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Universidade Federal Fluminense. Bacharel e Licenciada em História.
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Tradicional área de meretrício da região central de Niterói. Localizado na Avenida Hernani do Amaral Peixoto
em cima da Caixa Econômica Federal.
3 HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo. Centauro, 2004.
4
Por discurso oficial caracterizo a fala midiática, sua autoridade e sua capacidade de produzir real e construir
verdades, a partir de "esquemas dominantes de significação e interpretação do mundo" (COIMBRA, 2001,
p.25)
5
Vale notar que tanto a 76ª DP como a DEAM se localizam no mesmo endereço. A DEAM fica em cima da
76ªDP na Av. Ernani do Amaral Peixoto, a mesma rua do Prédio da Caixa.
6
CALABRIA, Amanda. Violência e Criminalização: O movimento de resistência das prostitutas do “Prédio da
Caixa”. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal Fluminense, 2016.
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ataques de violência física e seu local de trabalho passou a ser alvo constante de repressão,
traduzida em batidas policiais. O movimento, entretanto, esgotou-se rapidamente, dada à falta
de apoio político, ao silêncio da mídia, ao descaso jurídico e às intimidações e ameaças
sofridas pelas organizadoras. O conjunto de fatores elencados acabaram por calar as
protagonistas e dispersá-las, instaurando um silêncio a respeito.
Na interpretação das fontes, a operação de desocupação está relacionada a dois fatores:
a mudança de delegado da 76ª DP e, consequentemente, a elevação da taxa de arrego dirigida
ao meretrício, e a necessidade de conter a atividade sexual no prédio, por conta da construção
de um edifício da Justiça Federal ao lado do tradicional ponto7. Chama a atenção que a
operação tenha sido realizada logo depois de anunciada a grande intervenção urbanística, por
parte da prefeitura8. Relacionou-se a mesma à “requalificação” do espaço urbano, na cidade
de Niterói, que tem contado com um aumento do efetivo policial nas ruas, a construção de um
corredor do judiciário na Av. Amaral Peixoto9 e a política de “limpeza” direcionada a
segmentos considerados indesejáveis, as classes perigosas10, entraves para o projeto de
“requalificação” do espaço urbano.
No cotejamento das fontes, elucidou-se como frequentes as batidas policiais sob
alegações de proxenetismo, casa de prostituição, exploração sexual e de menores ou vínculo
ao tráfico11, ocorrências que podem criminalizar a prostituição. Como verificado, ao menos
nos casos pesquisados, não se registraram provas de nenhum dos eventos.
7
Ao lado do edifício “da Caixa”, localiza-se um terreno, hoje em construção, da Justiça Federal do Rio de
Janeiro, doado pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU) afim de edificar uma subseção do poder judiciário
na cidade.
8
Em 2013, foi aprovado o projeto de “revitalização” da área central de Niterói através de uma operação urbana
consorciada, realizada a partir da parceria público-privada. O intuito é modernizar a região, a referir os bairros:
Centro, São Domingos, Ponta D’Areia, São Lourenço, Morro do Estado, ingá e parte do Gragoatá e da Boa
Viagem. Para maiores informações acessar o Projeto de Lei n.193/2013.
9
A Avenida Ernani do Amaral Peixoto é a principal via do centro de Niterói. Além de concentrar grandes
prédios comerciais, conta com os prédios da Justiça do Estado e do Trabalho, a Câmara Municipal de Niterói e a
OAB.
10
COIMBRA, Cecília. OPERAÇÃO RIO. O mito das classes perigosas. Um estudo sobre a violência urbana, a
mídia impressa e os discursos de segurança pública. Intertexto, Niterói, RJ, 2001.
A autora utiliza a noção de classes perigosas para designar segmentos sociais historicamente marginalizados,
criminalizados. Considerados entrave a uma perspectiva de cidade moderna, civilizada. O uso do conceito, bem
como a sua extensão para “segmentos indesejados” se restringe ao entendimento de classes sociais no contexto
urbano.
11
No trabalho monográfico é desenvolvido o debate, levantado pelas ativistas profissionais do sexo, sobre a
comumente abordagem policial nos espaços de prostituição. Essas são realizadas no intuito de criminalizar o
meretrício. Alega-se “exploração sexual” e “casa de prostituição” ao se referir à atividade de exploração de
outrem, sendo a segunda realizada em uma determinada localidade. “Exploração sexual”, pela lei significa
induzir ou atrair alguém à prostituição ou forma de exploração sexual. Na prática, as trabalhadoras não tinham
3
Aproximei-me do campo enquanto ativista obstinada com a escuta das demandas das
prostitutas, no momento de ocupação, na Audiência Pública sobre Segurança Pública, em
Niterói, para denúncia da operação policial. Eu e outras mulheres oferecemos apoio ao
movimento através de gravações, filmagens e divulgação. Realizamos algumas entrevistas
com as meninas12 e um vídeo de divulgação do ato Puta Dei 13. Fizemos visitas frequentes ao
“Prédio” para acompanhar os passos do movimento. Entretanto, mesmo tendo construído uma
relação amistosa, o distanciamento social entre nós e elas, permeado por assimetrias (lugar
social, classista e racial), acompanhou nossos encontros.
De início, meu interesse restringia-se em apoiar o ativismo. Somente quando o
movimento foi silenciado, caindo numa “zona de sombra” e medo, que a contribuição
acadêmica foi pensada, em termos de uma alternativa para se falar a respeito. Em um primeiro
momento, dediquei-me à pesquisa pelo viés etnográfico, orientada pela observação
participante14, posto que dispusesse de tempo, diálogo e inserção para acompanhar as
dinâmicas e as mudanças de dinâmicas, inerentes a esse espaço tão multifacetado. Por entre
olhares, registros e uma escuta sensível fui tecendo as novas teias, em diálogo com as
meninas. Entretanto, só foi possível acompanhar o movimento e as práticas no “Prédio” até
certo ponto, dada à retirada para outros espaços daquelas prostitutas com quem eu havia
estabelecido diálogo e a chegada de outros atores, compondo um cenário diferente, em que
posições conflitantes passaram a disputar território no ambiente da pesquisa.
A partir de então, escolhi a história oral como uma possibilidade metodológica para a
catalisação das narrativas nas entrevistas, refletindo sobre a história do movimento recente e
cafetina ou cafetão e desempenhavam o ofício sem a indução ou exploração de outrem. O debate sobre
exploração sexual e exploração econômica também é apresentado no texto, diferenciando um do outro.
12
Termo utilizado por elas para se autodenominarem e também por moradores e apoiadores do movimento para
se referenciar às prostitutas do Prédio.
13
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=pBrIvvBXxiM
14
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1998.
4
15
Ver: ALMEIDA, Juniele Rabêlo;ROVAI, Marta Gouveia de Oliveira (Orgs) Introdução à História Pública.
São Paulo. Letra e Voz, 2011.
16
GLASS, 1963 apud BIDOU-ZACHARIASEN, 2006. De volta à cidade: dos processos de gentrificação às
políticas de “revitalização” dos centros urbanos, 2006.
17
HAWLBACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2004.
18
DELGADO, Lucília de Almeida Neves. História oral: memória, tempo, identidade. Belo Horizonte: Autêntica,
2010, p. 15-31.
5
19
RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: UNICAMP, 2007.
20
Idem.
21
POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos. CPDOC/FGV, 1989.
22
GOMES, Ângela de Castro. Escrita de si, escrita da história. FGV Editora, 2004
6
Aproximações e distanciamentos:
23
POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos. CPDOC/FGV, 1989.
7
A despeito de o termo “mulheres invisíveis” ter sido utilizado de maneira infeliz, uma
vez que não devemos considerar mulheres em situação de vulnerabilidade social como sendo
invisíveis, a fim de evitarmos reiterar o rótulo pejorativo, a pesquisa de Patai é extremamente
autocrítica e apurada quanto ao seu papel de mulher branca, pesquisadora e estrangeira.
Aponta para o equívoco da empatia em uma pesquisa entre mulheres, alertando que pode
existir uma falsa simetria por conta da proximidade de gênero e a errônea compreensão de
que, por serem mulheres, vivem problemas semelhantes. É importante ressaltar que a
aproximação não descarta diferenciações sociais outras, como classe e raça, bem como o
papel da colonizadora (figurado na imagem da estrangeira) e da estudiosa acadêmica.
24
PATAI, Daphne. Historia Oral, Feminismo e Política. Letra e Voz. São Paulo, 2010.
8
Sempre que as mulheres são usadas como meios para os fins dos outros [...] o
paradigma social dominante é afirmado em vez de contestado. A forma como
conduzimos nossos negócios – inclusive nosso negócio “profissional” de entrevistas
indivíduos – também está ou afirmando a ordem preexistente do mundo ou ajudando
a criar novos mundos. Se somos feministas e/ou socialistas, ou estamos
comprometidos com objetivos radicais e de longo alcance, devemos ter a máxima
seriedade ao lidar com a natureza dos valores implícitos que promulgamos ao ir
atrás de nossos variados objetivos. (PATAI, 2010,p.81)
La historia oral en este contexto es por eso mucho más que una metodología
participativa o de acción (donde el investigador es quién decide la orientación de la
acción y las modalidades de la participación): es un ejercicio colectivo de
desalienación, tanto para el investigador como para su interlocutor. Si en este
proceso se conjugan esfuerzos de interacción consciente entre distintos sectores: y
si la base del ejercicio es el mutuo reconocimiento y la honestidad en cuanto al
lugar que se ocupa en la cadena colonial, los resultados serán tanto más ricos en
este sentido. (CUSICANQUI, 2008,p. 171
9
processo de uma pesquisa comprometida com a comunidade e com a temática, que inclua uma
revisão dos lugares sociais e da concepção de mundo. Entretanto, os autores tratam de
possibilidades de aplicação da pesquisa. Os modos e os fins são encontrados a partir de cada
pesquisa em particular.
Meu trabalho reflete, sobremaneira, o compromisso social que experenciei enquanto
ativista, tendo evoluído quando topei com o evento da desocupação e da movimentação
política das prostitutas, fatos que me impeliram a buscar alternativas para dar voz àquele
grupo. Na academia, pouco vi a respeito da prostituição urbana, que ainda aparece como um
tabu. Na história de Niterói, a oralidade a respeito do “Prédio da Caixa” é forte, os moradores
mais velhos falam com proximidade, afetividade e trazem sempre memórias vívidas, mas
enquanto contribuição de uma memória escrita pouco se tem. Estudar a prostituição foi mais
que um capricho, decorreu de uma necessidade de ouvir, de escrever e de falar das prostitutas
do “Prédio da Caixa” em uma conjuntura de desmantelamento, silêncio e esquecimento de um
evento com a dimensão de desocupação e violência com cerca de quatrocentas prostitutas.
Perguntou-me ainda hoje qual foi a minha contribuição nesse processo. Portelli, em
“História Oral como Arte da Escuta”, trata da “contribuição” que se pode dar à comunidade
de onde surgiu um estudo:
“A contribuição do historiador/ativista está na elaboração e na articulação dos
conhecimentos da comunidade e na disseminação desse conhecimento para além de sua
fronteira” (PORTELLI, 2016, p.23)
É importante ressaltar que o conhecimento articulado e divulgado não deve apenas
retificar o que a comunidade já sabe, mas ir além, por intermédio de um processo dialógico
entre pesquisador e comunidade pesquisada, ampliando o conhecimento em um “diálogo
cultural mais amplo”, alcançando outros ethos da esfera pública.
Sobre o meu processo, não tenho a pretensão de sugerir um melhor modo de fornecer
a “contribuição” aos colaboradores e à comunidade. A história oral em conjunto com a
história pública vem encontrando maneiras originais e engajadas de retornar o conhecimento
dialógico produzido à comunidade e, muitas das vezes, consegue romper a barreira acadêmica
e alcançar outros públicos, ampliando o campo da discussão e fornecendo as bases para
formulações de políticas públicas. A pesquisa representou para mim um despertar para o
alerta protagonizado pelos movimentos sociais e, em especial, pelo movimento das
11
prostitutas, o qual estabelece condições éticas para a pesquisa, empurrando o processo para
uma outra epistemologia, que não alicerçada nos discursos europeus sobre os corpos das
mulheres.
Penso ser ainda insuficiente os resultados alcançados até agora com o trabalho que
realizei e que se traduziram positivamente na construção da memória do evento do “Prédio da
Caixa”, com base nas narrativas das protagonistas que vivenciaram a violência policial, no
processo dialógico com o movimento de prostitutas e na escuta de ativistas de diferentes
regiões do Brasil, publicizando o acontecimento. A academia, ainda assim, traz efetivamente
pouca contribuição para o segmento estudado. É necessário pensar em possibilidades
concretas para as prostitutas da região histórica de meretrício em Niterói, sobretudo, pela
situação de instabilidade em que se encontram.
O fenômeno da gentrificação na cidade de Niterói vem afetando-as, deixando-as
vulneráveis no tapetão. O espaço “saudável e seguro” faz-se necessário para a construção da
Niterói mais moderna e sem violência. Hubbard25 defende que o espaço urbano, da metrópole,
é produzido para a dominação masculina, para o desfrute do homem contemporâneo. O autor,
assim, fala que o processo de gentrificação, em tantas as circunstâncias, implica na
generificação, que sugere “uma forte conexão entre classe, gênero e estratégias de
regeneração do espaço urbano que implicam nas necessidades das cidades central em se
livrarem do trabalho sexual” 26.
A figura da prostituta na sociedade existe há muito. Apesar das discordâncias acerca
do momento de sua existência na sociedade por conta da estrutura social econômica vigente
no dado tempo, a imagem da mulher “outra” ligada à depravação, à venda (ou troca) do sexo
já está consolidada na sociedade. É um “mal necessário” que se perpetua sob o manto de uma
política de tolerância, regulatória, normatizadora e/ou criminalizadora. A prostituta ainda vai
existir, mesmo que em circunstância de vulnerabilidade. Nesse sentido, longe está de se findar
a prostituição na zona central de Niteroi, mas sua existência converge para uma resistência em
condições cada vez mais precárias. Penso que meu trabalho, tanto na condição de
pesquisadora quanto na de ativista, essa zona limiar de negociação, ainda não finalizou e o
25
HUBBARD, Phill. Sex work, urban governance and the gendering of cities
https://www.academia.edu/8347232/Sex_work_urban_governance_and_the_gend ering_of_cities. Último
acesso: 06/10/2017
campo vem me impondo, cada vez mais, desafios para o estudo do tema. Tratar da
prostituição na cidade é tarefa premente, incluir a universidade na rua e a rua na universidade
é dever magistral para o bom andamento da pesquisa.
Considerações finais
Bibliografia:
27
COIMBRA, Cecília. Operação Rio. O mito das classes perigosas. 2001
13
ALBERTI, Verena. Manual de História Oral. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2004
_________, Verena. Narrativas na história oral. In: Simpósio Nacional de história. ANPUH,
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políticas de “revitalização” dos centros urbanos. Annablume, 2006.
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prostitutas do “Prédio da Caixa”. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal
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humanos no século XXI. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo. Centauro, 2004.
HUBBARD, Phill. Sex work, urban governance and the gendering of cities
https://www.academia.edu/8347232/Sex_work_urban_governance_and_the_gend
ering_of_cities. Último acesso: 03/10/2017
COIMBRA, Cecília. OPERAÇÃO RIO. O mito das classes perigosas. Um estudo sobre a
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14
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