Você está na página 1de 18

A produção de um território patrimonial: sítios testemunhos e contextos histórico-

arqueológicos da ocupação indígena pré-colonial e colonial da região do atual Triângulo


Mineiro e Alto Paranaíba – MG

Aurelino José Ferreira Filho1


Marcel Mano2
Robson Rodrigues3

Introdução

O presente artigo é resultado dos trabalhos e reflexões do Grupo de Estudos e Pesquisas


em Arqueologia, Etnologia e História Indígena – GEPAEHI – CNPq. Embora ainda de forma
ensaística e incipiente, abordamos aqui um aspecto ainda pouco explorado para a
compreensão dos processos de produção dos diversos territórios indígenas no Brasil pré-
colonial e colonial, qual seja, a formação de territórios patrimônios, testemunhos histórico-
arqueológicos das diversas formas de ocupação humana que ali se desenvolveram. Com base
no estudo da região do atual Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba – MG, a intenção é mostrar
quais e como os sítios arqueológicos, em análise comparativa com a documentação histórica,
são testemunhos dos processos de produção e descartes, trocas materiais e simbólicas entre
diferentes grupos indígenas, e, já em tempos coloniais, entre esses grupos e os sertanistas,
agentes, instituições e processos coloniais de produção de diferentes territórios.
A região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba-MG apresenta altíssimo potencial

1
Doutor em História é professor do Instituto de Ciências Humanas do Pontal/UFU. Universidade Federal de
Uberlândia. E-mail: aurelino.ufu@gmail.com
2
Doutor em Antropologia é professor associado do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
PPGCS/INCIS/UFU e Programa de Pós-Graduação em História – PPGHI/INHIS/UFU. Universidade Federal de
Uberlândia. E-mail: marcelmano@ufu.br
3
Doutor em Arqueologia é professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais –
PPGCCS/INCIS/UFU. Universidade Federal de Uberlândia. E-mail: robson_arqueo@yahoo.com.br

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
1
histórico-arqueológico, de caráter e valor patrimonial4, testemunho do contexto e da memória
histórica da sua ocupação indígena pré-colonial5 e colonial durante os séculos XVIII e XIX.
Trata-se de território, geográfico e histórico, no qual se deu intensos contatos entre
diferentes populações e culturas. Primeiro, entre as populações indígenas que o habitavam,
desde tempos imemoriais (MAZZA, 2020) e, durante o período colonial (meados do XVIII a
XIX), entre elas e os sertanistas paulistas (bandeirantes) (FERREIRA FILHO, 2015;
RODRIGUES, 2011; MANO, 2012); entre elas e escravisados fugidos da escravização e
homens livres pobres em geral (ALVES, 2017; MANO; ALVES, 2015; MANO; 2015);
bem como com índios aldeados pela política colonial de aldeamentos indígenas (MORI, 2015;
ASNIS, 2019).
Esse intenso cenário de contatos e intersecções culturais deixaram inúmeros registros
(históricos, arqueológicos e paisagísticos) que nos permite pensar a região em tela como um
vasto território patrimonial, conceito tomado de empréstimo da musealização da arqueologia,
(WICHERS, 2014, p. 26) e entendido como testemunho histórico dos processos de produção e
reprodução de ocupações humanas dos territórios.
Cabe aqui uma pequena digressão sobre o conceito de território,
utilizado aqui para compreendermos essa relação entre sociedade e
espaço. Milton Santos propôs que o território fosse compreendido como uma
mediação entre o mundo e a sociedade, categoria de análise social “O
território são formas, mas o território usado são objetos e ações, sinônimo de
espaço humano, espaço habitado” (SANTOS, 2005, p. 255). Para Cabral
(2007), sob a noção de território, deve-se privilegiar a reflexão sobre o
poder referenciado ao controle e à gestão do espaço. Nesse sentido, ao
tomarmos o conceito de território na Musealização da Arqueologia,
estamos destacando as relações de poder, o controle político do espaço, o
que nos parece especialmente adequado se queremos refletir
criticamente sobre o contexto contemporâneo, onde muitos projetos têm
seu espaço de atuação definido a partir dos empreendimentos de
natureza diversa, que delimitam o território patrimonial a ser
pesquisado. A divisão política, seja municipal e estadual, também é um
recorte possível para a análise do território patrimonial. (Grifo nosso)
(WICHERS, 2014, p. 26-27).
4
Sendo que a região já conta com importantes bens tombados, de âmbito municipal e estadual, testemunhos
destes processos, como veremos ao longo do artigo.
5
Do ponto de vista geográfico e arqueológico, de forma ampliada, trata-se da ocupação pretérita da Bacia do Rio
Grande e Bacia do Rio Paranaíba, envolvendo o norte de São Paulo, Triângulo Mineiro, sul de Goiás e leste do
Mato Grosso do Sul tendo como grupos principais os indígenas da família linguística Jê, identificados como
Kayapó Meridionais ou Kayapó do sul.

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
2
A delimitação desta vasta área como território patrimonial, sítio histórico-arqueológico,
de caráter e valor patrimonial justifica-se pelo fato da região do atual Triângulo Mineiro e
Alto Paranaíba – MG, ser composta por um conjunto de municípios não contíguos nos quais
existem sítios testemunhos do contexto e da memória histórica da produção do território pré-
colonial e colonial. Embora já se tenha uma base de conhecimento acerca das relações entre
os povos e as culturas que o construíram, ainda há muito que fazer, como, por exemplo, uma
cartografia histórica que amplie a compreensão das formas de produção do território,
inserindo as redes de trocas materiais e simbólicas entre os povos, sejam elas produtos das
relações parentais, das alianças, das guerras, das negociações e outras formas de interação
social que aí se desenvolveram (MANO, 2010; MORI, 2015).

O cotejamento entre fontes históricas coloniais e arqueológicas

Metodologicamente, dialogamos de modo interdisciplinar como possibilidade de


trabalho com diversidade de fontes e campos do conhecimento, particularmente, entre a
História, a Arqueologia e a Antropologia. Assim, o procedimento metodológico adotado foi o
de cotejar fontes históricas coloniais, amplamente exploradas pela literatura histórica e
acadêmica6 sobre a região em tela, partes dos relatórios oriundos do Programa de Salvamento
Arqueológico7, como medida compensatória, realizado por ocasião da construção das UHE de
Miranda e UHE de Nova Ponte, ambas na região, o que tornou possível delinear o amplo

6
Entre tantas outras, podemos citar: MORI, Robert. Os aldeamentos indígenas no Caminho dos Goiases:
guerra e etnogênese no sertão do Gentio Cayapó (Sertão da Farinha Podre) séculos XVIII e XIX. Dissertação
(Mestrado em Ciências Sociais), Instituto de Ciências Sociais, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia,
2015. LOURENÇO, Luís A. B. Populações indígenas e política indigenista no Triangulo Mineiro nos séculos
XVIII e XIX. In: FERREIRA FILHO, Aurelino (Org.). Índios do Triângulo Mineiro. Uberlândia: Edufu, 2015,
p. 25-56; LOURENÇO, L. A. B. Os índios da Farinha Podre. In: A oeste das minas: escravos, índios e homens
livres numa fronteira oitocentista Triângulo Mineiro (1750-1861). Uberlândia: Edufu, 2005, p. 41-93; MANO,
Marcel. Da Tradição à Cultura: problemas de investigação nos estudos das ocupações indígenas no Planalto
Meridional Brasileiro. Revista Albuquerque, v. 10, n. 19, p. 8-34, 2018; MANO, Marcel. Negros e Índios nos
sertões das minas: contatos e identidades. Varia História, v. 31, n. 56, p. 511-546, 2015.
7
Programa de Salvamento Arqueológico – Atividade do Museu de História Natural da Universidade Federal de
Minas Gerais – Relatório Final – Estudos Ambiental, produzido em 1995 e do Projeto Executivo do Programa de
Salvamento Arqueológico da UHE Miranda – Atividades do Centro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas da
Universidade Federal do Paraná, 2001.

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
3
território patrimonial.
Sendo assim trabalhamos, portanto, na perspectiva desta região como área de
abrangência de um importante território patrimonial (WICHERS, 2014, p. 26-27) a ser
preservado por meio de tombamento do território como um todo, como sítio de alto valor
patrimonial histórico-arqueológico, ou isoladamente, por meio do tombamento de seus sítios,
trechos de caminhos, evidências e indícios atinentes àqueles processos de produção dos
espaços culturais.

Contexto pré-colonial e colonial: a presença indígena no atual Triângulo Mineiro e Alto Paraíba
– MG

Para a região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba-MG, especificamente para a Bacia


do Rio Grande8 e Bacia do Rio Paranaíba, há vasta literatura composta por relatos de
viajantes, bem como acadêmica, que a reproduz, sobre o seu povoamento originário, pré-
colonial (indígena) e colonial (séculos XVIII e XIX). Relatos de viajantes referentes ao XIX
atestam a presença massiva de grupos indígenas na região desde as primeiras entradas e
bandeiras que por ali passaram, bem como a presença de aldeias e aldeamentos9 coloniais;
estes últimos resultantes da política colonial no trato com as populações indígenas na América
portuguesa, além dos sítios indígenas que não contavam com capela, mas que surgiram da
dispesão dos indígenas aldeados ao longo do Caminho dos Goiases (LOURENÇO, 2015).
Os relatórios de pesquisas resultantes de Programas de Salvamentos arqueológicos
desenvolvidos na região e adjacências, especificamente os já citados por ocasião da
construção das UHEs de Miranda e Nova Ponte, também referenciam vários horizontes
arqueológico-históricos, tais como sítios arqueológicos que atestam a presença indígena na

8
Tratando-se dos grupos indígenas da Bacia do Rio Grande e Bacia do Rio Paranaíba, esses processos coloniais
só vão se iniciar a partir da segunda década do século XVIII, com a descoberta das minas de Goiás e Cuiabá.
(RASTEIRO, 2015, p. 37)
9
“Pela descrição que aqueles viajantes deram desses núcleos, só Rio das Pedras, Santana e Piçarrão
mereceriam o nome de aldeamentos, pois eram os únicos que contavam com capelas. A presença do templo
religioso era sinal da oficialidade de sua fundação, de que o núcleo havia sido reconhecido pelas autoridades
religiosas. Os demais povoados eram destacamentos dos núcleos originais, resultado de um processo de
dispersão centrífuga dapopulação aldeada, cujas causas analisaremos adiante” (LOURENÇO, p. 56).

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
4
região em tempos imemoriais, processos de ocupações coloniais, e até mesmo o intenso
deslocamento forçado de indígenas para a região.
Embora se trate de território patrimonial geograficamente não contíguo, mas
testemunho dos mesmos processos históricos de produção preteríta da região, trabalhamos
aqui, especificamente, com o Arraial do Desemboque (pertencente ao atual município de
Sacramento), os atuais municipios de Indianópolis, Cascalho Rico e Nova Ponte.

Arraial do Desemboque

Distrito do munícipio de Sacramento, próximo ao histórico Caminho do Goiás, o


Arraial do Desemboque está entre os primeiros núcleos coloniais do Sertão da Farinha Podre
(assim denominado até os idos do século XIX e atual Triângulo Mineiro).
Em Carta Régia de 1749, destinada a D. Marcos Mendonça, governador da
capitania de Goiás, a Coroa portuguesa decidiu pela guerra aos caiapós, “que
não cessa de infestar com as mais cruéis hostilidades o caminho de São
Paulo para o Goiás, e até as povoações daquelas Minas” (PALACIN;
GARCIA; AMADO, 1995, p. 69). Um ano antes, em 1748, os caiapós
haviam dizimado os garimpeiros de um núcleo aurífero, nas cabeceiras
do rio das Abelhas [atual rio Araguari], mesmo lugar onde, alguns anos
depois, surgiria o arraial do Desemboque (VASCONCELOS, 1999 apud
LOURENÇO, 2005, p. 54-55).

A se tomar as fontes coloniais como fidedignas, uma vez que era corrente, por parte dos
sertanistas, a reprodução da imagem do gentio Caiapó como violentos e empecilho a ser
eliminado, o Arraial do Desemboque teria sido um dos primeiros contextos de contatos e
conflitos entre luso-brasileiros, possivelmente paulistas, e índios na defesa de seus territórios
na região.

Caminhos coloniais e Pousos de viajantes

A ocupação pretérita da região, ainda pertencente à Capitania paulista10, é perpassada

10
A região do Triângulo Mineiro pertenceu a Capitania paulista até o ano de 1748, quando passou a pertencer a
Capitania goiana, sendo que em 1816 passa a fazer parte da Capitania mineira.

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
5
pelo caminho dos goiases, caminho obrigatório entre a capitania de São Paulo e as minas de
Goiás imortalizando a presença dos sertanistas e bandeirantes paulistas na região, que entre os
anos de 1722 e 1725,
Nesta empreitada, sedimentando o Caminho dos goiases, cruzando parte do território do
atual Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba – MG, “apenas três cursos d’água eram de difícil
travessia: o rio Grande, cujo profundo vale, então recoberto por densa floresta, chega a 550 m
de altitude; o rio das Velhas e o rio Paranaíba” (LOURENÇO, 2005 p. 52).
No tocante ao contexto dos caminhos coloniais (Imagem 1), utilizados por sertanistas
paulistas rumo às minas de Goiás e Mato Grosso, tão importantes para a região a partir da
segunda metade do século XVIII, apesar de extensa, a citação abaixo, estraída do Relatório do
Programa de Salvamento Arqueológico traz dados importantes a ser aprofundados:
Junto a algumas ocorrências foram constatadas árvores velhas,
especialmente mangueiras. Trechos de caminhos antigos também foram
registrados nos arredores de sítios e indícios. Estes serão comentados
adiante. (...) A tradição local relaciona a voçoroca existente no lado leste
do sítio MG 81 ao caminho utilizado pelos bandeirantes em suas viagens
para Goiás e Mato Grosso. Em cartografia da segunda metade do século
XVIII figura um caminho vindo de São Paulo, atravessando o rio das
Velhas (atual rio Araguari), passando pela Aldeia de Sant’Anna (atual
sede do Município de Indianópolis) e, seguindo sempre em direção
noroeste, transpondo o rio Paranaíba, logo após a localidade de Rio das
Pedras, dirigindo-se para o interior de Goiás. Esse espaço do Triângulo
Mineiro estava sob a jurisdição do Julgado das Velhas e pertencia à
Capitania de Goiás, da qual foi desmembrado em 1816. No momento da
pesquisa, o trecho do caminho situado ao lado do sítio apresentava-se
como uma voçoroca. Disposto no sentido norte-sul, no mesmo sentido do
declive do terreno, sofreu intensamente com a erosão depois do
desmatamento. O seu ponto de travessia, na margem direita do rio Araguari,
estava logo abaixo de um acentuado estreitamento do seu curso. (Grifo
nosso) (CEMIG-LEME, 2001, p. 402).

Também na literatura acadêmica sobre a região encontramos vastas referências aos


mesmos pousos.
Outro papel desempenhado pelos aldeamentos da Farinha Podre, por causa
de sua localização, era o de local para pousos de tropas. Os pousos eram
ranchos, geralmente cobertos de sapé, abertos dos lados, onde tropas e
viajantes descarregavam, dormiam e se alimentavam (SAINT HILAIRE,
1975a, 2000; ESCHWEGE, 1996). Dispunham do apoio logístico da
população vizinha, que preparava os víveres vendidos aos viajantes. Havia

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
6
pousos em Rio das Pedras, Estiva, Piçarrão, Boa Vista, Santana e
Lanhoso, onde os índios vendiam alimentos aos que lá faziam paradas
(Grifo nosso) (SAINT HILAIRE, 1975 apud LOURENÇO, 2005, p. 61).

Se referindo a outro trecho, desta vez no atual município de Indianópolis, também as


referências abaixo são inequívocas no tocante a existência de caminhos antigos, tanto
indígenas como coloniais, na área em tela.
Na chapada da margem direita, acima do sítio e nas proximidades da sede da
Fazenda Registro, existem trechos de caminho antigo não erodidos,
cobertos pela pastagem e pelo cerrado residual. Orientam-se em direção à
sede do Município de Indianópolis. Os portugueses, nas suas incursões em
demanda aos sertões de Goiás desde o final do século XVI, devem ter se
utilizado de trilhas indígenas que cruzavam a região em várias direções. O
caminho transpondo o rio Araguari foi usado em 1722 por Bartolomeu
Bueno da Silva, o filho, também conhecido como o segundo Anhanguera
(...) Os caminhos eram muito transitados. Só em um trecho, o compreendido
entre os rios Atibaia e Grande existiam, até 1728, trinta pousos. (Grifo
nosso) (CEMIG-LEME, 2001, p. 405).

O relato acima faz referência a trinta pousos no Caminho dos goiases, nos dando a
dimensão destes pousos para os processos de produção, ocupação e colonização da região nos
séculos XVIII e XIX.
Ainda esperando por pesquisas e estudos mais consistentes sobre o tema, os caminhos
indígenas e coloniais, assim como os Pousos de viajantes, foram fundamentais não só para a
dinâmica de aldeamentos da administração colonial na relação com as populações indígenas,
como também para a dinâmica econômica, de trocas materiais e simbólicas locais e regionais.
Assim, quando realizada, a cartografia dos caminhos do ouro no território em foco poderá
auxiliar no registro de mais um caminho colonial tombado, a exemplo do que ocorre em
várias partes do pais, tanto a nível municipal quanto estadual.

Aldeamentos coloniais indígenas

O período colonial da região foi inicialmente marcado por uma política indigenista que
atuou pela cooptação, violência, e construção de aldeamentos11 de indígenas transferidos de

11
Aroldo de Azevedo (1959, p. 23) diferencia duas categorias de habitações indígenas: a aldeia, “povoado

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
7
outras partes da colônia e “usados”, entre outras formas, como soldados para manterem livre
os caminhos do ouro.
No Triângulo Mineiro, a primeira forma de ocupação colonial consistiu,
paradoxalmente, em núcleos de população indígena instituídos pelo
colonizador: os aldeamentos. (...) Nestes núcleos, a população ameríndia
nativa era sedentarizada, de forma compulsória ou cooptada pela catequese,
e a partir de então era tutelada pelo colonizador. Para tanto, a Companhia de
Jesus recebeu da Coroa concessões de terra em torno da vila de São Paulo,
onde instalou capelas, povoados e fazendas, dando forma aos
aldeamentos.” (Grifo nosso) (LOURENÇO, 2005, p. 48-49).

Imagem 1: Mapa do Território que compreende o atual Triângulo Mineiro – MG


e o Caminho dos Goiases, e osaldeamentos criados em seu entorno.

Fonte: MORI, 2015.

construído pelos próprios índios, com os recursos de sua técnica primitiva e de acordo com sua cultura, sem a
interferência de elementos da cultura dita civilizada”; e o aldeamento de índios, de “origem religiosa ou leiga”
que seria uma expressão utilizada para diferenciar os aglomerados “espontâneos” (aldeias) dos idealizados pelos
não índios, os “aldeamentos” (1959, p. 26) (R. p. 74) Azevedo (1959) também diferencia três tipos de
aldeamento no período colonial: Aldeias do Colégio, Aldeias de El-rei e Aldeias ou Missões. As duas primeiras,
construídas próximas às cidades, congregavam os índios livres, ao passo que as Aldeias ou Missões estavam
“afastadas dos aglomerados urbanos, isoladas em pleno sertão, ficando sua administração exclusivamente
entregue aos religiosos” (AZEVEDO, 1959, p. 27). (MORI, 2015, p. 74).

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
8
Outro fator determinante para a política de aldeamentos de indígenas na região por parte
da coroa, por meio de cooptação e da violência, era a determinação em combater e exterminar
os índios Kaiapó12 ou Caiapó do Sul, como figura na documentação colonial, sob a alegação
de que aqueles impendiam o processo de colonização e ocupação daquelas terras.
Neste sentido, “Antônio Pires de Campos, o moço, iniciou em 1748, a guerra de
extermínio contra os índios Kayapó, habitantes tradicionais da região e considerados
obstáculos à sua ocupação pelos portugueses” (CEMIG-IESA, 2001, p. 405). Os relatos de
viajantes também nos dão conta da grande presença dos índios Kaiapó na região, sempre lhes
atribuindo ferocidade e violência.
Em toda a faixa de terras compreendida na bacia do baixo Paranaíba e
baixo rio Grande (atual sul de Goiás, noroeste de São Paulo, pontal do
Triângulo Mineiro e leste do Mato Grosso do Sul), até a época em que Aires
de Casal (1976) escreveu sua Corografia Brasílica, em 1817: É a menos
conhecida [região da província de Goiás], não havendo nela estabelecimento
algum de cristãos. Os caiapós, que a dominam (repartidos ainda, segundo
dizem, em várias tribos), têm sido fatais por vezes aos comboios cuiabanos,
e invadido a parte setentrional da província de São Paulo, onde causaram a
deserção de muitos estabelecimentos. (CASAL, 1976, p. 151). (Grifo nosso)
(LOURENÇO, 2005 p. 52).

Assim, os aldeamentos de Rio das Pedras, como o de Santa Ana do Rio das Pedras,
dentre outros núcleos habitados por indígenas na região, surgiram com o claro objetivo de
defesa do Caminho dos Goiases e demais arraiais da capitania de Goiás contra os ataques dos
Kayapó do sul (MORI, 2015, p. 76).
Viajantes e fontes coloniais, também apontam para a existência de outros aldeamentos
na região.
Eschwege (1996) visitou nove aldeamentos no trajeto da estrada, em 1816.
A maioria deles, como sugeriremos adiante, deve ter nascido de divisões da
população dos três originais. Saint Hilaire relatou que Pires de Campos
fundara somente Rio das Pedras e Santana. As aldeias de Estiva, Piçarrão
e Boa Vista surgiram, segundo o cronista, de desmembramentos da
população do Rio das Pedras. (Grifo nosso) (LOURENÇO, 2005 p. 56).

12
“Desde cedo, as menções históricas aos Kayapó são modelos de construção do outro (Tapuia – não Tupi e não
civilizado) a partir da lógica e da alegoria da colonização. Como se sabe pela moderna etnografia, o termo
Kayapó é uma designação genérica que não corresponde a uma etno-taxonomia social e significa, literalmente
em Tupi ou Guarani (e não em Jê – família linguística ao qual pertencem os Kayapó), “como macaco” (MANO,
2010, p. 239).

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
9
A considerar assertivo o relato de Eschwege (1976:2005), o território era bem povoado
(para padrões coloniais) por populações indígenas, constatando-se também significativa
mobilidade por meio de desmembramentos de núcleos populacionais originais, sobreudo se
consideramos que as guerras de extermínio contra esses grupos deva ter produzido a fuga das
aldeias, migrações e desolocamentos.
Para efeito deste artigo, consideraremos como exemplo apenas os aldeamentos de Santa
Ana do Rio das velhas e Rio das Pedras, ambos localizados entre os rios Grande e Das Velhas
(atual rio Araguari), na Bacia do rio Paranaíba, nos atuais municípios de Indianópolis e
Cascalho Rico, respectivamente. O referenciamento destes sítios torna-se possível por meio
do cotejamento entre as fontes históricas coloniais e as pesquisas arqueológicas.

Deslocamentos, territorialização forçada e aldeamentos indígenas

O aldeamento Rio das Pedras,

(...) foi criado [1743] no governo de Dom Luís Mascarenhas, quando Goiás
ainda estava sob jurisdição da capitania de São Paulo. Com a divisão
territorial, passou a ser administrado por Goiás, sendo então, o primeiro
aldeamento desta capitania. O segundo foi Santa Ana do Rio das Velhas,
criado em 1750. Ambos estavam localizados entre os Rios Grande e
Paranaíba, no Sertão da Farinha Podre (Grifo nosso) (MORI, 2015, p. 77).

Este aldeamento foi constituído para “abrigar” os índios Bororo e Paresí, bem como
mestiços e escravos que compunham os batalhões de Pires de Campos. (MORI, 2015, p. 75).
Neste sentido,
A aldeia estava localizada sobre a encosta de um morro que vai em declive
suave até a beira do riacho das Pedras. O aldeamento consistia em umas
trinta casas espalhadas, sendo a maior parte delas cobertas por palhas e
diferindo pouco das dos luso-brasileiros, embora houvesse alguns com
paredes e tetos de folhas de palmeiras como as choças dos Caiapós,
porém muito maiores e mais altas que as destes. Esta aldeia teria sido
escolhida por Pires de Campos para se estabelecer, sendo que uma das casas
era para ele reservada. Em 1809, parte da população foi transferida,
“através de centenas de léguas e sob um sol ardente” para Nova Beira,
local onde pretendiam estabelecer um posto militar. Entretanto, os indígenas

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
10
teriam perecido na sua maioria. Saint-Hilaire relata que todos eram
agricultores e não conservavam nenhum dos costumes de seus antepassados,
vivendo como os brasileiros (SAINT-HILAIRE, 1975, p. 131). (Grifo nosso)
(CEMIG-IESA, 2001, p. 405).

A escolha da localização para a ereção dos aldeamentos da região, entre outros motivos,
seguiu duas lógicas importantes para aquele momento, a primeira, por se tratar de localização
preferida pelos índios, e a segunda, e mais importante para a administração colonial,
facilitaria as incursões guerreiras contra os Kayapó.
A escolha do local do aldeamento de Rio das Pedras não foi aleatória. Ainda
que a paragem, segundo o governador da capitania, fosse a preferida pelos
índios, o local tinha uma posição estratégica, pois estava localizado no
“Sertão do Gentio Cayapó” (área dos tradicionais inimigos dos Bororo e da
Coroa portuguesa), às margens do Caminho dos Goiases (o que facilitava o
deslocamento e servia também como pouso para os viajantes), além de estar
equidistante de São Paulo e Vila Boa. Assim, a localização do aldeamento
facilitaria a saída de incursões guerreiras contra os Kayapó do sul.
(LOURENÇO, 2005. p. 85).

Diferentes fontes relatam o deslocamento e a territorialização forçada de grupos


indígenas para a região, por força da política colonial portuguesa, objetivando combater aos
índios Kayapó. O relato de Manuel Aires de Casal (1976) apontou que a aldeia de Lanhoso
“surgiu depois, em 1775, quando os índios Bororo da aldeia de Santana foram transferidos
para as proximidades do rio Grande, para dar lugar aos Chacriabás trazidos pelo governo
goiano”. (Grifo nosso) (LOURENÇO, 2005. p. 56).
Também foi para o aldeamento de Rio das Pedras (atual munícipio de Cascalho Rico)
que o sertanista Pires de Campos se deslocou para fazer contatos com os índios Taperapé,
Mangarirubas e Curumarê, ambos da ilha do Bananal, atual Estado do Tocantins.
O segundo aldeamento da região foi Santa Ana do Rio das Velhas (atual municipio de
Indianópolis), constituido em 1750, também localizados entre os Rios Grande e Paranaíba,
atual Triângulo Mineiro-MG, abrigaria, entre outros, os índios Araxá, e também seguia a
mesma lógica de combate aos Kayapó do sul.
Ficou decidido que o aldeamento para os Araxá seria construído
próximo ao Rio das Velhas. Como Rio das Pedras, a escolha do local não
foi aleatória, pois ela atendia aos interesses tanto da Coroa portuguesa como
do sertanista [Antonio Pires], pois “com ella se segurará melhor aquelle

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
11
caminho e ficasse menos exposto ás hostilidades que nelle tem feyto
repetidas vezes o gentio Cayapó (Grifo nosso) (MORI, 2015, p. 88).

As fontes coloniais, já citadas, apontam que os aldeamentos de Rio das Pedras, atual
município de Cascalho Rico e Santa Ana do Rio das Velhas, atual município de Indianópolis,
assim como um terceiro, Lanhoso, localizado no córrego Lanhoso, atual município de
Uberaba (MORI, 2015), teriam sido os núcleos originários dos demais aldeamentos da região,
sendo eles Estiva, Piçarrão, Boa Vista, Rocinha, Lanhoso, Uberaba e Baixa (Imagem 1).
Como já dito, o cotejamento entre as fontes em tela revelam referências que corroboram
para a existência de um amplo contexto histórico-arqueológico, de caráter patrimonial,
testemunho de processos de trocas, deslocamentos, forçados ou não, relações de poder,
conflitos, mas também de possíveis alianças, de suma importância para a preservação da
Memória e da História indígena local e regional.

Sítios arqueológicos e suas evidências materiais indígenas

A região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba-MG também conta com significativo


conjunto de sítios arqueológicos, espalhados por seus municípios, compondo um importante
acervo lito-cerâmico indígena, em grande parte, a céu aberto, próximos à encostas, rios,
córregos, pequenas e grandes propriedades rurais.
Pesquisas arqueológicas desenvolvidas na região, principalmente nos municípios de
Ituiutaba e Cachoeira Dourada, ambos no pontal do Triângulo Mineiro, registraram que
(...) nas margens do Rio Tijuco, na região de São Lourenço [no
município de Ituiutaba], foram identificados 38 sítios arqueológicos.
(...) Até o ano de 2013, haviam sido identificados 18 sítios
arqueológicos [no município de Cachoeira Dourada], sendo que grande
parte foi encontrada as margens do Rio Paranaíba, justamente na área
onde as margens foram alagadas pela construção da barragem da Usina
Hidrelétrica de Cachoeira Dourada (...). Dois desses sítios foram datados
(Cargão II e III) e apresentaram datas por volta de 600 a 500 anos.
Segundo Marcelo Fagundes, através de um levantamento das fichas
CNSA no IPHAN/MG, a região do Triângulo Mineiro apresenta uma
quantidade expressiva de sítios arqueológicos totalizando cerca de 100
sítios cadastrados, porém conforme o arqueólogo afirma esse número é
muito maior chegando a 146 sítios conhecidos e estudados

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
12
regionalmente (FAGUNDES, 2011). (Grifo nosso). (RASTEIRO, 2015,
p. 62).

Ao proceder tal comparação, as evidências da existência de um território patrimonial,


compondo um amplo sítio histórico-arqueológico, de caráter e valor patrimonial, testemunho
do contexto e da memória histórica da ocupação pretérita desta região, são inequívocas.
As pesquisas e os salvamentos arqueológicos realizados na região e referentes à UHE de
Nova Ponte envolveram os municípios de Nova Ponte, Sacramento, Pedrinópolis, Santa
Juliana, Perdizes, Iraí de Minas, Patrocínio e Serra do Salitre, municípios estes considerados
sua área de impacto ambiental, foram executados em diferentes etapas ao longo das décadas
de 1980 e 1990. Como resultado deste trabalho de pesquida na área da UHE Nova Ponte
geraram,
(...) a formação de 180 coleções líticas, cerâmicas, metálicas etc.,
constituídas por 32.463 peças. Durante a curadoria e análise foram
rejeitadas outras 2.154 peças, representadas por pequenos fragmentos de
cerâmica erodida e seixos-rolados. Após a conclusão, o acervo reduziu-se a
30.309 peças (CEMIG/LEME, 1995) (Grifo nosso) (RODRIGUES; MANO;
FERREIRA FILHO, 2020, p. 93)

Já as pesquisas para a construção da UHE Miranda envolveram os municípios de


Uberlândia, Uberaba, Indianópolis e Nova Ponte, municípios estes, também considerados área
de impacto ambiental daquele empreendimento, e seu Programa de Salvamento Arqueológico
foi executado pelo Centro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas – CEPA/UFPR, ente 1995 a
1997.
(...) proporcionaram o registro de 194 evidências associadas a 44
ocupações humanas, dentre as quais 50 foram consideradas sítios
arqueológicos por apresentarem áreas definidas, estruturas e volume de
traços arqueológicos condizentes com implantações mais prolongadas. O
restante foi registrado como indícios resultantes das diversas atividades
periféricas desenvolvidas pelas populações pretéritas. (...) Foram
manuseadas 52.239 peças oriundas de campo. Após a curadoria, o acervo
reduziu-se a 48.395 peças (CEMIG/IESA, 2001). (Grifo nosso)
(RODRIGUES; MANO; FERREIRA FILHO, 2020, p. 94)

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
13
Imagem 2: Mapa da região apresentando o contexto das áreas
de influências das UHEs Nova Ponte e Miranda, com destaque
para os municípios afetados pelos empreendimentos.

Fonte: RODRIGUES; MANO; FERREIRA FILHO, 2020, p.


93.

Entre tantos outros sítios, para a finalidade das reflexões que temos tentado
desenvolver, interessa-nos, particularmente, o Sítio arqueológico-histórico MG 81 – Registro
do Rio das Velhas, no município de Indianópolis. Dentre outras possibilidades, este sítio
revela a intensidade da ocupação humana ceramista na região.
Na área do sítio maior (MG 81), havia quatro estruturas habitacionais e
uma de combustão, provavelmente ligada à queima de recipientes
cerâmicos. No sítio MG 36, com área de 1.231,50 m2, não foi possível a
delimitação do espaço ocupado pela casa, cuja base situava-se no extremo
sul. (Grifo nosso) (CEMIG-IESA, 2001, p. 402).

Evidencia-se, assim, dois importantes contextos de ocupação humana pretérita da


região, pré-coloniais e coloniais, o que se comprova pela farta presença de artefatos lito-
cerâmico nos sítios registrados.
Ele [o sítio MG 81] estava situado na margem direita do rio Araguari, numa
área de 1.884 m2, com declividade bem suave, contendo dois horizontes de

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
14
ocupações humanas: uma mais antiga e pré-colonial com a presença de
vestígios líticos e uma mais recente, do período colonial. No contexto da
ocupação colonial, “raros fragmentos de telhas goivas foram encontradas
na superfície do solo” (CEMIG/IESA, 2001, p. 340). Com o avanço das
escavações, a investigação do terreno evidenciou a “função espacial do
sítio”, e apresentou “quatro estruturas habitacionais, três delas alinhadas
em sentido leste-oeste e, uma, um pouco deslocada para o sul. Ao norte foi
registrada uma estrutura caracterizada por uma laje de argila queimada,
provavelmente ligada à produção de cerâmica” (CEMIG/IESA, 2001, p.
341).

Embora ainda esteja por se realizar estudos e pesquisas mais abrangentes, a imagem
abaixo, registra uma área de habitação, denotando, o que se caracterizou na arqueologia, como
pertencente a contexto colonial.

Imagem 3: Planta da escavação do sítio MG 81: Registro do Rio das


Velhas identificando às estruturas habitacionais a partir das hachuras
(CEMIG/IESA, 2001, p. 341).

Fonte: RODRIGUES; MANO. FERREIRA FILHO, 2020, p. 97.

Outro trecho do referido Relatório de Salvamento arqueológico traz a possível datação


destas ocupações, pois define que “a tipologia da cerâmica manufaturada e da louça

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
15
industrializada, inclusive da cerâmica vidrada, que compreende majólicas, aponta para o
período compreendido entre o final do século XVIII e meados do século XIX”
(CEMIG/IESA, 2001, p. 404).
A presença de um número expressivo de sítios arqueológicos, compondo um importante
conjunto artefatual lito-cerâmico, metálico e vítrico, denotando a presença das tradições
arqueológicas Aratu-Sapucaí, Tupiguarani, bem como associada a evidências do período
colonial, faz com que esta área seja estratégica, não só para a região do Triângulo Mineiro e
Alto Paraíba, mas também para a arqueologia brasileira como um todo.
E, por fim, como já dito, para a região em tela, especificamente para os municípios em
evidência neste artigo, o cotejamento entre as fontes coloniais e arqueológicas nos possibilita
vislumbrar um contexto de produção de um estenso território patrimonial, sítio histórico-
arqueológico, de caráter e valor patrimonial, testemunho do contexto e da memória histórica
da ocupação pré-colonial e colonial da região do atual Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba –
MG.

Referências bibliográficas

ALVES, Daniella Santos. Do alto do Espia: gentios, calhambolas e vadios no sertão do


Campo Grande – Séc. XVIII. 2017. 173 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) –
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade Fedral de Uberlândia – UFU.
Uberlândia, 2017. DOI: http://doi.org/10.14393/ufu.di.2017.308. Disponível em:
https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/19061. Acesso em: 15 out. 2021.
ASNIS, Gabriel Z. P. Da guerra à paz? Dicotomias que escondem múltiplos caminhos:
análise histórica dos Cayapó aldeados em Maria I e São José de Mossâmedes. Dissertação
(Mestrado em Ciências Sociais). Instituto de Ciências Sociais – Universidade Federal de
Uberlândia, Uberlândia, 2019.
FERREIRA FILHO, Aurelino J. (org.). Índios no Triângulo Mineiro: história, arqueologia,
fontes e patrimônio – pesquisas e perspectivas. Uberlândia: Edufu, 2015.
LOURENÇO, L. A. B. Os índios da Farinha Podre. In: A oeste das minas: escravos, índios e
homens livres numa fronteira oitocentista Triângulo Mineiro (1750-1861). Uberlândia: Edufu,
2005, p. 41-93.
MANO, Marcel. Metáforas históricas e realidades etnográficas: a construção de uma história
do contato Kayapó no Triângulo Mineiro. Cadernos de Pesquisa do CDHIS, Uberlândia, v.
23, n. 2, 2010, p. 325-348. DOI: https://doi.org/10.14393/cdhis.v23i2.7661. Disponível em:

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
16
https://seer.ufu.br/index.php/cdhis/article/view/7661
MANO, Marcel. Índios e negros nos sertões das minas: contatos e identidades. Varia
História, v. 31, 2015, p. 511-546. DOI: https://doi.org/10.1590/0104-87752015000200009.
Disponível em:
https://www.scielo.br/j/vh/a/qSYHLwC9TXy8BQW5BVjNfLz/abstract/?lang=pt
MANO, Marcel. Guerras e saques: apropriações e incorporações diferenciais das alteridades
entre os Jê – ‘Cayapó’ meridionais. Revista de Antropologia, v. 63 n. 3, 2020, e178850. DOI:
https://doi.org/10.11606/1678-9857.ra.2020.178850. Disponível em:
https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/178850
MANO, M.; ALVES, D. S. Nos bastidores da história: o contato entre índios e negros no
século XVIII. Cadernos de Pesquisa do CDHIS, Uberlândia, v. 28, 2015, p. 217-235. DOI:
https://doi.org/10.14393/cdhis.v28i1.32637. Disponível em:
https://seer.ufu.br/index.php/cdhis/article/view/32637
MAZZA, Tayná B. M. Da cultura material à vida: urnas mortuárias e dinâmicas de contato
no Planalto Meridional Brasileiro – Séc. XVIII e XIX. 2020. 185 f. Dissertação (Mestrado em
Ciências Sociais). Instituto de Ciências Sociais, Universidade Federal de Uberlândia,
Uberlândia, 2020. DOI: http://doi.org/10.14393/ufu.di.2020.457. Disponível em:
https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/30390
MORI, Robert. Os aldeamentos indígenas no Caminho dos Goiases: guerra e etnogênese no
sertão do Gentio Cayapó (Sertão da Farinha Podre) séculos XVIII e XIX. Dissertação
(Mestrado em Ciências Sociais), Instituto de Ciências Sociais, Universidade Federal de
Uberlândia, Uberlândia, 2015.
WICHERS, Camila A. de Moraes. Dois enquadramentos, um mesmo problema: os desafios
da relação entre museus, sociedade e patrimônio arqueológico. Revista de Arqueologia, São
Paulo, v. 26, n. 2, nov. 2014, p. 16-39. DOI: https://doi.org/10.24885/sab.v26i2.380.
Disponível em: https://revista.sabnet.org/index.php/sab/article/view/380
RASTEIRO, Renan Pezzi. Arquelogia dos Jê da bacia do rio Grande: história indígena no
norte de São Paulo e Triângulo Mineiro. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-
Graduação em Arqueologia do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São
Paulo – USP. São Paulo, 2015. DOI: 10.11606/D.71.2016.tde-11022016-161017. Disponível em:
https://teses.usp.br/teses/disponiveis/71/71131/tde-11022016-161017/pt-br.php
CEMIG-LEME. Relatórios do Programa de Salvamento Arqueológico – Atividade do Museu
de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais – Relatório Final – Estudos
Ambiental, produzido em 1995 e do Projeto Executivo do Programa de Salvamento
Arqueológico da UHE Miranda – Atividades do Centro de Estudos e Pesquisas
Arqueológicas da Universidade Federal do Paraná, 2001.
RODRIGUES, Álvaro Almeida. Contato e guerra: etnohistória de um gentio Cayapó. 2013.
112 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Programa de Pó-Graduação em Ciências
Sociais, Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Uberlândia, 2013. Disponível em:
https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/12903

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
17
RODRIGUES, Robson; MANO, Marcel; FERREIRA FILHO, Aurelino. Acervos
arqueológicos musealizados e gestão no MAnA-UFU. Revista de Arqueologia, São Paulo,
v. 34, n. 1, 2021, p. 89-109. DOI: https://doi.org/10.24885/sab.v34i1.849. Disponível em:
https://revista.sabnet.org/index.php/sab/article/view/849
RODRIGUES, Robson. Uberaba pré-colonial: cenários arqueológicos – olhando o passado
com os “óculos” da Arqueologia. In: Uberaba 200 anos no Coração do Brasil. CASANOVA,
Marta Zednik de (Org.). Superintendência do Arquivo Público de Uberaba “Hildebrando de
Araújo Pontes”. Uberaba, MG. 2020. Disponível em:
https://app.codiub.com.br/drive_root/arquivopublico/Uberaba200AnosNoCoracaodoBrasil/fil
es/basic-html/page99.html
RODRIGUES, Robson. Dando significado às coisas: por uma Arqueologia antropológica nos
estudos interpretativos da tecnologia indígena numa perspectiva interdisciplinar e regional.
Crítica e Sociedade: Revista de Cultura Política, v. 7, n. 1, 2017, p. 5-27. DOI:
https://doi.org/10.14393/RCS-v7n1-2017-39253. Disponível em:
https://seer.ufu.br/index.php/criticasociedade/article/view/39253

Anais da VIII Semana de História do Pontal e VII Encontro de Ensino de História  27 a 30 de setembro de 2021  ISSN 2179-5665
Universidade Federal de Uberlândia  Curso de Graduação em História Campus Pontal Ituiutaba-MG
18

Você também pode gostar