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Política Sex, 11/03/2016 às 00:08 – Acesso em 14/03/2016, disponível em:

http://atarde.uol.com.br/politica/noticias/1751194-anisio-teixeira-foi-assassinado-defende-relatorio

Anísio Teixeira foi assassinado, defende relatório


Biaggio Talento
Divulgação

Baiano, Teixeira era considerado um dos mais importantes educadores do país

O relatório sobre as circunstâncias da morte do educador baiano Anísio Teixeira,


ocorrida em 1971 (cuja versão do regime militar indicou ter sido por "acidente"), será
apresentado nesta sexta-feira, 11, em Salvador pelo escritor João Augusto de Lima
Rocha, professor da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Ele
teve acesso ao Auto de Exame Cadavérico, documento encontrado recentemente, que
levanta fortes suspeitas de que Anísio tenha sido assassinado pelos agentes do regime
militar.
João Rocha, sobrinho-neto de Anísio, ex-deputado federal Haroldo Lima, o filho Carlos
Antônio Teixeira e o genro, Mário Celso Gama, são autores de um memorial sobre a
morte do educador que contraria a versão da ditadura, de que ele caiu no fosso do
elevador de um prédio no bairro de Botafogo, no Rio.
Na apresentação desta sexta - data em que se completam 45 anos do
desaparecimento de Anísio -, que acontece na Escola Politécnica da UFBA, a partir das
8h, o professor Rocha falará sobre o Auto de Exame Cadavérico do educador,
desaparecido no Rio em 11 de março de 1971, ao qual teve acesso há pouco tempo. A
cópia obtida do documento de cinco páginas está parcialmente ilegível.
"A muito custo, consegui decifrar, parcialmente, em quinze dias de muito trabalho",
disse Rocha ressaltando, no entanto, a importância do documento enviado à família de
Anísio pela Comissão Nacional da Verdade, que resgatou os documentos do regime
militar.
Elevador
No dia de sua morte, Anísio saiu da Fundação Getúlio Vargas, onde trabalhava, para ir
andando até a residência de Aurélio Buarque de Hollanda, no Edifício Duque de Caxias,
na Praia de Botafogo. Iriam conversar sobre a candidatura de Anísio para a Academia.
O educador nunca chegaria ao apartamento do amigo.
Dois dias depois, seu corpo foi recolhido do fosso do elevador, sem a realização do
levantamento cadavérico pelos peritos da polícia. A autópsia foi presenciada pelo
acadêmico Afrânio Coutinho e os médicos, professores da Faculdade de Medicina da
UFRJ, Domingos de Paula e Francisco Duarte Neto. O laudo é assinado pelo médico
João Guilherme Figueiredo.
A parte legível do laudo descreve o exame externo do corpo indicando "na região
temporo-parietal esquerdo" da (cabeça) "duas feridas contíguas" medindo 28 e 43
centímetros "nos maiores diâmetros". Na inspeção interna da cavidade craniana, o
legista informa que os ferimentos provocaram um afundamento de 3 centímetros de
largura por quatro de comprimento.
Em relação aos ferimentos na região do tórax, o médico constata "fratura completa
dos arcos costais direitos de 1/ ao 8° na linha axilar anterior e fratura no 6° arco costal
esquerdo no mesmo nível". O laudo apresenta desenho indicando a localização dos
dois ferimentos da cabeça.
No memorial, o grupo escreveu que, ao descrever as duas grandes lesões traumáticas
no crânio e na região supraclavicular, o legista mostrou ferimentos "que seriam
incompatíveis com a queda" no fosso. Conforme o memorial "admitiu-se que um
eventual instrumento cilíndrico, provavelmente de madeira, teria causado as lesões".
Auto do exame cadavérico de Anísio Teixeira emitido pelo Instituto Médico Legal do Rio, em
13/3/1971 (Foto: Reprodução)

Investigação
Quando prosseguia com sua descrição, o legista foi interrompido com a entrada na
sala de dois funcionários da polícia, que vinham do local de onde o corpo fora retirado
e, de forma categórica, afirmaram que tinha sido "morte acidental por queda no
fosso".
A partir do memorial, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) e Comissão da Memória
e Verdade Anísio Teixeira, da UnB, iniciaram investigação em 2012 mas o trabalho não
foi concluído. Rocha disse, no entanto, que a CNV conseguiu avançar. Obteve fotos do
local onde o cadáver foi encontrado, e o Auto de Exame Cadavérico.
"Este material, não processado por ela, foi repassado à família de Anísio que, por sua
vez, passou para mim, no final do ano passado, permitindo a produção do material
conclusivo que vou apresentar agora".
Rocha e a família de Anísio vão requisitar à Comissão Especial de Mortos e
Desaparecidos Políticos, "primeiro, que reconheça Anísio Teixeira como vítima de
morte suspeita, provavelmente perpetrada pelo regime militar. Segundo,
solicitamos investigação, de agora para frente para identificar quem o matou, como e
por que ele foi morto".

Política Sex, 11/03/2016 às 12:51 Tags: anisio teixeira regime militar política ditadura
Acesso em 14/03/2016, disponível em: http://atarde.uol.com.br/politica/noticias/1751245-relatorio-sobre-
assassinato-de-anisio-teixeira-e-detalhado

Relatório sobre assassinato de Anísio Teixeira é


detalhado
Luan Santos

Escritor João Augusto de Lima Rocha contesta versão do Regime Militar de que Anísio morreu em
queda

Com base em laudos técnicos, exames cadavéricos, fotos e relatos, o escritor João
Augusto de Lima Rocha, professor da Escola Politécnica da Universidade Federal da
Bahia (Ufba), chegou à conclusão de que o educador baiano Anísio Teixeira foi
assassinado (texto anterior) em 1971 e não sofreu um acidente, segundo informa a
versão oficial apontada pelo regime militar.
O relatório feito por Rocha foi apresentado na manhã desta sexta-feira, 11, quando se
completam 45 anos do desaparecimento de Anísio, no auditória da Escola Politécnica.
O relatório traz provas de que Anísio foi morto e depois levado para o fosso do
elevador de um prédio no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro - na versão do regime
militar, ele caiu acidentalmente no fosso do elevador.

Anísio Teixeira foi assassinado, defende relatório


O trabalho de João Rocha será incluído no relatório feito pela Comissão da Verdade,
que deve ser concluído e entregue, até o final deste mês, à Comissão Especial sobre
Mortos e Desaparecidos Políticos, que deverá investigar a autoria, motivação e demais
detalhes do crime.
O relatório conclui que, com base nas fotografias do local do crime e no laudo do IML
(Instituto Médico Legal), seria impossível Anísio Teixeira ter caído no fosso de um
elevador. Segundo o laudo, a causa da morte de Anísio foi resultado do impacto sobre
o lado esquerdo do crânio, que provocou uma fratura cominutiva, isto é,
esmagamento ósseo, de abertura retangular externa de 3 cm por 4 cm.
Os óculos usados pelo educador, mesmo com o impacto tão forte na cabeça,
permaneceram intactos e foram "suavemente depositados sobre uma das vigas de
suporte do elevador", conforme o relatório.
"Considero que somente a última constatação seja suficiente para desfazer a versão
oficial de que Anísio morreu em consequência de queda num fosso de elevador.
Verifica-se que é absolutamente incompatível com as leis do movimento, o fato de os
óculos ficarem intactos e na posição em que foram encontrados, após a suposta
queda", disse Rocha.
Teixeira era considerado um dos mais importantes educadores do país (Foto: Divulgação)

O ex-deputado federal Haroldo Lima, sobrinho de Anísio, lembra que quando o tio
sumiu, a família procurou o então governador da Bahia, Luiz Viana Filho, que informou
que o educador havia sido detido pela Aeronáutica, mas que logo seria liberado.
"Então, é muito provável que ele tenha morrido sob tortura, sendo acrescidos ao
corpo traumas posteriores, com o intuito de simular uma queda no fosso do elevador",
aponta o relatório feito por João Rocha.
Outra prova trazida pelo documento é uma avaliação técnica apontando a
impossibilidade de - levando em consideração a hipótese de queda - o corpo de Anísio
ter passado entre duas vigas, num espaço de 20 centímetros, para atingir o fundo do
fosso.
"Nosso objetivo é provar que ele não morreu na queda. Pelo visto, o contexto da
morte de Anísio é, em muitos aspectos, assemelhado aos das mortes de Rubens Paiva,
ocorrida em janeiro, e de Stuart Angel Jones, em maio do mesmo ano de 1971.
Portanto, o roteiro de investigação do assassinato de Anísio pode ser montado a partir
de caminhos abertos pelas duas últimas investigações", afirma Rocha.
Reprodução da página do laudo cadavérico de Anísio Teixeira
Sociedade - Artigo / Emiliano José
Acesso em 10/03/2016, disponível em: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-assassinato-de-anisio-teixeira-
2603.html

O assassinato de Anísio Teixeira


A história tem dessas coisas: as ditaduras acreditam poder esconder as patas depois
de cometer crimes, e as patas sujas de sangue um dia reaparecem
por Emiliano José — publicado 13/01/2014 10h53

Agnaldo Novais/Agecom Bahia

O educador Anísio Teixeira

Em 11 de março de 1971, Anísio Teixeira passou boa parte da manhã na Fundação


Getúlio Vargas (FGV), na Praia do Botafogo, no Rio de Janeiro. Joaquim Faria de Góes
Sobrinho, amigo e colaborador de Anísio, colega de trabalho, soube da visita que ele
faria ao apartamento de Aurélio Buarque de Holanda, situado na Praia do Botafogo,
48, edifício Duque de Caxias. Sugeriu-lhe fosse a pé. De carro, teria de dar muitas
voltas.
Anísio saiu antes das 11 horas em direção ao apartamento de Aurélio Buarque de
Holanda, aceitando recomendação de Sobrinho. Almoçaria com ele, e pediria voto: era
candidato a membro da Academia Brasileira de Letras. Depois desse almoço, iria para a
Editora Civilização Brasileira, na Glória, Rua Benjamin Constant. Ali, trabalhava como
consultor.
Anísio tinha uma rotina relativamente rigorosa. Chegava da Civilização Brasileira entre
18,30 e 19 horas. Neste dia 11, um pouco antes das 20 horas, a mulher de Anísio,
Emília Ferreira Teixeira, liga para a filha Anna Christina Teixeira Monteiro de Barros,
preocupada: nada de Anísio chegar. A filha tranquilizou-a: o pai poderia ter saído com
o embaixador Paulo Carneiro, seu amigo e um dos articuladores de sua candidatura à
Academia. Carneiro era representante do Brasil na UNESCO, em Paris, em visita ao
Brasil naquele momento.
Mas, o tempo passava, e nada de Anísio. Logo, o apartamento, à Rua Raul Pompéia,
58, apartamento 803, em Copacabana, começou a se encher de parentes e amigos.
Começa uma via-crucis: delegacia de polícia de Copacabana, onde não havia qualquer
notícia; não estivera na Editora Civilização Brasileira. Terminaram o dia no Hospital
Miguel Couto, onde também não havia sinal dele.
Dia seguinte: não estivera também no edifício de Aurélio Buarque de Holanda. Tudo
muito estranho, a família em polvorosa. E mais angustiado ficaram todos quando o
jornalista Artur da Távola, genro de Anísio, informa que o acadêmico Abgar Renault
soubera do comandante do I Exército, Sizeno Sarmento, que Anísio Teixeira estava
“detido para averiguações” em dependências da Aeronáutica.
No dia 13, jornais noticiam o desaparecimento do educador. E às 17 horas, Anna
Christina recebe um telefonema: “aqui é da polícia...”. Ela passa o telefone para Lúcio
Abreu, amigo da família. O educador fora encontrado morto, nas palavras da polícia,
no fosso do elevador do edifício onde residia Aurélio Buarque de Holanda.
O corpo estava agora no Instituto Médico Legal. Fora retirado do fosso sem perícia
técnica. Na autópsia, estiveram presentes o acadêmico Afrânio Coutinho, o
neurologista Djalma Chastinet Contreiras e os médicos Francisco Duarte Guimarães
Neto, Domingos de Paula e Deolindo Couto, estes três, professores da UFRJ. Segundo
relato dos presentes, havia duas grandes lesões traumáticas no crânio e na região
supra-clavicular, incompatíveis com a suposta queda. Relatam, também, a existência
de um instrumento cilíndrico, provavelmente de madeira, presumível causador das
lesões. O legista, quando prosseguia com sua descrição, foi interrompido
abruptamente por dois funcionários provenientes do local de onde o corpo fora
retirado, que afirmavam ter sido “morte acidental por queda em fosso de elevador”.
No edifício onde Aurélio Buarque de Holanda morava, outro genro de Anísio, Mário
Celso da Gama Lima, junto com um detetive policial, José Pinto, constatava: o corpo
não poderia ter caído do alto e chegado ao ponto onde fora encontrado. Não passaria
entre duas vigas logo acima, separadas entre si por uma distância de pouco mais de 20
centímetros. As lentes intactas dos óculos de Anísio, encontradas no local, outra
evidência da farsa – não havia, então, lentes inquebráveis. Os dois subiram para testar
as portas dos elevadores de cada um dos andares. Não conseguiram abrir nenhuma
delas.
Mário vai ao IML, a autópsia em curso, ele não consegue assisti-la. O médico e
professor da UFRJ, Francisco Duarte Guimarães, havia assistido, e lhe diz sem qualquer
vacilação: “Mário, tio Anísio foi assassinado”. Dos que assistiram a autópsia, Mário
ouviu a certeza: Anísio fora assassinado.
Foi enterrado no dia 14 de março de 1971, no cemitério São João Batista, no Rio de
Janeiro. A morte ocorria menos de dois meses depois da prisão, tortura e
desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva, também no Rio de Janeiro. À época,
os esforços para elucidar o caso junto à delegacia responsável esbarravam no fato de
que a polícia só admitia tratar o fato como crime comum, malgrado admitisse a
hipótese de assassinato. Quando houve a tentativa de incriminar serventes, o filho de
Anísio, Carlos Antonio Teixeira, resolveu suspender a investigação.
Esclareço que essas informações estão baseadas em textos produzidos principalmente
pelo professor João Augusto de Lima Rocha, da Escola Politécnica da UFBA, membro
do Conselho Curador da Fundação Anísio Teixeira e da Comissão da Verdade da UFBA,
autor do livro “Anísio em Movimento” e, também, no Memorial enviado à Comissão
Nacional da Verdade e à Comissão da Memória e Verdade Anísio Teixeira, da
Universidade de Brasília, assinado pelo filho de Teixeira, Carlos Antonio Ferreira
Teixeira; por Haroldo Lima, ex-deputado federal, ex-diretor da Agência Nacional do
Petróleo e sobrinho-neto de Anísio Teixeira, e pelo próprio João Augusto.
O Memorial anexa matéria do jornal Última Hora, de 15 de março de 1971, onde sérias
dúvidas são apresentadas em relação à tese de acidente. A polícia, em princípio,
segundo a reportagem, conclui que se Anísio tivesse caído no espaço do elevador de
serviço jamais iria cair no platô.
O repórter informa: o corpo estava exatamente sobre o platô, de cócoras, com a
cabeça sobre os joelhos e as mãos segurando as pernas. Entre os pés, uma poça de
sangue. Na parede, bem no canto, abaixo das duas pilastras, alguns pingos de sangue.
Mais nada. E as pilastras não mostravam ranhuras no cimento, na pintura, nem marcas
de sangue, coisa que aconteceria se o corpo tivesse batido ali. Ainda segundo a
reportagem: quando a portinhola que dá acesso ao platô foi aberta e encontrado o
cadáver, outra porta, a da casa de força também estava escancarada. A perícia
encontrou ali muitos respingos de sangue.
Outra conclusão categórica da polícia, ainda segundo a matéria: acidente é
praticamente impossível. A posição do corpo feria tudo o que já fora visto até ali em
acidentes como aquele. “Alguém matou e colocou ali o cadáver do professor Anísio
Teixeira”. O repórter anota ainda outras observações da polícia: o chão em volta da
portinhola que dá acesso ao poço do elevador havia sido lavado, os óculos de Anísio
haviam sido encontrados em uma das pilastras e tudo leva a crer que foram colocadas
ali, e ao ser retirado do fosso o cadáver estava sem sapatos e sem paletó. E os
elevadores haviam sido revisados havia apenas 20 dias.
O Memorial relata, ainda, depoimento de Luís Viana Filho, de 1988, dado ao professor
João Augusto de Lima Rocha, que preparava então o livro “Anísio em Movimento”,
publicado pela Fundação Anísio Teixeira, em 1990, e republicado pela Editora do
Senado, em 2002. Viana Filho, no depoimento, informa que, procurado pela família,
buscou notícias, e recebeu a informação de que Anísio fora detido pela Aeronáutica
para esclarecimentos, mas que seria libertado.
E noutro depoimento, dado em 1989, Afrânio Coutinho diz acreditar que Anísio fora
morto sob torturas. E diante de James Amado, sua esposa Luiza Ramos, Pedro Roberto
Ivo das Neves e do próprio João Augusto, disse ter escrito um documento sobre o
episódio, depositado no cofre da Academia Brasileira de Letras, com a recomendação
de só ser aberto 50 anos após a ocorrência dos fatos, em 2021, portanto. Coutinho cita
o brigadeiro Burnier como um dos responsáveis pelo assassinato de Anísio, o mesmo
Burnier dos sinistros planos do Para-Sar e da explosão do gasômetro da Avenida Brasil,
abortados pela resistência do capitão Sérgio Macaco.
São muitas as evidências de que Anísio Teixeira foi morto sob tortura. A história tem
dessas coisas: as ditaduras acreditam poder esconder as patas depois de cometer
crimes, e as patas sujas de sangue um dia reaparecem. É momento de resgatar a
memória, revelar a verdade, fazer justiça. Sem condescendência com os criminosos.

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