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Muitas são as imagens da Virgem Maria no Antigo Testamento, que nos ajudam
a compreender o Novo Testamento e o desígnio salvífico do Pai. Essas imagens
de Maria nas Sagradas Escrituras têm seu ponto mais alto na identificação de
Nossa Senhora com Sião, Templo santo (cf. Sl 2, 6), Jerusalém, cidade santa,
terra de Judá, Povo de Israel (Is 40, 9; Jr 31, 12; Zc 9, 13), Povo de Deus (Is 60,
14). Algumas mulheres gloriosas do Antigo Testamento também são imagens da
Virgem Maria, que nos ajudam a compreender a sua missão na obra da salvação
de seu Filho Jesus Cristo.
A identificação de Sião como imagem de Maria (cf. Is, 12, 6; 51, 3; 59, 20; 60,
14; Sf 3, 16), que põe em relação o Antigo Testamento e o Novo Testamento, é
mais do que uma construção histórica, através da qual são ligados promessa e
cumprimento. A Virgem Maria é Sião em pessoa, pois ela vive a totalidade do
que é significado por Sião. Nossa Senhora vive de tal maneira que é permeável a
Deus, habitável pela divindade, torna-se casa de Deus. Esta identificação entre
Sião e Maria “é realidade espiritual, vida vivida a partir do espírito da Sagrada
Escritura; é um estar radicada na fé dos patriarcas e simultaneamente dilatada
pela altura e amplidão das promessas vindouras” (Joseph Ratzinger, Maria, a
primeira Igreja, p. 65).
EVA, mãe do género humano: Maria, mãe da nova raça purificada do pecado,
Rainha de todos os eleitos, Mãe do inocente e verdadeiro Abel, traído e
imolado. Como Eva colaborou com Adão na desobediência a Deus, para a ruína
do género humano, assim Maria, Nova Eva, colaborou com Cristo, Novo Adão,
na obediência a Deus, para a redenção do género humano.
SARA, esposa estéril de Abraão, que concebeu por milagre de Deus; Maria foi
maravilhosamente ainda mais fecunda do que ela, Mãe do verdadeiro Isaque, do
filho único que carregou o instrumento no qual foi imolado.
REBECA, que brilhava com todos os dons da natureza, imperfeitamente figura a
beleza incomparável de Maria, na ordem da graça.
RAQUEL, mãe do justo José, vendido pelos irmãos; Maria, Mãe do inocente
Jesus, também traído e vendido.
Débora contribui para a vitória e para a libertação do Povo de Deus (cf. Jz 4; 5).
“Maria, com sua proteção, livra seus devotos do jugo do Demônio e das paixões
e lhes garante a vitória completa” (André Damino, Na Escola de Maria, p. 25).
Cheia de confiança no auxílio do Senhor, Judite expôs a sua vida para libertar o
seu povo (cf. Jud 13, 1-12). Como esta heroína, “a Virgem de Nazaré sacrificou
toda a existência em benefício do gênero humano; conservou-se imaculada,
quando a corrupção imperava no mundo; enganou o Demônio, escondendo,
sob as aparências de um casamento comum, a Encarnação do Verbo; esmagou a
serpente sedutora e afugentou, no decorrer dos séculos, a milícia infernal que
perseguia a Igreja e o povo cristão” (André Damino, Na Escola de Maria, p. 28).
“Da mesma forma que Eva se deixou seduzir para desobedecer a Deus, Maria se
deixou persuadir a obedecer a Deus para ser ela a Virgem Maria a advogada de
Eva, de sorte que o gênero humano, submetido à morte por uma virgem, fosse
dela libertado por uma Virgem, tornando-se contrabalançada a desobediência de
uma Virgem pela obediência de outra”
A Eva (= Mãe da vida, em hebraico) de Gn 3,15 inicia uma tarefa que só foi
plenamente realizada por Maria, pois o texto sagrado no diz que Eva foi
pecadora ou esteve sob o domínio da Serpente; ao contrário Maria que foi
“cheia de graça” e nunca se dobrou sob o jugo do Maligno; ao contrário
colaborou para a vitória sobre ele. Com outras palavras: assim como Gn 3,2-7
apresenta a mulher (Eva) envolvida com o Tentador e o pecado para a ruína do
gênero humano, assim Gn 3,15 apresenta a mulher (Eva feita Mãe da Vida por
excelência ou Eva plenamente realizada em Maria) intimamente associada ao
Messias na obra de Redenção do gênero humano. Assim a mulher (Eva, Mãe da
Vida), que introduziu o pecado no mundo, será também a introdutora da
Salvação ou do Salvador no mundo. O papel de Eva é recapitulado por Maria.
Note-se o paralelismo antitético: Eva é portadora da desobediência e da morte;
Maria, ao contrário, traz a fé e a alegria. Importante no texto é a observação:
Deus quis resolver o impasse oriundo do pecado mediante os elementos mesmos
que introduziram o pecado: o anjo (mau) falou à mulher infiel a Deus, o anjo
Gabriel falou à mulher fiel a Deus; no primeiro caso, a mulher colabora para a
morte; no segundo caso, a mulher (a nova Eva, a verdadeira Mãe da Vida)
colabora para a vida.
“Sabei que o Senhor mesmo vos dará um sinal: Eis que a jovem concebeu e dará
à luz um filho, e pôr-lhe-á o nome de Emanuel”.
Foi então que Deus enviou o profeta Isaías ao rei Acaz, para lembrar-lhe a
“política da fé” ou a necessidade de confiar na Providência Divina: “Não temas
nem te acovardes... Se não crerdes, não subsistireis” (Is 7,4-9). A fé devi ser o
fundamento da existência do povo de Deus; este havia de se apoiar na palavra
de Deus. Quem é Emanuel de Is 7,14? Há quem veja nele o rei Ezequias, filho de
Acaz. Todavia este não preenche o título “Deus conosco”. Isaías tem em vista,
mediata ou imediatamente, o Messias. Este, sim, é a garantia de que dinastia de
Davi não será destronada; por causa do Messias, prometido a Davi e à sua
descendência, é que Acaz não será desapossado da realeza; a casa de Acaz (que é
casa de Davi) deverá permanecer incólume, porque a ela foi prometido o
Messias como descendente de Davi. Esta interpretação confirmada pela
consideração de Is 9,5s, onde aparece um Menino-Mesias, que tem predicados
divinos:
“Um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado. Traz o cetro do principado
e se chama Conselheiro Admirável, Deus Forte, Pai Eterno, Príncipe da Paz. O
seu glorioso principado e a paz não terão fim, no trono de Davi e no seu reino,
firmando-o e consolidando-o sobre o direito e sobre a justiça” (Is 9,5s).
Quem é a “almah” de Is 7,14? Com que fundamento se pode dizer que é virgem?
Há quem veja nela a esposa do rei Acaz, mãe de Ezequias. Acontece, porém, que
jamais na Bíblia a palavra almah designa uma mulher casada ou jovem que tenha
perdido a virgindade. A expectativa do futuro Rei Messiânico em Israel estivesse
associada a figura honrosa da Mãe do Messias, a referência à venerável Mãe do
Messias é muito consentânea com os costumes das cortes orientais. O profeta
terá escolhido o vocábulo amah de preferência a betulah, a fim de realçar a
juventude da mãe do Messias, juventude que betuah não indica necessariamente.
Mas ainda sobre Miquéias 5,1 qual seria o pano de fundo deste texto? Chama a
atenção a construção da frase de Miquéias: em vez de dizer simplesmente que
virá o Grande Rei, o profeta escreve “até o momento em que dará à luz aquela
que deve dar à luz.” Por que essa referência especial à Mãe do Emanuel
mencionada em Is 7,14; essa Mãe já era conhecida dos contemporâneos de
Miquéias através da pregação de Isaías; eis por que ela estaria em primeiro plano
no vasto quadro da profecia messiânica, segundo Miquéias. Tal interpretação é
plausível. O profeta supõe Israel humilhado por seus inimigos. A humilhação,
porém, não é definitiva. Na pequena cidade de Belém aquela que deve dar à
luz, dará à luz um soberano cheio do poder de Javé, que dará início à paz
messiânica. Por que Mq 5,1s fala da mãe do Rei prometido? Para se entender o
nexo existente entre o Rei Messias e sua Mãe, convém lembrar que a rainha-mãe
gozava de especial veneração nas cortes do Oriente antigo: na Assíria, na
Babilônia, na Fenícia, no Egito... No Antigo Testamento rainha-mãe era chamada
gebirah, isto é, mãe do Senhor ou Grande Dama; 1Rs 15,13; 2Rs 10,13; Jr 13,18;
29,2. O nome da rainha-mãe é freqüentemente mencionado pelo autor dos
livros dos Reis: 1Rs 14,21; 15,2-10; 22,42; 2Rs 8,26; 12,2; 15,2-3.
Mas porque ainda se aplicam a Maria SS. os textos de Pr 8 e Eclo 24? Os livros
dos Provérbios e do Eclesiástico personificam a sabedoria. Dir-se-ia que os
respectivos autores não a conceberam como simples atributos de Deus, mas
como pessoa que assistiu a Deus na obra da criação. A liturgia aplica estes textos
a Maria SS.., como se fosse ela mesma que fala ou que é apresentada nos textos
citados. É o que se chama uma adaptação legítima do texto bíblico.
Uma outra relação com Maria Santíssima é entre ela e a Cidade Santa de
Jerusalém. Mas o que encontramos ao analisarmos esse paralelo? Comum na
Liturgia das festas de Nossa Senhora rezarem-se os “salmos de Sion” ou salmos
que louvam a cidade de Jerusalém (Sl 46.48.87...). A razão deste uso é quer a
cidade santa é considerada mãe do povo israelita ou mesmo mãe de todos os
povos (S. Paulo fala da Jerusalém celeste, que é nossa mãe, em Gl 4,26). Aliás, o
livro do Apocalipse funde entre si os conceitos de Esposa, Mãe e Cidade.
“vi descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, uma Jerusalém nova,
pronta como esposa que se enfeitou para o seu esposo” (Ap 21,2). “um dos sete
anjos... desse-me: vem! Vou mostrar-te a Esposa, a mulher do Cordeiro! Ele
então me arrebatou em espírito sobre um grande e alto monte, e mostrou-me a
Cidade Santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus” (Ap 21,9s). Ora, a
Mãe de Deus e Mãe dos homens têm afinidade com a Jerusalém celeste, esposa e
mãe, segundo a linguagem bíblica. Daí aplicarem-se a Maria os louvores que
tocam a Jerusalém, segundo a praxe litúrgica católica.