vivemos neste momento. Nós, na realidade, tentamos
desesperadamente sair dele — pensando, fazendo, falando, nos preocupando,
lembrando, esperando, seja o que for. Pagamos somas enormes para ter em nosso
bolso um aparelho que garanta que nunca fiquemos entediados. Inscrevemo-nos
em inúmeras atividades e assumimos um sem-fim de obrigações, corremos atrás
de dinheiro e realizações, tudo com a crença ingênua de que no fim disso haverá
felicidade.
Tolstói observou que o amor não pode existir no futuro. O amor só é real se
estiver acontecendo agora mesmo. Refletindo com cuidado, percebe-se que isso
serve para basicamente tudo que pensamos, sentimos ou fazemos. Os melhores
atletas, nos melhores jogos, estão completamente lá. Eles estão dentro de si
mesmos, dentro do agora.
Lembre-se, não há grandeza no futuro. Ou clareza. Ou inspiração. Ou
felicidade. Ou paz. Só há este momento.
Não que ele dure literalmente algum tempo exato. O verdadeiro momento
presente é aquele em que escolhemos existir, em vez de nos demorarmos no
passado ou nos inquietarmos com o futuro. Sua duração é o intervalo em que
conseguimos afastar tanto as impressões do que aconteceu antes quanto os
temores e as expectativas sobre o que pode vir a ocorrer. O agora pode durar
alguns minutos, uma manhã ou um ano — se você puder ficar nele tanto tempo.
Como disse Laura Ingalls Wilder, o agora é agora. Nunca pode ser qualquer
outra coisa.
Agarre-o!
Quem é tão talentoso a ponto de se dar ao luxo de permitir que apenas parte de
si lide com um problema ou uma oportunidade? Cujos relacionamentos são tão
sólidos que ele pode ser ausente e sair impune? Quem tem tamanha certeza de
que virá um outro momento e que por isso pode deixar este passar? Quanto
menos energia desperdiçamos nos arrependendo do passado ou nos preocupando
com o futuro, mais energia temos para nos dedicar ao que está à nossa frente.
Queremos aprender a enxergar o mundo como um artista: enquanto os outros
estão alheios a tudo ao redor, o artista vê de verdade. Sua mente, inteiramente
empenhada, percebe a maneira como um pássaro voa, como um desconhecido
segura o garfo ou como uma mãe olha para o filho. O artista não tem
pensamentos sobre o dia seguinte. Dedica-se apenas a capturar e comunicar esta
experiência.
Um artista está presente. E é dessa quietude que vem o brilhantismo.
Este momento que estamos vivenciando agora mesmo é uma dádiva (é por
isso que o chamamos de presente). Ainda que seja uma experiência estressante e
penosa — poderia ser a nossa última. Por isso é preciso desenvolver a
capacidade de estar nele, de usar todos os nossos recursos para apreciar a
plenitude do agora.
Não rejeite um momento difícil ou irritante por ele não ser exatamente o que
você quer. Não desperdice um belo momento por insegurança ou timidez. Faça o
possível com o que lhe foi dado. Viva o que pode ser vivido. É isso que é
excelência. É isso que a presença proporciona.
Na meditação, os professores instruem os alunos a se concentrarem na
respiração. Para dentro e para fora. Para dentro e para fora. Nos esportes, os
treinadores falam sobre “o processo” — essa jogada, esse exercício, essa
repetição. Não apenas porque o agora é especial, mas porque não dá para fazer o
seu melhor se a mente estiver em outro lugar.
Seria bom se seguíssemos isso em nossa vida. Jesus disse a seus discípulos
para não se preocuparem com o amanhã, pois o amanhã cuidará de si mesmo.
Outra maneira de expressar isso é: você tem coisas o bastante com que lidar
agora mesmo. Concentre-se nisso, não importa o quanto seja pequeno ou
insignificante. Faça o melhor que pode agora mesmo. Não imagine o que as
pessoas poderão dizer. Não pense demais ou complique desnecessariamente.
Esteja aqui. Seja você por completo.
Esteja presente.
Você teve dificuldade com isso no passado? Tudo bem.
O bom a respeito do presente é que ele continua aparecendo para lhe dar uma
nova oportunidade.

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