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Portuguesa
Organização do Texto
Organizadores
Maria Lúcia V. de Oliveira Andrade
Neide L. Rezende
Valdir Heitor Barzotto
Elaboradora
Maria Lúcia V. de Oliveira Andrade
1
módulo
Nome do Aluno
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Governador: Geraldo Alckmin
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
Secretário: Gabriel Benedito Issac Chalita
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas – CENP
Coordenadora: Sonia Maria Silva
PROGRAMA PRÓ-UNIVERSITÁRIO
Coordenadora Geral: Eleny Mitrulis
Vice-coordenadora Geral: Sonia Maria Vanzella Castellar
Coordenadora Pedagógica: Helena Coharik Chamlian
Coordenadores de Área
Biologia:
Paulo Takeo Sano – Lyria Mori
Física:
Maurício Pietrocola – Nobuko Ueta
Geografia:
Sonia Maria Vanzella Castellar – Elvio Rodrigues Martins
História:
Kátia Maria Abud – Raquel Glezer
Língua Inglesa:
Anna Maria Carmagnani – Walkyria Monte Mór
Língua Portuguesa:
Maria Lúcia Victório de Oliveira Andrade – Neide Luzia de Rezende – Valdir Heitor Barzotto
Matemática:
Antônio Carlos Brolezzi – Elvia Mureb Sallum – Martha S. Monteiro
Química:
Maria Eunice Ribeiro Marcondes – Marcelo Giordan
Produção Editorial
Dreampix Comunicação
Revisão, diagramação, capa e projeto gráfico: André Jun Nishizawa, Eduardo Higa Sokei,
Mariana Pimenta Coan, Mario Guimarães Mucida e Wagner Shimabukuro
Cartas ao
Aluno
Carta da
Pró-Reitoria de Graduação
Caro aluno,
Com muita alegria, a Universidade de São Paulo, por meio de seus estudantes
e de seus professores, participa dessa parceria com a Secretaria de Estado da
Educação, oferecendo a você o que temos de melhor: conhecimento.
Conhecimento é a chave para o desenvolvimento das pessoas e das nações
e freqüentar o ensino superior é a maneira mais efetiva de ampliar conhecimentos
de forma sistemática e de se preparar para uma profissão.
Ingressar numa universidade de reconhecida qualidade e gratuita é o desejo
de tantos jovens como você. Por isso, a USP, assim como outras universidades
públicas, possui um vestibular tão concorrido. Para enfrentar tal concorrência,
muitos alunos do ensino médio, inclusive os que estudam em escolas particulares
de reconhecida qualidade, fazem cursinhos preparatórios, em geral de alto
custo e inacessíveis à maioria dos alunos da escola pública.
O presente programa oferece a você a possibilidade de se preparar para enfrentar
com melhores condições um vestibular, retomando aspectos fundamentais da
programação do ensino médio. Espera-se, também, que essa revisão, orientada
por objetivos educacionais, o auxilie a perceber com clareza o desenvolvimento
pessoal que adquiriu ao longo da educação básica. Tomar posse da própria
formação certamente lhe dará a segurança necessária para enfrentar qualquer
situação de vida e de trabalho.
Enfrente com garra esse programa. Os próximos meses, até os exames em
novembro, exigirão de sua parte muita disciplina e estudo diário. Os monitores
e os professores da USP, em parceria com os professores de sua escola, estão
se dedicando muito para ajudá-lo nessa travessia.
Em nome da comunidade USP, desejo-lhe, meu caro aluno, disposição e vigor
para o presente desafio.
Caro aluno,
Com a efetiva expansão e a crescente melhoria do ensino médio estadual,
os desafios vivenciados por todos os jovens matriculados nas escolas da rede
estadual de ensino, no momento de ingressar nas universidades públicas, vêm se
inserindo, ao longo dos anos, num contexto aparentemente contraditório.
Se de um lado nota-se um gradual aumento no percentual dos jovens aprovados
nos exames vestibulares da Fuvest — o que, indubitavelmente, comprova a
qualidade dos estudos públicos oferecidos —, de outro mostra quão desiguais
têm sido as condições apresentadas pelos alunos ao concluírem a última etapa
da educação básica.
Diante dessa realidade, e com o objetivo de assegurar a esses alunos o patamar
de formação básica necessário ao restabelecimento da igualdade de direitos
demandados pela continuidade de estudos em nível superior, a Secretaria de
Estado da Educação assumiu, em 2004, o compromisso de abrir, no programa
denominado Pró-Universitário, 5.000 vagas para alunos matriculados na terceira
série do curso regular do ensino médio. É uma proposta de trabalho que busca
ampliar e diversificar as oportunidades de aprendizagem de novos conhecimentos
e conteúdos de modo a instrumentalizar o aluno para uma efetiva inserção no
mundo acadêmico. Tal proposta pedagógica buscará contemplar as diferentes
disciplinas do currículo do ensino médio mediante material didático especialmente
construído para esse fim.
O Programa não só quer encorajar você, aluno da escola pública, a participar
do exame seletivo de ingresso no ensino público superior, como espera se
constituir em um efetivo canal interativo entre a escola de ensino médio e
a universidade. Num processo de contribuições mútuas, rico e diversificado
em subsídios, essa parceria poderá, no caso da estadual paulista, contribuir
para o aperfeiçoamento de seu currículo, organização e formação de docentes.
O que é texto?
Organizadores
Maria Lúcio V. de
Oliveira Andrade
Neide L. Rezende
Como podemos distinguir um texto bem elaborado de meros aglomerados Valdir Heitor
de palavras e frases? Qual a função de seus diversos elementos lingüísticos? Barzotto
Essa funcionalidade não pode ser explicada no âmbito da frase; já que o texto Elaboradora
contém mais do que o sentido das expressões que estão em sua superfície,
Maria Lúcio V. de
pois deve incorporar conhecimentos e experiências, atitudes e intenções.
Oliveira Andrade
Carlos Drummond de Andrade uma vez escreveu:
-
QUALIDADES DO PARÁGRAFO
-
Embora tal noção seja bastante complexa e tenha recebido atenção espe-
cial não só da filosofia e da ciência, como também da literatura, é em Claude
Zilberberg, um estudioso francês das ciências da linguagem, que encontra-
mos uma definição precisa:
(4) O baile acabou. O capítulo é que não acaba sem que deixe um pouco de
espaço a quem quiser pensar naquela criatura. Pai nem mãe podem entendê-la, os
rapazes também não, e provavelmente Santos e Natividade menos que ninguém. Tu,
mestra de amores ou aluna deles, tu, que escutas a diversos, concluis que ela era...
Custa pôr o nome do ofício. Se não fosse a obrigação de contar a história com as
próprias palavras, preferia calá-lo, mas tu sabes qual é ele, e aqui fica. Concluis que
Flora era namoradeira, e concluis mal.
Leitora, é melhor negar isto que esperar pelo tempo. Flora não conhecia as
doçuras do namoro, e menos ainda se podia dizer namoradeira de ofício. A
namoradeira de ofício é a planta das esperanças, e alguma vez das realidades, se a
vocação o impõe e a ocasião o permite. Também é preciso ter em lembrança aquilo
de um publicista filho de Minas e do outro século, que acabou senador, e escrevia
contra os ministros adversários: ‘Pitangueira não dá manga’. Não, Flora não dava
para namorados.
(5) Ela era. Tal que assim se desencantava, num encanto tão terrível; e levantei
a mão para me benzer – mas com ela tapei foi um soluçar, e enxuguei as lágrimas
maiores. Uivei. Diadorim! Diadorim era mulher. Diadorim era mulher como o sol
não acende a água do rio Urucúia, como eu solucei meu desespero.
-
O senhor não repare. Demore, que eu conto. A vida da gente nunca tem termo real.
Eu estendi a mão para tocar naquele corpo e, estremeci, retirando as mãos para
trás, incendiável; abaixei meus olhos. E a Mulher estendeu a toalha, recobrindo as
partes. Mas aqueles olhos eu beijei, e as faces, a boca. Adivinhava os cabelos.
Cabelos que cortou com tesoura de prata... Cabelos que, no só ser, haviam de dar
para baixo da cintura... E eu não sabia por que nome chamar; eu exclamei me
doendo:
— ‘Meu amor!...’
Para criar um cenário que busca recuperar todo o espaço cênico, o autor
vale-se da distribuição dos parágrafos como ponto de intensidade máxima do
texto. Tal paragrafação não só resolve o dilema das personagens como tam-
bém cria pistas para que o leitor possa compreender a tragicidade do texto.
Em síntese, temos:
– no suposto dialogismo entre o discurso (monológico) do narrador e o silêncio
do personagem-ouvinte (Doutor), para o qual é relatado o evento, encontra-
se o motivo nuclear da narrativa – Diadorim/Diadorina (1o parágrafo);
– a inferência do personagem-ouvinte transforma, através da voz do narrador-
personagem, o parágrafo em aforismo (núcleo da trama): a finitude da exis-
tência humana (2o parágrafo);
– a representação do gesto “adâmico” possibilita recuperar a transcendência
dos núcleos anteriores da narrativa: vida – morte; realidade – sonho, até
chegar ao clímax, que será estruturado no parágrafo seguinte, em que se
cria uma imagem dramática do desfecho (3o parágrafo);
– a fala do narrador-personagem “— Meu amor!...” revela a transcendência
apontada no parágrafo anterior (4o parágrafo).
Na linguagem jornalística, a paragrafação se estrutura com o auxílio de
recursos visuais, visto que não se dissocia mais o texto (conteúdo semântico)
de suas imagens. Modernamente, a palavra texto ganha outra configuração,
evidenciando a imediaticidade da comunicação, criando uma nova dimensão
para o termo, que se transforma em um ícone graças à diluição do textual no
visual e vice-versa.
Desse modo, aqueles parágrafos que se distanciam da unidade pretendida
e enfocam uma relevância tida ou sentida como digressiva (marginal) são
colocados à parte (observe o exemplo 6, que apresenta um quadro colocado
no final da reportagem), para não “quebrar” a organização do texto. Tais pa-
rágrafos são normalmente destacados sob a forma de quadros com comentá-
rios ou informações adicionais a que se remete no corpo do texto.
Vejamos a reportagem (6), retirada da seção Ciência apresentada na revis-
ta Veja (28 de abril, 2004, p. 106) e colocado a seguir:
(6)
Este rato não precisou de um pai para nascer
Cientistas japoneses criam o primeiro mamífero gerado por duas mães
Nesse texto, temos uma reportagem sobre uma descoberta científica feita
por pesquisadores japoneses e coreanos na Universidade de Tóquio. A expe-
riência foi divulgada em uma revista científica. Ao ler a reportagem, ficamos
sabendo qual foi o procedimento científico para conseguir gerar um camun-
dongo a partir do óvulo de duas fêmeas. O texto informa ainda que a origem
do nome dado ao filhote, Kaguya, é uma referência a uma narrativa ficcional,
cuja personagem é uma menina encontrada num tronco de bambu e que é
considerada filha da Lua.
-
O texto narra o método usado pelos cientistas para conseguir gerar o rati-
nho, explicando, descrevendo e exemplificando com outros casos científi-
cos. Entretanto, como a genética não é uma parte da biologia conhecida com
profundidade por todos os leitores, o locutor busca construir o texto numa
linguagem objetiva e clara, narrando as ações dos cientistas e descrevendo os
termos específicos da genética que são empregados. Além disso, o locutor faz
uso de um quadro para sintetizar as principais ações da experiência.
Nesta unidade, foram apresentadas algumas orientações para a estruturação
e elaboração adequada dos textos. O objetivo foi oferecer a você, caro estu-
dante, reflexões sobre o que é um texto, como o parágrafo se estrutura e sobre
como o conhecimento de sua construção pode melhorar a elaboração de nos-
sos textos.
Não se pretendeu que as colocações feitas se tornem receitas a serem segui-
das passo a passo. É preciso antes de tudo ter um pouco de sensibilidade e não
assumir uma postura rígida, pois todo usuário da língua é capaz de perceber o
momento em que deve encerrar um bloco textual ou fazer uma transição.
Talvez conhecendo um pouco mais como se processa a elaboração do
texto, você possa não só compreender melhor as produções escritas de modo
geral, como também aprimorar os seus próprios textos, sem que percam a sua
expressividade, fazendo do trabalho com textos uma atividade dinâmica e
produtiva.
Atividades
1- O trecho que segue foi extraído de uma crônica de Carlos Drummond de
Andrade. Transcrevemos apenas o início. A tarefa proposta a você é que indi-
que qual o tipo de parágrafo elaborado (descritivo, narrativo ou dissertativo),
justificando por meio dos elementos abordados no texto. A seguir, elabore um
pequeno texto narrativo coerente com os elementos contidos na introdução.
- Assunto: Greves
- Delimitação do assunto (tema):
- Objetivo:
- Assunto: Trabalho
- Delimitação do assunto (tema):
- Objetivo:
-
- Objetivo:
SUGESTÕES DE LEITURA
- É importante que você leia, pelo menos uma vez por semana, jornais e/ou
revistas para estar atualizado sobre os acontecimentos nacionais e internacio-
nais e também para que você possa formar sua opinião sobre os fatos e a
sociedade de modo geral.
- Você pode ler jornais como: Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Jornal
da Tarde, provavelmente na biblioteca de sua escola você encontrará um
deles. Se puder, leia também revistas como Veja ou Istoé, sua escola deve
receber uma delas.
- Um endereço que você pode consultar é o site www.releituras.com/. Nele
você encontrará textos de vários escritores importantes da literatura em lín-
gua portuguesa e do meio jornalístico. Há 1000 textos de 308 autores. Como
exemplo para sua busca, podemos citar Carlos Heitor Cony. Deste jornalista
você encontra a crônica “O suor e a lágrima”, podendo verificar como ele
organiza seu texto, observando a distribuição dos parágrafos. Outro escritor
interessante que vale a pena conferir é Affonso Romano de Sant’Anna, com
o texto “Antes que elas cresçam”, escrito por meio de parágrafos bastante
curtos, mas muito significativos.
- Você ainda pode navegar pelo site do Observatório da Imprensa, onde se
encontram interessantes textos jornalísticos e debates bem instigantes. Vale
a pena dar uma olhada. O endereço é: www.tvebrasil.com.br/observatorio/
Unidade 2
Descrição
Organizadores
Maria Lúcio V. de
Oliveira Andrade
Você que é uma pessoa habituada a ler, já viu textos dos mais variados Neide L. Rezende
gêneros e já percebeu que, devido às inúmeras diferenças que os distinguem,
é possível classificá-los de maneiras distintas: textos científicos, textos poéti- Valdir Heitor
cos, textos jornalísticos, textos jurídicos, textos religiosos, etc. Barzotto
Agora passaremos a tratar de uma divisão que é, de certa maneira, uma Elaboradora
tradição escolar e que se revela útil tanto para a leitura como para a produção Maria Lúcio V. de
de textos. Referimo-nos à classificação dos textos em: descritivos, narrativos Oliveira Andrade
e dissertativos. Já vimos um pouco dessa distinção quando estudamos o pará-
grafo e suas características.
Cabe lembrar que, na maior parte dos textos que encontramos, não obser-
vamos textos em estado puro, isto é, textos especificamente descritivos, nar-
rativos ou dissertativos, já que esses três tipos de construção podem ser obser-
vados em um único texto. Isso não impede que, por uma conveniência didáti-
ca, se estude cada um desses tipos separadamente.
Leia o texto (1) que segue:
A paisagem era mais ou menos desse jeito – a cidade de cá, o rio no meio e do
outro lado a encosta que parecia querer esbarrar no céu sem fundo.
Na beira do rio, tinha uma porção de árvores, sempre verdes, mas que se cobriam
de roxo, branco, amarelo, conforme a estação do ano. Elas floriam. No meio da
encosta crescia um capão, por onde passava uma estrada alva e torta que levava para
qualquer parte do mundo.
O campo era verde demais. Manhã tão clara que havia uma névoa azulada para
adoçar mornamente os contornos vertiginosos da paisagem branca.
Manhã de mel.
(in Seleta de Bernarndo Ellis. Rio de Janeiro: José Olympio, 1976, p. 32).
Como você pode notar, esse texto revela certos aspectos de uma paisa-
gem. É um texto descritivo.
Note que:
a) todos os enunciados relatam ocorrências simultâneas;
b) não existe um enunciado que possa ser considerado cronologicamente an-
terior ao outro;
TIPOS DE DESCRIÇÃO
Vimos que, pelo discurso, é possível criar uma realidade estática, onde
não há a necessidade de ordenação entre os enunciados uma vez que não
-
2) A rua está suja. Esgotos à vista. As pedras estão mal dispostas. As casas
estão imundas.
A realidade construída nas duas descrições é vista de forma diferente: na
primeira, desolação e sujeira parecem ser definidoras da própria rua, parece
que a rua sempre está dessa maneira. Na segunda, desolação e sujeira são esta-
dos temporários, acidentais. Podemos perceber, então, que tanto é possível des-
crever um momento determinado, preciso, quanto um momento amplo e inde-
finido. No entanto, note que a realidade fixada pela descrição é sempre particu-
lar, um estado entre outros possíveis: é a fixação de um momento, não de algo
essencial àquela realidade. Dizer que “a rua é imunda” é dizer de um estado em
que essa rua determinada, particular, encontra-se por um tempo qualquer.
Finalizando esta unidade, para que você compreenda bem, é bom lembrar
que a afirmação de que na descrição não há uma evolução interna que favore-
ça a transformação não significa, de maneira alguma, que não haja movimen-
to interior da realidade construída. A realidade como um todo é que é estática,
e o movimento que porventura haja nela é um movimento contínuo, que não
provoca evolução interna.
A cidade ficava entre o rio e o mar, praias belíssimas, os coqueiros nascendo ao
largo de todo o areal. Um poeta, que certa vez passara por Ilhéus e dera uma confe-
rência, a chamara de “cidade das palmeiras ao vento” numa imagem que os jornais
locais repetem de quando em vez.
(In: Terras do Sem-Fim de Jorge Amado. Rio de Janeiro: Record, s.d., p. 184).
Como se pode verificar pelo texto acima, um texto descritivo pode conter
movimentos (no caso há o movimento do vento que balança as folhas das
palmeiras e que também espalha o cheiro do cacau), assim como ser construído
a partir de outros verbos que não “ser” e “estar”. O que é realmente funda-
mental para a existência da descrição é o fato de que os verbos se encadeiam,
não progridem, não chegam a compor uma realidade que evolui.
Veja, a seguir, como uma empresa automobilística divulga um novo carro
em uma revista de circulação nacional, em uma seção específica de orienta-
ção para o consumidor. Por meio da descrição, o leitor fica sabendo como é a
nova perua da Toyota: possui uma linha esportiva, suspensão macia, bom es-
paço interior, os vários acessórios que tornam o carro especial, os opcionais,
todos elementos que podem fazer a diferença na hora da compra.
Outra perua na praça
-
travas e vidros elétricos, detalhes que levam o preço aos 56 000 reais (na versão com
câmbio manual), contra os 47 000 de uma Weekend básica. Por mais 4 000 reais,
leva-se o câmbio automático, que torna um tanto lenta a reação do motor 1.8 de 136
cavalos. Os opcionais são rack de teto, sensor de aproximação no pára-choque e
faróis de neblina. Uma curiosidade: a Toyota fez mágica contra famílias grandes
num veículo originalmente concebido para casais com filhos. O porta-malas de 411
litros é menor que o do Corolla sedã, que tem 26 a mais.
Editado por André Fontenelle. Colaboraram Helena Fruet e Tatiana Schibuola
(in Veja- 26 de maio de 2004, p. 111- Seção Guia – Carro Novo).
Atividades
1- Uma experiência bastante enriquecedora e interessante para aguçarmos
nossos sentidos, os canais que nos fazem perceber as características surpreen-
dentemente novas dos objetos que nos rodeiam, é o levantamento sensorial,
ou seja, o exercício das sensações. Vamos começar: nós propomos um objeto
e você procura percebê-lo da forma mais detalhada possível, levando em con-
sideração todos os sentidos, todas as maneiras possíveis de descrevê-lo – a
visão, o tato, a audição, o olfato, o gosto.
O objeto que propomos é: LÂMPADA.
Agora, escolha você mesmo um objeto e refaça a experiência.
2- Elabore uma pequena descrição do quarto de um adolescente fanático por
futebol.
3- Descreva, em apenas um parágrafo, um ambiente físico: a sala de aula
onde você estuda, ou a rua em que você vive.
4- Leia o texto a seguir:
O texto que você acabou de ler descreve muitas facetas da lua de São
Jorge. Escolha uma das perspectivas apresentadas pelo locutor e crie um pará-
grafo descritivo.
SUGESTÕES DE LEITURA
Fica aqui essa breve introdução para que você se interesse pela obra e
procure ler. Vale a pena!
- Outra sugestão é pegar um filme em uma locadora ou ir ao cinema. Veja
como as cenas que focalizam paisagens, ambientes ou objetos revelam, na
linguagem cinematográfica, aquilo que você faria com as palavras para a
elaboração de um texto escrito. Uma dica é o filme Janela da alma – um
filme sobre o olhar. Trata-se de um documentário de João Jardim e Walter
Carvalho, 2001, Brasil.
Unidade 3
Narração
Organizadores
Maria Lúcio V. de
Oliveira Andrade
Leia o texto que segue Neide L. Rezende
Naquele dia de abril andava eu pelas ruas numa espécie de sonambulismo, com Valdir Heitor
a impressão de que o outono era uma opala dentro da qual estava embutida a minha Barzotto
cidade com as suas gentes, casas, ruas, parques e monumentos, bem como esses Elaboradora
navios de vidrilhos coloridos que os presidiários constroem pacientemente, peda-
Maria Lúcio V. de
cinho a pedacinho, dentro das garrafas. Veio me então o desejo de compor uma Oliveira Andrade
sonata para a tarde. Comecei com um andantino melancólico e brinquei com ele
durante duas quadras, com a atenção dividida entre a música e o mundo. De súbito
as mãos sardentas dum de meus alunos puseram-se a tocar escalas dentro de meu
crânio, com uma violência atroz, e lá se foi o andantino... Fiquei a pensar contrari-
ado nas lições que tinha de dar no dia seguinte. Ah! A monotonia dos exercícios, a
obtusidade da maioria dos discípulos, a incompreensão e a impertinência dos pais!
Devo confessar que não gostava da minha profissão e que, se não a abandonava, era
porque não saberia fazer outra coisa para ganhar a vida, pois repugnava-me a idéia
de tocar músicas vulgares nessas casas públicas onde se dança, come e bebe à noite.
(Érico Veríssimo. Sonata. Porto Alegre: Globo, 1978, p. 61).
Temos aí uma pequena narração. O que Érico Veríssimo fez para narrar?
Entre as várias respostas possíveis podemos citar:
- O autor relatou um fato.
- O autor contou uma história.
- O autor falou de um acontecimento.
Qualquer uma dessas respostas assinala o fato de que o autor se utilizou
da língua e construiu no discurso um fato, uma história ou um acontecimento.
O fato, a história, o acontecimento são por nós, leitores, conhecidos apenas
pelo discurso do autor. Você poderia discordar da idéia de que um discurso
cria um acontecimento, uma vez que este poderia ocorrer independentemente
do fato de ser narrado: um professor de música poderia desejar compor uma
sonata sem que isso tivesse sido narrado. No entanto, pense que uma vez
narrado, é através do discurso que você passa a conhecer o acontecimento e
que o acontecimento narrado não é mais o original, mas algo criado pelo
autor do discurso. Por essa razão é que podemos dizer que o autor construiu,
através da linguagem, um fato, uma história, um acontecimento.
Entretanto, o que significa fato, história, acontecimento? Examinemos no-
vamente o texto. Ele se inicia apresentando a época e o local onde o narrador-
personagem caminhava. Até aí, o autor não chegou a definir um fato, história
ou acontecimento. Na verdade, trata-se de elementos aos quais o autor atri-
buiu existência, sem que algo tenha ocorrido. Somente a partir do momento
em que diz; “Veio-me então o desejo de compor uma sonata” é que passa a
haver o fato, a história, o acontecimento. Em outras palavras, somente a partir
do instante em que começa “a se passar algo” com um dos elementos situados
anteriormente, no caso com o narrador-personagem, é que se pode dizer que
há o acontecimento.
Assim, relatar um fato, contar uma história, falar de um acontecimento,
significa construir uma realidade que se altera, se transforma e que, por isso
mesmo, é passageira. Essa realidade pode estar relacionada a alguma coisa
que se passa interna ou externamente com o autor, ou pode, perfeitamente, ser
inventada, sem nunca ter acontecido.
Retornemos, agora, ao texto que nos serviu de ponto de partida. O autor
revela o seu desejo de compor uma sonata, mas de repente é interrompido
pela lembrança das lições executadas por um de seus alunos. No final, revela
que não gostava de sua profissão, mas que não a abandonava por não saber
fazer outra coisa.
Você notou que esse texto relata as mudanças progressivas de estado que
vão ocorrendo com o narrador-personagem. Nesse tipo de texto, que é a nar-
ração, os episódios e os relatos estão organizados numa distribuição tal que
entre eles existe sempre uma relação de anterioridade e posterioridade, reve-
lando uma progressão no tempo. Essa relação é sempre fundamental em um
texto narrativo, mesmo que a narrativa seja psicologia (o texto começa pelo
clímax e há um retorno no tempo, provocado pelas memórias de um persona-
gem, para que o leitor saiba o que ocorreu desde o início da trama).
A título de ilustração, observe o texto a seguir:
Paulo tinha fama de mentiroso. Um dia chegou em casa dizendo que vira no
campo dois dragões-da-independência cuspindo fogo e lendo fotonovelas.
A mãe botou-o de castigo, mas na semana seguinte ele veio contando que caíra
no pátio da escola um pedaço de lua, todo cheio de buraquinhos, feito queijo, e ele
provou e tinha gosto de queijo. Desta vez Paulo não só ficou sem sobremesa como
foi proibido de jogar futebol durante quinze dias.
Quando o menino voltou falando que todas as borboletas da Terra passaram pela
chácara de Siá Elpídia e queriam formar um tapete voador para transportá-lo ao
sétimo céu, a mãe decidiu levá-lo ao médico. Após os exames, o Dr. Epaminondas
abanou a cabeça:
—Não há nada a fazer, Dona Colo. Este menino é mesmo um caso de poesia.
(in: Contos Plausíveis de Carlos Drummond de Andrade. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1981, p. 24).
Como se pode verificar, o texto acima é uma narração, dado que relata
fatos ocorridos com a personagem Paulo, evidenciando relações de anteriori-
dade e posterioridade entre os episódios relatados.
Você nota que cada momento da narrativa está intimamente ligado com o
outro:
Ao contar que tinha visto dois dragões-da-independência cuspindo fogo,
Paulo recebeu um castigo de sua mãe; na semana seguinte contou que havia
-
caído um pedaço da lua no pátio da escola, então sua mãe deixou-o sem sobre-
mesa e ficou sem jogar futebol; quando disse que tinha visto todas as borboletas
da Terra passarem pela Terra, a mãe resolveu levar o garoto a um médico.
Há, portanto, entre os enunciados que representam momentos de evolu-
ção da narrativa, um encadeamento necessário: um enunciado está sempre
relacionado com os anteriores e os posteriores.
Note ainda que os enunciados que consideramos essenciais no desenvol-
vimento do texto podem ser ligados por partículas do tipo “então”, “daí”,
“depois”, etc.
- Um dia Paulo chegou em casa dizendo que vira no campo dois dragões-da-
independência cuspindo fogo e lendo fotonovelas.
- Então, a mãe botou-o de castigo (...).
- Na semana seguinte, ele veio contando que caíra no pátio da escola um
pedaço de lua (...).
A possibilidade de você colocar tais partículas entre os enunciados mostra
que existe uma dependência temporal entre eles: um enunciado é conse-
qüência do anterior no tempo. A progressão temporal que se estabelece entre
os enunciados constitui a maneira mais corrente pela qual uma língua possibi-
lita construir uma narração.
Passando a um novo ponto referente ao ato de narrar, retornemos aos enun-
ciados anteriores, tomando os dois elencados abaixo:
- Um dia Paulo chegou em casa dizendo (...).
- A mãe botou-o de castigo (...).
Ao lado da relação de tempo existente (segundo posterior ao primeiro), há
uma relação entre esses enunciados que se tornará mais clara se refletirmos
um pouco mais sobre eles: a ação de Paulo dizer algo provoca uma reação por
parte de sua mãe: colocá-lo de castigo.
“Dizer” provoca “botar”. Há, portanto, dois processos conseqüentes nes-
se pequeno trecho; se você atentar para o encadeamento desses enunciados,
você perceberá que há uma classe de palavras sobre as quais se assenta tanto
o encadeamento de ações quanto a relação de conseqüência e a dependência
temporal: é a classe dos verbos, observável em “dizer”, “botar”. Esta classe
constitui o suporte do texto narrativo.
Cabe ainda apontar que numa narrativa os acontecimentos de cada verbo
devem ser ligados a elementos a quem são atribuídos esses acontecimentos:
Em relação aos enunciados anteriormente analisados, temos:
- Paulo _________________ chegou em casa dizendo.
- A mãe _________________ botou-o de castigo.
Temos aí dois elementos distintos para os quais ocorrem os acontecimen-
tos expressos pelos verbos: “Paulo” e “a mãe”. A esses elementos, aos quais
são atribuídos os acontecimentos expressos pelo verbo, dá-se o nome de per-
sonagens, que podem ser ou não seres humanos: o importante é que a eles
sejam atribuídos os acontecimentos fundamentais para a narrativa.
Falta ainda identificarmos um elemento fundamental: a ordenação dos acon-
tecimentos, bem como a atribuição desses acontecimentos na composição de
uma narrativa, que é feita por alguém. Trata-se do sujeito do texto, que nesse
caso recebe o nome de narrador e que tem sempre um papel fundamental
dentro do texto, embora nem sempre seja possível percebê-lo diretamente.
As narrativas podem ser escritas em primeira pessoa (narrador-persona-
gem) ou em terceira pessoa (narrador-onisciente). Quando a narrativa é
construída em primeira pessoa, o narrador é uma pessoa que participa dos
acontecimentos ao mesmo tempo em que sente e pensa sobre eles (como vi-
mos no texto Sonata de Érico Veríssimo). Já um narrador em terceira pessoa
faz mais do que relatar acontecimentos: pode, por exemplo, adivinhar o que
se passa por detrás deles, pode saber o que as pessoas sentem e pensam...
Observe este texto narrado em terceira pessoa. A capacidade de adivinhar do
locutor dá ao texto sua dimensão mais extraordinária: desvendar-nos o que as
personagens sentem e pensam a cada instante:
Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo.
Lá vinha ele trotando, à frente de sua dona, arrastando o seu comprimento.
Desprevenido, acostumado, cachorro.
A menina abriu os olhos pasmada. Suavemente avisado o cachorro estacou
diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.
Entre tantos seres que estão prontos para se tornarem donos de outro ser, lá
estava a menina que viera ao mundo para ter aquele cachorro. Ele fremia suavemen-
te, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanto tempo se passa-
va? Um grande soluço sacudiu-a desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela
passou por cima do soluço e continuou a fitá-lo.
O pêlo de ambos eram curtos, vermelhos.
Que foi que disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapida-
mente, pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-
se com urgência, com encabulamento, surpreendidos.
(Tentação. In: A Legião Estrangeira de Clarice Lispector. Rio de Janeiro: Ed. do
Autor, 1964, p. 68).
ATIVIDADES
1- Elabore um texto narrativo, dinamizando os fatos apresentados pelo poema
seguinte:
Poema tirado de uma notícia de jornal
João Gostoso era carregador de feira-livre e morava no morro
da Babilônia num barracão sem número.
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
(Libertinagem de Manuel Bandeira)
-
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio
aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada.
Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte
de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles se iam e eu
ficava só, sem o perdão de sua presença a todas as aflições do dia, como a última luz
na varanda.
E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero na salada – o
seu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? As suas violetas, na janela, não
lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada.
Que fim levou o saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os
outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.
(Os Mistérios de Curitiba de Dalton Trevisan).
SUGESTÕES DE LEITURA
– O livro As Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino, Companhia das Letras, 1990.
É uma reunião de textos curtos. Nessa obra, o legendário viajante Marco
Pólo traz notícias a Kublai Khan, o famoso conquistador mongol, das inú-
meras cidades englobadas por seu imenso império. Transcrevemos para você
o trecho inicial dessa fascinante narrativa:
Não se sabe se Kublai Khan acredita em tudo o que diz Marco Pólo quando este
lhe descreve as cidades visitadas em suas missões diplomáticas, mas o imperador
dos tártaros certamente continua a ouvir com a maior curiosidade e atenção do que
a qualquer outro dos seus enviados ou exploradores...
– Consulte os sites www.candango.com e www.adorocinema.com em ambos
você vai encontrar comentários sobre os filmes que estão sendo exibidos
atualmente nas salas de cinema, bem como resenhas a respeito dos últimos
lançamentos da indústria cinematográfica nacional e internacional. No site
“adorocinema”, o jornalista Roberto Cunha fala sobre os mais recentes lan-
çamentos nos cinemas nacionais.
Ao assistir a filmes, você pode apreciar como a narrativa é contada, como
se desenvolve, a partir de que ponto de vista, que efeito de sentido seu autor
busca atingir.
Unidade 4
Dissertação
Organizadores
Maria Lúcio V. de
Oliveira Andrade
Leia o texto que segue: Neide L. Rezende
Valdir Heitor
A televisão transforma, desfaz e cria hábitos. Os arquitetos já precisam prever,
Barzotto
em seus projetos, um espaço especial para os receptores de TV. A classe média se
orgulha de exibir seus aparelhos, a alta burguesia e a possível aristocracia os escon- Elaboradora
dem: a escolaridade é inversamente proporcional à televisualidade... Os espetácu- Maria Lúcio V. de
los e os eventos são montados tendo em vista o olho grande da TV: este foi um dos Oliveira Andrade
ponderáveis motivos por que os imponentes espetáculos dos funerais dos papas
Paulo VI e João Paulo I e da consagração desse último foram montados na Praça de
São Pedro e não no interior da basílica... E seria um não mais acabar de exemplos e
considerações, sendo suficiente que se diga, enfim, que a própria noção de cultura
não pode hoje ser debatida sem levar-se em conta a presença dos mass media – a
televisão, em especial.
Como se pode perceber, esse texto é uma dissertação, pois nele o locutor
pretende construir uma reflexão, buscando captar o que a televisão significa
na vida cotidiana e na cultura de um povo. Nota-se que o locutor teceu sobre
a televisão uma série de pensamentos generalizantes: pensou em como ela
está presente nas casas, como os espetáculos são montados visando a ser trans-
mitidos via TV, como ela altera a noção de cultura. A partir da reflexão, o
locutor busca sair dos limites específicos de uma realidade fixada no tempo
(como ocorre na descrição de um objeto particular, concreto) para especular
sobre seus aspectos mais gerais.
Desse modo, podemos dizer que o locutor interpreta e analisa, através de
conceitos abstratos, os dados concretos da realidade; esses dados funcionam
como recursos de confirmação ou exemplificação das idéias abstratas que
estão sendo discutidas. Ainda que na dissertação não exista, em princípio,
progressão temporal entre enunciados, eles mantêm relações lógicas entre si,
o que impede de se alterar sua seqüência.
Levando em conta o caráter generalizante e reflexivo da dissertação, pas-
semos ao estudo dos elementos lingüísticos que podem favorecer a criação
desse tipo de discurso. Vamos tomar como ponto de partida o texto a seguir:
Durante séculos não fizemos outra coisa que acumular conhecimentos. Da fissura
do átomo ao mecanismo da vida. Do entendimento da psicologia do homem ao
Nesse texto, você nota um ponto importante: alguns dos enunciados são
ditos na primeira pessoa do plural:
1- Durante séculos não fizemos outra coisa que acumular conhecimentos.
2- Os jornais, as revistas e a estações de radio e televisando (...) mantêm-nos
em dia com tudo o que acontece e informam-nos do que pensam todos a
respeito de tudo.
O uso da primeira pessoa do plural, nesses casos, tem uma função específi-
ca: a de incluir o locutor dentro de uma classe bem ampla de elementos. As-
sim, ao dizer “não fizemos outra coisa que acumular conhecimentos” ou “man-
têm-nos em dia com tudo o que acontece e informam-nos do que pensam
todos a respeito de tudo”, o locutor está se referindo à classe dos seres huma-
nos em geral.
A partir desses exemplos, podemos dizer que o objeto de reflexão é uma
classe em geral (os seres humanos) e que o locutor não fala em seu próprio
nome, mas em nome de toda uma classe, quer dizer, o sujeito da reflexão é
uma classe geral (no caso, os seres humanos).
Essas observações levam-nos a concluir que, em geral, na dissertação, o
locutor não responsabiliza apenas a si pelo que afirma ou, quando o faz, sali-
enta que se trata de uma opinião ou verdade.
O texto dissertativo de caráter científico deve ser elaborado de maneira a
criar um efeito de sentido de objetividade, pois pretende destacar as afirma-
ções feitas (ao enunciado) e não o aspecto subjetivo de quem as proferiu. É
claro que se trata de um recurso lingüístico, dado que sempre por trás de um
texto estará aquele que o produziu (o enunciador) e sua respectiva visão de
mundo.
Para neutralizar a presença do enunciador, usam-se certos procedimentos
lingüísticos que passaremos a destacar:
a) Evitam-se os verbos de dizer na 1a. pessoa (digo, penso, acho, creio, afir-
mo, etc.), procurando eliminar a idéia de que o conteúdo de verdade conti-
do no enunciado seja a simples opinião de quem o proferiu, e sugerir que o
fato se impõe por si mesmo.
Não se diz, portanto:
Mas simplesmente:
-
c) Nesse tipo de discurso, deve-se usar a língua padrão na sua expressão for-
mal, não se ajustando, portanto, o uso de gírias ou qualquer outro uso lin-
güístico distanciado da variante culta e formal da língua.
Além de procurar neutralizar o enunciador, o discurso dissertativo de ca-
ráter científico deve destacar o valor de verdade dos enunciados. Esse valor é
criado pela fundamentação das idéias e pela argumentação.
Vamos apresentar alguns recursos que servem para fundamentar o texto
dissertativo e aumentar seu poder de persuasão.
1- O argumento de autoridade
Apóia-se no saber notório de uma autoridade reconhecida em certa área
do conhecimento, trazendo credibilidade ao texto. Para isso, o enunciador faz
uso da citação. Observe o enunciado a seguir:
Conforme afirma Kabengele Munanga, o movimento da negritude foi criticado
por querer unir artificialmente povos geográfica, histórica e culturalmente diferen-
tes, que se inserem no contexto das civilizações com motivos e destinos econômi-
co-políticos diversos.
2- O apoio do consenso
Certos enunciados não exigem demonstração ou provas porque seu con-
teúdo é aceito como válido por consenso em um espaço sociocultural. Veja o
seguinte enunciado:
4- A fundamentação lógica
A argumentação pode ser apresentada com base em operações de racio-
cínio lógico, tais como: implicações de causa e efeito, conseqüência e causa,
condição e ocorrência, entre outras.
(In: O que é propaganda ideológica? de Nelson Jahr Garcia, São Paulo: Brasiliense,
1985).
Note que o objetivo do texto, provar que não existe neutralidade na im-
prensa, é obtido por meio da exposição de causas e conseqüências. Conside-
rando-se a dualidade apontada pelo enunciador: aparência e realidade, é pos-
sível dividir o texto em duas partes:
– aparência: compreende o primeiro período
Causa: a imprensa trabalha com fatos apresentados de maneira objetiva.
Conseqüência: aparência de neutralidade e confiança da maioria dos leitores.
ATIVIDADES
1- Quais os elementos lingüísticos presentes no texto de Manuel Bandeira,
colocado a seguir, que contribuem para que ele seja considerado uma dis-
sertação:
O rio
Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas nos céus, refleti-las.
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
-
Como você viu até aqui, a dissertação exige que seu produtor defenda
uma opinião, um ponto de vista. Para tanto, é preciso expor, analisar e/ou
discutir um problema. Agora, vamos trabalhar com alguns possíveis procedi-
mentos para se expor um problema.
-
b) Afirmação x Problema
Fala-se muito, atualmente, que a televisão é prejudicial às crianças. Não
desenvolve o raciocínio, nem desperta a criatividade. A questão está coloca-
da: a influência que a televisão exerce no desenvolvimento cultural de uma
criança.
c) Problema x Afirmação
É verdade que a televisão é prejudicial às crianças por não desenvolver o
raciocínio, nem despertar a criatividade, como afirmam muitas pessoas?
5- Agora procure abordar o problema relacionado à destruição da natureza.
Para a desenvolvê-lo, formule inicialmente as afirmações:
Crescer e empregar
Para tornar o cenário ainda mais preocupante, a renda média dos trabalhadores,
que havia crescido por três meses consecutivos, voltou a cair. Uma explicação para
esse fenômeno é o aumento do trabalho informal, uma vez que a renda média de um
empregado sem carteira é de R$ 542, 30 e a do trabalhador formal é de R$ 906,70.
O acréscimo de pessoas em busca de emprego, segundo o IBGE, poderia ser expli-
cado pela necessidade de recompor a renda familiar.
-
desemprego começarão a cair. Mesmo que seja assim, a realidade deverá permanecer
muito aquém das expectativas criadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
SUGESTÕES DE LEITURA
Sobre a autora
Profa. Dra. Maria Lúcia da Cunha Victório de
Oliveira Andrade
Doutora em Semiótica e Língüística Geral, é professora de Filologia e Lín-
gua Portuguesa da USP, autora de Relevância e contexto. São Paulo: Humanitas,
2001; e co-autora de Oralidade e Escrita: perspectivas para o ensino de lín-
gua materna. São Paulo, Cortez, 1999.
Anotações
Anotações
Anotações
Língua
Portuguesa
Organizadores
Maria Lúcia V. de Oliveira Andrade
Neide Luzia de Rezende
Valdir Heitor Barzotto
Elaborador
Waldemar Ferreira Netto
2
módulo
Nome do Aluno
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Governador: Geraldo Alckmin
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
Secretário: Gabriel Benedito Issac Chalita
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas – CENP
Coordenadora: Sonia Maria Silva
PROGRAMA PRÓ-UNIVERSITÁRIO
Coordenadora Geral: Eleny Mitrulis
Vice-coordenadora Geral: Sonia Maria Vanzella Castellar
Coordenadora Pedagógica: Helena Coharik Chamlian
Coordenadores de Área
Biologia:
Paulo Takeo Sano – Lyria Mori
Física:
Maurício Pietrocola – Nobuko Ueta
Geografia:
Sonia Maria Vanzella Castellar – Elvio Rodrigues Martins
História:
Kátia Maria Abud – Raquel Glezer
Língua Inglesa:
Anna Maria Carmagnani – Walkyria Monte Mór
Língua Portuguesa:
Maria Lúcia Victório de Oliveira Andrade – Neide Luzia de Rezende – Valdir Heitor Barzotto
Matemática:
Antônio Carlos Brolezzi – Elvia Mureb Sallum – Martha S. Monteiro
Química:
Maria Eunice Ribeiro Marcondes – Marcelo Giordan
Produção Editorial
Dreampix Comunicação
Revisão, diagramação, capa e projeto gráfico: André Jun Nishizawa, Eduardo Higa Sokei, José Muniz Jr.
Mariana Pimenta Coan, Mario Guimarães Mucida e Wagner Shimabukuro
Cartas ao
Aluno
Carta da
Pró-Reitoria de Graduação
Caro aluno,
Com muita alegria, a Universidade de São Paulo, por meio de seus estudantes
e de seus professores, participa dessa parceria com a Secretaria de Estado da
Educação, oferecendo a você o que temos de melhor: conhecimento.
Conhecimento é a chave para o desenvolvimento das pessoas e das nações
e freqüentar o ensino superior é a maneira mais efetiva de ampliar conhecimentos
de forma sistemática e de se preparar para uma profissão.
Ingressar numa universidade de reconhecida qualidade e gratuita é o desejo
de tantos jovens como você. Por isso, a USP, assim como outras universidades
públicas, possui um vestibular tão concorrido. Para enfrentar tal concorrência,
muitos alunos do ensino médio, inclusive os que estudam em escolas particulares
de reconhecida qualidade, fazem cursinhos preparatórios, em geral de alto
custo e inacessíveis à maioria dos alunos da escola pública.
O presente programa oferece a você a possibilidade de se preparar para enfrentar
com melhores condições um vestibular, retomando aspectos fundamentais da
programação do ensino médio. Espera-se, também, que essa revisão, orientada
por objetivos educacionais, o auxilie a perceber com clareza o desenvolvimento
pessoal que adquiriu ao longo da educação básica. Tomar posse da própria
formação certamente lhe dará a segurança necessária para enfrentar qualquer
situação de vida e de trabalho.
Enfrente com garra esse programa. Os próximos meses, até os exames em
novembro, exigirão de sua parte muita disciplina e estudo diário. Os monitores
e os professores da USP, em parceria com os professores de sua escola, estão
se dedicando muito para ajudá-lo nessa travessia.
Em nome da comunidade USP, desejo-lhe, meu caro aluno, disposição e vigor
para o presente desafio.
Caro aluno,
Com a efetiva expansão e a crescente melhoria do ensino médio estadual,
os desafios vivenciados por todos os jovens matriculados nas escolas da rede
estadual de ensino, no momento de ingressar nas universidades públicas, vêm se
inserindo, ao longo dos anos, num contexto aparentemente contraditório.
Se de um lado nota-se um gradual aumento no percentual dos jovens aprovados
nos exames vestibulares da Fuvest — o que, indubitavelmente, comprova a
qualidade dos estudos públicos oferecidos —, de outro mostra quão desiguais
têm sido as condições apresentadas pelos alunos ao concluírem a última etapa
da educação básica.
Diante dessa realidade, e com o objetivo de assegurar a esses alunos o patamar
de formação básica necessário ao restabelecimento da igualdade de direitos
demandados pela continuidade de estudos em nível superior, a Secretaria de
Estado da Educação assumiu, em 2004, o compromisso de abrir, no programa
denominado Pró-Universitário, 5.000 vagas para alunos matriculados na terceira
série do curso regular do ensino médio. É uma proposta de trabalho que busca
ampliar e diversificar as oportunidades de aprendizagem de novos conhecimentos
e conteúdos de modo a instrumentalizar o aluno para uma efetiva inserção no
mundo acadêmico. Tal proposta pedagógica buscará contemplar as diferentes
disciplinas do currículo do ensino médio mediante material didático especialmente
construído para esse fim.
O Programa não só quer encorajar você, aluno da escola pública, a participar
do exame seletivo de ingresso no ensino público superior, como espera se
constituir em um efetivo canal interativo entre a escola de ensino médio e
a universidade. Num processo de contribuições mútuas, rico e diversificado
em subsídios, essa parceria poderá, no caso da estadual paulista, contribuir
para o aperfeiçoamento de seu currículo, organização e formação de docentes.
* Waldemar Ferreira Netto é professor de Filologia e Língua Portuguesa da USP, autor de Introdução à
fonologia da língua portuguesa, São Paulo, Hedra.
Unidade 1
Distinção entre
variantes do português
Organizadores
Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade
Neide Luzia de
O português no mundo Rezende
Valdir Heitor
A língua portuguesa é uma das línguas mais usadas em todo o mundo. Barzotto
Como língua materna é a sexta em número de falantes, depois do chinês Elaboradores
(mandarim), do espanhol, do inglês, do bengali e do hindi. Sua dispersão
Waldemar
ocorre principalmente na região atlântica, nos países Portugal, Brasil, Angola, Ferreira Netto
São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Guiné-Bissau; e na costa leste da África,
em Moçambique. No extremo oriente, é falada no Timor Leste e na Região
Administrativa Especial de Macau no Território Chinês. Essa dispersão teve
início no século XVI com a expansão marítima portuguesa. Atualmente, é
falada por quase 200 milhões de pessoas em todo o mundo, como língua
oficial. Apesar dessa abrangência, a língua portuguesa mantém suas caracte-
rísticas básicas em todas as regiões.
Algumas poucas variações manifestam-se de uma forma mais evidente.
Podem ocorrer no léxico, por exemplo:
O português no Brasil
No século XVI, quando chegaram ao Brasil, os portugueses encontraram
muitas comunidades indígenas falantes de línguas muito diferentes da língua
portuguesa. Na maior parte do litoral, essas comunidades falavam línguas que
pertenciam à família lingüística tupi-guarani. Principalmente eram faladas as
línguas tupinambá e carijó. Nos primeiros séculos da história do Brasil, o
número de falantes dessas línguas indígenas nas regiões ocupadas pelos por-
tugueses era muito maior do que o de falantes do português. Assim, a opção
dos portugueses fora a de usar as línguas majoritariamente faladas nessas re-
giões. Também os nascidos na colônia — mamelucos, filhos de portugueses
com índias — falavam a língua de suas mães.
Apesar dessa característica, no correr dos séculos, a influência portuguesa,
bem como a manutenção de portugueses em posições-chave da administração,
provocou a primazia do uso da língua portuguesa em praticamente todos os
centros administrativos da colônia. Isso não significa que a língua portuguesa
1
Disponível em: <http://teixeira.home.sapo.pt/Quadras_Populares.html>.
tenha ficado incólume desse período de bilingüismo, nem que a presença maci-
ça de negros-africanos com suas línguas particulares não tenha deixado marcas
freqüentes na língua portuguesa. Ao contrário, o português que hoje se fala no
Brasil é o resultado do português falado em Portugal, principalmente com as
contribuições indígenas e africanas do período colonial.
Novamente é no léxico que a contribuição das línguas indígenas e das
línguas africanas pode ser mais facilmente notada.
Atividades
1) Leia o texto abaixo e respondas às questões que vão a seguir.
O padre, em vista dessa informação, tocou a besta para a água, mas o rio era de
uma fundura sem fim, e a besta perdeu o pé. Ela e o padre desapareceram rio adentro,
rodaram arrastados pela correnteza e somente a muito custo conseguiram se salvar.
Quando o padre atingiu a margem onde estava o menino, perguntou:
— Onde você mora?
— Perto daqui.
— Quero ir lá.
Foram, mas não encontraram ninguém em casa.
— Onde está seu pai, menino?
— Papai foi plantar o que não nasce.
— E sua mãe?
— Foi trabalhar para comer ontem.
— Esperarei que eles cheguem – declarou o padre, fechando a carranca.
Os pais do menino se demoraram muito; porém, quando apareceram, lá estava o
padre sentado, esperando, e aí não mais de carranca fechada e sim todo sorridente.
— Que menino esperto esse seu filho! — disse ele ao casal. — É muito inteli-
gente. Quando eu vinha para cá, ele me disse que o gado do seu pai atravessava o rio
com água pelo peito.
— É verdade — falou o pai —, nós criamos patos.
O padre disfarçou uma careta.
— Pois é – disse ele, sorrindo amarelo. — Ele disse que a senhora tinha ido
trabalhar para a família comer ontem.
— Está certo — disse a mãe. — Fui fazer pães para pagar uns que tomei de
empréstimo.
— Ele disse também que o senhor foi plantar o que não nasce.
— É isso mesmo — disse o pai. — Fui ao enterro de um dos meus amigos. (...)
(GUIMARÃES, Ruth (org.). Lendas e fábulas do Brasil. São Paulo: Círculo do
Livro, s.d.)
O Vestido
– Preste atenção um bocado!
Quar vistido hei de ponhá
Pra í na função que tem lá
Na praça, nhô Artú Virado?
Visto aquele verde-má
Ô este, de renda e babado?
Aquele eu já tenho usado
E este, inda tô pur usá
Sugestões de leitura
Há vários sites na Internet que tratam desse assunto e que podem ser con-
sultados. Recomenda-se que se visite a página da Comunidade dos Países de
Língua Portuguesa, diponível em <www.cplp.org>; a página do Instituto
Camões, em <www.instituto-camoes.pt>; a página do Projeto Vercial, em
<www.ipn.pt/opsis/litera/>; a página da Biblioteca Nacional no Rio de Janei-
ro, em <www.bn.br>; a página da Biblioteca Nacional em Lisboa, em
<www.bn.pt>. Em todos eles há grande quantidade de textos disponíveis para
leitura que compreendem toda a história e toda a variação da língua portugue-
sa. Particularmente nos sites das bibliotecas Nacional e do Rio de Janeiro e de
Lisboa podem-se encontrar textos originais, digitalizados, até então raríssimos,
que tratam da ortografia da língua portuguesa, em todos os seus momentos.
Ainda pela Internet, o site Jangada Brasil, em <www.jangadabrasil.com.br>, é
provavelmente um dos melhores dos que tratam das variações populares da cultu-
ra nacional. Ali se encontram muitos textos sobre os mais diversos assuntos.
Sugere-se, ainda, a leitura dos livros descritos abaixo para um aprofundamento
maior do assunto que ora foi tratado.
Unidade 2
Norma ortográfica
Organizadores
Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade
Neide Luzia de
O alfabeto Rezende
Valdir Heitor
O alfabeto usado na escrita da língua portuguesa é formado pelas seguin- Barzotto
tes letras: Elaboradores
Waldemar
Ferreira Netto
maiúsculas: A B C D E F G H I J L M N O P Q R S T U V X Z
minúsculas: a b c d e f g h i j l m n o p q r s t u v x z
Nomes próprios
Machado de Assis Brasil Guernica Igreja
Mário de Andrade Estados Unidos Mona Lisa República
Pelé Europa Dom Casmurro Chefe de Estado
Tonico e Tinoco São Paulo Os Lusíadas Prefeito
Rita Lee av. Paulista Macunaíma General
Raul Seixas rio Tietê A Escrava Isaura Bispo
Kurt Cobain Bexiga Garota de Ipanema Imprensa Nacional
Siglas
ECT
ECT: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos
ONU
ONU: Organização das Nações Unidas
STF
STF: Superior Tribunal Federal
USP
USP: Universidade de São Paulo
Bovespa
Bovespa: Bolsa de Valores de São Paulo
Fapesp
apesp
esp: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
Funai
Funai: Fundação Nacional do Índio
Sebrae
Sebrae: Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
Frases
U ma pesquisadora, à porta de um sitiozinho perdido no interior...
— E ssa terra dá mandioca?
— Não, senhora — responde o morador.
— D á batata?
— T ambém não!
— D á feijão?
— N unca deu!
— A rroz?
— D e jeito nenhum!
— Milho?
— Nem brincando!
— Quer dizer que por aqui não adianta plantar nada?
— A h! S e plantar é diferente...
c ç ss s
conceder caç ar ssar
amass cansar
caccique coççar pass
sseio
ss ansiosso
venccer ranççoso péss
ssimo
ss conssolo
accidente aççude ass
ssoalho
ss censsura
macciço aççúcar ssurro
suss
ss conssumo
sc xc x z
sciente
consc xcelente
exc máx ima paz
acrésc
scimo
sc exc
xceto
xc próxximo refezz
cresc
scer
sc exc
xcessivo
xc auxxílio arrozz
nasc
scer
sc exc
xcitar
xc sintaxxe velozz
scida
desc
sc xcessão
exc
xc texxto luzz
Como se verá, o uso das letras do alfabeto está condicionado à origem das
palavras, sendo portanto necessário conhecê-la. Entretanto, algumas regulari-
dades podem ser verificadas.
1) Nem ç, nem ss, nem rr ocorrem em começo de palavra.
2) A letra s em começo de palavra e depois de consoante tem o mesmo
valor sonoro do ss: soar, servir, sossegar, cansar, conversar, valsa, pulso,
curso, amassar, assinar, dissertar, emissora etc.
3) A letra r em começo de palavra e depois de consoante tem o mesmo
valor sonoro do rr: roer, rua, raiva, risada, honra, melro, corrida, errar,
horror, arrumar etc.
4) A letra s e a letra z só têm valores sonoros diferentes em começo de
palavra: atrás, faz, rapaz, apraz, inglês, vocês, barris, diretriz, aprendiz, fre-
guês, acidez, avidez, pauzinhos, papeizinhos, cacauzeiro, reizete, pausar,
paisana, causa, coisa, coisinha, zebra, sapo, azedo, mesa etc.; zabumba,
zebra, zinco, zôo, zurzir, sapo, sebe, silo, solo, suave etc.
5) Antes de e e de i, as letras c e g têm valores sonoros semelhantes aos do
ç e do j: jeito, jirau, nojento, gente, girafa, magenta, acerto, acinte, caçar,
açouque, açúcar etc.
Acentuação
A convenção para marcação gráfica do acento da língua portuguesa é
bem mais simples do que a que se fez para o uso do alfabeto. Tendo em vista
que as palavras da língua portuguesa na sua grande maioria são paroxítonas
ou oxítonas terminadas em consoante, ter-se-á que estabelecer convenções
apenas para um pequeno grupo de palavras. Vale lembrar que palavras
paroxítonas são as que tem o acento tônico na penúltima sílaba, palavras
proparoxítonas na antepenúltima e oxítonas, na última sílaba.
As convenções mais gerais para a acentuação gráfica são as seguintes.
1) Paroxítonos terminados em vogal a, e ou o, seguidos ou não de s, não
são acentuados: janela, pelote, recado, miragem, aguardam, casas, postos,
bailes.
2) Paroxítonos terminados em vogal a e e seguidos de m ou de ns, não
são acentuados: miragem, aguardam, item, hifens, bagagem, bagagens.
3) Oxítonos terminados em consoante diferente de s ou de m não são
acentuados: lugar, acender, coronel, papel, quiloton, panteon, telex, unissex.
Venda à vista:
Assistiram à peça:
Unidade 3
Morfossintaxe das
classes de palavras
Organizadores
Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade
Neide Luzia de
Estrutura e formação de palavras Rezende
Valdir Heitor
As palavras da língua portuguesa formam-se a partir de junção de elemen-
Barzotto
tos menores a uma base historicamente determinada. Assim, podemos verifi-
car que palavras como jardineiro e jardinagem são formas derivadas de uma Elaboradores
mesma forma básica jardim; no primeiro caso acrescentou-se-lhe -eiro e no Waldemar
segundo -agem. Na maioria das vezes, alguns ajustes fonéticos são necessári- Ferreira Netto
os, como foi o caso da variação das letras m e n, bem como de seus valores
sonoros correspondentes. Algumas vezes o acréscimo ocorre antes da base
historicamente determinada: fazer e desfazer, por exemplo. Dessa maneira
podemos distinguir três elementos principais na formação das palavras: o ra-
dical — base a partir da qual se forma a palavra — o prefixo — elemento que
se acrescenta antes do radical — e o sufixo — elemento que se acrescenta
depois do radical. Alguns dos ajustes podem ser acréscimos de letras e valores
sonoros correspondentes, estabelecendo elementos de ligação. É o caso de
agressividade, que tem como forma básica a palavra agressivo. A essa forma
acrescentou-se -dade. Houve necessidade de ajustes, que nesse caso foi a
inserção de uma vogal de ligação -i. Compare-se, por exemplo, com igualda-
de, em que apenas se acrescentou -dade à base igual.
DERIVAÇÃO
Os prefixos disponíveis para os falantes da língua portuguesa formarem
novas palavras têm origem diversa. Abaixo segue uma lista com alguns desses
prefixos separados por sua origem grega ou latina:
LATINOS GREGOS
ante
ante- — antebraço, anteontem a -, an
an- — acéfalo, anônimo, atrofia
contra
contra- — contra-indicação, contraprova anfi
anfi- — anfiteatro,
circum
circum
cum- — circundar, circunavegar ana
ana- — anacrônico, anagrama
des
des- — desusar, desfazer, descaroçar anti
anti- — antialcoólico, antibiótico
de
de- — decompor, depenar arqui
arqui-, arce- — arquiinimigo, arcebispo
ex - — expatriar, expor dis
dis- — dislalia, disfunção
in
in-, i - — inútil, ilegal endo
endo- — endogenia, endovenoso
en
entrtr
tree -, in
intter
er- — entrever, interpor epi
epi- — epiderme, epicentro
L ATINOS GREGOS
in tr
intr o - — intrometer, introspectivo
tro eu
eu- — eufonia, eulalia,
pr
pree - — predizer, predispor hemi
hemi- — hemiplégico, hemisférico
re - — reassumir, reviver hiper
hiper- — hipertensão, hipertrofia
ultr
ultraa - — ultrapassar, ultravioleta hipó
hipó- — hipoglicemia, hipotrofia
sub
sub- — subnutrido, subdelegado sin
sin- — sinônimo, sincrônico
sobre
sobre-, super
super-, supra
supra- — sobreposto,
supersônico, supranacional
retr
etro o- — retroagir, retrovisor
-aria
aria -ia
ia -mento
mento -oso
oso osa
oso, -osa -ável ível
ável, -ível
ável
livro>livraria valente>valentia ornar>ornanento rigor>rigoroso desejar>desejável
pirata>pirataria alegre>alegria pensar>pensamento leite>leitosa remover>removível
io
-io ez
-ez eza
ez, -eza ção
-ção udo
-udo douro
-douro
mulher>mulherio surdo>surdez nomear>nomeação ponta>pontudo beber>bebedouro
poder>poderio puro>pureza coroar>coroação sorte>sortudo vir>vindouro
agem
-agem ice
-ice dor
-dor ano
-ano tório
-tório
folha>folhagem menino>meninice regar>regador Peru>peruano inibir>inibitório
língua>linguagem tolo>tolice roer>roedor Camões>camoniano derivar>derivatório
al
-al -dão tório
-tório ento
-ento iço
-iço
banana>bananal manso>mansidão purgar>purgatório sede>sedento meter>metediço
lama>lamaçal podre>podridão orar>oratório peçonha>peçonhento assustar>assustadiço
ada
-ada dade
-dade ante
ante, - ente
-ante inte
ente, -inte engo
-engo io
-io
bico>bicada mal>maldade pedir>pedinte mulher>mulherengo regar>regadio
papel>papelada legal>legalidade combater>combatente verde>verdolengo achar>achadio
ugem
-ugem ura
-ura ência
-ência aico
-aico ivo
-ivo
pena>penugem branco>brancura obedecer>obediência prosa>prosaico pensar>pensativo
lã>lanugem doce>doçura reger>regência judeu>judaico lucrar>lucrativo
A VARIAÇÃO DE GÊNERO
o presidente a presidente
a presidenta
o parente a parente
a parente
A variação de número
As marcas suf ixais da variação de número também não podem ser
abarcadas por uma regra geral que dê conta de todas as possibilidades. Há
algumas tendências, no entanto:
SINGULAR PLURAL
-ão
ão: sabão, mamão, limão
ão -ões
ões: sabões, mamões, limões
ões
ão
-ão
ão: mão, órfão, irmão ãos
-ãos
ãos: mãos, órfãos, irmãos
ão
-ão
ão: alemão, pão, tabelião ães
-ães
ães: alemães, pães, tabeliães
ão
-ão
ão: aldeão, verão ões
-ões ãos
ões, -ãos
ãos: aldeões, aldeães; verões, verãos
ão
-ão
ão: ancião, ermitão, sultão ões
-ões ãos
ões, -ãos ões
ões: anciões
ãos, -ões anciões, anciãos, anciães;
ermitões, ermitãos, ermitães; sultões, sultãos, sultães
-al el
al, -el
al el (tôn.), -ol
el, -el ol ul
ul: pombal, túnel, papel,
ol, -ul ais
-ais eis
ais, -eis éis
eis, -éis óis
éis, -óis uis
óis, -uis
uis: pombais, túneis, papéis, anzóis,
anzol, azul azuis
il (tôn.), -il
-il il
il: funil, fóssil is
-is eis
is, -eis
eis: funis, fósseis
as
-as es
as, -es is us (átonos): atlas, pires, lápis, ônus,
is, -us
es, -is não mudam
mudam: os atlas, os pires, os lápis, os ônus, os
vírus vírus
Substantivo
Além de sua composição interna, as palavras podem ser compreendidas
por meio da relação que estabelecem umas com as outras no processo de
construção frasal. As palavras distribuem-se em classes gramaticais, variáveis
e invariáveis. Classes gramaticais variáveis são as que exigem que sua forma
básica seja flexionada em gênero e número, por exemplo; classes gramaticas
invariáveis não têm variação obrigatória. As classes gramaticais da língua
portuguesa são: substantivo, adjetivo, numeral, artigo, pronome, verbo, ad-
vérbio, conjunção e preposição.
As classes gramaticais de palavra que exigem flexão de gênero e número
são: o substantivo, o adjetivo, o numeral, o artigo e o pronome. A classe gra-
matical que exige flexão de pessoa, tempo, modo, aspecto e voz é o verbo.
Uma das características da construção frasal na língua portuguesa é um
fenômeno gramatical chamado concordância. A concordância estabelece que
certos grupos de palavras recebam a mesma marcação de gênero e número. A
partir do gênero intrínseco dos substantivos, definido tanto pela sua forma
básica quanto pelo resultado de diversas derivações, as palavras que, na frase,
relacionam-se a esse substantivo têm de receber o mesmo gênero, estabele-
cendo um grupo nominal coeso entre si.
Tomando-se uma palavra como Brasil, que é um substantivo que tem o
gênero masculino, pode-se derivar brasilidade, que tem o gênero feminino.
Trata-se, pois, de um substantivo feminino. Quaisquer palavras que se relaci-
onem com essas têm de receber o mesmo gênero, masculino se se relaciona-
rem com Brasil e feminino se se relacionarem com brasilidade.
O nosso Brasil fica na América Latina.
A nossa brasilidade é conhecida no exterior.
língua, outros têm vida curta e logo são abandonados. Os neologismos po-
dem ser elaborados por mecanismos diversos: afixação, isto é, pelo acrésci-
mo de sufixos ou de prefixos a uma base pré-existente: imexível, automotivo,
grevismo, besteirol etc.; pela fixação de grupos de palavras quatro-dormitó-
rios, para um apartamento com quatro quartos, boca-de-urna, para os mili-
tantes que fazem propaganda de seus partidos junto dos locais de votação;
pelo empréstimo de palavras estrangeiras: pole-position, mouse, skinhead; pelo
estabelecimento de siglas: PT, CPMF, MEC, dentre outras cujo desdobramen-
to nem sempre tem relação com as letras que formam a sigla — MEC, por
exemplo, hoje é apenas Ministério da Educação, e não mais Ministério de
Educação e Cultura, como era antes.
Nem sempre é fácil decidir qual é o gênero dos neologismos: para skinhead,
por exemplo, que é uma expressão que significa, na sua língua original, cabe-
ça-pelada ou careca, optou-se por atribuir-lhe o gênero masculino.
[...] as cinc
cincoo últimas ccanções
anções eexxecutadas foram: “Sick of It”, Primitives; “Shrine”,
The Dambuilders; “Show Me”, Over the Rhine; “Should I Stay or Should I Go”, The
Clash; “Short Skirt, Long Jacket”, Cake. (Folha de S. Paulo. 17 mai. 2004. Caderno
Folhateen.)
Adjetivo
Os adjetivos formam uma classe de palavras variáveis, que concordam
sempre com os substantivos. De maneira geral, pode-se dizer que são pala-
vras que dependem de um substantivo pois que sempre o acompanham, po-
dendo vir antes ou depois dele. Seguem as mesmas regras derivacionais dos
substantivos.
Assim como os substantivos, os adjetivos também se reportam a fatos da
realidade, ou extralingüísticos.
[...] a embalagem skinhead não fazia sentido estético na época, a moda pedia
madeixas compridas. (Folha de S. Paulo. 17 mar. 1998. Caderno Esportes.)
Um automóvel Citroën caiu no buraco e ficou só com a parte traseira para fora
d’água. (Folha de S. Paulo. 1 mai. 2004. Caderno Cotidiano.)
Girotto deu uma boa notícia a seus colegas médicos e enfermeiros brasileiros.
(Folha de S. Paulo. 31 mai. 2004. Caderno Mundo.)
Para quem está pensando em financiar um imóvel, uma notícia boa e outra ruim.
(Folha de S. Paulo. 30 mai. 2004. Caderno Imóveis.)
Numeral
Numerais são palavras para reportar quantidades específicas das coisas
referidas pelos substantivos. Atuam de maneira semelhante aos adjetivos, fa-
zendo parte do mesmo grupo nominal. Os numerais podem ser classificados
como cardinais, ordinais, fracionários e multiplicativos.
Os numerais cardinais são os que tratam dos números propriamente ditos:
um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, e assim em diante. Via
de regra, são usados por extenso até o número cinco, às vezes até o nove, para
além disso usam-se os símbolos próprios para os números: 10, 11, 25, 147,
1.589 etc.
Com exceção dos numerais cardinais um e dois, não se faz nenhuma con-
cordância dele com o substantivo a que se referem.
Segurei a máquina com as duas mãos e pressionei para baixo. (Folha de S. Paulo. 23
mai. 2004. Ombudsman.)
Cinco testemunhas de acusação e cinco de defesa serão ouvidas. (Folha de S.
Paulo. 31 mai. 2004. Caderno Cotidiano.)
As ter
ercceiras partidas da série acontecem na terça-feira. (Folha de S. Paulo. 27 fev.
eiras
1999. Caderno Esportes.)
Nos exemplos acima, nota-se que primeiras, numeral ordinal, quando ocor-
re antes do adjetivo, tem o sentido próprio de estabelecimento de ordem; no
segundo caso — questões primeiras — o numeral adquiriu um valor que seria
muito mais apropriado para adjetivos do que para numerais ordinais, tem um
significado muito próximo de adjetivos como principais, básicas, importan-
tes ou outros semelhantes.
Os numerais fracionários e multiplicativos são usados à semelhança dos subs-
tantivos. Estabelecem a base a partir da qual se farão todas as concordâncias.
Artigo
As palavras definidas como artigo são usadas de forma semelhante aos
adjetivos e aos pronomes demonstrativos, com o qual concorrem, como se
verá adiante. Formam uma classe muito fechada, contendo apenas oito ele-
mentos: o, os, a, as, um, uns, uma, umas. Como se vê, variam em gênero e em
número. Chamam-se definidos os artigos o, os, a, as e indefinidos os artigos
um, uns, uma e umas.
Os artigos ocorrem obrigatoriamente antes dos substantivos, com o qual
concordam em gênero e número, e sempre como as primeiras palavras de um
grupo nominal qualquer.
Pronome
A classe gramatical dos pronomes pode ser subdividida em: pessoais, de-
monstrativos, possessivos, indefinidos, interrogativos e relativos.
Os pronomes pessoais têm uso semelhante aos substantivos. Referem-se
especialmente às chamadas pessoas do discurso: 1ª pessoa, 2ª pessoa e 3ª
pessoa. Trata-se de uma característica que os pronomes compartilham apenas
com os verbos e com alguns advérbios. Essas pessoas do discurso também
são flexões e, portanto, estabelecem concordâncias: pronomes de 1ª pessoa
desencadeiam o uso de formas verbais de 1ª pessoa nos verbos e, eventual-
mente, outros pronomes que estiverem relacionados a ele. Assim, aumentam-
se as flexões: gênero, número e pessoa.
Os pronomes pessoais de primeira pessoa indicam o próprio falante, autor
do discurso que se profere ou que se escreve. Sua forma mais óbvia é o pro-
nome eu, mas também ocorre como me ou mim, e na expressão comigo. O
pronome eu é usado exatamente como um substantivo, isto é, a partir dele
fazem-se as concordâncias das demais palavras do grupo nominal que ele
define. Dessa maneira, se o pronome eu reportar-se a um falante feminino,
todo o grupo nominal será feminino.
Se você não for lá, eu mesma vou. (SABINO, Fernando. No quarto de Valdirene.)
Isso é o que todas nós dizemos nas tuas condições, minha filha. (AZEVEDO, Aluísio.
Livro de uma sogra.)
Nos exemplos acima, ambos extraídos do mesmo autor, pode-se notar que
o uso da forma tu, primeiro caso, e da forma você, segundo caso, desencadei-
am a restrição do uso dessas formas.
A concordância no grupo nominal é semelhante aos outros casos. Con-
corda-se sempre com o pronome.
Os pronomes de terceira pessoa são ele, eles, ela, elas, se, si e a expressão
consigo. Como se vê, têm formas específicas para a variação de gênero e de
número. Pode-se dizer que a chamada terceira pessoa não é a primeira nem a
segunda, mas é o assunto sobre o qual se está discorrendo. Referem-se a fatos
estritamente lingüísticos, como a recuperação de idéias e sentidos que já fo-
ram falados.
Mas eu sei o que foram as minhas dores. (LISPECTOR, Clarice. Uma ira.)
Em outros braços tu resolves tuas crises
Em outras bocas
Não consigo te esquecer (FAGNER, Raimundo. Deslizes.)
entre os pronomes. Assim, como no exemplo acima optou-se pela forma tu,
manteve-se a correlação com as formas tuas e te. Caso a opção fosse por você
a correlação seria com as formas suas e se.
[...] você precisa ver se acha por aí aquele trabalhinho que lhe mandei pra ler.
(ANDRADE, Mário de. Cartas de Mário de Andrade a Manuel Bandeira.)
Eu também estava sofrendo de — megalomania! Nem bem cheguei fui ler a carta
e estava certo. Que hei de fazer com esta cabeça cada vez pior! Outro dia falei uma
burrada dos diabos numa crítica musical. (ANDRADE, Mário de . Cartas de Mário de
Andrade a Manuel Bandeira.)
— Rosa, que mal te fiz eu, para estares assim a amofinar-me com essas falas?
(GUIMARÃES, Bernardo. A escrava Isaura.)
Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui
escravo não mais será escravo de ninguém. (VARGAS, Getúlio. Carta-testamento.)
Iniciei a construção de um novo balão e novo motor, este um pouco mais forte,
este
aquele um pouco maior. (DUMONT, Santos. O que eu vi.)
Perdoe-me trazer o fato para esta carta, que comecei tomado de tristeza e dor de
sua grande perda. ( TEIXEIRA, Anísio. Correspondência . Disponível em:
<www.prossiga.br/anisioteixeira/>.)
Verbo
Os verbos são as palavras que, na língua portuguesa, mais variam em suas
flexões. Apesar de não compartilharem da variação de gênero, como as de-
mais palavras que vimos até agora, recebem marcação de pessoa, número,
tempo, aspecto, modo e voz.
A variação de pessoa, as mesmas dos pronomes, é obrigatória. Suas mar-
cas caracterizam-se por serem formas sufixais associadas ao radical do verbo,
com os devidos ajustes.
Pode-se notar que as marcas são -o e -s, para a primeira e segunda pessoa
do singular, -mos, -is e -m para a primeira, segunda e terceira pessoa do plural.
Também se verifica que não há marca para a terceira pessoa do singular. Os
radicais verbais, nesse caso, são canta-, vende- e parti-. Cada um deles teve
de ter seus próprios ajustes para acondicionar as marcas de pessoa.
As marcas de pessoa dadas acima são as formas que se pode chamar de
canônicas da língua portuguesa; não são as mais usadas. Na fala coloquial, e
mesmo em textos escritos, formais ou não, essas mesmas marcas de pessoa
são usadas para referir pessoas do discurso diferentes dessas canônicas.
vós, minha menina, nada quereis saber? (PENA, Martins. As casadas solteiras.)
E vós
[...] a minha fé com os olhos fechados crê firmemente, Senhor, que estais nesse
Sacramento. (VIEIRA, Pe. Antônio. Sermão de quarta-feira de cinzas.)
Todos vvo
ocês sab em que, quando tomei posse, a economia brasileira vivia um
sabem
momento dramático. (LULA DA SILVA, Luís Inácio. FolhaOnline. 7 abr. 2003.)
Então — não sei se você se lembra — que a gente chegou e o homem do botequim
disse que o siri já tinha acabado. (PONTE PRETA, Stanislaw . Não sei se você se lembra.)
Ah! vocês querem levar outra sova ao dominó como a de sábado passado?
(QUEIRÓS, Eça de . Os maias.)
Você foi
O maior dos meus casos,
De todos os abraços
O que eu nunca esqueci (ROBERTO CARLOS. Outra vez.)
Então a gente começava a falar sobre as pessoas que a gente conhecia em
comum, ali no bairro [...] (Folha de S. Paulo. 5 mar. 2002. Caderno Ilustrada.)
Não vou dizer que vender emos US$ 10 milhões amanhã. (Folha de S. Paulo. 24 nov.
enderemos
2003. Caderno Ilustrada.)
O time concentra três dos cinco atletas de Bernardinho que venceram a Copa do
Mundo. (Folha de S. Paulo. 6 dez. 2003. Caderno Esportes.)
— Isso é um crime, ouviu?, é um crime o que vocês estão fazendo com esse rapaz!
(RODRIGUES, Nelson. Delicado.)
— Ei, Nicolino! NICOLINO!
— Que é?
— Você está fic ando surdo, rapaz! A Grazia passou agorinha mesmo. (SABINO,
ficando
Fernando. Como nasce uma história.)
Nos dois casos, os verbos fazer e ficar têm a marca morfológica -ndo
referindo um fato durante o seu desenvolvimento. No primeiro exemplo, a
maldade que se está fazendo com o rapaz está sendo referida no momento da
fala do locutor; da mesma maneira o hipotético ensurdecimento do Nicolino,
que parece estar se acentuando naquele mesmo instante em que ele é chama-
do. Note que as ações estão sendo referidas no tempo presente, relativamente
ao locutor, e durante o momento da fala do locutor: um tempo presente e um
aspecto imperfectivo.
Deve-se entender que o aspecto verbal refere o fato tomando-o sob três
pontos de vista: o seu início, o seu decorrer e o seu final. Assim, as marcas
aspectuais estarão sempre voltadas para um desses pontos de vista.
PRESENTE INDIC
INDICAATIV
TIVOO SUBJUNTIVO
corro corra
corremos corramos
correm corram
PASSADO corri corresse
corremos corrêssemos
correram corressem
FUTURO correrei correr
correremos corrermos
correrão correrem
Quem sabe se não seria melhor abandonar duma vez esses sonetos indiscretos?
Repare que talv ez eles também per
talve erttençam um bocado àquele “ruim esquisito”
que você inventou com tanta felicidade. (ANDRADE, Mário de. Cartas de Mário de
Andrade a Manuel Bandeira.)
Atividades
1) Leia os textos abaixo e responda às questões.
Finalmente, a Firjan defende a imediata construção de uma refinaria para 220
mil barris por dia no norte fluminense. Alega que a inexistência dessa refinaria faz
com que o Brasil tenha de exportar petróleo bruto e importar seus derivados,
perdendo US$ 5 por barril. (ALVES, M. O Globo.)
A peritonite [pode ser] provocada por substâncias vindas do exterior (no caso
de ferimentos penetrantes) ou do interior, por contaminação com o conteúdo das
vísceras (perfuração do estômago ou do intestino). (FERIMENTO de abdome. Dis-
ponível em: <www.rafe.com.br/sql_enciclopedia/>.)
Embora as palavras exportar e importar, no primeiro texto, e exterior e
interior no segundo refiram ambientes diferentes, os prefixos ex- e im- têm a
mesma significação. Discrimine os ambientes que são referidos por essas pa-
lavras, apontando as semelhanças de seus prefixos.
leiro (98 e 99), e conquistou a Copa do Brasil, em 95, e o Mundial de Clubes da Fifa,
no início do ano passado. (FolhaOnline. 30 jan. 2001. Esportes.)
Na Bolsa de Tóquio, as ações da Toshiba fecharam em queda de 4,7%. As vendas
do grupo no período recuaram para 2,511 trilhões de ienes (US$ 20,49 bilhões), de
2,816 trilhões de ienes em igual período de 2000. (Agência Estado. Disponível em:
<www.estadao.com.br>. 28 jan. 2001.)
Dali tombavam os mortos e os feridos, alguns até ao fundo da garganta, embai-
xo, por onde tinham entrado os sessenta homens do esquadrão de lanceiros e a
divisão de artilharia, quebrando-se, ambos, de encontro a forte trincheira posta de
uma e outra margem do rio, na bifurcação das duas bocainas, feito uma represa.
(CUNHA, Euclides da. Os sertões.)
Nos textos acima, as palavras grifadas iniciam-se com as sequências tri e
bi. Aponte os casos em que essas seqüências são morfemas em ambas as
palavras de cada parágrafo, justificando as suas decisões.
16) No texto abaixo, qual foi o recurso lingüístico usado pelo autor para
caracterizar o olhar por meio de óculos, ou pince-nez, de Dona Sebastiana?
— Por que não advoga? perguntou Dona Sebastiana, rindo, com seu quádruplo
olhar altaneiro, da filha ao caboclo que, na sua frente e a seu mando, se sentavam
juntos. (BARRETO, Lima. Milagre de Natal.)
17) Nos grupos nominais abaixo indique o termo com os quais os artigos
se relacionam.
— Pobre animal! pobre animal! — dizia o Borges, fechando-se no quarto. —
Como tudo se vai transformando em minha vida! Já não possuo os meus dois me-
lhores amigos, os únicos que me restavam: o Barroso e o Urso! (AZEVEDO, Aluísio.
Filomena Borges.)
18) Nos textos abaixo, os artigos estão ora na forma masculina ora na
feminina. Justifique essa variação.
Estiveram presentes nesta grande prova, todos os melhores ginastas nacionais.
(Jornal Torrejano. Disponível em: <www.jornaltorrejano.pt>. Acesso em: 3 mai. 2003.)
A ginasta, medalha de ouro no solo no Mundial de Anaheim, deve participar da
Copa Americana, evento que reúne as melhores ginastas do continente. (Folha de
S. Paulo. 7 dez. 2003. Caderno Esportes.)
19) No trecho da peça que vai transcrito abaixo, cada uma das persona-
gens usa de uma forma pronominal diferente da outra para referir-se ao outro
e, também, a si próprio. Mostre essas diferenças.
GUSTAVO — Ora! Saber para quê? Que remédio podes dar-me? O que eu quero
é dinheiro! É de dinheiro que eu preciso! Tu o tens para mo emprestar?
LOURENÇO (Tirando do bolso, dinheiro embrulhado num lenço sujo.) — Aqui
estão minhas economias, juntadas vintém por vintém... Se vossemecê precisa, Lou-
renço faz muito gosto... (AZEVEDO, Artur; DUARTE, Urbano. O escravocrata.)
20) Leia o texto abaixo e diga qual é a proximidade dos cortes a que refere
a moça.
A moça reclamava:
— Mamãe! Escolha; qual é mais bonito, este corte cinzento ou aquele branco e
preto? (ALMEIDA, Júlia. A viúva Simões.)
Sugestões de leitura
Para uma leitura complementar, há algumas obras que devem ser referi-
das; são as que vão abaixo. No entanto, há que referir-se também os dicioná-
rios e gramáticas da língua portuguesa: o Dicionário Houaiss da língua por-
tuguesa, editado pelo Instituto Antônio Houaiss, o Novo Aurélio, século XXI,
editado pela Melhoramentos, e o Michaelis, moderno dicionário da língua
portuguesa, editado pela Nova Fronteira, são os mais completos que estão
disponíveis nas bibliotecas de maneira geral. É importante acostumar-se a
consultar as obras que fogem dos resumos, ainda que tenham um acesso mais
difícil. Dentre as gramáticas, há que citar a Nova gramática portuguesa de
Celso Cunha e Lindley Cintra, a Moderna gramática brasileira de Celso Pedro
Luft, e a Moderna gramática portuguesa de Evanildo Bechara, tanto na 37ª
ed., que foi revista e ampliada, editada pela Lucerna, quanto nas anteriores a
essa, editadas pela Companhia Nacional. Como obras de referência, ainda há
os dicionários de regência nominal e verbal, de Celso Pedro Luft, ambos edi-
tados pela Ática, bem como o Dicionário de regimes de substantivos e adjeti-
vos e o Dicionário de verbos e regimes, ambos de Francisco Fernandes, edita-
dos pela Globo.
Não se deve fiar, entretanto, somente nas leituras de referência, pois essas
estarão dependendo especialmente da capacidade de memorização. Deve-se
enfatizar a leitura de obras diversas, sobretudo aquelas cujos autores mostrem
uma preocupação com o uso da linguagem para além de seu uso corriqueiro.
Assim, tanto obras literárias quanto científicas serão proveitosas quando fo-
rem freqüentes e resultarem de um trabalho cuidadoso.
Bibliografia
ALVES, Ieda Maria. Neologismo. Criação lexical. São Paulo: Ática, 1994.
BACCEGA, Maria Aparecida. Concordância verbal. São Paulo: Ática, 1994.
COSTA, Sônia Bastos Borba. O aspecto em português. São Paulo: Con-
texto, 1990.
ILARI, Rodolfo. A expressão do tempo em português. São Paulo: Contex-
to/Educ, 1997.
SANDMANN, Antônio José. Formação de palavras no português brasi-
leiro contemporâneo. Curitiba: Scientia et Labor/Ícone, 1988.
VIARO, Mário Eduardo. Por trás das palavras: manual de etimologia do
português. São Paulo: Globo, 2004.
Língua
Portuguesa
Organizadores
Maria Lúcia V. de Oliveira Andrade
Neide Luzia de Rezende
Valdir Heitor Barzotto
Elaborador
Waldemar Ferreira Netto
3
módulo
Nome do Aluno
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Governador: Geraldo Alckmin
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
Secretário: Gabriel Benedito Issac Chalita
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas – CENP
Coordenadora: Sonia Maria Silva
PROGRAMA PRÓ-UNIVERSITÁRIO
Coordenadora Geral: Eleny Mitrulis
Vice-coordenadora Geral: Sonia Maria Vanzella Castellar
Coordenadora Pedagógica: Helena Coharik Chamlian
Coordenadores de Área
Biologia:
Paulo Takeo Sano – Lyria Mori
Física:
Maurício Pietrocola – Nobuko Ueta
Geografia:
Sonia Maria Vanzella Castellar – Elvio Rodrigues Martins
História:
Kátia Maria Abud – Raquel Glezer
Língua Inglesa:
Anna Maria Carmagnani – Walkyria Monte Mór
Língua Portuguesa:
Maria Lúcia Victório de Oliveira Andrade – Neide Luzia de Rezende – Valdir Heitor Barzotto
Matemática:
Antônio Carlos Brolezzi – Elvia Mureb Sallum – Martha S. Monteiro
Química:
Maria Eunice Ribeiro Marcondes – Marcelo Giordan
Produção Editorial
Dreampix Comunicação
Revisão, diagramação, capa e projeto gráfico: André Jun Nishizawa, Eduardo Higa Sokei, José Muniz Jr.
Mariana Pimenta Coan, Mario Guimarães Mucida e Wagner Shimabukuro
Cartas ao
Aluno
Carta da
Pró-Reitoria de Graduação
Caro aluno,
Com muita alegria, a Universidade de São Paulo, por meio de seus estudantes
e de seus professores, participa dessa parceria com a Secretaria de Estado da
Educação, oferecendo a você o que temos de melhor: conhecimento.
Conhecimento é a chave para o desenvolvimento das pessoas e das nações
e freqüentar o ensino superior é a maneira mais efetiva de ampliar conhecimentos
de forma sistemática e de se preparar para uma profissão.
Ingressar numa universidade de reconhecida qualidade e gratuita é o desejo
de tantos jovens como você. Por isso, a USP, assim como outras universidades
públicas, possui um vestibular tão concorrido. Para enfrentar tal concorrência,
muitos alunos do ensino médio, inclusive os que estudam em escolas particulares
de reconhecida qualidade, fazem cursinhos preparatórios, em geral de alto
custo e inacessíveis à maioria dos alunos da escola pública.
O presente programa oferece a você a possibilidade de se preparar para enfrentar
com melhores condições um vestibular, retomando aspectos fundamentais da
programação do ensino médio. Espera-se, também, que essa revisão, orientada
por objetivos educacionais, o auxilie a perceber com clareza o desenvolvimento
pessoal que adquiriu ao longo da educação básica. Tomar posse da própria
formação certamente lhe dará a segurança necessária para enfrentar qualquer
situação de vida e de trabalho.
Enfrente com garra esse programa. Os próximos meses, até os exames em
novembro, exigirão de sua parte muita disciplina e estudo diário. Os monitores
e os professores da USP, em parceria com os professores de sua escola, estão
se dedicando muito para ajudá-lo nessa travessia.
Em nome da comunidade USP, desejo-lhe, meu caro aluno, disposição e vigor
para o presente desafio.
Caro aluno,
Com a efetiva expansão e a crescente melhoria do ensino médio estadual,
os desafios vivenciados por todos os jovens matriculados nas escolas da rede
estadual de ensino, no momento de ingressar nas universidades públicas, vêm se
inserindo, ao longo dos anos, num contexto aparentemente contraditório.
Se de um lado nota-se um gradual aumento no percentual dos jovens aprovados
nos exames vestibulares da Fuvest — o que, indubitavelmente, comprova a
qualidade dos estudos públicos oferecidos —, de outro mostra quão desiguais
têm sido as condições apresentadas pelos alunos ao concluírem a última etapa
da educação básica.
Diante dessa realidade, e com o objetivo de assegurar a esses alunos o patamar
de formação básica necessário ao restabelecimento da igualdade de direitos
demandados pela continuidade de estudos em nível superior, a Secretaria de
Estado da Educação assumiu, em 2004, o compromisso de abrir, no programa
denominado Pró-Universitário, 5.000 vagas para alunos matriculados na terceira
série do curso regular do ensino médio. É uma proposta de trabalho que busca
ampliar e diversificar as oportunidades de aprendizagem de novos conhecimentos
e conteúdos de modo a instrumentalizar o aluno para uma efetiva inserção no
mundo acadêmico. Tal proposta pedagógica buscará contemplar as diferentes
disciplinas do currículo do ensino médio mediante material didático especialmente
construído para esse fim.
O Programa não só quer encorajar você, aluno da escola pública, a participar
do exame seletivo de ingresso no ensino público superior, como espera se
constituir em um efetivo canal interativo entre a escola de ensino médio e
a universidade. Num processo de contribuições mútuas, rico e diversificado
em subsídios, essa parceria poderá, no caso da estadual paulista, contribuir
para o aperfeiçoamento de seu currículo, organização e formação de docentes.
Palavras invariáveis
Organizadores
Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade
Neide Luzia de
Advérbios Rezende
A classe de palavras dos advérbios comporta uma variedade bastante grande Valdir Heitor
de formas. De maneira geral, caracterizam-se por não estabelecer relações de Barzotto
concordância obrigatória com outras palavras da oração. São elementos que Elaboradores
modificam o sentidos de palavras e de orações, acrescentando-lhes novas in- Waldemar
formações. Ferreira Netto
Tempo e lugar são circunstâncias bastante características da informação dos
advérbios. De maneira geral, mesmo sem fazer concordância, nesses casos, os
advérbios têm alguma relação com a pessoa e o tempo das palavras com que se
relacionam. No exemplo abaixo, repare nos advérbios ontem e hoje.
– Não sei... disse o pai; o fato é que ela estava ontem muito bem disposta e hoje
hoje, ao
contrário, está impertinente como nunca! AZEVEDO, Aluísio. Girândola de Amores.
abarca uma grande variedade de formas cujas relações com as demais pala-
vras das orações também são muito variadas. Nesses casos, o advérbio rela-
ciona-se especialmente com as classes de palavras verbo e adjetivo, podendo
também relacionar-se com outros advérbios.
A princípio ele achou prudente não voltarem juntos, já que uma não sabia da existência
da outra. SABINO, Fernando. O golpe do comendador.
Quem é o homem nesta casa? Se você não for olhar eu não fico aqui dentro nem mais
um minuto. SABINO, Fernando. No quarto da Valdirene
Ela ficara moça e era bonita; alguns diziam muito bonita, e ela concordava com estes.
ALENCAR, José de. Encarnação.
Atirou, desmontou para dar-lhe o tiro da graça; e descobriu então que havia matado um
bezerro complacente que uma máscara adrede transformara em onça. BARRETO, Lima.
Numa e Ninfa.
Descobrindo o engano, Berta não se agastou e riu-se gostosamente com o rapaz, da
peça que lhe pregara ele. ALENCAR, José de. Til.
Ninguém lhe ouvia palavra mais áspera ou gesto menos conveniente, e às vezes en-
trava pela hora do recreio grudado aos livros sem os querer deixar. AZEVEDO, Aluísio.
Casa de pensão.
Trabalhemos, portanto, cada um com o recurso de que dispomos em pr ol da causa que
prol
abraçamos. Luiz Carlos Prestes, Carta a Paulo Nogueira Filho (13 set. 1928). In BONAVIDES
P. e Amaral, P. (2002).Textos Políticos da História do Brasil.
Conectivos
Preposições e conjunções são palavras que estabelecem a ligação entre
palavras, grupos de palavras ou orações. Já vimos, por exemplo, que tanto os
adjetivos quanto os advérbios podem ter seus sentidos substituídos, pelo me-
nos parcialmente, por expressões chamadas locuções. Essas locuções, por
sua vez, formam-se a partir de um grupo nominal, cuja base será um substan-
tivo ou um pronome, e uma preposição qualquer. Dessa maneira teremos:
espetáculo circense, em que circense é um adjetivo que se refere ao substan-
tivo espetáculo, concordando com ele, e teremos, também, espetáculo de cir-
co, em que de circo é uma locução adjetiva formada pela preposição de e pelo
substantivo circo.
Dessa maneira, pode-se notar com alguma facilidade que há três grupos
nominais – um milagre digno do Natal de um Deus, o Natal de um Deus e um
Deus –, sendo que uns se encaixam dentro de outros.
Ainda que estejamos falando de grupos nominais, não é essa a única pos-
sibilidade. Essa ligação também ocorre entre verbos e grupos nominais.
Não a desmenti e fomos até a borda da cama de dona Clementina. BARRETO, Lima.
Cemitério dos vivos.
No exemplo, o grupo nominal cuja ligação com o verbo fomos se faz com
a preposição até subordina outros dois que lhe são encaixados: a cama de
dona Clementina e dona Clementina.
As preposições mais comuns são a, ante, após, até, com, contra, de, des-
de, em, entre, para, perante, por, sem, sob, trás. Embora elas sejam facilmente
confundidas com advérbios – como após, na frase A rapariga foi-se e logo
após voltou –, é importante ter sempre em mente que preposições estabele-
cem um vínculo subordinativo entre o grupo nominal que lhe segue e outra
palavra. No caso referido, após não está subordinando nenhum grupo nomi-
nal; assim, não está sendo usado como preposição, mas sim como advérbio.
Como as preposições são palavras de muito uso na língua, geralmente são
monossilábicas e átonas. Assim, é muito freqüente que os falantes produzam
preposições incrustadas em outras palavras.
à=a+a na = em + a
ao = a + o naquilo = em + aquilo
àquela = a + aquela naquele = em + aquele
àquilo = a + aquilo nesse = em + esse
daquele = de + aquele nisso = em + isso
desse = de + esse pela = per + a
disso = de + isso pelo = per + o
Deve-se ressaltar que, em todos esses casos, há sempre uma preposição esta-
belecendo ligações entre grupos nominais ou entre grupo nominal e verbo. O
caso mais complexo, que comumente gera mais dúvida, é a contração da prepo-
sição a com o artigo a, formando uma crase, que significa que fundiram-se ambas
as formas. Quando essa contração ocorre, sobrepõe-se um acento grave. Se há
crase da preposição a e do artigo a, então haverá acento grave: à ou às.
Não há uma regra que deixe isso claro, pois o uso do artigo é facultativo,
o que estabelece que a crase é facultativa. Entretanto, padronizou-se que em
alguns casos diferenciais manter-se-ia a crase, ainda que, rigorosamente, ela
não seja obrigatória.
A nossa obra está à vista de todos, só os cegos não a querem ver. PATROCÍNIO, José do.
Campanha abolicionista.
Conjunções coordenativas
Com características bastante semelhantes às das preposições, as conjunções
também estabelecem ligações entre palavras, grupos nominais ou orações. A
característica diferencial é que as conjunções podem fazer relações de subor-
dinação e de coordenação. Elementos coordenados não estão encaixados uns
dentro dos outros, são paralelos entre si.
Entre gritos e penas, ela foi presa. LISPECTOR, Clarice. Uma galinha.
Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos. LISPECTOR, Clarice.
Uma galinha.
Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. LISPECTOR,
Clarice. Uma galinha.
Continuou entre a cozinha e o terraço dos fundos. LISPECTOR, Clarice. Uma galinha.
Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. LISPECTOR,
Clarice. Uma galinha.
Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto vôo, inchar o peito e, em dois
ou três lances, alcançar a murada do terraço. LISPECTOR, Clarice. Uma galinha.
Conjunções subordinativas
As conjunções subordinativas caracterizam-se por estabelecer uma relação
de dependência entre as orações, isto é, elas apontam para o fato de que as
orações se encontram encaixadas umas dentro das outras. Assim, as orações
que se encaixam internamente às outras têm de exercer alguma função sintá-
tica de sujeito, de objeto ou de adjunto, por exemplo.
Uma das conjunções subordinativas mais comuns é a chamada conjunção
integrante. Trata-se do conectivo que. Esse conectivo pode assumir muitos va-
lores, indicando variados tipos de relacionamento entre orações. No que diz
respeito às orações que atuam como grupos nominais, ele é o único conectivo
possível. Nesse caso particular é que recebe o nome de conjunção integrante.
Exercícios
O papel da mulher de hoje não é o da de ontem. FRANÇA Júnior. As doutoras.
Espero, meu caro doutor, que não deixe de vir hoje; esperei-o ontem em vão. ASSIS,
Machado de. A mulher de preto.
O bom velho não gostava nunca da visita de homens, com receio de que a sobrinha
escolhesse algum e casasse. ASSIS, Machado de. A desejada das gentes.
Lucas e a marroquina trocam olhares e, como antes, dão um jeito de driblar a guarda e
marcar um encontro às escondidas para o dia seguinte. Contigo, n. 1369, de 11 de
dezembro de 2001.
Até que enfim, por obra daquele estonteante acaso, iam surgir à luz do sol as escondidas
riquezas do Caramuru. SETUBAL, Paulo. O romance do Prata.
Viu a vida universal com a vista cansada dos velhos. CUNHA, Euclides da. Contrastes e
confrontos.
Gabriel sentiu ouriçar-lhe o cabelo à vista da terrível cena que se patenteava a seus
olhos. AZEVEDO, Aluísio. A condessa Vésper.
O preço depois de regateado fora pago à vista. ALENCAR, José de. Lucíola.
Mudanças bruscas, desligadas de uma visão de longo prazo, podem satisfazer interesses
conjunturais, mas não constroem o perfil de um Estado responsável. Não devemos,
contudo, ter receio de inovar quando os nossos interesses e valores assim indicarem.
Fernando Henrique Cardoso. Discurso de posse. 1995
Automóveis buzinavam como se fosse dia alto. E, no entanto, era noite, ainda. CAMPOS,
Humberto de. A mina.
Sugestões de leitura
Como leituras complementares, é sempre conveniente ter à mão as gramá-
ticas tradicionais da língua portuguesa. A Moderna gramática brasileira de Cel-
so Pedro Luft, recentemente reeditada pela Globo, e a Moderna gramática por-
tuguesa, de Evanildo Bechara, sobretudo a 37ª edição que foi revista e amplia-
da, editada pela Lucerna, são obras excelentes para uma visão mais atualizada
da gramática tradicional da língua portuguesa. Para além das leituras de obras
técnicas específicas, como essas gramáticas, sugerimos atividades de produção
de texto em que se tenha a liberdade para arriscar o máximo possível, a partir de
modelos apresentados pelas mais diferentes obras e gêneros.
Unidade 2
Sintaxe
Organizadores
Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade
Neide Luzia de
Sintaxe interna da oração Rezende
A pa ta caiu, e ele ficou olhando para o rato meio cadáver. ASSIS, Machado de. Causa
pata
secreta.
Note que o interlocutor novamente não terá como saber que, no final, por
exemplo, quem voltou foi Mendonça, pois a oração segue uma outra com o
sujeito o escravo. Pode até ser que o interlocutor admita que o escravo não
possa ter voltado ao assunto porque saiu, nesse caso o sujeito a ser depreendido
pelo interlocutor seria necessariamente Estácio. Dessa maneira, é fundamental
que haja ponderação nas supressões de sujeitos: se há um mesmo sujeito que
se repete, pode-se expressar o primeiro e substituir os demais por pronomes
ou mesmo eliminá-los, mas se a seqüência for quebrada, isto é, se ocorrerem
outros sujeitos entre eles, será necessário repeti-lo. É preciso ter em mente que
nem sempre é culpa do interlocutor se ele não entende um texto; o escritor ou
o falante tem que dar todas as informações necessárias para que o interlocutor
possa compreender o que está escrito.
Uma das características interessantes dessa concordância do sujeito com o
verbo é o fato de ela se estender para todo o predicado. Nas orações em que o
verbo apenas refere uma ligação entre dois grupos nominais – nesses casos o
verbo é chamado de ligação –, há concordância de gênero e de número com
o predicado.
A arte é uma forma de sentir o universo, a ciência é uma forma de conhecer o universo.
TEIXEIRA, Anísio. Cartas.
Na família da modelo, a história também é desconhecida. Contigo, n. 1369, de 11 de
dezembro de 2001
cujas – o relativo que é o mais utilizado de todos. Por ser um pronome, ele
atua na oração como atuaria um grupo nominal qualquer que ele esteja subs-
tituindo; no caso em questão ele substitui a lentidão. Sua capacidade de subs-
tituir outros elementos é muito restrita, pois se limita ao grupo nominal que
imediatamente o anteceda.
Tinha quinze anos feitos e bem feitos. Cabeça inculta, mas bela, olhos de rapaz que
sonha, que adivinha, que indaga, que quer saber e não acaba de saber nada. ASSIS.
Machado de. Uns braços.
Tinha quinze anos feitos e bem feitos. Cabeça inculta, mas bela, olhos de rapaz que
sonha, adivinha, indaga, quer saber e não acaba de saber nada.
Nas duas ocorrências do verbo chover, não há sujeito expresso. Aliás, não
há sujeito. Essa é uma propriedade da língua portuguesa (há línguas em que
sempre há um sujeito expresso). Quando se utiliza esses verbos metaforica-
mente, então haverá um sujeito, mesmo que não seja expresso. É o que acon-
tece no exemplo a seguir:
Tendo sido na noite de quarta-feira o banquete escandinavo, o nosso céu ainda resistiu
durante a quinta-feira, e com tal desespero que parecia queimar tudo; mas na sexta-feira
já não pôde, e não teve remédio senão chover e ventar. Não choveu, nem ventou muito,
não chegou a nevar, mas fez-nos respirar, e basta. ASSIS, Machado de. A semana.
concordando com o mesmo sujeito do resistir. Isso deixa claro que o autor,
com muita habilidade, propôs que foi o nosso céu que choveu, que ventou
mas que não nevou.
Além de atuar como sujeito de oração, grupos nominais atuam com outras
funções: objeto direto, objeto indireto, complemento nominal, adjunto
adnominal e adjunto adverbial.
Diz-se que um grupo nominal é objeto direto de um verbo quando é um
complemento obrigatório do verbo, que não necessita de conectivos para as-
sociar-se a ele. Apesar de isso parecer muito pouco esclarecedor, dificilmente
as pessoas têm dificuldade em produzir objetos diretos.
Eu sou de um tempo, Mitre, e não está muito longe: 1968 – eu comprei um primeiro
terreno de cinco por vinte e cinco e eu comprei o material a prestação, construí um
quarto e cozinha
cozinha, entrei dentro e, depois que eu construí esse quarto e cozinha e
paguei os doze meses de prestação
prestação, eu fui no depósito de material, fiz outra dívida
dívida,
quarto. Luís Inácio Lula da Silva. 2º debate do 2º turno das eleições
construí mais um quarto
presidenciais de 1989, realizado no dia 14.12.89
Essa representação gráfica pode ser feita, também, de uma outra maneira
que deixe essas relações um pouco mais claras:
sujeito predicado
sujeito predicado
eu comprei o material
— construí um quarto e cozinha
eu construí esse quarto e cozinha
— paguei os doze meses de prestação
— fiz outra dívida
— construí mais um quarto
Essa ordem que vimos – sujeito, verbo, objeto – é a mais usual na língua
portuguesa. É comumente chamada de ordem direta. As pessoas em geral
escrevem e falam valendo-se dessa ordem de palavras.
Os complementos verbais não precisam ser diretos. Há aqueles que são
utilizados somente com conectivos (mais especificamente, com preposições).
sujeito predicado
Na ponta da produção
produção, encontramos o processo de industrialização, como dominan-
te. ALCÂNTARA, Lúcio. Discursos. 2001. Disponível em www.senado.gov.br
Hoje encontrei dois regatos de boa água. ALMEIDA, Francisco José de. Diário de viagem
de Moçambique para os rios de Sena.
Da mesma maneira que grupos nominais podem ser sujeito, objeto, com-
plemento, também o poderão ser as orações subordinadas substantivas.
Meu caro amigo eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades. Chico Buarque. Meu caro amigo.
Não quero que pensem que tenho ódio do senhor presidente da República
República. Maga-
lhães, Antônio Carlos. Discurso de renúncia ao mandato de senador. 2001.
Nesse instante o moço marítimo teve a visão de que, ao encontro da sua, vinham duas
iguais, tristes na sua esterilidade. ALMEIDA, Júlia Lopes de. A falência.
almas iguais
Ao final da avaliação, as instituições assinam um documento em que se comprometem
a melhorar em pontos insatisfatórios. Folha de São Paulo, 12/02/2003
De acordo com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), um ônibus que tr af
trafega
afegava
egav
na A v enida B
Av Brr igadeiro LLuís
igadeiro uís A
Anntônio
tônio, sentido centro-bairro, atingiu um carro no
cruzamento com a Avenida Paulista, sentido Paraíso-Consolação. O Estado de São Paulo,
online, 21/12/2003
Nem sempre é fácil distinguir entre uma adjetiva restritiva e entre uma adjetiva
explicativa. A oração do primeiro exemplo é restritiva e a do segundo é
explicativa. A diferença entre elas está no fato de que, na primeira, a oração
restringe o conjunto dos homens que está comprometido com as esperanças
dos escravos, isto é, são apenas os que assumiram a responsabilidade do movi-
mento abolicionista que têm esse compromisso; na segunda, todos os homens
eram o vigor de um povo, independentemente de chegarem dilacerados ou não.
As orações adjetivas explicativas podem ocorrer como orações coordenadas.
Aqueles homens chegavam dilacerados pelas garras do jagunço e pelos espi-
nhos da terra e eram o vigor de um povo posto à prova do ferro, à prova do fogo e à
prova da fome.
Quando o assun
assuntto é demasiado sér io
io,, certo amigo lhe retorquiu que não se pode rir.
sério
Certo amigo lhe retorquiu que não se pode rir quando o assunto é demasiado sério
sério.
sujeito predicado
Ao aproximarem-se, viram que o vulto branco era de mulher e que os outros traja-
vam saios e elmos e traziam achas de armas. HERCULANO, Alexandre. Eurico, o presbítero.
sujeito predicado
coordenação
No dia 7, recebemos seu telegrama daí, estimei saber que fizeram boa viagem e que
chegaram sem novidade. TEIXEIRA, Anísio. Cartas.
Nos dois segmentos acima, diga quais são os objetos dos verbos receber,
estimar, saber e fazer.
Temos que distribuir a renda no país num programa nacional de defesa do Brasil. DIRCEU,
José. Discursos na Câmara Federal. 2001
No trecho acima, aponte o grupo nominal que atua como complemento nominal.
No trecho acima, aponte o grupo nominal que atua como complemento nominal.
Para esses comerciantes portanto, o que conta nos bens que compram e em seguida
vendem em operações sucessivas e permanentemente repetidas, não é o valor de uso,
como o nosso camponês, e sim o valor de troca. (Prado Jr, Caio. Teoria marxista do
conhecimento e método dialético materialista.)
Sugestões de leitura
A compreensão da sintaxe da língua portuguesa faz-se muito mais pela
leitura crítica de diferentes textos do que pela aplicação de exercícios prepara-
dos. Assim, é fundamental que, em qualquer leitura, estejamos sempre atentos
para a compreensão das frases e das estratégias usadas pelos autores para
criá-las. A sintaxe é uma das áreas dos estudos gramaticais que mais têm tido
avanços. Para ter alguma idéia dessas discussões, o texto de Flávia de Barros
Carone, Subordinação e coordenação. Confrontos e contrastes, editado pela
Ática, é uma contribuição importante e acessível. Novamente, a gramática de
Evanildo Bechara não pode deixar de ser pelo menos consultada.
Sobre o autor
Waldemar Ferreira Netto
é professor de Filologia e Língua Portuguesa da USP, autor de Introdução
à fonologia da língua portuguesa, São Paulo, Hedra.
Anotações
Anotações
Anotações
Anotações
Língua
Portuguesa
O texto e sua articulação
Organizadores
Maria Lúcia V. de Oliveira Andrade
Neide Luzia de Rezende
Valdir Heitor Barzotto
Elaboradora
Maria Lúcia V. de Oliveira Andrade
4
módulo
Nome do Aluno
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Governador: Geraldo Alckmin
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
Secretário: Gabriel Benedito Issac Chalita
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas – CENP
Coordenadora: Sonia Maria Silva
PROGRAMA PRÓ-UNIVERSITÁRIO
Coordenadora Geral: Eleny Mitrulis
Vice-coordenadora Geral: Sonia Maria Vanzella Castellar
Coordenadora Pedagógica: Helena Coharik Chamlian
Coordenadores de Área
Biologia:
Paulo Takeo Sano – Lyria Mori
Física:
Maurício Pietrocola – Nobuko Ueta
Geografia:
Sonia Maria Vanzella Castellar – Elvio Rodrigues Martins
História:
Kátia Maria Abud – Raquel Glezer
Língua Inglesa:
Anna Maria Carmagnani – Walkyria Monte Mór
Língua Portuguesa:
Maria Lúcia Victório de Oliveira Andrade – Neide Luzia de Rezende – Valdir Heitor Barzotto
Matemática:
Antônio Carlos Brolezzi – Elvia Mureb Sallum – Martha S. Monteiro
Química:
Maria Eunice Ribeiro Marcondes – Marcelo Giordan
Produção Editorial
Dreampix Comunicação
Revisão, diagramação, capa e projeto gráfico: André Jun Nishizawa, Eduardo Higa Sokei, José Muniz Jr.
Mariana Pimenta Coan, Mario Guimarães Mucida e Wagner Shimabukuro
Cartas ao
Aluno
Carta da
Pró-Reitoria de Graduação
Caro aluno,
Com muita alegria, a Universidade de São Paulo, por meio de seus estudantes
e de seus professores, participa dessa parceria com a Secretaria de Estado da
Educação, oferecendo a você o que temos de melhor: conhecimento.
Conhecimento é a chave para o desenvolvimento das pessoas e das nações
e freqüentar o ensino superior é a maneira mais efetiva de ampliar conhecimentos
de forma sistemática e de se preparar para uma profissão.
Ingressar numa universidade de reconhecida qualidade e gratuita é o desejo
de tantos jovens como você. Por isso, a USP, assim como outras universidades
públicas, possui um vestibular tão concorrido. Para enfrentar tal concorrência,
muitos alunos do ensino médio, inclusive os que estudam em escolas particulares
de reconhecida qualidade, fazem cursinhos preparatórios, em geral de alto
custo e inacessíveis à maioria dos alunos da escola pública.
O presente programa oferece a você a possibilidade de se preparar para enfrentar
com melhores condições um vestibular, retomando aspectos fundamentais da
programação do ensino médio. Espera-se, também, que essa revisão, orientada
por objetivos educacionais, o auxilie a perceber com clareza o desenvolvimento
pessoal que adquiriu ao longo da educação básica. Tomar posse da própria
formação certamente lhe dará a segurança necessária para enfrentar qualquer
situação de vida e de trabalho.
Enfrente com garra esse programa. Os próximos meses, até os exames em
novembro, exigirão de sua parte muita disciplina e estudo diário. Os monitores
e os professores da USP, em parceria com os professores de sua escola, estão
se dedicando muito para ajudá-lo nessa travessia.
Em nome da comunidade USP, desejo-lhe, meu caro aluno, disposição e vigor
para o presente desafio.
Caro aluno,
Com a efetiva expansão e a crescente melhoria do ensino médio estadual,
os desafios vivenciados por todos os jovens matriculados nas escolas da rede
estadual de ensino, no momento de ingressar nas universidades públicas, vêm se
inserindo, ao longo dos anos, num contexto aparentemente contraditório.
Se de um lado nota-se um gradual aumento no percentual dos jovens aprovados
nos exames vestibulares da Fuvest — o que, indubitavelmente, comprova a
qualidade dos estudos públicos oferecidos —, de outro mostra quão desiguais
têm sido as condições apresentadas pelos alunos ao concluírem a última etapa
da educação básica.
Diante dessa realidade, e com o objetivo de assegurar a esses alunos o patamar
de formação básica necessário ao restabelecimento da igualdade de direitos
demandados pela continuidade de estudos em nível superior, a Secretaria de
Estado da Educação assumiu, em 2004, o compromisso de abrir, no programa
denominado Pró-Universitário, 5.000 vagas para alunos matriculados na terceira
série do curso regular do ensino médio. É uma proposta de trabalho que busca
ampliar e diversificar as oportunidades de aprendizagem de novos conhecimentos
e conteúdos de modo a instrumentalizar o aluno para uma efetiva inserção no
mundo acadêmico. Tal proposta pedagógica buscará contemplar as diferentes
disciplinas do currículo do ensino médio mediante material didático especialmente
construído para esse fim.
O Programa não só quer encorajar você, aluno da escola pública, a participar
do exame seletivo de ingresso no ensino público superior, como espera se
constituir em um efetivo canal interativo entre a escola de ensino médio e
a universidade. Num processo de contribuições mútuas, rico e diversificado
em subsídios, essa parceria poderá, no caso da estadual paulista, contribuir
para o aperfeiçoamento de seu currículo, organização e formação de docentes.
-
Por meio dos elementos levantados no texto (1), você pôde ver que são
várias as palavras que, num texto, assumem a função de conectivo ou elemen-
to de coesão:
Ele sempre nos leva a lugares novos, interessantes. Ele vai e apresenta onde vamos
viver. Defende e briga por nós. Consegue o melhor para a gente. Ele nos providencia
uma moradia. Ele se preocupa com a gente. Depois de um tempo, aparece com uma
proposta incrível. Uma casa na praia ou no campo. Ele se importa com o lugar onde
vamos passar as férias com a nossa família. Ele não tem obrigação de pensar nisso, mas,
mesmo assim, pensa. Nossa satisfação, nosso sorriso no rosto de estar bem abrigado é
a sua alegria. Ele vive pra isso. Até quando o assunto é trabalho, ele está lá para nos
orientar.“Aqui sua empresa vai decolar”, diz orgulhoso, do alto de toda a sua experiên-
cia. Ele sabe das coisas. Ele sabe que nós precisamos dele. E ainda bem que ele sempre
está lá, à nossa disposição.
Uma homenagem do Grupo Cyrela ao Dia do Consultor Imobiliário
-
Atividades
1. Releia a propaganda acima e levante outros elementos coesivos estudados
nesta unidade, além da repetição do pronome ele e de sua elipse.
Texto A
Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
(Andrade, Carlos Drummond de. Poesia completa. Rio de Janeiro:
Nova Aguilar, 2002, p. 26)
Texto B
Cidadezinha qualquer
Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham...
Eta vida besta, meu Deus.
(Andrade, Carlos Drummond de. Poesia completa. Rio de Janeiro:
Nova Aguilar, 2002, p. 23)
Texto C
Relatório ao governador
(texto redigido pelo então prefeito de Palmeira dos Índios – Graciliano
Ramos – no estado de Alagoas, em 10/11/1929)
O principal (...) foi estabelecer alguma ordem na administração. Ha-
via em Palmeira dos Índios inúmeros prefeitos: os cobradores de im-
postos, o Comandante do Destacamento, os soldados, outros que dese-
jassem administrar. Cada pedaço do Município tinha a sua administra-
ção particular, com Prefeitos coronéis e Prefeitos inspetores de quartei-
rão. Os fiscais, esses resolviam questões de polícia e advogavam. Para
que semelhante anomalia desaparecesse, lutei com tenacidade e encon-
trei obstáculos dentro da Prefeitura e fora dela – dentro, uma resistência
mole, suave, de algodão em rama; fora, uma campanha sorna, oblíqua,
carregada de bílis. Pensavam uns que tudo ia bem nas mãos do Nosso
Senhor, que administrava melhor do que todos nós; outros me davam
três meses para levar um tiro. Dos funcionários que encontrei em janei-
ro passado restam poucos. Saíram os que faziam política e os que não
faziam coisa nenhuma. Os atuais não se metem onde não são neces-
sários, cumprem as suas obrigações e, sobretudo, não se enganam nas
contas. Devo muito a eles. Não sei se a administração do Município é
boa ou ruim. Talvez pudesse ser pior. (...)
Cuidei bastante da limpeza pública. As ruas estão varridas, retirei da
cidade o lixo acumulado pelas gerações que por aqui passaram; incine-
rei monturos imensos, que a Prefeitura não tinha recursos suficientes
para remover. Houve lamúrias e reclamações por se haver mexido no
cisco preciosamente guardado nos fundos dos quintais; lamúrias, recla-
mações, ameaças, guinchos, berros e coices dos fazendeiros que viram
bichos nas praças. Durante meses mataram-me o bicho do ouvido com
reclamações de toda a ordem contra o abandono em que se deixava a
melhor entrada para a cidade. Chegaram lá pedreiros – outras reclama-
ções surgiram, porque as obras irão custar um horror de contos de réis,
dizem. Custarão alguns, provavelmente. Não tanto quanto as pirâmides
do Egito, contudo. O que a Prefeitura arrecada basta para que nos não
resignemos às modestas tarefas de varrer as ruas e matar cachorros. (...)
-
RITMO E SONORIDADE
Outra estratégia de coesão que devemos estudar são os recursos expressi-
vos: ritmo e sonoridade. Segundo a professora Leonor Lopes Fávero, em seu
livro Coesão e coerência textuais, o ritmo é um elemento importante na for-
mação do texto. “A duração relativa das sílabas está ligada, de um lado, à
posição das pausas, acentos e entoação; de outro, a mudança do tempo pode
constituir por si só uma função delimitadora ou de realce” (1995, p. 30).
Para entendermos melhor a função do ritmo na obtenção da coesão, deve-
mos observar a sucessão de movimentos que se estabelecem no jogo textual.
Assim, vejamos o poema simbolista:
-
(3)
AEIOU
Manhã de primavera. Quem não pensa
Em doce amor, e quem não amará?
Começo a vida. A luz do céu é imensa...
A adolescência é toda sonhos. A.
O luar erra nas almas. Continua
O mesmo sonho de oiro, a mesma fé.
Olhos que vemos sob a luz da lua...
A mocidade é toda lírios. E.
Descamba o sol nas púrpuras do ocaso
As rosas morrem. Como é triste aqui!
O fado incerto, os vendavais do acaso...
Marulha o pranto pelas faces. I.
A noite tomba. O outono chega. As flores
Penderam murchas. Tudo, tudo é pó.
Não mais beijos de amor, não mais amores...
Ó sons de sinos a finados! O.
Abre-se a cova. Lutelenta e lenta,
A morte vem. Consoladora és tu!
Sudários rotos na mansão poeirenta...
Crânios e tíbias de defunto. U.
(Guimaraens, Alphonsus de. Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar,
1960, p. 506)
No poema o autor emprega as vogais, que dão título ao texto, para encer-
rar cada uma das estrofes. Entretanto, essas vogais servem não só para efeito
de rima, como também para revelar valores simbólicos em relação às fases da
vida do homem descritas em segmento.
Os recursos de motivação sonora – por exemplo, assonâncias, aliterações,
ritmo, rima – auxiliam no estabelecimento da coesão, fazendo o texto progre-
dir de maneira especial. Leia o texto:
(4)
Relógio
As coisa são
As coisas vêm
As coisas vão
As coisas
Vão e vêm
Não em vão
As horas
Vão e vêm
Não em vão
(Andrade, Oswald de. Trechos escolhidos. Rio de Janeiro: Agir, 1967,
p. 41)
Neste texto, a linguagem é organizada de tal modo que transforma o cará-
ter linear da sintaxe verbal e recupera analogicamente as qualidades físicas,
Atividades
1. Leia o texto colocado abaixo de autoria do poeta Augusto de Campos:
pluvial / fluvial
p
pl
plu
pluv
pluvi
pluvia
fluvial
fluvial
fluvial
fluvial
fluvial
fluvial
(In: Antologia da literatura brasileira. Antonio Medina Rodrigues et. al.
São Paulo: Marco Editorial, 1979, vol. II, p. 350)
-
SUGESTÕES DE LEITURA
Como já foi dito nos módulos anteriores, é importante que você leia cons-
tantemente jornais e/ou revistas para manter-se atualizado. Também é necessá-
rio ler as obras básicas da literatura nacional e internacional para poder refletir
sobre o trabalho com os textos, sua construção e organização de sentido.
Se você deseja ler livros e não tem tempo de ir à biblioteca, pode consultar
os sites de bibliotecas virtuais; neles você encontrará textos completos de li-
vros de diversos autores indicados para os principais vestibulares do país:
www.bibvirt.futuro.usp.br (neste site você pode consultar as principais obras
indicadas no vestibular da Fuvest);
www.uol.com.br/cultivox (aqui você encontra mais de 300 e-livros – livros
eletrônicos – grátis);
www.bibliotecavirtual.org.br (site da biblioteca virtual da UFBA).
http://sites.uol.com.br/fredb (Leituras na Rede é o site criado pelo escritor e
professor Federico Barbosa; nele você pode ler a edição integral de
algumas das obras fundamentais das literaturas brasileira e portuguesa)
Para saber mais sobre Graciliano Ramos, autor que utilizamos em um dos
textos desta unidade, consulte os seguintes livros:
MORAES, Denis de. O velho Graça. Rio de Janeiro: José Olympio, 1992.
RAMOS, Clara. Mestre Graciliano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.
LIMA, Valdemar de. Graciliano Ramos em Palmeira dos Índios. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.
LIMA, Mário Hélio Gomes de (org.) Relatórios. Recife: Record, 1994.
Você ainda pode navegar pelo site www.graciliano.com.br produzido pela
família do escritor. Nele encontrará notícias sobre sua obra, manuscritos, ál-
bum de família etc.
Para obter mais informações sobre poesia concreta, leia “Poesia Concreta”
– seleção de textos notas, estudos biográfico, histórico e crítico e exercícios
por Iumna Maria Simon e Vinicius de Ávila Dantas (orgs.). Literatura Comen-
tada. São Paulo: Abril, 1982.
Unidade 2
Discurso reportado (citação):
discurso direto, indireto e indireto livre
Organizadores
Ao construir um texto, você pode mostrar a presença de outras vozes, Maria Lúcia V. de
trazendo para a cena e demarcando lugares e limites; pode ainda deixá-las Oliveira Andrade
implícitas, por conta da memória do leitor. Entretanto, para escolher dentre as
Neide Luzia de
várias possibilidades que a língua oferece, é preciso conhecer um pouco cada
Rezende
um desses recursos lingüísticos.
Valdir Heitor
Num texto narrativo, entram em cena personagens que dialogam entre si, Barzotto
manifestando seu discurso. Nesta unidade, vamos estudar os recursos que o
narrador pode utilizar para reproduzir o discurso de tais personagens, ou seja, Elaboradora
como ele insere na narrativa a fala que não lhe pertence. Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade
Basicamente, há três recursos para citar o discurso do outro: discurso dire-
to, discurso indireto e discurso indireto livre. Vejamos cada um deles:
DISCURSO DIRETO
As histórias em quadrinhos e as charges usam, freqüentemente, o discur-
so direto. Nesse gênero textual, a fala de cada personagem é associada direta-
mente à sua imagem, permitindo ao leitor apreender as diversas vozes mostra-
das no texto.
(1)
Rato de Sebo
® Custódio
-
DISCURSO INDIRETO
Observando um pequeno fragmento do romance Helena de Machado de
Assis, vejamos agora outro procedimento para citar a fala de uma persona-
gem, o chamado discurso indireto:
(3)
(...) [Estácio] Cercou-a [Helena] de cuidados, buscou distraí-la, pe-
diu-lhe que fosse repousar um instante. Para justificar a explicação que
dera, Helena obedeceu às instruções do irmão. Este foi encerrar-se no
gabinete, onde se ocupou a examinar e colecionar alguns papéis.
(In: Obra Completa. Vol. I – Romance. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
1979, p. 324).
Para citar a fala da personagem Estácio, o narrador não reproduz literal-
mente a fala dessa personagem, mas emprega suas palavras de narrador para
comunicar o que Estácio pediu a sua irmã Helena. A fala de Estácio chega ao
leitor de maneira indireta, isto é, pelas palavras do narrador; por isso tal recur-
so lingüístico denomina-se discurso indireto.
O discurso indireto apresenta algumas características básicas:
a. vem introduzido por um verbo de dizer;
b. vem separado da fala do narrador por uma partícula introdutória, normal-
mente a conjunção que ou se, e não por sinais de pontuação. No fragmen-
to citado, temos: pediu-lhe que fosse repousar;
c. o tempo verbal, os pronomes e as palavras dependentes da situação são
determinados pelo contexto em que se inscreve o narrador e não a perso-
nagem: o verbo ocorre na 3a pessoa, o tempo verbal correlaciona-se com
o tempo em que se situa o narrador, e o mesmo ocorre com os demais
recursos lingüísticos de situação (advérbios, pronomes etc.).
-
Discurso indireto
Fabiano acordou sobressaltado e começou a pensar que poderia es-
tar misturando as pessoas, desatinando.
A partir dos exemplos, você pode notar que o discurso indireto livre cor-
responde a uma espécie de discurso indireto do qual foram excluídos os ver-
bos de dizer, que servem para anunciar a fala das personagens, e a partícula
introdutória (que, se). No fragmento do capítulo “Cadeia”, predominam as
formas verbais do pretérito imperfeito do indicativo, na 3a pessoa do singular.
Cabe lembrar que o pretérito imperfeito do indicativo sempre foi o mais ade-
quado às descrições e narrativas. Seu efeito principal é transportar o leitor a
uma época passada e descrever o que então era presente. O pretérito perfeito
do indicativo aparece em dois momentos importantes, apenas dentro da lin-
guagem do narrador: quando se descreve a personagem em “close-up”, pre-
parando a abordagem de sua consciência (“Acordou sobressaltado”), e quan-
do após o trecho em discurso indireto livre o narrador retoma a sua própria
linguagem para acrescentar novas informações (“Ouviu o falatório”).
Outro ponto a destacar é que no discurso indireto livre as ordens, súplicas,
pedidos, perguntas são conservados nas formas imperativa e interrogativa.
Nele, destacam-se os elementos expressivos, as exclamações, interjeições etc.
Atividades
1. Transforme os trechos que estão elaborados em discurso indireto para dis-
curso direto, e depois explique os recursos lingüísticos empregados:
a. Paulo balançou a cabeça e respondeu que não tinha a mínima idéia.
3. Leia o cartum criado por Quino, na página seguinte. Observe que o discur-
so reportado (citação) é usado para reforçar as nossas próprias idéias, mas
pode substituir as palavras quando não se tem nada a dizer, como ocorre nesse
texto. A seguir, crie um texto em que você possa utilizar as falas das persona-
gens retratadas pelo cartunista.
-
SUGESTÕES DE LEITURA
Se você deseja conhecer outras obras de literatura em que os autores em-
pregam o discurso indireto livre, pode escolher, por exemplo, textos de Ma-
chado de Assis, Aluísio de Azevedo, Raul Pompéia, José Lins do Rego, Gui-
marães Rosa, entre outros. Como sugestão, indicamos o romance João Miguel
de Raquel de Queiroz, publicado em 1932.
Para saber mais sobre histórias em quadrinhos, leia o livro Como usar as
histórias em quadrinhos em sala de aula de Alexandre Barbosa, Paulo Ra-
mos, Túlio Vilela, Ângela Rama e Waldomiro Vergueiro. São Paulo: Contexto,
2004.
Ainda sobre quadrinhos, visite os seguintes sites:
www.fabricadequadrinhos.com.br
www.custodio.net
Unidade 3
Níveis de significação do texto:
significação explícita, significação implícita,
denotação e conotação
Organizadores
Maria Lúcia V. de
Em muitos discursos, como o literário e o humorístico, significados para- Oliveira Andrade
lelos sobrepõem-se ao significado denotativo de um termo – também conhe-
cido como sentido básico, “literal” ou “de dicionário”. Pode-se dizer que, Neide Luzia de
devido a uma estratégia de construção textual, cria-se um efeito de sentido Rezende
chamado, nesse caso, de sentido conotativo. Valdir Heitor
Barzotto
Geralmente, os textos denotativos não empregam palavras às quais pos-
sam ser atribuídos múltiplos sentidos, isto é, evitam termos polissêmicos (ter- Elaboradora
mos com várias significações, como “a cabeça do alfinete”; “o cabeça do Maria Lúcia V. de
grupo”; “dor de cabeça”). Quando isso não é possível, estabelecem orienta- Oliveira Andrade
ções que delimitam o sentido textual por meio do contexto.
Por outro lado, os textos conotativos utilizam intensamente termos polis-
sêmicos ou construções ambíguas, e devem ser lidos a partir dos vários senti-
dos que as palavras evocam. Nesse tipo de texto, o que importa não é tanto o
seu sentido evidente, mas a sua capacidade de sugerir e criar efeitos de senti-
do múltiplos.
Vejamos a tirinha. Abaixo:
(1)
A graça desse texto pode ser explicada pelo jogo de palavras construído
pelo enunciador. Ela resulta do duplo sentido que a palavra chato adquire no
contexto. O adjetivo chato, relacionado ao formato do planeta na região po-
lar, significa plano, achatado, sem relevo. Entretanto, quando referido à situ-
ação (atmosfera ou clima psicológico) do planeta nos domingos sem futebol,
expressa a idéia de aborrecido, tedioso, maçante.
Esse jogo de linguagem que instaura o humor está relacionado a um uso
da linguagem. No sentido denotativo ou literal, o termo chato significa plano,
Atividades
1. Leia a charge colocada a seguir, retirada do jornal Folha de S. Paulo, em
11/04/2004, 1o caderno, página 2, na seção intitulada “Opinião”. Para com-
preender o significado desse texto, é preciso analisar a situação discursiva,
observando quem são as personagens representadas nessa caricatura. Ou seja,
você precisa relacionar o que está ocorrendo no quadro representado e o que
de fato acontece no contexto sócio-hitórico do leitor do referido jornal. A
seguir, procure explicar o jogo de palavras que cria o humor dessa charge.
-
2. Vejamos os poemas:
Lâmina
Leio no brilho do teu olho
Meu corpo – dado como morto –
Re-nascido.
Escrevo na folha do teu corpo
Meu nome – antes sem voz nem paz –
Re-citado.
Calado e inteiro ao teu lado
Te ofereço a face
Te estendo a mão
E estou ao alcance da tua alma.
Calma, eu posso te ver em mim
E me ver em ti:
Corpo e Alma:
Reflexos, ecos, pedaços completos:
Amor.
(Bedani, Sílvio. Quadrívio. São Paulo: Plêiade, 1997, p. 25.)
Nome
algo é o nome do homem
coisa é o nome do homem
homem é o nome do cara
isso é o nome da coisa
cara é o nome do rosto
fome é o nome do moço
homem é o nome do troço
osso é o nome do fóssil
corpo é o nome do morto
homem é o nome do outro
(Antunes, Arnaldo. Na virada do século – Poesia de Invenção no Brasil.
São Paulo: ETCetera, 2002, p. 69)
Procure explicar o efeito de sentido produzido pelas escolhas lexicais feitas
pelos autores de cada texto, relacionando com o título dos poemas.
SUGESTÕES DE LEITURA
Para saber mais sobre denotação e conotação, leia os capítulos referentes
a esse tema e também ao uso do sentido figurado por meio de construções
metafóricas e metonímicas no livro Para entender o texto: leitura e redação de
José Luiz Fiorin e Francisco Savioli Platão, publicado pela Ática, em 1990.
Procure ouvir um CD de Itamar Assumpção, pretobrás – por que eu não
pensei nisso antes..., cujas letras apresentam um redimensionamento polissê-
mico das palavras. Segundo os críticos, as músicas são de excelente qualida-
de, o humor é ácido e inteligente, há trocadilhos e jogos de linguagem, que
fazem com que as letras mereçam ser ouvidas com bastante atenção. Consulte
o site www.atracao.com.br e saiba mais sobre a obra.
Leia mais sobre a atividade da escrita revelada, de modo significativo,
neste depoimento de Graciliano Ramos:
-
Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lava-
da na corda ou no varal, para secar.
Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra
não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita
para dizer.
(Graciliano Ramos, em entrevista concedida em 1948)
Unidade 4
Intertextualidade
Organizadores
O termo intertextualidade é usado para significar que há uma relação en-
Maria Lúcia V. de
tre textos, ou seja, tudo aquilo que é dito, expresso por um falante ou por um
Oliveira Andrade
enunciador não pertence somente a ele, na medida em que em um discurso
Neide Luzia de são percebidas outras “vozes” que podem ser identificadas ou não, distantes
Rezende ou anônimas, impessoais ou mesmo imperceptíveis que ecoam durante o pro-
Valdir Heitor cesso de produção. Esta noção de “vozes” nos auxilia a compreender a inter-
Barzotto textualidade como a propriedade que têm os textos de apresentar, de modo
Elaboradora explícito ou não, a presença de outros textos e, valendo-se desse fator de
organização textual, gerar o sentido pretendido.
Maria Lúcia V. de
Oliveira Andrade Cabe ainda destacar que o termo intertextualidade foi proposto por Júlia
Kristeva, na década de 60, para designar o processo por meio do qual o texto
se constrói; sendo todo texto “absorção e rejeição de outro texto”. Essa defi-
nição leva outra lingüista, a professora Eni Orlandi, em 1983, a estabelecer a
noção de incompletude, isto é, todo texto é necessariamente incompleto, dada
sua relação com outros textos e com o conhecimento de mundo do alocutário
(leitor / ouvinte).
Na unidade 2, trabalhamos com uma tirinha de “Rato de Sebo” em que o
enunciador faz uso da intertextualidade para construir o seu texto e criar a
ironia. O enunciador apresenta a narrativa, em 1a pessoa, com as seguintes
palavras: “Quando nasci veio um anjo torto e disse....”. A seguir, temos a voz
do próprio anjo em discurso direto: “Vá ser rato de sebo na vida”. Para um
leitor que tenha um conhecimento enciclopédico (também denominado co-
nhecimento de mundo, que pode ser adquirido por meio de leitura e estudo
ou de modo informal) a respeito da literatura brasileira, vai reconhecer de
imediato a relação com um outro texto: o poema intitulado “Poema de sete
faces” de Carlos Drummond de Andrade, que integra a obra Alguma Poesia.
Nesse poema, podemos ler na primeira estrofe:
(1)
Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche1 na vida.
A expressão anjo torto empregado no poema conota para o termo anjo
um efeito divergente do seu significado original de “ser celestial repleto de
bondade e protetor dos humanos”, e esse sentido é reforçado pelo verso “des-
ses que vivem na sombra”, que contraria a idéia de que os anjos vivem na
(2)
Os argonautas
o barco
meu coração
não agüenta
tanta tormenta
alegria
meu coração
não contenta
o dia
o marco
meu coração
o porto
não
navegar é preciso
viver não é preciso
o barco
noite no teu tão bonito
sorriso solto perdido
horizonte
madrugada
o riso
o arco
da madrugada
o porto
nada
navegar é preciso
viver não é preciso
o barco
o automóvel brilhante
o trilho solto o barulho
do meu dente em tua veia
o sangue o charco barulho lento
o porto
o silêncio
navegar é preciso
viver não é preciso
navegar é preciso
viver
-
Atividades
1. Leia a letra da música “Bom Conselho” de Chico Buarque de Holanda.
Você perceberá que o texto é feito com provérbios ou ditados populares, só
que eles aparecem invertidos. Faça um levantamento desses provérbios espa-
lhados pelo texto e tente reconstruí-los em sua forma original.
Bom Conselho
Ouça um bom conselho
Que lhe dou de graça
Inútil dormir
Que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado
Quem espera nunca alcança
Ouça, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com o meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar
Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que
Não se vai longe
Eu semeio o vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade
-
SUGESTÕES DE LEITURA
Para saber mais sobre escritores contemporâneos que fazem uso de estra-
tégias de construção textual como paráfrase e paródia, visite o site www.
releituras.com
Leia ainda o livro Fábulas Fabulosas de Millôr Fernandes, publicado pela
editora Nórdica, do Rio de Janeiro, 1963.
Pesquise sobre textos que estabelecem diálogos intertextuais entre si. Vale
a pena conferir:
a. “Canção de Exílio” de Gonçalves Dias, in Presença da literatura brasilei-
ra: das origens ao romantismo, obra organizada por José Aderaldo Castello
e Antonio Candido. São Paulo: Difel, 1974, p. 262.
b. “Canto do Regresso à Pátria” de Oswald de Andrade, in Presença da lite-
ratura brasileira: modernismo, obra organizada por José Aderaldo Castello
e Antonio Candido. São Paulo: Difel, 1977, p. 81.
c. “Canção do Exílio” de Murilo Mendes, in Presença da literatura brasilei-
ra: modernismo, obra organizada por José Aderaldo Castello e Antonio
Candido. São Paulo: Difel, 1977, p. 181.
d. “Sabiá” de Tom Jobim e Chico Buarque, no site www.chicobuarque.com.br
Em relação ao “Poema das sete faces” de Carlos Drummond de Andrade –
in Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p.5 –, é interessante
que você o confronte com a canção “Até o fim” de Chico Buarque, escrita em
1978. Você poderá encontrá-la no endereço www.chicobuarque.com.br/letras/
ateofim_78.htm
Bibliografia
FIORIN, José Luiz e SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto:
leitura e redação. São Paulo: Ática, 1990.
FIORIN, José Luiz e SAVIOLI, Francisco Platão. Lições de texto: leitura e
redação. São Paulo: Ática, 1996.
KOCH, Ingedore G. V. Introdução à Lingüística Textual: trajetória e grandes
temas. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática de usos do português. São
Paulo: Editora da UNESP, 2000.
Sobre a autora
Profa. Dra. Maria Lúcia da Cunha Victório de
Oliveira Andrade
Doutora em Semiótica e Lingüística Geral, é professora de Filologia e Lín-
gua Portuguesa da USP, autora de Relevância e contexto. São Paulo: Humanitas,
2001; e co-autora de Oralidade e Escrita: perspectivas para o ensino de lín-
gua materna. São Paulo, Cortez, 1999.