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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

RODRIGO LUÍS RIGUETO

O TRABALHO DO PROFESSOR COORDENADOR


NA ESCOLA PÚBLICA PAULISTA – A FORMAÇÃO
DE UMA IDENTIDADE

CAMPINAS/SP
2016
RODRIGO LUÍS RIGUETO

O TRABALHO DO PROFESSOR COORDENADOR


NA ESCOLA PÚBLICA PAULISTA – A FORMAÇÃO
DE UMA IDENTIDADE

Dissertação de Mestrado apresentada


ao Programa de Pós-Graduação em
Educação da Faculdade de Educação
da Universidade Estadual de
Campinas para obtenção do título de
Mestre em Educação, na área de
concentração de Ciências Sociais na
Educação.

Orientador: Profa. Dra. Ivany Rodrigues Pino

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL


DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO
RODRIGO LUÍS RIGUETO, E ORIENTADA PELA
PROFA. DRA. IVANY RODRIGUES PINO

CAMPINAS/SP
2016
FICHA CATALOGRÁFICA
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

O TRABALHO DO PROFESSOR COORDENADOR


NA ESCOLA PÚBLICA PAULISTA – A FORMAÇÃO
DE UMA IDENTIDADE

Autor: Rodrigo Luís Rigueto

COMISSÃO JULGADORA:

Profa. Dra. Ivany Rodrigues Pino

Prof. Dr. José Roberto Montes Heloani

Profa. Dra. Luciana Cristina Salvatti


Coutinho

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

2016
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha esposa Ana


e a minha filha Marina que durante esse
longo percurso suportaram, não somente
minha ausência física, mas também
minha ausência como esposo e pai.
Obrigado pela paciência, dedicação,
compreensão e por não desistirem de
mim. Amo vocês.
AGRADECIMENTO

Nos semestres em que, entre exaustivas idas e vindas à UNICAMP, tive a


oportunidade de conhecer e conviver com pessoas de singular beleza, com histórias
de superação e conquistas. Pessoas com as quais compartilhei prazerosas
conversas, longos cafés, rápidos almoços e cochilos nos assentos dos ônibus.
Pessoas que partilhei momentos de alegria, prazer e satisfação por estarmos,
naquele momento de nossas vidas, em um universo privilegiado pelo conhecimento.
Pessoas que dividi a saudade de casa, da família e dos amigos próximos quando
esse sentimento me invadia o peito. Muitas vezes me indaguei as razões pelas quais
eu estava ali. Nessas horas, a palavra amiga, a escuta atenta, o olhar sincero e os
gestos de carinho foram essenciais para que caminhada prosseguisse com fôlego
renovado. Pelas trilhas do mundo acadêmico em busca não só de uma certificação,
mas de um rico e imensurável saber, momentos e sentimentos fundiram-se em meu
ser. Vocês serão, para sempre, parte da minha história de vida. Grato por nossos
caminhos se entrelaçarem.

E as aulas!!! Não consigo encontrar uma palavra para expressar meu


sentimento pelos professores e professoras que compartilharam seus
conhecimentos. Conhecimento conquistado por anos de dedicação e pesquisa.
Talvez tal palavra não exista. Mas saibam, Debora Mazza; Vicente Rodriguez; Nora
Rut Krawczyk; Aparecida Neri de Souza; José Roberto Rus Perez; Débora Cristina
Jeffrey; Marta Leandro da Silva; Evaldo Piolli e; José Roberto Montes Heloani, que
serei eternamente grato pelos vossos ensinamentos. Muito obrigado.

A tensão, o medo e a ansiedade que anteciparam o momento da qualificação


e da defesa foram suavizados pela gentileza e pela conduta que Vicente Rodriguez,
Luciana Cristina Salvatti Coutinho e José Roberto Montes Heloani tiveram durante
esses processos. Muito obrigado pelas palavras e orientações.

E o que dizer de Ivany Rodrigues Pino, orientadora exigente, perfeccionista e


com uma sensibilidade e percepção ímpares. O que seria de mim sem você nessa
longa jornada pelo emaranhado caminho do conhecimento e da vida? Querida Ivany,
muitíssimo obrigado pelos ricos e inesquecíveis momentos nos quais você
sabiamente me orientou. Sou imensamente grato por suas palavras sinceras e pela
confiança concedida. Novamente, muitíssimo obrigado.

Aos amigos e colegas que conviveram comigo durante essa jornada, não é
preciso citar nomes, vocês também foram essenciais para que esta etapa fosse
concluída. Muito obrigado pelos “pedais”, pelas corridas, pelos “rolas”, pela
paciência, pelas conversas e pelo apoio irrestrito. Grato.
RESUMO

O presente estudo objetiva compreender a formação da identidade profissional do


professor coordenador no contexto das reformas educacionais ocorridas no período
de 2007 à 2014 no sistema público de ensino do Estado de São Paulo. Tais
reformas introduziram e aperfeiçoaram elementos da gestão gerencialista, trazendo
para dentro da escola pública paulista uma visão empresarial e mercantil de
educação, promovendo, entre outros aspectos, a competitividade e a
individualização nas relações entre os indivíduos. Ao considerarmos que a
construção identitária de um indivíduo se concretiza na alteridade, por conseguinte,
ele vem a constituir identidades pela interação com outros indivíduos no interior dos
diversos grupos sociais aos quais ele possa vir a pertencer. Os aspectos
competitivos e individualistas podem vir a constituir uma identidade profissional
fragilizada do professor coordenador no interior da escola. Durante a pesquisa,
pudemos observar o trabalho do professor coordenador como uma importante peça
na implantação, na implementação e no monitoramento das políticas contidas no
corpo dessas reformas educacionais, situando-o como um articulador entre os
interesses da escola e os da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo.

Palavras chave: Reforma educacional; Organização do trabalho; Professor


coordenador; Identidade.
ABSTRACT

This study aims to understand the formation of professional identity of the coordinator
teacher in the context of educational reforms from 2007 to 2014 in the public system
of São Paulo State education. Such reforms introduced and perfected elements of
managerial management, bringing in the São Paulo public schools a business and
commercial vision of education by promoting, among other things, the
competitiveness and individualization in relations between individuals. When we
consider that the identity construction of an individual is realized in otherness,
therefore, it comes to form identities through interaction with other individuals within
the various social groups to which he can come to belong. Competitive and
individualistic aspects may prove to be a professional identity weakened coordinator
teacher in the school. During the research, we observed the work of the coordinator
teacher as an important part of the deployment, implementation and monitoring of the
policies contained in the body of these educational reforms, placing it as an
articulator of the school's interests and the Department of Education State of Sao
Paulo.

Keywords: educational reform; Organization of work; Teacher coordinator; Identity.


LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Número de artigos sobre o professor coordenador.............................. 20


Tabela 2 – Descrição dos artigos sobre o professor coordenador......................... 21
Tabela 3 – Documentos normativos utilizados na pesquisa.................................. 51
Tabela 4 – Descrição função professor coordenador e coordenador pedagógico 61
Tabela 5 – Relação dos volumes do Caderno do Gestor....................................... 84
Tabela 6 – Professor coordenador por tempo de serviço na função...................... 114
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira


SEE/SP – Secretaria Estadual da Educação do Estado de São Paulo
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
Scielo – Scientific Electronic Library Online
USP – Universidade de São Paulo
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
UNESP – Universidade Estadual Paulista
MGME – Melhor Gestão, Melhor Ensino
AI-5 – Ato Institucional número 5
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
ANDE – Associação Nacional de Educação
ANPEd – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade
CBE – Conferências Brasileiras de Educação
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC – Ministério da Educação
SARESP – Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
UE – Unidade Escolar
ONG – Organização Não Governamental
HTPC – Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo
DE – Diretoria de Ensino
IDESP – Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo
ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio
CENP – Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas
EVESP – Escola Virtual de Programas Educacionais do Estado de São Paulo
ATPC – Atividade de Trabalho Pedagógico Coletivo
PCNP – Professor Coordenador do Núcleo Pedagógico
IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
MARE – Ministério da Administração Federal e de Reforma do Estado
SE – Secretaria de Educação
OMC – Organização Mundial do Comércio
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica
Unicef – United Nations Children's Fund (Fundo das Nações Unidas para a Infância)
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ..................................................................................................... 13
CAPÍTULO 1 – AUTONOMIA E REGULAÇÃO NA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
.................................................................................................................................. 26
1.1. O controle dos meios de produção e suas prováveis consequências ............ 26
1.2. Autonomia e responsabilização como forma de regulação na organização do
trabalho .................................................................................................................. 29
CAPÍTULO 2 - A FORMAÇÃO DE UMA IDENTIDADE – UMA RELAÇÃO ENTRE O
“EU” E O “OUTRO” ................................................................................................... 35
2.1. A comunicação como meio para o ‘eu’ se fazer compreensível ao ‘outro’ ..... 35
2.2. A organização, o ‘outro’ e o ‘eu’ ...................................................................... 41
CAPÍTULO 3 - METODOLOGIA................................................................................ 45
3.1. Procedimentos e Participantes do Estudo ...................................................... 51
3.2. Categorias de análise ..................................................................................... 56
CAPÍTULO 4 - A SEE/SP E A CONSTITUIÇÃO DO ESPAÇO/TEMPO DO
TRABALHO DO PROFESSOR COORDENADOR.................................................... 59
4.1. As décadas de 1970 e 1980 ........................................................................... 59
4.2. A década de 1990 ........................................................................................... 67
4.3. O Novo Milênio – O Professor Coordenador dos anos 2000 a 2014 .............. 73
CAPÍTULO 5 - A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DO PROFESSOR
COORDENADOR NA ESCOLA ................................................................................ 91
5.1. Gestão Pedagógica – Autonomia entre restrições e/ou privações: um sistema
paradoxal ............................................................................................................. 101
CAPÍTULO 6 – O PROFESSOR COORDENADOR E A FORMAÇÃO DE SUA
IDENTIDADE PROFISSIONAL ............................................................................... 106
6.1. Identidade Profissional.................................................................................. 111
CAPÍTULO 7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................ 115
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 123
ANEXOS ................................................................................................................. 127
ANEXO I – Carta convite enviada por e-mail .......................................................... 128
ANEXO II – Termo de consentimento livre e esclarecido ........................................ 129
ANEXO III – Roteiro da entrevista ........................................................................... 130
ANEXO IV – Bibliografia para a prova de certificação para professor coordenador 132
ANEXO V – História em quadrinhos apresentada no curso MGME ........................ 134
13

APRESENTAÇÃO

Desde meados da década de 1990 até o presente momento da apresentação


desse estudo, a educação pública, mais precisamente a educação básica do Estado
de São Paulo, vem passando por diversas reformas educacionais: “Escola de Cara
Nova” em 1996, pela “Escola do Acolhimento” em 2002, “São Paulo faz Escola” em
2007 e “Educação – Compromisso de São Paulo”, em 2011. Segundo essas
propostas, o foco de suas proposições é a qualidade da educação.

A implementação dessas reformas no Estado de São Paulo vieram a


coadunar-se com um movimento mais abrangente de reforma refletindo a intenção
de nova concepção de Estado que, entre outros pontos, exigiu, particularmente, nas
políticas públicas educacionais, novo enfoque da educação e da escola,
evidenciando-se a necessidade de implementação de ampla reestruturação do
trabalho baseada em um modelo de administração pública gerencial.

Conforme documento elaborado pelo Ministério da Administração Federal e


da Reforma do Estado (MARE), o foco da Reforma do Estado:

deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado,


que deixa de ser responsável direto pelo desenvolvimento econômico e
social pela via da produção de bens e serviços, para fortalecer-se na função
de promotor e regulador desse desenvolvimento. [...] reformar o Estado
significa transferir para o setor privado as atividades que podem ser
controladas pelo mercado. [...] entretanto, salientamos um outro processo
tão importante quanto, e que no entanto não está tão claro: a
descentralização para o setor público não-estatal da execução de serviços
que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas devem ser
subsidiados pelo Estado, como é o caso dos serviços de educação, saúde,
cultura e pesquisa científica. (Brasil, 1995, p. 12)

Simultânea e articuladamente ao processo de mudança no contexto da nova


organização do Estado posto em nível nacional, o Estado de São Paulo vem
realizando, desde então, uma ampla reforma no campo da educação. Vale ressaltar
que o grupo político que deu início à reforma do Estado em nível nacional se
articulava com o do Estado de São Paulo, ambos do PSDB (Partido da Social
Democracia Brasileira). Lembrando que, desde o ano de 1995, o Estado de São
14

Paulo segue, a cada pleito, elegendo governadores desse partido político (PSDB). E
considerados os estilos pessoais de cada governante, como afirma Sanfelice (2010,
p.147), é observada a continuidade de “uma inspiração ideológica razoavelmente
comum” entre eles.

A reforma educacional no Estado de São Paulo, ainda segundo Sanfelice


(2010, p.148), “teve suas mais profundas intervenções no governo de Mário Covas”,
entre os anos de 1995 e 20021. Com um programa focado na produtividade e na
melhoria da educação, ressaltando a eficiência e a flexibilidade, essa mudança
inicial garantiu que os mecanismos de gestão, próprios do setor privado,
imprimissem um novo formato na educação pública paulista desde então (Venco e
Rigolon, 2014).

Essas sequenciais reformas educacionais (do ano de 1996 ao ano de 2011)


materializaram-se por constantes alterações na organização e nas condições do
trabalho docente na escola, por meio de programas ou de políticas educacionais
contidas em seu contexto.

As estratégias utilizadas pela SEE/SP para o encaminhamento das reformas


e de suas ações com a rede foram concretizadas de forma vertical através das
equipes das Diretorias de Ensino, centralizando os debates sobre os materiais
distribuídos diretamente nas escolas. Assim, em linha de comunicação vertical
ocorreram, entre outras, as seguintes ações e programas: alterações no plano de
carreira do magistério a partir de 1997; implantação de um currículo unificado em
2008; distribuição do “Manual de Proteção Escolar e Promoção da Cidadania”,
visando a padronização de ações para a resolução de conflitos no espaço escolar,
em 2009; lançamento da plataforma online “Curriculo+”, disponibilizando conteúdos
digitais para que os docentes possam fazer uso desse recurso digital em sala de
aula, em 2014.

Considerando a escola, como Tragtenberg (2004), um espaço original de


relações e interações sociais, a verticalização da comunicação sobre as proposições
do processo das reformas educacionais podem ter ocasionado ruídos, com
interferência na organização do trabalho na escola. Esse contexto favoreceu,

1
No início do ano de 2001 faleceu o governador Mário Covas e assumiu seu vice, Geraldo Alckmin.
15

certamente, rupturas entre significados e apreensões das ações e programas e os


seus respectivos sentidos na organização do trabalho. Tais rupturas podem ser
compreendidas como novos episódios de desarticulação das atividades docentes
que lhes dão sentido e que as impulsionam.

Antunes (2008, p. 142-155), identifica a ruptura entre significado e sentido do


trabalho como causa de um estranhamento para o trabalhador, interferindo na sua
compreensão, durante a realização e nos resultados finais do seu trabalho, como lhe
sendo próprio. Segundo o autor:

Se na formulação marxiana o trabalho é o ponto de partida do processo de


humanização do ser social, também é verdade que, tal como se objetiva na
sociedade capitalista, o trabalho é degradado e aviltado. Torna-se
estranhado. "O que deveria se constituir na finalidade básica do ser social -
a sua realização no e pelo trabalho - é pervertido e depauperado. O
processo de trabalho se converte em meio de subsistência. A força de
trabalho torna-se, como tudo, uma mercadoria, cuja finalidade vem a ser a
produção de mercadorias. O que deveria ser a forma humana de realização
do indivíduo reduz-se à única possibilidade de subsistência do despossuído.
Esta é a radical constatação de Marx: a precariedade e perversidade do
trabalho na sociedade capitalista. Desfigurado, o trabalho torna-se meio e
não "primeira necessidade" de realização humana. Na formulação contida
nos Manuscritos, "... o trabalhador decai a uma mercadoria e à mais
miserável mercadoria", torna-se "um ser estranho a ele, um meio da sua
existência individual". (Antunes, 2008, p. 144-145)

Martins (2011, p. 122), avança essa ideia apontando que a “desarticulação


entre atividades e motivos”, poderá ocasionar no trabalhador possível
“desintegração” da consciência a propósito da realização do seu trabalho, o que
poderá contribuir para que haja uma ruptura na formação da identidade profissional,
configurada pela contradição entre significado e sentido do trabalho.

Nesse cenário, em que as reformas educacionais se processam em redes de


comunicação de maneira verticalizada, tem-se como característica o elemento
surpresa, implicando anúncios de novos programas em mudanças de ações
imediatas na linha do tempo de suas realizações na escola.

Tal elemento surpresa provoca tensões face às constantes expectativas de


alterações, o que poderá ocasionar a sensação de sobrecarga de atribuições e/ou
de funções nos trabalhadores da escola. Contudo, a inclusão de diferentes
atividades profissionais e/ou a exigência de profissionais com habilidades
diversificadas, caracteriza a polivalência no trabalho, própria da gestão gerencialista.
16

Peculiar à gestão gerencialista e orientada pela lógica capitalista, a


polivalência visa o desenvolvimento das potencialidades do trabalhador no sentido
de maximizar seu tempo de produção e subordinar o seu potencial cognitivo e/ou de
criação, promovendo, dessa forma, a incorporação naturalizada de novas atribuições
e/ou funções no cotidiano de seu trabalho.

É o que afirma Freitas (2004, p. 148) ao analisar o cenário das reformas


educacionais na década de 1990, explicando a fundamentação das reformas no
capital e no modelo gerencialista, trazendo para a educação uma nova concepção,
que passa a ser “entendida como serviço e não mais como direito”. A educação,
tratada como uma modalidade de comércio de serviços, no contexto da Organização
Mundial do Comércio (OMC), segue transformando a escola em uma prestadora de
serviços. A escola deixa de ser “percebida como instituição”, e passa a “ser
entendida como organização”.

É importante considerarmos a distinção entre organização e instituição, posta


por Chaui (2003)2 apud Freitas (2004). Escreve a autora:

Uma organização difere de uma instituição por definir-se por uma prática
social determinada por sua instrumentalidade: está referida ao conjunto de
meios (administrativos) particulares para obtenção de um objetivo particular.
Não está referida a ações articuladas às ideias de reconhecimento externo
e interno, de legitimidade interna e externa, mas a operações definidas
como estratégias balizadas pelas ideias de eficácia e de sucesso no
emprego de determinados meios para alcançar o objetivo particular que a
define. [...] A instituição social aspira à universalidade. A organização sabe
que sua eficácia e seu sucesso dependem de sua particularidade. Isso
significa que a instituição tem a sociedade como seu princípio e sua
referência normativa e valorativa, enquanto a organização tem apenas a si
mesma como referência, num processo de competição com outras que
fixaram os mesmo objetivos particulares. Em outras palavras, a instituição
se percebe inserida na divisão social e política e busca definir uma
universalidade (ou imaginária ou desejável). Ao contrário, a organização
pretende gerir seu espaço e tempo particulares aceitando como dado bruto
sua inserção num dos polos da divisão social, e seu alvo não é responder
às contradições e sim vencer a competição com seus supostos iguais. (p.
148-149)

Ao ser inserida em um cenário que propiciou a perda de suas características


de instituição social que aspirava a universalidade, na forma de organização, a
escola passa a adquirir novo sentido, que poderá implicar em alterações na
organização do trabalho escolar, trazendo elementos particulares de eficácia,

2
CHAUI, M. H. A universidade pública sob nova perspectiva. Conferência de abertura da ANPED,
Poços de Caldas, 5/out/2003.
17

eficiência e desempenho, incorporando-se num dos polos da divisão social, tendo


como objeto não as contradições e sim a competição.

Tal alteração no sentido da escola sugere uma nova organização do trabalho


escolar e, opondo-se ao conceito de escola de Tragetenberg (2004) como
“organização complexa”, passa a privilegiar a individualização das relações que nela
acontecem. Sob a ótica do gerencialismo, a organização tende a promover uma
gestão por resultados, privilegiando em seu espaço a competitividade e o
individualismo em lugar do convívio e do bem comum.

A escola sob a forma de uma organização passa a privilegiar a categoria de


insumos na definição da qualidade da educação3, apoiando-se no ideário alicerçado
no capital humano, centrando-o no papel da aprendizagem, tendo em vista a
formação de estudantes aptos a atenderem as exigências do mercado de trabalho.
O sentido do trabalho docente é desqualificado em seus componentes sociais,
econômicos e de desigualdades, minimizando na escola o processo de inclusão,
reforçando, em consequência, a exclusão. A sala de aula passa a ser, nesse
cenário, o foco do trabalho docente.

Nessa concepção de gestão por resultados utilizada pela SEE/SP, o trabalho


docente centraliza a mediação do seu sucesso à realização de avaliações
periódicas, possibilitando a promoção de um ambiente competitivo e imprevisível.
Transformado e correlato aos sistemas de avaliações da educação básica (SAEB,
SARESP), o trabalho docente tende a incorporar indicadores de desempenho
(IDESP, IDEB) que passam a condicionar, a balizar e a avaliar as políticas
educacionais que envolvem e permeiam a organização do seu trabalho. Ao
“medirem” os seus saberes e os saberes dos discentes, esses indicadores

3
Em 20/08/2007, o Governador José Serra anunciou uma nova reforma na educação. Em seu
discurso a preocupação centrou-se no âmbito dos investimentos no sistema de ensino – prédios,
infraestrutura, laboratórios de informática, computadores – não demonstrando preocupação com as
regularidades e as particularidades de cada região, cidade ou mesmo da unidade escolar e seu
entorno. Segundo Serra “[...] algumas teorias insistem, [...] na questão do papel da pobreza, no papel
da distância, da família que não favorece o aprendizado. Mas eu acho que essas são barreiras
perfeitamente superáveis”. Disponível em:
http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/lenoticia.php?id=87022&c=201. Acesso em: 15/08/2015.
Vide também as diretrizes contidas na “Educação – Compromisso de São Paulo”, publicado pelo
então Governador Geraldo Alckimin, em 2011, que, dentre outras, expressa a valorização do capital
humano via programa de valorização por mérito. Disponível em:
http://www.educacao.sp.gov.br/compromisso-sp. Acesso em: 15/08/2015.
18

proporcionam a criação de scores e rankings entre as escolas, entre as Diretorias de


Ensino, além de monitorar o fluxo escolar.

Nesse processo de reforma, a flexibilidade, a mobilidade e a adaptabilidade


surgem como condições para a efetivação do trabalho docente.

A administração pública gerencial constitui um avanço e até um certo ponto


um rompimento com a administração pública burocrática. Isto não significa,
entretanto, que negue todos os seus princípios. Pelo contrário, a
administração pública gerencial está apoiada na anterior, da qual conserva,
embora flexibilizando, alguns dos seus princípios fundamentais, como a
admissão segundo rígidos critérios de mérito, a existência de um sistema
estruturado e universal de remuneração, as carreiras, a avaliação constante
do desempenho, o treinamento sistemático. A diferença fundamental está
na forma de controle, que deixa de basear-se nos processos para
concentrar-se nos resultados, e não na rigorosa profissionalização da
administração pública, que continua um princípio fundamental. (Brasil, 1995,
p. 16)

Gaulejac (2014, p. 40) reforça nesse cenário o papel da gestão como


“definitivamente, um sistema de organização de poder”, visando mobilizar não
somente o corpo, como no modelo taylorista, mas também o psíquico, orientando o
trabalhador através do seu comprometimento e do estabelecimento de níveis de
sucesso e de desempenho. Nas reformas gerencialistas o poder 4 procura se
concretizar no processo de controle dos trabalhadores, orientado pelas metas e/ou
resultados que passam a ter fundamental importância na caracterização do sucesso
ou do fracasso no desempenho e/ou na realização do seu trabalho.

Como afirma Bourdieu (2010) o real não é transparente, tais relações de


poder não são palpáveis dentro de uma organização. Elas assumem formatações
peculiares que podem ser construídas segundo os interesses daqueles que detém o
poder definidos no espaço organizacional e que tem como objetivo sua
materialização através do controle. Nessa dimensão, os níveis de subordinação que
são desenhados na situação de controle não obedecem a uma hierarquização
normatizada pela burocracia. Pensamos que nas mais de cinco mil escolas públicas
estaduais essas relações de poder e formas de controle possam existir tendo em

4
Em, DORTIER, Jean-François. Dicionário de ciências humanas. São Paulo: Editora WMF Martins
Fontes, 2010. Encontramos, dentre outras, a seguinte definição para ‘poder’: “Em Economia e
Sociedade (1922), Max Weber propõe a definição seguinte: o poder é a oportunidade de fazer
prevalecer, no âmbito de uma relação social, sua própria vontade, até mesmo contra a vontade do
outro” (p.497).
19

vista as singularidades dos indivíduos e as diferentes realidades sociais do entorno


escolar.

É nesse cenário, contextualizado na procura de um novo papel do Estado, em


que as reformas educacionais se materializam, alterando o sentido e o significado da
escola, e tendo como foco a ótica de uma gestão gerencialista privilegiando os
resultados, que se situa a função e as atribuições do professor coordenador. Seu
trabalho está intimamente articulado com o processo de implantação,
implementação e monitoramento das políticas contidas no contexto dessas
reformas. E nessa confluência, situamos o objeto dessa pesquisa: o estudo da
formação da identidade profissional do professor coordenador a partir da
compreensão de como está organizado o seu trabalho.

Esse estudo, portanto, tem como objetivo geral analisar o trabalho do


professor coordenador a partir de um estudo documental e de campo acerca de seu
trabalho, possibilitando, dessa maneira, compreender a formação de sua identidade
profissional.

As perguntas orientadoras elaboradas ao desenvolvimento do objeto na


condução da pesquisa são:

1) diante da realidade, in loco, o professor coordenador expressa e/ou constrói


estratégias de resistência aos ditames burocráticos ou seu trabalho se
configura numa atitude de não reflexão?
2) como ele lida com os confrontos entre as reais necessidades da escola
(relações internas) e as (im)posições estatais (relações externas)?
3) quais são suas expertises?
4) em que momentos se dão as resistências e em que momentos elas não
ocorrem?
5) há espaço para o exercício político, de publicização das ideias, de estudos, de
discussões entre essa equipe gestora?
6) isso se estende aos docentes?
7) quais os mecanismos de controle utilizados pelo professor coordenador para
o acompanhamento e monitoramento dessas políticas?
20

8) há eficácia e/ou eficiência nesse mecanismo de acompanhamento e


monitoramento?
9) sendo o professor coordenador um docente designado para essa função, com
formação em uma das licenciaturas contidas na grade curricular (exemplo:
matemática, língua portuguesa, arte), nessa contradição, como ele encaminha
a sua atribuição sobre a questão da formação continuada dos demais
docentes, tendo em vista as particularidades de sua formação e as
especificidades da formação dos docentes?

A relevância deste estudo se dá no momento em que as pesquisa sobre o


trabalho do professor coordenador na escola pública paulista e a formação de sua
identidade profissional se mostram escassas.

Fundamentamos essa escassez ao efetuarmos a busca por artigos,


dissertações e teses no banco de dados da CAPES5, da Scielo6, da USP7, da
UNICAMP8 e da UNESP9. Para tanto, utilizamos a combinação de duas palavras-
chave: 1) identidade e; 2) professor coordenador, e limitamos nossas buscas ao
campo resumo.

Tabela 1
Banco de Dados Resultados Retornados
CAPES 1 (uma)
Scielo 0 (zero)
USP 0 (zero)
UNESP 3 (três)
UNICAMP 0 (zero)

Os seguintes estudos foram retornados pela pesquisa no banco de dados da


CAPES e UNESP:

5
Vide: http://bancodeteses.capes.gov.br/. Acesso em: 17/08/2015
6
Vide link “pesquisa de artigos” em: http://www.scielo.br/?lng=pt. Acesso em: 17/08/2015
7
Vide link “pesquisa avançada” em : http://www.teses.usp.br/. Acesso em: 17/08/2015
8
Vide: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/. Acesso em: 17/08/2015
9
Vide link “busca simples/avançada” em: http://unesp.br/portal#!/cgb/bibliotecas-digitais/cthedra-
biblioteca-digital-teses/. Acesso em: 17/08/2015
21

Tabela 2
Título / Autor Fonte Data Proposição segundo resumo dos autores
Título: CAPES 2012 Essa investigação tem como objetivo compreender como
Coordenador/Supervisor do se constitui a identidade do coordenador/supervisor
Colégio Militar de Campo pedagógico no interior do Colégio Militar de Campo Grande
Grande/MS: Uma Prática (CMCG). [...] A pesquisa foi motivada por questões ligadas
Refletida. à prática do apoio pedagógico que se desenvolve no
CMCG, desde 2007. A indagação central que fomentou a
Autora: busca foi a seguinte: como se constitui
Neiva Blós. a identidade do coordenador/supervisor pedagógico no
interior do CMCG? A partir dessa questão desencadeadora,
levantamos algumas possibilidades:
o professor coordenador pode construir
sua identidade como profissional participativo, reflexivo e
crítico apesar da estrutura hierarquizada de seu contexto
de trabalho; a formação continuada é um dos elementos
fundamentais para a constituição da identidade do
profissional; é possível fazer movimentos de ações
transformadoras, mesmo num contexto organizacional
marcadamente hierárquico.
Título: UNESP 2007 Nessa pesquisa de caráter empírico, procuramos investigar
O professor coordenador a percepção de 30 professores que atuam nos dois
das escolas públicas segmentos do Ensino Fundamental e no Ensino Médio da
estaduais paulista: análise Diretoria de Ensino do Município de São Carlos, sobre o
das condições de trabalho e desempenho do Professor Coordenador da Escola Pública
a construção do projeto do Estado de São Paulo na busca de ações coletivas que
político-pedagógico. possibilitem melhorias na qualidade de ensino, e se essas
ações estão relacionadas à existência de práticas
Autora: democráticas no interior das escolas.
Rita de Cássia Duarte

Título: UNESP 2009 A presente pesquisa sob o título


O professor coordenador na "O Professor Coordenador na Rede Oficial de Ensino do
rede oficial de ensino de Estado de São Paulo: um estudo sobre a (re)construção de
Estado de São Paulo: um sua ação pelo cotidiano" tem como objetivo estudar os
estudo sobre a fatores que levam o professor coordenador a se distanciar
(re)construção de sua ação das atribuições instituídas por lei referentes a sua função. O
pelo cotidiano. foco de estudo são os profissionais da Diretoria de Ensino
da Região de São João da Boa Vista. Para que o estudo
Autor: fosse realizado foi analisada a literatura que trata sobre
Marcos Nogueira de Lima esse profissional, bem como análise da legislação que
instituiu a função "Professor Coordenador" na rede pública
estadual de ensino e as leis vigentes.
Título: UNESP 2014 A presente pesquisa se compôs de uma investigação
Professor coordenador na qualitativa em Educação, com coletas de dados realizada
formação contínua de no ano letivo de 2013, com nove Professores
professores: um estudo em Coordenadores de seis escolas diferentes do Município de
escolas do município de Limeira, nos espaços de HTPCs (Horários de Trabalho
Limeira. Pedagógico Coletivo). O foco dessa investigação está na
análise da contribuição do papel dos professores
Autora: coordenadores na formação continuada dos professores,
Luciana Estessi Bento tendo o HTPC como um espaço privilegiado para isso. [...]
Antunes de modo a contribuir para a constituição
da identidade profissional.

Enquanto são raros os estudos sobre o professor coordenador, não são raros
os estudos sobre o coordenador pedagógico10, atuante em redes municipais ou
estaduais de ensino.

10
Como mostra a coleção publicada pela Edições Loyola, onde encontramos os seguintes títulos: “O
coordenador pedagógico e a educação continuada”; “O coordenador pedagógico e a formação
22

Uma importante pesquisa realizada pela Fundação Victor Civita entre março
de 2010 a março de 2011, intitulada: “O coordenador pedagógico (CP) e a formação
de professores: intenções, tensões e contradições” (Placco et al., 2011), objetivou
revelar um retrato do coordenador pedagógico e como se estruturam e se articulam
suas atribuições. Em um primeiro momento, foi realizado um levantamento
quantitativo envolvendo 400 (quatrocentos) coordenadores pedagógicos, em 12
Estados e no Distrito Federal, através de questionários aplicados via telefone pela
empresa “Ibope Inteligência”. Em um segundo momento, foi realizada a fase
qualitativa, na qual 3 (três) pesquisadoras aplicaram questionários presencialmente
em 20 (vinte) coordenadores pedagógicos em 5 (cinco) capitais (Natal – RN; Rio
Branco – AC; Goiânia – GO; São Paulo – SP; Curitiba – PR). Foram entrevistados 2
(dois) coordenadores pedagógicos da rede municipal e 2 (dois) da rede estadual em
cada uma das capitais.

Consideramos e compreendemos a importância dessa pesquisa, a partir do


momento em que ela nos propicia uma compreensão macro do trabalho do
coordenador pedagógico.

Entretanto, a característica desse profissional, o coordenador pedagógico, é a


de ser um pedagogo por formação, o que o diferencia, no âmbito de sua formação e
da realização do seu trabalho, do professor coordenador atuante no ensino
fundamental anos finais ou do ensino médio da escola pública paulista. Para vir a
assumir o posto de trabalho de professor coordenador, o docente não precisa ser
um pedagogo por formação.

Ao considerarmos que o foco do trabalho do coordenador pedagógico está


dirigido aos docentes dos anos iniciais do ensino fundamental, e o trabalho do
professor coordenador é direcionado aos docentes dos anos finais do ensino
fundamental e do ensino médio na rede pública do Estado de São Paulo, tanto pelas
características inerentes aos níveis de ensino no qual cada um trabalha quanto pela
sua formação acadêmica, é muito provável que a organização do seu trabalho
também venha a se caracterizar e a se concretizar de forma diferente.

docente”; “O coordenador pedagógico e o espaço da mudança”; “O coordenador pedagógico e


questões da contemporaneidade”; “O coordenador pedagógico: provocações e possibilidades de
atuação”.
23

Também observamos que a pesquisa da Fundação Victor Civita universaliza


a terminologia coordenador pedagógico, atribuindo-a também para: o professor
coordenador; o orientador pedagógico; o pedagogo; e o supervisor pedagógico. E
sob a ótica do conceito de identidade presente em Ciampa (1996), Capitão e Heloani
(2007) e Berger e Luckmann (2013), compreendemos que no processo de
construção de uma identidade, o nome ou o predicado atribuído à um indivíduo lhe
confere sentidos e significados do que ele deve ser e/ou fazer.

Portanto, consideramos no presente estudo, que o nome atribuído ou o


predicado dado ao docente designado como sendo o de professor coordenador é de
suma importância no processo de construção de sua identidade profissional.

Os limites de tempo e espaço do objeto dessa pesquisa encontram-se no


plano das reformas educacionais ocorridas no Estado de São Paulo entre os anos
de 2007 e 2014.

Tomamos a liberdade de classificarmos essa pesquisa como sendo um


estudo exploratório, uma vez que durante a abordagem do campo concretizamos
duas entrevistas plenas de sentidos e significados. Essas entrevistas nos
forneceram um rico material sobre o trabalho do professor coordenador. O
entendimento que o professor coordenador expôs sobre o seu trabalho nos
proporcionou novas percepções e compreensões sobre suas atribuições como um
dos principais articuladores dos programas e das polícias educacionais na escola,
fato que veio a contribuir substancialmente com o estudo documental.

Compreendemos e consideramos importante o fato do pesquisador ter


trabalhado na função de professor coordenador do ensino médio na rede pública do
ensino paulista durante toda a pesquisa. Contudo, não poderíamos ter associado
e/ou classificado essa pesquisa como exploratória ou como uma pesquisa
participante tendo em vista essa situação factual. Tal generalização poderia tender a
uma banalização, sem apresentar a profundidade exigida por esses métodos.

Contudo, ao assumirmos um posicionamento participante, as regularidades


puderam se manifestar diferentemente que para um observador externo ou distante
da realidade. Sendo assim, ao mesmo tempo em que houve um contato direto do
24

pesquisador com o objeto dessa pesquisa, contribuindo no entendimento e na


compreensão das opiniões, dos valores e das atitudes dos indivíduos em um campo
na qual consideramos que as relações de poder se manifestam de forma desigual, o
esforço cognitivo e emocional para separar as projeções do cotidiano de seu
trabalho, para que não houvesse barreiras ao compreender e interpretar o trabalho
do professor coordenador no cotidiano escolar por diferentes ângulos, se deu por
todo o processo de pesquisa.

Consideramos que a apresentação dessa dissertação parte do princípio que a


pesquisa não é construída em etapas isoladas e únicas. Como afirma Bruyne et al.
(1977, p. 19):

Não existe um momento no qual se poderia dizer que a construção do


objeto está acabada e que a fase de análise começa; na realidade, a
construção prossegue de um extremo a outro do procedimento no qual se
desenvolve a pesquisa.

Ainda segundo Bruyne et al. (1977, p. 101):

O progresso da pesquisa e o da elaboração teórica não são apenas


paralelos, mas também indissociáveis. Esse progresso não consiste apenas
numa acumulação de “fatos”, mas numa mudança qualitativa na estrutura
dos sistemas teóricos.

Dessa forma, a busca pela compreensão dos fenômenos que cercam o objeto
dessa pesquisa se deu por todo tempo, conduzindo-nos a um incansável
levantamento de fontes bibliográficas.

Nesse sentido, estruturamos o texto da seguinte forma:

Na apresentação construímos, a partir da problematização, o objeto de


pesquisa, contextualizando-o historicamente, articulando com a fundamentação
teórica e metodológica.

Na sequência, nos Capítulos 1 e 2 explicitamos o referencial teórico,


Organização do Trabalho e Identidade, integrando o objeto de pesquisa à
metodologia.

Em seguida, no Capítulo 3, apresentamos a metodologia do estudo,


fundamentada à luz do método hermenêutico de Gadamer (2012) e desenvolvida em
duas dimensões: documental e das entrevistas.
25

No Capítulo 4, apresentamos o professor coordenador circunscrito por atos


normativos e pelas reformas educacionais existentes no Estado de São Paulo,
desde sua criação no ano de 1974 até o ano de 2014, descrevendo suas funções e
atribuições.

No Capítulo 5, apresentamos a organização do trabalho do professor


coordenador, face ao referencial teórico apresentado no Capítulo 1, corroborando
com nossas análises.

No Capítulo 6, articulamos os referencias teóricos sobre identidade


apresentados no Capítulo 2, aos dados das entrevistas e documental.

No Capítulo 7, realizamos as considerações finais.


26

CAPÍTULO 1 – AUTONOMIA E REGULAÇÃO NA ORGANIZAÇÃO DO


TRABALHO

O que pretendemos nesse capítulo é apresentar algumas dimensões


existentes no conceito de organização do trabalho, que conduz, no contexto das
reformas educacionais, segundo pesquisadores como Saviani (2011); Heloani
(2011a, 2011b, 2013); Peroni (2012); Freitas (2004, 2012, 2014); Oliveira (1996);
Gaulejac (2014); Tragtenberg (2004); Sennet (2011), o trabalho na escola. Com isso,
objetivamos obter, no intuito de uma orientação e de um referencial teórico no
estudo, uma melhor compreensão sobre o nosso objeto de pesquisa: a identidade
profissional do professor coordenador.

1.1. O controle dos meios de produção e suas prováveis consequências

Entre o final dos anos de 1960 e meados dos anos de 1970 o modelo sócio-
econômico fordista entra em crise e sua ideologia se dissipa em novos modelos de
organização do trabalho e de acumulação do capital. Chega “ao fim o primado
fordista de investir para aumentar a produtividade e repassá-la aos salários”
(Heloani, 2011b, p. 86).

Encerra-se, assim, o período orientado pelo “Estado-Previdência” ou “Estado


de Bem Estar Social”, responsável por atender as necessidades da população,
regulando serviços, bem como os fornecendo à sociedade, garantindo educação,
saúde, transporte, segurança, enfim, uma melhor qualidade de vida à população.
Segundo Heloani (2011a, p. 53), “o ‘Estado-Previdência’ complementou o projeto
fordista, na medida em que ambos se propunham a manter e assegurar o
crescimento do consumo”. De um lado o Estado provia a seguridade social, do outro
27

a iniciativa privada garantia bons salários em detrimento de um maior consumo e


consequentemente de uma maior produção.

Entretanto, quando esse cenário se esgota e entra em colapso, a iniciativa


privada passa a argumentar contra o Estado, responsabilizando-o pela diminuição
da oferta de emprego e dos investimentos na indústria, destacando uma suposta
ineficiência do Estado e de ser muito custoso para a população, devido a carga
tributária paga por esta pela garantia dos seus serviços.

Em detrimento dessa suposta ineficiência, é realizada uma transição para um


novo modelo de Estado: o Estado Mínimo. Caracterizado como interventor e
regulador dos serviços essenciais à população, e não mais prestador desses
serviços, esse modelo neoliberal de Estado segue focado em continuar a garantir
uma lógica de mercado para um pequeno grupo que intenciona, a qualquer preço,
“direcionar a intervenção do Estado para seus particulares interesses de classe,
transformando o ‘Estado Mínimo’ em ‘Estado Máximo para o capital’” (Heloani,
2011b, p. 101). Dessa forma, o Estado vem a transferir a responsabilidade pela
realização desses serviços à iniciativa privada.

No devir desse processo, novas formas de cooptação adentram as


organizações e emergem com o modelo toyotista, com os programas de qualidade
total e com os círculos de controle da qualidade, propondo uma maior flexibilidade
ao trabalhador. Configurando-se numa antítese à linha de montagem e ao padrão
rotineiro, típicos do fordismo, surgem as ilhas de produção, a multiespecialização e a
multiqualificação. Os trabalhadores, considerados como polivalentes nesse novo
cenário que passa a organizar a produção, precisam moldar seu trabalho de acordo
com as demandas exigidas pelo mercado. São postos a assumirem, de maneira
ilusória, as rédeas da produção.

As novas formas de controle e disciplina incidem com menos intensidade


sobre o corpo do trabalhador ou sobre a sua capacidade de agilidade na realização
de seus gestos. O elemento a ser explorado passa a ser o seu cérebro. A partir da
manipulação de sua subjetividade, as organizações passam a disciplinar seu corpo
fazendo o trabalhador alcançar o máximo de sua produtividade, intensificando suas
atividades e incorporando em sua mente a ideia de bom desempenho.
28

Uma ilusória percepção de pertença à instituição tende a induzir nos


trabalhadores um processo de monitoramento para que passem a supervisionar o
trabalho uns dos outros, responsabilizando-os pelas metas (pro)postas pelas
organizações. Os trabalhadores esgotam-se mentalmente11 em uma competição
entre si e entre grupos, lutando pelos melhores índices, pelas melhores bonificações
e pelas melhores premiações. A ideologia de quem produz mais, alcança o êxito e o
reconhecimento entre seus pares se dissemina por entre os trabalhadores,
formatando sua subjetividade. Afinal, é preciso “vestir a camisa” da organização.

Como afirma Heloani (2011b, p. 107-108) é:

Nesse contexto em que o trabalhador é levado à identificação com a


organização (processo transferencial), todas as relações pessoais e sociais
são apropriadas de suas particularidades mais abstratas para se
submeterem a outra gramática mais instrumental: a da produção e do lucro.
É a “lógica” empresarial, naturalmente desconectada da subjetividade de
cada operário, que exerce seu poder mediante contradições, isto é, põe
lado a lado, de forma positiva e ambígua, “vantagens” e “restrições”. As
primeiras são ostensivamente alardeadas em chamariz atrativo para cooptar
todos os esforços do trabalhador: salários elevados, promoções, benefícios
e distinções (“privilégios” como sala própria, elevador especial e crachás,
entre outros); já as “restrições” têm uma formulação implícita no tocante às
exigências constantes de subordinação e dedicação à empresa que o
trabalhador deve ter.

O individualismo tonifica-se como suporte adaptativo para essa nova


configuração de organização do trabalho. Segundo Heloani (2013):

Esse projeto neoliberal diz o seguinte: você é responsável por você próprio.
[...] O neoliberalismo vai, pouco a pouco, minando o Estado protetor, vai
tornando este Estado cada vez menor, menos interventor, menos positivo. E
o mercado vai fazendo a vez do Estado. (p. 10)

Julgamos que nessa luta, de um contra todos e de todos contra todos, o que
se promove é o esquecimento, por parte dos trabalhadores, de que ocorre um
constante e intenso monitoramento sobre o seu trabalho pelo sistema ao qual
pertencem. Parecem esquecer, ou talvez realmente não saibam, que essa busca
incansável por resultados métricos só beneficia o empregador, o detentor do capital.
Ao conceder a flexibilidade dos tempos e movimentos ao trabalhador, opinamos que
há, na verdade, um escamoteamento da percepção dessa flexibilidade,

11
Em uma entrevista concedida à Revista do Instituto Humanitas Unisinos, Heloani (2013) coloca
“que ainda nesta década, até 2020, segundo relatórios internacionais, a segunda causa de
afastamento do trabalho será o transtorno mental, sendo que a mais recorrente será a depressão (p.
09)”.
29

configurando-a em uma autonomia composta de certas concessões, privações e


restrições, na qual os privilégios são acordados a portas fechadas e as restrições
postas pela relação existente entre dominante e dominado, estabelecendo as
relações de poder nos meandros da organização em que trabalham.

A organização intenta manipular o imaginário do trabalhador para que ele


incorpore os limites e as metas (im)postas como sendo seus e não da organização
ou do sistema. A ideia transmitida aos trabalhadores de que estão tendo um maior
controle sobre seu trabalho é enganadora, visto que as decisões centrais ainda são
tomadas pelo alto, por poucos.

Para Sennett (2011, p. 54), a “repulsa à rotina burocrática e a busca da


flexibilidade produziram novas estruturas de poder e controle, em vez de criarem as
condições que nos libertem”.

Concordamos com Sennett (2011) quando o autor escreve sobre a


flexibilidade, dizendo que ela deveria garantir ao ser humano uma maior autonomia
e “liberdade pessoal”, possibilitando-o a adaptar suas ações de acordo com as suas
capacidades, ou seja, uma “livre ação”. Entretanto, as organizações e os modelos de
gestão utilizados por elas trazem evidências de um processo na qual as estruturas
políticas e econômicas acabam por vir a trair esse desejo de liberdade pessoal do
indivíduo, muitas vezes através do desrespeito as suas singularidades e a sua
jornada de trabalho.

1.2. Autonomia e responsabilização como forma de regulação na organização


do trabalho

Nesse cenário em que uma nova dimensão conceitual é atribuída ao Estado


como interventor e regulador de serviços, a disputa dos interesses privados dos
30

reformadores educacionais12, que constituem um segmento da sociedade, e os


agentes públicos no governo do Estado, vem a tempos lutando e reforçando a
incorporação de modelos organizacionais utilizados nas empresas no setor de
gestão da educação pública.

No plano das políticas públicas sociais e econômicas, a escola, como reflexo


do que acontece na sociedade e não ao contrário, acaba por ficar sem muitas
opções de enfrentamento diante das reformas educacionais que lhe são
introduzidas.

Inseridas, muitas vezes de forma abrupta, essas reformas podem vir a excitar
expectativas no corpo docente que podem ser positivas, ao pensarmos pelo prisma
de que novos processos educacionais possam suscitar melhores condições de
trabalho ou uma justa reinvindicação feita pelos docentes. Quanto negativas, tendo
em vista que os projetos, os programas, as ações, as intervenções ou qualquer outra
forma de processo de inovação educacional que adentre a escola pública tende a
não passar por um processo democrático com participação ativa do corpo docente a
respeito dessas escolhas.

Não nos posicionamos negando a existência de ações de enfrentamento ou


resistência, afinal, pensamos no fato de haver interesses, tanto coletivos quanto
individuais, inerentes à escola e aos indivíduos que nela se encontram que dialogam
de forma convergente ou divergente, tanto entre eles, quanto para com as
exigências postas pelas reformas através da SEE/SP e suas ramificações.

Logo, ao considerarmos as reformas educacionais ocorridas no Estado de


São Paulo nos últimos vinte anos, e as responsabilidades atribuídas ao trabalho do
professor coordenador na escola, duas questões nos vêm à mente: Quais seriam os
limites encontrados na escola na execução dos enfrentamentos e das resistências
às reformas educacionais? No pressuposto da existência de um enfrentamento,
seria o professor coordenador o responsável por amortizar tais conflitos e promover
um processo de aceitação das reformas educacionais dentro da escola?

12
Termo utilizado por Freitas (2014; 2012) em seus textos evidenciando o controle industrial privado
no setor educacional público.
31

No intuito de compreendermos esses questionamentos, a partir de um


referencial teórico, consideramos o conceito de autonomia como hipótese às
questões.

Ao considerarmos a autonomia como um dos mecanismos reguladores do


sistema educacional, visando a diminuição dos entraves burocráticos existentes nas
escolas, no âmbito das reformas educacionais, a autonomia pode servir como um
mecanismo de descentralização das responsabilidades, sejam elas administrativas,
financeiras ou pedagógicas, podendo contribuir na ampliação das responsabilidades
da escola e dos docentes acerca do aprendizado dos estudantes. Dessa forma,
como afirma Oliveira (2007, p. 367), é estendido “o poder de decisão da escola
sobre um conjunto de ações, mesmo sabendo-se que as formulações não estão
descentralizadas a esse nível”.

Entretanto, ao avançar em busca de uma maior eficiência e eficácia, o


desempenho dos estudantes, dos docentes e da escola passam por diversos
instrumentos avaliativos, formulados externamente à escola, tratando a autonomia
de maneira ambígua.

Para Oliveira (2007, p. 366):

Tal descentralização veio acompanhada de processos de padronização de


procedimentos administrativos e pedagógicos, como meios de garantir o
rebaixamento dos custos da expansão do atendimento e redefinir gastos,
sem contudo, abrir mão do controle central das políticas. Por meio de
currículos centralizados, o livro e o material didático, vídeos, programas de
computadores, a regularidade dos exames nacionais de avaliação e a
prescrição normativa sobre o trabalho pedagógico, observa-se relativa
padronização nos processos escolares.

Por esse ponto de vista, entendemos que os enfrentamentos às reformas


educacionais podem adquirir os limites postos pelas rédeas de uma autonomia
relativa embutida nas diretrizes das próprias reformas. Entretanto, é muito provável
que a contrapartida aos propósitos das reformas e aos limites postos para o seu
enfrentamento, residam na existência de um possível não cumprimento dessas
reformas, ao menos em partes, pelas escolas e/ou pelos docentes.

Nessa perspectiva, levantamos uma segunda hipótese. Murrie (2008, p. 06)


ao considerar o professor coordenador como o principal gestor responsável pela
32

implementação das políticas de melhoria na qualidade da educação, o seu trabalho


assume contornos importantíssimos no que diz respeito a introdução e a execução
dos processos pedagógicos orientados pelas diretrizes das reformas educacionais.
Seja na tentativa de amortizar possíveis conflitos e enfrentamentos ou para
gerenciar as resistências, ao utilizar-se das informações e dos documentos
disponibilizados pela SEE/SP, o professor coordenador poder vir a desenvolver um
trabalho de convencimento nos docentes sobre as benesses contidas nas reformas
educacionais.

A partir das hipóteses levantadas, compreendemos que a escola e o trabalho


do professor coordenador estão balizados pela responsabilidade de se garantir uma
educação de qualidade mediante as determinações contidas nas reformas
educacionais.

Sobre a qualidade na educação no Estado de São Paulo a SEE/SP afirma


que é preciso “elevar a qualidade do ensino nas escolas estaduais paulistas” (São
Paulo, ca. 2008, p. 05). Para tal intento a SEE/SP lançou em maio do ano de 2008 o
Programa de Qualidade na Escola que:

criou um indicador, denominado Índice de Desenvolvimento da Educação


do Estado de São Paulo (IDESP). O IDESP é um indicador de qualidade da
escola. Nesta avaliação, considera-se que uma boa escola é aquela em que
a maior parte dos alunos apreende as competências e habilidades
requeridas para a sua série, num período de tempo ideal – o ano letivo. [...]
Dessa maneira, na avaliação de qualidade do ensino feita pelo IDESP são
considerados dois critérios: o desempenho dos alunos em exames de
proficiência (o quanto aprenderam) e o fluxo escolar (em quanto tempo
aprendem). [...] O IDESP avalia a qualidade do ensino nas sérias iniciais e
finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, para cada uma das
unidades escolares individualmente. (São Paulo, ca. 2008, p. 05)

Dessa maneira, compreendemos que o conceito de qualidade da educação


utilizado pela SEE/SP, muito embora sua preocupação com o aprendizado dos
estudantes se apresente de maneira louvável e incontestável, na realidade o que
observamos é uma qualidade estabelecida por uma equação que tenta racionalizar
um conceito que é dinâmico e subjetivo.

Ao considerarmos que as relações sociais tendem a não se concretizarem de


forma estanque e, portanto, nem sempre as determinações postas de forma
exógena à escola podem vir a se concretizar nela, outras dúvidas surgem: Quais e
33

como os modelos de organização do trabalho balizam as ações do professor


coordenador na escola? Conseguiria ou teria o professor coordenador condições de
assumir um posicionamento de enfrentamento ou contrário às reformas
educacionais? Teria ele uma autonomia para organizar seu trabalho? A organização
de seu trabalho, a sua postura diante do grupo de docentes, diante da direção e da
supervisão de ensino, se mostra convergente ou divergente as proposições das
reformas educacionais?

Os professores coordenadores nos relataram ter total autonomia na


realização do seu trabalho. Principalmente no planejamento e na execução das
ações de visitas às salas de aula.

Argumentam a existência de docentes que impedem e/ou dificultam essas


visitas, impedindo-os de entrarem na sala de aula para observarem o seu trabalho.
Também relatam casos de docentes que não permanecem ou pouco permanecem
nas ATPCs. Segundo os entrevistados, nesses casos, o docente é encaminhado até
o Diretor de Escola, para que seja realizado um trabalho de “orientação”,
argumentando ao docente que a presença do professor coordenador em sala de
aula e as ATPCs não são para “exigir ou cobrar o que deve ser ensinado” e sim para
“ajudar na sua formação” e “para que haja mais rendimento”, enfim, “para auxiliá-los”
sem uma “cobrança tão enérgica”.

Quanto às pautas das ATPCs, eles relatam que as fazem em equipe.


Professor coordenador e diretor, quando na escola existe apenas um professor
coordenador; ou entre os professores coordenadores, quando na escola existem
dois professores coordenadores. Nesse último caso, a pauta é avaliada pelo Diretor
de Escola que pode ou não realizar alterações em seu conteúdo, ou propor um
tempo para sua participação.

Argumentam que os conteúdos organizados para serem trabalhados nessas


reuniões focam a formação continuada do docente, através do estudo de leis e
programas da SEE/SP, citando como exemplo estudos sobre a Avaliação de
Aprendizagem em Processo, e a construção de um currículo adaptado para
estudantes que apresentam alguma deficiência física e/ou mental. Além de estarem
34

sempre trabalhando as habilidades e competências do currículo, em busca de uma


melhoria na qualidade da educação.
35

CAPÍTULO 2 - A FORMAÇÃO DE UMA IDENTIDADE – UMA


RELAÇÃO ENTRE O “EU” E O “OUTRO”

Interpretamos que a complexidade contextual existente no processo de


formação da identidade profissional do professor coordenador, considerando as
relações de poder existentes nos meandros da escola pública paulista, possa vir a
ser estudada por meio da percepção que esse indivíduo possui de si para com a sua
ação pedagógica, ou seja, na relação entre a sua subjetividade e a objetividade que
esse expõe no dia-a-dia. Compreendemos que essa exposição possa a vir a se
concretizar através da linguagem, onde, através da fala e da escrita, se efetiva a
comunicação e o contato social. Logo, a linguagem é essencial para
compreendermos o indivíduo, visto que, dessa maneira, ele pode vir a expressar as
relações que estabelece com o meio no qual vive.

2.1. A comunicação como meio para o ‘eu’ se fazer compreensível ao ‘outro’

Ciampa (1996) e Berger e Luckmann (2013) exprimem a ideia da linguagem


como constituinte na formação identitária do indivíduo. O conhecimento transmitido
através da linguagem tende a se objetivar no mundo social, construindo e
constituindo, num contínuo processo, uma identidade. Tal conhecimento,
historicamente construído, assenta-se fortemente no senso comum, ou seja, em um
conhecimento comum à todos, sendo aprendido e apreendido no devir de uma vida
e no decorrer de um processo relacional entre indivíduos.

Esse conhecimento transmitido de geração para geração, ao consolidar-se


num movimento condicionante, pode vir a cristalizar esses saberes e transformá-los
em uma fórmula a ser repetida numa contínua dinâmica institucionalizadora,
36

definindo os papeis de cada indivíduo no processo de socialização. Dessa maneira,


a identidade se fortalece e se estrutura dentre as intersubjetividades que se formam
nesse processo. Vai-se assim, construindo, uma biografia, uma história de vida, que
se concretiza pela interação e na projeção da subjetividade no mundo.

Estaríamos assumindo uma postura um tanto ingênua, ao reconhecermos que


a construção da identidade pode vir a ser realizada de maneira estanque e
determinista, onde o simples fato de se estar exposto em um determinado meio ou
pertencer a um determinado grupo, possa vir a se tornar condição necessária para
definir as singularidades do indivíduo e assim determinar quem ele é.

Compreendemos que a identidade se constrói num permanente devir. Ela se


define na existência de uma permanente relação entre o indivíduo e os outros
indivíduos que, inseridos em um determinado contexto social, econômico e político
muito ou pouco complexo, no que diz respeito aos seus aspectos organizacionais,
comporão um mundo objetivo concretizando suas intersubjetividades.

Para Berger e Luckmann (2013, p. 84), “O mundo institucional é a atividade


humana objetivada”, portanto, em uma sociedade organizada pelo mote capitalista e
posta como uma sociedade global, é muito provável que os elementos constituintes
da identidade, que são singulares ao indivíduo, se tornem cada vez mais complexos
devido as relações que esses elementos se processam ao interagirem com a
estrutura social, econômica e política e suas constantes modificações e ajustes.
Ainda segundo os autores, o “homem é um produto humano. A sociedade é uma
realidade objetiva. O homem é um produto social” (p. 85).

Para fins de análise, consideramos nesse estudo, que a identidade de um


indivíduo se constrói na relação com os outros indivíduos. Sendo na relação do ‘eu’
com o ‘outro’ que a identidade do ‘eu’ toma forma. Porém, o ‘eu’ e o ‘outro’ não estão
isolados do contexto social. Logo, para compreendermos a formação da identidade
profissional do professor coordenador é preciso considerarmos sua relação com os
outros indivíduos e a escola, repleta de normas, comunicados, leis, decretos,
resoluções e outros, onde serão estabelecidas as interações entre os indivíduos e o
meio. Assim, a identidade segue transformando e sendo transformada, através
37

dessa interação cortada pelas relações que são inerentes a escola e sua
organização.

Segundo Ciampa (1996, p. 241-242) a:

[...] identidade é identidade de pensar e ser [...]. O conteúdo que surgirá


dessa metamorfose deve subordinar-se ao interesse da razão e decorrer da
interpretação que façamos do que merece ser vivido. Isso é busca de
significado, é invenção de sentido. É autoprodução do homem. É vida.

Ao considerarmos a alteridade, ou seja, o ‘outro’ como peça chave no


processo de constituição e construção da identidade do ‘eu’, percebemos quão
intenso e complexo é esse processo de formação e (re)formação identitária que
ocorre num constante movimento dialético no qual o indivíduo está inserido, sendo
parte constituinte dele. O ‘outro’, nesse processo, pode vir a ser uma pessoa ou um
grupo de pessoas. Pode vir a ser uma instituição ou uma organização que, através
de sua estrutura burocrática, intenta se objetivar no ‘eu’ através da linguagem
(informes, reuniões, treinamentos, comunicados, etc.), empenhando-se na
manipulação e na formatação da subjetividade do ‘eu’. Como também pode vir a ser
o ‘eu’, na tentativa de compreender a si mesmo na possibilidade de ser um ‘outro’.

Em cada momento da minha existência, embora eu seja uma totalidade,


manifesta-se uma parte de mim como desdobramento das múltiplas
determinações a que estou sujeito. Quando estou frente a meu filho,
relaciono-me como pai; com meu pai, como filho; nunca compareço frente
aos outros apenas como portador de um único papel, mas como uma
personagem (chamada por um nome, Fulano, ou por papel, o Papai, etc),
como uma totalidade... parcial. O mesmo pode ser dito de meu filho e de
meu pai. (Ciampa, 1996, p. 170)

Mediante as relações sociais se estabelecem certos rótulos com os quais


somos reconhecidos e nos reconhecemos através deles. Podemos colocar como
exemplo o nome de um indivíduo, que se constitui, juntamente com outros rótulos, o
início do processo da formação identitária do indivíduo dada pelo ‘outro’.

Ainda no ventre materno, o bebê é reconhecido socialmente como o bebê de


determinados pais ou de determinada família. Muitas vezes um nome é dado ao
bebê quando ainda se encontra no ventre materno. Podemos considerar o nome
como a primeira predicação concedida ao indivíduo pelo ‘outro’. Sendo que esse
novo ‘eu’ cresce e desenvolve-se com o nome que lhe é atribuído, no qual define ‘o
que’ ou ‘quem’ ele é. Ou mesmo ‘o que’ ele pode vir a ser, pelos desejos, pelos
38

anseios e pelas expectativas postas pelo ‘outro’, convergendo e divergindo com os


desejos, com os anseios e com as expectativas do ‘eu’.

Dessa maneira o indivíduo tende a identificar-se e é identificado pelos


atributos que lhe são conferidos pelo ‘outro’. Segundo Ciampa (1996, p. 131)
“interiorizamos aquilo que os outros nos atribuem de tal forma que se torna algo
nosso”. Sendo assim, os predicados atribuídos ao indivíduo fundem-se a ele,
designando-lhe um papel no qual deverá assumir, construir e reconstruir conforme
as circunstâncias na qual ele está inserido.

Contudo, é preciso considerar as condições que circunscrevem o processo no


qual tais predicados são atribuídos ao indivíduo. As resistências e as abdicações
que podem surgir durante ou em decorrência desse processo. Lembrando que o ‘eu’
também se assume como ‘outro’ nas relações interpessoais.

Ainda assim, comumente no cotidiano das relações sociais, comumente são


atribuídos predicados ao ‘outro’. Ele se reconhece e é reconhecido, tal qual o papel
que lhe é dado a assumir e a representar na sociedade sob o olhar do ‘eu’ e do
‘outro’. Através de uma determinada atividade que se realiza, comumente é possível
declarar quem o ‘outro’ é.

Raro, quando se relaciona o indivíduo a uma atividade: o fulano ensina


matemática. Comumente tende-se a atribuir uma atividade ao indivíduo: o fulano é
professor de matemática. Dessa maneira, o indivíduo tende a interiorizar as
determinações do que é ser um professor de matemática, identificando-se e sendo
identificado pela posição que lhe é posta pela sociedade. Ou seja, com certa
frequência o reconhecimento não se faz somente mediante ao conhecimento que lhe
é próprio por sua formação, mas ele se constrói na complexidade das atribuições
dadas pelo ‘outro’ sobre o que é ser um professor de matemática (disciplina chata,
professor chato; arrogante; metódico; frio; etc.). “O indivíduo não mais é algo: ele é o
que faz” (Ciampa, 1996, p. 135).

Em contrapartida aos desejos e anseios do ‘outro’, o ‘eu’ possui seus próprios


desejos, anseios e expectativas. O conhecimento e o reconhecimento do ‘eu’ pelo
‘outro’ repercute no mundo através da realização de uma determinada ação. Ao se
39

fazer algo que se concretize no mundo, que venha a tornar externo a sua
subjetividade, o ‘eu’ e o ‘outro’ se formam e se reformam em suas percepções, logo,
entendemos que uma identidade se forma nesse jogo dinâmico, complexo e
interativo entre o ‘eu’, o ‘outro’ e o ‘meio’ no qual, historicamente, vivem.

Isto posto, entendemos a existência de um forte movimento dialético no


processo de formação de uma identidade. Ao desejar ser, tal qual o outro anseia, um
jogo de interesses e circunstâncias se promove na medida em que diferentes
desejos e expectativas se projetam no mundo.

Ao considerarmos que o ‘eu’ é condicionado ao mesmo tempo em que


condiciona o ‘outro’, promovendo um círculo relacional que vai configurando os
modos de ser, de pensar e de agir. Ou seja, aquele que condiciona o
comportamento dos outros, torna-se condicionado pelo próprio movimento de
condicionar. O indivíduo acaba por ser condicionado pelo próprio ato, pela sua ação,
por aquilo que pensa, por seus sentimentos, pelo contexto histórico em que vive,
pela sua cultura, pelos seus amigos, pela sua família, pelo seu trabalho, enfim, por
tudo aquilo que adentrar a sua vida de forma natural ou por esforço humano.

Esse contínuo processo que condiciona e que cria hábitos, “que representa a
pessoa e a engendra” (Ciampa, 1996, p. 243), nos permite, mediante sua
manifestação pela linguagem, compreender, em certa medida, sobre a identidade
desse indivíduo.

A identidade do indivíduo metamorfoseia-se ao longo da sua história de vida


conforme suas inter-relações se desenvolvem com o meio social e com o momento
histórico no qual está exposto. Portanto, ao expressar-se, ele se percebe e expressa
a noção que tem de si mesmo através de um complexo movimento relacional
existente com o ‘outro’ e com o ‘meio’. Ou seja, o indivíduo se compreende e é
compreendido através dos atributos que o ‘outro’ lhe designa e de sua relação com
essa percepção, ora passiva, ora de confronto. Mas é no exprimir-se, no falar de si
mesmo, no expressar sua percepção de mundo, que o indivíduo se materializa na
realidade.
40

Concordamos que o processo de formação da identidade profissional é


caracterizado pelas interações desenvolvidas no ambiente de trabalho e que “uma
vez cristalizada, é mantida, modificada ou mesmo remodelada pelas relações
sociais” (Berger e Luckmann, 2013, p. 221). Logo, mediante a realização de seu
trabalho, ser um bom ou um mau profissional pode vir a não ser uma premissa do
trabalhador, mas daqueles que atribuem tal valor a ele.

Contudo, dado os diferentes desejos e expectativas da organização e dos


indivíduos que fazem parte dela, esses se localizam em um contínuo processo de
convergência e de divergência.

Berger e Luckmann (2013, p. 221), afirmam que:

Os processos sociais implicados na formação e conservação da identidade


são determinados pela estrutura social. Inversamente, as identidades
produzidas pela interação do organismo, da consciência individual e da
estrutura social reagem sobre a estrutura social dada, mantendo-a,
modificando-a ou mesmo remodelando-a.

Os estudos de Ciampa (1996) e Berger e Luckmann (2013) vêm corroborar


com nossa postura investigativa ao perceberem o indivíduo como produto dos
processos sociais no qual está exposto e ao mesmo tempo produtor de tal contexto.
Entendemos que a identidade profissional pode vir a se concretizar pela
compreensão que o trabalhador tem de si mesmo mediante o ‘outro’, em uma
complexa relação entre o ‘eu’, o ‘outro’ e o ‘meio’.

outro eu

IDENTIDADE

meio

Isto posto, uma questão nos é válida: como o professor coordenador


compreende as convergências e divergências inerentes à escola e ao seu trabalho?

Ao exprimirem seus entendimentos sobre essa questão, os professores


coordenadores entrevistados demonstraram compreender as divergências, em
41

nosso pensar, de forma um pouco autoritária. Caracterizando-a como um


impedimento ao seu trabalho e não como uma ação que existe naturalmente nas
relações sociais. Ou seja, interpretam que as divergências são barreiras postas por
aqueles que “são do contra” e que é preciso destruir essa barreira. Não
compreendem as diferenças em decorrência das várias motivações que possam
existir e coexistir entre os indivíduos. Quanto às convergências, essas se resumem
ao aceite irrestrito das intervenções e proposições postas por eles aos docentes.

A partir de suas análises, Ciampa (1996) nos revela que a materialidade das
relações sociais no mundo surge a partir das singularidades que cada indivíduo
projeta em ‘si’ e no ‘outro’. Como afirma o autor, isto ocorre por que:

Cada indivíduo encarna as relações sociais, configurando uma identidade


pessoal. Uma história de vida. Um projeto de vida. [...] Uma identidade
concretiza uma política, dá corpo a uma ideologia. No seu conjunto, as
identidades constituem a sociedade, ao mesmo tempo em que são
constituídas, cada uma por ela. A questão da identidade, assim, deve ser
vista não como questão apenas científica, nem meramente acadêmica: é
sobretudo uma questão social, uma questão política. (p. 127)

Em nossas entrevistas, os professores coordenadores expressaram em suas


falas que a percepção que eles têm da forma como as outras pessoas os enxergam
é de que eles são vigias que monitoram o trabalho docente. Todavia, compreendem
que “estão lá para ajudar” o docente em seu trabalho.

2.2. A organização, o ‘outro’ e o ‘eu’

Na busca por referenciais teóricos que nos permitisse compreender o


processo de formação identitária no interior das organizações, encontramos nos
estudos de Capitão e Heloani (2007) e Enriquez (1974) o conceito de identidade
analisado a partir de estudos realizados em organizações onde se estabelecem
relações de trabalho. Os autores expressam em suas análises a ideia que “nós só
existimos enquanto somos reconhecidos pelos outros” (Enriquez, 1974, p. 57). Logo,
compreendemos que, no ambiente de trabalho, esse reconhecimento pode vir a se
42

estabelecer através da manipulação das relações consensuais e contraditórias


existentes entre os indivíduos e a organização, na intensão de fundir as identidades
em uma única: a identidade da organização a qual pertencem.

Responsável pela construção da identidade, o grupo é a célula-base por


meio da qual o indivíduo adquire valores, introjeta normas, condutas,
adquire necessidades. Estabelece-se assim um movimento dialético
contínuo, que se desenvolve por toda a vida da pessoa, só expirando com
sua morte. Através de um processamento contínuo de intersubjetividades
que passam a transformar-se em elementos socioculturais, o sujeito
constrói sua identidade individual e grupal. (Capitão e Heloani, 2007, p.52)

Nesse sentido, as organizações acabam por se apresentarem como um


grande palco onde os indivíduos, imbuídos de seus papeis, os representam na
medida em que seus interesses encontram espaços para que esses possam ser
realizados, estabelecendo seu posicionamento em um determinado grupo, dentro da
organização. Em outras palavras, os espaços para a manifestação dos interesses
podem surgir quando esses se coadunam com os interesses do grupo, estreitando a
relação entre a identidade do grupo e a identidade individual, caso contrário, é muito
provável que o grupo exerça pressão para que o novo indivíduo aceite como seus os
interesses do grupo, ou forcem-no a sair.

Porém, ao mesmo tempo e na medida em que de fato uma pessoa é


inserida em um determinado grupo, por essa condição, pode sofrer uma
profunda alteração em seu funcionamento mental, como também, da sua
identidade. (Capitão e Heloani, 2007, p. 51)

Contudo, não podemos descartar a probabilidade de uma mudança na


identidade do grupo por força de um único indivíduo. Tendo em vista que as
relações que se estabelecem dentro do grupo são relações orgânicas de poder, isto
é, não são relações mecânicas e unidirecionais, mas múltiplas. Todos são
partícipes, uns mais submissos, outros mais subversivos e outros podem vir a se
mostrarem indiferentes. E é nessa pluralidade de interesses, de entendimentos do
‘eu’ e do ‘outro’, que o movimento relacional entre os indivíduos adquire seus
contornos.

Logo, no processo de interação social, um indivíduo pode vir a impor seus


interesses a um pequeno grupo dentro de um grupo maior, formando um novo
grupo, estabelecendo alianças, fortalecendo-se até ao ponto onde os seus
interesses se tornem os interesses do grupo maior ou um novo grupo se forme.
43

Ao compreendermos que a lógica expressa pelas organizações é uma lógica


capitalista, portanto, mercantil. E que essa lógica encontra legitimidade na estrutura
burocrática que a organiza. Logo, se faz urgente uma discussão em torno da ideia
de que a subjetividade que permeia as organizações é uma subjetividade com mote
capitalista, e de que essa segue permeando as singularidades de cada indivíduo,
formatando sua identidade.

Todavia, não somos integralmente reflexo do meio, visto que condicionamos e


somos condicionados, que transformamos e somos transformados, e que, nessa
intensa e complexa interação dialética com o meio, não só é dada a possibilidade de
compreensão desse movimento condicionante, como também criam-se
possibilidades para que surjam movimentos de transformação e de superação dessa
lógica capitalista. Sob esse prisma, a urgência de se trazer a tona tal discussão
adquire sua viabilidade.

Contudo, é preciso compreender que essa possibilidade é relativa. A


superação da lógica capitalista exige do indivíduo uma superação da sua própria
identidade. Se sou ‘eu’ mesmo como o ‘outro’, o processo de superação exige
superar também o ‘outro’. Tendo em vista que a lógica voltada para o capital está
impregnada na sociedade e na quase totalidade das suas organizações, esse
processo de superação exige muita energia e disposição por parte do ‘eu’. E é nesse
cenário, permeado por lutas desiguais, onde a lógica capitalista tem feito muitas
vítimas, que o trabalho do professor coordenador se realiza: na escola pública.

A organização, enquanto conjunto estruturado e estabilizado, vai colocar


cada um no desafio de provar sua existência e vai instaurar a gramática da
luta pela vida. (Enriquez, 1974, p. 66)

No interior de uma organização, “enquanto conjunto estruturado e


estabilizado” (Enriquez, 1974, p. 66), a identidade se define pelo que se espera do
indivíduo e não pelo que ele é, ou seja, existe um desejo de que esse indivíduo
tenha um comportamento permitido, coadunando suas ações e pensamentos dentro
do propósito estabelecido pela organização. Assim, ele poderá vir a incorporar o que
é ser um bom profissional pelos olhos da organização. O reconhecimento dado
pelos outros a cerca de seu trabalho, pela sua produção, pelo seu desempenho e
44

pela sua dedicação, constituem os apontamentos positivos que constituirão a


formação da consciência que o trabalhador terá de si mesmo.

Quando há a ocorrência de um rompimento, quando o reconhecimento não se


concretiza, quando isto é negado ao indivíduo, ou quando ele é expulso da
organização através de uma demissão ou afastado por um longo período, ele tende
a não se reconhecer mais como um membro importante para a organização e para o
‘outro’, ele se torna estranho a si mesmo.

Nas organizações contemporâneas os meios de monitoramento e de controle


do trabalho ocorrem a todo momento, tanto dentro como fora delas, ‘seguindo’ o
indivíduo onde quer que ele esteja. O nome próprio vem dar lugar ao nome da
organização, ao lugar que o indivíduo ocupa na organização, ao crachá. Quando o
sentimento de não pertença ou a retirada desse semiófaro se concretiza, quando a
retirada desse símbolo que o define, que o torna singular dentro da organização,
quando essa base lhe é tomada, a sua identidade fragiliza-se.

Capitão e Heloani (2007, p. 59) fazem um apontamento à esse respeito.


Segundo os autores:

O sujeito tende a identificar-se com o poder conferido à organização ou a


destruir-se por esse poder, quando a sensação de poder torna-se
esvaziada. Nesta dinâmica extremamente útil à lógica da produção, há uma
tentativa de dominar os outros e a si próprio, em uma relação amorosa em
que a organização funciona como um espelho, possibilitando condições
para um estado, vamos assim dizer, narcísico, um estado ilusório,
imaginário. Perder o emprego, ou melhor, desvincular-se da organização,
equivale às vezes a perda de um objeto hipervalorizado e que não encontra
substituto. Por consequência, temos os estados depressivos, ou seja, o
sentimento de vazio, angústia, que chega até mesmo ao limite da morte
planejada.
45

CAPÍTULO 3 - METODOLOGIA

Sendo essa, uma pesquisa no campo da educação, uma questão decisória se


revelou de suma importância para delinear os procedimentos que utilizamos na
construção lógica desse estudo: qual metodologia e quais métodos utilizar?

Não poderíamos utilizar procedimentos nos quais a relação de causa e efeito


determinasse a racionalidade dos procedimentos metodológicos, visto que essa é
uma prática comum adotada no campo das ciências naturais e, no mais, estaríamos
reduzindo os achados de campo à um princípio único: ‘isto’ em consequência
‘daquilo’. Utilizarmo-nos dessa premissa seria no mínimo inadequado, posto que, a
metodologia conecta-se com o campo teórico e esse já demonstrou não poder ser
medido de forma linear posto a procedimentos rígidos e imutáveis mesmo que
fundamentados em conceitos prévios. Sendo assim, compreendemos que nas
ciências sociais:

O campo de pesquisa, concebido como lugar efetivo do trabalho dos


pesquisadores, é essencialmente o lugar dinâmico e dialético no qual se
elabora uma prática científica que constrói objetos de conhecimento
específicos, os quais impõem, por sua vez, sua matriz particular de
apreensão e de interpretação dos fenômenos. (Bruyne et al., 1977, p. 28)

A ideia de que a metodologia é um trilho no qual os procedimentos são postos


e ali estarão prontos para seguir caminho, acarreta em uma atribuição limitada,
retirando sua condição criativa e essencialmente dinâmica. A metodologia não deve
engessar a pesquisa, mas sim ser um instrumento para a pesquisa, a serviço da
pesquisa.

Dessa forma, entendemos que ao definir a metodologia, cabe ao pesquisador


assimilar suas regras e suas teorias, a ponto de, ao compreendê-las, poder romper
com padrões, quando tais rupturas se fazem necessárias, como afirma Bruyne et al.
(1977), permitindo apreender o espírito inventivo e criativo na relação pesquisador e
objeto.
46

Bruyne et al. (1977) nos chama a atenção para esse possível enrijecimento
do pensar mediante a metodologia. Para ele:

A prática científica não é redutível a uma sequência de operações, de


procedimentos necessários e imutáveis, de protocolos codificados. Tal
concepção, que converte a metodologia numa tecnologia, repousa sobre a
visão rigorista e “burocrática” do design, fixado no início da pesquisa e de
uma vez por todas, concretizando-se no que W. H. White chama de “mania
de projeto”. Ao contrário, parece que a complexidade das problemáticas em
ciências sociais exige interpenetrações e voltas constantes entre os polos
epistemológico, teórico, morfológico e técnico da pesquisa. Mas a divisão
sócio-técnica do trabalho e a profissionalização do pesquisador tendem
para automatismos administrativos de tipo burocrático: “O recorte das
operações da pesquisa serve de paradigma, pelo menos inconsciente, à
maioria dos pesquisadores, nada mais é do que a projeção do espaço
epistemológico de um organograma burocrático... tudo concorre para
favorecer a dicotomia entre empirismo cego e a teoria sem controle, a
magia formalista e o ritual dos atos subalternos”. (p. 30)

Diante do esforço de não limitar essa pesquisa a um comportamento regido


pelas leis cartesianas13 de causa/efeito, que percebe a realidade como fatos e ou
eventos isolados e independentes, e ao compreendermos que nas ciências sociais
não há determinismos e sim regularidades decorrentes das singularidades de um
determinado indivíduo e/ou grupo, entendemos que a metodologia precisa conectar-
se com a teoria e com o objeto numa dinâmica de entrelaçamento onde um polo
complementa o outro num processo que pressupõe uma abertura para novas
compreensões sobre o tema, ampliando as possibilidades de observação e
interpretação do estudo.

No tocante ao pesquisador, entendemos que a escolha de uma metodologia


que o oriente e lhe dê suporte para que o seu percurso científico se concretize por
um caminho que não o domestique, ao impor-lhe uma conduta científica com base
apenas na assimilação e reprodução de regras, definindo sua competência diante da
fidelidade aos métodos, é de suma importância para a sua formação. Nesse sentido,
a metodologia deve possibilitar a movimentação do pesquisador por entre os polos,
permitindo-lhe uma visão panorâmica da pesquisa.

13
“A divisão entre espírito e matéria levou à concepção do universo como um sistema mecânico que
consiste em objetos separados, os quais, por sua vez, foram reduzidos a seus componentes
materiais fundamentais cujas propriedades e interações, acredita-se, determinam completamente
todos os fenômenos naturais. Essa concepção cartesiana da natureza foi, além disso, estendida aos
organismos vivos, considerados máquinas constituídas de peças separadas. [...] tal concepção
mecanicista do mundo ainda está na base da maioria de nossas ciências e continua a exercer uma
enorme influência em muitos aspectos de nossa vida (p. 37).” CAPRA, Fritjof. O ponto de Mutação.
24. ed. São Paulo: Editora Pensamento-Cultrix, 2003.
47

A sociedade se apresenta como um misto de regras e certas regularidades


homogêneas ao mesmo tempo em que é dinâmica e plural, sendo assim, mediante
esse paradoxo, ao entendermos as relações sociais como mecânicas,
provavelmente estaríamos correndo o risco de observarmos somente uma parte do
objeto, deixando de notar as singularidades e a interdependência de fatores que
constituem a sua totalidade, prejudicando a compreensão e a interpretação do
mesmo. Decerto que, mesmo com esse olhar dinâmico e indivisível, entendendo as
partes como essencialmente inter-relacionadas, não temos o atrevimento de
expressar nossas considerações finais como sendo uma verdade única, um quadro
acabado da realidade. Estaríamos assim compondo uma análise mecânica,
estanque. Ora! É exatamente isso que não queremos.

Nesse caso, não se trata de romper com o processo metodológico, o que nos
colocaria em risco de perdermos as rédeas na condução do estudo, privando-nos de
uma compreensão e interpretação do objeto de pesquisa que nos revele um
panorama amplo sem se perder dentro do emaranhado teórico/prático.

Encontrar o melhor meio entre os termos requer um esforço cognitivo que não
pode ser desprezado nessa etapa da formação do pesquisador.

Logo, para esse estudo, consideramos o uso da hermenêutica filosófica14


como o caminho metodológico a ser utilizado, tendo em vista que essa metodologia
privilegia a linguagem como forma de expressão pela qual o indivíduo interage com
outros e com o meio social no qual pertence ou se encontra naquele determinado
momento. Nessa interação ele é produto e produtor do meio social. Ele é
transformado e transformador desse ou daquele meio. E nesse dinâmico processo
de compreensão, interpretação e de posicionamento diante do mundo, a linguagem
assume a função de objetivação, ou seja, a externalização da compreensão. A
compreensão guardada no pensamento pode tornar-se subjetiva, abstrata e inócua.
Ela não se processa no mundo, não interage, não há movimento, não há
posicionamento, e dessa maneira, o indivíduo pode ficar à mercê do ‘outro’. Sem
confrontar as ideias do ‘outro’ e sem projetar no mundo as suas, aliena-se.

14
GADANER, Hans-Georg. Verdade e Método I – traços fundamentais de uma hermenêutica
filosófica. 12. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
48

Manifestar-se através da linguagem é projetar-se no mundo, é estar vivo e


partícipe do processo e do momento histórico em que se encontra. Mesmo o
expressar alienado é válido, pois carrega consigo a própria realidade que o originou.
Sendo assim, a linguagem é o instrumento no qual o indivíduo manifesta a sua
existência. Nas palavras de Gadamer (2012): “A linguagem é o meio em que se
realizam o acordo dos interlocutores e o entendimento sobre a coisa em questão” (p.
497).

O primeiro significado dado à hermenêutica foi como a arte da compreensão


e da interpretação do significado das palavras e dos símbolos, retirando os seus
sentidos ocultos ou os mais aparentes de textos religiosos, jurídicos ou literários.
Através de Gadamer (2012), apreendemos que o sentido da hermenêutica vai além
de seu significado original. Ela se comporta como uma ferramenta que contesta a
existência de um único caminho que conduz o pensar ao encontro do conhecimento
da verdade. Ao valer-se da compreensão e da interpretação, a hermenêutica intenta
ultrapassar essa barreira enraizada em nossa forma de pensar que está
condicionada pelo pragmatismo e pelo utilitarismo posto pelo pensamento mecânico
das ciências naturais, e passa a nos orientar para um pensamento sistêmico, plural,
que intenta por um entendimento pleno dos fenômenos humanos, buscando
compreender as singularidades de cada indivíduo, ou seja, um movimento que
busca a compreensão do “todo a partir do individual e do individual a partir do todo”
(p. 385), que constituirá o seu ser.

A hermenêutica que se vai desenvolver aqui não é uma doutrina de


métodos das ciências do espírito, mas a tentativa de entender o que são na
verdade as ciências do espírito, para além de sua autoconsciência
metodológica, e o que as liga ao conjunto de nossa experiência de mundo.
(Gadamer, 2012, p. 31)

A linguagem projetada adentra o mundo e adquire um determinado sentido


conforme o contexto em que surge, podendo o sentido ser alterado sempre que os
interlocutores mudam. Porém, o significado das palavras não se apresenta de forma
tão provisória. Ele, o significado, tende a permanecer estável por um longo período
mesmo quando os sentidos se alteram. Podemos dizer que o sentido é o instante,
porque é subjetivo, e o significado é histórico, porque é social.
49

Porém, a realidade não existe de forma estanque, há sempre a possibilidade


de, mediante um processo de compreensão e de interpretação, novos sentidos
serem apreendidos possibilitando que novos significados surjam e, conforme o
momento histórico e a realidade social na qual esse processo se concretiza, novas
formas de pensar e de refletir podem adentrar a realidade.

A hermenêutica considera a linguagem como sendo um instrumento para a


materialização da razão. É a expressão objetiva do pensamento que se torna
realidade, é a opinião de si sendo posta ao outro e vice-versa.

O que intentamos é poder, através do diálogo, da palavra, compreender e


interpretar a realidade posta pelo ‘outro’, possibilitando que outros sentidos sobre o
tema desse estudo se apresentem, visto que a linguagem faz parte da ação humana
e é através dele que produzimos e somos produto do meio em que vivemos.

Costumamos dizer que “levamos” uma conversa, mas na verdade quanto


mais autêntica uma conversação, tanto menos ela se encontra sob a
direção da vontade de um outro dos interlocutores. Assim, a conversação
autêntica jamais é aquela que queríamos levar. Ao contrário, em geral é
mais correto dizer que desembocamos e até que nos enredamos numa
conversação. Como uma palavra puxa a outra, como a conversação toma
seus rumos, encontra seu curso e seu desenlace, tudo isso pode ter algo
como uma direção, mas nela não são os interlocutores que dirigem; eles
são dirigidos. O que “surgirá” de uma conversação ninguém pode saber de
antemão. O acordo ou o seu fracasso é como um acontecimento que se
realizou entre nós. [...] Tudo isso demonstra que a conversação tem seu
próprio espírito e que a linguagem que empregamos ali carrega em si sua
própria verdade, ou seja, “desvela” e deixa surgir algo que é a partir de
então. [...] compreender o que alguém diz é pôr-se de acordo na linguagem
e não transferir-se para o outro e reproduzir suas vivências. (Gadamer,
2012, p. 497)

Nosso entendimento sobre o processo hermenêutico gadameriano, não vai de


encontro a um procedimento técnico fechado, onde ao se perguntar algo, pergunta-
se num desejo de uma resposta já prevista, como em um inquérito ou investigação
policial. Entendemos que durante o diálogo deve-se estar aberto ao tema, a ponto
dele conduzir a conversa, oportunizando uma reflexão entre os interlocutores.
Porém, essa entrega ao diálogo não pode ser confundida com algo totalmente
neutro, sem objetividade, sem rumo ou ao léu. O posicionamento que pretendemos
ter mediante ao diálogo é o de assumir nossos pré-conceitos e nossa opinião diante
da opinião do outro, num entendimento mediado pela linguagem diante do que foi
dito.
50

Sob esse prisma, a hermenêutica filosófica vem fundamentar o uso do diálogo


como método, tendo em vista que através dele o indivíduo encontra o caminho para
se objetivar no mundo. Logo, justificamos o uso de um questionário aberto em
nossas entrevistas, privilegiando a abertura para que o entrevistado possa vir a se
expressar abertamente, criando possibilidades para que suas singularidades se
tornem ‘visíveis’.

Nossa abordagem considera o que sabemos, o que a pesquisa documental


nos revelou e juntamente com o que o nos foi exposto pelo professor coordenador,
tendo em vista que sua opinião expressa seus conhecimentos e experiências vividas
e construídas, inserido em um processo histórico e que, no momento da realização
do diálogo, trouxe a tona o seu saber sobre a complexidade do lhe foi proposto a
refletir e exprimir, contribuindo assim para uma compreensão e uma interpretação de
achados de sentidos e significados sobre como é construída a sua identidade
profissional.

[...] a linguagem é o médium universal em que se realiza a própria


compreensão. A forma de realização da compreensão é a interpretação. [...]
Todo compreender é interpretar, e todo interpretar se desenvolve no
médium de uma linguagem que pretende deixar falar o objeto, sendo, ao
mesmo tempo, a própria linguagem do intérprete. (Gadamer, 2012, pg. 503)

Vale deixar claro que não estamos em busca dos efeitos de uma ação e sim a
ação. E essa ação, nesse estudo, é o resultado do diálogo obtido com o professor
coordenador e a pesquisa documental. É o compreender e o interpretar o que essas
vivências expressam. Não é fazê-lo do ponto de vista de um julgamento moral,
confrontando, encontrando erros e acertos. Tão pouco, buscamos fazer
comparações, descrever narrativas, histórias de vida ou propor uma análise de
conteúdo. É pura e simplesmente “fazer valer o direito objetivo daquilo que o outro
diz” (Gadamer, 2012, pg. 386).

Esse modelo metodológico que estamos utilizando é um modelo


compreensivo e interpretativo, onde a realidade tende a se apresentar tal qual como
ela é através da linguagem, exportando para a realidade o pensamento dos
interlocutores, tornando-se real. É a subjetividade tornando-se objetividade.
51

3.1. Procedimentos e Participantes do Estudo

O procedimento metodológico inclui: o documental e o campo materializado


nas entrevistas.

Os documentos que subsidiaram nosso estudo foram:

Tabela 3
Ato normativo Ementa / Título Âmbito
Lei nº 5.692, de 11 de agosto de Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º
Nacional
1971. graus, e dá outras providências.
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro Estabelece as diretrizes e bases da educação
Nacional
de 1996. nacional.
Institui o Estatuto do Magistério Público de 1.º e
Lei Complementar nº 114, de 13 de
2.º graus do Estado e dá providências Estadual – São Paulo
novembro de 1974.
correlatas.
Lei Complementar nº 201, de 09 de Dispõe sobre o Estatuto do Magistério e dá
Estadual – São Paulo
novembro de 1978. providências correlatas.
Lei Complementar nº 444, de 27 de Dispõe sobre o Estatuto do Magistério Paulista e
Estadual – São Paulo
dezembro de 1985. dá providências correlatas.
Dispõe sobre a criação e a extinção dos cargos
Lei nº 9.289, de 26 de dezembro
e das funções-atividades que especifica e dá Estadual – São Paulo
de 1995.
previdências correlatas.
Dispõe sobre a continuidade do processo de
escolha para designação de professor para o
Resolução SE nº 76, de 13 de
exercício da função de Coordenação Estadual – São Paulo
junho de 1997.
Pedagógica, nas escolas da rede estadual de
ensino, e dá providências correlatas.
Dispõe sobre o processo de seleção, escolha e
Resolução SE nº 35, de 07 de abril designação de docente para exercer as funções
Estadual – São Paulo
de 2000. de Professor Coordenador, em escolas da rede
estadual de ensino e dá providências correlatas.
Dispõe sobre o processo de credenciamento,
seleção e indicação de docentes para o posto
Resolução SE nº 66, de 03 de
de trabalho de Professor Coordenador, em Estadual – São Paulo
outubro de 2006.
escolas da rede estadual de ensino e dá
providências correlatas.
Resolução SE nº 88, de 19 de Dispõe sobre a função gratificada de Professor
Estadual – São Paulo
dezembro de 2007. Coordenador.
Procedimentos relativos ao processo de
credenciamento de docentes para função de
Instrução CENP nº1, de 10 de
Professor Coordenador do ciclo II do Ensino Estadual – São Paulo
janeiro de 2008.
Fundamental e ou do Ensino Médio, das
Escolas Estaduais.

Ademais dos atos normativos, utilizamos publicações impressas pela


SEE/SP, como: Caderno do Gestor, volume 01; Relatório dos estudos do SARESP
2013; e Caderno do Programa de Qualidade da Escola 2007. Além de publicações
on-line retiradas da página da SEE/SP na internet.
52

A escolha dos participantes, a entrada em campo e a transcrição das


entrevistas ocorreram nos meses de março, abril e maio de 2015.

Do ponto de vista pedagógico, optamos por trabalhar com professores


coordenadores de um único nível de ensino no intento de obter uma sólida
apreensão do processo teórico, metodológico e de campo no qual estamos
trabalhando, para que o mesmo não seja “apenas” usado, visto que, estamos
tratando de uma dissertação de mestrado e, portanto, do aprofundamento do
processo de formação do pesquisador.

Convidamos para participar desse estudo, docentes designados para a


função de professor coordenador do ensino fundamental anos finais do ensino
público paulista (5ªsérie/6ºano à 8ªsérie/9ºano). Muito embora as atribuições legais
para o professor coordenador do ensino fundamental anos finais e para o do ensino
médio sejam as mesmas, conhecendo as diferenças existentes entre esses dois
níveis de ensino, como por exemplo: os programas curriculares; a forma de
aprovação/retenção; a faixa etária dos estudantes; entre outros fatores que
poderiam contribuir para uma análise fragmentada do objeto de pesquisa, optamos
por definir um único nível de ensino para o qual o professor coordenador é
designado.

Logo, se escolhêssemos indistintamente um professor coordenador de cada


nível de ensino para a pesquisa de campo, percepções muito diferentes poderiam
surgir. O que acarretaria uma dificuldade técnica na análise e na interpretação dos
dados, visto que a interpretação sobre a identidade profissional entre os
participantes poderia vir a ser interpretada como distinta, ou homogênea, por conta
das diferenças existentes no modo de organização do trabalho de cada nível de
ensino e não por suas características individuais e peculiares, mediante à um
mesmo modelo de trabalho. Contudo, seja qual for a direção em que a compreensão
e a interpretação foi conduzida, estamos seguros de que ela ocorreu em um
determinado grupo, com especificações distintas para o seu trabalho.

Consideramos dois fatores para a escolha de tal nível de ensino:


53

1.) No ano de 2013 foi oferecido pela SEE/SP através da Escola de Formação
e Aperfeiçoamento dos Professores do Estado de São Paulo "Paulo Renato Costa
Souza", o curso intitulado “Melhor Gestão, Melhor Ensino” – MGME, no qual
procedimentos técnicos e burocráticos de monitoramento das aulas dos docentes e
dos estudantes foram ensinados para posterior implantação nas escolas no ano de
2014. Válido falar que os professores coordenadores do ensino fundamental anos
finais aderiram ao curso através de um “convite” feito pelos diretores de escola e
pelos supervisores de ensino (os diretores de escola também participaram do curso);

2.) A alteração na série/ano de retenção dos estudantes. Até o ano de 2013


nesse nível de ensino, a retenção só poderia acontecer na 8ªsérie/9ºano. A partir de
2014 a retenção também passou a ocorrer na 5ªsérie/6ºano, além da 8ªsérie/9ºano.
Ao julgarmos a existência de metas de redução progressiva nas taxas de reprovação
e abandono dos estudantes, é muito provável que mudanças substanciais venham a
ocorrer no modo em que o professor coordenador compreende e percebe o seu
trabalho. Podendo vir a intensificar medidas de monitoramento do rendimento dos
estudantes e do trabalho dos docentes.

Segundo dados da SEE/SP, publicados no documento “Sumário Executivo


SARESP 201315”, haviam no Estado de São Paulo, no ano de 2013, 10.063 (dez mil
e sessenta e três) docentes ocupando a função de professor coordenador na rede
pública estadual de ensino. Para a realização da pesquisa convidamos professores
coordenadores de diversas Diretorias de Ensino.

Contudo, existem atualmente 91 (noventa e uma) Diretorias de Ensino no


Estado de São Paulo. Logo, a escolha das Diretorias de Ensino se deu pela
proximidade em que as cidades sob sua jurisprudência encontravam-se do
pesquisador, facilitando o contato com os participantes e otimizando o tempo de
permanência no campo.

A forma que escolhemos para convidar os professores coordenadores foi


através de e-mail e posterior contato telefônico com os que decidiram participar da
pesquisa. No e-mail expusemos o objetivo da pesquisa, a forma e a previsão da
duração da entrevista e garantimos o sigilo absoluto da sua participação e do

15
Disponível em: http://saresp.fde.sp.gov.br/2013/#. Acesso em: 14/07/2015
54

conteúdo gravado. Considerando que muitos professores coordenadores acumulam


cargos e/ou funções, não seria ideal marcar as entrevistas em um horário que
pudesse causar-lhes alguma tensão ou outro fator que não os deixassem à vontade.
Portanto, foi concedida ao participante a possibilidade de decidir sobre a escolha da
data, horário e local de realização das entrevistas.

Foram convidados 21 (vinte e um) professores coordenadores, dos quais 2


(dois) aceitaram participar da pesquisa.

As entrevistas se caracterizaram por meio de um diálogo aberto, permitindo


que ricas interações ocorressem. Muito embora a concepção metodológica que
utilizamos não privilegie o uso de questões estruturadas ou semi-estruturadas,
construímos algumas questões desse tipo para abrir o diálogo com o participante e,
a partir daí, deixamos o diálogo fluir sobre o tema proposto. Tais questões deram
início à conversação, possibilitando que novas questões surgissem, permitindo que
singularidades sobre o tema se manifestassem durante a entrevista. Abrir o diálogo
com tal técnica nos permitiu “comprender la lógica cultural desde el cual el sujeto
interpreta y da sentido a los hechos de realidad estudiados16” (Martinic, 1997, p.103).

Intentamos, durante o diálogo, não reduzir a participação do outro a respostas


fixas. Sequer direcionar as perguntas para que houvesse algum tipo de resposta
esperada ou satisfatória. Tal ocorrência poderia configurar em mera aplicação
técnica, não possibilitando uma abertura para o surgimento de novas perguntas. O
diálogo é uma arte que necessita de experiência e prática para que ele se realize de
forma fluída, com o propósito de que se estabeleça uma abertura ao outro, deixando
valer o que o outro tem a dizer. No devir da realização do diálogo fomos
impulsionados pela temática abordada, favorecendo assim uma abertura que
oportunizou uma autorreflexão aos interlocutores sobre seus pontos de vista acerca
do tema.

Realizadas as entrevistas, foi o momento de transcrevê-las. Decidimos


realizar essa tarefa nós mesmos. Tendo em vista que, ao delegar tal função a uma
pessoa que não presenciou o diálogo, a linguagem oral, viva e repleta de calor

16
Traduzido pelo autor: “compreender a lógica cultural da qual o sujeito interpreta o assunto e dá
sentido aos fatos da realidade estudada”.
55

humano, seria reduzida em uma linguagem escrita, também rica, contudo, estática e
passiva.

Dessa forma, conseguimos reviver algumas das singularidades expostas pela


lembrança dos gestos, das expressões e da postura que cada entrevistado teve
diante ao entrevistador/pesquisador (um olhar fixo, punhos cerrados, o tensionar ou
a leveza expressa na face), no momento da transcrição, incluindo assim, algumas
observações que consideramos relevantes.

No momento em que as entrevistas foram realizadas, nosso foco concentrou-


se na interação entre entrevistador/pesquisador e entrevistado, momento em que a
atenção centrada no diálogo, tentou-se interferir, minimamente, com questões que
possibilitaram o desenrolar do tema.

Já no momento da transcrição, focamos, ao transformar o áudio em texto, no


que foi e no que não foi dito, em perceber não só o que foi perguntado e respondido,
como também as perguntas que deixaram de ser feitas e nas respostas que
deixaram de ser respondidas, portanto, idas e vindas pelo áudio ocorreram.

A realização da transcrição ocorreu o mais breve possível após cada


entrevista, tendo em vista que elas ocorreram numa dinâmica na qual o entrevistado
mostrou-se livre para dizer o que pensava sobre o assunto, externando com mais
espontaneidade seu ponto de vista e proporcionando com que o
entrevistador/pesquisador captasse informações que poderiam ser utilizadas
posteriormente noutra entrevista.

Findadas as transcrições, foi o momento de realizamos uma leitura atenta,


buscando compreender o que está posto nos textos, permitindo “que o próprio texto
possa apresentar-se em sua alteridade, podendo assim confrontar sua verdade com
as opiniões prévias pessoais” (Gadamer, 2012, p. 358).

Nossas opiniões são constructos fundamentados pelo referencial teórico que


utilizamos nesse trabalho e outros diversos textos que permearam o processo de
construção do nosso conhecimento. Portanto, o ineditismo contido nos textos
transcritos foi de extrema importância ao buscarmos uma interpretação mais
proximal da problemática abordada nessa pesquisa.
56

Por fim, terminadas as leituras, construímos nossas compreensões e


interpretações, em um processo de análise articulado com o campo teórico,
resultando, posteriormente, na formulação e na expressão de nossas conclusões em
capítulo específico para tal. Procuramos através da conclusão, fugir de certos
determinismos. Não objetivamos uma postura pragmática e conclusiva em si, mas
sim propiciar que a partir das nossas conclusões, dúvidas surjam; que novos
problemas de pesquisa nasçam, e que novas compreensões e novas interpretações
se apresentem, possibilitando o tema manifestar-se nas suas mais variadas
possibilidades.

3.2. Categorias de análise

Ao apresentarmos os referenciais teóricos nos Capítulos 1 e 2 foi possível


identificar a abrangência da dimensão conceitual na qual as categorias ‘organização
do trabalho’ e ‘identidade’ assumem. Contudo, não é nossa intenção tentar esgotar
as possibilidades conceituais dessas categorias junto ao objeto.

Ao compormos a metodologia, conectando-a ao referencial teórico, pudemos


estabelecer os aspectos mais significativos de cada categoria de análise em relação
ao objeto de nossa pesquisa. Dessa forma, organizamos os motivos condutores de
cada categoria, constituindo assim, um quadro que permitisse formar um “conjunto
orgânico considerado simultaneamente em sua coerência hierárquica intrínseca e
em sua correspondência com a realidade teorizada” (Bruyne et al., 1977, p. 186).

Assim, as categorias de análise ‘organização do trabalho’ e ‘identidade’, ao se


inserirem no contexto das reformas educacionais da educação pública paulista,
ocorridas entre os anos de 2007 e 2014, compuseram subcategorias de análise, que
resultaram no seguinte quadro:
58

[...] os fundamentos e preceitos do pós-fordismo são, em sua essência,


muito semelhantes aos da lógica taylorista. Apenas mais sutis, mais bem
maquiados e, portanto, mais perigosos, pois de certa maneira agora o
trabalhador compartilha a própria dominação. (Heloani, 2011b, p. 175)

Compreendemos que a administração pública, ao se utilizar dos princípios e


da ideologia utilizada na administração de empresas (Brasil, 1995, p. 16), apropria-
se do conceito de gestão “como um conjunto de técnicas, destinadas a racionalizar e
otimizar o funcionamento das organizações” (Gaulejac, 2014, p. 39).

Gaulejac (2014, p. 68) afirma que por muito tempo a gestão esteve
relacionada com a parte física das organizações, entretanto, com o passar do tempo
o fator humano e a complexidade das relações interpessoais passaram a integrar a
gestão administrativa das organizações. Dessa maneira a gestão passa a
compreender diversas especialidades e a ocupar diversos espaços dentro das
empresas, como a: gestão comercial, a gestão do pessoal e dos recursos humanos,
a gestão contábil, a gestão de produção, a gestão, etc. Segundo o autor os saberes
práticos existentes nesses diferentes espaços “têm como função modelar
comportamentos, orientar processos de decisão, estabelecer procedimentos e
normas de funcionamento” e que “a particularidade da gestão reside no fato de que
não se trata de perseguir uma finalidade escolhida por indivíduos, nem uma
finalidade negociada no interior de uma coletividade, mas uma finalidade exterior” (p.
68).
59

CAPÍTULO 4 - A SEE/SP E A CONSTITUIÇÃO DO ESPAÇO/TEMPO


DO TRABALHO DO PROFESSOR COORDENADOR

Nesse capítulo apresentaremos o trabalho do professor coordenador sob uma


ótica documental, contextualizando-o em uma linha histórico-temporal. Para tanto,
dividimos o capítulo em décadas, ordenando assim o trabalho do professor
coordenador às ocorrências e as proposições das reformas educacionais desde a
década de 1970 até o ano de 2014.

4.1. As décadas de 1970 e 1980

A década de 1970 inicia-se em meio a uma fase da história brasileira onde o


processo político se encontrava sob o ideário desenvolvimentista de um regime
militar que limitava toda e qualquer ação política dos cidadãos. O intenso
autoritarismo adentra a referida década trazendo consigo consequências do recém
Ato Institucional número 5 (AI-5 de 13/12/1968), que, dentre suas várias proibições,
vetava movimentos e ações políticas dentro das escolas que viessem a ser julgadas
como subversivas ao regime ditatorial, sob pena de demissão.

Em um período histórico de extrema repressão e de um olhar voltado para o


desenvolvimento industrial que, em 11 de agosto de 1971, foi instituída a Lei 5.692 17
(LDB), tendo como objetivo geral o de “proporcionar ao educando a formação
necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-
realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da
cidadania”, ampliando a obrigatoriedade escolar de 4 para 8 anos, criando uma base

17
Lei que fixa as diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus da educação nacional.
60

curricular obrigatória em âmbito nacional e introduzindo a profissionalização no


ensino médio.

Ocorreu nesse período uma intensificação do pensamento mercantil na


educação, proporcionando mudanças significativas na organização do trabalho na
escola, através de “ideias relacionadas à organização racional do trabalho
(taylorismo, fordismo), ao enfoque sistêmico e ao controle do comportamento
(behaviorismo)” (Saviani, 2011, p. 369), e com foco na racionalização do humano,
transformando-o em fator econômico e de produção – teoria do capital humano –
colocando para a escola a responsabilidade pela formação de uma mão-de-obra
qualificada para posteriormente ser absorvida pelo mercado de trabalho.

É diante desse cenário, no qual se processava uma reforma educacional


ajustada aos princípios da ditatura militar, que encontramos o primeiro registro sobre
o trabalho do professor coordenador no magistério público paulista. Instituída
através da Lei Complementar nº 114, de 13 de novembro de 1974 18, a função19 de
professor coordenador encontrava-se condicionada com a “amplitude e a
organização básica da escola” que determinaria a existência ou não desse posto de
trabalho na escola. Ainda na Lei Complementar nº 114, institui-se a função de
coordenador pedagógico. Contudo, esse posto de trabalho deveria existir em todas
as escolas, independente de sua organização ou tamanho.

Sendo assim, o espaço da coordenação pedagógica nas escolas públicas


paulista se apresentava na seguinte conformidade:

18
Lei que institui o Estatuto do Magistério Público de 1º e 2º graus do Estado de São Paulo no ano de
1974.
19
É preciso neste ponto esclarecermos o conceito do Cargo; Função e Posto de Trabalho. Segundo
Aldino Graef, em seu texto intitulado: Cargos em comissão e funções de confiança: diferenças
conceituais e práticas, “Os cargos serão preenchidos; as funções serão exercidas” (p.03). Disponível
em:
http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/seges/090709_seges_arq_funcoes_confi
anca.pdf, acesso em: 03/10/2015.
Ou seja, o cargo indica a posição hierárquica ocupada por uma pessoa dentro de uma organização
ou instituição e o conjunto de atribuições a ela conferida. Já a função normalmente indica o conjunto
de tarefas desempenhado por uma ou mais pessoas.
Segundo o Artigo 5º, inciso XII da Lei Complementar nº 180, de 12/05/1978, posto de trabalho
significa: “lugar em determinada unidade administrativa, necessário ao desempenho de uma função
de serviço público”. Disponível em:
http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/1978/lei.complementar-180-
12.05.1978.html, acesso em: 03/10/2015.
61

Tabela 4
Espaço da Coordenação Pedagógica
Coordenador Pedagógico Professor Coordenador
Formação: Formação:
- Licenciatura Plena em Pedagogia (L.C. nº114, - Licenciatura plena em uma das disciplinas da
13/11/1974). área que vai atuar (L.C. nº114, 13/11/1974).
Forma de ingresso: Forma de ingresso:
- Docente designado pelo Delegado de Ensino - Docente designado pelo Diretor de Escola
por proposta do Diretor de Escola (Decreto nº (Decreto nº 5.771, 04/03/1975).
5.771, 04/03/1975).
Atribuições: Atribuições:
1. Realizar as tarefas relativas ao 1. Coordenar as atividades de elaboração do
acompanhamento, avaliação e controle do plano escolar nos aspectos referentes às
currículo; proposições curriculares específicas da sua área;
2. Garantir o fluxo sistemático e regular da 2. Coletar informações e sistematizar dados
informação sobre a execução das atividades específicos da sua área, que subsidiem as
curriculares, possibilitando a realimentação do tarefas de acompanhamento, avaliação e
planejamento a nível de escola e a nível de controle, de responsabilidade do Coordenador
sistema; Pedagógico;
3. Participar da elaboração do plano escolar, 3. Encaminhar ao Coordenador Pedagógico os
coordenando os aspectos referentes as planos de trabalho de sua área e solicitar as
proposições curriculares; providências necessárias para a sua execução;
4. Coordenar o planejamento, execução e 4. Assegurar a execução política de ação definida
avaliação das reuniões pedagógicas da escola; pela equipe-escola, dando conhecimento a todos
5. Apresentar diagnóstico das atividades os professores da área, das normas de trabalho
curriculares da escola ao final de cada ano letivo. estabelecidas pela equipe e do calendário de
(Decreto nº 5.586, 05/02/1975). atividades, bem como planejando, coordenando e
avaliando as reuniões pedagógicas da área;
5. Promover a articulação com outras áreas que
integram a organização da escola. (Decreto nº
5.586, 05/02/1975).

Analisando a tabela 4 e, tendo em vista que o poder de designação recaía


sobre uma única pessoa, consideramos a hipótese de haver além dos interesses
externos, ligados aos determinantes do sistema de ensino, burocráticos e
impessoais, também interesses internos, imbuídos de relações pessoais. Orientando
a escolha do docente designado mediante predileção exclusiva do responsável pela
designação, ao estender-lhe, em certa medida, o poder daquele que o elegia,
observamos no espaço da coordenação pedagógica, que a forma de ingresso aos
postos de trabalho de coordenador pedagógico e de professor coordenador
apresentavam contornos autoritários e antidemocráticos. Contudo, embora a
designação pudesse estar orientada pela dimensão pessoal, o trabalho na
coordenação pedagógica era realizado, contraditoriamente, mediante uma rígida
hierarquização das funções e uma divisão muito distinta das atribuições.

Ainda referindo-se à tabela 4, ao analisarmos as funções do coordenador


pedagógico e professor coordenador, evidencia-se que o trabalho do coordenador
62

pedagógico vinha a exercer suas funções administrando o pedagógico a uma certa


distância do trabalho docente. Consideramos que ele poderia vir a atuar como um
intermediário dentro da escola, garantindo que informações externas, referentes ao
sistema de ensino, chegassem até a escola para serem executadas e, levava ao
conhecimento da Delegacia de Ensino informações sobre o andamento das ações
promovidas na escola. Em uma década onde a tecnologia computacional como
ferramenta de monitoramento estava longe de ser uma realidade a ser utilizada por
um sistema de ensino, podemos arriscar uma analogia e levantar a hipótese de que
essa função atuava como uma tecnologia de supervisão e monitoramento
importando e exportando dados entre o sistema educacional e a escola.

Já o professor coordenador, interpretamos que ele se relacionava com o


sistema de ensino via coordenador pedagógico. Seu trabalho na escola situava-se
mais próximo dos docentes, na medida em que seu trabalho se relacionava
diretamente com o grupo de docentes por ele coordenado, assegurando a execução
e a formatação das ações desses docentes, com relação ao conteúdo curricular,
através de reuniões pedagógicas.

Portanto, compreendemos que a diferença entre as funções centrava-se na


mediação desenvolvida com o sistema de ensino em detrimento da organização do
trabalho docente.

Podemos verificar na organização do trabalho das funções existentes na


coordenação pedagógica a influência do que Saviani (2011) denomina de
“pedagogia tecnicista”. Segundo o autor:

Se na pedagogia tradicional a iniciativa cabia ao professor, que era, ao


mesmo tempo, o sujeito do processo, o elemento decisivo e decisório; e se
na pedagogia nova a iniciativa se desloca para o aluno, situando-se o nervo
da ação educativa na relação professor-aluno, portanto, relação
interpessoal, intersubjetiva; na pedagogia tecnicista o elemento principal
passa a ser a organização racional dos meios, ocupando o professor e o
aluno posição secundária, relegados que são à condição de executores de
um processo cuja concepção, planejamento, coordenação e controle ficam
a cargo de especialistas supostamente habilitados, neutros, objetivos,
imparciais. A organização do processo converte-se na garantia da
eficiência, compensando e corrigindo as deficiências do professor e
maximizando os efeitos de sua intervenção. (p. 382)

Respeitadas as respectivas características das atribuições, ambas as funções


tinham como objetivo o monitoramento, avaliação e controle das ações relacionadas
63

a sistematização e execução do conteúdo curricular e; garantir a movimentação de


informações entre os órgãos centrais e a escola e entre os indivíduos na escola.

Um novo episódio ocorreu com a promulgação do novo Estatuto do Magistério


no ano de 1978. Instituído pela Lei Complementar nº 201, de 09 de novembro, no
mês subsequente ao encerramento do AI-520, o novo estatuto apresentava
contornos mais democráticos, o que pode ter possibilitado uma maior participação
política dos docentes na escola.

Pelo novo estatuto, o coordenador pedagógico passa a ser considerado, no


quadro do magistério, um especialista da educação graduado em pedagogia. O
provimento para esse posto de trabalho passa a ser realizado por concurso público,
deixando de ser por designação. Dessa forma, compreendemos que houve uma
espécie de profissionalização desse posto de trabalho, o que pode ter possibilitado
uma atuação mais independente do coordenador pedagógico mediante as
atribuições do cargo. Em contrapartida, compreendemos que, ao deixar de ser um
docente designado para ser um titular de cargo e um especialista, isto acabou por
afastá-lo ainda mais do trabalho docente, aproximando o seu trabalho mais de
questões relativas a administração escolar do que as questões pedagógicas. Ele
mantém o seu trabalho como o de um articulador do sistema educacional dentro da
escola.

No entanto, a Lei Complementar nº 201 também trouxe alterações para a


função de professor coordenador. Novas atribuições lhe foram postas e, muito
embora esse posto de trabalho continuasse a ser ocupado por um docente
designado, alterou-se o processo de sua designação. A leitura do artigo 18 apoia o
desenvolvimento de nossa análise.
Artigo 18: A designação para o posto de trabalho de Professor-Coordenador
far-se-á pelo Diretor de Escola, em cada ano letivo, dentre os docentes
mediante prévia indicação do Conselho de Escola, ouvidos os professores
da área e o Coordenador Pedagógico [...].

Observamos um processo mais participativo e democrático na forma na qual


ocorria a escolha e a designação do docente para o posto de professor coordenador.
A abertura para que outros indivíduos pudessem participar do processo de escolha,

20
O término do AI-5 se deu no dia 13 de outubro de 1978 pela promulgação da emenda
constitucional nº11, contudo, ela entrou em vigor a partir do dia 01 janeiro de 1979.
64

pode ter contribuído para que o trabalho do professor coordenador ocorresse de


forma mais harmônica com os interesses do grupo de docentes, podendo vir a
realizar ações pedagógicas mais coerentes com as reais necessidades da escola.

Já o artigo 10 amplia suas atribuições:


O Professor-Coordenador atuará em todo o ensino de 1º e 2º graus e
exercerá o posto de trabalho sem prejuízo das atividades docentes,
incumbindo-lhe, ainda quando for o caso, as atividades de Orientador de
Educação Moral e Cívica ou as atribuições referentes a coordenação das
ações de saúde, no âmbito das unidades da rede estadual de ensino.

Suas atividades ampliam-se, vinculando seu trabalho a projetos que poderiam


vir a ser implantados nas escolas da rede pública estadual. Compreendemos que o
exercício concomitante de professor coordenador e de docente contribuiu para
ampliar e estreitar sua relação com os outros docentes e com as atividades próprias
da sala de aula, portanto, nos parece que o professor coordenador encontrava-se
aberto às discussões mais progressistas e contrárias a aceitação de uma “ideologia
hegemônica”, na forma de se ensinar, como afirma Saviani (2011), logo, é muito
provável que seu trabalho se realizava em um cenário onde se promovia uma
grande abertura ao debate.

Tendo em vista a forma na qual o processo de escolha do professor


coordenador era realizado, como já pontuamos, levantamos a hipótese de que ele
poderia estar exposto a uma confluência de interesses. De um lado, aos interesses e
expectativas do diretor de escola e do coordenador pedagógico, que,
compreendemos, exerciam suas atividades focando mais em questões
administrativas e, consequentemente, entendemos que acabavam por representar
os interesses do sistema educacional na escola. E, de outro lado, aos interesses e
expectativas do grupo de docentes, que se relacionavam diretamente com a sala de
aula e com as questões pedagógicas do ensino e da aprendizagem, portanto,
questões mais próximas da realidade da escola. Por esse ponto de vista,
entendemos que o trabalho do professor coordenador caracterizava-se como um
mediador entre os interesses e expectativas da escola e do sistema educacional.

Ressalta-se que nesse período histórico em que os movimentos sociais pela


redemocratização do sistema político cresciam, com a participação efetiva da
educação, as ações desencadeadas pelos sistemas educacionais e a organização
65

do trabalho na escola continuavam circunscritas pelas diretrizes e orientações


contidas na LDB de 1971. Contraditoriamente, ao mesmo tempo em que ideias
progressistas, contrárias às concepções hegemônicas de ensino, procuravam
adentrar-se na escola, essa cumpria a LDB formulada e regida por princípios e
concepções em contexto de extrema repressão, orientados pelos interesses do
capital econômico.

A década de 1980 se inicia como um importante capítulo da história do país


traçando um cenário contraditório e de luta, expresso de um lado pelos movimentos
sociais a procura do reestabelecimento da democracia e de novas ideias de
conduções de politicas educacionais, e de outro lado, a permanência da ordem da
ditadura regendo as instituições de ensino.

Saviani (2011) destaca que:

Os anos de 1980 inauguram-se com a existência da Associação Nacional


de Educação (ANDE), Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
em Educação (ANPEd) e Centro de Estudos Educação e Sociedade
(CEDES) [...]. Mas, além dessas entidades destinadas a congregar
educadores independentemente de sua vinculação profissional, a década
de 1980 também se inicia com a constituição de associações, depois
transformadas em sindicatos, aglutinando, em âmbito nacional, os
professores dos diferentes níveis de ensino e os especialistas nas diversas
habilitações pedagógicas. (p. 403)

Corroborando com Saviani (2011), Martins (2003), ao pesquisar sobre os


conceitos de descentralização e autonomia existentes na política educacional
paulista no período de 1983 à 1999, traz ao nosso conhecimento a existência, em
âmbito nacional, do objetivo político de “descentralização do sistema de ensino e da
autonomia da escola”. No âmbito do Estado de São Paulo, no ano de 1983 o
governo paulista, consonante as proposições nacionais para a educação, promove o
Fórum de Educação do Estado de São Paulo, no intuito de promover um
relaxamento nas tensões entre escolas, docentes e poder executivo, visto que tal
evento vinha a atender a urgência de uma “discussão que considerasse a escola
pública como espaço legítimo para construção do conhecimento, a partir de um
projeto pedagógico que respeitasse a heterogeneidade da clientela escolar” (p. 530).
Ainda segundo Martins (2003):

Em âmbito estadual, a política educacional iniciada em 1983 representava,


de alguma forma, a efetivação de mudanças reivindicadas por setores
66

acadêmicos e sindicais, ainda que algumas tímidas e, outras,


controvertidas. O magistério, como categoria profissional das mais
organizadas no estado de São Paulo, vinha reivindicando reformas
significativas nos assuntos referentes à cultura e educação: liberdade de
expressão, fim da censura, maiores subsídios à pesquisa e ao ensino,
aumentos salariais, melhoria nas condições de trabalho e descentralização
do poder de Estado, diminuindo seus níveis hierárquicos e burocráticos. (p.
529)

Via processos de descentralização, de concessão de autonomia financeira e


administrativa para as escolas e de desburocratização, percebemos as primeiras
sementes dos princípios neoliberais serem plantadas no sistema educacional, o que
culminaria, na próxima década, em uma completa reforma do Estado e,
consequentemente, uma reforma do sistema educacional.

No ano de 1985 um novo estatuto do magistério paulista é instituído pela Lei


Complementar nº 444, de 27 de dezembro21. Em seu texto encontramos alguns
pontos que entendemos como parte do processo de concessão de uma maior
autonomia às escolas, e a introdução de princípios gerencialistas e termos advindos
da indústria. Nas disposições gerais e finais da referida lei, ao conselho de escola é
atribuído “deliberar sobre as diretrizes e metas da unidade escolar” e “apreciar
relatórios anuais da escola, analisando seu desempenho em face das diretrizes e
metas estabelecidas”.

No que se refere ao coordenador pedagógico, o estatuto nada se altera.


Contudo, para o professor coordenador, é alterada a sua forma de ingresso ao posto
de trabalho. Sua designação passa a ser “precedida de escolha entre os docentes
da unidade escolar, pelos seus pares, à época do planejamento escolar, recaindo a
preferência dentre ocupantes de cargo de docente e suas funções serão exercidas
sem prejuízo da docência”.

Consideramos que as décadas de 1970 e 1980 foram essenciais na


estruturação e na formatação do espaço da coordenação pedagógica na escola
pública paulista. Para o trabalho do professor coordenador parece que essas
décadas foram ricas, expressivas e essenciais no processo de formação de sua
identidade profissional, promovendo um espaço de trabalho onde, de um lado,
encontrava-se diretamente ligado ao trabalho docente e de outro lado, encontrava-

21
Ressaltamos que esse estatuto do magistério encontra-se em vigor até a presente data.
67

se conectado as proposições do sistema de ensino. Sendo assim, é indicativo que o


trabalho do professor coordenador possa ter se constituído e se caracterizado como
a de um mediador, que atuava como um importante agente no processo de
amortização das tensões e conflitos que poderiam ser gerados pelas
incompatibilidades existentes entre o administrativo e o pedagógico na escola.

4.2. A década de 1990

Os anos iniciais de 1990, decorrentes do processo de redemocratização


nacional, é um período vigoroso de atuação dos movimentos sociais da educação
que, na série das Conferencias Brasileiras de Educação - CBE aprovam uma Carta
de Princípios para a Constituinte, dando ensejo a organização do Fórum Nacional
em Defesa da Educação Pública na Constituinte. Uma vez proclamada a Carta
Magna do Brasil, iniciou-se o processo de elaboração de uma nova LDB, tendo
como referência a própria Constituição Cidadã e a concepção de Estado de Bem
Estar Social nela contida.

Entretanto, esse período foi interrompido em 1995, consonante a


consolidação do projeto neoliberal no Brasil, ocorrido no governo do presidente
Fernando Henrique Cardoso. Nesse período foi pensada uma ampla Reforma do
Estado, sendo legitimada em âmbito nacional através do documento intitulado
“Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado” (Brasil, 1995), que veio a
reorganizar as estruturas da administração pública obedecendo aos princípios da
administração gerencial, enfatizando a qualidade e a produtividade dos seus
“serviços”, colocando o cidadão como “cliente” e fixando aos funcionários públicos
uma competitividade “administrada” atrelada a metas e a “controle de resultados” (p.
17). O documento ainda cita a Constituição de 1988 como um “retrocesso
burocrático sem precedentes” e de ser promulgada sem um amplo “debate público”
(p.21), lhe atribuindo um caráter de paralisia ao processo de formação da
administração pública com o foco na gestão gerencial.
68

Entretanto, o processo de globalização que movimentava os setores


econômicos, políticos e sociais, foi conquistando a opinião pública e obtendo espaço
na sociedade, enfraquecendo, em certa medida, o pensamento democrático que
culminou na promulgação da Constituição Cidadã.

O ideário neoliberal refletiu-se no campo educacional com a posse do novo


Ministro da Educação, Professor Dr. Paulo Renato, ex-secretário da educação do
Estado de São Paulo, promovendo por todo país debates sobre reformas nos
sistemas públicos de ensino.

Nesse contexto, no ano de 1996 é promulgada a Lei nº 9.394, de 20 de


dezembro, estabelecendo as diretrizes e bases da educação nacional (LDBEN).
Dentre as várias e importantes proposições contidas nessa LDB, consideramos
como fundamentais para nossa análise, a fundamentação do processo de
“descentralização” e de “autonomia dos sistemas de ensino”, que vinha se
desenvolvendo desde meados da década de 1980 no Estado de São Paulo,
promovendo a instauração de diferentes instrumentos e processos de avaliação da
educação em todos os seus níveis e de seus trabalhadores, como uma ferramenta
de regulação promovendo ampla reforma da educação.

A nova LDB e o programa de governo do MEC, balizados pelos aspectos


gerencialistas da reforma do Estado, tendo a reforma da educação ocorrendo não
somente no Estado de São Paulo, mas em outros Estados como, por exemplo,
Paraná, Minas Gerais e Bahia, incorporaram em seu âmago alterações a serem
implementadas, tais como: universalização do acesso à educação fundamental;
adequação do fluxo segundo idade e série, revisando taxas de aprovação, retenção
e abandono e classes de aceleração, mecanismos que antecipariam o regime de
progressão continuada; implantação de telessalas; flexibilização do currículo do
ensino médio; implantação do bônus mérito; o SARESP no Estado de São Paulo; e
o INEP em âmbito nacional. Tais medidas na SEE/SP vieram sob a denominação
“Escola de Cara Nova”, que foram definidas de forma exógena sem participação
expressiva e efetiva dos docentes.

Os aspectos competitivos e a individualização das relações foram colocados


como orientadores nesse processo de reforma educacional, avaliando
69

periodicamente as escolas, os docentes e os estudantes, sob a justificativa de se


promover uma melhora na qualidade do ensino. Compreendemos a escola como um
local no qual a cooperação deveria ser a tônica, contudo, com os processos de uma
administração com base nos predicados da gestão gerencialista, a escola agora
transforma-se em um ‘campo de batalha’ onde só interessa os bons resultados. Há
uma retomada da teoria do capital humano nos objetivos educacionais, “guiada pela
ênfase nas capacidades e competências que cada pessoa deve adquirir no mercado
educacional para atingir uma melhor posição no mercado de trabalho (Gentili22 apud
Saviani, 2011, p. 430)”.

Com relação ao espaço da coordenação pedagógica, o Governo do Estado


de São Paulo executa a extinção do cargo de Coordenador Pedagógico do quadro
do magistério através da Lei nº 9.289 de 26 de dezembro de 1995. A hipótese que
levantamos sobre o motivo que ocasionou tal extinção, relaciona-se ao processo de
desburocratização do trabalho da coordenação pedagógica, e ao processo de
conceder maior autonomia e poder de decisão para que a escola elaborasse seu
projeto pedagógico de acordo com a sua realidade. Historicamente, identificamos
que o professor coordenador sempre esteve envolvido com o trabalho dos docentes
em sala de aula. Sendo assim, estando ele mais próximo aos docentes e
desenvolvendo um relacionamento mais proximal com os mesmos, entendemos ser
ele um elemento chave na implantação e implementação das alterações na forma e
no conteúdo do trabalho docente provenientes da reforma educacional que estava
em andamento.

Ponto a ser considerado pelo processo desencadeado pela lei 9.289, é o fato
de que o coordenador pedagógico, por exigência do cargo, era um profissional com
formação em pedagogia, o que lhe rendia saberes próprios sobre os aspectos
administrativos e pedagógicos adquiridos em seu processo de formação. Já o
professor coordenador, para participar do processo de escolha e posterior
designação, era necessário apenas que ele fosse um docente em exercício e que
possuísse habilitação em licenciatura em umas das áreas do currículo. Por aspectos
inerentes a sua formação, possíveis lacunas sobre conceitos pedagógicos e

22
GENTILI, Pablo (2002). Três teses sobre a relação trabalho e educação em tempos
neoliberais. In: LOMBARDI, José Claudinei; SAVIANI, Dermeval & SANFELICE, José Luís (orgs.).
Capitalismo, trabalho e educação. Campinas, Autores Associados, p.45-59.
70

administrativos poderiam vir a favorecer uma deficiência no tratamento e no


entendimento desses conceitos quando esses se fizessem presentes em suas
atividades.

Sob esses aspectos, Ball (2005) contribui para nossa reflexão ao colocar que
o profissionalismo, sob a ótica gerencialista, está distante de ter “uma relação
específica entre o profissional e o seu trabalho (p. 541)”, ou seja, os saberes sobre
‘o que’ e ‘como’ fazer, precisam ser adquiridos de acordo com a demanda
estabelecida por agentes externos à escola. Segundo o autor:

Os principais pontos dessa diferença, ou pelo menos dois deles, são:


primeiro, esses pós-profissionalismos se reduzem, em última instância, à
obediência a regras geradas de forma exógena; e, segundo, eles relegam o
profissionalismo a uma forma de desempenho (performance), em que o que
conta como prática profissional resume-se a satisfazer julgamentos fixos e
impostos a partir de fora. (p. 542)

Corroborando com o nosso entendimento sobre a extinção do cargo de


coordenador pedagógico, no ano de 1997 foi promulgada a Resolução SE nº 76 de
13 de junho, onde, a SEE/SP veio a considerar a “importância da atuação do
professor com a função de Coordenação Pedagógica no processo de articulação e
mobilização da equipe escolar na construção do Projeto Pedagógico da unidade
escolar”.

Parece-nos que a SEE/SP, ao não utilizar a denominação professor


coordenador (o que virá a fazer posteriormente) nessa resolução, intenta legitimar o
espaço da coordenação pedagógica como sendo um espaço a ser ocupado por um
docente que virá a aprender e apreender sobre as suas atividades durante o seu
trabalho, através de orientações técnicas presenciais nas Diretorias de Ensino e
através de comunicados escritos, sem uma formação específica na área.

Em princípio o projeto pedagógico de uma escola revela sua identidade, suas


propostas de ações, seus objetivos, as fundamentações teóricas e metodológicas
que balizam sua busca por uma educação de qualidade, enfim, o projeto pedagógico
ou projeto político-pedagógico de uma escola se realiza, em tese, através de uma
construção coletiva e democrática. Mas como articular e mobilizar um conjunto de
pessoas para que coletivamente construam um documento mediante um cenário de
reforma educacional que não privilegiou um processo participativo dos docentes na
71

sua formulação? Quais os limites e qual a autonomia que a escola possui na


construção do seu projeto político pedagógico? Como se processa o trabalho do
professor coordenador na articulação e na mobilização dos docentes na construção
desse documento?

Em busca de um entendimento sobre o conceito de autonomia utilizado pelo


Estado no contexto da reforma da educação com a finalidade de entendermos as
implicações dessa autonomia no trabalho do professor coordenador, encontramos
um estudo realizado por Adrião (2006) sobre a reforma na educação paulista no
período de 1995 à 1998. Nesse texto, a autora coloca a autonomia como uma
ferramenta estratégica, dentre outras, do governo para que novos princípios de
gestão fossem estabelecidos e, consequentemente, formatando progressivamente
um programa de avaliações das escolas, dos docentes e dos estudantes. Ainda
segundo Adrião (2006):

Para os então gestores, “a autonomia tem como contrapartida a


responsabilidade e o compromisso”. Nessa lógica inseria-se a necessidade
de um controle externo via avaliação dos resultados da aprendizagem dos
alunos. Em outras palavras, a autonomia para as UEs só se instalaria na
medida em que os resultados de seu trabalho pudessem ser controlados
externamente. Logo, parece que não existia a possibilidade de as escolas
optarem por projetos pedagógicos diferenciados, quando os padrões ou
resultados a serem atingidos seriam fornecidos a priori.
A perspectiva de responsabilizar as escolas pelo resultado alcançado, via
medição de desempenho de alunos, na prática poderia criar uma camisa de
força na escola, dado que ela poderia, quando muito, definir-se pela
maneira mais eficaz, de ensinar aquilo que seria cobrado nos testes. Parece
que o controle burocrático e autoritário sobre o trabalho pedagógico poderia
tornar-se, pela primeira vez, um fato. (p. 112)

Do ponto de vista pedagógico a autonomia transformou-se em um revés. O


que a princípio proporcionaria a construção de um projeto político-pedagógico onde
as questões específicas da realidade dessa ou daquela escola fossem realmente
consideradas, promovendo um processo político e democrático, e de uma possível
ruptura com as normatizações postas pela reforma educacional, a autonomia
acabou sendo incorporada nas escolas mediante as restrições e privações
existentes na grade curricular, nas avaliações, nos currículos, na distribuição das
turmas e em outras proposições pensadas em nível central para serem executadas
na escola.
72

Tudo indica que a compreensão sobre a importância dada pela SEE/SP ao


trabalho do professor coordenador orientava-se no sentido dele vir a ser um
instrumento de “articulação” e “mobilização” dentro da escola. Entendemos a
articulação como um processo no qual vem-se estabelecer uma relação entre as
partes, unindo-as, criando estratégias e coordenando medidas para determinado fim.
Quanto a mobilização, entendemos como sendo um processo de sensibilização e de
movimentação para deflagrar uma determinada ação. Por esse ponto de vista,
podemos considerar que o professor coordenador assume um papel central no
apoio, conscientemente ou não, no gerenciamento do ideário contido na reforma
educacional dentro da escola.

A reforma na educação pública paulista deflagrada durante os anos de


1995-1998, embora proclamando a relevância da descentralização e da
autonomia para a gestão educacional, prescindiu de qualquer mecanismo
democrático para a sua elaboração. Educadores, pais e alunos foram
alijados da possibilidade de construir coletivamente alternativas para a
educação paulista, explicitando, mais uma vez, o conteúdo autoritário
implícito nas inovações implementadas. (Adrião, 2006, p. 180)

Um último aspecto que queremos considerar em meio a reforma da educação


na década de 1990, refere-se as mudanças na subjetividade dos docentes mediante
a introdução de aspectos relacionados ao individualismo promovido pela competição
e pelo mérito de ter executado seu trabalho em tempo hábil, compondo, no final do
ano letivo, indicadores que se transformam em uma gratificação pecuniária em
detrimento do demérito de outros.

Ball (2005), em seu estudo sobre o processo de reforma do ensino, ao focar a


reforma das relações e das subjetividades ocasionadas pelo modelo gerencial e
suas consequências, relata que para além da “mudança técnica e estrutural das
organizações” a reforma da educação intenta “mudar o significado do que é ser
professor”. Na tentativa de formar uma nova identidade profissional, a gestão
gerencialista “[...] não muda apenas o que fazemos. Ela também procura mudar
aquilo que somos, aquilo que poderíamos vir a ser [...]” (p. 546). Logo, ao
estabelecer novos contornos ao trabalho a ser realizado pelo professor coordenador,
é provável que, dentro dos aspectos gerenciais da reforma, venha a ocorrer uma
ruptura nas relações entre o docente que virá a ocupar esse posto de trabalho e os
docentes em sala de aula. Uma ruptura não somente em termos funcionais e/ou
73

hierárquicos, mas um rompimento de entendimentos a respeito do trabalho


pedagógico em sala de aula.

Se a década de 1980 foi marcada por uma articulação e uma promoção de


movimentos coletivos em prol do bem comum e do fortalecimento de uma
participação democrática na escola, os anos após 1995 vieram a se caracterizar
como catalisadores do modelo gerencial, atuando como um estimulador no processo
de alteração desse pensamento participativo. Os interesses coletivos começam a se
diluir em consequência dos interesses individuais.

4.3. O Novo Milênio – O Professor Coordenador dos anos 2000 a 2014

No decorrer do processo de reforma da educação, compreendemos que na


década de 2000 inicia-se uma abertura para fortalecimento do pensamento
empresarial na gestão do processo pedagógico na escola. Não que isso nunca
tenha ocorrido. Historicamente, no Brasil e, consequentemente, no Estado de São
Paulo, a influência dos grandes industriais na educação é um fato 23 Contudo, no
início desse milênio a necessidade de uma mão de obra mais especializada fez com
que os reformadores empresariais da educação estabelecessem um contato direto
com o governo, determinando as metas e balizando os programas educacionais e as
políticas públicas nesse campo.

No novo milênio uma nova ferramenta de controle se fortalece na educação.


Há uma intensificação do processo avaliativo como estratégia de controle dos
processos pedagógicos desenvolvidos na escola. Contudo, pensados fora dela, ou
seja, “trata-se de avaliar os alunos, as escolas, os professores e, a partir dos
resultados obtidos, condicionar a distribuição de verbas e a alocação dos recursos
conforme os critérios de eficiência e produtividade” (Saviani, 2011, p. 439).

23
RODRIGUES, José. O moderno príncipe industrial: o pensamento pedagógico da confederação
nacional da indústria. Campinas, SP: Autores Associados, 1998.
74

Por esse caminho, o Estado acabou intensificando o ideal de eficiência e de


produtividade nas escolas, além de propiciar uma abertura para que no campo
educacional viessem a ocorrer uma grande quantidade de parcerias entre o setor
público e o setor privado. Bancos, indústrias, ONGs e outros se organizam em
movimentos da sociedade com o objetivo de melhorar a qualidade da educação.
Direcionado pelo nobre objetivo, os movimentos como: “Ação Educativa”; “Todos
Pela Educação”; “Parceiros da Educação24”; colaboram com o setor público na
coordenação de programas como, por exemplo, o “Observatório do Plano Nacional
de Educação”, coordenado pelo movimento Todos Pela Educação25 e o programa
“Indicadores da Qualidade na Educação” (BRASIL, 2004) coordenado pelo
movimento Ação Educativa26, Unicef, PNUD e INEP-MEC.

Tais parcerias tendem a organizar o trabalho na escola sob a ótica do modelo


gerencialista, privatizando cada vez mais o controle do processo pedagógico e
precarizando o trabalho docente, ao retirar-lhe o poder de decidir sobre as formas e
os conteúdos a serem utilizados em sala de aula, tais parcerias intensificaram a
transferência da responsabilidade pelo fracasso ou pelo sucesso expresso pelos
indicadores de desempenho para a escola como um todo. Entretanto, na visão dos
reformadores educacionais, como numa grande empresa, a sorte ou o infortúnio
pelo alcance das metas, dependem única e exclusivamente do esforço individual.
Com referência ao exposto, concordamos com as análises de Freitas (2014),
quando ele expõe que:

Empresas educacionais confiáveis do mercado de consultoria, materiais


didáticos, avaliação, venda de tecnologia, organização de big data entre
outras, que operam na difusão de métodos tecnicistas e introduzem nas
redes e escolas processos de gestão verticalizados que permitem elevar o
grau de controle sobre os profissionais da educação, a título de garantir a
obtenção de metas e índices nas avaliações externas, definindo objetivos, a
avaliação, a forma e o conteúdo da escola. [...]
A organização do trabalho pedagógico da sala de aula e da escola ficou
cada vez mais padronizada, esvaziando a ação dos profissionais da
educação sobre as categorias do processo pedagógico, de forma a cercear
um possível avanço progressista no interior da escola e atrelar esta
instituição às necessidades da reestruturação produtiva e do crescimento
empresarial (p. 1092).

24
Disponível em: http://www.parceirosdaeducacao.org.br/, acesso em: 12/12/2015.
25
Disponível em: http://www.todospelaeducacao.org.br/, acesso em: 12/12/2015.
26
Disponível em: http://www.acaoeducativa.org.br/, acesso em: 12/12/2015.
75

Verificamos essa inserção das empresas na educação pública paulista ao


longo dos anos em diversos programas e projetos apresentados pela SEE/SP.
Dentre eles, citaremos alguns como: o Programa Escola da Família, que
estabeleceu parcerias com universidades privadas pagando 50% das mensalidades
aos universitários participantes do programa, no ano de 2003; o Programa Acessa
Escola, que remodelou as salas de informática das escolas, instalando novos
computadores “alugados” por empresa privada ao Estado, no ano de 2008; o
SARESP, que metodicamente monitora a qualidade da educação através de
avaliações elaboradas por empresas privadas contratadas pelo Estado, e que
conduzem o processo pedagógico dos docentes em sala de aula acerca das
habilidades e competências que o estudante precisa adquirir, no ano de 1996,
entretanto, tal avaliação intensifica-se em detrimento de metas e resultados a serem
alcançados a partir do ano de 2002; e uma forma de compra direta, introduzida a
partir do ano de 2011 onde as escolas passaram a realizar suas compras através de
um modelo baseado no e-commerce. Com um saldo em um site de compras
pertencente a uma empresa privada de comércio de materiais diversos com foco
corporativo, as escolas públicas estaduais adquirem materiais para escritório,
informática, higiene e limpeza, mercearia e manutenção, entre outros. O saldo não
pode ser gasto de outra forma que não seja nos produtos existentes nesse site.
No que se refere ao professor coordenador, nesses quatorze anos (2000 à
2014), quatro resoluções foram publicadas em diferentes momentos das reformas
educacionais no Estado de São Paulo. Em comum, observamos nesses textos, a
legitimação da denominação professor coordenador como posto de trabalho a ser
ocupado por docente designado. Contudo, a cada nova resolução, novas
prerrogativas são postas para o exercício de sua função. Dessa forma, entendemos
que, em decorrência das diferentes reformas na educação paulista, a função do
professor coordenador foi se fortalecendo no pressuposto de atuar como um objeto,
e não como um indivíduo, no sentido de se fazerem cumprir as determinações
contidas nas reformas da educação nas escolas.

Em 07 de abril de 2000, ainda no decorrer da “Escola de Cara Nova”, é


publicada a Resolução SE nº 35, dando novos contornos ao trabalho do professor
coordenador. Com essa resolução a SEE/SP considera:
76

- a relevância da atuação do Professor Coordenador no processo de


elaboração e implementação da proposta pedagógica da escola;
- a importância da articulação e integração da equipe escolar no
desenvolvimento do projeto pedagógico da escola, objetivando aprimorar o
processo de ensino e aprendizagem;
- a necessidade de se garantir a integração curricular no ensino
fundamental e médio;
- a necessidade de se potencializar o trabalho articulado entre a escola e as
equipes de Supervisão e da Oficina Pedagógica da Diretoria de Ensino. [...]
Art. 2º - Ao docente designado para o exercício das funções de Professor
Coordenador caberá:
I – assessorar a direção da escola na articulação das ações pedagógicas
desenvolvidas pela unidade, incluindo as de todas as telessalas e as
classes vinculadas;
II – auxiliar a direção da escola na coordenação dos diferentes projetos
inclusive os de reforço da aprendizagem;
III – assessorar a direção da escola na relação escola/comunidade;
IV – subsidiar os professores no desenvolvimento de suas atividades
docentes;
V – potencializar e garantir o trabalho coletivo na escola, organizando e
participando das HTPCs;
VI – executar, acompanhar e avaliar as ações previstas no projeto
pedagógico da escola. (Resolução SE nº 35, de 07/04/2000)

De início pudemos observar nessa Resolução que novas dimensões foram


incorporadas ao trabalho do professor coordenador. Dentre essas dimensões
encontra-se o movimento de articulação do trabalho do professor coordenador com
o do diretor de escola e com a Diretoria de Ensino, via supervisão e oficina
pedagógica, o que vem a corroborar com algumas hipóteses anteriores, sobre o
distanciamento entre o professor coordenador e o trabalho docente. Interessante o
movimento que vem se desenvolvendo no espaço da coordenação pedagógica ao
longo de sua existência. O coordenador pedagógico, que no início foi o elo entre os
agentes externos e internos, foi aos poucos perdendo seu espaço até a extinção do
seu cargo. Noutro lado o professor coordenador, que sempre esteve ligado à prática
docente, foi aos poucos sendo distanciado do grupo de docentes. A identidade do
professor coordenador foi aos poucos se metamorfoseando, tendo que se adequar
aos novos contornos das atividades e funções que envolviam seu trabalho.

É muito provável que, ao legitimar a presença dos agentes das DEs nas
escolas, o processo de monitoramento, controle e poder tenha vindo a ‘amplificar’ a
voz dos que estão promovendo as reformas na educação, diluindo os processos
participativos e de tomada de decisões na escola em processos de cumprimento e
execução de ações pensadas fora da escola. Como uma das características do
gerencialismo, como ferramenta de organização do trabalho, há uma tendência em
77

individualizar as relações entre as pessoas e dentre as mazelas promovidas por


esse modelo, destacamos a responsabilização do indivíduo não só pelos seus
afazeres, mas também por monitorar os afazeres dos seus pares. Logo, ao se anular
a discussão sobre os processos, a atenção se volta para a execução dos
procedimentos.

No ano de 2002, ano de eleição para governador, ocorreu a substituição do


secretário estadual de educação. Contudo, as bases da reforma iniciada pela
“Escola de Cara Nova” se mostravam sólidas e acordadas com as diretrizes
nacionais para a educação. Porém, com novo secretário, a SEE/SP promoveu um
novo pacote de reformas sob a denominação de “Escola do Acolhimento”,
extinguindo algumas medidas implantadas anteriormente como: a flexibilização do
ensino médio; a recuperação nas férias e; as salas-ambientes. Entretanto, novas
medidas foram incorporadas tais como o Programa Escola da Família, Ensino Médio
em Rede e o Programa de Formação de Professores “Rede do Saber”. Logo, as
medidas implantadas entre 2002 e 2006 só vieram a reforçar a já implantada política
de avaliação do desempenho das escolas, dos docentes e dos estudantes.

Sob as lentes do desempenho, a Resolução SE nº 66, de 03 de outubro de


2006, vem reforçar a “centralidade da categoria da avaliação” na escola, através do
professor coordenador, fortalecendo “o controle ideológico dos espaços da escola”
pelos “reformadores empresariais da educação” (Freitas, 2014, p. 1102).

Na Resolução SE nº 66, a SEE/SP considera:

[...] a importância da atuação do Professor Coordenador, junto à equipe


escolar, no processo de:
- integração curricular entre os professores de cursos, períodos e turmas
diversas;
- elaboração, implementação e avaliação da proposta pedagógica da
escola;
- aprimoramento do processo ensino-aprendizagem;
- acompanhamento e avaliação do desempenho escolar dos alunos;
- formação continuada dos docentes;
- articulação das ações da coordenação pedagógica e otimização de
recursos e parcerias com a comunidade;
- dinamização de todos os espaços pedagógicos e integração dos trabalhos
da escola, das equipes de Supervisão e da Oficina Pedagógica da Diretoria
de Ensino. [...]
Art. 2º - Caberá ao docente designado para o exercício das atribuições de
Professor Coordenador, como membro da equipe gestora:
78

I – assegurar a integração das atividades de desenvolvimento e


aprimoramento do plano de trabalho da escola, articulando as ações de
docentes de cursos, modalidades e turnos diversos;
II – acompanhar a execução e a avaliação das ações e metas fixadas pela
escola em sua proposta pedagógica;
III – garantir, planejar e liderar o desenvolvimento dos trabalhos realizados
na escola, participando ativa, rotineira e diretamente das reuniões nas
Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo – HTPCs;
IV – estabelecer, juntamente com o Diretor da Escola, o horário das Horas
de Trabalho Pedagógico Coletivo – HTPCs, organizando a participação de
todos os professores em exercício na unidade, de forma a assegurar o
caráter coletivo dos trabalhadores;
V – acompanhar o trabalho dos professores, subsidiando-os com sugestões
para a melhoria da prática docente e, nas Escolas de Tempo Integral,
orientar os professores das oficinas curriculares de forma a assegurar que
as atividades nelas desenvolvidas se apresentem, dinâmicas,
contextualizadas, significativas e prazerosas;
VI – proceder, juntamente com os professores, à análise dos resultados da
avaliação do desempenho escolar, através de seus indicadores, registrando
e divulgando avanços e estratégias bem sucedidas, bem como identificando
as dificuldades a serem superadas e propondo alternativas de otimização
dos resultados;
VII – coordenar, acompanhar e avaliar as atividades de recuperação da
aprendizagem, em especial da recuperação paralela, e também dos demais
projetos implementados na escola;
VIII – desenvolver ações que visem a ampliação e o fortalecimento da
relação escola – comunidade. (Resolução SE nº 66, de 03/10/2006)

Num primeiro instante notamos, nessa Resolução, um aumento nas


atribuições dadas ao trabalho do professor coordenador. Observamos também que
seu trabalho deixa de se articular com o trabalho do diretor de escola e com a
Diretoria de Ensino. Agora suas atividades estão integradas com as atividades da
Diretoria de Ensino via supervisão e oficina pedagógica. O que, ao nosso entender,
veio promover, quase por completo, a retirada da participação do professor
coordenador com o grupo docente, no que se refere a uma participação integradora
e complementar no direcionamento das atividades tanto do professor coordenador,
quanto dos docentes. Nessa resolução, sob a denominação de “membro da equipe
gestora”, sua identidade é reconfigurada. Dentre as novas atribuições, nos chamou a
atenção: a formação continuada dos docentes; a promoção dos HTPCs como
espaço de formação docente; a intervenção na prática docente através de
“sugestões”; e o acompanhamento e a avaliação do desempenho dos estudantes.

Para Oliveira (2007), a descentralização como estratégia para garantir maior


autonomia “administrativa, financeira e pedagógica” para as escolas, reduzindo a
burocracia, na verdade, “veio acompanhada de processos de padronização de
procedimentos administrativos e pedagógicos”, via procedimentos de avaliação, com
79

o objetivo de buscar uma redução de custos sem “abrir mão do controle central das
políticas” (p. 366).

Acrescentamos ao pensamento da autora, o processo de


desresponsabilização do Estado pela qualidade da educação. Sob a ótica da
autonomia e da descentralização, o Estado segue desenvolvendo mecanismos que
possibilitam que toda a sociedade possa vir a ser responsável por essa qualidade.
Contudo, quem define os parâmetros dessa qualidade é o Estado. A transferência
de recursos públicos para a iniciativa privada se apoia na justificativa da
necessidade de se reduzir o gasto público com o bem público, porém, o que
realmente acontece é o deslocamento dos recursos financeiros para outras ‘mãos’.

Sob esse prisma, no ano de 2007 o governo do Estado de São Paulo


apresentou uma nova agenda para a educação pública composta por 10 metas 27 a
serem cumpridas até o ano de 2010, 10 ações28 para serem implantadas nas
escolas e 5 medidas29 para que essas ações fossem implantadas nas escolas.

Dentre as 5 medidas para que a implantação das ações “para uma escola
melhor”, na primeira da lista encontramos a “criação da função de professor
coordenador e seleção de 12 mil professores até dezembro de 200730”.

Essa nova reforma, denominada “São Paulo Faz Escola”, acabou por reforçar
as ações que vinham sendo efetivadas em anos anteriores, como: a redução das
taxas de reprovação no ensino básico; o aumento do desempenho dos estudantes
nas avaliações externas; a capacitação dos profissionais da educação, através da
EVESP, para a implementação dos programas da SEE/SP; dentre outras ações a
serem promovidas na escola.

Entre as 10 metas divulgadas pelo governo, consideramos que 5 delas


relacionam-se ao trabalho do professor coordenador:

27
Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/lenoticia.php?id=87027. Acesso em:
25/06/2015.
28
Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/acoes/educacao/metas/acoes.htm. Acesso em:
25/06/2015.
29
Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/acoes/educacao/metas/medidas.htm. Acesso em
25/06/2015.
30
Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/acoes/educacao/metas/medidas.htm. Acesso em
25/06/2015.
80

1 - Todos alunos de 8 anos plenamente alfabetizados;


2 - Redução de 50% das taxas de reprovação da 8ª série;
3 - Redução de 50% das taxas de reprovação do Ensino Médio;
4 - Implantação de programas de recuperação de aprendizagem nas séries
finais de todos ciclos (2ª , 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e 3ª série
do Ensino Médio);
5 - Aumento de 10% nos índices de desempenho dos ensinos fundamental
e médio nas avaliações nacionais e estaduais;
6 - Atendimento de 100% da demanda de jovens e adultos de Ensino Médio
com oferta diversificada de currículo profissionalizante;
7 - Implantação do Ensino Fundamental de 9 anos, em colaboração com os
municípios, com prioridade à municipalização das séries iniciais (1ª a 4ª
séries);
8 - Utilização da estrutura de tecnologia da informação e Rede do Saber
para programas de formação continuada de professores integrado em todas
as 5.300 escolas com foco nos resultados das avaliações; estrutura de
apoio à formação e ao trabalho de coordenadores pedagógicos e
supervisores para reforçar o monitoramento das escolas e apoiar o trabalho
do professor em sala de aula, em todas as DEs; programa de capacitação
dos dirigentes de ensino e diretores de escolas com foco na eficiência da
gestão administrativa e pedagógica do sistema;
9 - Descentralização e/ou municipalização do programa de alimentação
escolar nos 30 municípios ainda centralizados;
10 - Programa de obras e infraestrutura física das escolas.

Em maio de 2008, como parte integrante da reforma educacional, o governo


paulista lança o Programa de Qualidade na Escola e o IDESP. Segundo documento
oficial, o programa visa “instituir critérios objetivos para a avaliação das escolas da
rede estadual paulista e para o estabelecimento de metas que promovam a melhoria
da qualidade e da equidade do sistema” (São Paulo, ca.2008, p.05). Já sobre o
IDESP, o documento o considera como “um indicador de qualidade da escola”,
onde, a “boa escola é aquela em que a maior parte dos alunos apreende as
competências e habilidades requeridas para a sua série” (p. 05). Dessa maneira o
IDESP quantifica o quanto os alunos aprenderam, através do seu desempenho no
do SARESP, e em quanto tempo obtiveram tal aprendizado, através do fluxo
escolar.

Pela ótica desse documento pudemos compreender a forma na qual a


SEE/SP expressa o seu entendimento sobre a qualidade da educação. Ela é vista
em termos quantitativos e posto em sentido universal para as escolas. Em nossas
entrevistas tal intento ficou muito claro no momento em que os participantes se
mostraram como sendo um dos responsáveis pela qualidade da educação nas
escolas que trabalham. Tal qualidade foi expressa pelos entrevistados através da
quantificação dos indicadores obtidos pela escola, seja expresso pelo IDESP, ENEM
ou pela aprovação de seus estudantes em avaliações de instituições públicas de
81

ensino técnico ou pública/privada de ensino superior, coadunando-se ao


pensamento da SEE/SP.

No intuito de alinhar o trabalho do professor coordenador às metas e ações


que compõe a reforma educacional, foi publicada a Resolução SE nº 88, de 19 de
dezembro de 200731, lhe atribuindo ampla responsabilidade pela introdução,
execução e monitoramento dessas metas e ações na escola, situando-o como
gestor implementador da política de melhoria da qualidade do ensino, com os
seguintes objetivos:

- ampliar o domínio dos conhecimentos e saberes dos alunos, elevando o


nível de desempenho escolar evidenciado pelos instrumentos de avaliação
externa e interna;
- intervir na prática docente, incentivando os docentes a diversificarem as
oportunidades de aprendizagem, visando à superação das dificuldades
detectadas junto aos alunos;
- promover o aperfeiçoamento e o desenvolvimento profissional dos
professores designados, com vistas à eficácia e melhoria de seu trabalho.
[...]
Art. 2º - O docente indicado para o exercício da função de Professor
Coordenador terá como atribuições:
I – acompanhar e avaliar o ensino e o processo de aprendizagem, bem
como os resultados do desempenho dos alunos;
II – atuar no sentido de tornar as ações de coordenação pedagógica espaço
coletivo de construção permanente da prática docente;
III – assumir o trabalho de formação continuada, a partir do diagnóstico dos
saberes dos professores para garantir situações de estudo e reflexão sobre
a prática pedagógica, estimulando os professores a investirem em seu
desenvolvimento pessoal;
IV – assegurar a participação ativa de todos os professores do
segmente/nível objeto da coordenação, garantindo a realização de um
trabalho produtivo e integrador;
V – organizar e selecionar materiais adequados às diferentes situações de
ensino e aprendizagem;
VI – conhecer os recentes referenciais teóricos relativos aos processos de
ensino e aprendizagem, para orientar os professores;
VII – divulgar práticas inovadoras, incentivando o uso de recursos
tecnológicos disponíveis. (Resolução SE nº 88 de 19/12/2007).

Como esses objetivos e atribuições se concretizam na realização do trabalho


do Professor Coordenador dentro das escolas? Como o Professor Coordenador
articula a questão do tempo para conseguir efetivar todas essas atribuições? De que

31
Essa resolução foi alterada pela Resolução SE nº 53, de 26/06/2010, pela Resolução SE nº 8 de
15/02/2011 e pela Resolução SE nº 42 de 10/04/2012 retificada em 18/04/2012. Contudo, as
atribuições do Professor Coordenador permaneceram as mesmas desde 2007, sendo alteradas pela
Resolução SE nº 75, de 30/12/2014. No entanto, não vamos trabalhar com análises sobre essa última
resolução, tendo em vista que, consideramos para nossas análises, o período de 2007 à 2014, logo,
entendemos que essa resolução, por ter sido publicada no penúltimo dia do ano e por conter
praticamente as mesmas atribuições da resolução anterior, ela ainda não foi totalmente incorporada
ao trabalho dos professores coordenadores.
82

maneira esse rol de atribuições contribui na formação da sua identidade


profissional?

Entre os anos de 2007 até abril de 2012, o processo de designação do


docente para a função de professor coordenador ocorria em conformidade com o
artigo 5º da Resolução SE nº 88, que estabelecia:

I – credenciamento obtido em processo seletivo a ser organizado pela


Diretoria de ensino, consistindo de uma prova escrita;
II – realização de entrevista individual;
III – apresentação de projeto que vise à melhoria do processo de ensino e
aprendizagem de uma unidade escolar;
IV – ato de designação para a função de Professor Coordenador, editado
pelo Diretor de Escola, [...]

Ao analisarmos a resolução, compreendemos que esse processo para a


designação do professor coordenador se realizava de maneira coerente com os
conhecimentos que a SEE/SP desejava daquele que fosse ocupar tal função. Suas
etapas apresentavam-se de forma a impedir que preferências pessoais ocorressem.
Muito embora a entrevista fosse realizada por um Supervisor de Ensino e pelo
Diretor de Escola e nela preferências pessoais de escolha poderiam vir a ocorrer, a
realização de uma prova apresentava um caráter impessoal ao processo, impedindo,
em certa medida, que a predileção por um ou outro docente ocorresse. Contendo as
características sobre o processo de credenciamento, a instrução CENP – 1, de 10
de janeiro de 2008, apresentava as seguintes especificações para a prova:
A prova será elaborada pela SEE e será constituída por 20(vinte) questões
de múltipla escolha, versando sobre as propostas curriculares e as
metodologias de todas as áreas e disciplinas do ciclo II do Ensino
Fundamental e Ensino Médio, com especial destaque à abordagem de
habilidades, competências, interdisciplinaridade e processo de avaliação do
rendimento escolar, na conformidade dos referenciais da prova constantes
do item 2.2.4;

O item 2.2.4. especificava um endereço de internet com a bibliografia para a


prova de credenciamento (Anexo 4).

Entretanto, no decorrer de nossa pesquisa, em oportunidades que conversas


informais com professores coordenadores foram realizadas, e em nossas entrevistas
pudemos constatar alguns elementos que apresentavam predileções de docentes
para a função, como, por exemplo, a possibilidade de trocar informações entre os
candidatos durante a prova em momentos que os aplicadores se retiravam da sala.
83

Em uma das entrevistas, o professor coordenador nos relatou que participou


desse processo de designação, contudo, recebeu um convite de um supervisor de
ensino para que participasse desse processo, por ser uma pessoa dinâmica.
Sentindo-se “empolgado”, realizou as etapas e obteve sucesso em todas. Relatou
que sem expectativas sobre a função, não sabia fazer nada. Que a prova não trazia
nada sobre coordenação, e que seu aprendizado se deu via capacitação na Diretoria
de Ensino.

Noutra entrevista, o professor coordenador não precisou passar por esse


processo de credenciamento. Tendo em vista que, a partir de abril do ano de 2012,
cada Diretoria de Ensino passou a estabelecer seus critérios para a indicação do
docente para a função. Disse-nos ter elaborado um projeto e ter sido entrevistado.
Entretanto, antes de nos contar sobre as etapas, o docente nos revelou que se
ofereceu para assumir a função que estava para ser vaga, antes mesmo da abertura
do edital.

Em nossas entrevistas, pudemos observar a possibilidade da existência de


uma predileção ou mesmo uma antecipação de quem seria designado para a função
de professor coordenador antes mesmo da abertura de um edital ou da vacância da
função. Logo, compreendemos que tal possibilidade pode caracterizar uma
adulteração no processo de seleção e escolha do docente a ser designado, podendo
comprometer a importância da função de professor coordenador na escola, uma vez
que os aspectos formais e impessoais são substituídos por aspectos informais e
pessoais.

Para subsidiar o trabalho do professor coordenador, a SEE/SP publicou um


manual denominado Caderno do Gestor, no ano de 2008. Foram entregues nas
escolas vários volumes desse manual entre o ano de 2008 e o ano de 201032. No
levantamento de material bibliográfico no decorrer da pesquisa, encontramos dois

32
Não sabemos ao certo quantos volumes foram disponibilizados. Procuramos nos sites da SEE/SP
referências a essas entregas e não encontramos nenhuma indicação o número exato de volumes
distribuídos nas escolas.
84

volumes disponíveis on-line33, e oito volumes em diferentes escolas, totalizando dez


volumes publicados:

Tabela 5
Ano Caderno do Gestor - Volumes
2008 Volume 1; Volume 2; Volume 3
2009 Volume 1; Volume 2; Volume 3
2010 Volume 1; Edição Especial; Edição SARESP 2009; Volume 4

Tais volumes contêm diversas prescrições colocadas como sugestões pela


SEE/SP, que vão desde como divulgar o currículo na escola, orientações de como
organizar um primeiro dia de aula, até como organizar e avaliar os planos de aulas
dos docentes, textos literários para estimular a reflexão, entre outras mais.

Dentre todos os volumes do Caderno do Gestor, um em especial nos chamou


a atenção: o volume 1 de 2008. Nesse volume encontramos qual era a expectativa
da SEE/SP para com o trabalho do professor coordenador na escola.

Esse volume estabelecia instrumentos para que o professor coordenador


obtivesse sucesso em seu trabalho na escola, como por exemplo: como analisar a
proposta pedagógica; o que se espera do trabalho do professor coordenadora; como
implantar o currículo; como organizar um processo de avaliação; como o professor
deve organizar o seu trabalho; entre outros.

O caderno do gestor volume 1 considerava o professor coordenador como


uma liderança na escola, assumindo a partir daquele momento sua função
pedagógica. Contudo, sua liderança estava subordinada ao diretor de escola,
devendo toda ação ou projeto a ser desenvolvido pelo professor coordenador obter
“o aceite de seu Diretor, para evitar informações contraditórias ou disputas de poder”
(Murrie, 2008, p. 11).

Segundo esse documento, sua função, centrada na qualidade do ensino,


visava articular a execução de ações (tais como: verificação do planejamento das
aulas dos docentes; treinamento e monitoramento das avaliações aplicadas pelos
docentes; monitoramento da conduta pedagógica em sala de aula) para que essa

33
Cadernos disponíveis em:
http://www.rededosaber.sp.gov.br/portais/spfe2009/MATERIALDAESCOLA/CADERNODOGESTOR/t
abid/1220/Default.aspx. Acesso em: 29/06/2015.
85

qualidade viesse a se evidenciar nos resultados apresentados pelos estudantes nas


avaliações internas e externas. Para tanto, sua primeira ação se constituiu na
implementação da nova proposta curricular na escola e na garantia de total adesão
à ela por parte da equipe de docentes.

[...] Muitos dirão “ai vem mais um pacote, um texto que eu já li e já sei o
final”. [...] Como fazê-los acreditar que as mudanças propostas serão de fato
produtivas?
O Professor Coordenador, para rebater esse argumento, deve estar
informado sobre as ações “práticas” da Secretaria, e usar essa informação
para convencer os agentes de que a Proposta Curricular é, antes de tudo,
uma Proposta Política que apoia os movimentos inovadores escolares e que
aposta na possibilidade de desenvolvimento da autonomia escolar. (Murrie,
2008, p. 8-9)

Tal proposta curricular implantanda34 em 2008 consolidou-se em 2010 e até a


atualidade não ocorreram mudanças significativas em seu conteúdo. Entretanto, o
que nos chamou a atenção na citação acima é o intento em convencer um
determinado grupo de pessoas baseando-se apenas em ações práticas, sem
fundamentação teórica com base em pesquisas sobre um determinado assunto, em
um verdadeiro movimento pragmático, num claro curso de imposição de uma ação
que pode até ser discutida, porém, deve ser aceita tendo em vistas os indicadores
quantitativos que demonstram que tal ação gera bons resultados – desempenho dos
alunos no SARESP e controle do fluxo de estudantes.

Segundo a SEE/SP35, o IDESP é um indicador quantitativo que verifica e


avalia a qualidade da escola. Esse indicador é calculado através da multiplicação de
outros dois indicadores:

34
Segundo o site do Programa São Paulo Faz Escola: “A partir dos resultados do SAEB (hoje Prova
Brasil), do Enem e de outras avaliações realizadas em 2007, o Governo do Estado de São Paulo
elaborou 10 metas para a educação paulista, a serem conquistadas até 2010.
Para isso, propôs uma ação integrada e articulada, cujo objetivo era organizar melhor o sistema
educacional de São Paulo. A chamada Proposta Curricular criou uma base curricular comum para
toda a rede de ensino estadual. Com os bons resultados da implantação da Proposta Curricular no
Estado de São Paulo, avaliados pelo Saresp, pelas devolutivas do corpo docente das escolas e na
voz da comunidade escolar, o Currículo da rede pública estadual está consolidado. O conceito de
aprendizagem respeita as estruturas de pensamento de crianças, adolescentes e jovens de todo o
Estado.” Disponível em: www.saopaulofazescola.sp.gov.br, acesso em: 15/01/2016.
35
É possível verificar as fórmulas e os critérios utilizados na obtenção do IDESP e demais
indicadores no documento “Programa de qualidade da escola – nota técnica 2015”. Disponível em:
http://idesp.edunet.sp.gov.br/Arquivos/NotaTecnica2014.pdf. Acesso em 10/02/2016.
86

1) o indicador de desempenho, que é o resultado dos estudantes nas provas


de Língua Portuguesa e Matemática no SARESP. Esse indicador é obtido através de
diversos cálculos matemáticos;

2.) o indicador de fluxo apresenta o tempo em que o estudante permaneceu


em determinada série/ano. Ele é obtido através de uma fórmula matemática que
verifica a taxa média de aprovação dos estudantes nos anos iniciais e finais do
ensino fundamental e no ensino médio. Essa taxa considera o número de
estudantes matriculados cadastrados no Censo Escolar pela secretaria da escola.

Com vistas à melhoraria da qualidade do ensino, cabia ao professor


coordenador promover intervenções sobre o trabalho docente em sala de aula,
devendo esses estarem trabalhando com as habilidades e competências
determinadas pela matriz curricular. Ou seja, o trabalho do professor coordenador
começava a caminhar em uma direção que culminaria no processo de verificação e
de intervenção das atividades pedagógicas do docente em sala de aula.

Ball (2005), ao referir-se aos aspectos performáticos do trabalho docente, o


autor expressa que a performance atua como uma ferramenta de regulação que,
mediante a avaliação do desempenho individual ou da organização, “emprega
julgamentos, comparações e demonstrações como meio de controle, atrito e
mudança” (p. 543).

As atividades da nova intelectualidade técnica, do gerenciamento,


direcionam a performatividade para as práticas rotineiras dos professores e
para as relações sociais entre professores, tornando o gerenciamento
onipresente, invisível e inevitável – parte de algo que está inserido em tudo
que fazemos.
Cada vez mais, escolhemos e julgamos nossas ações, e elas são julgadas
por outros, com base na contribuição que fazem para o desempenho
organizacional, apresentado em termos de resultados mensuráveis. (p. 554)

Esse processo de verificação e intervenção ficou claro na fala dos professores


coordenadores por nós ouvidos. Outra observação a ser feita, mediante as falas,
consistiu na estratificação que o professor coordenador vem a realizar, ao considerar
esse ou aquele docente como não competente, realizando constantes visitas em
suas aulas, orientando no que deve e no que não deve ser feito. Ou seja, os critérios
utilizados pelo professor coordenador a respeito da competência pedagógica deste
ou daquele docente podem levar a formação de grupos distintos entre os docentes:
87

os bons docentes, que dão conta do currículo; e os maus docentes, que não
conseguem ou não utilizam o currículo.

Sob esse aspecto, o professor coordenador assume uma postura como se


fosse um gerente supervisionando a linha de produção de uma empresa, verificando
se a produção (conteúdo) está em ritmo adequado, se está na quantidade certa, se
o docente atende a todos os estudantes, se o docente se movimenta
adequadamente em sala de aula, se o docente é prestativo quando solicitado, se o
docente demonstra ter domínio sobre o conteúdo apresentado, se o docente
consegue a atenção de todos os estudantes, entre outras coisas. Tudo isso
registrado para posterior verificação pelo diretor de escola e supervisor de ensino.

Freitas (2012), ao analisar as características das propostas apresentadas


pelos reformadores empresariais da educação, considera que, ao se combinarem,
os efeitos da privatização, da meritocracia e do gerencialismo, tornam-se negativos
para a escola pública, para os docentes e para os estudantes. Como consequência
negativa, o autor cita: a minimização da ação pedagógica; a maximização da
competição; a indução a ações fraudulentas e; a desmoralização do trabalho
docente.

Essa negatividade ficou evidente quando os professores coordenadores por


nós ouvidos demonstram uma preocupação ímpar em exigir que o trabalho dos
docentes em sala de aula estivesse fundamentado nas habilidades e competências
do currículo, treinando os estudantes para que venham a obter sucesso no
SARESP. Expressam certa tristeza ao revelar que o IDESP da escola “não subiu”.
Demonstram conduzir uma prática de vigilância ao que está sendo ensinado em sala
de aula, anotando sistematicamente os conteúdos desenvolvidos pelo docente para
posterior acompanhamento de agentes externos. Ficou evidente, na fala dos
professores coordenadores, que o sucesso está intimamente ligado ao melhor
rendimento. Além do nítido culto à eficácia e à eficiência ao material apostilado. E,
mesmo quando todos os parâmetros prescritivos são executados, mas as metas não
são alcançadas, o problema nunca é do material, e sim do docente que não está “se
saindo muito bem” e precisa aprender a “planejar a sua aula”.
88

O professor coordenador, ao dirigir o foco de seu trabalho para conteúdos


pré-determinados de maneira exógena e para a promoção de diversos mecanismos
de recuperação (contínua, durante as aulas; e paralela, no contraturno das aulas),
visando a obtenção de melhores resultados nas avaliações externas, gerando uma
bonificação para os docentes e para a escola que se destaca das demais por estar
mais bem ranqueada, convertendo o “sucesso” do trabalho pedagógico em uma
recompensa monetária, pode vir a gerar um desgaste nas relações interpessoais no
interior da escola, acirrando o individualismo, a impessoalidade, intensificando as
disputas por poder, enfim, a gestão por resultados, ao se sobressair sobre o
pedagógico, pode vir a tornar as ações reflexivas em ações mecânicas.

Um novo episódio de reforma educacional denominado “Educação –


Compromisso de São Paulo36”, ocorreu no ano de 2011. Como em anos anteriores,
tal reforma veio por dar continuidade as ações e metas da reforma anterior.
Contudo, foi através desse “compromisso” que o Governo Estadual veio
publicamente legitimar o que já estava ocorrendo na educação pública: a presença
dos reformadores industriais no campo educacional, participando na formulação dos
objetivos e das orientações políticas para a educação.

O programa Educação — Compromisso de São Paulo teve também apoio e


envolvimento de diversas organizações e instituições, como Fundação
Natura, Fundação Victor Civita, Fundação Lemann, MSC Participações,
Instituto Unibanco, Comunidade Educativa Cedac, Instituto Hedging-Griffo,
Fundação Itaú Social, Itaú BBA, Iguatemi, Santander, Tellus, Parceiros da
Educação, Fundação Educar DPaschoal, Fundação Bradesco, Instituto de
Co-Responsabilidade pela Educação (Ice), Centro de Estudos e Pesquisas
em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Instituto Península,
Instituto Arymax e da consultoria internacional McKinsey & Company.
37
(SEE/SP, notícia publicada em 15/10/2011 ).

Essa nova reforma não alterou as atribuições do professor coordenador nas


escolas. Entretanto, ao considerarmos que duas diretrizes (denominada de pilares
pela reforma) existentes nesse “compromisso” dizem respeito: 1.) valorização do
capital humano através de uma política salarial baseada na meritocracia e; 2.)
aprimoramento da gestão pedagógica com foco na melhora do desempenho dos
estudantes através da utilização dos programas oferecidos pela SEE/SP como o Ler

36
Disponível em: http://www.educacao.sp.gov.br/compromisso-sp. Acesso em: 30/06/2015.
37
Disponível em: http://www.educacao.sp.gov.br/noticias/governador-anuncia-programa-de-acoes-e-
convida-a-sociedade-para-compromisso-pela-educacao. Acesso em: 30/06/2015.
89

e Escrever e os cursos oferecidos de forma on line pela EVESP (Escola Virtual de


Programas Educacionais do Estado de São Paulo), levantamos a possibilidade de
que esses “pilares” possam vir a organizar o trabalho do professor coordenador em
direção a uma busca desenfreada por melhores resultados, por melhores
desempenhos, vindo a compreender que seu trabalho se limita a “números em uma
tabela” (Ball, 2005, p. 547). Ou seja, tais pilares tendem a intensificar o desejo por
melhores indicadores pela escola, culminando no pagamento de uma bonificação
pelos bons resultados aos docentes e funcionários, promovendo um processo de
sobreposição da ambição em detrimento do pedagógico.

Dessa forma, seu posicionamento, como gestor do currículo, pode se


intensificar no monitoramento e nas intervenções sobre o trabalho docente. Ao
sustentar a crença de que a metodologia e o conteúdo existentes no currículo,
quando trabalhados integralmente com os estudantes, são o suficiente para a
ocorrência de um bom desempenho nas avaliações, o professor coordenador pode
vir a assumir uma postura autoritária e antidemocrática, não permitindo que atrasos
ocorram no desenvolvimento do currículo ou que outras formas e conteúdos, que
venham ser avaliados pelos docentes como mais próximos à realidade dos
estudantes, possam ser postos em prática em sala de aula.

Em nossas entrevistas nos foram apresentadas pastas com calendários e


cronogramas de visitas à sala de aula e de avaliações. Tudo é devidamente
registrado, com anotações do que deve ser realizado e do que foi realizado pelos
docentes. Após a visita do professor coordenador, os docentes são chamados em
sua sala para um feedback. Constatamos a existência de uma história em
quadrinhos apresentada aos professores coordenadores que participaram do curso
“Melhor Gestão, Melhor Ensino” de como conduzir tal feedback (Anexo 5).
Observamos que mesmo descrevendo tais visitas como sendo um suporte, um
auxílio ao docente, os professores coordenadores são persuasivos e insistentes
para que os cronogramas sejam cumpridos. E quando um ou outro docente não
cumpre, seja qual for o motivo, é considerado “o que bate de frente” ou é aquele
“que não leva a sério o seu trabalho”.

Freitas (2014) corrobora com nosso pensar, ao escrever sobre a debilidade


do trabalho pedagógico, a partir de análises que demonstram a disputa dos
90

reformadores empresariais na educação pelo controle e pela “padronização dos


conteúdos e métodos” a serem utilizados nas escolas. Segundo o autor:

As visões alternativas de organização do trabalho pedagógico no interior da


escola vão ficando cada vez mais sem espaço para se manifestar ante o
peso avassalador das avaliações externas, consultorias e materiais pré-
fabricados que engessam a atividade da escola e se associam a processos
de mediação internos, ancorados em uma gestão verticalizada e que
funcionam como transmissões daquelas funções sociais de exclusão e
subordinação, através de microações que redefinem as relações entre os
atores escolares, controlando os objetivos, os conteúdos e os métodos de
ensino. Qualquer ação fora do esperado pode comprometer a nota da
escola e/ou bônus de final de ano. [...]
O controle gerencial verticalizado nas escolas, o apostilamento e o
planejamento “passo a passo” fazem com que seja desnecessária uma
grande preparação profissional, bastando que professores improvisados
treinados em seguir apostilas e obedecer sejam suficientes para os novos
propósitos. (p. 1102-1103)

Diante das leituras e observações que realizamos acerca do trabalho do


professor coordenador tendo em vista a sua apresentação nos textos legais, através
do contato obtido pelas entrevistas e em visitas e conversas informais durante o
processo de pesquisa, muitas vezes, em nossas análises, acabamos nos colocando
como ideólogos em defesa de um ensino público e gratuito de qualidade,
sustentando uma participação efetiva e democrática dos docentes na escola.
Entretanto, não é nossa intensão difundir neste estudo uma ou outra postura
ideológica, mas sim, apresentar um panorama sobre os processos que envolvem as
reformas educacionais no Estado de São Paulo a partir do estudo da identidade
profissional do professor coordenador da rede pública paulista.

Todavia, findamos o capítulo compreendendo um pouco mais sobre o


trabalho do professor coordenador, transpondo o nosso entendimento não somente
orientado pela perspectiva de suas atribuições postas pelo Estado, mas também por
uma perspectiva partindo da compreensão que o professor coordenador tem de seu
trabalho dentro da escola pública paulista.
91

CAPÍTULO 5 - A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DO PROFESSOR


COORDENADOR NA ESCOLA

Saviani (2011) aponta que nos anos de 1970 e 1980, os modelos


“tecnicistas”, relacionadas à organização do trabalho na escola tinham como base os
princípios organizacionais fundamentados no taylorismo, no fordismo, na
racionalidade técnica e no monitoramento do comportamento. Contudo, a partir da
década de 1990, os modelos “tecnicistas” passam a ser caracterizados pela
flexibilização, denominado pelo autor de “neotecnicismo”. O que percebemos, a
partir dessa análise, é que a organização do trabalho na escola ainda segue os
princípios de taylor/ford, entretanto, novos mecanismos foram introduzidos ao
processo, novas fórmulas surgiram remodeladas, reestruturadas e adequadas ao
modelo econômico e político vigente, o que levou o deslocamento do foco
“processual para o dos resultados”. O trabalho na escola vem sendo reorganizado
através da transferência de modelos de gestão, visando a “qualidade total”,
utilizados no campo empresarial para o campo educacional, ao que o autor
denomina de “pedagogia corporativa38”.

Redefine-se, portanto, o papel do Estado como das escolas. Em lugar da


uniformização e do rígido controle do processo, como preconizava o velho
tecnicismo inspirado no taylorismo-fordismo, flexibiliza-se o processo, como
recomenda o toyotismo. Estamos, pois, diante de um neotecnicismo: o
controle decisivo desloca-se do processo para os resultados. É pela
avaliação dos resultados que se buscará garantir a eficiência e
produtividade. [...] O neotecnicismo se faz presente alimentando a busca da
“qualidade total” na educação e a penetração da “pedagogia coorporativa”.
(SAVIANI, 2011, p. 439)

Segundo Peroni (2012, p. 24), “historicamente, o mercado foi o padrão para o


público”, e nesse sentido a autora compreende a existência de um “hibridismo” de
princípios e de conceitos na organização do trabalho das e nas escolas, que vão

38
Saviani (2011, p. 440 e 441) utiliza o termo “pedagogia corporativa” para explicar “o processo de
adoção do modelo empresarial na organização e no funcionamento da escola (p. 440)” e para
explicar a crescente expansão de instituições privadas de ensino superior que, para além da
utilização de modelos de gestão advindos das empresas, conecta-se ao mercado treinando, através
de seus diversos cursos, mão de obra especializada em conformidade e se ajustando as
necessidades das empresas.
92

desde elementos tayloristas até os modernos princípios de gestão gerencial. A


autora afirma a existência de elementos como: a divisão do trabalho, a
especialização, o monitoramento e o controle pela gerência, a padronização material
e comportamental, o trabalho em equipe, o atendimento às demandas, a utilização
de expressões e ações motivacionais, entre outros, no processo de gestão e de
organização do trabalho na escola pública.

Ratificando o movimento de transposição de categorias de origem da


organização do trabalho nas empresas para a gestão escolar, Oliveira (1996)
destaca que tal uso além de não ser uma inovação, passa a ser um conjunto de
ferramentas com o objetivo de ajustá-lo e adequá-lo ao trabalho pedagógico do
docente. Essa “transferência dos critérios da racionalidade administrativa (p. 57)”
para a escola, confirma a autora, poderia dar ensejo ao surgimento de condições
para incorporação da lógica de mercado no processo da gestão escolar.

Nesse contexto a avaliação dos resultados passa a ser inscrita como


parâmetro do novo modelo de regulação do Estado, tendo em vista à “qualidade
total na educação”, implicando mudanças de direção na formulação das novas
políticas, para responder às necessidades de “accountability” e reorganizando, para
tal, os órgãos da secretaria para as novas exigências das normas burocráticas da
organização do trabalho (Pino, 1997).

É pensando na existência dos elementos que constituem a organização do


trabalho na escola que buscamos compreender, nos fundamentando em Heloani
(2011a, 2011b), como os modelos de organização do trabalho advindos do
Taylorismo até o Toyotismo e os Programas de Qualidade Total vêm sendo
aperfeiçoados, através de mecanismos de controle e de monitoramento, cada vez
mais complexos, refinando-se, sutilmente, e incorporando-se à subjetividade do
trabalhador.

A fim de fundamentar nossas análises, encontramos em Heloani (2011b,


p.24-42), as características do taylorismo e assim, pudemos perceber o quanto são
abrangentes seus elementos e como eles se concretizam nos “vários setores da vida
moderna”. Notamos que o pensamento taylorista sobre a organização do trabalho
relaciona-se ao “uso de quatro elementos”:
93

Primeiro – O desenvolvimento (pela direção e não pelo operário) da ciência


de assentar tijolos, com normas rígidas para o movimento de cada homem,
aperfeiçoamento e padronização de todas as ferramentas e condições de
trabalho.

Segundo – A seleção cuidadosa e subsequente treinamento dos pedreiros


entre os trabalhadores de primeira ordem, com a eliminação de todos os
homens que se recusam a adotar os novos métodos, ou são incapazes de
segui-los.

Terceiro – adaptação dos pedreiros de primeira ordem à ciência de assentar


tijolos, pela constante ajuda e vigilância da direção, que pagará a cada
homem, bonificações diárias pelo trabalho de fazer depressa e de acordo
com as instruções.

Quarto – Divisão equitativa do trabalho e responsabilidade entre o operário


e a direção. No curso do dia, a direção trabalha lado a lado com os
operários, a fim de ajudá-los, encorajá-los e aplainar-lhes o caminho,
enquanto no passado, ao contrário, a direção permanecia de lado,
proporcionava-lhes pouco auxílio e sobrecarregava-os de quase toda a
responsabilidade quanto aos métodos, uso dos instrumentos, velocidade e
cooperação. (Taylor apud Heloani (2011, p. 38)

Ao lermos o projeto piloto39 que a SEE/SP em parceria com a Fundação Itaú


Social e Instituto Fernand Braudel implantou em janeiro de 2009 em dez escolas da
capital que apresentaram baixo rendimento nas avaliações externas, encontramos
elementos do “hibridismo” existente na organização do trabalho na escola e no
trabalho do professor coordenador. Tal projeto apresentava como objetivo o
treinamento de professores coordenadores para observarem as aulas e intervirem
nas práticas pedagógicas dos docentes, na intenção de melhorar o rendimento dos
estudantes.

Em um primeiro momento levantamos a hipótese de existir nesse projeto a


questão regulatória do Estado no que diz respeito a garantir uma educação de
qualidade a partir da regulação do sistema de ensino e da responsabilização da
escola via avaliação de resultados. Segundo Gaulejac (2014) a “ideologia
gerencialista” utiliza-se de meios verificáveis, mecânicos e mensuráveis para
compreender o humano. O Estado de São Paulo faz uso do IDESP como indicador
verificador da qualidade da educação pública paulista. Ao gerar uma nota para os
9ºs anos do ensino fundamental anos finais e outra nota para a 3ª série do ensino
médio de cada escola da sua rede de ensino, acaba por promover, implicitamente,
um ranqueamento e uma competição, além de uma estratificação entre as escolas.

39
Disponível em: http://www.educacao.sp.gov.br/noticias/sp-lanca-projeto-piloto-para-implantar-
modelo-de-ny-em-escolas-estaduais. Acesso em: 08/07/2015.
94

Com base nas análises de Freitas (2014) a respeito da interferência dos


“reformadores empresariais da educação” na “disputa pelo controle do processo
pedagógico na escola”, compreendemos que o empresariado segue adotando
estratégias próprias do setor privado e transferindo-as para o campo educacional.
Essas estratégias podem vir a ser utilizadas via controle das avaliações e de seus
objetivos e, na organização e controle do trabalho pedagógico, ou seja, dos
conteúdos e das metodologias de ensino (o que, do que e como ensinar),
intensificando “a padronização da atividade pedagógica como forma de viabilizar o
controle ideológico da escola” (p. 1095).

Por essa perspectiva, entendemos que os resultados das avaliações são


fundamentais ao orientarem as ações a serem postas ao sistema educacional pelos
formuladores das políticas educacionais, moldando os contornos da organização do
trabalho na escola. Ou seja, o uso da avaliação pode vir a ser uma ferramenta de
controle comportamental, mais preocupada em compor limites aos que trabalham na
escola do que comprometida com a qualidade do processo pedagógico em si.

Em um segundo momento, surge outra hipótese com foco na gestão


educacional, ao verificarmos a parceria pública-privada entre SEE/SP e a Fundação
Itaú Social e o Instituto Fernand Braudel, transcendendo as dimensões relativas a
transferência de dinheiro público para a iniciativa privada na compra de material de
escritório, de limpeza ou de tecnologia para as escolas e/ou na compra de material
didático, é possível identificar aspectos que possam, talvez, deem elementos para
compreendê-la como inédita. Segundo a SEE/SP os elementos que compunham a
execução desse projeto piloto foram importados da reforma educacional que estava
sendo realizada na cidade de Nova York desde o ano de 2001.

Tal parceria estaria iniciando um processo de privatização da gestão da


escola pública paulista, permitindo que o público passe a ser privadamente
administrado, viabilizando que novas técnicas, instrumentos e metodologias de
gestão utilizadas em organizações privadas possam vir a ser executadas no interior
das escolas públicas?

Freitas (2014), ao analisar a ação dos “reformadores industriais” no setor


educacional público, compreende a privatização da gestão da educação como
95

estratégia utilizada pelo empresariado, na medida em que promove a


desresponsabilização do Estado pela educação pública, de um lado, como uma
forma de garantir “o faturamento das corporações educacionais e, por outro, o
controle ideológico do sistema educacional pelas corporações empresariais para
colocá-lo a serviço de interesses de mercado” (p. 387).

Do ponto de vista da organização do trabalho na escola, difícil não pensar em


um processo de intensificação de ações e estratégias empresariais nesse cenário,
incorporando, entre outros fatores, contratos precários, exigência de flexibilidade e
polivalência do trabalhador na execução de múltiplas tarefas e atendimento a uma
demanda imediata. Entendemos que essas medidas gerencialistas, no interior da
gestão escolar tendem a diluir os direitos e deveres dos docentes em prescrições
pontuais balizadas por resultados imediatos.

Por esse prisma, compreendemos que a avaliação se efetiva como um


conjunto de condições que geram resultados a serem usados como justificativa para
a viabilização das reformas educacionais e do processo de privatização da gestão
da escola pública, ou seja, a gestão por resultados através dos instrumentos da
avaliação geram os resultados, de um lado que permitem avaliar o trabalho do
professor do ponto de vista meritocrático e, de outro lado, viabilizar e legitimar as
reformas educacionais de cunho empresarial que caminham na direção da
privatização do público.

Em um terceiro momento, respeitadas as diferenças entre o trabalho de se


“assentar tijolos” e o trabalho docente, e o tempo e o espaço em que Taylor efetuou
suas pesquisas e escreveu suas teorias, verificamos a utilização de elementos
tayloristas nesse projeto: seleção das escolas; seleção dos participantes;
treinamento externo através de métodos elaborados e aplicados por especialistas;
acompanhamento, monitoramento e avaliação contínua; adaptação; bonificação
pelos bons resultados (via avaliação e melhora no desempenho dos alunos no
SARESP e consequente melhora no IDESP); divisão do trabalho; estímulos ‘no’ e
‘para’ o uso das novas metodologias e processos pedagógicos. Assim, observamos
um movimento em busca do controle de uma qualidade de forma gradual e contínua,
alinhando a organização do trabalho ao molde taylorista, contudo, sob uma nova
96

perspectiva, “em que velhas ideias adquirem nova roupagem e se adaptam às novas
circunstâncias históricas” (Heloani, 2011b, p.23).

Levantadas essas hipóteses, algumas dúvidas surgiram: Ao aplicar tal projeto


nessas escolas onde se verificou um baixo rendimento dos estudantes nas
avaliações externas e, consequentemente, um indicador de desempenho baixo,
estaria a SEE/SP realmente interessada na aplicação de estratégias que
desencadeassem resultados que fizessem essas escolas alcançarem rendimentos
satisfatórios ou essa intervenção objetivava outros interesses? Essas escolas teriam
servido de laboratório para que novos modelos de controle e de monitoramento do
trabalho docente fossem adequados e aprimorados à realidade do sistema de
ensino público paulista? Seria esse projeto uma forma de justificar e cobrar o uso do
currículo oficial ao relacioná-lo a uma consequência futura de bons resultados?
Estaria a SEE/SP utilizando o fator ‘baixo rendimento’ para justificar a introjeção de
uma gestão privada nessas escolas públicas e consequentemente para todo o
sistema? Como se organizava o trabalho do professor coordenador nesse processo?

Na intenção de trazer uma luz para essas dúvidas, ao observarmos algumas


notícias na página da SEE/SP na internet e pelos relatos obtidos em nossas
entrevistas, identificamos que, após a execução desse projeto (muito embora não
tenhamos conseguido encontrar notícias sobre uma possível apresentação pública
dos resultados promovidos por ele), houve uma expansão das ideias 40 aplicadas
nessas dez escolas. Isto conduziu nosso pensar ao entendimento que tal projeto
piloto, independente se resultados de melhora foram ou não apresentados, utilizou-
se da escola como um laboratório onde intentou promover a ideia de que bons
indicadores de desempenho podem vir a ser conquistados mediante o uso
sistemático da metodologia e do currículo organizado pela SEE/SP, direcionando o
trabalho do professor coordenador através dessa perspectiva.

A partir dessa observação, trabalhamos com a hipótese de que a avaliação


processa-se como uma ferramenta de poder, de organização e de controle na
40
Vide a notícia de 20/05/2015 intitulada: Diretoria de Ensino de Bauru realiza ação para professores
coordenadores. Segundo a notícia a ação tem como objetivo dar instruções aos professores
coordenadores de como observar as aulas dos docentes para oferecer-lhes um retorno no intuito de
melhorar o seu desempenho em sala de aula. Disponível em:
http://www.educacao.sp.gov.br/noticias/diretoria-de-ensino-de-bauru-realiza-acao-para-professores-
coordenadores. Acesso em: 09/07/2015.
97

intensão de que as regras do jogo sejam cumpridas durante o processo, na medida


em que essa é utilizada como mecanismo para garantir que os procedimentos
(meios) se alinhem aos resultados (fins).

Com isso a avaliação, como instrumento, passa a camuflar o papel da


burocracia41 como forma de controle e regulação. Ao se promover o conceito de
Estado Gerencial em detrimento ao Estado Burocrático, o termo burocracia parece
diluir-se mediante aos aspectos gerencialistas. Contudo, compreendemos que o
conceito de burocracia continua atrelado ao conceito de Estado e de organização do
trabalho na visão desse Estado Gerencialista. Os princípios burocráticos como a
avaliação contínua do desempenho, treinamento metódico, critérios de mérito,
estrutura hierárquica, entre outros, encontram-se presentes nas reformas
educacionais e, portanto, na organização do trabalho na escola pública.

Com base em Tragtenberg (2004, p. 45 à 75) entendemos que a burocracia


(avaliação) é parte essencial na organização do trabalho na escola. Construída sob
uma égide legal, a burocracia (avaliação) se estabelece como uma estrutura
(ferramenta e/ou mecanismo) de controle, provida de imunidades e privilégios, que
pulveriza sua responsabilidade na coletividade que administra. Seu esquema
organizacional se molda aos ideais das classes dominantes (industriais), o que
proporciona que suas ações sejam pensadas e executadas verticalmente de cima
para baixo, tendendo a retirar o poder de contestação dos que hierarquicamente a
ela estão subordinados. A burocracia (avaliação) como controle, poder e
organização tem por objetivo atingir a subjetividade dos trabalhadores, formatando
um comportamento adequado aos seus princípios, introduzindo limites na forma e no
conteúdo de suas ações.

Dessa perspectiva observamos que a organização do trabalho na escola


encontra-se balizada pela produtividade nos moldes do capitalismo. Ressaltamos
que tal produtividade não se relaciona com a obtenção de lucro pela escola, afinal, o
trabalho pedagógico em sala de aula não gera excedentes lucrativos de forma
41
Tragtenberg (2006) esclarece em suas análises sobre os estudos de Max Weber o conceito de
burocracia. Segundo o autor a burocracia para Weber é um tipo de poder, “um sistema racional em
que a divisão de trabalho se dá racionalmente com vistas a fins. A ação racional burocrática é a
coerência da relação entre meios e fins visados. Assim, para Weber a burocracia implica predomínio
do formalismo, de existência de normas escritas, estrutura hierárquica, divisão horizontal e vertical de
trabalho e impessoalidade no recrutamento dos quadros” (p. 171).
98

explícita para o Estado ou para a iniciativa privada. No entanto, pensamos na


exitência de uma preocupação maior com os valores investidos na educação, ou
seja, na compra (pelo Estado) e na venda (pela iniciativa privada) de materiais
pedagógicos, tecnologias, palestras, cursos, oficinas, reformas nas estruturas físicas
das escolas, prestação de serviços, enfim, uma série de gastos públicos com o setor
privado que gerariam lucros e possibilitariam um maior controle e regulação do
trabalho docente pelo setor privado. Outro fator que podemos relacionar à
produtividade da escola reside na produção de trabalhadores para o mercado de
trabalho, e em grande número, abarrotando-o com mão de obra especializada e
barata, o que propiciaria ao setor privado a oferta de contratos precários e com
baixos salários em função da baixa oferta e grande procura.

Sendo assim, podemos considerar, ainda que de forma indireta, que a


organização do trabalho pedagógico nos meandros da escola pode ocupar um lugar
estratégico do ponto de vista dos interesses do mercado.

Gaulejac (2014, p. 269) afirma que a “educação deve ser considerada como
um serviço prestado ao mundo econômico” e, como tal, essa concepção abre o
espaço para que a lógica capitalista venha a instalar-se, encontrando os meios de
reproduzir-se, em maior ou menor escala na escola. Válido expressarmos que a
escala de reprodução, segundo Tragtenberg (2004), depende das relações de poder
estabelecidas, na escola, entre os que nela trabalham e os que a frequentam.

Tais relações podem ter como base as orientações do mercado e, sendo


assim, acabam por seguir transformando a educação em “[...] uma fábrica de
homens utilizáveis (Tragtenberg, 2004, p. 45)”, vindo a produzir estudantes dóceis e
bem treinados, para que saibam no mínimo ler e escrever, e que possam vir a
atender as necessidades da economia, treinando-os a adaptarem seu
comportamento de acordo com as mudanças que possam vir a acontecer na
organização de seu trabalho quando esses adentrarem o mercado de trabalho.
Conclui o autor que:

Duas são as principais funções conservadoras atribuídas à escola e aos


professores: a exclusão do sistema de ensino dos alunos das classes
sociais inferiores e a que definimos como socialização à subordinação, isto
é, a transmissão ao jovem de valores compatíveis com o seu futuro papel
de subordinado. (p. 67-68)
99

Diante do exposto, é possível compreender que a organização do trabalho


pedagógico na escola vem, gradualmente, deixando de estar apoiada em diretrizes
ou normas estritamente rígidas. Ela passa a assentar-se em uma ótica flexível e
ainda que existam regras na execução e na condução do trabalho na escola, seus
contornos encontram-se balizados pelos fins, ou seja, pelos resultados alcançados.
Satisfatórios ou não, são esses resultados que passam a orientar e limitar as ações
do trabalho do professor coordenador na escola. Dessa forma, atribui-se o sucesso
pelos bons resultados ao bom uso dos recursos disponíveis, em contrapartida, o
infortúnio dos resultados é atribuído ao descaso e ao desuso dos recursos
disponibilizados pelo sistema educacional.

No caso da escola pública paulista, a responsabilidade pela qualidade da


educação acaba por recair nos encarregados pelo processo pedagógico na escola,
cabendo ao professor coordenador garantir que esse processo caminhe conforme as
orientações da SEE/SP. O Estado e a SEE/SP, implicitamente, parecem se eximir da
responsabilidade pela qualidade da educação, cabendo-lhes a competência sobre a
definição dessa qualidade e da formulação de ações a serem incorporadas no
sistema educacional ou dele retiradas, mediante os indicadores de desempenho das
escolas. Logo, os meios e fins educacionais situam-se sob o controle de uma
avaliação impessoal, exógena, excludente e estratificadora, motivando uma
competição focada em melhores resultados (fins), não importando as dimensões em
que os contornos do processo se darão (meios).

De acordo com o Caderno do Gestor, volume 1, seu objetivo é o de:

[...] fornecer instrumentos para que o Professor Coordenador possa ocupar


com competência seu lugar de gestor pedagógico na organização escolar,
apoiando a implantação da Proposta Curricular e planejando outras ações
para a construção de uma escola pública de qualidade. [...]

A função do Professor Coordenador deve estar centrada na gestão da


qualidade do ensino oferecido pela escola e na construção de um espaço
produtivo para uma conveniência social e coletiva mais humana e
construtiva da vida escolar.

Como Professor Coordenador Gestor esse profissional deve ser capaz de


definir e articular múltiplas ações voltadas para a qualidade do ensino e de
seus resultados na aprendizagem dos alunos no contexto real onde essas
ações acontecem. (Murrie, 2008, p. 07)
100

Muito embora esse caderno tenha sido publicado e distribuído no ano de


2008, em nenhum momento ele foi citado nas entrevistas. Um dos participantes
argumentou que entrou para ser professor coordenador “de gaiato” e que não sabia
“qual era a função do professor coordenador”. Que “nos primeiros meses não sabia
nem como trabalhar” classificando seu primeiro ano de trabalho como “uma lástima”.

Entretanto, averiguamos que, mesmo sem os professores coordenadores


participantes citarem a existência desse caderno e dos outros volumes existentes,
suas ações harmonizam-se com as prescrições contidas em seus parágrafos, o que
nos leva a pensar que, outros meios e formas foram utilizadas para suprir prováveis
lacunas e desarmonizações entre o que a SEE/SP esperava do trabalho do
professor coordenador e o que ele executava na escola. Nesse sentido, as
orientações centralizadas nas Diretorias de Ensino podem ter contribuído
enormemente na capacitação e na formação desse profissional.

mas a nossa função é extremamente pedagógica. É estudar o currículo,


estudar as outras áreas do conhecimento, não só a minha área. Como é
que eu posso assistir uma aula de matemática, se eu não estudei antes
aquela aula, não estudei a metodologia, pra depois cobrá-la do professor,
entendeu? Então, é muito importante, porque, no Estado, por exemplo, o
patrão, ele não está aqui. É uma empresa? Tudo bem. É um empresa. Mas
ele não está aqui no dia a dia observando. Então, é por isso que tem esses
outros cargos, eu vejo assim. Então, de alguma maneira alguém tem que
ser cobrado, se não o que é que vira? Senão o professor entra na sala de
aula, ele faz aquilo que ele quer! Aquilo que ele bem entende! Então quer
dizer que ele pode muito bem sentar cruzar os braços e não dar aula!
Então, como é que nós vamos, né, lidar com essa situação? Porque que o
aluno não aprende? O que é que está acontecendo? Porque que a nossa
escola zerou? Então, quais foram os erros? Não houve um trabalho bem
feito da equipe pedagógica? Do professor coordenador? Não houve um
trabalho bem feito das PCNPs da Diretoria de Ensino conosco? O que?
Quais orientações que nos foram passadas? Pra que a gente faça valer o
nosso trabalho. Porque o professor coordenador ele não é só fazer
calendário de provas, separar material pra professor, pro aluno: Ah! Eu
preciso de cartolina. Vai pegar a cartolina. Não é isso, entendeu? Tá, ele
ajuda nessa parte, mais é na parte pedagógica que ele tem que entrar. Nem
todos os professores gostam disso, mas, eles já estão se acostumando com
essa nova realidade. (Relato de um professor coordenador)
101

5.1. Gestão Pedagógica – Autonomia entre restrições e/ou privações: um


sistema paradoxal

Achados de pesquisa42, ao contribuírem para o nosso entendimento sobre


organização do trabalho na escola, expressam o penetrar da lógica capitalista em
seus meandros através das reformas educacionais. Essas pesquisas revelam uma
complexificação das relações sociais na escola e demonstram que essas estão
tornando-se cada vez mais individualizantes mediante a vinculação do trabalho às
competências pessoais de cada trabalhador, cujo objetivo culmina em uma
bonificação para o grupo pelos resultados individualmente obtidos. A hipótese a ser
ressaltada é a provável existência dessa lógica capitalista na organização do
trabalho do professor coordenador.

A permanente pressão posta aos trabalhadores da educação


responsabilizando-os individualmente - porém, em nome do grupo - pelo
aprendizado dos estudantes e pelas metas inalcançáveis, além de incumbi-los de
promoverem ações e projetos ligados à área da saúde, da segurança e entre outros;
responsabilizá-los pela limpeza e pela organização das salas de aula; pelas reuniões
pedagógicas e de cunho fiscal; pelo preenchimento de relatórios sobre o
aprendizado e disciplina dos estudantes; pelas tabulações de avaliações exógenas;
pelas adaptações curriculares para alunos com deficiências físicas e intelectuais;
pelo cumprimento de um currículo uno; pela utilização de um método apostilado,
pragmático e utilitarista, isonômico e isométrico, com tempos definidos que mais se
assemelha a um caderno de receitas; pelo preenchimento on line das notas, faltas,
datas de provas, trabalhos, etc.; essa gama de responsabilidades norteiam o
trabalho pedagógico nas escolas com foco na performance sob o monitoramento
sistemático de uma gestão democrática e autônoma.

As evidências epistemológicas, documentais e o que foi expresso pelas


palavras dos entrevistados, conduziram nosso entendimento na direção da
existência de um hibridismo conceitual na organização do trabalho do professor

42
Ball (2002, 2005); Fanfani (2007); Freitas (2004; 2012; 2014); Landini (2008); Oliveira (1996; 2007;
2008); Peroni (2012).
102

coordenador: ora rígida, impessoal e especializada (taylorizada); ora flexível, grupal,


multiqualificada e polivalente (gerencialista).

Para examinarmos a organização do trabalho do professor coordenador e


compreendermos seu trabalho é necessário localizá-lo no interior de um processo de
reprodução cultural43 e social e, como consequência, uma reprodução dos modos
capitalistas de produção. Ou seja, sua ação pedagógica se organiza seguindo os
critérios rígidos de uma racionalidade administrativa ao mesmo tempo em que
conduz as atribuições do seu trabalho de maneira flexível e polivalente, integrando o
fator humano a algo maior: a uma demanda externa à escola, alinhada aos ensejos
do mercado e sustentada por uma ideologia gerencialista.

Essa ação pedagógica pode vir a implicar em uma conduta competitiva,


comparativa, produtivista e reprodutivista preservando as relações sociais pré-
estabelecidas por uma ideologia dominante e as desigualdades sociais nela
contidas.

Os conceitos de qualidade, produtividade, participação e meritocracia são


valorativos. Exprimem uma concepção de relação social. Dentro deste
contexto em que os critérios da economia provada se apresentam como
referenciais para a gestão da escola pública, estes conceitos são inseridos
dentro de uma lógica mercantil cuja a prática social é a concorrência. [...]
Assim, os alunos devem competir entre si, tentar provar que são melhores;
os professores provarão que são bons, merecedores de salários dignos
porque contribuem na criação da riqueza, qualificando a força de trabalho, e
as escolas competirão por excelência, pois assim garantem recursos para a
sua sobrevivência. [...]
Já não interessa o conhecimento crítico, aquele que não traz ganhos em
produtividade. (Oliveira, 1996, p. 85 e 86)

Contudo, não compreendemos o mundo social como algo estanque e


cartesiano. E estando a escola inserida nesse mundo social, por sua concepção
histórica de ser um local onde os saberes são produzidos e reproduzidos, por essa
sua pluralidade e diversidade de pensamentos e de indivíduos, concordamos com
Heloani (2011b, p. 174) quando ele escreve que “[...] a lógica dialética ensina-nos

43
“É provavelmente por um efeito de inércia cultural que continuamos tomando o sistema escolar
como um fator de mobilidade social, segundo a ideologia da ‘escola libertadora’, quando, ao contrário,
tudo tende a mostrar que ele é um dos fatores mais eficazes de conservação social, pois fornece a
aparência de legitimidade às desigualdades sociais, e sanciona a herança cultural e o dom social
tratado como dom natural”. BOURDIEU, Pierre. A escola conservadora: as desigualdades frente à
escola e à cultura. In: Escritos de educação. Nogueira, M. A.; Catani, A. (orgs.). 11.ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2010.
103

que toda dominação é processual, portanto transformadora e transformada, e


passível de resistência e conflito”.

Entretanto, o poder da gestão gerencialista, em um processo no qual utiliza-


se de mecanismos tácitos e coercitivos, tenta, a qualquer preço, minar essas
resistências. Ao tentar equacionar a realidade, a gestão tende a eliminar tudo que
não pode ser contabilizado. Questões afetivas e emocionais são deixadas de lado
tendo em vista que são difíceis de serem mensuradas. Além do mais, as questões
subjetivas podem trazer à tona as peculiaridades e as particularidades de cada
indivíduo, abrindo espaço para que as diferenças e os conflitos apareçam. Para a
ideologia gerencialista é importante que os indivíduos assumam comportamentos e
condutas desejáveis e que atendam as expectativas da organização, ou no caso da
escola pública, satisfaça a expectativa daqueles que idealizam e elaboram as
políticas e os programas educacionais. Para Gaulejac (2014, p. 74) “os conflitos são
considerados como disfunções” e como tal, passíveis de não discussão.

Sob a perspectiva gerencialista, o trabalho do professor coordenador pode vir


a se concretizar sob uma diretriz de monitoramento do trabalho docente ao mesmo
tempo em que tenta justificar tal monitoramento através de indicadores
apresentados pelas avaliações externas que medem ‘o quanto’ e ‘em quanto tempo’
os estudantes estão aprendendo. A qualidade do processo educacional é o
resultado do progresso notado em uma escala de proficiência linear, ou seja, uma
suposta quantidade do que se aprendeu ou do que se sabe.

Consideradas as argumentações dos entrevistados sobre o seu trabalho,


levantamos a hipótese de que o trabalho do professor coordenador pode vir a não
pautar-se somente na realização da observação e da análise do desempenho do
docente em sala de aula. Pensamos que o desempenho obtido pelos estudantes nas
avaliações externas pode permitir ao professor coordenador verificar o
comprometimento do docente, se está ou não adequando o ensino as necessidades
da escola (meta), traduzindo esse dado em qualidade do ensino. Ou seja, somente
ao se alcançar a meta proposta poderá ser considerado que os docentes tenham
realizado um bom trabalho em sala de aula e consequentemente o trabalho do
professor coordenador poderá vir a ser avaliado como a de “um bom gestor”, visto
que garantiu o alcance de determinada meta (sucesso final) ao mobilizar o corpo
104

docente através de uma formação continuada em serviço (reuniões pedagógicas),


utilizando-se de intervenções pedagógicas (observação e intervenção das aulas).
Enfim, a qualidade do trabalho pedagógico na escola pode vir a ser traduzida por um
indicador de desempenho numérico utilizado pelo sistema educacional vigente.

Gaulejac (2014) e Ball (2010; 2005; 2002) entendem a “cultura da gestão”


como uma tecnologia política que visa uma mobilização psíquica do trabalhador em
relação as suas atribuições, incitando-o a assumir determinadas habilidades e
competências pensadas de maneira exógena, contudo, fazendo-o perceber que tais
determinações lhe são próprias. “A gestão gerencialista prefere a adesão voluntária
à sanção disciplinar, a mobilização à obrigatoriedade, a incitação à imposição, a
gratificação à punição, a responsabilidade à vigilância” (Gaulejac, 2014, p. 119).
Embora tais preferências do gerencialismo se apliquem na escola e nas atribuições
do professor coordenador, suas contrapartidas também se realizam, como por
exemplo, na utilização ou não do currículo, na observação ou não das aulas dos
docentes, na conquista ou não das metas, entre outras ocorrências que se tornam
paradoxais no cotidiano de seu trabalho.

O que pudemos perceber sobre os princípios gestionários nos meandros da


escola, é que tais princípios se concretizam, em grande medida, através de um
processo lógico, onde a comunicação age como mediador dos conflitos, garantindo
uma mobilização e uma flexibilidade ‘no’ e ‘do’ trabalho pedagógico. Os processos
avaliativos seguem traduzindo as ações, tanto dos estudantes quanto dos docentes
e do professor coordenador, em indicadores de desempenho numérica e
exaustivamente analisados e transformados em indicadores de qualidade. Esses
mesmos processos avaliativos servem de base para normalizar e normatizar os
comportamentos, balizando e adequando as ações pedagógicas ‘do que se pode’ e
‘do que se deve’ fazer, de acordo com os manuais.

Importante ressaltar que tais adequações podem não se concretizarem de


maneira tão unilateral e de forma linear. A gestão não se utiliza de maneira tão
simplista do binômio – eu mando e você obedece. O processo gestionário induz a
participação de todos nas decisões. Sugere, propõe, discute, ao mesmo tempo em
que se apresenta aberto a essas possibilidades participativas de sugestão,
proposição e discussão. Utilizando-se de um discurso circular, sustentado por
105

modelos ideais e por evidências positivistas, a gestão intenta desviar a atenção dos
trabalhadores da realidade na qual se encontram, propondo um mundo ideal, sem
contradições e sem diferenças. Propõe a realização do trabalho de forma
enriquecedora e estimulante. Gera situações motivadoras, incita a determinação
pelo mérito pessoal. A gestão não intenta incutir os ideais da organização na ‘alma’
do trabalhador, ela espera algo maior, que o trabalhador ceda a sua alma à
organização.

[...] enquanto eu estava na sala de aula, eu não enxergava como eu estou


enxergando agora. Não me fizeram uma lavagem cerebral, tá?! Não, não
me fizeram uma lavagem cerebral. Mas pelas orientações, eu comecei a
enxergar de uma outra maneira, e ver que é muito mais fácil do que se
imagina aceitar o novo e não ficar dando murro em ponta de faca. Achar
que lá, tudo vem de lá de cima e a gente tem que fazer do jeitinho que eles
querem, certo? Tem que ter. Tem que ter alguém para comandar. Não
adianta! Porque uma empresa se não tiver um bom diretor, um bom
supervisor, o que acontece com ela? Então eu acho assim, que todos se
empenham ao máximo. Eu observo isso lá na Diretoria de Ensino, que há
muito estudo deles. Há um empenho muito grande, e que os professores
não são capazes de enxergar. Então eles acham que tudo fica muito bonito
no papel. Porque a realidade é outra! Mas eles podem fazer com que aquilo
que está bonito no papel fique bonito também na sala de aula, e eu acho
que isso, que há possibilidade disso, começando por não serem tão
resistentes. Por serem sempre do contra, porque há pessoas que são
sempre contrárias a tudo. Porque alguém fala pra eles fazerem e eles não
querem fazer, entendeu? Então numa empresa, o chefe pode ser o cara
mais bacana que existe, mais ele é o chefe, então ele é chato, porque ele é
chefe, porque ele quer que você faça desse jeito o serviço, entendeu?
(Relato de um professor coordenador)

Finalizamos o capítulo, concordando e valendo-nos de Gaulejac (2014) sobre


o seu entendimento a respeito da gestão gerencialista. Segundo o autor:

A gestão gerencialista é uma mistura não só de regras racionais, de


prescrições precisas, de instrumentos de medidas sofisticados, de técnicas
de avaliação objetivas, mas também de regras irracionais, de prescrições
irrealistas, de painéis de bordo inexplicáveis e de julgamentos arbitrários.
Por trás da irracionalidade fria e “objetiva” dos números dissimula-se um
projeto “quantofrênico” (a obsessão do número) que faz os homens
perderem o senso da medida.
Essa ideologia suscita muitas resistências e desilusões. Ela provoca
reações contraditórias. [...] o poder gerencialista mobiliza a psique sobre os
objetivos de produção. [...] Ele encerra os indivíduos em um sistema
paradoxal que os leva a uma submissão livremente consentida. (p. 41 e 42)
106

CAPÍTULO 6 – O PROFESSOR COORDENADOR E A FORMAÇÃO


DE SUA IDENTIDADE PROFISSIONAL

Pudemos observar nos trabalhos de Ciampa (1996), Berger e Luckmann


(2013), Capitão e Heloani (2007) e de Enriquez (1974), que suas análises
coadunam-se com as pesquisas de Oliveira (2008, 2007) e de Ball (2005, 2002) ao
tratarem sobre questões relacionadas à formação da identidade do docente no
contexto das reformas educacionais, demonstrando em seus estudos a relação entre
a organização do trabalho e a formação da identidade profissional.

Em suas análises, Oliveira e Ball trazem evidências de que as reformas


educacionais fazem uso de mecanismos tácitos no intento de manipular a
subjetividade dos docentes através da forma como organizam o seu trabalho.

Segundo Ball (2002, p. 3):

[...] as tecnologias políticas da reforma da educação não são simplesmente


veículos para a mudança técnica e estrutural das organizações, mas
também mecanismos para “reformar” professores e para mudar o que
significa ser professor. A reforma não muda apenas o que nós fazemos,
muda também quem nós somos – a nossa “identidade social”.

Já Oliveira (2008, p. 30), expressa sua preocupação com esse processo


identitário demonstrando que:

Agora, o trabalho docente deve contemplar as atividades em sala de aula,


as reuniões pedagógicas, a participação na gestão da escola, o
planejamento pedagógico, dentre outras atividades. Esse quadro tem
resultado na significativa intensificação do trabalho e precarização das
relações de emprego, em mudanças que repercutem sobre a identidade e
profissão docente.

A proposição de que é preciso haver uma flexibilização e um imediatismo no


trabalho docente, pode, pouco a pouco, gerar um sentimento de insegurança diante
do seu trabalho, uma vez que o docente pode vir a não saber ou não compreender
se o que está fazendo é o suficiente, se está certo ou errado, se pode ou não fazer
isto ou aquilo.
107

A responsabilização pelas metas, a competitividade, as bonificações, o


desempenho diante dos colegas, a mensuração do seu ‘ser’, todas essas questões
vão formatando a compreensão que o docente tem de si e dos outros, constituindo e
construindo a sua identidade profissional.

“[...] os professores são representados e encorajados a reflectir sobre si


próprios como indivíduos, que fazem cálculos sobre si próprios,
“acrescentam valor” a si próprios, aumentam a sua produtividade, vivem
uma existência baseada em cálculos. (Ball, 2002, p. 6)

O que conseguimos observar, tanto nos documentos, quanto nas entrevistas,


sobre a organização do trabalho nas escolas, é a existência de um distanciamento
entre o trabalho racional e o trabalho manual.

Desde o ano de 2008, quando a SEE/SP promoveu a adoção de um currículo


único para todas as escolas da sua rede de ensino, distribuindo para os docentes e
para os estudantes apostilas com conteúdos definidos para cada aula e para cada
bimestre, contendo, em muitas dessas apostilas, avaliações prontas para serem
aplicadas em sala de aula, que esse distanciamento vem se evidenciando.

Segundo os manuais e nas palavras dos entrevistados, ao docente cabe a


execução do que lhe é prescrito. O exercício de reflexão sobre quais conteúdos
precisam ser abordados, as formas que o docente deve utilizar no processo de
ensino e de aprendizagem, o processo avaliativo a ser utilizado, e o tempo em que
esse processo pedagógico deve ocorrer, não são sua responsabilidade. Segundo
revelam os professores coordenadores, o bom docente é aquele que “dá conta do
currículo”, no sentido de não estar atrasado com os conteúdos de sua disciplina.

O conhecimento do docente, nem sempre, ou pouco é considerado


importante nesse processo. Ao professor coordenador cabe o monitoramento das
ações dos docentes em sala de aula. Nas reuniões pedagógicas, conduzidas pelo
professor coordenador, novas alternativas de ensino são discutidas. Contudo, essas
discussões se caracterizam pela prescrição de metodologias para serem aplicadas
em sala de aula, sob a proposição de estarem realizando, ou proporcionando ao
docente, uma formação continuada.

Ao participarmos de uma reunião pedagógica em uma visita a uma escola


pública paulista, nos deparamos com o estudo do texto: Aula nota 10: 49 técnicas
108

para ser um professor campeão de audiência, de autoria de Doug Lemov, editado


pela Fundação Lemann, com consultoria e adequação para a língua portuguesa
feitas por Guiomar Namo de Mello e Paula Louzano. O estudo foi conduzido pelo
professor coordenador que tangia seu entendimento para o encontro de novas
fórmulas de ensinar o conteúdo curricular.

Observamos nessa reunião a ocorrência de uma ação pensada de forma


exógena e não de uma ação reflexiva a partir de estudos e evidências postas pelos
docentes e pelo professor coordenador de maneira democrática, tendo em vista a
realidade da escola.

A Fundação Lemann, instituição sem fins lucrativos, está entre tantas outras
organizações e instituições mantenedoras do movimento “Todos pela Educação 44”.
Essa fundação, diretamente envolvida na participação da reforma educacional
denominada “Educação – Compromisso de São Paulo”, vem promovendo a
publicação das técnicas contidas nesse livro nas redes públicas e privadas de
ensino em todo Brasil45. Propondo a ideia de que, ao aplicarem os conceitos e as
fórmulas existentes no livro em sala de aula, todos os estudantes obterão sucesso
em seu aprendizado.

Em recém trabalho publicado intitulado: “Movimento Todos Pela Educação:


um projeto de nação para a educação brasileira 46”, a autora Erika Moreira Martins,
em suas análises, demonstra as evidências da movimentação entre indivíduos do
setor industrial e do setor econômico em cargos políticos, assumindo posições
estratégicas através de cargos e comissões, orientando e articulando decisões sobre
as políticas e programas que compõe as reformas na educação, imprimindo
interesses privados na escola pública.

Ainda sobre a reunião, ficou em evidência a condução do professor


coordenador, prescrevendo ao grupo um modelo sobre ‘o que’ e ‘como’ se deve

44
Detalhes do programa disponível em: http://www.todospelaeducacao.org.br/. Acesso em:
10/05/2014.
45
Vide documento de apresentação para implementação das técnicas, disponível em:
http://www.fundacaolemann.org.br/uploads/estudos/lemov_interior_maio_2011.pdf. Acesso em:
10/05/2014.
46
Dissertação de Mestrado defendida no ano de 2013. Disponível em:
http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000915751. Acesso em: 14/08/2015.
109

proceder em sala de aula para ser um ‘professor campeão’, imputando-lhe um novo


predicado. Ouvimos frases de motivação e indução sobre o material apresentado:
“Para que sua aula seja ‘nota 10’, basta o docente decorar as 49 técnicas existentes
no livro e acrescentá-las às situações de aprendizagem contidas no currículo”;
“Seguindo a receita, vocês terão sucesso na aplicação do currículo em sala de aula”.

Melhor na opinião de quem? Melhor pra quem ou para o quê? E se não


funcionar? E se os alunos não aprenderem? Provavelmente a culpa não será
creditada ao método, e sim à quem o aplicou. Visto que, na lógica do mercado, se
utiliza o jargão: o cliente47 tem sempre razão.

Também observamos nessa reunião a ocorrência de um processo sofístico,


através de uma liderança que conduzia o estudo: o professor coordenador. Naquele
momento tivemos a oportunidade de observar o professor coordenador assumindo o
seu predicado de gerente, de gestor. De observarmos sua postura diante dos
docentes, desenvolvendo estratégias na promoção de alianças e consensos entre o
grupo, no intuito de viabilizar e justificar a importância daquele momento e do estudo
que se realizava.

Segundo Capitão e Heloani (2007, p. 53) “nosso ideal de ego é muito


variável”, ou seja, o indivíduo é muito vulnerável a novos modelos de identificação, e
em identificar-se no ‘outro’ e idealizar um modelo ideal para si. Essa vulnerabilidade
se dá de acordo com a relação que o indivíduo tem com o meio e consigo mesmo.
Para esses autores, dentro de um determinado grupo existem indivíduos que
apresentam diferentes graus de intensidade acerca de suas exigências para consigo
mesmo. Uns são pouco exigentes e críticos, em contrapartida, outros se apresentam
mais entusiastas e exigentes para com suas conquistas. Ocorre que, nesse último
caso, há a possibilidade de crescimento no grupo. Caso não haja situações que
barrem esse crescimento, um ou outro indivíduo pode vir a ter um posicionamento
mais evidente, tornando-se mais incisivo em suas opiniões. O indivíduo, ao sentir-se
confiante, disposto a enfrentar toda e qualquer situação a ele posta:

substitui o seu ideal de ego por um outro objeto, o líder [...] e identifica-se
com os outros membros, por terem eles também substituído o seu ideal de

47
Na reunião que presenciamos e na fala dos professores coordenadores durante as entrevistas, os
estudantes eram constantemente chamados de clientela.
110

ego pelo mesmo objeto. Assim, os ideais do grupo passam a ser o ideal do
sujeito e o sujeito não mede esforços para cumprir com as exigências do
grupo, que, passaram, também a ser suas. (Capitão e Heloani, 2007, p. 53)

Compreendemos que ao se apresentar como uma liderança, o professor


coordenador pode vir a assumir, como na reunião, a responsabilidade de encontrar
um meio para que os docentes superem as dificuldades que possuem ao
desenvolverem suas práticas pedagógicas na sala de aula. O professor coordenador
em uma dual preocupação, ora com os docentes, ora com o sistema, promove uma
busca por uma solução imediata e pragmática para tal anseio.

Contudo, mesmo em um ambiente onde deveria ocorrer uma reciprocidade de


confiança, a solução pode ou não se concretizar da capacidade do grupo ou do líder
em debater uma melhor solução para a superação de um problema. Ela pode vir
através de uma prescrição, um livro ou manual ou através de outra ferramenta
pretenciosa (vídeos, aulas prontas na internet, outros), na intenção de homogeneizar
a prática docente, padronizando-na.

Desta feita, num grupo a pessoa do líder não diz “olha eu sou a parte
idealizada, vocês passarão a admirar-me, como Deus, como alguém que
vocês gostariam de ser”. Nesses casos, tudo acontece de forma de maneira
sub-reptícia, quase que imperceptível, baseada no fenômeno da
identificação. No caso dos grupos, o líder, normalmente, é aquele que foi
eleito e tem uma certa autonomia de ação que o restante não possui; mas,
por ser a figura que substitui o ideal de todos, faz com que todos se
identifiquem, a partir de seu ideal, uns com os outros. (Capitão e Heloani,
2007, p. 54)

Na extração de um trecho de uma de nossas entrevistas, notamos uma


postura “heroica” do professor coordenador. Ao adentrar uma sala de aula, diante
dos estudantes e docente, ele veio a promover um ambiente de paz e tranquilidade.
Contudo, esse ambiente considerado “ideal” ao desenvolvimento do processo de
ensino e aprendizagem, silencioso e inócuo, ocorreu através de um movimento, ou
de uma expressão, que nós interpretamos como opressora. Ou seja, de alguma
maneira, a presença do professor coordenador intimidou docente e estudantes em
sala de aula, a ponto de conseguir com que todos ficassem quietos para que o
docente reproduzisse o conhecimento prescrito. E esse último assim o fez.

- E esse pessoal que bate de frente. É aquele pessoal que não quer assumir
o currículo?(Entrevistador)

- Não. Até que trabalham o currículo, entendeu? Ele não tem é habilidade
para segurar o aluno na sala de aula. E, quando eu vou lá, eles adoram.
111

Porque eu assisto a aula e porque os alunos ficam quietos. Mas se eu saio


da sala, eles falam que não aguentam os alunos. Então, sei lá, uma postura
do professor, eu acho, entendeu? E está difícil corrigir esta postura. A
maioria dos professores são complicados. (Relato de um professor
coordenador)

Freire (2010) afirma que a prescrição constitui elemento básico em uma


relação que venha a se configurar como mediadora entre opressor-oprimido. O autor
considera a prescrição como uma imposição de “uma consciência a outra” (p. 37),
alienando o outro na medida em que esse deixa de reconhecer suas ações como
próprias, ou seja, o ‘eu’ se sobrepõe ao ‘outro’ no comando de suas ações,
prescrevendo um determinado comportamento, mesmo que esse comportamento
venha a causar certa estranheza no ‘outro’.

Os oprimidos, que introjetam a “sombra” dos opressores e seguem suas


pautas, temem a liberdade, na medida em que esta, implicando a expulsão
desta sombra, exigiria deles que “preenchessem” o “vazio” deixado pela
expulsão com outro “conteúdo” – o de sua autonomia. O de sua
responsabilidade, sem o que não seriam livres. A liberdade, que é uma
conquista, e não uma doação, exige permanente busca. Busca permanente
que só existe no ato responsável de quem faz. Ninguém tem liberdade para
ser livre: pelo contrário, luta por ela precisamente porque não a tem. Não é
também a liberdade um ponto ideal, fora dos homens, ao qual inclusive,
eles se alienam. Não é ideia que se faça mito. É condição indispensável ao
movimento de busca eu que estão inscritos os homens como seres
inconclusos. (Freire, 2010, p. 37)

6.1. Identidade Profissional

Entendemos que a identidade de um indivíduo se constrói pela interação do


‘eu’ com o ‘outro’ em um determinado contexto social ou grupo social, sustentada
pelas expectativas a respeito do que cada um tem sobre os seus papeis a serem
desempenhados. A identidade se forma mediante a interação das especificidades
constituintes em cada contexto ou grupo (familiar, profissional, amigos, escolar,
religioso, entre outros). Portanto, não existe uma identidade, mas sim identidades.

Defendemos que a identidade profissional é um processo no qual o indivíduo


se constrói enquanto profissional balizado pelos saberes inerentes à sua profissão
112

(adquiridos durante sua formação acadêmica) e a sua função (adquiridos ao exercer


a sua profissão).

Ao analisarmos o trabalho do professor coordenador, observamos que sua


formação acadêmica não se relaciona com às atribuições exigidas pela sua função.
Ou, quando vem a se relacionar, é de forma mínima. Isto porque sua formação
acadêmica não se alinha ao rol de atribuições que lhe é proposto.

O que pudemos observar é que a profissionalização do professor


coordenador ocorre exclusivamente em serviço.

[...] hoje eu falo que faço um trabalho legal na coordenação, que é a


formação do professor mesmo! Mais, antigamente, no início da minha
coordenação, acho que eu pequei muito, falhei muito [...] (Relato de um
professor coordenador há 8 anos na função)

Sua principal tarefa é o de garantir a qualidade do processo de ensino dentro


da escola. Para tanto, segundo afirma Davis (2012, p. 16-17), esse profissional “se
vê obrigado a seguir as determinações políticas assumidas pelo governo federal,
estadual ou municipal”.

Segundo consta no Caderno do Gestor Volume 01:

Com apoio em modernas teorias que explicam o desenvolvimento humano


e a aprendizagem, espera-se que o Professor Coordenador possa
compreender a realidade do processo de ensino-aprendizagem e seus
desafios e orientar-se, considerando as relações que afetam o desempenho
dos alunos – seja dentro das salas de aula e da escola, seja entre a escola
e a comunidade – e os dilemas atuais relativos ao ideal de cidadania
responsável e seus correlatos: a formação moral, política e social. (Murrie,
2008, p. 09)

Entretanto, destacamos que os saberes aplicados na cotidianidade do


trabalho do professor coordenador estão relacionados às diretrizes das políticas e
programas educacionais vigentes que compõe o processo de reforma educacional.
De acordo com tais diretrizes, ele direciona a execução de seu trabalho.

Bom, o que toma meu maior tempo é assistir aula, porque a gente vai na
sala de aula, assiste a aula, e eu não faço direto na planilha. Eu registro
numa folha, caderno, ai depois eu vou lá na planilha para encaixar certinho
os objetivos, o que o professor deu. Se os conteúdos estavam corretos [...]
e depois eu tenho que sentar com o professor para estar orientando [...]
responder documentação para a diretoria. Vira e mexe eles estão mexendo,
pedindo. Mandam e-mail pedindo documentação. Que nem agora, sábado
nós vamos ter que trabalhar, e o e-mail chegou ontem à noite, hoje de
manhã (quinta-feira) tive que trabalhar em cima do que eles queriam: uma
113

planilha do que iria fazer no sábado [...] era pra ser o dia na escola do meu
filho, mas eles mudaram e agora veio uma outra orientação. (Relato de um
professor coordenador)

A primeira coisa que eu faço é ver os e-mails da Diretoria de Ensino, pra ver
se tem alguma informação importante, as publicações. O que é da área
pedagógica vai ser encaminhado para os professores [...] Ai nós temos o
nosso horário, nós temos um calendário de acompanhamento de aulas,
principalmente nas disciplinas de português e matemática [...] eu
acompanho as aulas para ver se o professor está seguindo realmente o
currículo. Observo a metodologia utilizada pelos professores. Assim que ele
terminar uma situação de aprendizagem, aí nós damos a devolutiva [...] já
aconteceu este ano que eu precisei sentar com ele pra montar uma aula,
para ensiná-lo a planejar a sua aula, entendeu? Porque a professora não
estava se saindo muito bem. (Relato de um professor coordenador)

Porém, levantamos a hipótese de que na relação que o professor


coordenador vem a estabelecer com as suas atribuições, é provável que ele possa
vir a aderir ou não a elas. Nesse caso, é preciso considerar as interações existentes
e o permanente jogo de forças empreendido na escola.

Sob essa ótica, o professor coordenador encontra-se exposto a múltiplas


influências: ora ao que lhe é atribuído pela legislação e pelos órgãos centrais
(SEE/SP; Diretoria de Ensino), ora pelo que lhe é atribuído pelo e no contexto
escolar e, ora pelo o que ele próprio prioriza para si. Nesse sentido compreendemos
que a identidade profissional do professor coordenador está sempre em movimento,
compondo e se recompondo, transformando e sendo transformada.

Esse constante movimento, pode vir a formar uma identidade profissional


fragmentada, que está sempre tendo que se adaptar aos anseios do sistema. De
acordo com Capitão e Heloani (2007) as condições de trabalho podem produzir
sofrimento ou possibilitar satisfação. “Este sofrimento ocorre quando a relação
homem-trabalho é bloqueada, isto é, quando alguém não consegue realizar sua
tarefa consoante suas necessidades e desejos psicológicos” (p. 55). Já a satisfação
pode ocorrer quando o trabalho traz a possibilidade de “uma satisfação sublimatória,
contanto que seja livremente organizado ou escolhido, desembocando, assim, em
prazer e saúde mental” (p.55).

De acordo com os dados apresentados no “Relatório dos Estudos do


SARESP de 2013”, dos 9.769 professores coordenadores participantes do relatório,
85,7%, ou seja, 8.372 professores coordenadores estavam exercendo no ano de
114

2013 a função entre menos de 01 ano e 08 anos. Os outros 14,3%, ou seja, 1.397
professores coordenadores exerciam suas funções entre 09 e 20 anos ou mais.

Tabela 6

Professores coordenadores, por tempo de exercício na função (em %)


Há quantos anos você exerce esse cargo/função? %
Menos de 01 ano 27,5
De 01 a 02 anos 18,0
De 03 a 05 anos 26,5
De 06 a 08 anos 13,7
De 09 a 10 anos 3,9
De 11 a 15 anos 6,2
De 16 a 20 anos 3,2
Mais de 20 anos 1,1
Total 100,0
Fonte: São Paulo, 2014, p. 225.

Observamos que essas constantes movimentações no trabalho, nas funções


e atribuições, podem gerar uma crise da identidade profissional. Segundo Esteve
(1991)48 apud Martins (2011, p. 14) “o despreparo dos professores para o
enfrentamento dessas mudanças tem gerado o que ele denomina mal-estar
docente”. Martins (2011, p. 15) complementa afirmando que “como consequência, o
mal-estar docente gera uma crise de identidade nos professores e os conduz a
diferentes reações”.

48
ESTEVE, J. M. (1991). Mudanças sociais e função docente. In: NÒVOA, A. (org.) Profissão
professor. Lisboa, Porto editora, pp. 93-124.
115

CAPÍTULO 7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A busca pela qualidade da educação se fez sempre presente nas proposições


das diversas reformas educacionais pelas quais a educação pública paulista passou.
Entretanto, desde meados dos anos de 1990, a qualidade da educação passou a
ocupar um lugar de destaque nas reformas educacionais, orientando e conduzindo
as políticas e os programas educacionais que, a partir desse momento, passou a
pautar-se na gestão gerencialista como modelo para a administração educacional.

Reconhecendo o sucesso ou o fracasso mediante resultados métricos por


meio de indicadores de desempenho, a gestão pública gerencial não somente
promoveu a qualidade da educação em sua Política, como veio a utilizar-se do
campo educacional para alavancar e promover uma Reforma Política em todo país
e, principalmente, no Estado de São Paulo. Isso devido às estreitas relações entre
os indivíduos que ocupavam cargos e funções estratégicas no governo federal e no
governo paulista.

Com a apresentação do “Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado”,


no ano de 1995, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, as
proposições de uma nova concepção de gestão pública começam delimitar o
caminho pelo qual as políticas públicas, entre elas as educacionais, seriam
orientadas.

Almejava-se um Estado gerencial voltado para o controle dos resultados e


com certo nível de descentralização que chegasse até ao cidadão. Nesse
sentido, o grande desafio seria garantir e ampliar a governança do Estado
brasileiro mediante um ajuste fiscal duradouro, reformas econômicas
orientadas para o mercado e a inovação dos instrumentos de política social.
No documento ficou evidenciada a relação entre o ajuste fiscal e a
implementação de políticas públicas, pois, mediante a privatização e a
transferência de alguns serviços públicos estatais para o setor público não-
estatal, o Estado poderia reduzir o seu papel de executor ou prestador
direto de serviços, passando a assumir apenas o papel de regulador e
coordenador político. (Editorial, 2015, p. 589)

Esse novo papel conferido ao Estado não se restringiu ao Brasil. Países


como: Chile, Canadá, Inglaterra, França, Espanha, Noruega, para citar alguns,
116

também desenvolveram reformas educacionais, aplicando no setor público o modelo


de gestão gerencialista utilizado pelo setor privado. O que não significa que um
mesmo modelo foi utilizado na elaboração e na execução da reforma educacional
em todos esses países. Segundo Verger e Normand (2015, p. 600), a nova gestão
pública “no es un modelo de reforma educativa monolítico ni adopta la misma forma
en todos los lugares; más bien, se puede concretar en enfoques de gobernanza y en
diseños de políticas educativas bien diferenciados49”.

No Estado de São Paulo, envolto pelas reformas educacionais e pelos


princípios da gestão gerencialista, processos como o de descentralização do poder e
de autonomia às escolas proporcionaram uma maior responsabilização pela
qualidade da educação à elas, ao mesmo tempo em que se foi promovendo a
desresponsabilização do Estado por essa qualidade.

Como regulador das políticas públicas aplicadas à educação, o Estado de


São Paulo empenhou-se em realizar diversas parcerias público-privada, colocando
uma nova rota para a aplicação do dinheiro público: as empresas privadas.

Segundo Araújo (2010)50 apud Terto e Pereira (2011, p. 03):

Constituem ideias centrais da Nova Gestão pública um Estado


administrativo ao estilo da iniciativa privada; contratos de gestão entre
unidades; avaliação de desempenho; ênfase em resultados; redução do
poder da burocracia; focalização na eficiência; busca de mecanismos
regulatórios; introdução sistemática de conceitos de produtividade;
flexibilidade; competitividade administrada; participação dos agentes sociais
e controle dos resultados; foco no cidadão, orçamento e avaliação por
resultados e performance; fortalecimento e aumento da autonomia da
burocracia; descentralização na formulação e execução de políticas e por
fim maior autonomia às unidades executoras.

Pudemos averiguar, nessa pesquisa, que em decorrência das reformas


educacionais e orientada pelas ideias da gestão gerencialista, foram incorporadas
alterações na forma e no conteúdo do trabalho pedagógico na escola pública
paulista. A organização do trabalho docente passou a ser orientada pelos resultados
obtidos em avaliações externas (SARESP, Prova Brasil, ENEM) e por indicadores

49
Tradução livre do pesquisador: “não é um modelo de reforma educativa fechada nem adota a
mesma forma em todos os lugares; em vez disso, pode se configurar em abordagens de governança
e em desenhos de políticas educacionais bem diferentes”.
50
ARAÚJO, Maria Arlete Duarte. Responsabilização da administração pública: limites e possibilidades
do gestor público. In: Construindo uma Nova Gestão Pública. Coletânea de textos do I Ciclo de
Palestra organizado pela Escola de Governo do RN. Natal, RN: SEARH/RN, 2010.
117

numéricos de qualidade (IDESP, IDEB), desencadeando um processo concorrencial


entre as escolas e entre os que nela trabalham. Essa competitividade nem sempre
fica evidente, visto que, muitas vezes essa disputa se mostrou, em nossas
entrevistas, amortizada pelos ideais solidários de um trabalho realizado em equipe,
onde a culpabilidade ou o sucesso passam a ser atribuídos ao grupo.

Entretanto, também nos ficou claro que o ranqueamento entre as escolas, o


estabelecimento de metas, a busca pela superação dessas metas e por uma melhor
classificação, vieram a favorecer o surgimento e/ou o aprimoramento de
mecanismos de controle e de monitoramento do trabalho pedagógico na escola,
promovendo uma cultura balizada pela performatividade.

Segundo Ball (2005, p. 544):

A performatividade é alcançada mediante a construção e publicação de


informações e de indicadores, além de outras realizações e materiais
institucionais de caráter promocional, como mecanismos para estimular,
julgar e comparar profissionais em termos de resultados: a tendência para
nomear, diferenciar e classificar.

O autor também escreve que:

A performatividade atinge profundamente a percepção do eu e de nosso


próprio valor. Coloca em pauta uma dimensão emocional, apesar da
aparência de racionalidade e objetividade. Assim, nossas respostas ao fluxo
de informações a respeito do desempenho podem engendrar nos indivíduos
sentimentos de orgulho, culpa, vergonha e inveja. (Ball, 2005, p. 550)

É nesse cenário recortado por políticas e pelos programas educacionais, por


indicadores e metas, por interesses pessoais e coletivos, e pelas singularidades de
cada indivíduo que o trabalho do professor coordenador vem se concretizando
dentro da escola.

Ficou evidenciado, em nosso estudo, que a principal atividade do professor


coordenador dentro da escola está centralizada na formação dos docentes em
serviço. Seja na preparação e no estudo do material a ser exposto nas ATPCs ou
quando ele está em sala de aula observando o trabalho docente.

Também ficou claro que o professor coordenador compreende que a


importância do seu trabalho encontra-se em ajudar o docente em sua formação.
Sobre o trabalho em sala de aula, ele entende que o docente necessita estar
118

“preparado para dar aulas”. Nesse sentido, o professor coordenador acredita que
somente a formação acadêmica do docente não lhe é suficiente para o ensino, e que
“a formação dele vai ser dentro da sala de aula, porque ele chegou lá só com o
certificado”.

Todavia, o que observamos durante toda pesquisa é a existência de uma


ajuda prescritiva aos docentes. O que poderia vir a se configurar em uma ajuda
compartilhada e desvinculada das prescrições elaboradas pela SEE/SP, onde os
saberes do docente e do professor coordenador coadunassem em um movimento
recíproco, democrático e dialético, na verdade assume uma dimensão pouco
democrática e participativa, tendo em vista que essa ajuda balizada por documentos
e orientações técnicas é pensada por pessoas distantes da realidade da escola.

As exigências e o monitoramento do que deve ser ensinado, de que como


está sendo ensinado, se está sendo bem ensinado e se tudo está no tempo
considerado como ideal, assumem uma conotação de ajuda. O professor
coordenador afirma que “o currículo deve e precisa ser cumprido”, com vistas em um
melhor rendimento dos estudantes no SARESP e, consequentemente, obter uma
evolução no IDESP, melhorando a qualidade da escola.

Contudo, compreendemos que o trabalho do professor coordenador não se


limita ao monitoramento das atividades docentes em sala de aula. Ele mesmo diz
que “faz de tudo um pouco” na escola.

Notamos que seu trabalho é ampliado ao atendimento de estudantes e de


pais, ao resolver casos de indisciplina, ao promover consensos e amenizar conflitos,
ao organizar e distribuir materiais didáticos, e, por vezes, ao assumir a
responsabilidade pela direção da escola.

Em uma das conversas, o entrevistado revelou ter deixado de lecionar em


uma escola particular à pedido do Diretor de Escola onde exerce a função de
professor coordenador porque ele “exigiu” total disponibilidade à escola. Ao mesmo
tempo em que ele expressa, em outros momentos da conversa, que o Diretor de
Escola não o obriga a fazer nada, e que tudo é decidido em equipe.
119

Quanto a organização do seu trabalho, observamos uma ambivalência em


suas funções. Ora ela se apresenta de forma rígida e previsível, com cronogramas
de ações, agendas e horários específicos para reuniões com os docentes e para
estudos individuais ou em grupo; ora ela se apresenta imprevisível e flexível, à
revelia dos programas e projetos que os órgãos centrais (SEE/SP e Diretoria de
Ensino) enviam, tendo que cumprir as ordens e/ou orientações para que ações
sejam executadas, muitas vezes, em curtos prazos.

Evidenciamos que somente a formação acadêmica inicial do docente que


ocupa a função de professor coordenador nem sempre é o suficiente para subsidiá-
lo no cotidiano de seu trabalho. Por muitas vezes nos foi relatado uma sensação de
não saber o que deve ser feito e o de não achar o caminho para concretizar suas
ações.

A formação do professor coordenador, enquanto profissional, se concretiza


durante a realização do seu trabalho. Entretanto, observamos que essa construção
ocorre de forma prescritiva, proporcionando-lhe pouco espaço para que realizações
e/ou ações próprias se materializem no cotidiano de seu trabalho. Os estudos, as
ações, as ideias, as discussões circunscrevem e se limitam às proposições contidas
no contexto das reformas educacionais.

Dessa forma, o espaço político para publicização de ideias se reduz a um


momento em que os indivíduos podem até reclamar e/ou não concordar com as
proposições que lhes são postas, contudo, é necessário cumpri-las.

Logo, tendo em vista que o trabalho do professor coordenador precisa estar


sempre se ajustando às concepções de ensino, ao contexto das reformas
educacionais e as condições inerentes ao seu ambiente de trabalho, sua identidade
profissional tende a se caracterizar de forma frágil e fragmentada.

Segundo Oliveira (2008, p. 35-36):

Os trabalhadores passam a buscar alternativas de ocupação e,


consequentemente, de formação, para se adaptarem às novas exigências.
Esse caráter flexível das ocupações chega à escola de duas formas: no
objeto dos docentes (eles terão que adequar seu trabalho às exigências
atuais, já que formam a força de trabalho para esse mundo em mudança) e
na organização do seu próprio trabalho (que também tende a adotar cada
120

vez mais o caráter de maior flexibilidade e autonomia que o trabalho em


geral assume).

Verificamos que há uma preocupação dos professores coordenadores em


buscar cursos na tentativa de diminuir as lacunas existentes entre a sua formação
acadêmica e a realização de seu trabalho.

Contudo, essa constante busca por formação, o contínuo processo de


adaptabilidade aos condicionantes internos (escola) e externos (SEE/SP; Diretoria
de Ensino) e a interação entre os indivíduos dentro da escola (expectativas,
singularidades, interesses), formam um conjunto de fatores que são constituintes e
construtores de uma identidade.

Compreendemos que nem sempre os mesmos indivíduos estão na escola. De


tempos em tempos ocorrem mudanças dos indivíduos que caracterizam o grupo de
docentes na escola. Diversos fatores contribuem para que ocorra essa rotatividade
de docentes: licenças, afastamentos, contratos temporários, aposentadorias,
transferências, entre outros. Portanto, a composição do grupo, por ser dinâmica,
tende a configurar as relações interpessoais estabelecidas por esse grupo, na
escola, de maneira frágil.

Como já exposto no capítulo 4, uma identidade se constitui e se constrói na


interação com outros indivíduos. Confluem-se as expectativas, as singularidades e
especificidades de cada indivíduo, caracterizando, assim, o grupo. Logo, o indivíduo
vem a participar, ao longo de sua existência, de vários grupos, portanto, compondo
identidades.

Assim, a identidade é posta e reposta continuamente, pois o indivíduo


vivencia ao mesmo tempo vários papéis, o que o torna um personagem da
vida, que sempre se metamorfoseia de acordo com as condições históricas
e sociais a que está submetido. (Silva, 2009, p. 188-189)

O trabalho do professor coordenador efetiva-se pelo contato direto com os


docentes que lecionam na escola, assim, a todo momento, novos indivíduos
permeiam o seu cotidiano. Docentes substitutos e/ou eventuais estão sempre se
movimentado por entre o grupo mais antigo e efetivo de docentes. Condicionando e
sendo condicionado por esses novos integrantes, novas singularidades e
particularidades podem surgir no grupo.
121

Interpretamos esse movimento sob dois prismas. Ao mesmo tempo em que o


grupo pode vir a se fortalecer pela inserção de novas ideias, de novas energias,
configurando-se em um espaço dinâmico e plural. O grupo pode vir a se fechar entre
os mais antigos, criando uma redoma, excluindo a participação dos mais novos,
vindo a promover mecanismos de cooptação, anulando toda e qualquer
manifestação que lhes seja contrária ou que venha a desestabilizar o grupo.

Defendemos, com base em nossos achados durante a realização desse


estudo, que em decorrência da forma como o trabalho do professor coordenador
está organizado e pelas interações interpessoais que são partilhadas no espaço
escolar, há a possibilidade do professor coordenador, enquanto profissional, ser
constituído por identidades profissionais.

Nesse estudo, o professor coordenador, ao manifestar-se, ao se expor no


mundo, pôde nos revelar algumas singularidades de seu trabalho, expressando a
compreensão que tem de seu posicionamento no grupo ao qual pertence. Logo,
compreendemos que a linguagem, carregada de uma carga de conceitos que o
indivíduo produz a respeito de si e do outro, acabou por expressar a verdadeira
essência de seu ser.

Não foi nossa intenção, nesse estudo, realizar um juízo de valor sobre o
trabalho do professor coordenador, visto que buscamos compreender e levantar
questões sobre a formação da identidade de um indivíduo e não julgá-lo por sua
ação, vindo a considerá-la como falsa ou verdadeira, ou mesmo, como boa ou má.

Portanto, o que transpareceu pela linguagem nesse estudo foram


compreensões e interpretações de um determinado momento, em uma determinada
circunstância, em uma determinada realidade.

Tendo em vista a complexidade na qual o objeto dessa pesquisa se localiza,


não damos por concluída ou esgotada a temática abordada. Quiçá que nossas
conclusões configurem-se como estanques. Questões relacionadas à compreensão
de como o ‘outro’ observa, entende e interpreta o trabalho do professor coordenador
na escola precisam ser aprofundadas.
122

Ao finalizar esse estudo, ao mesmo tempo em que fomos envolvidos pelo


sentimento de dever cumprido, ao verificarmos que as proposições que
impulsionaram essa pesquisa puderam ser expostas e respondidas, constatamos
uma abertura à novas proposições acerca do objeto dessa pesquisa. O que vem a
nutrir o desejo de ampliar os horizontes e as discussões sobre a temática abordada.
123

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jul.-set. 2015.
127

ANEXOS
128

ANEXO I – Carta convite enviada por e-mail


129

ANEXO II – Termo de consentimento livre e esclarecido


TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado Sr(a),

Você está sendo convidado a participar de uma pesquisa que tem por objetivo estudar o trabalho do docente
designado para a função de professor coordenador na rede pública estadual de ensino paulista.

Sua participação envolve conceder uma entrevista, que será gravada, com duração de aproximadamente 40
(quarenta) minutos.

Sua participação é muito importante e voluntária. Você não terá nenhum gasto e também não receberá nenhum
pagamento por participar desse estudo.

As informações obtidas nesse estudo serão confidenciais, sendo assegurado o sigilo sobre sua participação. Sua
identidade será mantida no mais rigoroso anonimato, sendo omitidas todas as informações que permitam
identificá-lo(a), quando da apresentação dos resultados em publicação científica ou educativa, uma vez que os
resultados serão sempre apresentados como retrato de um grupo e não de uma pessoa.

Você poderá se recusar a participar ou a responder algumas das questões a qualquer momento, não havendo
nenhum prejuízo pessoal se esta for a sua decisão.

Mesmo não tendo benefícios diretos em participar desta pesquisa, indiretamente você contribuirá para a
compreensão do fenômeno estudado e para a produção de conhecimento científico.

Você receberá uma cópia deste termo no qual constam o telefone e o endereço eletrônico do pesquisador
responsável, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento.

Dou meu consentimento de livre e espontânea vontade para participar deste estudo.

____________________________ ____________________________________ ____/_____/2015


Nome do participante (em letra de Assinatura do participante Data
forma)

Obrigado pela sua colaboração e por merecer sua confiança.


_____________________________________
Mestrando/Pesquisador: Rodrigo Luis Rigueto
Registro Acadêmico: 133872
R.G.: 26.263.819-8

Profa. Dra. Ivany Rodrigues Pino


Orientadora
Presidente do Centro de Estudos Educação e Sociedade – CEDES/UNICAMP - http://cedes.preface.com.br/
Quaisquer dúvidas relativas à pesquisa poderão ser esclarecidas pelo Mestrando/Pesquisador Rodrigo Luis Rigueto através do telefone (16)
99754-2626, e do email: rrigueto@hotmail.com. Endereço Eletrônico do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil – CNPq:
http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/2165174087004845. Endereço eletrônico do GPPE-UNICAMP: http://www.fe.unicamp.br/gppe/.
130

ANEXO III – Roteiro da entrevista


ROTEIRO DE ENTREVISTA
identificação (caráter censitário)
 Nome
 Idade
 Tempo de trabalho na SEE/SP
 Formação acadêmica
 Forma de contrato - efetivo ou categoria F (esta questão poderá ser utilizada para
compreender possíveis relações de mando ou subordinação que por acaso apareçam na
fala do entrevistado).

- Qual(is) foi(ram) o(s) motivo(s) que o(a) levou(levaram) a assumir a função de professor
coordenador? Como se deu esse processo? Foi uma escolha sua?

- Quais expectativas surgiram quando foi designado(a) para essa função? Como você situa
este momento na sua vida?

- Gostaria que você relatasse as atividades (tarefas/atribuição) que costuma fazer no seu dia a
dia, em sua rotina de trabalho como professor coordenador.

- Qual(is) atividade(s) (tarefa/atribuição) que você realiza no seu dia a dia, que caracteriza(m)
o seu trabalho como professor coordenador?

- Você acredita que esta(s) atividade (tarefa/atribuição), que você acabou de se referir,
identifica(m) você como professor coordenador para os outros profissionais que compõem o
espaço escolar onde você trabalha, tais como: Prof. Coord. do Núcleo Pedagóg., Docentes,
Diretor, Vice-Diretor, Supervisor de Ensino, Alunos? (Você acredita que eles compreendem
essa atividade como sendo própria do trabalho do professor coordenador? [--pausa--] Há
outras atividades atribuídas a você, que você não considera como sendo próprias do seu
trabalho e que você gostaria de relatar?)

- Como você acredita que as pessoas da escola (docentes, diretor, vice-diretor, funcionários,
alunos) te percebem? É desta maneira que você gostaria de ser percebido(a)/visto(a) como
profissional, como professor coordenador? [--pausa--] (Se não é desta maneira, como
gostaria de ser percebido/visto pelos outros na escola?)

- Você vivencia situações de conflito no seu trabalho? [--pausa--] Você poderia relatar
algumas destas situações? Como você lida com elas?

- Você tem autonomia na realização do seu trabalho? [--pausa--] (Em que situações você
percebe esta autonomia ou a falta dela?)

- Como você compreende o que é a qualidade na educação?

- Como professor coordenador, você se sente responsável por esta qualidade? [--pausa--]
(Porque você sente esta responsabilidade ou porque não sente?)

- Você participa de algum tipo formação em serviço? Seja em forma de treinamentos; cursos
131

de curta ou longa duração; presencial ou on-line; oferecidos ou não pela Secretaria de


Educação de SP?

- Como se dá a escolha por esses cursos? Qual a expectativa ou motivo por fazê-los?

- Neste tempo trabalhando como professor coordenador, qual(is) a(s) atividade(s) que
foi(ram) realizada(s) por você que você considera/entende como importantes? E qual(is) você
considera que não foi(ram) importante(s)?

- Você pretende continuar trabalhando na função de professor coordenador? [--pausa--] (O


que o motiva permanecer ou não permanecer nesta função?)

- Você gostaria de dizer mais alguma coisa que não lhe foi perguntado?
132

ANEXO IV – Bibliografia para a prova de certificação para professor


coordenador
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ensino de história para o ensino fundamental Ciclo II e ensino médio. São Paulo: SE, 2008.

SÃO PAULO (Estado) Secretaria da Educação. Proposta curricular do Estado de São Paulo para o
ensino de filosofia para o ensino médio. São Paulo: SE, 2008.

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ensino de geografia para o ensino fundamental Ciclo II e ensino médio. São Paulo: SE, 2008

SÃO PAULO (Estado) Secretaria da Educação. Proposta curricular do Estado de São Paulo para o
ensino de arte para o ensino fundamental Ciclo II e ensino médio. São Paulo: SE, 2008.

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SÃO PAULO (Estado) Secretaria da Educação. Proposta curricular do Estado de São Paulo para o
ensino de ciências para o ensino fundamental Ciclo II. São Paulo: SE, 2008.

SÃO PAULO (Estado) Secretaria da Educação. Proposta curricular do Estado de São Paulo para o
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ensino de química para o ensino médio. São Paulo: SE, 2008.

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134

ANEXO V – História em quadrinhos apresentada no curso MGME


135
136

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