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XXII Colóquio de Usinagem

21 a 23 de novembro de 2018
Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM
Uberaba, MG, Brasil

CORRELAÇÃO ENTRE AS FORÇAS DE CORTE E A POTÊNCIA


ELÉTRICA APARENTE NO TORNEAMENTO DO AÇO ABNT 1050

Paulo Vinícius da Silva Resende, Instituto Federal de Goiás, paulo.vinicius@ifg.edu.br


Ildeu Lúcio Siqueira, Instituto Federal de Goiás, ildeu.siqueira@ifg.edu.br

Resumo. A medição de grandezas na usinagem contribui para o aprimoramento das condições de corte e estudo dos
fenômenos. Dentre eles, está a medição de forças, de temperatura e potência elétrica. O primeiro demanda a
instalação de sistemas de aquisição com alto valor agregado, enquanto a medição de energia pode ser viabilizada com
instrumentação de baixo custo. Na literatura convencional, abordam-se os aspectos econômicos para a usinagem de
maneira a ponderar os esforços de corte. Para tanto, o presente estudo tem como objetivo determinar a correlação
entre a força de corte no torneamento cilíndrico do aço ABNT 1050 com ferramenta de metal duro revestida. Os
resultados obtidos indicam que, para as condições analisadas, há correlação linear entre a potência elétrica aparente
e a força de corte.

Palavras chave: torneamento, correlação, forças, potência.

1. INTRODUÇÃO

O último relatório do Ministério de Minas e Energia, EPE (2017), divulga o Balanço Energético Nacional com a
base de dados do ano anterior, 2016. Destes resultados, o consumo de energia elétrica no setor industrial foi
predominante dentre os demais ramos da Economia, pontuando a demanda em 29,2%, seguido do setor de transportes
com 28,7%. A mesma comparação na base de dados do ano de 2015 aponta que os dois setores supracitados já
prevaleciam na mesma ordem, sendo a indústria responsável por 31,9% e o setor de transporte por 21,3% de toda a
demanda energética. Estes resultados indicam que, mesmo com o recuo industrial por questões políticas e econômicas,
o setor industrial é consumidor significante da matriz energética.
Neste contexto, os processos de usinagem figuram entre os elementos chave dos produtos e processos que nos
cercam. A aplicabilidade desses processos é palpável, sejam na fabricação de automóveis, equipamentos de uso
doméstico, hospitalar, civil, agrícola, aeronáutica e afins. Essa disseminação se deve, em parte, à capacidade de
produção de componentes com baixo tempo e elevada repetibilidade.
Nos processos de usinagem atuais há grande variedade de máquinas-ferramenta, quanto ao porte, capacidade de
operações, dispositivos auxiliares e comandos computadorizados. Entretanto, a fonte de energia para a realização de
trabalho é comum: máquinas elétricas, ou seja, motores de corrente contínua ou alternada.
Costa et al. (2017) classifica as máquinas ferramenta utilizadas no torneamento, o torno, quanto aos recursos
empregados no controle da velocidade e posição. Os tornos equipados com tecnologia CNC (Comando Numérico
Computadorizado) possibilitam a variação e o controle da velocidade e posição da ferramenta/peça em pequenos
intervalos. Nas máquinas convencionais a velocidade dos motores é sempre constante e a velocidade dos movimentos
peça/ferramenta só pode ser modificada por meio de uma transmissão mecânica. Entretanto, nas máquinas
programáveis, a velocidade é controlada pela variação da frequência elétrica dos motores.
Apesar da grande disseminação dos tornos equipados com comando numérico computadorizado (CNC) em virtude
da versatilidade e capacidade de executar grandes lotes de peças de revolução complexas, a utilização dos tornos
convencionais ainda predomina em empresas pequenas, sendo uma boa alternativa para a usinagem de lotes pequenos,
ou unitários, e para atender à manutenção mecânica de peças específicas.
Diversos ramos de pesquisa têm demonstrado aplicações metrológicas de maneira a caracterizar o efeito de um ou
mais parâmetros controláveis do processo no mensurando e correlacionar as variáveis de controle às de processo. A
importância da medição e controle remete à máxima do pai da administração moderna, Peter Ferdinand Drucker: "Se
você não pode medir, não pode gerenciar.”.
Na usinagem, as relações entre a rugosidade e integridade superficial, forças de corte, vida de ferramenta e os
parâmetros de entrada dos processos, como as características mecânicas, físicas e químicas do material, além da
velocidade de corte, avanço e profundidade, são amplamente estudados e publicados.
Segundo Sousa et al. (2017), a medição das grandezas elétricas desempenha um papel fundamental para determinar
a natureza das fontes de energia necessárias, visto que a maioria das máquinas ferramenta, utilizadas na usinagem, exige
a energia elétrica como fonte de energia principal.
Neste sentido, o presente trabalho tem como proposta apresentar uma metodologia para avaliar a correlação entre as
forças de corte e a potência elétrica aparente drenada pela máquina ferramenta em estudo. O objetivo é estudar a
qualidade das informações obtidas através do sistema de medição utilizado para correlacionar aos esforços de usinagem.
Paulo Vinícius da Silva Resende, Ildeu Lúcio Siqueira.
Correlação entre as Forças de Corte e a Potência Elétrica Aparente no Torneamento do Aço ABNT 1050

2. METODOLOGIA

No presente trabalho, os testes foram executados em um Torno Mecânico Paralelo Universal, modelo Nodus 220
Gold do fabricante Nardini S/A em 2017, com potência instalada de 5,5 kW (7,5 cv), como apresenta o esquema da
Figura 1(a).
Como variáveis de entrada, são considerados:
(a) Como material de estudo, utilizou-se um tarugo redondo de Aço ABNT 1050 com dureza média de 238 HB e
dimensões de 54 mm de diâmetro e comprimento de 500 mm. A fixação foi feita entre placa e ponta e a superfície
usinada foi predominantemente próxima à contra ponta para atenuar os efeitos de vibrações;
(b) A ferramenta de corte composta pelo suporte e inserto do fabricante Mitsubishi Carbide dos respectivos
modelos: PWLNR2020K06 e WNMG06T308-MP classe UE6110;
(c) Parâmetros de corte: Velocidade de Corte Vc = 98 m/min; Avanço f = 0,2 mm /rev.; profundidade de corte ap
variável em cinco níveis, de 0,5 mm à 1,5 mm com incremento de 0,25 mm, caracterizando os cinco ensaios (E1, E2,
E3, E4, E5).

Figura 1: Representação esquemática dos ensaios (a), detalhamento dos sistemas de medição (b).

Como variáveis de saída, foram avaliadas:


(a) Forças de Usinagem: Força de Corte Fc, Força de Avanço Ff, Força Passiva Fp. Para efeito de comparações,
considerou-se apenas a força de corte, visto que esta parcela é mais representativa na potência de usinagem.
(b) Potência Elétrica: Potência Aparente Se (VA). A primeira é obtida de forma direta a partir do sistema de medição
de potência elétrica pelo produto de tensão e corrente por fase e é a grandeza contabilizada pelas concessionárias de
energia em face do consumo industrial.
Os sistemas de medição utilizados para a medição das variáveis, apresentados na Fig. 1(b), são:
(a) Plataforma piezoelétrica: Fabricante Kistler, modelo 9265B com o dispositivo para torneamento modelo 9441B,
montado sobre o carro transversal do referido torno, de modo que a aresta de corte da ferramenta foi ajustada à altura da
contra ponta. Os sinais obtidos pelo dispositivo foram enviados ao amplificador multicanais, também do mesmo
fabricante e modelo 5070A que realiza a comunicação via USB pelo software Dynoware específico do conjunto.
(b) Sistema de aquisição de potência elétrica trifásica: Utilizou-se o sistema de instrumentação desenvolvido por
Rosa (2013) que consiste em sensores de tensão e corrente do tipo hall, dos respectivos modelos LV25-P e LA200-P.
Os instrumentos possuem faixa nominal de medição de 500 V e 200 A, respectivamente, e foram devidamente aferidos
e calibrados à época. Os sinais de tensão e corrente foram capturados e condicionados por uma placa de aquisição do
fabricante National Instruments modelo NI-USB-6009 com 8 entradas analógicas de 14 bits e frequência de
amostragem de 48 kS/s. Visto que cada sinal de corrente e tensão foi condicionado em uma porta analógica, na interface
com o usuário a aquisição foi ajustada em 6 kHz por canal.

2.1. Força e Potência de Corte

Diversos autores da literatura técnica, como, Ferraresi (1977), Ballato (1995), Machado et al. (2009), citam
métodos diretos e indiretos para a medição de forças de usinagem. O método de medição direta com dinamômetros
piezoelétricos é consagrado às aplicações práticas e acadêmicas tendo em vista a adequada resolução, sensibilidade e
faixa de operação.
A Potência Ativa de usinagem Pa é o somatório das parcelas da Potência de Corte Pc, dado pelo produto da Força
de Corte Fc [N] e a Velocidade de Corte [m/min], e a Potência de Avanço Pa, dado pelo produto da Força de Avanço Ff
[N] e a Velocidade de Avanço [m/min], conforme a Eq. (1).
XX COLÓQUIO DE USINAGEM

̃ (1)

Visto que a velocidade de corte pode representar até duas ordens de grandeza a velocidade de avanço, despreza-se a
parcela da Potência de Avanço Pf e a Potência ativa Pa é considerada igual à Pc.

2.2. Medição de Energia Elétrica em Sistema Trifásico

Segundo Costa (2017), o consumo energético na usinagem é o somatório das parcelas destinadas à realização de
trabalho mecânico, nos movimentos de corte e avanço, e as perdas nos mecanismos de acoplamento e transmissão na
forma de calor, ruído e vibrações.
A potência elétrica medida na entrada do motor Pe, quando este se encontra acoplado à carga é determinada, tal
como indicado pela Eq. 2, onde T é o torque [Nm], ω é velocidade angular em [rad/s] e ηG é o rendimento global.

(2)

Em operações de torneamento longitudinal com velocidade de corte Vc constante, a Eq. 1 pode ser desenvolvida em
função da força de corte Fc e apresentada na forma da Eq. 3.

(3)

A potência aparente Se [VA] é a potência efetivamente consumida e contabilizada pelas concessionárias de energia.
Ela é composta pela parcela de potência ativa [W] e reativa [Var]. No presente trabalho, foram obtidos os sinais das três
fases (i=3) de tensão vi(t) e corrente ii(t) na entrada da máquina ferramenta no período efetivo de corte. Logo, calculou-
se Se pelo produto da tensão Vrms e corrente Irms, valor RMS do sinal temporal, na faixa experimental.

∑ (4)

4. RESULTADOS

A Figura 2(a) apresenta os resultados de força de corte Fc e de avanço Ff. Após a avaliação estatística, comprovou-
se, pelo teste de Anderson-Darling, que a distribuição das variáveis medidas é de característica Normal. Portanto, a
avaliação da dispersão foi realizada com os desvios padrões, expressos por barras na figura.
Para Fc e Ff a dispersão foi máxima no quarto ensaio (3%). Em concordância à literatura, o incremento da
profundidade de corte ap foi proporcional à Fc e Ff, como descrito por (TRENT e WRIGHT, 2000; MACHADO et al.,
2009), devido à maior área dos planos de cisalhamento primário e secundário durante o corte , e consequentemente
maior será a demanda de energia na execução do trabalho.

Figura 2: Resultados dos ensaios: forças de corte e avanço (a), potência aparente (b)
Paulo Vinícius da Silva Resende, Ildeu Lúcio Siqueira.
Correlação entre as Forças de Corte e a Potência Elétrica Aparente no Torneamento do Aço ABNT 1050

Para os resultados da medição de potência elétrica aparente Se, apresentados na Fig.2(b), nota-se que os valores
médios obedeceram à tendência crescente com o aumento de ap. A maior dispersão dos resultados foi no segundo
ensaio (2%), também com distribuição normal.
O coeficiente de correlação r foi avaliado utilizando as ferramentas estatísticas do MS Excel®. O resultado foi
positivo e próximo da unidade (r=0,99). Portanto, realizou-se a regressão linear simples, no qual os coeficientes são
apresentados na Tab.1.

Tabela 1: Coeficientes de regressão linear.


Coeficientes Erro padrão (e) p-valor
a 1054,59 27,08 3,72E-05
b -2011,41 67,37 8,25E-05

A Figura 3 apresenta os resultados experimentais da Potência Aparente e Força de Corte. Nota-se que o modelo tem
capacidade para predizer as forças de corte a partir dos sinais brutos de tensão e corrente das fases de alimentação do
torno, dentro da referida faixa experimental.

Figura 3: Resultados experimentais da regressão linear.

Combinando a Eq. (4) ao modelo ajustado, a força de corte predita ̅̅̅ é obtida com os coeficientes da Tab. 1,
fazendo o produto de a com Se, obtido pela Eq. 4, somado à constante b e o erro e, conforme a Eq. (5):

̅̅̅ (5)

A Tabela 2 apresenta os resultados dos ensaios, utilizados na construção da Figura 3 e para o teste do modelo.

Tabela 2: Resultado dos ensaios


Ensaio Se (kVA) Fc (N) ̅̅̅ (N)
E1 2,21 ± 0,03 310,35 ± 14,17 320,80 ± 9,01
E2 2,33 ± 0,05 456,00± 10,84 450,07 ± 6,63
E3 2,47 ± 0,02 609,77 ± 9,95 595,08 ± 5,32
E4 2,62 ± 0,02 748,22 ± 20,17 755,78 ± 6,59
E5 2,76 ± 0,02 897,15 ± 0,81 899,76 ± 9,26

4. CONCLUSÕES

Com os resultados deste trabalho, conclui-se que:


 O método de predição das forças de corte pela potência elétrica aparente foi satisfatória;
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 Na condição mais severa de corte (ap = 1,5 mm), a potência elétrica aparente foi aproximadamente 51% a potência
instalada;
 O sistema de aquisição de potência elétrica teve sensibilidade com a variação de profundidade de corte, como
prevê a literatura, o incremento das forças em função da área da seção de corte proporcional à profundidade de corte ap;
 Em trabalhos futuros será avaliado o fator de potência do sistema para determinar experimentalmente a Potência
Ativa (W) e sua proporcionalidade em diferentes condições de corte, além de ampliar a faixa experimental com a
variação do avanço f e do tipo de material usinado.

5. REFERÊNCIAS

COSTA, D. D. da; RIALTO, A. C.; GUSSOLI, M. K.; GUIMARÃES, W. M. Análise das Perdas de Energia no
Processo de Torneamento Convencional. 9° Congresso Brasileiro de Engenharia de Fabricação (COBEF), 2017.
EPE, Empresa de Pesquisa Energética. Balanço Energético Nacional 2016: Relatório final. Ministério de minas e
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09 set. 2018.
MACHADO, Á. R.; ABRÃO, A. M.; COELHO, R. T.; SILVA, M. B. da. Teoria da Usinagem dos Materiais. São
Paulo: Blucher 2, 2009.
SOUSA, D. B.; SILVA, R. G. da; SANTOS, O. D. dos; OLIVEIRA, J. H.; PAULINO, E. D. F.; FERNANDES, L. F.;
VIANA, R. Monitoramento da Potência Ativa na Usinagem Utilizando um Sistema de Baixo Custo. 9° Congresso
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FERRARESI, D. 1977. Fundamentos da Usinagem dos Materiais. Editora Edgard Blücher Ltda., São Paulo, 751 p.
HAMMES, J. M.; ROSA, A. F. P.; WALKER, E. 2017. Otimização do Acabamento Superficial no Torneamento
Cilíndrico Externo de um Aço SAE 1045. Revista GEPROS, 12(2), p.138.
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DOMINGOS, J. L. ; ABRAO, P. J. Synchronous Compensation Versus Capacitive Compensation for Reactive
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Environment and Electrical Engineering (EEEIC), 2016, Florence. 2016 p. 1.
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por Ponto para as Versões Corrente Alternada (CA) e Corrente Contínua a Média Frequência (MFDC). Tese
de Doutorado: Universidade Federal de Uberlândia, 2013.
SANTOS, S. C.; SALES, W. F. 2007. Aspectos Tribológicos da Usinagem dos Materiais. São Paulo: Artliber, 246 p.

4. AGRADECIMENTOS

Agradecemos o Laboratório de Ensino e Pesquisas em Usinagem (LEPU-UFU), sobretudo o Prof. Dr. Márcio Bacci
pela concessão do material, ao Prof. Dr. Omar Rosa do Departamento de Eletrotécnica do IFG pelo aparato de aquisição
de potência elétrica e ao Núcleo de Pesquisa em Fabricação (NUPEF) do IFG-Câmpus Goiânia, pela infraestrutura.

5. ABSTRACT

The measurement of quantities in the machining process is necessary for evaluating and improving the cutting
conditions. Among them is the measurement of forces, temperature and electrical power. The first demands the
installation of high value-added acquisition systems, while energy measurement can be enabled with low cost
instrumentation. In conventional literature, the economic aspects for machining are approached in order to weigh
cutting efforts. For this purpose, the present study aims to determine the correlation between the shear force in the
cylindrical turning of ABNT 1050 steel with coated carbide tool. The results indicate that, for the conditions analyzed,
there is a linear correlation between the output and power variables.
Key words: turning, correlaction, forces, power.

6. RESPONSABILIDADE PELAS INFORMAÇÕES

Os autores são os únicos responsáveis pelas informações incluídas neste trabalho.

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