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18.

11 Mudança de variáveis de funções de n variáveis 691

18.11 Mudança de variáveis de funções de n variá-


veis
Vimos que se S é uma região do R2 que é a imagem de uma outra região
Q do R2 por uma transformação inversível e diferenciável exceto talvez em um
conjunto de medida nula e que se f é uma função de duas variáveis integrável em
S, então
¨ ¨
f (x, y)dxdy = f (X(u, v),Y (u, v)) |J(u, v)| dudv, (18.373)
S Q

onde
∂x ∂y ∂x ∂y
J(u, v) = (18.374)
∂u ∂v ∂v ∂u
é o determinante da matriz jacobiana da transformação~r(u, v) = (X(u, v),Y (u, v)).
Na dedução desta fórmula a parte mais trabalhosa foi mostrar que se particio-
narmos o retângulo Q e calcularmos a área da imagem de cada sub-retângulo Qi j
temos que
A(Si j ) = J(ui 1 , v j 1) Dui Dv j + ei j Dui Dv j , (18.375)
onde ei j tende a zero quando (Du, Dv) tende a (0, 0), ou seja, a área do sub-
retângulo de área Dui Dv j é amplificada por um fator J(ui 1 , v j 1 ) a menos de
um erro que tende a zero mais rápido que Dui Dv j .
Este resultado tem a seguinte interpreta-
y

ção geométrica. Seja ~a o vetor que liga


+

=
o ponto ~r(u0 , v0 ) ao ponto ~r(u0 + Du, v0 )
+

e ~b o vetor que liga o ponto ~r(u0 , v0 ) ao


ponto ~r(u0 , v0 + Dv). A área do losango
=
definido pelos vetores a e b aproxima
bem a área da imagem do sub-retângulo
[u0 , u0 + Du] ⇥ [v0 , v0 + Dv].
x

Como a transformação~r(u, v) é diferenciável, podemos escrever


∂~r
~a = Du +~eu Du , (18.376)
∂u
~b = ∂~r Dv +~ev Dv . (18.377)
∂v
Desprezando os termos ~eu e ~ev que tendem a zero, a área do losango é calculada
como
∂r ∂r
DA = ~a ⇥~b = ⇥ DuDv . (18.378)
∂u ∂v
692 Integrais de campos escalares

Calculando este último produto vetorial temos


0 1
~i ~j~k ✓ ◆
∂r ∂r B ∂x ∂x C ∂x ∂y ∂x ∂y ~
⇥ = det @ ∂u ∂v 0 A= k, (18.379)
∂u ∂v ∂y ∂y ∂u ∂v ∂v ∂u
∂u ∂v 0

ou seja,

DA = |J(u, v)|DuDv (18.380)

mais termos que tendem a zero mais rápido que o jacobiano.


Seja uma transformação de coordenadas do R3 para o R3 dada pelas equações

x = X(u, v, w) , (18.381)
y = Y (u, v, w) , (18.382)
z = Z(u, v, w) . (18.383)

A imagem do 3-retângulo S = [u0 , u0 +


Du] ⇥ [v0 , v0 + Dv] ⇥ [w0 , w0 + Dw] é a
região limitada por 6 superfícies distin-
tas, definidas pelas equações u = u0 , u =
u0 + Du, v = v0 , v = v0 + Dv, w = w0 ,
w = w0 + Dw, como exibido na imagem
ao lado. Queremos calcular o volume
desta região.

Podemos repetir o procedimento do caso bidimensional e escrever cada uma


destas 6 superfícies como o gráfico de uma função z = fk (x, y) no domínio rele-
vante, identificar quais superfícies estão por cima e calcular o volume pelas in-
tegrais duplas das 6 funções encontradas, que podemos estimar pelo teorema do
valor médio e tomar o limite em que (Du, Dv, Dw) tende a (0, 0, 0). O resultado
desta conta, após muito trabalho, é o mesmo que se aproximarmos o volume desta
região pelo paralelogramo definido pelos vetores

~a =~r(u0 + Du, v0 , w0 ) ~r(u0 , v0 , w0 ) , (18.384)


~b =~r(u0 , v0 + Dv, w0 ) ~r(u0 , v0 , w0 ) , (18.385)
~c =~r(u0 , v0 , w0 + Dw) ~r(u0 , v0 , w0 ) . (18.386)

Se as funções que definem as transformações forem diferenciáveis, podemos es-


18.11 Mudança de variáveis de funções de n variáveis 693

crever
∂~r
~a = Du + e~1 Du , (18.387)
∂u
~b = ∂~r Dv + e~2 Dv , (18.388)
∂v
∂~r
~c = Dw + e~3 Dw , (18.389)
∂w
onde os vetores e~1 , e~2 e e~3 tendem a zero quando (Du, Dv, Dw) tende a (0, 0, 0). O
volume da região é dado então por
⇣ ⌘ ✓ ◆
∂~
r ∂~
r ∂~
r
DV = ~a · ~b ⇥~c = · ⇥ DuDvDw , (18.390)
∂u ∂v ∂w

onde
0 1 0 1
✓ ◆ ∂X ∂Y ∂Z ∂X ∂X ∂X
∂~r ∂~r ∂~r ∂u ∂u ∂u ∂u ∂v ∂w
B ∂X ∂Y ∂Z C B ∂Y ∂Y ∂Y C
· ⇥ = det @ ∂v ∂v ∂v A = det @ ∂u ∂v ∂w A , (18.391)
∂u ∂v ∂w ∂X ∂Y ∂Z ∂Z ∂Z ∂Z
∂w ∂w ∂w ∂u ∂v ∂w

que implica

DV = |J(u, v, w)|DuDvDw , (18.392)

mais termos que tendem a zero mais rápido que DuDvDw. O termo J(u, v, w) é
o determinante da matriz jacobiana da transformação de coordenadas~r(u, v, w) =
(X(u, v, w),Y (u, v, w), Z(u, v, w)).
Em quatro ou mais dimensões não temos mais esta interpretação geométrica,
mas podemos utilizar os resultados da Álgebra Linear. Se um sub-retângulo S
de volume n-dimensional DVS é deformado por uma transformação linear T , o vo-
lume da imagem T (S) é dado por | det(M)|DVS , onde M é a representação matricial
da transformação linear T .
Uma transformação geral (não linear) pode ser expressa por um campo vetorial

~r(~u) = (X1 (u1 , . . . , un ), . . . , Xn (u1 , . . . , un )) (18.393)

Queremos calcular o volume da imagem do sub-retângulo de volume DVS = Du1 · · · Dun


pela transformação de coordenadas geral. A aproximação de Taylor de primeira
ordem da transformação~r(u) é dada por

~r(~u0 + Du)
~ =~r(~u0 ) + J [~r(~u0 )] Du
~ + E Du
~ , (18.394)
694 Integrais de campos escalares

onde~r(~u0 ) representa uma translação (que não afeta o volume da imagem), J [~r(~u0 )]
é a matriz jacobiana da transformação e o termo J [~r(~u0 )] Du
~ representa uma trans-
formação linear. A matriz E é uma matriz que tende à matriz nula quando Du ~
tende a zero, e o efeito desta matriz no cálculo do volume da imagem tende a zero
mais rápido que os efeitos da transformação linear. Portanto o volume da imagem
do sub-retângulo de volume DVS = Du1 · · · Dun é dado por
DVT (S) = |det (J (~r(~u0 )))| DVS (18.395)
desprezando os termos que tendem a zero mais rápido que DVS .
Com este resultado podemos repetir a demonstração da fórmula de mudança
de variáveis feita para o caso bidimensional. O resultado desta demonstração é
que se S é a imagem de um n-retângulo Q por uma transformação de coordenadas
~r(~u) inversível e diferenciável, então
ˆ ˆ
f (~r)dx1 . . . dxn = f (~r(~u))|J(~u)|du1 . . . dun . (18.396)
S Q

Em três dimensões, se S é a imagem de um 3-retângulo Q por uma transformação


~r(u, v, w) = (X(u, v, w),Y (u, v, w), Z(u, v, w)) inversível e diferenciável, então
˚ ˚
f (x, y, z)dxdydz = f (x(u, v, w), y(u, v, w), z(u, v, w))|J(u, v, w)|dudvdw .
S Q
(18.397)
Assim como no caso bidimensional, o determinante do jacobiano deve ser não
nulo para a transformação ser inversível. No entanto, se esta função for limitada
em Q e nula em apenas um conjunto de medida nula, a fórmula de mudança de
variáveis continua válida.
As contas omitidas podem ser demonstradas de maneira mais simples utili-
zando o formalismo de formas diferenciais, que é um formalismo que foge do
escopo deste texto.

18.11.1 Coordenadas cilíndricas


Este sistema de coordenadas é conveniente em problemas com simetria azimu-
tal, isto é, simetria por rotação em torno de um eixo, que orientamos como o eixo
z. A coordenada z é mantida inalterada enquanto nas coordenadas x e y utilizamos
coordenadas polares. As equações de transformação são
x = r cos q , (18.398)
y = r sen q , (18.399)
z = z, (18.400)
18.11 Mudança de variáveis de funções de n variáveis 695

onde 0  r < •, 0  q < 2p e • < z < •. As superfícies de r constante são


cilindros de base circular de raio r. As superfícies de q constante são semi-planos
verticais que se interceptam no eixo z. As superfícies de z constante são planos
horizontais.
O jacobiano desta transformação de coordenadas é
0 1 0 1
∂x ∂x ∂x
∂r ∂q ∂z cos q r sen q 0
B ∂y ∂y C
J(r, q, z) = det @ ∂y
∂r ∂q ∂z A
= det @ sen q r cos q 0 A (18.401)
∂z ∂z ∂z 0 0 1
∂r ∂q ∂z

J(r, q, z) = r cos2 q + r sen2 q = r . (18.402)

Exemplo 18.29 (Volume de um cilindro).

Um cilindro com base circular de raio a e altura h é descrito por

S = (x, y, z) 2 R3 | x2 + y2  a2 , 0  z  h . (18.403)

Em coordenadas cilíndricas um cilindro é descrito por 0  r  a, 0  q  2p e


0  z  h. O volume de um cilindro é dado por
˚ ˆ h ˆ 2p ˆ a
V= 1dxdydz = rdrdqdz
S 0 0 0
✓ˆ ◆ ✓ˆ ◆ ˆ !
a 2p h
= rdr dq dz
0 0 0

a2
= 2ph = pa2 h . (18.404)
2
Exemplo 18.30.

Seja S a região limitada lateralmente pelo hiperboloide de uma folha x2 + y2


z2  a2 e pelos planos horizontais z = h e z = h. Em coordenadas cilíndricas,
essa região é descrita por h  z  h. A variável angular q deve variar de 0
a 2p para varrer a região S inteira. A variável r varia de 0 até a superfície do
hiperboloide, que deve ser um valor diferente para cada z diferente. A equação do
hiperboloide em coordenadas cilíndricas é

(r cos q)2 + (r sen q)2 z2 = a2


r2 (cos2 q + sen2 q) = a2 + z2
p
r = a2 + z2 (18.405)
696 Integrais de campos escalares

p
portanto a variável r varia de 0 até a2 + r2 para preencher a região S.
˚ ˆ h ˆ 2p ˆ pa2 +z2
V= 1dxdydz = rdrdqdz
h 0 0
✓ˆ ◆ˆ p
2p h ˆ a2 +z2
= dq rdrdz
0 h 0
p
2 2
1 2 r= a +r
h
ˆ
= 2p r dz
h 2 r=0
ˆ h  z=h
2 2 2 z3
=p (a + z )dz = p a z +
h 3 z= h
✓ 3 ◆ ✓ ◆
2 h 2 h2
= 2p a h + = 2ph a + . (18.406)
3 3

18.11.2 Coordenadas esféricas


Este sistema de coordenadas é conveniente em problemas com simetria esfé-
rica, isto é, simetria em relação à rotação em torno de um ponto que escolhemos
como sendo a origem. As equações de transformação são
x = r sen q cos j (18.407)
y = r sen q sen j (18.408)
x = r cos q (18.409)
onde 0  r < •, 0  q  p e 0  j < 2p. As superfícies de r constante são esferas
centradas na origem. As superfícies de q constante são semi-cones e as superfícies
de j constante são semi-planos que interceptam o eixo z.
O jacobiano desta transformação é
0 ∂x ∂x ∂x 1 0 1
∂r ∂q ∂j sen q cos j r cos q cos j r sen q sen j
B ∂y ∂y ∂y C
J = det @ ∂r ∂q ∂j A = det sen q sen j r cos q sen j
@ r sen q cos j A
∂z ∂z ∂z cos q r sen q 0
∂r ∂q ∂j
(18.410)

Calculando este determinante temos


J(r, q, j) = r2 cos2 q cos2 j sen q + r2 cos2 q sen2 j sen q
+r2 sen3 q sen2 j + r2 sen3 q cos2 j
= r2 cos2 q(cos2 j + sen2 j) sen q + r2 sen3 q(cos2 j + sen2 j)
= r2 cos2 q sen q + r2 sen3 q = r2 sen q(cos2 q + sen2 q)
18.11 Mudança de variáveis de funções de n variáveis 697

e finalmente

J(r, q, j) = r2 sen q . (18.411)

Este jacobiano se anula nos pontos em que r = 0 (na origem) ou nos pontos em
que sen q = 0 (no eixo z). Nestes pontos o sistema de coordenadas é degenerado,
mas como formam um conjunto de medida nula do R3 , a fórmula de mudança de
variáveis pode ser utilizada sem problemas.

Exemplo 18.31 (Volume de uma esfera de raio a).

A esfera de raio a em coordenadas esféricas é descrita por 0  r  a, 0  q  p


e 0  j  2p.

˚ ˆ 2p ˆ p ˆ a
V= 1dxdydz = r2 sen qdrdqdj
S 0 0 0
✓ˆ a ◆ ✓ˆ p ◆ ✓ˆ 2p ◆
2
= r dr sen qdq dj
0 0 0
✓ 3◆
a 4pa3
= (2)(2p) = . (18.412)
3 3

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