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Resumos Livro Nazaré Cabral
Resumos Livro Nazaré Cabral
Política Financeira
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A função de estabilização, ao contrário da função de afetação de recursos, é uma
função macroeconómica: pretende explicar como, através dos instrumentos
orçamentais ao dispor do Estado (a receita e a despesa públicas), este intenta
suavizar as flutuações da economia. A função de estabilização é herança direta do
modelo Keynesiano e explora justamente a ação dos multiplicadores de despesa
e dos impostos. Ajuda-nos a compreender a ação contra cíclica: em períodos de
recessão, pelo aumento de despesa pública (em consumo e investimento) e
diminuição da carga fiscal; em situações de expansão, pela diminuição da
despesa pública e aumento dos impostos.
O primeiro aspeto, tem que ver com a opção por políticas de estabilização
ativas ou funcionais, ou pelo funcionamento dos estabilizadores
automáticos.
Abba Lerner vem dizer que as finanças públicas devem ser funcionais e
ativas e objetivo é o combate ao desemprego, de tal forma que o pleno
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emprego não poderá ser sacrificado, em circunstância alguma:
funcionalização das finanças.
Outras correntes vêm evidenciar o carácter dinâmico do orçamento e de
que este é capaz de operar um conjunto de efeitos de estabilização
automática. Os defensores desta ideia, entendiam que o orçamento
exercia, de forma espontânea, uma ação contra cíclica, ainda que
nenhuma política discricionária fosse empreendida. A confirmação deste
automatismo resultou da utilização de impostos e de certos instrumentos
geradores de despesa pública (por exemplo, subsídios de desemprego).
Em todo o caso, a utilização em exclusivo de estabilizadores automáticos
não deixou de implicar alguma objeção e crítica: considerou-se que, se é
verdade que eles constituem uma boa resposta a movimentos
inflacionistas ou depressivos, não dispensavam, em todo o caso, a
necessidade de realizar ações deliberativas nos instrumentos. Daí a defesa
da utilização de uma política ativa de estabilização segundo regras de
flexibilidade, em que as variações nos instrumentos são realizadas de
acordo com certas regras de flexibilidade previamente estabelecidas.
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eram definidas regras para que ela não ultrapassasse certos valores. A
importância das regras no domínio da política orçamental encontra, pois,
no monetarismo de Friedman e na Nova Macroeconómica Clássica, o seu
fundamento teórico original. A subordinação a essas regras orçamentais é
condição de credibilidade política, sendo que a generalidade dos países
reconhece a sua necessidade e consagra novas regras orçamentais. Na
União Europeia, elas são fruto de determinações legais resultantes quer
dos tratados, quer do direito derivado. A definição de regras resulta,
ainda, da necessidade de assegurar a coordenação das políticas
orçamentais dos Estados Membros.
A primeira fase da UEM (1990-1993) teve por objectivo o reforço das políticas
económicas e monetárias entre os Estados membros no contexto da criação do
mercado único e previa ainda a integração de todas as moedas comunitárias no
Sistema Monetário Europeu. Este período é também a fase da concretização do
Tratado da União Europeia (1992), sendo que é aqui que se lançam as bases de
aprovação/lançamento do tratado.
A terceira fase (1999-2002) tem que ver com a decisão irrevogável das taxas de
câmbio e com a determinação dos países que estavam em condições de aderir ao
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euro. Nesta altura, a Europa foi marcada por uma lógica de progressão, havendo
três tipos de países: aqueles que, querendo aderir ao euro, preenchem os
critérios; aqueles que, mesmo preenchidos os requisitos, não aderiram (Reino
Unido, por exemplo); aqueles que, querendo aderir ao euro, não preenchiam os
requisitos (Grécia, por exemplo). Assim, a terceira fase fica marcada pela adoção
de uma moeda única pela generalidade dos Estados que haviam preenchidos os
critérios de convergência nominal, implicando, para estes Estados membros, a
perda dos seus instrumentos convencionais de estabilização macroeconómica, as
políticas monetária e cambial.
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quer em termos absolutos, quer na sua relação com o PIB dos países
comunitários.
O PEC é, então, constituído por dois grupos de institutos que configuram, por seu
turno, uma intervenção comunitária de natureza e força jurídica distintas:
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Os programas de estabilidade e crescimento, além de constituírem um
instrumento de supervisão da situação orçamental dos Estados membros, têm
uma outra relevância: trata-se, com caráter senão pioneiro pelo menos inovador
no contexto europeu, de instrumentos de programação de médio prazo ou
plurianual da despesa pública.
As vicissitudes do PEC
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A preocupação fundamental está em garantir um comportamento financeiro ao
longo do ciclo e uma plataforma de ajustamento em direção ao MTBO
(medium-term budgetary objective). Os Estados devem, então, adoptar uma
abordagem mais consentânea em períodos de recuperação económica, evitando
políticas pró-cíclicas e aproximando-se gradualmente do objetivo de médio
prazo.
Origens da crise europeia atual: da crise financeira à crise da dívida
soberana
A crise atual, como é referido por Candelon e Palm, começou com o crash da
bolha imobiliária nos Estados Unidos, em 2007, deixando as instituições
financeiras com graves problemas de liquidez ou até numa situação de
insolvência. Em grande medida, por causa das medidas adotadas para salvar as
instituições financeiras, alguns países da zona euro começaram a enfrentar
dificuldades orçamentais de financiamento da respetiva economia, pelo que isso
determinou uma mutação da crise financeira, numa crise de dívida soberana.
Agora, arrisca-se a transmutar-se numa crise cambial.
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transmissão dos efeitos da crise ao mercado cambial. Num sistema de câmbios
flexível, a moeda depreciará. Numa União Monetária, haverá perturbações
enormes no seu funcionamento que, no limite, podem pôr em causa a sua
sobrevivência. E é justamente isto que se vem passando na União Económica e
Monetária.
Nota: Blyth rejeita que a crise de dívida soberana seja uma crise resultante da má
gestão orçamental. A verdade é que os Estados foram obrigados a fazer um
esforço financeiro brutal de apoio ao sector bancário, absorvendo nos
respectivos balanços os custos da implosão da bolha financeira. Por isso, a crise
nos mercados obrigacionistas começo nos bancos e terminará nos bancos.
Trata-se, em suma, de uma crise bancária transmutada e bem camuflada. O que
aconteceu foi que, na Europa, e após a introdução da moeda única, os bancos
mais importantes do sistema bancário europeu compraram em grandes
quantidades de dívida soberana dos países periféricos e alavancaram-na em
demasia.
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Numa primeira fase, apelou-se ao estímulo orçamental como forma preventiva
de se cair numa nova Grande Depressão. A segunda fase, de 2010 até meados de
2012, enfatizou, pelo contrário, o objetivo da consolidação orçamental, à medida
que a dimensão da dívida pública foi assumindo valores reconhecidos como
insustentáveis. A terceira fase surge a partir desse altura, quando, verificadas as
consequências da austeridade sobre o crescimento económico
(enfraquecendo-o), inúmeras zoes críticas começaram a insurgir-se contra os
alegados excessos dessa austeridade.
Os pacotes de estímulo orçamental, adotados naquela primeira fase pelos
Estados membros, foram claramente sancionados e impulsionados pelas
instituições comunitárias que autorizam, então, o relaxamento no cumprimento
dos objetivos fixados pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento. A mudança de
orientação, do estímulo orçamental para a consolidação, implicou mais do que a
mera reabilitação do PEC, implicou o seu endurecimento.
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através da redução dos salários, dos preços e da despesa pública, com vista à
recuperação da competitividade, supostamente melhor alcançada mediante
cortes na despesa, na dívida pública e nos défices orçamentais. Ao fazê-lo,
acredita-se que se consegue restabelecer a confiança nos negócios, uma vez que o
Estado não só suprimirá o efeito de “crowding out” na economia, como também
não aumentará mais a dívida pública, já de si elevada.
Por seu turno, Corsetti menciona que a questão fundamental que hoje se coloca é
a de saber se os programas adotados em 2011 cortaram de mais e depressa de
mais, conduzindo a uma contração desnecessária e gerando risco
macroeconómico. Os países desenvolvidos enfrentam comummente um
problema de sustentabilidade, resultante do envelhecimento da população e do
aumento crescente dos custos com a saúde. A crise da dívida soberana é um fator
adicional, a juntar a estas preocupações, pelo que os Estados estão empenhados a
encontrar respostas para esse desafio da sustentabilidade. A questão é, então,
sobretudo a de apurar o grau de intensidade e o timing desejáveis, para aplicação
das medidas de consolidação.
O mesmo autor considera que o tipo de resposta a adotar num contexto de crise
deve ser diferente consoante a duração da crise e a posição orçamental inicial
ostentada pelo país em causa. Assim, se se esperar que a recessão não seja muito
prolongada, cortes na despesa pública imediatos terão um impacto moderado
sobre a diminuição do produto e acabam por levar à redução do défice. Neste
hipótese, o efeito direto de contração dos cortes na procura é atenuado por
efeitos indiretos de redução dos juros sobre a dívida soberana, reduzindo de
facto o custo do financiamento privado da economia. Contudo, quando se espera
uma recessão de efeitos duradouros (superior a um ano), a situação muda
radicalmente. Para países que apresentam uma posição orçamental sólida e em
que o prémio de risco soberano é pouco sensível relativamente aos défices
orçamentais, o efeito direto torna-se dominante sobre os efeitos indiretos.
Diversamente para países com uma posição orçamental frágil, ou seja com uma
dívida pública inicial elevada e/ou com elevada sensibilidade do prémio de risco
soberano relativamente aos défices orçamentais, o impacto macroeconómico dos
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cortes de despesas imediatos e efetivos podem ser positivos: as contrações
orçamentais tendem a tornar-se expansionistas.
No entanto, este último argumento tem sido muito criticado, sendo que alguns
autores vêm defender que a austeridade é auto destrutiva. Na verdade, a política
monetária é quase impotente no que diz respeito à ação contra cíclica: as taxas
de juro podem ser reduzidas, mas a verdade é que, estando já próxima do zero, o
resultado seria pouco mais do que simbólico; a política recente do BCE está
ainda por provar no que toca à sua eficácia; a única contribuição que a política
monetária poderia dar seria com a depreciação da taxa de câmbio.
Por sua vez, agora no seio do FMI, os problemas, na opinião destes autores,
respeitam fundamentalmente ao curto prazo, porque é aqui que os efeitos
recessivos são visíveis. Na verdade, o ajustamento orçamental afeta o
crescimento através de dois canais, de efeito contrário: em primeiro lugar, o
ajustamento contribui positivamente para a sustentabilidade orçamental,
reduzindo os riscos de uma crise orçamental; em segundo lugar, o ajustamento
afeta negativamente a procura agregada.
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No caso das economias europeias, a hipótese de manipulação da taxa de câmbio
está vedada e a política do BCE é tendencial e estatutariamente restritiva. Deste
modo, na Europa, a austeridade significa retração da taxa de crescimento da
economia e isto pela ação conjugada dos seguintes fatores:
Uma das críticas mais corrosivas à política de austeridade pode ser encontrada
de novo em Blyth, que nos recorda de forma muito apropriada o quadro
ideológico que dá respaldo a essa política. A austeridade é aqui vista como uma
expressão da “zombie economics”, uma vez que tendo tido concretização prática
em alguns momentos da História, particularmente ao longo do séc. XX, sempre
provou mal e, no entanto, voltou sempre a ressurgir.
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das condições de competitividade através da desvalorização. Não sendo possível
aos países pertencentes à zona euro o recurso à desvalorização cambial nominal,
resta-lhes a desvalorização da taxa de câmbio real através da redução dos preços
do sector não transacionável da economia e uma redução dos custos salariais.
Esta redução implica redimensionar (para menos) a procura interna, ou seja,
conter os factos indutores do consumo dos bens não transacionáveis. A
desvalorização salarial (induzida desde logo pelos cortes nas remunerações dos
trabalhadores da Administração Pública e dos pensionistas) e, bem assim, as
medidas fiscais gravosas aplicadas a sectores tipicamente não transacionáveis
são claramente orientadas pela preocupação de reorientação da estrutura
produtiva do país, de uma produção assente em bens não transacionáveis para
bens transacionáveis e, assim, aumentando a capacidade exportadora da
economia.
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ser dívida individual de países membros, muitos dos quais já hoje
endividados. Assim, países com boa reputação iriam assumir uma dívida
de países que, provavelmente, não teriam, depois, capacidade para
reembolsar;
A última alternativa consistiria, desta feita para países mais pesadamente
endividados, no incumprimento, ou simplesmente, repúdio da dívida.
Desta forma, estes países eliminariam uma fatia significativa da sua
despesa, do serviço da dívida e recuperariam espaço para poderem
respirar do ponto de vista financeiro. O problema está em que o
incumprimento afasta os devedores do acesso ao mercado durante um
período de tempo significativo. Os efeitos de contagio para toda a zona
euro não seriam, também despiciendos, no limite, gerando a sua
destruição.
Resta-nos ainda a hipótese da restauração da dívida, sendo que é vista
como uma alternativa ao “default” (hipótese anterior). Ela não é isenta de
problemas jurídicos e económicos, como são, por exemplo, os problemas
de “holdout” e de financiamento, mas ela é vista, cada vez mais, como uma
solução plausível, a começar junto do próprio FMI.
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Os desenvolvimentos mais recentes na legislação europeia
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especial incidência no desenvolvimento e reforço do mercado interno, no
fomento do comércio internacional e da competitividade, num Semestre
Europeu para uma coordenação reforçada das políticas económicas e
orçamentais, num quadro eficaz de prevenção e correção dos desequilíbrios
macroeconómicos, em requisitos mínimos para os quadros orçamentais
nacionais e uma regulação e supervisão reforçadas no mercado financeiro,
incluindo a supervisão macro prudencial do Comité Europeu dos Risco
Sistémico.
Este pacote legislativo era, então, constituído por cinco regulamentos e uma
diretiva:
Os regulamentos alteram o PEC, quer na sua vertente preventiva (por
exemplo, prevê-se a constituição, pelo Estado incumpridor, de depósitos
remunerados; é estabelecido um mecanismo de alerta para facilitar a
identificação precoce e a vigilância de desvios macroeconómicos; etc.), quer
na sua vertente sancionatória (por exemplo, prevê-se a constituição, pelo
Estado incumpridor, de depósitos não remunerados; aplicação de multas
para os casos de manipulação de estatísticas por parte dos Estados; etc.)
A diretiva é muito importante já que veio a ser definitivamente transposta.
Contém medidas como as seguintes: os Estados membros devem criar
sistemas contabilísticos que abranjam todos os subsectores da
Administração Pública e contenham as informações necessárias para gerar
dados de exercício, com vista à elaboração dos dados baseados no SEC95; os
Estados membros asseguram que o planeamento orçamental se baseia em
previsões macroeconómicas e orçamentais realistas, recorrendo, para isso,
às informações mais atualizadas; os Estados membros devem estabelecer um
quadro orçamental eficaz, credível, a médio prazo que facilite a adoção de
um horizonte de planeamento orçamental de, pelo menos, três anos, a fim de
assegurar que o planeamento orçamental nacional se inscreve numa
perspectiva de planeamento orçamental plurianual; etc.
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aprofundamento do conceito de desvio significativo, complementado por um
mecanismo efetivo de sanções, por referencia ao ajustamento do objetivo
orçamental de médio prazo. Assim, doravante, se a Comissão identificar um
desvio significativo em relação à trajetória de ajustamento ao objetivo
orçamental de médio prazo, e a fim de evitar a ocorrência de um défice
excessivo, será dirigida uma advertência precoce ao Estado-Membro em causa.
Para a avaliação global do desvio em relação ao objetivo orçamental de médio
prazo devem-se ter em conta os seguintes critérios:
critério quantitativo: ao avaliar a variação do saldo estrutural, se o desvio for
de, pelo menos, 0,5% do PIB num só ano, ou de, pelo menos, 0,25% do PIB,
de média anual, em dois anos consecutivos; ao avaliar a evolução da despesa,
se o desvio tiver um impacto total sobre o saldo da Administração Pública
de, pelo menos, 0,5% do PIB num único ano, oi, cumulativamente, em dois
anos consecutivos;
critério qualitativo: o desvio não será considerado significativo se o
Estado-Membro em causa tiver ultrapassado significativamente o objetivo
orçamental de médio prazo, tendo em conta a possibilidade de receitas
excecionais significativas, desde que os planos orçamentais estabelecidos no
programa de estabilidade não coloquem em risco este objetivo ao longo do
período de vigência do programa.
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Por sua vez, o Pacto Orçamental tem em vista o reforço do pilar
económico da UEM, adotando um conjunto de regras destinadas a
promover a disciplina orçamental e a reforçar a coordenação das suas
políticas económicas e a melhorar a governação na área do euro,
concretiza a regra de equilíbrio orçamental: considera-se que existe uma
situação de equilíbrio se o saldo estrutural anual das administrações
públicas tiver atingido o objetivo de médio prazo específico desse país,
tal como definido pelo PEC revisto, com um limite de défice estrutural de
0,5% do PIB.
Mais recentemente (2013), a União Europeia fez aprovar as duas últimas peças
legislativas (dois regulamentos comunitários) do após crise, conhecidas pela
designação de Two Pack.
O primeiro regulamento cria novos procedimentos e regras de
supervisão para países que se encontrem em dificuldade financeira.
Aplicar-se-á em três casos: países em situação de dificuldade financeira
severa; países que se encontrem a receber assistência financeira; países
que estão em vias de abandonar essa assistência. Com esta
regulamentação, pretende-se melhorar a transparência e os canais de
acompanhamento relativamente aos países visados.
O segundo regulamento aplica-se aos países da zona euro e visa
fortalecer a base jurídica do processo de coordenação económica do
Semestre Europeu, dando maiores poderes à Comissão na monotorização
do cumprimentos dos objetivos orçamentais definidos de acordo com o
PEC. Os países devem assim apresentar à Comissão os seus projetos de
orçamento, nessa mesma altura do ano, (15 de Outubro), e a Comissão
terá o direito de se pronunciar sobre eles, podendo inclusive propor que
os projetos de orçamento sejam revistos, o regulamento prevê também
uma monotorização mais apertada aos países da zona Euro, no quando
do procedimento orçamental por défices excessivos.
Esta nova legislação suscita algumas questões e preocupações. Importa verificar
até que ponto a intervenção ativa da Comissão no processo orçamental não
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significará a diluição crescente do papel dos Parlamentos nacionais nesse
processo, a erosão do princípio da democracia financeira e, no limite até, a
europeização dos processos orçamentais. A questão está, pois, em saber se este
regulamento não marcará, pois, o fim dos processos orçamentais nacionais.
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entradas efetivas ou em saídas efetivas de massa monetária no
património de tesouraria do Estado. À luz desta noção, haverá equilíbrio
quando as receitas efetivas servem para cobrir, pelo menos, as despesas
efetivas. As receitas efetivas são todas aquelas que não implicam a
inscrição desse montante no passivo financeiro do Estado, tal como as
despesas efetivas serão aquelas que não implicam a supressão desse
valor no passivo financeiro do Estado. É este critério que está na base da
definição das principais regras em matéria de saldos orçamentais, hoje
vigentes na generalidade dos países mais desenvolvidos: constituem
concretizações do ativo de tesouraria, os saldos global e primário do
orçamento.
3. Critério do orçamento ordinário: neste, as receitas e as despesas de
referência são as receitas e as despesas ordinárias, aquelas que se
repetem em todos os orçamentos, havendo uma situação de equilíbrio
quando as primeiras servem para cobrir, pelo menos, as segundas.
4. Critério do ativo patrimonial do Estado: aqui, as receitas e as despesas de
referência são as receitas e as despesas correntes, ou seja, as receitas e as
despesas que não afectam o património duradouro do Estado. De acordo
com este critério há equilíbrio quando as receitas correntes servem para
cobrir, pelo menos, as despesas correntes.
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para tolerar o endividamento público, quando este se destine a fazer face às
despesas de investimento. O sentido da regra de ouro, concretizada no pacto
orçamental, de que antes tratámos, é diferente: aqui, do que se trata, é de
garantir que o saldo estrutural anual das administrações atinja o objetivo de
médio prazo específico desse país, tal como definido no PEC revisto, com um
limite de défice estrutural de 0,5% do PIB a preços de mercado. Esta previsão
remete-nos para uma outra forma de olhar para o saldo orçamental que não a
convencional.
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habitualmente associada uma carga negativa importante. As principais razões
que se apontam contra os défices orçamentais são as seguintes:
O principal mentor do défice sistemático foi William Beveridge, sendo que este
preconizou o chamado “orçamento humano”, como meio de assegurar a
expansão da economia em período de desemprego, com vista à obtenção do
pleno emprego. A redução do desemprego suportaria a utilização racional do
investimento e da despesa, através de uma intervenção do Estado que corrigisse
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os erros dos privados. Esta ação pública dever-se-ia orientar pelos propósitos
seguintes:
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expansão. Deste modo, visa alcançar a neutralização do ciclo, sem que o
equilíbrio orçamental, numa perspectiva de conjunto, seja desrespeitado: da
depressão, o Estado reduzirá os impostos e aumentará as despesas, recorrendo a
empréstimos; da expansão, a elevação dos impostos em combinação com a
diminuição das despesas ditará o saldo necessário para a amortização da dívida
antes gerada.
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fim do ajustamento, o rácio da dívida for mais baixo do que no último ano de
ajustamento.
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Receitas Tributárias – são as receitas provenientes da cobrança de
tributos (impostos, taxas e contribuições financeiras);
Receitas Creditícias – são as receitas resultantes do crédito público e têm
a particularidade de serem receitas não efetivas. Assim acontece, na
medida em que as receitas creditícias, embora se traduzam numa entrada
de ativos monetários no património de tesouraria do Estado, implicam o
registo no passivo financeiro, de um valor exatamente igual ao da receita
assim obtida.
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Contribuições financeiras – constituem uma categoria autónoma de
tributo, ainda que fiquem a meio caminho entre as taxas e os impostos: o
que as diferencia dos impostos é o facto de, nelas, haver lugar a uma
contraprestação, sendo que o que as diferencia das taxas é p facto de a
prestação ter uma natureza difusa (ela pode, ou não, verificar-se no
tempo). Por exemplo, contribuições para a segurança social. O
pressuposto deste tributo é uma prestação administrativa
presumivelmente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo e têm
ainda uma finalidade compensatória, que deve ser confirmada pelo
destino da receita cobrada.
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redefinição do sistema de tributação das pessoas singulares, com vista ao
alisamento do sistema de taxas, implicando, assim, a redução ou a supressão
da natureza progressiva do sistema;
compensação desta redução da progressividade fiscal, pela redefinição do
sistema de créditos fiscais reembolsáveis, mormente para rendimentos mais
baixos e para famílias em especial condição de vulnerabilidade;
redefinição da tributação das empresas, mormente do sistema de deduções
de custos e reforço da simplificação administrativa de todo o processo fiscal;
etc.
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b) impostos sobre o património: a criação de um sistema efetivo de avaliação
dos prédios urbanos e rústicos fez com que fosse possível estabelecer o
valor patrimonial próximo do valor de mercado desses mesmos prédios.
Assim, permitiu criar um verdadeiro imposto sobre o património (IMI), e
não sobre o rendimento, abrindo, igualmente, a possibilidade de o
legislador descer as taxas, em resultado do aumento dos valores
patrimoniais, que serviriam de base tributável.
c) impostos sobre o consumo: para além da mera redistribuição de riqueza,
como fundamento do núcleo essencial do imposto, é a existência de um
custo social associado ao consumo de determinados bens, tendo em vista
a internalização de externalidades negativas geradas, como seja o
deperecimento da saúde pública ou do meio ambiente, que fundamenta a
arrecadação de receita do Estado. Temos três impostos sobre o consumo
– o imposto sobre o valor acrescentado (IVA); impostos especiais sobre o
consumo (IEC); impostos sobre os veículos (ISV). O IVA é um imposto de
tipo consumo assente no sistema de pagamentos fraccionados destinados
a tributar o consumo final, sendo que a dedução do imposto pago nas
operações intermédias do circuito económico é, desta forma,
indispensável ao funcionamento deste sistema. Os IEC pretendem punir o
consumo de determinados bens, assumindo-se como sendo uma
alternativa à proibição. Assim, a tributação é de caráter repressivo, no
caso dos tabacos e das bebidas alcoólicas e, no caso dos produtos
petrolíferos e energéticos, a tributação visa a proteção do ambiente. Os
IEC constituem verdadeiros impostos pigouvianos, sendo que são um
instrumento incontornável na correção das externalidades. Estamos na
presença de impostos de finalidade extrafiscal. O ISV traz como principal
inovação o alargamento da base de incidência a veículos que, até agora,
não estavam sujeitos ao imposto automóvel e cuja sujeição a imposto
especial no momento da compra se justifica pelos custos ambientais,
viários e de sinistralidade que lhes estão sempre associados. Assim se
sucede com os motociclos e autocaravanas, integrados no âmbito de
incidência do novo impostos, ainda que lhes sejam aplicáveis taxa de
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imposto menos elevadas, pelo menor custo ambientável e viário que
produzem. A base tributável desde imposto é constituída pelo nível de
emissão de dióxido de carbono ou de partículas pesadas.
A dívida pública é a dívida do Estado, sendo que, como qualquer dívida, traduz
um compromisso financeiro ou um conjunto de compromissos financeiros,
vencíveis num determinado prazo. Concorrem para a dívida pública, não apenas
a dívida do Estado, mas também a dívida das administrações infra estaduais.
Assim, a dívida pública constitui o conjunto de situações passivas de que o
Estado seja titular, determinada, em primeira linha, pelo recurso ao crédito.
As receitas do crédito público traduzem receitas não efetivas do Estado, tal como
a amortização da dívida configura uma despesa não efetiva. O recurso ao crédito,
por sua vez, é explicado ou pela existência de défice orçamental, ou pela
existência de um stock prévio de dívida acumulado. Assim, pode dizer-se que o
défice pré-determina e influencia o valor da dívida pública. A existência de dívida
pública condiciona o desempenho orçamental, na medida em que a sua
existência envolve o pagamento de juros, despesa corrente, que concorre para o
saldo global.
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Critério da moeda: a divida pode ser qualificada como dívida interna
quando é denominada em moeda com curso legal em Portugal (o euro) e
como dívida externa quando é denominada em moeda que não tenha
curso legal em Portugal;
Critério da evidência: quando a dívida pública resulta da contratação de
empréstimos ou da emissão de dívida a sua evidência é imediata, sendo,
por isso, dívida expressa. Quando a dívida resulta da assunção de
compromissos que, no imediato até podem trazer receitas para o Estado,
mas que, no futuro, redundarão certamente em despesa, a sua evidência é
diferida no tempo, sendo, por isso, dívida implícita (por exemplo,
compromissos assumidos com o pagamento de pensões pelo sistema de
segurança social). Quando a dívida tem uma evidência meramente difusa,
podendo, no limite, nem vir a concretizar-se, tratamo-la como dívida
condicional (por exemplo, concessão de garantias pessoais por parte do
Estado – avales e fianças), sendo que, neste caso, a dívida só se tornará
efetiva para o Estado em caso de incumprimento por parte do devedor
principal;
Critério do tipo de débito: quando o Estado é devedor principal, então,
estamos perante dívida direta. Quando o Estado é devedor subsidiário,
então, estamos perante dívida acessória do Estado.
Critério da maturidade: atendendo a este critério, podemos qualificar a
dívida pública como de curto prazo (se ela é inferior a um ano), ou
dívida de longo prazo (se a maturidade é superior a um ano);
Critério do exercício orçamental: considera-se que a dívida é dívida
flutuante se a amortização ocorre no mesmo exercício orçamental em
que a dívida foi contraída. A dívida fundada tem que ver quando a
amortização ocorre em exercício diferente daquele em que haja sido
contraída. A dívida flutuante é sempre de curto prazo. Esta distinção
entre estas duas modalidades de dívida é muito relevante, do ponto de
vista não apenas económico e financeiro, mas também do ponto de vits
jurídica. Isto já que o regime aplicável, nos termos da Constituição,
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art.161º alínea h), é diferente, sendo de maior exigência no caso da dívida
fundada.
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antecipada, recompras, operações de reporte e operações com derivados
financeiros), com o objetivo de alterar a estrutura da carteira de dívida existente.
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iii. Bilhetes do Tesouro (BT) – são valores mobiliários de curto prazo com um
valor unitário de um euro, podendo ser emitidos com um prazo até um
ano, colocados a desconto através de leilões ou subscrição limitada e
reembolsáveis no vencimento pelo seu valor nominal.
iv. Certificados de Aforro – são instrumentos de dívida com o objetivo de
captar a poupança das famílias. Têm como característica principal o de
serem distribuídos a retalho, isto é, serem colocados diretamente junto
dos aforrados e terem montantes mínimos de subscrição reduzidos. Os
certificados de aforro só podem ser emitidos a favor de particulares e não
são transmissíveis, exceto em caso de falecimento do titular.
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a formação de capital fixo do Estado, ao passo que as segundas respeitam aos
gastos necessários para assegurar o normal funcionamento da máquina
administrativa;
A segunda distinção, é a que separa despesas em bens e serviços de
despesas de transferência, sendo as primeiras as que asseguram a criação
de utilidades, por meio da compra de bens ou serviços do Estado, enquanto
as segundas limitam-se a proceder a uma redistribuição de recursos,
atribuindo-os a entidades que se situam ou no sector público, ou no sector
privado;
A terceira distinção opõe despesas produtivas a despesas reprodutivas,
consoante se limitem a gerar utilidades no presente ou impliquem o
aumento da capacidade produtiva no futuro;
Pode ainda distinguir-se entre despesas civis e despesas militares, sendo
estas últimas destinadas a manter a Defesa Nacional e as primeiras todas as
demais (económicas, sociais, etc.).
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para outros, para além de causas não institucionais, contam sim, os
fatores de natureza institucional, tais como, a procura de maximização de
ganhos eleitorais, a burocracia, as falhas de percepção e de informação.
37
interno: ele orienta os serviços componentes da Administração Pública
portuguesa na elaboração das respetivas contas ou demonstrações financeiras.
38
O regulamento (CE) nº 2223/96 – SEC 95 - estabeleceu uma metodologia
relativa às normas, definições, nomenclaturas e regras contabilísticas comuns,
destinada a permitir a elaboração de contas e quadros em bases comparáveis,
com o objetivo de descrever de forma sistemática e pormenorizada o total de
uma economia, seus componentes e suas relações com outras economias.
Por outro lado, a ideia de que uma unidade dispõe de contabilidade completa,
traduz-se na circunstância de a mesma dispor de documentos contabilísticos que
reflitam a totalidade das suas operações económicas e financeiras efetuadas no
decurso do período de referência das contas e de um balanço dos seus ativos e
passivos.
39
As unidades institucionais não podem ser consideradas a nível individual, sendo,
por conseguinte, agrupadas em conjuntos designados por sectores institucionais,
os quais podem divididos em subsectores e que agrupam as unidades
institucionais que têm um comportamento económico análogo. Deste modo, as
unidades institucionais são classificadas em sectores com base no tipo de
produtor que são, sendo este tipo aferido através da análise da atividade
principal e da função de unidade institucional em causa, as quais são
consideradas indicadoras do seu comportamento económico.
O conjunto destes cinco sectores constitui o total da economia, sendo que cada
sector se encontra ainda subdividido em subsectores.
40
outros produtores não-mercantis privados e públicos: são classificados no
sector das administrações públicas ou das instituições sem fim lucrativo ao
serviço das famílias.
Concluindo,
41
Os produtores para utilização final própria são unidades institucionais
cuja produção é maioritariamente para utilização final própria, dentro da
mesma unidade institucional;
Os outros produtores não mercantis são unidades institucionais cuja
produção é, na sua maioria, fornecida gratuitamente ou a preços
economicamente não significativos.
Nota: uma instituição sem fim lucrativo (ISFL) define-se, no âmbito do SEC 95,
como uma entidade jurídica ou social criada com o fim de produzir bens e
serviços, cujo estatuto não lhe permite ser uma fonte de rendimentos, lucros ou
ganhos financeiros para as unidades que a criam, controlam ou financiam. Na
prática, as suas atividades produtivas geram excedentes ou défices, mas
quaisquer excedentes que se realizem não podem passar para a posse de outras
unidades institucionais.
Perímetro orçamental e desorçamentação
42
Qualificação como receitas de fluxos financeiros que podem, em futuros
exercícios orçamentais, gerar dívida pública e consubstanciando formas
de dívida implícita.
43
Portugal não escapou, infelizmente, a essa voragem criativa, que tornou opacas,
para não dizer desconhecidas, as situações financeiras de muitas empresas
nacionais, regionais e municipais, com isso contribuindo para um enviesado da
situação financeira real de todo o sector público.
Assim, umas das preocupações centrais do Memorando de Entendimento foi
precisamente “melhorar o atual reporte mensal da execução orçamental, em
base de caixa para as Administrações Públicas, incluindo em base consolidada”.
Mas, para além dos mecanismos de consolidação de contas, existe uma outra
forma de capturar a realidade orçamental de certas entidades empresariais,
consistindo, essa forma, na reclassificação de entidades empresariais.
Consideram-se entidades públicas reclassificadas as que, independentemente da
sua natureza e forma, foram incluídas no sector público administrativo no
âmbito do SEC 95. Isto porque o SEC 95 baseia-se numa ótica económica que
integra, nas administrações públicas, as instituições controladas pelo Estado, seja
qual for a sua natureza, desde que não-mercantis. Considerando-se, por seu
turno, não mercantil, a entidade que não vende a sua produção a preços
economicamente significativos, de tal modo que a principal fonte de
financiamento não é a receita associada a um preço, tarifa ou taxa pelos bens e
serviços que presta, engloba-se neste domínio, aquelas que têm receitas próprias
de valor inferior a 50% dos seus custos de produção.
44
financeiros a que o sector público está adstrito, bem como para retirar o
investimento público e dívida associada do balanço do Estado.
Para além disso, as garantias que o Estado geralmente concede, nas PPP, ao
financiamento privado, acabam por expô-lo a custos ocultos ou implícitos mais
elevados do que os resultantes do financiamento público tradicional. A existência
de um modelo, internacionalmente aceite, de reporte e contabilidade
contribuiria certamente para promover uma maior transparência na celebração
de PPP e para um acrescido escrutínio público.
45
Para além destas limitações constantes na LEO, cumpre mencionar a
concretização de uma cláusula “gateway” no diploma regulador das PPP, nos
termos da qual “a qualquer momento pode pôr-se termo ao procedimento em
curso relativo à constituição da parceria, sem direito a qualquer indeminização,
sempre que, de acordo com a apreciação dos objetivos a prosseguir, os
resultados das análises e avaliações realizadas até então ou os resultados das
negociações levadas a cabo com os concorrentes não correspondem, em termos
satisfatórios, aos fins de interesse público subjacente à constituição da parceria,
incluindo a respetiva comportabilidade de encargos globais estimados”
(art.18º/3).
46
tributária, referente a tributos cobrados nessas circunscrições; por outro
lado, traduz-se na autonomia fiscal, ou seja, na possibilidade,
constitucionalmente conferida de, as mesmas entidades tributárias
exercerem poderes tributários em relação a esses tributos/impostos.
47
Capítulo 4 – Morfologia e vicissitudes do Orçamento do Estado
48
No que diz respeito à sua natureza e características, o OE é uma lei, em sentido
formal e em sentido material. A concretização de um sistema monista em
Portugal não aconteceu logo na primeira versão da Constituição de 1976. Foi
preciso esperar pela revisão constitucional de 1982 para que tal sucedesse:
desde então, a lei do OE é só uma e contém, pois, esses dois elementos, antes
disseminados por dois documentos distintos.
Isso faz da lei do OE uma lei muito particular, marcada por um objeto
ambivalente: o OE é uma lei (vertente normativa); mas também é um conjunto
de mapas, agregados e desagregados de receita e despesa (vertente
contabilística).
Por outro lado, associada a esta dupla incidência, mas com ela não se
confundindo, verifica-se uma outra ambivalência: o OE pode ser encarado
atendendo à sua dimensão económico-financeira e ele aqui é verdadeiramente o
Orçamento do Estado (plano de condução das finanças públicas do país e
instrumento primordial da ação macroeconómica); ou pode ser olhado
atendendo à sua dimensão jurídica, ou seja, como instrumento de concretização
do princípio da democracia financeira, regulando e calibrando um equilíbrio
tenso entre os diversos intervenientes.
É certo que a LEO é uma lei de valor reforçado. Ela própria, aliás, de uma forma
algo redundante e inútil, se auto qualifica como lei de valor reforçado (art.3º
LEO). De forma redundante, pois assim já ela é considerada pela própria
49
Constituição e só à Constituição compete definir o que sejam leis de valor
reforçado. Acontece que o OE também é uma lei em sentido formal e material e é
também considerada, por diversos autores, como sendo uma lei de valor
reforçado.
50
No passado, bastava que o processo orçamental fosse certo e devido. Hoje isso
não basta: o resultado orçamental é que tem de ser certo e devido, querendo isso
dizer que deve ser concordante com as exigências de disciplina orçamental.
Posto isto, podemos assim identificar, como fazendo parte integrante do corpo
regulador de uma LEO, três eixos principais de matérias ou temas:
As razões mais determinantes das alterações mais recentes são de dupla ordem:
51
Trata-se de um mecanismo “backstop” financeiro temporário, enquadrado pelo
Pacto de Estabilidade e Crescimento relativamente à política de supervisão
multilateral e completado por outros mecanismos desenvolvidos na Europa após
a crise de 2008/2009.
52
1) Os sistemas orçamentais estão menos concentrados nos procedimentos e
nos formatos orçamentais e mais nos resultados orçamentais, pelo que a
micro orçamentação está subordinada aos objetivos da macro
orçamentação. Neste sentido:
53
Segunda característica: desenvolvimentos de técnicas orçamentais “top-down”
– implica a definição prévia de tetos máximos de despesa para cada
ministério sectorial e só depois a concretização de dotações para cada
rubrica orçamental. Em certos países, a utilização de tais técnicas aparece
associada à implementação de processos orçamentais de duas fases, sendo
que estes processos visam obviar às tensões sentidas em diversos sistemas
orçamentais entre totais previstos no orçamento e nas suas partes e evitar
tentações despesistas, mormente em períodos de expansão.
54
fins, orientando-se a gestão por preocupações de eficiência e eficácia. A
performance budgeting supõe uma alteração estrutural orçamental:
definição de programas orçamentais baseados em atividades. As
especificações fundamentais a considerar num modelo atual de performance
budgeting são as seguintes: regras de agregação das despesas na estrutura de
programas; cobertura institucional dos programas e responsabilidade pela
sua gestão; implementação de um sistema de informação de gestão de
desempenho adequado; implementação de um sistema de financiamento que
relacione os outputs (resultados orçamentais) com os seus custos
orçamentais e benefícios, avaliando-se, assim, cabalmente, a respetiva
performance.
1. Anualidade
55
O sistema de gerência tem vantagens, porquanto torna fácil e clara a execução
orçamental. No entanto dificulta a responsabilização de cada Governo pela
elaboração e execução dos orçamentos que lhe são imputáveis.
O s orçamentos de exercício, ao invés, se têm a vantagem de permitirem mais
facilmente a responsabilização do Governo, têm uma desvantagem: num
determinado ano não sabemos ao certo a situação de tesouraria.
Nota: No entanto, alerta-se para o facto de, mesmo quando a lei prevê a
existência de mapas plurianuais, as verbas neles incluídas devem ser inscritas no
OE de cada ano, sob pena de não poderem ser realizadas por falta de cabimento
orçamental (art.106º/1 CRP).
56
5º LEO – ou seja, as contas fecham dia 7 de Janeiro, apesar do Orçamento cessar a
31 de Dezembro).
2. Plenitude
Para que o referido conhecimento seja cabal, exige-se mesmo no nº3 que “o total
das responsabilidades financeiras resultantes de despesas de capital assumidas
por via de compromissos plurianuais, decorrentes da realização de
investimentos com recurso a operações financeiras cuja natureza impeça a
contabilização direta do respetivo montante total no ano em que os
investimentos são realizados ou os bens em causa postos à disposição do Estado
conste dos Orçamentos de Estados, das Regiões Autónomas e das Autarquias
Locais.
as operações de tesouraria;
a gestão patrimonial do Estado;
os fenómenos de independência orçamental.
57
segurança social: só elas têm de constar num único orçamento e de estar todas
nesse mesmo orçamento.
3. Discriminação
58
a limitação do montante de uma despesa ou de uma receita;
a afetação de receita temporária a uma despesa determinada;
a personalização de um serviço público.
4. Publicidade
59
5. Equilíbrio
60
quando as receitas efetivas servem para cobrir, pelo menos, as despesas
efetivas. As receitas efetivas são todas aquelas que não implicam a
inscrição desse montante no passivo financeiro do Estado, tal como as
despesas efetivas serão aquelas que não implicam a supressão desse
valor no passivo financeiro do Estado. É este critério que está na base da
definição das principais regras em matéria de saldos orçamentais, hoje
vigentes na generalidade dos países mais desenvolvidos: constituem
concretizações do ativo de tesouraria, os saldos global e primário do
orçamento.
3. Critério do orçamento ordinário: neste, as receitas e as despesas de
referência são as receitas e as despesas ordinárias, aquelas que se
repetem em todos os orçamentos, havendo uma situação de equilíbrio
quando as primeiras servem para cobrir, pelo menos, as segundas.
4. Critério do ativo patrimonial do Estado: aqui, as receitas e as despesas de
referência são as receitas e as despesas correntes, ou seja, as receitas e as
despesas que não afectam o património duradouro do Estado. De acordo
com este critério há equilíbrio quando as receitas correntes servem para
cobrir, pelo menos, as despesas correntes.
61
a) Enquanto as regras clássicas respeitam tendencialmente ao OE, as novas
reras respeitam a todas as Administrações Públicas (incluindo
Administrações Regionais e Locais);
b) Enquanto as regras clássicas regulam fundamentalmente a fase de
elaboração e aprovação do OE, nas novas regras está em causa todo o
ciclo orçamental, ou sejam, respeitam também à fase da execução;
c) Enquanto as regras orçamentais clássicas se baseiam fundamentalmente
na estrutura e no procedimento orçamentais, as novas regras centram-se
sobretudo nos resultados orçamentais;
d) Enquanto as regras clássicas desligam a micro orçamentação da macro
orçamentação, as novas regras associam claramente estas duas
dimensões, subordinando a primeira à segunda;
e) Enquanto as regras orçamentais clássicas se filiam na perspetiva
tradicional que concebia o orçamento como um orçamento de meios
focados na dotação orçamental, as novas regras alicerçam-se nos fins ou
objetivos orçamentais;
f) Enquanto as regras clássicas concebem a micro orçamentação a partir de
uma função de controlo, as novas regras orçamentais são tributarias de
uma função de controlo, as novas regras orçamentais são tributarias de
uma função de gestão;
g) Enquanto que as regras clássicas são sobretudo de cariz continental, as
novas regras traduzem claramente uma nova influência dominante: a
influência da literatura internacional mais relevante produzida em
matéria de orçamentação pública;
h) Enquanto as regras clássicas estão consagradas, de há muitas décadas, no
nosso direito orçamental, algumas remontando ao direito liberal clássico,
as novas regras orçamentais aparecem no nosso direito orçamental,
sobretudo, a partir da aprovação da atual LEO e suas sucessivas
alterações.
62
1) Estabilidade orçamental
Ademais, este novo preceito, na redação que resulta da proposta, apresenta, para
nós, uma vantagem inegável sobre o atual art.9º: o equilíbrio ou excedente
orçamental aí exigido não conta com as exceções dos arts.23º, 24º e 25º, o que,
para o prof. Guilherme d’Oliveira Martins, é obviamente de saudar.
63
Este princípio pressupõe, antes de mias nada, a ideia de divulgação ao público,
no que diz respeito à estrutura e funções do Estado, às intenções da política
orçamental, às contas públicas e às projeções. Nesta medida, o principio facilita
os mecanismos de controlo orçamental, nos planos político, administrativo e
jurisdicional, de prestação de contas e de responsabilização financeira.
Pressupõe também a abertura interinstitucional: dos governos nacionais em
relação às instâncias internacionais competentes e interessadas; do governo em
relação ao parlamento; dos sectores e subsectores do Estado em relação ao
governo e, especialmente, ao ministro das finanças.
Para o prof. Guilherme d’Oliveira Martins, o princípio da transparência
orçamental encontra-se vertido na LEO, desde a sua versão inicial (art.10º-C da
versão atual).
3) A equidade intergeracional
Importa contudo fazer notar que a previsão deste princípio tem tanto de vago
quanto de insuficiente. Com efeito, nada se concretiza na LEO sobre o modo de
dar explicitação, no corpo da Lei do OE (e designadamente a nível dos mapas
orçamentais), a esta exigência de equidade.
64
O acolhimento das novas regras numéricas na legislação portuguesa
Regras procedimentais
Regras numéricas
65
ii. Regras de dívida – no caso da LEO, logo em 2011, previu-se uma regra
importante, o art.87º, relativa ao estabelecimento, pela lei do Orçamento,
de limites de endividamento dos subsectores do Estado. determinou-se
ademais que tais limites possam ser inferiores ao que resulte das
respetivas leis de financiamento, quando tal resulte da necessidade de
cumprir o PEC. Nas leis de financiamento aplicadas ao subsectores em
causa, o mesmo pode ser verificado: na Lei das Finanças das Regiões
Autónomas, prevê-se a fixação anual de limites à contratação de
empréstimos e ao endividamento, sendo que em caso de violação dos
limites de endividamento prevê-se redução das transferências de igual
valor ao excesso do endividamento; por sua vez, na Lei das Finanças
Locais, concretiza-se a previsão de limites idênticos quer quanto ao
endividamento líquido, quer quanto à contratação de empréstimos.
O art.16º-A prevê, no seu nº2, que, em acréscimo à variação máxima do
endividamento líquido, o Estado possa financiar-se antecipadamente até
ao limite de 50% das amortizações previstas de dívida pública fundada, a
realizar no ano subsequente. Caso esse financiamento antecipado se
concretize, o limite de endividamento é reduzido pelo financiamento
antecipado efetuado.
Ainda, na última alteração à LEO, em 2013, foi introduzida a regra de ouro
da dívida pública: art.10º-G.
iii. Regras de despesa – podemos considerar que existem, hoje, dois tipos de
regras de despesa: uma de caráter implícito e indireto e que resulta da
necessária subordinação do OE aos limites máximos de despesa fixados
pela lei de programação orçamental plurianual (art.12º-D); a segunda, de
caráter expresso e direto que consta do art.12º-C/6. (ver artigo).
O regime das vinculações externas consta do art.17ºLEO, o qual traduz, por sua
vez, um desenvolvimento do disposto do art.105º/2CRP. Nos termos daquele
art.17º, constituem vinculações externas:
66
as obrigações decorrentes de lei, de contrato, de sentenças judiciais ou
outras obrigações determinadas pela lei (despesas obrigatórias);
as obrigações decorrentes do Tratado da União Europeia;
as opções em matéria de planeamento e a programação financeira
plurianual.
Para além disso, fruto dos constrangimentos atuais com que se debate a
economia e as finanças públicas portuguesas e dos compromissos assumidos
por Portugal no Memorando assinado com a Troika, diversas medidas de
austeridade têm vindo a ser adotadas e, de entre elas, um conjunto muito
significativo de cortes ou reduções de prestações remuneratórias, sobretudo dos
trabalhadores da Administração Pública. Ora, o teor e a expressão destas
medidas interferem com algumas vinculações externas, mormente com as
denominadas despesas obrigatórias.
Cabe, ainda, analisar em que medida fará sentido falar em despesas obrigatórias,
tratando-as, consequentemente, como vinculação externa do OE. A partir do
disposto no art.16º/1LEO, dir-se-á que as despesas obrigatórias derivam, por
um lado, de obrigações decorrentes da lei ou de contrato e, por outro, de
obrigações associadas ao cumprimento de sentenças judiciais. No plano da
execução orçamental, estas vinculações associadas a despesas obrigatórias
67
resultantes de lei ou de contrato projetam-se na concretização do princípio da
legalidade da despesa. É curioso notar que OE assume, hoje, essa legalidade
(dupla): na medida em que OE pode ser fonte criadora de despesa, pode criar
ativamente despesa pública, sendo portador de legalidade genérica; na medida
em que ele acolha, passivamente, mormente nos mapas orçamentais, despesa
pública criada, quer por leis, quer por contratos, assumindo-se portador da
legalidade específica.
68
A LEO procura, especialmente no seu art.31º, formatar o conteúdo desejável do
OE, porque pretende, pela positiva, indicar o conjunto de matérias que podem e
devem estar no articulado do Orçamento, ainda que o faça de forma meramente
exemplificativa.
69
orçamental ou perante um cavaleiro orçamental: é o caso, por exemplo, das
regras sobre o regime de férias, feriados e faltas;
matérias que configuram claramente um cavaleiro orçamental: é o caso, por
exemplo, do disposto no art.75ºLEO, relativo à representação da segurança
social, nos processos especiais de recuperação de empresas e insolvência.
70
executado, e em áreas delimitadas pela proposta do Governo, que tem o
exclusivo da iniciativa de alteração e o encargo e responsabilidade pela
execução orçamental. Assim, os deputados, a pretexto de uma proposta de
alteração orçamental, não podem proceder a modificações orçamentais
que não se inscrevam na proposta do Governo, ou seja, alargar essas
modificações a outras áreas, não pretendidas pelo Governo. Não se
pretende que a Assembleia da República esteja vinculada à proposta de
alteração feita pelo Governo. Pode aceitá-la ou rejeitá-la. Pode aumentar
as receitas, como se propõe, ou aumentá-las numa percentagem diferente
do que a pretendida. Igualmente poderá não diminuir as despesas, ou
diminuir menos do que se pretende. Não pode é proceder a alterações que
extravasem o âmbito da proposta.
71
do apoio recíproco pode induzir os outros a desviarem-se também.
Consequentemente, os decisores eleitos exigem mais (despesa) com um
projeto de interesse local, sempre que o custo desse projeto seja
suportado por contribuintes não locais.
72
Europeia. Ainda que legal, o lobbying tem sempre associado um efeito
potenciador e incremental sobre a despesa pública, constituindo uma das
várias causas de crescimento dessa despesa.
A rent seeking foi estudada para descrever os efeitos das tentativas dos
grupos de interesse em obter lucros, a partir das restrições de acesso à
atividade económica, colocadas pelos poderes públicos (por exemplo, nas
situações de monopólio). Ela é explicada, desde logo, pela circunstância
dos mercados de concorrência imperfeita serem caracterizados pelo
poder de mercado, gerando ou podendo gerar, para os produtores, uma
renda económica. A captação de renda por parte desses produtores com
poder de mercado realiza-se através ou da compra de direitos exclusivos,
ou de atividades protegidas por barreiras anti concorrenciais, ou da
pressão sobre os poderes políticos e jurídicos no sentido da criação
desses direitos e proteções (lobbying). Muitos recursos são despendidos
no esforço da captação de renda, sendo que essa pressão concorrencial
gera, por sua vez, um equilíbrio, uma subida de preços que pode anular os
ganhos extraordinários em que essa renda se traduz, aumentando os
custos de captação até que se perca o lucro económico. Este equilíbrio de
rent seeking conduz a várias perdas de bem-estar.
73
introdução de mecanismos de concorrência na Administração.
74
2. Início dos trabalhos de preparação do OE para o ano seguinte (início do
2º semestre);
3. Negociação interministerial;
4. Aprovação, em Conselho de Ministros, da proposta de Lei das GOP
(Setembro);
5. Envio da proposta de Lei das GOP à Assembleia da República (Setembro);
6. Aprovação, em Conselho de Ministros, das propostas de lei do Quadro
Plurianual de Despesa Públicas e do OE (Outubro);
7. Envio das propostas à Assembleia da República (Outubro);
8. Discussão (Novembro);
9. Aprovação (Dezembro).
75
d) OBZ consiste na justificação detalhada das despesas que cada serviço
pretende inscrever, implicando a obrigatoriedade de indicação de
alternativas e a avaliação total de todas elas;
e) A OBZ deve ser aplicada na organização e na elaboração do segundo ou
terceiro OE, após início de nova legislatura, aquando da apresentação da
proposta de Lei de OE, o Governo deve incluir, junto com os demais
elementos informativos, informações relevantes relativas à
implementação, em cada programa de atividades, da OBZ.
Para além do OBZ, também a programação orçamental visa pôr cobro a essa
tentação incremental ostentada pelos sistemas de orçamentação convencionais.
A LEO estabelece a programação em sentido material: o novo quadro “plurianual
de programação orçamental” (artigo 12º-D). O objetivo e o objeto deste quadro é
o de definir, com caráter plurianual, os limites da despesa da administração
central, financiada por receitas gerais e em cumprimento aos objetivos
constantes no PEC e, bem assim, definir os limites de despesa para cada
programa orçamental, para cada agrupamento de programas e para o conjunto
de todos os programas.
O processo orçamental originário: a aprovação do OE
76
Governo à Assembleia da República, até 15 de Outubro de cada ano. A iniciativa
em matéria orçamental é um exclusivo do Governo: art.161º/1 alínea g) CRP.
77
à necessidade ou não de novos decretos de execução orçamental para sustentar o
regime de prorrogação.. no entanto, nos termos no art.41º/8 veio prever-se a
faculdade de o Governo aprovar, por decreto-lei, os dispositivos de execução
orçamental apenas e quando venham a justificar-se.
78
A execução orçamental, de que é responsável máximo o Governo, é feita todos os
dias e desde o primeiro dia em que o OE está em vigor. Ela é feita,
quotidianamente, a todo o momento, pelos serviços do Estado a que respeita o
orçamento. O gestor orçamental é, então, em primeira linha, o dirigente máximo
do serviço e os respetivos responsáveis pela gestão financeira.
Orçamento da Receita:
Orçamento da Despesa:
79
A necessidade de efetuar alterações orçamentais resulta da execução orçamental.
Há três grandes graus:
1. A fiscalização Política
80
controlo à posteriori: apreciação anual da Conta Geral do Estado;
controlo concomitante: apreciação do modo como os Governos executam.
Para além destes dois controlos a Assembleia exerce, ainda, uma fiscalização ex
ante, já que, ao votar o Orçamento do Estado, a Assembleia da República exerce
uma primeira fiscalização.
2. A fiscalização administrativa
3. A fiscalização jurisdicional
81
A fiscalização jurisdicional da execução do Orçamento do Estado está confiada ao
Tribunal de Contas, que é constitucionalmente um verdadeiro tribunal e órgão
supremo de auditoria, integrado no poder judicial, ao qual compete:
O Tribunal de Contas
82
bem como a economia e eficácia das entidades sujeitas aos seus poderes de
controlo.
O Tribunal de Contas tem funções diversas que vão desde a capacidade para
fazer apreciações nos vários domínios das Finanças Públicas e do Direito
Orçamental, até ao exercício de diversos tipos de fiscalização (prévia,
concomitante e sucessiva) e à aplicação de sanções que a lei manda aplicar em
resultado do apuramento da responsabilidades financeiras, em sentido estrito.
83
Perante a necessidade de ver assegurada a disciplina financeira e orçamental e
de garantir o rigor e a transparência na gestão dos dinheiros públicos, o Tribunal
está confrontado com desafios diversos e complexos devidos às novas formas de
gestão de serviços públicos, à transformação do Estado social num Estado
regulador, à adoção pela Administração Pública de formas jurídico-privadas de
atuação, bem como às exigências de qualidade acrescida das despesas públicas.
Deste modo, cabe aos órgãos de auditoria e fiscalização, como o Tribunal de
Contas, uma tarefa essencial de credibilização das finanças públicas tendentes à
boa e correta utilização dos dinheiros públicos.
i. Competência consultiva;
ii. Competência jurisdicional – o Tribunal de Contas julga e efetiva
responsabilidades financeiras;
iii. Fiscalização à priori das despesas públicas – o Tribunal examina e
concede o visto ou emite declaração de conformidade relativamente a
diversos atos geradores de despesa: art.5º/1 alínea c) LOPTC;
iv. Fiscalização concomitante e sucessiva – arts.49º e 50º da LOPTC.
Segundo o prof. Sousa Franco, o controlo orçamental dos dinheiros públicos tem
principalmente duas ordens de fundamentos:
84
fundamentos jurídico-políticos: assegurar que o Executivo se mantém dentro
dos limites da lei e dos que foram assinalados pelo Parlamento, através da
aprovação da Lei do Orçamento;
fundamentos económicos: evitar os desperdícios e a má utilização dos
recursos públicos.
Por outro lado, este controlo da atividade financeira pública, através das
observações e recomendações formuladas, representa, também, uma missão
pedagógica e um contributo para o equilíbrio da vida financeira.
85
financeira e efetiva responsabilidade por infrações financeiras”, define, ao nível
legal, as atribuições do Tribunal, a sua missão, o interesse público que o Tribunal
visa realizar.
86
Nota: é certo que as associações públicas em geral estão sujeitas à jurisdição do
Tribunal de Contas – art.2º/2d LOPTC – mas está, à partida, excluída para todas
a fiscalização preventiva das despesas. Mais ainda, o conteúdo e os modos de
controlo variam de espécie para espécie, conforme o juízo do Tribunal acerca da
natureza pública, ou não, das suas finanças.
Assim, enquanto as academias estão sujeitas a prestação de contas
(porque financiadas diretamente por verbas orçamentais do Estado), já tal não
sucede nem com as ordens profissionais, nem com a Casa do Douro.
Essa diversidade do controlo está de acordo naturalmente com a
diversidade do próprio regime financeiro de cada espécie de associações
públicas e das suas relações com as finanças do Estado, que varia muito, tanto no
que se refere ao espeto orçamental, como no que se refere à natureza das
respetivas receitas. De facto, da natureza pública das associações públicas não
resulta como regra, nem a natureza pública das suas finanças, nem a natureza
fiscal das suas receitas.
87
Desta forma, o art.2º/3 LOPTC, acaba por enunciar, de forma clara, os princípios
que devem guiar a interpretação do âmbito da jurisdição do Tribunal de Contas.
88
moderna doutrina alude que estamos perante um ato de natureza jurisdicional,
que gera anulação do ato relativamente ao qual houve recusa, tendo as últimas
leis orgânicas do Tribunal assumido esta orientação.
Assim, a natureza do visto pode ser apreciada à luz de dois critérios: o do caráter
do órgão que o produz e do conteúdo próprio da decisão em que se
consubstancia.
Para o prof. Guilherme d’Oliveira Martins, não há dúvidas de que estamos
perante uma autêntica decisão de natureza jurisdicional.
Apesar da importância formal do visto, verifica-se, nos últimos anos, uma perda
da sua relevância prática, designadamente em razão do estipulado art.45ºLOPTC,
quanto à produção de efeitos não financeiros de atos submetidos a fiscalização
prévia.
89
encaminhadas para o Ministério Público, que funciona junto do Tribunal de
Contas, para um eventual apuramento de responsabilidades financeiras.
Estas são algumas situações que dão lugar a recomendações e reservas por parte
do Tribunal de Contas em sede de auditoria.
O artigo 59º LOPTC prevê que, nos casos de alcance, desvio de dinheiros públicos
e ainda pagamentos indevidos, pode o Tribunal de Contas condenar o
responsável a repor as importâncias abrangidas pela infração, sem prejuízo de
qualquer outro tipo de responsabilidade em que o mesmo possa incorrer.
Por outro lado, pode também haver reposição por não arrecadação de receitas:
nos casos de prática, autorização ou sancionamento, com dolo ou culpa grave,
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que impliquem a não liquidação, cobrança ou entrega de receitas com violação
das normas legais aplicáveis, pode o Tribunal de Contas condenar o responsável
na reposição das importâncias não arrecadadas em prejuízo do Estado ou de
entidades públicas. É o caso, por exemplo, do funcionário que deixa passar os
prazos de caducidade e prescrição.
No entanto, a punição que existe nestes casos passa mais pelo procedimento
disciplinar do que pela via da responsabilidade financeira.
Quanto aos responsáveis pela reposição, eles constam do art.61º LOPTC: recai
sobre o agente ou agentes da ação, que podem ser os membros do Governo, os
gerentes, dirigentes ou membros dos órgãos de gestão administrativa e
financeira, e outras entidades sujeitas à jurisdição do Tribunal de Contas.
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fiscalização da legalidade, regularidade e correção económica e financeira da
aplicação desses mesmo dinheiros e valores públicos.
Por tudo isto, o legislador português tem ainda um longo caminho a percorrer
quando ao aperfeiçoamento do modelo vigente, sendo que deveria repensar os
mecanismos institucionais e procedimentais disponíveis para o reforço da
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credibilidade e dos meios de financiamento disponíveis num quadro de
consolidação orçamental.
Talvez o Conselho das Finanças Públicas, na qualidade de controlar técnico
independente, constitua um elemento subjetivo novo, no sentido de
despolitização do estabelecimento do quadro de política macroeconómica e
orçamental.
Por tudo isto, os legisladores devem focar-se na gestão e apuramento dos riscos,
sendo necessário encontrar estruturas subjetivas complementares entre o
controlo financeiro jurisdicional e o controlo técnico não jurisdicional, de forma
a exigir dos governantes uma sábia administração dos recursos públicos,
satisfazendo as necessidades coletivas, com o menor sacrifício do património
pessoal do cidadão contribuinte.
É neste quadro que aparece a figura do controlador técnico independente:
independent fiscal watchdog. Estas novas instituições verificam a proposta do
orçamento, ou outras propostas legislativas orçamentais, de forma a assegurar a
transparência e exatidão das estimativas e previsões orçamentais, tendo em
conta o equilíbrio, a consolidação orçamental, a dívida, os limites à despesa e as
projeções macroeconómicas e financeiras, podendo fazer advertências prévias
quanto aos riscos e aconselhar quanto às reformas estruturais a empreender.
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