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MARIOLOGIA

INTRODUÇÃO

A misericórdia divina resplandece na Encarnação do Verbo e em toda a sua obra salvífica. Só Cristo,
perfeito Deus e perfeito homem, é mediador perfeito entre Deus e os homens, capaz de unir nEle, Deus com
os homens e os homens com Deus. Ele é o único Mediador, segundo a conhecida expressão de São Paulo:
“Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, o Homem Cristo Jesus” (Tm 2,5). Mas
Jesus Cristo não é um “mediador solitário”. Assim como Deus é o único Bom (Mt 19,17), mas torna
participante da sua bondade todas as suas criaturas em diferentes graus e modos, assim também quis tornar
os homens participantes da sua mediação. Jesus Cristo é o único Redentor. Mas não é menos certo que quis
associar todos os homens a tomarem parte ativa na sua obra salvífica (LG 60).

Jesus Cristo quis unir a Virgem Maria, sua Mãe por obra do Espírito Santo, ao seu ser e à sua missão
de Homem Salvador. De tal maneira que, na atual Economia da Redenção, já não se pode entender
cabalmente a salvação realizada por Cristo, sem a singular presença ativa da Virgem Maria, Mãe de Deus e
nossa Mãe, adornada pelo Criador com privilégios extraordinários, que aqui vamos resumir.

Ela não nos pode afastar de Cristo de maneira nenhuma. Pelo contrário, “na história do mundo
ninguém foi mais cristocêntrico, mais “cristóforo” (portador de Cristo) do que ela”.

Economia da Salvação

A palavra Economia vem da junção de duas palavras gregas: oikos (que significa casa) e nomia (que
significa lei). Economia, literalmente, quer dizer a Lei da Casa, como se gere, se cuida e se leva avante uma
casa, um patrimônio, etc.

A expressão Economia da Salvação parece-nos hoje estranha, é verdade. Esta expressão foi usada em
toda a história da Igreja, sobretudo a partir de um teólogo do séc. III, Santo Irineu de Lyon, para falar de
toda a história de Salvação que Deus escreveu e construiu com a Humanidade. A Economia da Salvação é
o Projeto de Amor que o nosso Deus sonhou e construiu, sonha e constrói com a Humanidade que é a
sua casa!

A Economia da Salvação é este Caminho que Deus percorre com a Humanidade à medida que
esta vai amadurecendo e crescendo na sua história. O Espírito Santo de Deus vai-lhe convidando e
inspirando a viver em Aliança, e todo o caminho do povo Israel é essa consciência e revelação progressiva
de que Deus quer fazer uma Aliança com o Homem. Abraão, Isaac, Jacó, Moisés, David, os Profetas…

E nem o pecado, que é a recusa a viver em Aliança e comunhão com Deus e com os irmãos, faz com
que Deus desista… “Quando chegou a Plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho…” diz o Apóstolo
Paulo na carta aos Gálatas. Com o Sim de Jesus de Nazaré, o Ungido pelo Espírito, que “passou fazendo o
bem, curando e libertando, porque Deus estava com ele” (At 10, 38), Deus-Pai dá o pleno Sim: e na
Ressurreição de Jesus inaugura-se plenamente a Aliança entre Deus e o Homem, Aliança de Salvação,
Aliança de Ressurreição e Comunhão eterna e plena no seio do Pai… “Eis a morada de Deus entre os
homens: habitará com eles, eles serão o seu povo e o próprio Deus estará com eles…” (Ap 21, 3).

“O que vimos e ouvimos vô-lo anunciamos também a vós…” (1Jo 1, 3). A Economia da Salvação é
este caminho de Aliança que Deus continua a construir, hoje, com a Humanidade e com cada um de
nós, Aliança que nos conduz sempre a Jesus. É a revelação e a descoberta do seu Rosto e do seu Projeto,
que é sempre um caminho, uma história… Hoje continua esta Economia da Salvação que Deus escreve
conosco e que abraça toda a história da Humanidade! Nela está inserida a Virgem Maria. Diz-nos o
Catecismo que a “Anunciação a Maria inaugura a “plenitude dos tempos”, isto é, o cumprimento das
promessas e das preparações” (CEC 484).
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Cultos prestados na Igreja Católica:

Latria, do grego (λατρεια, “latreia” que significa “adorar”), latria é um termo teológico que significa
o culto de adoração devida e dada somente a Deus, ou seja, à Santíssima Trindade. É o culto que se deve
somente a Deus e consiste em reconhecer nele a divindade, prestando uma homenagem absoluta e suprema,
como criador e redentor dos homens. Ou seja, reconhecer que ele é o Senhor de todas as coisas e criador de
todos nós, etc.

Dulia (do grego δουλεια, “douleia” que significa “honrar”), é um termo teológico que significa a
honra e o culto de veneração devotados aos santos. (como amigos de Deus)

Hiperdulia (do grego υπερδουλεια é um termo teológico utilizado pelas Igrejas Católica e Ortodoxa
que significa a honra e o culto de veneração especial devotados a Nossa Senhora como Mãe de Deus.

Este culto à Nossa Senhora é feito através da liturgia, em maior intensidade, através da piedade
Popular. Destacam-se as devoções feitas à Virgem Maria, como por exemplo, o Santo Rosário, o Ângelus, a
devoção ao Imaculado Coração de Maria, a peregrinação aos lugares onde Maria apareceu, as procissões,
etc.

COMUNHÃO DOS SANTOS

Comunhão dos Santos (em latim , Communio Sanctorum) é a união espiritual de todos os cristãos
vivos e mortos, aqueles na terra, no céu e, no purgatório. Eles formam juntos um único corpo místico, e cuja
cabeça é o próprio Jesus Cristo.

A palavra “sanctorum” na frase “communio sanctorum” também pode referir-se não apenas às
pessoas santas, mas também para as “coisas santas”, ou seja, as bênçãos que as pessoas santas partilham
umas com as outras, incluindo a sua fé, os sacramentos e as outras graças e dons espirituais que têm como
cristãos.

História e Conceito

O termo é incluído no Credo dos Apóstolos, uma grande profissão da fé cristã cuja forma atual foi
atingida no século VIII, mas que teve origem em torno do ano 100, sendo a base da declaração de fé da
Igreja. A crença em um elo místico que unia tanto os cristãos vivos e os mortos em esperança e amor é
confirmada já no século IV por São Nicetas de Remesiana (335-414); o termo desde então tem
desempenhado um papel central nas formulações do credo cristão.

A doutrina da Comunhão dos Santos é baseada em 1 Cor 12, onde São Paulo compara os cristãos e a
Igreja a um único organismo. “Santos” refere-se aos cristãos como indivíduos, independentemente da sua
santidade pessoal, sendo assim chamados, porque eles são consagrados a Deus e à Cristo. O uso da palavra
“santo” encontra-se cerca de cinquenta vezes no Novo Testamento. A alegação de que todos os cristãos
estão em comunhão com Cristo, e são beneficiários de todos os seus dons é citado em Romanos 8,32, 1 Cor
6,17 e 1 João 1,3.

A comunhão dos santos compreende três estágios espirituais diferentes:

• “Igreja militante”, formada pelos “peregrinos na terra” que não têm nenhum pecado mortal cuja culpa
ainda não foi perdoada.

• “Igreja padecente”, “composta pelas almas que ainda padecem no Purgatório “e que, por isso, necessitam
das nossas “orações de sufrágio, em particular o Sacrifício Eucarístico, mas também das nossas esmolas,
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indulgências e obras de penitência” (ex: sacrifícios e boas obras), para acelerar a sua purificação e posterior
entrada no Céu.

• “Igreja triunfante”, formada pelos habitantes do Céu, que alcançaram a eterna e definitiva santidade e
perfeição.

Todos os membros destas “3 Igrejas” podem interceder e ajudarem-se mutuamente, através de


orações, boas obras, sacrifícios e indulgências.

A COOPERAÇÃO DE MARIA NA OBRA REDENTORA


MARIA ASSOCIADA AO SEU FILHO NA REDENÇÃO DO MUNDO

A maternidade de Maria em relação a Jesus Redentor não foi meramente biológica. Maria não foi
mera espectadora da obra de salvação do mundo, mas prestou a esta uma cooperação ativa: “Maria
respondeu ao mensageiro celeste: „Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra‟ (Lc
1,38). Consagrou-se totalmente, como serva do Senhor, à pessoa e obra de seu Filho servindo sob Ele e com
Ele, por graça de Deus Onipotente, ao mistério da Redenção. Os Santos Padres julgam que Deus não se
serviu de Maria como instrumento meramente passivo, mas julgam que cooperou para a salvação humana
com livre fé e obediência” (Lúmen Gentium, 56).

Como definir mais precisamente a cooperação ativa de Maria na obra da salvação na Comunhão dos Santos?

a) Em relação ao seu Filho viandante na terra, Maria exerceu uma colaboração ativa, não no sentido de haver
concorrido diretamente para obter-nos as graças da Redenção, como se fosse um segundo princípio redentor
ao lado de seu Filho. Maria é criatura remida por Cristo;

b) Maria coopera atualmente, após sua glorificação celeste, para a aplicação dos frutos da Redenção aos
homens na qualidade de intercessora materna. Maria foi remida de modo excepcionalmente fecundo não em
proveito dela mesmo apenas, mas a fim de desempenhar uma função própria na aplicação da salvação;

c) Toda a cooperação de Maria é subordinada a Cristo. Maria só tem valor no plano do Pai por causa de
Cristo. Nunca a veneraríamos se não fosse em vista de Cristo; a autêntica piedade mariana é formulada nos
seguintes termos: “O cristão deve procurar ser, para Maria, um outro Jesus”. O objetivo primeiro do cristão é
configurar-se a Cristo, o primogênito entre muitos irmãos, como diz São Paulo em Rm 8, 9. E quanto mais o
cristão se configura a Cristo, tanto mais ele deve se ver filho de Maria. Para o cristão nada é anterior a
Cristo.

CO-REDENTORA

No século X entrou em uso o termo Redemptrix (Redentora) aplicado a Maria SSma. A partir do
Século XV os teólogos preferiam dizer “Co-Redentora”, título este que se foi propagando. Cabe ressaltar
que nenhum documento de índole magisterial na Igreja usou a palavra Co-Redentora. Ela aparece, porém,
em textos de importância subalterna, tais como:

1. Em 1908 em uma petição do Superior dos Servos de Maria sobre a festa das Sete Dores de Maria, onde
cita o termo Co-Redentora;

2. Em 1913 alguns cristãos pedindo indulgências sobre uma saudação que incluísse o nome de Maria, pedem
em nome da Co-Redentora;

3. Em 1914 a Congregação para o Santo Ofício concedeu indulgência a quem recitasse uma oração que
mencionava a Co-Redentora do gênero humano. Notamos que tais citações sobre o título “Co-Redentora” é
de quem o solicitou e não do Magistério da Igreja.
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4. O Papa Pio XI usou tal título na oração de encerramento do Ano da Redenção em 1933. E, depois de Pio
XI, nenhum Papa recorreu à controvertida expressão. Bons teólogos foram evidenciando a ambigüidade dos
títulos de “Co-Redentora” e “Medianeira”, e os maus entendidos que podiam suscitar.

A Teologia hoje recusa o uso dos dois termos referidos (não porque sejam errôneos, mas porque
passíveis de má interpretação), embora reconheça que Maria foi associada à obra do Redentor e é
cooperadora da Redenção.

QUATRO MOMENTOS IMPORTANTES

A cooperação de Maria com o Redentor caracterizou toda a sua existência desde a Anunciação do
Anjo. Na Anunciação (Lc 1,26-38), o Sim de Maria é uma aceitação na colaboração em toda a obra da
reconciliação da humanidade com Deus. Maria mostra-se disposta para o serviço que Deus lhe pede;

Nas Bodas de Caná (Jo 2,1-12), Maria, com a sua intervenção suscita também a fé dos discípulos. A
fé de Maria está na origem do sinal que Jesus realizou, e prepara os discípulos para acolher a manifestação
da sua glória e crer nele. A vida de Maria está claramente orientada para o serviço do Filho de Deus e de sua
missão;

O seguimento de Jesus na Cruz por Maria, a coloca no plano salvífico que levaria Jesus à morte de
cruz. Assim, a Virgem não sofreu em favor dela mesma, sofreu em favor de nós, como Mãe de todos;

A Missão de Maria nos inícios da Igreja

O livro dos Atos dos Apóstolos refere que Maria acompanhava os apóstolos no Cenáculo, rezando
com eles na expectativa do Espírito Santo. Mesmo após a Ascensão do Filho, Ela continuava presente na
Igreja prolongando sua missão de intercessora.

A MATERNIDADE ORANTE DE MARIA

O papel de Maria glorificada em relação à Igreja ou aos membros que Jesus Cristo associa ao seu
Corpo Místico através dos séculos.

SOLIDARIEDADE OU COMUNHÃO

1Tm 2,5: “só existe um Mediador entre Deus e os homens, o homem Cristo Jesus, que se deu em
resgate por todos” – Verificamos que desde o AT Deus quis chamar homens e mulheres, a virem ser
“mediadores” para a salvação destinada a todo o povo. O título mediador foi aplicado: a Moisés, Abraão,
Judite, Ester. Os levitas, que ofereciam o sacrifício pelo povo e pediam para este a Bênção do Senhor; os
profetas, portadores da Palavra de Deus e intercessores em favor do povo.

No NT, os cristãos são chamados a interceder uns pelos outros (1Tm 2,1-4), a fim de que cheguem
ao conhecimento da verdade e se salvem; Deus quer salvar uns mediante outros; é por efeito da mediação
sacerdotal e única de Cristo que o cristão pode fazer algo em prol do seu irmão. O Senhor exerce sua
mediação servindo-se daqueles que Ele livremente quer associar à sua obra em favor dos homens.

É sobre este pano de fundo que se coloca a intercessão materna ou medianeira de Maria em favor dos
homens peregrinos.

A INTERCESSÃO DA MÃE

A função de intercessora, que cabe a todo cristão em prol dos seus irmãos, toca a Maria de modo
especial, pois ela ocupa um lugar único na Comunhão dos Santos; é a Mãe do Redentor. Mãe de toda a
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humanidade, que Jesus lhe confiou pouco antes de morrer (Jo 19,25-27). Como toda mãe na família
desempenha uma função peculiar. Maria a desempenha na Igreja. O fundamento dessa função é a relação de
Maria com Jesus, relação que não se limita ao indivíduo Jesus Cristo, mas se estende ao Cristo total (cabeça
e membros do Corpo Místico, Cristo e Igreja).

Lumen Gentium, 60: “A materna missão de Maria em favor dos homens de modo nenhum obscurece
ou diminui a mediação única de Cristo, mas até manifesta a sua eficácia. Com efeito, todo o salutar influxo
da Bem-aventurada Virgem em favor dos homens...se origina do divino beneplácito. Decorre dos
superabundantes méritos de Cristo, repousa na mediação de Cristo; dela depende inteiramente e dela tira a
sua força. De modo nenhum impede, mas até favorece, a união imediata dos fiéis com Cristo”.

Se durante a sua vida mortal Maria teve como missão cuidar de Jesus, guia-lo e orientá-lo,
atualmente este cuidado se volta, de maneira própria ao seu próprio estado de glorificado, em favor do resto
do Cristo total, ou seja, em favor dos membros do Corpo Místico de Cristo que ainda peregrinam na terra.
Por isto a Igreja a interpela como intercessora ou como Maternidade Orante e a contempla a imagem da
consumação que esperamos alcançar.

A MEDIANEIRA DO TODAS AS GRAÇAS

Desde os primeiros tempos, a Igreja invocou Maria como intercessora. No século III se proferia esta
oração: “À vossa proteção recorremos Santa Mãe de Deus; não desprezeis as nossas súplicas, em nossas
necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos, Virgem gloriosa e bendita”.

Também as imagens da Virgem (século VI), a representam com mãos estendidas na posição de
orante e advogada do gênero humano. Aqui começa a aparecer o título “Medianeira”. No século XII também
aparece este título com muita evidência, mas somente no século XVII se elaborou a doutrina. E no século
XX, os teólogos se dedicaram a aprofundar o sentido de tal expressão mariológica.

Em 1921, o Cardeal Desiré Mercier, arcebispo de Malines (Bélgica), com colaboração de diversos
teólogos e liturgistas da Universidade de Louvain, com apoio do episcopado Belga, pede a Santa Sé a
promulgação do dogma “Maria Medianeira de todas as graças”. Em 1922 o Papa Bento XV concedeu a
celebração do Ofício Litúrgico e da Missa da Medianeira a todas as dioceses da Bélgica e a todas as outras
dioceses que a solicitassem; todavia não se pronunciou sob a petição dogmática. Idêntica atitude reservada
foi assumida pelos Papas seguintes: Pio XI e Pio XII, embora se avolumasse a produção teológica em livros
e artigos favoráveis ao título de Medianeira. A este se associava o título de Co-Redentora, suscitando
oposição calorosa da parte dos protestantes, que viam nos dois títulos uma derrogação ao Sacerdócio de
Jesus Cristo.

Na fase preparatória do Concílio Vaticano II (1962-65), trezentas petições foram dirigidas à Santa
Sé, solicitando a definição universal de Maria por parte do Concílio, que não quis tomar posição, os padres
conciliares e seus teólogos viam claramente que tanto o título de “Medianeira de todas as graças” quanto o
de “Co-Redentora” eram ambíguos e podiam suscitar mal-entendidos entre os fiéis católicos, assim como
distanciamento dos protestantes, que o Concílio queria aproximar da Igreja católica. A piedade mariana na
primeira metade do século XX tendia a exageros ou afirmações pouco fundamentadas na Escritura Sagrada e
na Tradição.

O que nos diz a Lúmen Gentium, 62: “A maternidade de Maria na dispensação da graça perdura
ininterruptamente a partir do consentimento que ela fielmente prestou na Anunciação, que sob a Cruz ela
resolutamente manteve e manterá até a perpétua consumação de todos os eleitos... a Bem-aventurada
Virgem Maria é invocada na Igreja sob os títulos de Advogada, Auxiliadora, Protetora, Medianeira. Isto,
porém, se entende de tal modo que nada derrogue, nada acrescente à dignidade e eficácia de Cristo, o único
Mediador. Com efeito; nenhuma criatura jamais pode ser colocada no mesmo plano com o Verbo Encarnado
e Redentor. Mas, como o sacerdócio de Cristo é participado de vários modos seja pelos ministros, seja pelo
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povo fiel, e como a indivisa bondade de Deus é realmente difundida nas criaturas de maneiras diversas,
assim também a única mediação do Redentor não exclui, mas suscita nas criaturas uma variegada
cooperação, que participa de uma única fonte. A Igreja recomenda ao coração dos fiéis para que,
encorajados por esta maternal proteção, mais intimamente dêem sua adesão ao Mediador e Salvador”.

A função materna e intercessora de Maria, portanto, não decorre de alguma insuficiência da obra
salvífica de Cristo, nem é algo de necessário por causa de alguma pretensa limitação dos méritos de Cristo.
Mais: a mediação de Maria em favor dos homens recobre a fase da história que vai da Assunção até o fim
dos tempos. Não se estende a época anterior a Cristo nem atinge a redenção ou salvação dos seres humanos.
A expressão “Medianeira de todas as graças” ou “Medianeira Universal” é atualmente posta de lado pelos
teólogos, pois poderia insinuar uma indevida aproximação de Maria a Jesus Cristo.

A mediação de Maria é reconhecida pela Igreja em vista de duas grandes intenções:

a) O ecumenismo: Todos os fiéis cristãos supliquem instantaneamente à Mãe de Deus e Mãe dos homens,
para que ela, que com suas preces esteve presente às primícias da Igreja interceda junto a seu Filho, até que
todas as famílias dos povos, tanto os cristãos, como os que ignoram o seu Salvador, sejam oportunamente
congregadas na paz e concórdia, no único povo de Deus, para a glória da Santíssima e indivisa Trindade
(Lúmen Gentium, 69);

b) A nova evangelização. São Paulo VI: “Na manhã de Pentecostes Maria presidiu, em oração, o iniciar-se
da evangelização sob a ação do Espírito Santo; seja ela a estrela da evangelização sempre renovada, que a
Igreja, obediente ao mandato do Senhor, deve promover e realizar, sobretudo nestes tempos difíceis, mas
cheios de esperança”. (Evangelii Nuntiandi,82).

OS DOGMAS MARIANOS –

- MATERNIDADE DIVINA- A maternidade divina é o meio escolhido por Deus para realizar o
mistério da salvação. Por que Deus quis este meio? (Gl 4,4 – Gn 2,7).

Deus quis salvar a humanidade a partir de dentro, tomando-se irmão e não apenas um estrangeiro.
Jesus, assim, torna-se o Mediador perfeito (é homem e Deus - liga perfeitamente Deus e o homem). A partir
daí entende-se que a missão fundamental de Maria é unir Deus à humanidade; seu maior privilégio, portanto,
é a Divina Maternidade. A graça da Maternidade Divina não é dada primeiro a Maria para sua perfeição, seu
engrandecimento..., mas para que a salvação do mundo fosse operada a partir de dentro.

Assim a humanidade pode (por iniciativa de Deus) colaborar na salvação.

- A Maternidade Divina é uma graça singular, é uma maternidade santa:

a) Por parte de Deus, que realiza em Maria grandes coisas (Lc 1 ,49) propondo e intervindo
miraculosamente (Lc 1,28-35). Sempre que Deus age, tem em vista a santidade:

Lc 1, 35: “O Espírito Santo virá sobre ti


e o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra.
Eis que o SANTO que nascer de ti
será chamado FILHO DE DEUS”.

Repete a vinda de Iaweh sobre a Arca da Aliança – Ex 40,35:


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“A nuvem cobriu com sua sombra o Tabernáculo


e a glória de Deus encheu a morada”.

Nos dois textos, Deus vem em direção ao homem, porém em Maria, o modo de presença é totalmente
novo e qualitativamente diferente: é presença na ordem do SER, enquanto que na Arca é presença na ordem
da ação. Presença na ordem do ser porque Maria é “repleta de graça” (Lc 1, 28).

b) Por parte de Maria, porque Deus dirige sua mensagem a alguém que já é santo: “cheia de graça”.

Além disso, seu estado é santo; ela é virgem (Mt 1,18-23); Lc 1,27) e virgem voluntariamente (Lc
1,34). A virgindade indica o conceito de santidade, enquanto é separação (santo, ágios) das criaturas para
pertencer exclusivamente a Deus.

c) Segundo a causalidade eficiente, porque Maria concebe “do Espírito Santo”.

d) Segundo a causa final; Maria gera o Filho de Deus, é Mãe de Deus. Este sentido é o único que permite
falar com exatidão da Maternidade Divina, que Maria é realmente Mãe de Deus. Maria não é a Mãe da
divindade, mas mãe de um Filho que verdadeiramente é Deus (na espécie humana a maternidade se refere à
pessoa, não ao corpo).

- A Maternidade Divina de Maria a coloca, assim, numa relação única com Deus:

É a mais estreita e mais profunda relação que pode haver entre a criatura e Deus.

Esta relação única é ao mesmo tempo uma relação transformante, pois transforma o ser de Maria: ela
é agora mais digna, mais perfeita do que antes. Isto está insinuado em Lc 1, 35 , com o emprego dos verbos
no futuro: “O Espírito Santo virá sobre ti e o poder do Altíssimo te cobrirá com sua sombra”.

- A Maternidade Divina possui um aspecto social

Por ser Mãe de Jesus, que é a cabeça da Igreja, ela é também Mãe do seu Corpo, a mesma Igreja. Isto
só se realizará na cruz (Jo 19,26s), mas na anunciação já está em gérmen.

Há também um aspecto soteriológico na Maternidade Divina de Maria. Por ser Mãe do Salvador, ela
está associada de modo único à missão de seu Filho (Lc 2,34s; Jo 19,25s).

- O Dogma de Éfeso (431)

A partir de 428 difundiu-se a idéia de que Maria só gerou o corpo de Cristo e não o Verbo. Não
poderia, assim, ser chamada de Mãe de Deus. Tal tese teve seu principal tematizador e propagador em
Nestório, Bispo de Constantinopla. Houve imediata e forte repulsa por parte dos fiéis e de bispos e teólogos,
dentre os quais se destacou Cirilo de Alexandria, que em doze proposições evidenciava os graves erros de tal
colocação (os “Doze Anatematismos”). O cerne do pensamento de S. Cirilo estava em que, por baixo da
negação do título “Mãe de Deus”, havia um erro acerca da estrutura da mesma quanto a Cristo (negação da
união das naturezas na Pessoa do Verbo). Se Maria não é Mãe de Deus, Jesus não é Deus, pois a mãe
humana gera a pessoa. O Papa da época, Celestino I, apóia as colocações de Cirilo como real expressão da fé
na Igreja.

Em 431 reuniu-se em Éfeso um Concílio Ecumênico, que aprovou os anatematismos de Cirilo,


rejeitando as teses de Nestório. Idéias fundamentais deste Concílio:

- preocupação em não dividir o Cristo: unidade de Pessoa;


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- o Verbo não foi gerado por Maria, mas é o término da ação geradora de Maria;

- por isso os Santos Padres. chamaram Maria de THEOTÒKOS.

Fundamentos bíblicos do Dogma de Éfeso;

Gl 4,4: “enviou” supõe a pré-existência do Verbo: alusão ao Filho Eterno do Pai. “nascido de uma
mulher”: esta mulher é sua mãe.

Lc 1, 35: “será chamado Filho de Deus” - será Santo (At 3,14 x Lc 1,15-17) - Santo é Deus.

Rm 9,5: “..., dos quais (os israelitas) procede o Cristo segundo a carne (de Maria), que é, sobre todas
as coisas, Deus bendito pelos séculos”.

- Maria invocada como Mãe

É interessante observar que desde os primeiros tempos os cristãos se dirigiram a Maria com
confiança, invocando-a como Mãe de Deus.

Assim diz a oração mais antiga dirigida à Virgem: “A vossa proteção recorremos, Santa Mãe de
Deus, não desprezeis as nossas súplicas em nossas necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos,
ó Virgem gloriosa e bendita!”

- MARIA, VIRGEM-MÃE

- Profissão de fé

O Credo dos Apóstolos, no texto mais antigo, diz: “que nasceu do Espírito Santo, de Maria Virgem”.
Por que a necessidade de juntar no Credo estas duas verdades?

Isto mostra que a filiação divina de Jesus e a concepção virginal têm uma profunda conexão entre si.

- Dificuldades colocadas ao tema da Virgindade de Maria:

- o pequeno número de textos;

Quanto a este ponto, vemos que o problema não é tão grave.

Os textos de Mt e Lc falam explicitamente da virgindade. Têm, de fato, necessidade disto, pois


apresentam Jesus como filho de Davi. Devem assim mostrar que ele é descendente de Davi: é fruto de uma
intervenção misericordiosa de Deus na história.

João e Paulo, por sua vez, partem da pré-existência do Lógos. Por isso não têm tanto interesse em
mostrar a divindade de Jesus através da concepção virginal.

Além disso, o pequeno número de textos bíblicos se explica também pela própria natureza do
assunto.

A par de todas as observações, poderíamos ainda nos perguntar se de fato Marcos, João e Paulo
silenciam totalmente a concepção virginal de Jesus:

- Mc introduz, em 6,3, uma mudança no texto que ele deve ter encontrado no proto-evangelho de
Mateus:
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Mt (13,55): já falou sobre a virgindade de Maria; repete agora as palavras que o povo disse: “Não é
ele o filho do carpinteiro?”

Mc 6,3: não havia falado sobre a concepção virginal - muda o texto: “Não é ele o carpinteiro, o filho
de Maria?”

Gl 4,4: para um judeu como Paulo, dizer que um homem importante é descendente de uma mulher é
uma humilhação.

Além disso, observe-se a duplicidade de expressões para dizer “nasceu”: gignomai; mais suave =
tomar origem (genómenos); genáo - engendrar - é relativo tanto ao pai quanto à mãe (genétos) – Paulo evita
aqui, utilizar o verbo gígnomais.

- Jo l, 13: há textos antiqüíssimos que trazem a variante: “...O QUAL (ele, singular) não nasceu...”- é
o Cristo.

“não nasceu de sangue” - esta expressão é usada na Bíblia normalmente no singular. João usou o
plural: o Cristo não nasceu de sangues, mas só de Maria.

- Os textos principais do NT que atestam diretamente a Concepção Virginal:

a) Mt 1, 1-17

- 3 x 14 gerações: é filho de Davi (DVD=4+6+4).

- O nascimento de Jesus é o ponto culminante da genealogia: quem gera não é um homem, mas uma mulher.
José é apenas mencionado no sentido jurídico, mas Jesus nasce só de Maria.

Mt 1,23 - cita Is 7,14, interpretando-o, de acordo com a LXX. Baseia-se provavelmente na fé da igreja
daquele tempo.

“Eis que a Virgem conceberá”.

Mt 1,18s: José não tinha como explicar o fato.

Mt 1,25: “e não a conheceu até que ela deu à luz um filho” - redação feita por função do v. 23 (Is 7,14).
Indica que no parto Maria era virgem. Não indica que depois ela teria conhecido, pois o grego éos não tem
esse sentido (até que): não indicava uma mudança da situação. Mesma expressão aparece no AT: Sl 109
(110) e Gn 8, 7; 2Sm 6,23.

b) Lc 1: v.26 - uma virgem

v.34 - a pergunta de Maria.

- A Virgindade Perpétua

Desde remota época, a Igreja professa que Maria é aeiparthénos, sempre virgem. Esta verdade
pertence ao Patrimônio da Fé.
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a) A virgindade no parto:

Após o séc. IV não há mais vozes discordantes. É claramente afirmada em diversas liturgias e
pronunciamentos da Igreja:

• Carta dogmática de S. Leão Magno;

• Conc. Latrão de 649;

• Símbolo do Concílio de Toledo (Dz 282);

• Constituição “Cum Quorundam”, de Paulo IV, 1555;

• Pio XII, na “Munificentissimus Deus” (1950)

Indícios bíblicos: Is 7,14; Lc 2,7; Jo 1,13 (“de sangues”).

b) A virgindade após o parto:

- Possibilidade:

• A intenção de virgindade antes da concepção;

• Sua concepção maravilhosa não seria destruída;

• Aspecto psicológico: a entrega a Deus por Jesus excluía outro interesse.

- Objeções:

• Lc 2,7 - “primogênito” - é o título civil e religioso;

• Mt l ,25 - já estudamos;

• O termo adelphós;

• Os “irmãos” de Jesus.

Quanto ao tema dos “irmãos” de Jesus, a Bíblia mostra que os “irmãos” de Jesus eram seus primos:

• nunca se diz que eram filhos de Maria e de José;

• Mc 6,3: “o filho de Maria”: o uso do artigo definido caracteriza Jesus como filho único.

• Lc 2,41-51: não há menção de outros seus filhos.

• Jo 19,26s - supõe que Maria não tinha outros filhos (embora os “irmãos” de Jesus estivessem com Maria
em At l, 14).

• Pelo menos dois dos “irmãos” de Jesus são colocados como filhos de outra mãe Mc 6, 3: Tiago e José(t)
filhos de outra Maria: Mc 15,40 Judas e Simão.

- Significado teológico da Virgindade Perpétua de Maria:


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- é sinal de intervenção maravilhosa de Deus, que não destrói, mas conserva ao atuar;

- Segundo 1 Cor 7 ,32 , é sinal de consagração indivisa a Deus, não só simbólica, mas real;

- A virgindade de Maria é o sinal da Encarnação: toma mais eloqüente o fato de Jesus ser Filho de Deus e
não ter uma paternidade humana.

- A IMACULADA CONCEIÇÃO

- Introdução

Ao se abordar o tema da Imaculada Conceição de Maria (ou, em outras palavras, da plenitude da


graça que nela existe), é mister não separá-lo do tema da Maternidade Divina, tema fundamental em toda a
Mariologia. Eles não devem ser tratados como se fossem duas realidades justapostas, sem nenhuma conexão
entre si.

A Maternidade Divina significa, em sua essência, a incorporação mais completa a Cristo. Sendo o
efeito formal da graça, no homem, a participação na natureza divina (cf. 2Pd 1,4), a plenitude da graça em
Maria surge como o fruto interior e necessário da Maternidade Divina.

Desse modo, uma maternidade numa linha meramente fisiológica em relação a Cristo, que não fosse
ao mesmo tempo santificante, não teria sentido. Acrescente-se a isso que Maria não concebeu simplesmente
no plano biológico; sua maternidade foi antes de tudo espiritual: “Ela concebeu o Cristo pela fé” (Santo
Agostinho). Assim, na maternidade, Maria gera o Redentor, por sua resposta livre à interpelação de Deus;
acolhe a Redenção. E, por ser este um acolhimento pleno, a mais íntima participação da humanidade em
Cristo, a graça aí deveria também ser plena: Maria deveria ser isenta do pecado original.

“A Maternidade Divina de Maria significa, portanto, a graça concedida em grau máximo.”

“O primeiro efeito desta plenitude da graça e da redenção foi a preservação de Maria do pecado
original.” (Mysterium Salutis, p, 104)

- Desenvolvimento Histórico

Desde o início do Cristianismo houve a associação da idéia da dignidade de Maria pela Maternidade
Divina à da incompatibilidade com todo pecado. Porém, alguns pensadores cristãos discordavam, duvidando
da santidade de Maria e imputando-lhe alguma imperfeição, como o desejo de ostentação, em Caná, ou uma
dúvida de fé, no Calvário. Porém, não se encontra aí a grande vertente da Tradição. São exceções.

Quem virá explicar a Imaculada Conceição é Duns Escoto, com o pensamento de que o ato redentor
de Cristo foi tão perfeito que preservou Maria do pecado. A polêmica, porém, continuava, o que levou o
Concílio de Basiléia, em 1439, a definir que todos deveriam aceitar a doutrina da Imaculada Conceição
como conforme à fé e à Sagrada Escritura. Porém, como na altura desta definição, o Concílio já não tinha
mais a aprovação papal, não se podia falar em dogma definido e a discussão continuou.

Em 1483 Sisto IV proibiu que se tivesse uma ou outra opinião por herética. Trento renova o
pensamento de Sisto IV. Paulo V, no entanto, proíbe que se façam ataques à doutrinada Imaculada
Conceição. Em 1661 Alexandre VII, na Bula “Sollicitudo” afirma a doutrina da Imaculada Conceição quase
nos mesmos termos que serão usados posteriormente por Pio IX. Em 1708 Clemente XI instaura a festa
litúrgica da Conceição (cuja missa e ofício já haviam sido a provados por Sisto IV) para a Igreja Universal.

A definição do Dogma se deu no Pontificado de Pio IX, a 8 de dezembro de 1854 (Bula “Ineffabílis
Deus”):
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“Para honra da santa e indivisa Trindade, para glória e ornamento da Virgem Mãe de Deus, para
exaltação, da fé católica e aumento da religião cristã, por autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-
aventurados apóstolos Pedro e Paulo e pela nossa própria, declaramos, pronunciamos e definimos que a
doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua conceição, por graça
singular e privilégio de Deus onipotente e em atenção aos méritos de Cristo Jesus, Salvador do gênero
humano, foi preservada imune de toda mancha de culpa original, foi revelada por Deus e, por isso, deve ser
crida firmemente e constantemente por todos os fiéis.” (Dz 1641; Ds 2803). A Lumen Gentium repete esta
mesma realidade ao falar da “graça exímia de Maria” (n. 53).

- Explicação Teológica

O cerne da problemática acerca da Imaculada Conceição, ao longo da história, consistiu em que o


Cristo deveria sempre ser colocado como Redentor de todo o gênero humano. Todos necessitam da
salvação, pois todos estão mortos pelo pecado (cf. Rm 5,12-21). A ausência do pecado original em Maria
daria a impressão de que ela não teria precisado de salvação, o que era ir contra a redenção universal
operada na cruz.

O mérito da explicação coube a Duns Escoto. A problemática foi solucionada pelos conceitos
“preservação” e “previsão”: Maria foi preservada do pecado original em previsão dos méritos de Cristo na
Redenção. Como conseqüência, Maria foi preservada também da concupiscência (tendência para o mal).

Segundo o pensamento de Escoto, uma redenção que preserva de cair é “mais perfeita” do que aquela
que salva após a queda. Maria é, assim, redimida de modo “mais perfeito” (“sublimiori modu” - Pio IX).

Maria é, então, a primeira redimida, aquela em quem o pecado original foi plenamente vencido.
Devemos observar que Maria não concebeu primeiramente na ordem biológica, mas na ordem da fé. Ela dá
sua resposta livre, concebe Deus no coração. Esta recepção supõe uma disponibilidade perfeita para receber
o Cristo numa relação maternal pessoal. Por isso, em sua história concreta, Maria deveria ser preparada pela
graça para poder conceber a Jesus. Qualquer pecado seu teria deixado nela uma disposição negativa, que
afetaria a plena disponibilidade para receber Deus.

Além disso, é de se supor que os efeitos da predestinação de Maria para ser Mãe do Salvador,
tivessem ocorrido nos momentos exatos que lhes correspondiam na vida de Maria. Assim, se nela seria
superado o pecado original, é mais admissível que isto se tenha dado no momento da transmissão deste
pecado, ou seja, no momento de sua concepção no seio de sua mãe.

“A preservação do pecado original foi fixada formalmente naquele primeiro instante (Bula
Ineffabilis) em, juntamente com a geração de uma nova natureza humana, esse pecado seria transmitido.”
(Myst. Sal, p,111).

- Fundamentação bíblica na Bula Ineffabilis Deus;

• Gn 3,15: a inimizade entre a serpente e a mulher está em paralelismo com a que há em Cristo e o demônio.
Exclui, portanto, um estado original de pecado em Maria.

• Lc 1,28: kecharitoméne - “cheia de graça”, isto é, a posse estável da graça. Por conseguinte, a graça deve
ser plena (n Vulgata: “gratia plena”); para corresponder à dignidade da Mãe de Deus, deve ser desde o
primeiro instante da vida.

- A Imaculada Conceição e a santidade plena em Maria


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A Imaculada Conceição não é primeiramente algo de negativo (ausência do pecado original), mas
positivo: ela é cheia de graça. Isto implica na exclusão de todo pecado, inclusive do pecado venial, durante
toda a sua vida: santidade perpétua (Trento, Dz 833).

Uma pergunta, porém, a fazer, é se isto implicaria também na ausência da concupiscência. Se Maria
não foi afetada pelo pecado original, teria ela os dons preter-naturais que possuíam os primeiros pais antes
do pecado (imortalidade, integridade...)?

Seria difícil imaginar, convivendo entre os homens, alguém que correspondesse a nossa imagem do
homem do paraíso...

Vemos que todos os homens, devido ao pecado original, nascem desprovidos do dom da integridade,
ao que se denomina concupiscência. Porém a concupiscência não é um castigo meramente externo, como
pode ser a morte (perda do dom da imortalidade). É possível combatê-la vivendo sob a graça, embora em
plenitude isto só venha a acontecer na escatologia.

Assim, a concupiscência não é apenas a perda de uma perfeição original, mas está profundamente
ligada à pecabilidade. Se a graça e a superação da concupiscência forem perfeitas, esta será plenamente
dominada e superada. Maria, a cheia de graça, por sua preservação prévia terá em si suprimidas todas as
raízes da concupiscência, já que o pecado estava também completamente supresso.

Assim, não se pode admitir que em Maria tenha havido um único pecado pessoal. A impossibilidade
de Maria pecar se funda na graça que ela recebeu de Deus.

No que se refere a graça em Maria, resta ainda a questão se esta graça foi nela algo de estático ou se
passou por um crescimento, mesmo sendo desde o primeiro momento plena.

No ser humano, a graça destinada ao homem é a ele conferida por Deus através da sua cooperação.
Com isto há um fortalecimento da graça.

Maria não deve fugir a esta regra. Tendo a plenitude da graça desde o primeiro instante, cada ação
sua, realizada pela graça, trouxe-lhe uma intensificação maior (sempre maior) desta graça.

- ASSUNÇÃO DE MARIA

- Dogma de fé definido pelo Papa Pio XII em 1/11/1950 - “Munificentissimus Deus”

- Objeto primário da definição: glorificação corporal de Maria - não define se Maria morreu ou não.

- Trata-se da glorificação antecipada de Maria - sua glorificação em corpo e alma.

a) Fundamentação bíblica do dogma:

-Textos bíblicos que aparecem no dogma: a argumentação usada por Pio XII:

• Desde o século II Maria é chamada de “nova Eva”, ligada ao “novo Adão” (Cristo): baseia – se isto em Gn
3,15.

• Em Gn 3,15 trata-se da luta de Cristo contra o demônio e de sua vitória sobre o mal.

• A vitória de Cristo sobre o demônio foi a vitória sobre o pecado e a morte: Rm 5-6; 1Cor 15,21- 26.54.57 -
cf, também Hb 2,14s.
14

• Há uma especial participação de Maria nesta luta e, portanto, nesta vitória. A vitória só será completa com
a glorificação corporal de Maria: 1Cor 15, 54.26.23s: associação de Maria na luta contra o demônio -
associação de Maria na vitória.

b) A tradição sobre a Assunção de Maria:

- desde o fim do século II pergunta-se sobre os últimos momentos da vida terrestre de Maria.

- No século IV existe o escrito “Transitus”, do Pseudo-Melitão, que afirma a ressurreição de Maria.

- São Gregório de Tours (séc.VI) difunde este apócrifo no Ocidente.

- Já no século VI existe a festa da “Dormição” em Jerusalém. Embora tivesse este nome, o que se celebrava
era a glorificação de Maria. No século VII esta festa já existe em Roma, onde toma o nome de festa da
Assunção de Maria.

c) Sentido teológico do Dogma:

- Maria hoje já possui a Deus com seu corpo e sua alma - ou seja, ela, como ser humano total já está na
comunhão divina.

- O Cristo ressuscitado hoje é o nosso intercessor, - nosso advogado junto ao Pai: Rm 6,9; Hb 7, 25; 1Jo 2,1.

Maria, com seu corpo já glorificado também intercede por nós, unindo sua intercessão à de Cristo. Só
Cristo e Maria intercedem com sua totalidade humana.

-A humanidade de Maria está na glória: daí a devoção ao Coração de Maria.

PIEDADE MARIANA

APARIÇÕES

Têm-se multiplicado, no Brasil e no estrangeiro, fenômenos de aparições atribuídas à Virgem SSma,


as opiniões se acham divididas a respeito.

OS FATOS

No século XVI, começa com mais freqüência o fenômeno “aparições”. Em 1531 em Guadalupe a
Virgem Ssma terá aparecido ao índio Juan Diego; em 1858 em Lourdes (França) a Sta. Bernadete
Soubirous; em 1917 em Fátima (Portugal) a três pequenos pastores. No Brasil 1717 a imagem de N.Sra.
Aparecida é encontrada no Rio Paraíba por três pescadores. Em 1960: Erechim, RS, Nossa Senhora da Santa
Cruz estaria se manifestando a Dona Dorotéia. 1967-1977: Nossa Senhora da Natividade teria aparecido ao
Dr. Fausto Faria, em Natividade (RJ). Após 1988 até nossos dias numerosos são os casos que vão sendo
registrados. Fora do Brasil, o historiador Yves Chiron contou no século XX até 1993 um total de 362
aparições de Nossa Senhora. Sobre a grande maioria destas a Igreja não se pronunciou.

O PROCEDIMENTO DA IGREJA
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O INQUÉRITO

A Igreja crê na possibilidade de aparições do Senhor e de seus Santos. Assim como para São Paulo,
na estrada para Damasco (At 9, 3-9). São Pedro teve uma visão antes de ir à casa do centurião Cornélio (At
10, 9-11). S. Estevão, antes de morrer, viu a glória de Deus e Jesus à direita do Pai (At 7,55s). Todavia,
antes de se pronunciar a respeito de alguma aparição, a Igreja é cautelosa:

1. Verifica-se que, da parte dos (as) videntes, há debilidade mental, fantasia exuberante, desonestidade,
charlatanismo ou manifestação de psiquismo exaltado (laudo negativo);

2. Laudo positivo no plano espiritual e físico (conversões, afervoramento, curas de doenças e outros
benefícios...). Em tais casos, a Igreja não somente permite, mas favorece o culto ao Senhor ou ao (à) Santos
(as) que se julga ter aparecido. La Salette, N.Sra. de Lourdes, de Fátima... Embora a Igreja favoreça o culto a
Nossa Senhora em tal lugar, ela nunca diz, nem dirá, que a Virgem SSma apareceu; o fenômeno “aparição”
não pode ser definido pela Igreja como verdade de fé. A revelação pública e de fé está encerrada com a
geração dos Apóstolos; nenhum artigo pode ser acrescentado ao Credo (Dei Verbum, 4). A dispensação da
graça cristã, como aliança nova e definitiva, jamais passará, e já não há que esperar alguma nova revelação
pública antes da gloriosa manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo (1Tm 6,14 e Tt 2,13). O Papa Bento
XIV (1740-1758) publicou as seguintes observações: “a dita „aprovação‟ da Igreja não é senão uma
permissão; atesta que os fenômenos alegados não estão em desacordo com a fé, os costumes e a missão da
Igreja. Não pedem adesão de fé divina ou católica, mas pode suscitar a fé humana”.

3. Pode também a Igreja abster-se. É o que acontece na maioria dos casos. Em consideração desses frutos, a
Igreja deixa que a piedade se desenvolva até haver razões de ordem doutrinária ou moral que exijam algum
pronunciamento. Quando não incorrem erro no tocante à fé ou à Moral, os fenômenos extraordinários têm
alto potencial evangelizador, que merece respeito e não pode ser deixado de lado. Aos pastores compete, de
um lado, confirmar os irmãos na fé, e, de outro lado, ajudar os fiéis a superar a demasiada credulidade, para
que esta não venha a ser um fator de descrédito da própria mensagem cristã.

SÁBIAS PONDERAÇÕES

Verifica-se que várias das mensagens atribuídas a Nossa Senhora em nossos dias são marcadas por
forte pessimismo. Descrevem a situação do mundo atual em termos apocalípticos: o demônio estaria solto, a
a corrupção generalizada, os castigos de Deus seriam iminentes, implicando catástrofes de âmbito mundial,
condenação dos pecadores e salvação para os justos. Sobre este pano de fundo pedem-se oração e penitência.

a. O mundo está vivendo uma situação de crise generalizada;

b. O pessimismo e o desespero;

c. O Brasil é muito sacudido por correntes que dizem receber comunicações do além;

d. Muitas pessoas se deixam levar pelo sentimentalismo e as emoções;

e. Muita gente quer ser dirigida; espera um guru ou um líder privilegiado. Consciente disto, a Igreja usa
sempre de grande cautela desde que se propague a notícia de algum fenômeno extraordinário.

PRUDÊNCIA
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Eis alguns traços:

a. A Igreja, de um lado, se sente responsável pela conservação incólume da doutrina da fé, de acordo com o
mandato de Jesus Cristo (Mt 16,16-19; Lc 22,31s; Mt 28,18-20). Doutro lado, ela sabe que o Espírito Santo
pode falar por vias extraordinárias, de tal modo que não lhe é lícito extinguir o Espírito, como diz S. Paulo
em 1Ts 5,19s;

b. O extraordinário deve ficar sendo sempre extraordinário. Não é via normal pela qual Deus guia os seus
filhos; o normal é a via da fé..., fé que se distingue de crendice, pois a fé supõe credenciais ou motivos para
crer; a fé não diz Sim a qualquer notícia de portento;

c. Aparições e revelações não devem ser presumidas nem admitidas em primeira instância num juízo
precipitado. Procurem-se, antes do mais, as explicações ordinárias ou naturais (físicas, psicológicas ou
parapsicológicas). É preciso levar em conta a fragilidade humana, sujeita a engano, alucinações, sugestões
coletivas. Daí o senso crítico, que deve começar por investigar aquilo de que realmente se trata, para depois
procurar a explicação adequada. Leve-se em conta especialmente a tendência dos meios de comunicação
social a provocar artificialmente as emoções e o sensacionalismo, sem compromisso sério com a verdade;

d. Toda autêntica aparição há de ser coerente com as linhas e o espírito do Evangelho. Deve confirmar o que
este ensina:

• As muitas minúcias (quanto a datas, local, duração e tipo de fenômenos preditos) merecem reservas, pois
não há habituais na linguagem da Escritura Sagrada;

• O que certamente se pode e deve depreender de toda a genuína mensagem do céu, é a exortação à oração e
à penitência; La Salette, Lordes e Fátima clamam altamente por tais atitudes a ser assumidas pelos fiéis
católicos. O Papa São João XXIII em comemoração ao centenário de Lourdes nos fala que os dons
extraordinários são concedidos aos fiéis: “não para propor doutrinas novas, mas para guiar a nossa conduta”.

A MARIOLOGIA SUBJACENTE NO ANTIGO TESTAMENTO

O Antigo Testamento não fala explicitamente sobre Maria Santíssima. Alguns de seus textos, porém,
ao tratar do Messias, referem-se à Mãe do Messias. É o que veremos em algumas passagens, fazendo sempre
a correlação entre o texto do Antigo Testamento e a vida de Nossa Senhora, ora numa abordagem exegética,
ora numa abordagem teológica. É necessário que a autêntica piedade Mariana esteja relacionada com a fé
em Jesus Cristo. Vejamos: Gn 3,15 (O Protoevangelho – Primeiro anúncio da Boa Nova): “Porei inimizade
entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a descendência da mulher. E ela (a descendência da mulher) te
atingirá a cabeça. E tu lhe atingirás o calcanhar.” Primeiro título de Nossa Senhora, pela tradição cristã:
Nova Eva.

Concílio de Éfeso (431): Maria é Theotókos, Mãe de Deus.

Is 7,14: “Sabei que o Senhor mesmo vos dará um sinal: Eis que a jovem concebeu e dará à luz um filho, e
por-lhe-á o nome de Emanuel” (Is 7,14).

Vejamos algumas considerações:

• A virgindade da mãe do Messias põe em relevo o caráter extraordinário do seu parto.

• O filho dessa Virgem Mãe é especial dom de Deus aos homens, como a salvação é dom de Deus.

Mq 5, 1ss: “E tu, Belém Efrata, pequena demais para ser confiada entre os clãs de Judá. De ti sairá para
mim aquele que deve governar Israel. Suas origens são de tempos antigos, de dias imensuráveis.
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Por isto Deus os abandonará até o tempo em que dará à luz aquela que deve dar à luz. Então o que houver
restado de seus irmãos, se reunirá aos filhos de Israel”.

Conversando sobre esta citação:

• S. Mateus (2,4-6) exalta a cidade. Em vez de dizer „pequena demais‟ diz „não és o menor entre todos os
clãs de Judá”.

• O Rei é transcendente ao tempo.

• A rainha-mãe gozava de especial veneração nas cortes de Oriente antigo. É a mãe do Senhor ou Grande
Dama. Logo, o povo de Israel esperava o Salvador e teria grande estima por sua Mãe.

Podemos concluir sobre estes três textos:

• O Antigo Testamento põe sua esperança no Messias. Por isso, Maria Ssma. É esboçada como Mãe do
Messias.

• A prerrogativa principal de Maria é a maternidade messiânica.

• Isaías anuncia o caráter virginal desta maternidade, quer dizer o Filho-Messias é dom gratuito de Deus.

• A Mãe do Messias também coopera na obra da salvação humana.

Vejamos outros livros do Antigo Testamento que podem fazer alguma alusão à Mãe do Salvador, a Virgem
Maria.

A Esposa do Cântico dos cânticos: Neste livro que apresenta o amor entre um jovem e uma jovem, desde o
namoro até o casamento, vemos uma figura do amor de Deus pelo seu povo. No Novo Testamento, a Esposa
de Javé, é a Igreja, da qual Maria é a miniatura. Em Maria, a Igreja vê seu protótipo e considera o estado
final que tocará a todos os justos. Sua alma estava unida a Deus, mais do que todos os outros.

A Sabedoria Personificada (Pr 8,22-31 e Ecl 24, 3-21.): A liturgia aplica estes textos a Maria Santíssima,
como se ela fosse a Dama que fala ou que é apresentada nos textos citados.

Salmos de Sion (46, 48,87...): Salmos que louvam a cidade de Jerusalém, considerada mãe do povo israelita
ou mesmo de todos os povos. A Mãe de Deus e Mãe dos homens tem afinidade com a Jerusalém celeste,
esposa e mãe, segundo a linguagem bíblica. Daí se aplicarem a Maria os louvores que tocam a Jerusalém,
segundo a praxe litúrgica católica.

Judite: Viúva que derrotou o general Holofernes. Foi exaltada entre o povo de Israel. Costuma-se, na
liturgia, aplicar estes louvores também a Nossa Senhora.

Éster: Éster livra o povo de Israel do extermínio, foi intercessora junto ao Rei Assuero. Maria é a
intercessora por excelência em favor dos homens. Deus salva os homens como Ele quer, servindo-se de
instrumentos precários aos olhos humanos. Maria é a humilde serva do Senhor.

Sofonias: Comparar Sf 3, 14-18 com Lc 1, 28-31.

Êxodo: Comparar Ex 40,35 com Lc 1, 35


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
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GOMES, Cirilo Folch. Riquezas da Mensagem Cristã. Rio de Janeiro, Lumen Christi, 1981, p.443- 44 7

LARENTIN, René. Breve Tratado de Teologia Mariana. Petrópolis, Vozes, 1965, p.7981,118-121

MULLER, Alois. Conceição Imaculada, plenitude da graça e isenção da concupiscência, in FEINER,


Johannes e LOEHRER, Magnus. Mysterium Salutis /7. Petrópo1is, Vozes, 197 4, p, 103-116

POZO, Candido. Marian en Ia Escritura y en Ia Fe de Ia Iglesia. Madrid, BAC, 1979, p,131-139.

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