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ENSINO HÍBRIDO

O QUE É
CONCEITO

Se fôssemos tentar descrever uma sala de aula de ensino fundamental típica


no Brasil, ela seria em uma escola pública e urbana, com aulas por 4,5 horas
por dia e teria por volta de 25 alunos em cada classe.

Se a turma fosse de quinto ano, duas ou três dessas crianças seriam daquelas
que sabem tudo de matemática e que pedem novos desafios porque já estão lá
na frente enquanto os colegas ainda estão absorvendo os conceitos mais
básicos. Oito ou nove delas, por outro lado, estariam entre as que têm tanta
dificuldade que precisam de uma atenção especial; neste grupo, é provável que
ao menos uma tivesse algum déficit de aprendizagem mais sério. Os 18 ou 19
restantes comporiam um grupo com conhecimentos de um nível que oscila
entre o mínimo necessário e o adequado.

Esses dados, retirados do Education at a Glance e de estatísticas do MEC


(Ministério da Educação) compiladas pelo QEdu, mostram que, mesmo na
configuração de sala de aula mais comum no país, o desafio de proporcionar
um ensino significativo para cada estudante é imenso. Numa classe com 25
alunos, os professores precisam lidar com 25 interesses, 25 talentos e 25
necessidades de aprendizagem diferentes.
“Cada aluno é único, com interesses e talentos próprios e responde de forma
única a estímulos de aprendizagem.”

Não por acaso, a personalização do ensino, ou o ensino personalizado, tem se


mostrado uma das tendências mais fortes da educação no Brasil e no mundo.

O termo se refere a uma série de estratégias pedagógicas voltadas a promover


o desenvolvimento dos estudantes de maneira individualizada, respeitando as
limitações e os talentos de cada um. Ele leva em consideração que os alunos
aprendem de formas e em ritmos diferentes, já que também são diversos seus
conhecimentos prévios, competências e interesses.

Education at a Glance, OCDE

Um Olhar para a Educação, em livre tradução, é uma publicação anual


produzida pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico) que traz indicadores educacionais de diferentes países. Entre os
dados apresentados no documento estão informações sobre escolarização,
organização das escolas, investimentos públicos no setor e acesso à
educação. No Brasil, o MEC apresenta alguns dos destaques mais importantes
para o país em português pelo site do Inep , órgão do ministério responsável
pelos dados educacionais brasileiros. Em inglês, é possível ter acesso a
informações detalhadas de todos os países que compõem o estudo
pela página da iniciativa no portal da OCDE.

QEdu

Ferramenta aberta e gratuita que reúne dados sobre a educação brasileira,


feita pela Meritt e pela Fundação Lemann. O portal contém filtros que permitem
encontrar informações sobre a qualidade do aprendizado em cada escola,
município, estado do Brasil ou mesmo dados gerais do país. Na situação
descrita acima, a pesquisa feita foi da proficiência dos alunos de 5º ano em
matemática a partir dos resultados da Prova Brasil 2011. Além disso, o QEdu
também organiza informações do Censo Escolar, facilitando consultas sobre
número de matrículas, infraestrutura das escolas, perfil de alunos e professores
da educação básica brasileira.

50 mi
de alunos estão na educação básica no Brasil
83%
Estão matriculados na rede pública
12%
Sabem no 9º ano o que deveriam de matemática
22%
Sabem no 9º ano o que deveriam de português

Influências

Mas a ideia de proporcionar um ensino mais relacionado às necessidades e


expectativas dos estudantes não é algo novo. De acordo com Lilian Bacich,
pedagoga que estuda ensino híbrido em seu doutorado na USP, alguns dos
educadores que mais influenciaram as salas de aula brasileiras já traziam
a preocupação de personalizar a educação, mesmo que usassem outros
termos para descrever o conceito.

O brasileiro Paulo Freire, afirma a especialista, é um deles. O patrono da


educação brasileira, morto em 1997, defendia que o aprendizado acontece de
verdade quando o aluno é levado a compreender o que ocorre ao seu redor, a
fazer suas próprias conexões e a construir um conhecimento que faça sentido
para a sua vida. “Freire falava em aproximar o objeto de estudo à realidade do
aluno. Isso também é personalização”, afirma Bacich.
Segundo Mitchel Resnick, professor do MIT (Massachusetts Institute of
Technology) e um dos expoentes no estudo do uso da criatividade no
aprendizado, uma das grandes contribuições do brasileiro foi mostrar que saber
ler é importante por ser uma habilidade útil na rotina de qualquer ser humano,
mas é ainda mais crucial porque faz com que os educandos se tornem
autônomos — palavras muito caras aos que defendem a personalização do
ensino. “Freire entendeu que aprender a escrever era importante não só por
questões práticas, mas para se sentir um participante ativo da sociedade”,
afirmou.

Um exemplo de rede de escolas que assumidamente se baseia nos


ensinamentos de Paulo Freire para proporcionar um ensino voltado às
necessidades de cada aluno é a High Tech High. Localizadas na Califórnia,
essas 11 escolas, que são públicas de administração privada, apostam em
quatro pilares pedagógicos: personalização, conexão com o mundo real,
interesse comum em aprender e professor como designer do aprendizado. Lá,
cada aluno tem a mentoria de um adulto para descobrir seus interesses,
talentos e assim buscar autonomamente um aprendizado adequado às suas
necessidades. Todos os dias os estudantes definem um cronograma de
atividades, com o qual se comprometem, e determinam onde querem chegar.
Entre as possibilidades de aprendizagem que têm ao longo do dia estão
projetos em grupo, momentos de reflexão individual, com e sem tecnologia, e
aulas tradicionais.

Por falar em autonomia e mentoria, Bacich não fica apenas em Freire ao


apontar referências tradicionais. Ela relaciona também alguns dos preceitos da
personalização aos ensinamentos de outro educador importante para o Brasil,
o psicólogo bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934). Para a especialista, o
conceito desenvolvido por ele de zona de conhecimento proximal se enquadra
bem nessa discussão atual. “A zona de conhecimento proximal é aquilo que o
aluno pode fazer tendo o apoio necessário. Também é um olhar para cada um”,
afirma.

COMO FAZ
Para demonstrar como a personalização acontece na prática,
o Porvir pesquisou iniciativas que utilizam diferentes estratégias para promover
um ensino personalizado. Algumas dessas experiências estão centradas no
uso da tecnologia, outras pouco utilizam recursos digitais. Há aquelas que têm
como foco crianças e as que se voltam mais para os adolescentes. Parte delas
estão no Brasil, outras no exterior. Todas são gratuitas e acontecem em três
tipos de escolas: públicas convencionais, geridas via parceria público-privado
ou mantidas por investidores sociais.
Antes de conhecer as experiências, confira algumas características recorrentes
em todas elas:

Autonomia
As escolas que se propõem a oferecer um ensino mais personalizado colocam
o aluno no centro de sua proposta pedagógica e criam oportunidades para que
se torne o principal agente do seu aprendizado. Não por acaso, o
desenvolvimento de indivíduos autônomos é um valor importante para todas as
iniciativas visitadas. A autonomia é estimulada a partir de diferentes
estratégias. Em algumas escolas, os alunos elaboram seus planos individuais
de aprendizado, outras dão ao estudante a liberdade de fazer escolhas ao
longo de sua trajetória escolar.

Ambiente de aprendizagem
Para que os alunos tenham a possibilidade de aprender de diferentes
maneiras, as escolas têm reorganizado seu espaço físico. Na maior parte das
vezes, a opção é por mobiliário flexível, que permite diferentes arranjos,
capazes de abrigar atividades diversas (on-line, experimentações, debates e
até aulas expositivas), tanto realizadas individualmente, quanto em grupos. Há
escolas que aboliram as salas de aula tradicionais. A presença de dispositivos
móveis, como tablets e celulares, também ampliam a variedade de ambientes
em que aprender é possível.

Mentoria
O apoio individual oferecido por um adulto de referência é outra das estratégias
usadas para promoção do ensino personalizado. Normalmente, cada professor
tem um número máximo de alunos que acompanha em diferentes níveis: rotina
acadêmica, projeto de vida, dificuldades fora do âmbito escolar e articulação
com família. Em alguns casos, o mentor (tutor ou orientador) também é aquele
que ajuda o aluno a descobrir seus talentos e se conectar com pessoas de fora
da escola que podem apoiá-lo no desenvolvimento dessas habilidades. A
mentoria não tem como foco o acompanhamento psicológico, mas o apoio ao
estudante no alcance de metas e na superação de desafios.

Planos individuais de aprendizado


Muito relacionados ao desenvolvimento da autonomia, os planos individuais de
aprendizado são utilizados por algumas das escolas pesquisadas como
instrumentos pedagógicos desenvolvidos com ou sem o apoio da tecnologia,
mas sempre a partir do que o aluno precisa e deseja aprender. De maneira
analógica, costumam tomar a forma de roteiros de aprendizagem, definidos
periodicamente pelo aluno com a ajuda de um tutor. Com a tecnologia, são
elaborados com apoio de plataformas inteligentes, que entendem como cada
aluno aprende melhor e sugerem caminhos para que ele cumpra seus objetivos
educacionais.

Avaliação individualizada e de processo


As escolas investigadas também utilizam formas mais personalizadas de
avaliação. Uma vez que cada aluno segue seu próprio percurso pedagógico,
respeitando ritmo, características e interesses distintos, as provas
padronizadas deixam de fazer sentido. Com isso, as avaliações passam a ser
feitas de forma contínua, com o intuito de acompanhar a evolução de cada
estudante e garantir que ele aprenda. Também observa o desenvolvimento de
competências que extrapolam o âmbito dos conteúdos formais, mas são
igualmente importantes para a formação integral dos estudantes. A tecnologia
tem permitido que algumas dessas avaliações aconteçam em tempo real,
gerando dados que orientam a ação imediata de professores e dos próprios
alunos para assegurar que a aprendizagem aconteça.

Aprendizado por projetos


As experimentações concretas ou atividades mão na massa têm sido
amplamente utilizadas pelas escolas mapeadas, com grande efeito sobre o
engajamento dos alunos. Geralmente, os projetos são interdisciplinares,
ajudam os alunos a compreender conceitos mais complexos ou abstratos e
permitem o desenvolvimento de uma série de outras competências, como
liderança, criatividade, capacidade de resolver problemas e trabalhar em grupo.
Em algumas escolas, eles são realizados por alunos de idades e séries
diferentes, o que amplia a integração e enriquece a troca. Muito
frequentemente, buscam resolver problemas da vida real, conferindo sentido ao
que se aprende.
Desenvolvimento integral
As escolas que promovem a educação personalizada têm um olhar integral
para o aluno, a fim de assegurar que os conteúdos e estratégias de
aprendizagem dialoguem com o perfil e o projeto de vida de cada um. Assim,
promovem atividades educativas que desenvolvem os estudantes em
diferentes dimensões (acadêmica, física, socioemocional, cultural).
“No ensino híbrido, o aluno aprende em parte virtualmente e tem controle sobre
tempo, lugar, modo e ritmo do estudo”

Tecnologia e Ensino híbrido


O uso mais intensivo e estratégico de recursos tecnológicos na educação
gerou uma nova abordagem pedagógica denominada de ensino híbrido, que
mescla atividades on-line e offline.

No artigo Ensino Híbrido: uma Inovação Disruptiva? — Uma introdução à teoria


dos híbridos, do Clayton Christensen Institute, organização internacional
dedicada ao estudo de inovações disruptivas, os autores trazem a seguinte
definição: “O ensino híbrido é um programa de educação formal no qual um
aluno aprende, pelo menos em parte, por meio do ensino on-line. O estudante
tem algum controle sobre pelo menos um dos seguintes elementos: tempo,
lugar, modo e/ou ritmo do estudo. A educação ocorre pelo menos em parte em
uma espaço físico supervisionado”.
Os especialistas dividem os tipos de ensino híbrido em quatro grandes
modelos: de rotação, flex, à la carte e virtual aprimorado.

O primeiro modelo, de rotação, é aquele que, dentro de um curso ou disciplina


(ex: matemática), os alunos se revezam entre atividades pré-determinadas,
sendo uma delas necessariamente virtual. Esse modelo apresenta quatro
subtipos: rotação por estações, laboratório rotacional, sala de aula invertida e
rotação individual.
Na rotação por estações, diferentes atividades são propostas durante uma
aula. A turma é dividida em subgrupos, que se revezam nas tarefas.
No laboratório rotacional, o rodízio ocorre entre a sala de aula e um
laboratório de informática. Duas das experiências que visitamos e que serão
detalhadas a seguir praticam esses dois modelos. A sala de aula invertida é
aquele modelo em que o aluno tem o primeiro contato com o conteúdo
virtualmente, fora da escola, e depois discute e tira dúvidas em aula. Já no
modelo de rotação individual, cada aluno tem um roteiro individualizado e não
participa necessariamente de todas as estações ou modalidades disponíveis.
O segundo modelo é o flex. Nele, certas disciplinas e cursos têm o ensino
on-line como sua espinha dorsal, mas os estudantes comparecem diariamente
à escola ou universidade, com uma agenda flexível a ser cumprida, de acordo
com os objetivos previamente estipulados. Aqui há um alto grau de
personalização, uma vez que estudantes têm roteiro individual de
aprendizagem e não são agrupados por séries. A arquitetura da sala de aula é
bem flexível.
O terceiro é o à la carte. Nesse modelo, os alunos fazem cursos inteiros de
maneira virtual. Têm um tutor on-line e, ao mesmo tempo, continuam a ter
experiências educacionais em escolas tradicionais. Os alunos podem participar
das aulas on-line tanto no campus físico como em outros lugares. Esse modelo
pode ser aplicado, por exemplo, em uma disciplina avançada de língua
estrangeira, em que o professor esteja disponível apenas virtualmente.
Já o quarto é o virtual aprimorado. Trata-se de um modelo que ocorre
basicamente on-line, em que encontros presenciais para acompanhamento
ocorrem de maneira agendada entre tutores e alunos. Nele raramente alunos e
professores se encontrarão todos os dias da semana.
Veja, a seguir, iniciativas que personalizam o ensino com os elementos acima
apresentados.

Âncora: a autonomia de duas


crianças ensopadas

Chovia como há muitos meses São


Paulo não via naquela cinzenta manhã
de junho. A abertura da Copa do Mundo
do Brasil seria em poucos dias, os
metroviários tinham decidido por entrar
em greve. O caos. Os quase 20 km que
a reportagem percorreu em pouco mais
de uma hora até chegar a Cotia, na
região metropolitana de São Paulo,
foram compensados pelas boas-vindas
efusivas de Kayo Pereira, 8, e Ana
Luíza dos Santos, 10. Eles estavam
ensopados.

"Não querem comprar uma rifa?",


perguntaram aos visitantes. "É para a
nossa festa junina". Anotaram os
nomes, explicaram o sorteio e a
premiação e entregaram um papelzinho.
Lá se foram R$ 5. No Âncora, escola
que atende de graça alunos de baixa
renda de fundamental 1 e 2 com uma
proposta pedagógica totalmente
diferente da tradicional, são os alunos
que fazem as coisas acontecerem: das
festas aos temas que cada um estuda, tudo vem deles. É deles, inclusive, a
responsabilidade de guiar os visitantes pela escola e apresentar o modelo
pedagógico. (Que fique claro: logo depois, em sala de aula, Kayo e Ana Luíza
reapareceram secos).

"Procuramos criar sentido para a aprendizagem. Aqui o conhecimento é


construído junto com os educandos, e não para eles. É por isso que o
aprendizado é significativo. As crianças dão ideias, sugerem e a gente vai
dando o apoio de que elas precisam", afirma Claudia Duarte, coordenadora
pedagógica da escola. Para tanto, continua a educadora, a assembleia, em
que todos os alunos discutem juntos as normas da escola, algumas
ferramentas pedagógicas e a forma como organizam o espaço são
fundamentais.

Fisicamente, a escola não se parece nada com escolas tradicionais. A começar


por uma lona de circo, que se vê de longe, mesmo antes de chegar ali. Debaixo
dela, crianças pulam na cama elástica, se exercitam e estudam. O mesmo
ocorre na pista de skate, na quadra, nas áreas verdes ao ar livre -- quando não
chove --, no refeitório ou em qualquer outro lugar da instituição.

Qualquer mesmo. Por lá, tutores e educandos gostam de dizer que o


aprendizado pode acontecer em qualquer espaço, e não apenas nas salas de
aula -- que, por sinal, também não são nada comuns. Elas não têm carteiras
enfileiradas e um professor na frente, ditando o que cada um precisa aprender.
São salões com mesas que se juntam ou se separam, conforme o jeito que
cada um escolheu estudar naquele dia, se sozinho, em dupla ou em grupo.
Tutores ficam disponíveis para ajudar a sanar dúvidas.

As atividades são definidas por cada aluno com seu tutor e anotadas
em roteiros de estudo individuais, uma das ferramentas pedagógicas que o
Âncora usa para estimular a autonomia e o autoconhecimento dos alunos.
Funciona assim: os alunos descobrem interesses específicos, procuram seus
tutores e, juntos, constroem uma tabela com objetivos de aprendizagem para
um determinado período. Nesse percurso, os alunos estudam conteúdos das
mais diversas disciplinas. Se as crianças se interessarem em conhecer
assuntos mais profundamente, os tutores estão ali para ajudar. No fim, os
alunos têm que desenvolver um projeto a partir do assunto pelo qual se
interessaram.
Naquele dia, por causa da chuva, a maior parte dos alunos estava estudando
nos salões. Mas Ana Carolina Sá, 10, não. Ela estava sob a lona do circo, com
sua tabela periódica e notebook em mãos, estudando como construir um
laboratório de química na escola. Uma prima mais velha havia mostrado para
ela um material da disciplina, ela se interessou e pediu para a tutora incluir
química em seu roteiro. "Eu agora estou pesquisando como montar um
laboratório, que equipamentos eu preciso, essas coisas. Para isso, eu preciso
estudar sobre química. Assim, eu consigo ensinar os outros. Como é que eu
vou ensinar, se eu mesma não souber?", pergunta a menina.
Espera aí. Química, Carol? Mas você só tem 10 anos. "Se eu estivesse em
outra escola, eu ainda não ia [estar estudando química] porque eu ainda ia
estar no quinto ano. Ainda ia ter que estudar um monte de coisas até chegar
em química. Mas já tô adiantada porque eu aprendo as coisas mais rápido.
Aqui, assim que eu termino de estudar um assunto, eu posso já passar para
outro e aí eu vou aprendendo mais."

"Conseguir que as crianças exerçam suas individualidades exige uma mudança


na prática do professor. É preciso ouvir muito mais do que falar"
Juliana Guidayes

Se quiser, Carol pode oferecer seus conhecimentos recém-adquiridos sobre


cádmio e hidrogênio no quadro Preciso de ajuda/Posso ajudar. Como cada
aluno tem projetos próprios, conhecimentos e sabe muito de assuntos
diferentes, o Âncora usa um quadro para estimular a troca de saberes entre
eles, em um espaço em que podem demonstrar fraquezas e exercer a
solidariedade sem nenhum tipo de julgamento. É o aprendizado entre pares,
que é incentivado em vários outros momentos da rotina da escola.

Os alunos são estimulados, por exemplo, a se reunir em grupo para resolver


um problema real. É o caso do grupo do lixo, que envolve várias crianças. No
fim de semana anterior, elas tinham conseguido que sete caminhões de lixo
fizessem uma coleta especial em uma comunidade dos arredores da escola
que não recebe esse serviço regularmente. Agora que o lugar está limpo, os
alunos estão estudando como ensinar aos moradores a dar um destino correto
aos detritos que produzem.

"A maior prova de que você aprendeu o suficiente de um assunto é quando


você ensina o outro. Além de ensinar, você ainda aprende mais"
Ana Carolina Sáyes
Provas, eles (quase) não fazem. Mas não significa que não sejam avaliados a
todo momento. Uma lista com todos os conteúdos que as crianças precisam
dominar ao longo dos anos, de acordo com os Parâmetros Curriculares
Nacionais, fica afixada na parede dos salões. Os tutores registram tanto o
domínio dos conteúdos demonstrado no desenrolar dos projetos, quanto o
desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Todos os alunos têm
registros individuais atualizados diariamente.

"Aqui não se olha uma classe; se olham crianças, se olham pessoas,


individualmente. Isso foi o me fascinou e me estimulou a vir para cá. Eu vi esse
respeito pela história de cada um, pelo momento em que cada um está e
fiquei", diz Juliana Guida, tutora do Âncora e filósofa por formação.

É assim, com forte envolvimento entre as pessoas, com o incentivo à


autonomia dos estudantes, com o desenvolvimento de atividades relacionadas
aos interesses e com o estabelecimento de metas e avaliação constante, que o
Âncora personaliza o ensino. Ao longo da visita, alunos e educadores repetiam:
"Pena que hoje está chovendo tanto. Não dá para ver a escola funcionando
direito". Mal sabiam eles o tanto que deu para ver.

SUA VEZ

Até aqui, este material apresentou o conceito de personalização, mostrou como


ele se apresentou ao longo do tempo, chamou a atenção para a necessidade
de se repensar o ensino e relatou exemplos de iniciativas que, de alguma
maneira, trazem um olhar individualizado para cada estudante. Então,
especialmente para os educadores, chega o próximo passo – ou a angústia
imediata: “Achei tudo isso muito legal, mas não sei por onde começar”.

Também já foi mencionado que uma das maneiras de se personalizar o ensino


é através do uso da tecnologia. Para ajudar professores a inovar e aplicar
técnicas de ensino híbrido, a Fundação Lemann e o Instituto Península
coordenam, desde abril de 2014, um grupo de 17 professores que têm se
reunido para aprender as bases da metodologia, aplicar em suas salas de aula
e compartilhar experiências com colegas e tutores.

O conteúdo dessas discussões poderá ser conferido nos links das


engrenagens abaixo. Em cada um dos elementos, é proposto um desafio para
o educador e sugerido um passo a passo para a implantação da abordagem
em sala de aula.

O material foi desenvolvido pela Fundação Lemann e pelo Instituto Península,


com o grupo de experimentação e o apoio dos educadores Adolfo Tanzi, Lilian
Bacich e Fernando Trevisani. Longe de ser um conteúdo definitivo, tem o
objetivo de iniciar um debate. Clique nas peças para ter acesso ao material
completo e use a caixa de comentários para compartilhar suas experiências.

PAPEL DO PROFESSOR

POR QUE
A postura do professor em uma aula híbrida e personalizada não é a mesma
que em uma aula tradicional. Aqui, quem deve estar no centro do processo de
ensino-aprendizagem é o aluno, não o professor, que deve incentivar e propor
atividades que valorizem as interações interpessoais. Para tanto, alguns papéis
enraizados na cultura escolar precisam ser revistos. Outros papéis, por sua
vez, precisam ser mantidos.

Veja, a seguir, o módulo sobre o novo papel do professor em sala de aula do


curso sobre ensino híbrido promovido pela Silicon Schools Fund e pelo Instituto
Clayton Christensen (ative legendas em português).
EXEMPLOS
Repensando o papel do professor e as mudanças essenciais que ele
experimenta:

1. De palestrante para facilitador. As palestras seguem ocorrendo nessa nova


proposta, mas estão presentes principalmente nos momentos em que o
professor precisa orientar pequenos grupos sobre os conceitos ou atividades a
serem realizadas. Nos demais momentos, o papel do professor é facilitar a
realização das tarefas dos grupos, incentivando o protagonismo e a divisão de
tarefas dos estudantes nos grupos. Em alguns momentos, o professor pode
sanar dúvidas dos alunos, porém aconselha-se que isso seja feito após deixar
as interações entre os grupos ocorrerem.

2. De agrupamentos fixos para agrupamentos dinâmicos de estudantes. Ao


organizar a turma, o professor deve evitar os agrupamentos apenas por
habilidades, mas possibilitar que os alunos sintam-se à vontade para transitar
entre os grupos. Os grupos são organizados a partir de objetivos de
aprendizagem específicos e os estudantes podem migrar de um grupo para
outro. Uma forma de organizar os grupos ocorre a partir dos dados sobre os
estudantes que já foram levantados. O professor pode fazer uma tarefa coletiva
e, de acordo com as respostas, os estudantes apresentam os conceitos em
que têm mais dúvidas e migrarão para o grupo que precisam ir para aprimorar
esses conceitos. A análise de dados possibilita essa personalização.

3. De explicação para intervenção. Enquanto os alunos trabalham nos grupos,


o professor pode intervir com mais facilidade, dando uma atenção
individualizada.

4. De foco em conteúdo para foco em conteúdos, habilidades e postura


acadêmica. O professor pode analisar em seu programa quais são os
conteúdos que os estudantes necessitam, a postura para serem bons
aprendizes e as habilidades necessárias para terem sucesso.

5. De generalista para especialista. Fazer um rodízio entre professores para


que cada professor possa ensinar aquilo com que mais se identifica.

“Durante o desafio perceber que é totalmente possível deixar de ser orador e


passar a ser um professor com postura de facilitador…”

CARLA FERNANDA PIRES, professora de ciências

DESAFIO
Após refletir sobre as mudanças essenciais do papel do professor, o educador
deve escolher uma delas e procurar desenvolvê-la em sala.
PASSO A PASSO
1. Escolher uma das cinco mudanças descritas acima, de preferência aquela
que represente um desafio maior, e procurar implementá-la em uma aula no
modelo híbrido;

2. Garantir que, durante a elaboração e realização da aula, o foco de sua


análise esteja na mudança escolhida, mesmo que nesse processo outras
mudanças se evidenciem;

3. Dar um depoimento, em um vídeo de até 3 minutos, sobre essa aula.


Responder a questões como: como foi sua aula (breve descrição)? Qual
mudança de papel você exercitou? O que funcionou? O que não funcionou?
Qual foi o maior desafio?

4. Compartilhar o link de seu vídeo para que outros professores possam


aprender com sua experiência.
Veja vídeo em que um educador compartilha a sua experiência.

https://www.youtube.com/watch?v=ecOg_OumGlk&index=3&list=PLiRvxKpahS16WkQHN6GjBzF-3TWpH
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SUGESTÕES
- Procurar interagir com professores da escola, sugerindo ou ampliando
discussões sobre essas questões: o que o professor deve deixar para trás em
um modelo de ensino híbrido e personalizado? O que ele deve manter?

- Organizar grupos de estudantes de acordo com as habilidades de cada um e


dividir os papéis deles no grupo. Para isso, verificar com os alunos qual o
trabalho a ser realizado no grupo e qual a atuação de cada um para alcançar o
objetivo final;

- Selecionar um dos grupos em cada aula e trabalhar de forma mais próxima


com esse grupo, atuando como facilitador e intervindo para esclarecer as
eventuais dificuldades desses estudantes.

“Foi muito interessante buscar um desafio próprio para superar. Refletir sobre
minhas próprias práticas e tentar me desafiar a mudar.”

GRAZIELLA MATARAZZO, professora de tecnologia educacional

REFERÊNCIAS
O papel do professor. Proposta de registro de aprendizados ao longo do
desafio.
CULTURA ESCOLAR

POR QUE

Sabemos o quanto a nossa cultura escolar está influenciada pela maneira com
que professores, alunos e familiares pensam a escola e o quanto o modelo
tradicional de ensino foi considerado, durante muito tempo, a única forma de
possibilitar a aprendizagem de conceitos. Hoje, também sabemos que várias
são as formas possíveis de inovar. Para que isso ocorra, acima de tudo, os
professores, o coordenador pedagógico e o diretor devem estar profundamente
envolvidos no processo.

Veja vídeo em que professor fala sobre a evolução no envolvimento da


comunidade.

https://www.youtube.com/watch?v=0pBqkQcX1XY&index=6&list=PLiRvxKpahS16WkQHN6GjBzF-3TWpH
yfkY

“Foi muito interessante perceber a reação dos professores, seja de interesse


seja de desconforto. É nítido que eles também percebem as carências da sala
de aula e sentem que há espaço para melhorias.” ERIC RODRIGUES,
professor de história

EXEMPLO

Para que uma nova cultura escolar seja criada, as ideias não devem ser
impostas às escolas, mas criadas por elas. Os erros devem ser vistos como
parte do processo. O que não da certo serve como reflexão e aprendizado. É
necessário tentar para inovar. É necessário arriscar!

DESAFIO

Para mudar, é preciso fazer um reflexão sobre como está configurada a cultura
na sua escola e os impactos do uso da abordagem do ensino híbrido. A
intenção é construir um ambiente propício para a inovação em sala de aula a
partir de uma sensibilização coletiva para a importância do tema.

PASSO A PASSO

1. Conversar com cinco professores sobre o modelo de ensino híbrido. Dividir


suas impressões sobre o que realizou até o momento.
2. Levantar, com esse grupo de professores, as dúvidas deles sobre o modelo.
3. Anotar as dúvidas que, em sua opinião, são mais representativas: quais
foram os aspectos que mais inquietaram os professores? Como você avalia as
concepções desses professores em relação ao modelo de ensinar?
4. Refletir sobre o que foi estudado e aplicado até o momento e anotar dúvidas
sobre o modelo de ensino híbrido. O que você perguntaria para um professor
que já utiliza essas propostas há mais tempo do que você?
5. Verificar se alguns dos questionamentos estão no documento de dúvidas
frequentes abaixo, e também aproveitar o espaço abaixo do fórum para discutir
com outras pessoas.

SUGESTÕES

- Realizar esse desafio depois que o professor já tiver tido algumas


experiências com aulas no modelo híbrido ou já tenha evoluído em algum dos
outros desafios propostos.

- Procurar analisar os questionamentos levantados por seus colegas e


elaborar outros desafios que poderiam ser importantes para ajudar na
disseminação dessa abordagem.

- Verificar a possibilidade de algum colega aplicar um dos planos de aula que


você elaborou em seu percurso. Ao término da proposta, conversar com o
professor sobre suas impressões quanto ao trabalho realizado. Se for possível,
acompanhar a aplicação da atividade, auxiliando o colega durante a aula.

“Conversamos com outros professores a respeito das atividades que


realizamos e conhecemos as impressões e dúvidas que surgiram, bem como
críticas que nos levaram a melhorar nossas abordagens e métodos de ensino”.
ALEXSANDRO SUNAGA, professor de matemática.

REFERÊNCIAS

Contagiando outros professores. Perguntas frequentes sobre ensino híbrido.

Ensino híbrido é o único jeito de transformar a educação. Matéria do Porvir que


traz entrevista com Michael Horn, especialista em inovações disruptivas.

ESPAÇO
POR QUE
A maneira como o educador organiza o espaço da sala de aula pode –
ou não – promover a interação dos alunos e influenciar os papéis de
todos os envolvidos no processo de aprendizagem. Salas de aula com
carteiras enfileiradas indicam uma proposta de aula diferente do que a
que possui carteiras organizadas em semicírculo e, da mesma maneira,
é possível alcançar objetivos pedagógicos diferentes a partir de um uso
inteligente das possibilidades que o ambiente proporciona.

Por isso, o educador deve considerar que há momentos em que o


estudante pode aprender melhor em grupos grandes; há outros em que
será mais adequado optar por dividir a classe em grupos menores; há
também situações em que o aluno vai refletir melhor se estiver sozinho;
e há momentos em que, na mesma turma, mais de uma dessas
possíveis configurações pode ser adotada.

Veja vídeo que mostra uma aula em rotação.


https://youtu.be/QKghZNGL3eM

EXEMPLO

Uma das possibilidades de organização da sala de aula é conhecida por


rotação por estações. Nesse formato, os alunos fazem um rodízio por
diferentes estações, cada uma com uma meta pedagógica e tarefas específicas
dentro de um mesmo plano de aula, sendo pelo menos uma com atividades
on-line. As demais podem ser tarefas escritas em papel, pequenos projetos,
instrução individualizada. O vídeo a seguir detalha o modelo (ative legendas
em português).

DESAFIO

Para começar a experimentar o ensino híbrido, é preciso mudar a configuração


do ambiente e, a princípio, o uso das tecnologias digitais não é obrigatório.
Assim que o professor ficar mais confortável com o uso de novas organizações
do ambiente, as tecnologias digitais podem ser inseridas, gradativamente, nas
estações.

PASSO A PASSO

1. Selecionar uma aula de 45 a 90 minutos;

2. Planejar uma atividade em que a turma trabalhe em equipes e que cada


grupo tenha um objetivo diferente de aprendizagem;

3. Promover uma rotação desses grupos pelas atividades planejadas;

4. Garantir que as atividades aconteçam simultaneamente;

5. Determinar regras e tempo para que os grupos percorram as estações.

Não é necessário fazer uso de tecnologias digitais nesse momento. O objetivo


desse desafio é promover a mudança da organização da sala de aula.
SUGESTÕES

- Agendar um dia ou uma aula por semana para realizar a proposta de rotação
por estações para que, gradativamente, os estudantes fiquem mais autônomos
nessa proposta;- Selecionar um aluno monitor para uma das estações. Essa
função é assumida de forma alternada pelos alunos e as funções do monitor
devem ser escolhidas pelo group em comum acordo com o professor;

- Registrar os resultados da aula por meio de um relatório e de fotos (ou vídeo)


que mostrem momentos significativos da atividade;

- Compartilhar os resultados;

- Refletir: o que funcionou? O que não funcionou? Qual foi o maior desafio?

“Foi uma maneira diferente de ensinar. Já identifiquei pontos fortes e áreas de


melhoria em cada uma das estações. As experiências compartilhadas
encorajaram os colegas.”

FERNANDO TREVISANI, professor de matemática

“Uma estação livre poderia ajudar a ocupar os alunos que terminam as


atividades muito rápido.”

FLAVIA MOURA, professora de matemática

REFERÊNCIAS

Plano_de aula_estações. Proposta de planejamento de uma aula com


estações.

AVALIAÇÃO
POR QUE
A palavra avaliação não é das mais queridas entre os alunos, que veem nela
quase uma forma de castigo. Em um ambiente de ensino híbrido e
personalizado, porém, a proposta é que a avaliação seja ressignificada. Ela
passa a expressar a existência de mais instrumentos no auxílio ao
desenvolvimento do aluno. Da mesma maneira, a avaliação deixa de ocorrer
em um ponto no fim do percurso e passa a ocorrer ao longo do processo. Seus
resultados deixam de ter caráter punitivo e passam a prestar informações que
ajudam o educador a intervir na trajetória de aprendizagem do aluno para que
ele tenha mais sucesso. Aqui entram em cena os dados educacionais.

Veja vídeo em que professora fala sobre o papel da avaliação no ensino


híbrido.
https://www.youtube.com/watch?v=0BGqinDO7bw&index=5&list=PLiRvxKpahS
16WkQHN6GjBzF-3TWpHyfkY

EXEMPLO
Quando pensamos em personalização do ensino, é importante conhecer direito
cada aluno. Neste ponto, a tecnologia tem ajudado muito, uma vez que ela é
capaz de registrar informações sobre o desempenho de cada estudante.
Assim, uma das possibilidades de se usar dados em prol da educação começa
com o uso de recursos tecnológicos para identificar o que os estudantes já
sabem sobre um determinado assunto.

Além disso, ferramentas digitais podem ser usadas para traçar um perfil de
comportamento do aluno e ajudar a delinear de que forma cada um aprende
melhor o conteúdo. Essas informações poderão ser usadas pelos educadores
para ajudar os estudantes a organizar roteiros de objetivos a serem cumpridos
individualmente e de forma personalizada. A análise desses dados, portanto,
passa a ser uma habilidade requerida de educadores.

DESAFIO
Para desenvolver a habilidade de analisar a experiência do aluno a partir de
dados, educadores devem se reunir para interpretar dados dos desempenhos
dos estudantes em relação a um determinado objetivo. A intenção é usar essas
informações para personalizar o ensino.

“Refletir sobre a prática de outro colega me fez pensar sobre aspectos na


minha própria [prática] que eu estava deixando de lado.” CARLA FERNANDA
PIRES, professora de ciências

PASSO A PASSO
1. Estabelecer, com os alunos, metas de aprendizagem e registrar dados sobre
o seu percurso pedagógico.
2. Refletir individualmente sobre as informações que os números trazem.

3. Discutir os dados, se for o caso, com outros professores dessa mesma


turma. Analisar os critérios dos colegas e buscar soluções para personalizar o
ensino do grupo.

4. Programar a próxima aula de acordo com a análise dos dados da aula


anterior, buscando formas de personalizar o ensino.

“Poder acompanhar o desempenho dos alunos constantemente é muito mais


produtivo do que aguardar o resultado de avaliações mensais, quando a ação
do professor pode não ser mais tão efetiva.” ADOLFO TANZI, professor de
inglês

SUGESTÕES
- Compartilhar as soluções encontradas no passo 3 e 4 com colegas e
aperfeiçoá-las.

- Elaborar uma lista de objetivos a serem alcançados em uma determinada


atividade e, após avaliar individualmente os alunos em relação a cada um dos
objetivos sugeridos, conversar com cada um e dar um retorno, também
individual, sobre seu desempenho.

- Identificar, com os estudantes, a forma com que aprendem melhor um


determinado conteúdo. Para isso, selecionar um objetivo de ensino e, em uma
mesma aula, disponibilizar espaços em que aquele conteúdo é apresentado
por meio de um recurso diferente: leitura de um texto, jogo on-line, vídeo,
simulação, entre outras possibilidades. Solicitar que os alunos optem pelo
recurso que preferem e avaliar os resultados dessa aula ao final dela.

“Observar os dados e refletir sobre a melhor forma de personalizar o ensino foi


um dos pontos mais interessantes, e onde tive maior dificuldade.”FERNANDO
TREVISANI, professor de matemática

REFERÊNCIAS
Diferenciar, individualizar, personalizar o ensino, matéria do Porvir que
apresenta diferentes conceitos segundo a definição da especialista Barbara
Bray.
AUTONOMIA DO ALUNO

POR QUE

Uma das vantagens do uso de estratégias de personalização e de ensino


híbrido está no engajamento dos alunos. Para eles, esses momentos de
experimentação também são um aprendizado com um novo modelo. Por ser
algo novo para educadores e educandos, é normal que a adaptação dos
estudantes e do professor aconteça de forma gradativa, assim como será
gradativa a apropriação dos elementos envolvidos em um modelo eficiente de
ensino híbrido.

Veja, a seguir, o módulo sobre os elementos-chave da experiência do aluno do


curso sobre ensino híbrido promovido pela Silicon Schools Fund e pelo instituto
Clayton Christensen (ative legendas em português).

“Achei muito interessante a possibilidade de avaliarmos os alunos em


diferentes aspectos. Gostei da planilha de avaliação dos alunos. Isso pode
melhorar muito nossas aulas e nossos resultados.”

Fernanda Schneider, professora de inglês e português do Ensino Médio

EXEMPLOS

Os quatro pilares para oferecer ao aluno uma experiência ideal em um modelo


de ensino híbrido são:

1. Autonomia do aluno. Possibilitar que os alunos direcionem seu aprendizado


a partir do que é importante aprender. Autonomia é o maior objetivo da
educação.

2. Aprendizado personalizado. Cada aluno recebe o que precisa, no momento


em que precisa. Poder atender às necessidades diferentes é uma vantagem da
tecnologia.

3. Domínio gradativo do conhecimento. De acordo com os conhecimentos


prévios dos estudantes, é possível identificar de onde partir para que consigam
fazer com ajuda o que, em breve, conseguirão fazer sozinhos.
4. Relacionamentos produtivos. Consolidar a relação entre professor e aluno e
entre os alunos de maneira positiva é uma parte essencial do processo.

DESAFIO

O objetivo deste desafio é estudar sobre a experiência ideal para o aluno em


um modelo de ensino híbrido.

“Penso que neste conjunto o mais importante é ensinar o aluno sobre


protagonismo e como é importante que ele desenvolva essa autonomia nas
aulas.”

FLAVIA MOURA, professora de matemática do 7o ano do ensino fundamental

PASSO A PASSO

1. Planejar e aplicar um modelo de aula híbrida com o objetivo de proporcionar


momentos em que seja possível analisar as quatro grande ideias para a
experiência ideal do aluno em um modelo de ensino híbrido.

2. Elaborar uma forma de verificar se os alunos, individualmente, atingiram o


objetivo geral da aula realizada.

3. Criar uma tabela para relacionar os dados que você levantou.

4. Refletir sobre que pilares da experiência ideal foram colocados em prática


nessa aula.

SUGESTÕES

- Refletir de que forma os elementos-chave da experiência dos alunos


estiveram presentes nas aulas que você aplicou até o momento.

- Elaborar propostas para viabilizar uma experiência completa para seus alunos
em um modelo híbrido.

- Aplicar uma autoavaliação. Para tanto, elaborar um formulário para ser


respondido on-line que faça o aluno refletir, por exemplo, sobre as facilidades e
dificuldades encontradas na aula, dar sugestões para a próxima aula, entre
outras informações. Essa autoavaliação deverá ser respondida após a aula.
“Gostei de observar individualmente os alunos e poder proporcionar um
momento de aprendizagem personalizado, no qual os próprios alunos é que
buscavam os conteúdos para a construção do conhecimento e não
simplesmente eram ouvintes dos conteúdos que eu passaria.”

VERÔNICA CANNATÁ, professora de tecnologia educacional dos ensinos


fundamental e médio.

REFERÊNCIAS

Foco no estudante. Proposta de registro de aprendizados ao longo do desafio.

TECNOLOGIA
POR QUE
O elemento tecnologia, que tem sido fundamental na descoberta de novas
maneiras de ensinar, abre – e muito – o leque de possibilidades pedagógicas
para professores e alunos. Mas a tecnologia sozinha não faz milagre. Apenas
adicionar recursos em sala de aula, como adotar lousa digital ou tablets, não
quer dizer que o ensino esteja sendo transformado.

Os recursos tecnológicos devem ser adotados a partir de uma reflexão


profunda sobre o que se espera deles e, acima de tudo, devem estar
associados a momentos de aprendizagem cara a cara. Pela abordagem do
ensino híbrido, o aluno mescla oportunidades digitais e reais de aprendizado,
que formam um todo integrado.

Veja vídeo em que professores falam da mudança no uso de tecnologia após


experimentarem o ensino híbrido.
EXEMPLOS
De acordo com o curso sobre ensino híbrido da Silicon Schools Fund e do
Instituto Clayton Christensen, podemos classificar os recursos tecnológicos em:
1. Softwares ou plataformas em que é possível encontrar conteúdos de
diferentes disciplinas. Nesse caso, não há personalização do ensino;
2. Softwares suplementares, que podem ser utilizados para aprofundar,
treinar ou introduzir conceitos durante uma proposta de ensino híbrido,
garantindo algum nível de personalização;
3. Ferramentas para facilitar o trabalho dos professores com a turma;
4. Ferramentas para os alunos aprenderem itens específicos de um
planejamento pedagógico.
“Achei a troca de experiências entre professores muito rica e interessante. O
acesso a novas plataformas, que eu não conhecia, foi de extrema relevância…”

ALINE SOARES, professora de matemática

DESAFIO
Começar a usar a tecnologia em sala de aula pode ajudar os educadores a
oferecer um ensino mais personalizado. Os professores devem refletir sobre
como usar recursos tecnológicos em seu planejamento pedagógico e, para
isso, devem criar um repertório de diferentes recursos tecnológicos digitais.

PASSO A PASSO
1. Pesquisar e selecionar ferramentas tecnológicas (plataformas, softwares,
aplicativos etc.) que possam ser utilizadas em uma proposta de ensino híbrido
– integrando atividades presenciais e digitais;

2. Organizar as ferramentas selecionadas em uma tabela para facilitar seu uso


em aulas futuras. Compartilhar as descobertas;

3. Selecionar, planejar e aplicar uma aula pensando que sua turma deverá
utilizar um dos recursos tecnológicos que você pesquisou.

SUGESTÕES
- Selecionar o recurso tecnológico a partir do planejamento e dos objetivos
pedagógicos daquela aula. É importante não inverter a lógica e elaborar uma
aula para usar um recurso. Ele dever ser meio, e não fim.

- Selecionar prioritariamente recursos tecnológicos disponíveis em português;


se forem em outra língua, seu uso deve ser intuitivo;

- Planejar com antecedência o uso de equipamentos dentro das escolas;

- Selecionar dois recursos diferentes que tenham o mesmo objetivo. Por


exemplo, recursos tecnológicos voltados para trabalhar matemática. Utilizar em
aulas diferentes e comparar os resultados;

- Verificar o planejamento de um colega e, dos recursos selecionados, escolher


um deles para ensinar ao outro professor. Comparar a utilização do recurso
pela sua turma e pela turma dele e avaliar as vantagens de cada um dos
recursos.

“Foi muito interessante organizar todas as ferramentas, sites e plataformas.


Isso [compartilhar recursos ajuda] para que cada um tenha disponível e
também para futura divulgação.”
FERNANDA SCHNEIDER, professora de inglês e português
REFERÊNCIAS
Escola Digital. Site de busca de objetos digitais de aprendizagem de todas as
disciplinas.
Repertório tecnológico Lista de algumas tecnologias recomendadas pelos
professores do grupo.
O papel da tecnologia na sala de aula, de Marc Prensky. Artigo do autor que
cunhou os termos “nativo” e “imigrantes digitais” sobre o uso da tecnologia
como um suporte para oferecer um novo paradigma de ensino.
Edmodo. Plataforma que possibilita a criação de fóruns entre os estudantes e
professores, além de enquetes e disponibilização de conteúdos.
Khan Academy. Plataforma adaptativa para o ensino de matemática. O
professor recebe em tempo real o retorno sobre o que está sendo feito e onde
estão as dificuldades de cada aluno. Uso é gratuito e o conteúdo está
disponível em português.
Nearpod. Site gratuito em que professores podem criar conteúdo interativo e
atividades on-line, compartilhá-las com alunos, avaliar o tempo e o
desempenho deles na ferramenta. Disponível para ser usado em tablets ou
computadores.
Padlet. Mural on-line em que qualquer usuário convidado para participar
daquele espaço pode colar um post. Facilita a organização de fóruns,
comunicação de grupos e serve como ambiente para uma sensibilização de
início de aula.
Ponto Ciência. Plataforma que reúne roteiros e vídeos sobre experimentos
científicos. É um ponto de encontro entre professores, alunos e entusiastas das
ciências.
Geekie. Plataforma adaptativa que oferece ao aluno possibilidades de
aprendizado adequadas ao perfil de cada aluno.
QMágico. Sistema inteligente de gestão do aprendizado: uma plataforma web
onde você pode inserir seu conteúdo, convidar seus professores e alunos para
interagir. e receber uma enorme quantidade de dados sobre alunos e
conteúdos É possível gerar estatísticas e recomendações automáticas.
Tondoo. Site para criar histórias em quadrinhos.

OPINIÃO

Esse especial nasceu, há alguns meses, quando discutíamos em equipe que


meios tínhamos para aprofundar o debate sobre os maiores desafios da
educação brasileira. No Porvir, sempre buscamos falar de inovação porque
acreditamos que está nela a solução para problemas antigos.

Existe uma clareza crescente na sociedade, expressa das mais diversas


formas, de que a educação precisa mudar. Que temos escolas do século 19,
professores do século 20 e alunos do século 21. Que não dá mais para termos
um ensino tão padronizado. Que os alunos perdem o interesse e deixam a
escola. E que a escola está de costas para o mundo.

Ao buscar as soluções que diferentes iniciativas no mundo tinham encontrado


para esses desafios, descobrimos que, de alguma forma, elas tinham uma
gênese comum: é preciso oferecer uma educação mais personalizada às
necessidades de cada estudante.

Depois de um trabalho de imersão de mais de três meses no tema,


gostaríamos de compartilhar oito impressões que sintetizamos no nosso papel
de espectadores privilegiados – e não de especialistas.

1. A personalização já está aí

Se perguntarmos para um professor se ele personaliza o ensino, nem sempre a


resposta vai ser sim. Mas se pedirmos para que apontem características de
uma educação adequada às necessidades do século 21, certamente vão
apontar fatores comumente relacionados aos processos de
ensino-aprendizagem relacionados à personalização. Dirão que os alunos
precisam ser autônomos, que devem aprender a aprender, que devem ver
sentido nas aulas e por aí vai.

Assim, o termo pode ainda não ser amplamente difundido e o vocabulário pode
não ser comum, mas a personalização já está aí. Como disse o empreendedor
Claudio Sassaki em entrevista para o especial, não estamos mais discutindo se
vai acontecer, estamos discutindo como vai acontecer, em diferentes
realidades.

2. Não existe receita de bolo

No especial mostramos experiências diferentes, nacionais e internacionais,


sempre gratuitas para o aluno, que expressam a preocupação de personalizar
o ensino. Percebemos que há muitos elementos comuns entre as iniciativas,
mas que cada uma encontrou um modelo que dá certo para suas necessidades
específicas.

3. A personalização pode começar de baixo para cima

Muitas vezes, percebemos que são os professores os responsáveis por


introduzir inovações em sala de aula. Por um lado, isso é ótimo, porque mostra
que os educadores não estão esperando que uma solução para a sua sala de
aula venha dos órgãos centrais de educação. Além disso, permite a
efervescência de inovações pequenas que podem estimular várias
microinovações no ambiente em que estão inseridos. Por outro lado, dessa
maneira, os alunos não se beneficiam de maneira equânime, uma vez que
dependem de um bom professor.

4. Ou de fora para dentro

Muitos atores, da iniciativa privada ao terceiro setor, têm passado a levantar a


bandeira da educação. Parcerias que ajudam escolas a ter infraestrutura
tecnológica e/ou apoio pedagógico têm sido o motor para a personalização do
ensino.

5. Às vezes é preciso infringir regras para fazer dar certo

Quando a proposta de um novo modelo de educação parte de grandes redes, é


comum que as escolas precisem adaptar as ordens gerais para que o efeito de
suas intenções seja percebido em casos específicos. Essa flexibilidade acaba
beneficiando quem mais importa, os alunos.

6. Com mais tempo na escola, maior é a chance de propor um ensino diferente

A maior parte das escolas que visitamos era de tempo integral. Com mais
tempo na escola, é mais factível de cumprir o currículo obrigatório de maneira
significativa, levando os alunos a experimentarem projetos dentro e fora da
escola. Mesmo quando os alunos ficavam na escola apenas por um turno,
havia uma tentativa de fazer com que a educação se estendesse para outros
horários, principalmente pelo uso de plataformas digitais de aprendizado.

7. As salas de aula são silenciosas

O recreio pode ser o mais barulhento, as crianças as mais cheias de energia,


quando uma aula que faz sentido para elas começa, a sala de aula fica
silenciosa. Não é um silêncio imposto nem absoluto, mas um silêncio
concentrado, que comporta conversas entre alunos.

8. Os efeitos nos alunos são a grande prova

Um discurso pedagógico alinhado entre os educadores, material de alta


qualidade, infraestrutura à disposição, tudo isso ajuda a compor a ideia de um
projeto pedagógico bem sucedido. Mas nada, absolutamente nada, dá tanta
segurança de que o caminho está certo do que ouvir os alunos. Não importa se
são crianças do fundamental 1 ou jovens do ensino médio, estudantes
expostos a um aprendizado que os coloca no centro se comunicam de maneira
surpreendentemente clara.
Foi bom poder contar com a sua leitura até aqui. Contribua com reflexões e
críticas. Vamos adorar ouvi-lo.

Equipe Porvir

http://porvir.org/especiais/personalizacao/#experimente

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