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Brasil Central
sobre educação linguística crítica
REVISÃO: Dos Autores
DIAGRAMAÇÃO: Telma Custódio
P929
Praxiologias do Brasil Central sobre educação linguística crítica /
organização Rosane Rocha Pessoa, Kleber Aparecido da Silva, Carla Conti
de Freitas. - 1. ed. - São Paulo: Pá de Palavra, 2021.
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Para além de “certo” ou “errado”: Educação linguística crítica em um
cursinho popular ............................................................................................................. 153
Michael Douglas Rodrigues, Maria Eugênia Sebba Ferreira de Andrade e
Viviane Pires Viana Silvestre
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ciais e nacionalistas (MAKONI; PENNYCOOK, 2007). Segundo Milroy (2001)
e Harris (2010), construtos como língua padrão e regras gramaticais são
ficções criadas por pessoas no poder para manter seus privilégios intactos,
pois as normas linguísticas não antecedem a comunicação, mas dela emer-
gem. Assim, o sucesso comunicativo depende de estratégias comunicativas e
recursos atitudinais, e não de normas predefinidas (CANAGARAJAH, 2007a,
2013). No entanto, essas praxiologias1 têm estado ausentes dos contextos
de educação linguística e de formação de professoras/es de línguas. Como
Canagarajah (2018a, p. 2) afirma, orientações que separam o significado do
corpo e do espaço, descrevendo-o como uma atividade mental, continuam
“a influenciar a ASL [Aquisição de Segunda Língua] e as pedagogias de ensi-
no de línguas de forma geral”. Essa ideia reverbera na realidade educacional
brasileira, uma vez que “a gramática normativa ainda é a estrela nas aulas de
língua estrangeira em nosso país” (PESSOA; BASTOS, 2017, p. 143).
Nossas atuais concepções de língua e pesquisa, como muitas outras con-
cepções da vida social, são exemplos de que o fim da colonização europeia nas
Américas não significou o fim das formas coloniais de dominação (CASTRO-
-GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007). Castro-Gómez (2007) alega que a universi-
dade é uma instituição colonial por ter sido criada para manter a posição da
hybris del punto cero, um ponto de neutralidade capaz de descrever e legitimar
certos tipos de conhecimento. O nascimento da linguística moderna, materia-
lizada na publicação do Curso de linguística geral de Saussure (2011 [1916]), é
uma tentativa de introduzir um ponto de neutralidade nos estudos linguísticos.
Ao discutir o livro de Saussure, Nascimento (2017, p. 59) afirma que “as
bases epistemológicas das concepções e práticas de linguagem naturalizadas
por uma geopolítica hegemônica de conhecimento se alinham ao pensamen-
to racional moderno”. Por meio do estruturalismo, Saussure isolou a língua
“de outros domínios, tais como a sociedade, a cultura, os indivíduos e a polí-
tica”, transformando-a em um produto analisável, abstrato e desconexo (CA-
NAGARAJAH, 2013, p. 23). Le circuit de la parole de Saussure, criado para
representar o processo comunicativo, é caracterizado por Pratt (2012, p. 17)
como “uma combinação interessante de determinadas marcações e ausência
de outras”. No esquema, os sujeitos estão em uma mesma posição de poder.
1 O termo praxiologia é usado no lugar de teoria no intuito de não dicotomizar teoria e prática.
O estudo
O material empírico discutido neste estudo provém de uma pesquisa3
de formação crítica de professoras/es de inglês que objetivou problematizar
2 Optamos pela terminologia norma-padrão em vez de língua padrão, pois, de acordo com Bagno (2011,
p. 367), “definitivamente não é uma das muitas variedades linguísticas que existem na sociedade”, mas
sim uma norma, como argumentaremos melhor na última seção deste capítulo. Entretanto, nas cita-
ções mantemos o termo usado por suas/seus autoras/es.
3 A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás (CEP-UFG).
Excerto 1
Hi, Basil. Today [tudei] is my last [lesti] day in London cause [câsi] a very beau-
tiful city [siti] e I love [lovi] Londres [londis] e I say to [tu] you, “Save money
Excerto 2
Como professor de inglês eu tenho que lhe dar os parabéns por sua coragem.
Logo ela estará falando fluentemente.
Excerto 3
É assim que se aprende, errando, errando e praticando [a língua] sem vergonha
de falar msm, com o tempo ela aprende mantendo contato com o idioma.
Excerto 4
Mano mas o pior é que ela deve ter aprendido muito (mesmo pronunciando mal),
pq esse é o tipo de pessoa que adquire mais conhecimento, não tendo medo de
falar é realmente tentando.
Excerto 5
Excelente atriz Mas, já vi muitos pagarem esse mico na real.
Excerto 6
O povo não sabe que ela é comediante!!! Melhor coisa os comentários!
Dois comentários até mencionaram Joel Santana, a razão pela qual sele-
cionamos este vídeo:
Excerto 7
Selo Joel Santana de qualidade!
Excerto 8
Superou Joel Santana!
Na linha 13, Rosa afirma que é difícil entendê-la por causa de seu “ca-
rioquês”, termo usado para descrever o sotaque de falantes do Rio de Ja-
neiro. A aluna também defende seu argumento nessa linha de raciocínio,
afirmando que a mulher pertence a uma comunidade de fala diferente da
sua, apesar de ambas serem brasileiras. Portanto, a mesma ideologia foi
usada para classificar o evento comunicativo da mulher como não com-
preensível, nesse caso.
Excerto 10
1. Pedro: But why do you think only Brazilians would understand her?
2. Yoshihara: The rhythm she speaks.
3. Luna: Because we know it. We know the difficulty when we started. We’re
teachers also. It’s because we are teachers. So, I think we are already trained
to understand what she’s saying.
4. Anita: It’s because we are-
5. Luna: We are Letras students. Our repertoire helps us understand what she says.
6. Pedro: Yeah, I think it’s more on that way.
7. Anita: And we are mutually supportive.
8. Pedro: You think?
9. Anita: As teachers.
10. Luna: We’re trained.
11. Anita: Maybe another person, “What are you talking? I can’t understand.”
But we try because we do it every day. We are listening to our students.
12. Pedro: Okay. So, you think it’s more, like, if you are willing to understand, you
can understand it?
13. Luna: Yes.
14. Yoshihara: Also, you make an effort.
15. Pedro: What about ‘esquentar’ (to heat)? She uses the word in Portuguese,
yes? Do you think that people would understand ‘esquentar’ (to heat)? Peo-
ple who don’t speak English.
16. Students: No.
uma herança preciosa que foi construída ao longo das gerações, não pelas/os
milhões de falantes nativas/os, mas por um seleto grupo que deu a essa tarefa
uma atenção especial, polindo, refinando e enriquecendo a língua até que ela se
tornasse um perfeito instrumento de expressão (esse grupo é geralmente identi-
ficado com figuras literárias, como Shakespeare). Essa é uma opinião defendida
por pessoas em diversos campos de atuação, incluindo encanadoras/es, políti-
cas/os e professoras/es de literatura (MILROY, 2001, p. 537).
Referências
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