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A pesquisa das danças populares brasileiras: questões epistemológicas para as artes cênicas

DECOLONIZAR O CORPO: QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS PARA A ARTES


CÊNICAS ????

PENSANDO O TEATRO HIP HOP COMO

PENSANDO A DECOLONIALIDADE NO TEATRO A PARTIR

PENSAR O TEATRO A PARTIR DA DECOLONIALIDADE: EXPERIÊNCIAS E DISCUSSÕES

PENSAR OS MÉTODOS SUBALTERNIZADOS/DESCONSIDERADOS REFUTADOS DENTRO


DA ACADEMIA OU DO FAZER ARTÍSITCO COMO PONTO DE VISTA "PRIVILEGIADO"

Escrevo a partir da experiência.

EXPERIÊNCIA QUE LEVAR A PENSAR NUM TEATRO DECOLONIAL A E EM COMO O


TEATRO PODE SE UTILIZAR DESSAS FERRAMENTAS COMO

MAS NÃO APENAS COMO APROPRIAÇÃO MERAMENTE, MAS COMO QUEM FALA DE
DENTRO

MARGEM, QUEM É SUBALTERNIZADO

O SABER QUE SE APRENDER E PODER SER ENSINADO TIREI MUITO DALI PARA HOJE,
POR EXEMPLO, SER PROFESSOR DE TEATRO INFANTIL

APOSTA ESPISTÊMICA DO DECOLONIALISMO

- visão do subalterno - Miñoso

- Lugones

- Spivak Pode o subalterno falar? - Respondendo com a genealogia da Yurderkys

- Quijano
PENSAR ENTÃO UM TEATRO DECOLONIAL

- conceituar

- teatro ritual ?
- oralidade?
- slam

RELATO DE EXPERIÊNCIA

METODOLOGIA

DISCUSSÕES

A colonização deixou feridas abissais na América Latina. Sob o discurso de


modernidade, espanhóis e portugueses, além de matar e silenciar os povos originários,
tomaram a história das civilizações que por aqui viviam antes da chegada dos
colonizadores e escreverem-na pela ótica europeia. “Destruíram quase que
completamente a memória do período anterior à ocupação através da desintegração dos
padrões de poder e das civilizações existentes na região, do extermínio de comunidades
inteiras e de seus portadores de cultura e poder”, escreve a pesquisadora Larissa
Rosevics no livro Diálogos internacionais (2007).

Mas se, por um lado, essas feridas são elos de similitude entre países ibero-americanos,
por outro lado são também chaves na busca contemporânea por reestabelecer
narrativas históricas através de um processo decolonial. BOTAR UMA CITAÇÃO

Assim, os subalternos – aqueles que um dia foram oprimidos e excluídos da história –


têm buscado subverter e desconstruir os padrões hegemônicos eurocêntricos, dando
novos sentidos aos direitos humanos, à cidadania, à economia e à cultura, por exemplo.
como o corpo assume singularidade no processo de decolonização da história e se
torna um espaço da performatividade individual da pessoa-artista. E o teatro faz isso
pela ideia foucaultiana de um corpo utópico, ligado a todos os outros lugares do mundo,
e, na verdade, em outro lugar que não o mundo; corpo de onde se olha o entorno e de
onde se cria tudo que está disposto em sua volta. Corpo capaz de nos ajudar a
reconstruir a nossa História.

O CORPO QUE DÁ FORMA AO TEATRO DECOLONIAL, disponível em


https://revistacontinente.com.br/coberturas/mirada-2018/o-corpo-que-da-forma-ao-teatro-
decolonial - acesso em 13/12/2023

nódulos que estão nos corpos que precisam ser tratados

a matéri - corpo é também a amtéria da espituralidade, da

Muniz Sodré - não é só a matéria fisica, mas constuidos a partir das ancrstralidades

corpo eurocentrido - está na binaridaes


TRÓI, Marcelo de; COLLING, Leandro. Decolonizar o corpo: o Teat (r) o Oficina e a
Universidade Antropófaga. 2017.

Colocar o corpo na centralidade desse processo decolonial é problematizar um dos pilares da


colonialidade/modernidade. Esse parece ser o mote dos artivismos queer quando
pretendem utilizar o corpo como arte para criar um outro agencia-mento que não esteja
focado somente na perspectiva rígida identitária, político-par-tidária ou na reivindicação de
marcos legais e jurídicos que são incapazes de questio-nar e modificar o que Rolnik (2016, p.8)
chama de “inconsciente colonial capitalístico que comanda o sujeito moderno ocidental que
todavia encarnamos, inclusive nas esquerdas”. Para fazer frente a essa subjetividade
vigente, ela propõe o que chama de uma micropolítica ativa (e não reativa, que seria a
dominante, incentivada e fomenta-da pelo capitalismo globalitário financeirizado). 119-120

HOLLANDA, Heloisa Buarque de et al. Pensamento feminista: conceitos fundamentais.


Rio de Janeiro: Bazar do tempo, p. 83-94, 2019.
_______

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, o discurso acadêmico e cultural tem sido enriquecido pelos estudos
decoloniais, movimento intelectual que desafia as estruturas de poder e os paradigmas
eurocêntricos que moldaram a história e a produção de conhecimento. Na América Latina,
intelectuais como Aníbal Quijano, Maria Lugones e Yuderkys Espinosa Miñoso têm liderado
esse movimento, propondo análises profundas sobre as relações coloniais e suas influências
persistentes nos campos sociais, políticos, culturais e artísticos. Este artigo se apresenta como
proposta de um diálogo entre os estudos decoloniais ancorado no pensamento de intelectuais
latino-americanos, a citar Aníbal Guijano, Maria Lugones e Yuderkys Espinosa Miñoso e as
teorias teatrais, a fim de possibilitar um exercício de deslocamento tanto espistêmico quanto
estético do teatro feito no Brasil, explorando a possibilidade de um teatro decolonial.

Ao unir os insights das teorias decoloniais com a prática e a análise do teatro, almejamos não
somente compreender as heranças coloniais presentes nas formas teatrais, mas também
questionar os fundamentos sobre os quais o teatro contemporâneo é construído. Este estudo
propõe-se a explorar como as noções de espaço, representação, linguagem e performance
podem ser reconceitualizadas à luz das perspectivas decoloniais, oferecendo assim novos
horizontes para o teatro enquanto um instrumento de descolonização e emancipação.

Para tanto, examinaremos as contribuições de Quijano, Lugones e Espinosa Miñoso no que diz
respeito à decolonização do pensamento, à compreensão das dinâmicas coloniais e à proposta
de reconstrução de epistemologias alternativas. Em seguida, investigaremos como tais
conceitos e reflexões podem ser aplicados e dialogar com as teorias teatrais, potencialmente
gerando um teatro que não apenas critique a colonialidade, mas que também se afirme como
um espaço de criação e resistência, capaz de alimentar uma consciência mais plural e
inclusiva.

Na mesma toada de Bisiaux (2018), o objetivo é "descentralizar, desuniversalizar e relocalizar"


as formas de viver, de pensar e de agir impostas por aqueles se dão direito de classificar para
atender a seus interesses econômicos, políticos ou religiosos e que também atinge as formas
artísticas. Isso porque algumas formas artísticas são hegemônicas e, pode-se concluir,
impuseram-se de forma unilateral.

Por fim, a proposta aqui é não apenas compreender como o teatro foi moldado pelas dinâmicas
coloniais, mas também vislumbrar como ele pode se tornar um espaço de resistência,
subversão e reconstrução de identidades em um contexto pós-colonial. Entre as linguagens e
estéticas já experimentadas, lançaremos luz neste trabalho sobre o Teatro Hip Hop como
proposta estética e política, e ao trabalho de Trupe, grupo de teatro cuiabano, como
experiência pessoal.

(DE) COLONIALIDADE EM LUGONES E QUIJANO

A história da humanidade foi marcada por processos complexos de dominação, colonização e


expansão que moldaram não apenas estruturas políticas e econômicas, mas também
influenciaram profundamente as formas de conhecimento, cultura e identidade. Em se tratando
de América Latina, ou Abya Ayla como é referenciada por alguns intelectuais, a colonialidade,
segundo os teóricos do giro decolonial, não se limita ao período histórico da colonização física
pelas potências europeias. Em vez disso, ela é uma matriz de poder que persiste além do
período colonial, continuando a influenciar as estruturas sociais, culturais, políticas e
econômicas até os dias de hoje.

Quijano (2005) defende a colonialidade não é apenas um fenômeno do passado, mas sim um
sistema contínuo de dominação que se estende para além do período colonial. O argumento do
sociológo peruano é de que a colonialidade está intrinsecamente ligada à modernidade, sendo
uma dimensão oculta e esquecida do processo de globalização capitalista. Para Quijano, a
modernidade não é apenas um estágio temporal, mas sim um projeto global que se baseia na
divisão hierárquica do mundo, na categorização e na exploração de povos e territórios em
busca de recursos e poder.

Dentro desse contexto, a modernidade é compreendida como um projeto global que se


desenvolveu a partir do século XVI, associado ao processo de expansão colonial europeia. Na
contramão, os teóricos do giro decolonial contestam a visão eurocêntrica da modernidade
como um período de progresso unidimensional. Em vez disso, argumentam que a modernidade
é inseparável da colonialidade, pois foi construída sobre a lógica da dominação, exploração e
imposição de um padrão único de conhecimento, produção e poder. Em suma, a modernidade
é definida, por Quijano (2005), como a expansão do capitalismo em escala mundial, tendo sua
fonte na descoberta da América e na colonização.

Assim sendo, a colonialidade e a modernidade estão profundamente entrelaçadas. A


modernidade não foi apenas um movimento de avanço tecnológico ou político, mas também
um processo que impôs uma visão de mundo particular, impondo formas de dominação e
marginalização. Segundo Grosfoguel (2016 apud DA FONSECA PALMIERE et al), diante desse
pensamento de modernidade uma série de estratégias se compuseram na forma de
epistemidício, culimando na invisibilização das espistemologias não ocidentais e não brancas,
bem como na subalternização e sub-intelectualização de populações ao redor do mundo.

A elaboração intelectual do processo de modernidade produziu uma perspectiva de


conhecimento e um modo de produzir conhecimento que demonstram o caráter do padrão
mundial de poder: colonial/moderno capitalista e eurocentrado. Essa perspectiva e modo
concreto de produzir conhecimento se reconhecem como eurocentrismo.
María Lugones, é outra pensadora do movimento decolonial contribui com a discussão com sua
análise crítica da colonialidade, especialmente ao introduzir o conceito de "colonialidade de
gênero". Ela expande a compreensão da colonialidade para além do olhar de Quijano (sobre as
estruturas políticas e econômicas), incluindo as dinâmicas de gênero dentro desse contexto.

Para este artigo me ancoro no pensamento de Lugones na busca de "entender a maneira como
essa indiferença é construída para, então, convertê-la em algo cujo reconhecimento seja
inevitável para aqueles que se dizem envolvidos em lutas libertadoras" (HOLLANDA et al p. X)

"Ao produzir essa classificação social, a colonialidade permeia todos os aspectos da vida social
e permite o surgimento de novas identidades geoculturais e sociais. “América” e “Europa”
estão entre essas novas identidades geoculturais; “europeu”, “índio”, “africano” estão entre as
identidades "raciais"" (HOLLANDA et al, 2019, p. X).

Para a autora, em outras palavras, essa classificação é "expressão mais profunda e duradoura
da dominação colonial". Isso porque, com a expansão do colonialismo europeu essas
classificações foram impostas à população de todo o globo, atravessado todas elas em cada
área da vida social, se tranformando na forma mais efetiva de dominação social, tanto material
como intersubjetiva, argumenta Lugones.

De acordo com uma concepção de humanidade que se consolidou com essa mitologia, a
população mundial foi dividida em dicotomias: superior e inferior; racional e irracional; primitiva
e civilizada; tradicional e moderna p. 63-64

O giro decolonial propõe a necessidade de desmantelar a colonialidade presente na


modernidade, buscando a construção de novos horizontes de conhecimento, respeitando as
diversidades culturais e epistemológicas. O objetivo é reverter a lógica colonial que continua a
perpetuar hierarquias e injustiças em diferentes esferas da vida social e intelectual. Em síntese,
a proposta da decolonialidade oferece uma crítica profunda à relação entre colonialidade e
modernidade, destacando como essa interligação continua a moldar o mundo contemporâneo.
Essa perspectiva teórica propõe um desafio fundamental às estruturas de poder estabelecidas,
buscando a construção de um conhecimento plural e diverso que permita a valorização de
todas as formas de vida e saberes.

Mas se, por um lado, essas feridas são elos de similitude entre países ibero-americanos,
por outro lado são também chaves na busca contemporânea por reestabelecer
narrativas históricas através de um processo decolonial. BOTAR UMA CITAÇÃO

A GENEALOGIA COMO MÉTODO EM MIÑOSO


É na busca por um processo de decolonização do teatro que nos deparamos com o
pensamento de Yurdeskys Espinosa Miñoso. Filósofa e teórica feminista natural da República
Dominicana, ela também emerge como voz importante dos estudos decoloniais, desafiando a
modernidade ocidental enquanto projeto máximo da evolução do ser humano, "desvelando-a
como aquilo que realmente é um projeto imperialista, racista, de domínio e morte" (HOLLANDA
et al 2019, p. 112).

Ao explorar a genealogia , Miñoso busca revelar as formas como as hierarquias raciais,


culturais e de poder foram instituídas e ainda são mantidas ao longo do tempo. Ela propõe um
olhar crítico para desvendar os mecanismos de subjugação que permeiam as estruturas
sociais, culturais e epistemológicas, visando, assim, desafiar e desmantelar essas formas de
dominação. Nessa empreitada, Miñoso destaca a importância da experiência como um
conhecimento legítimo e valioso na luta pela decolonização. Em outras palavras, ela enfatiza a
necessidade de reconhecer e valorizar as experiências subalternizadas e marginalizadas, que
frequentemente são desconsideradas pelas narrativas dominantes.

Para Miñoso (2019), o feminismo decolonial é antes de tudo uma aposta política e epistêmica,
que propõe a experiência de mulheres, mulheres negras e de cor como base válida para
produção de conhecimento. Como ela mesma diz: "a experiência como forma efetiva de
construção de saber". Ao mesmo tempo, Miñoso também vai recuperar as críticas realizadas ao
pensamento feminista clássico que está, segundo ela, concentrado na crítica ao
androcentrismo e à pretensão de objetividade no método científico e criticar o universalismo da
categoria mulher apontando que aquilo que é tido como teoria feminista clássica é apenas um
ponto de vista e um ponto de vista de um lugar que é um lugar de privilégio.

E isso é um questão porque, segundo a autora, "explicar o mundo e os acontecimentos a partir


somente do ponto de vista de quem é privilegiado nos dá um entendimento parcial e distorcido,
o que pode ser resolvido graças ao olhar e à experiência dupla de quem ocupa um lugar
subalterno" (HOLLAND et al, 2019, p. 122).

Ancorada em autores que defendem a experiência como fonte de conhecimento e que


consideram o olhar de agentes subalternizados como fundamentais para entender ou dar pista
do funcionamento da matriz dominante. Isso porque, segundo Miñoso, são pontos de vista que
nos permitem um olhar de baixo para cima. Esta mudança de perspectiva pode nos permite ter
um olhar mais amplo, completo e menos distorcido do social. Se considerarmos a teoria do
ponto de vista, "daí pode surgir uma crítica mais radical e comprometida com a transformação
social, à medida que se evidencia aquilo que é ocultado pelos esquemas de poder e, no caso
dos países do Sul global, o colonialismo internalizado" (HOLLAND et al, 2019, p. 121).

Neste sentido, Miñoso se baseia na compreensão da genealogia crítica como uma ferramenta
crucial para a análise das estruturas de poder historicamente enraizadas no intuito de rastrear a
origem e evolução dessas estruturas, reconhecendo as conexões entre o passado colonial e as
dinâmicas contemporâneas de dominação e opressão. Mais especificamente, o objetivo dela é
fazer uma genealogia crítica da atual política e do pensamento feminista na América Latina.
Nos atemos aqui ao método usado para esta incurssão: a ideia de arquivo. Para Miñoso é ser
arquivista, cartógrafo
(…) de nossa memória, mostrando antigos testamentos como sintomas do presente.
Construir um “arquivo audiovisual”, lidar com a mais ampla variedade de documentos
disponíveis, assim como com as “práticas silenciosas, comportamentos laterais, discursos
heterogêneos” e estar disposta a “escavar e rastrear nas profundezas, jogar luz sobre o que
está escondido” Gonçalves 2019 apud HOLLANDA et al , 2019 p. 117).

A experiência, nesse sentido, não é apenas individual, mas também coletiva, carregando
consigo os traumas, resistências e saberes acumulados ao longo das histórias de luta e
sobrevivência de comunidades subalternizadas. Miñoso propõe que essas experiências sejam
reconhecidas como fontes legítimas de conhecimento, fundamentais para a construção de
narrativas contra-hegemônicas e para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa.

Miñoso (2019) valida a experiência como forma efetiva da construção de saber a partir de
outros autores2 cujo argumento é de que o ponto de vista das mulheres - adicionamos aqui o
ponto de vista de outros grupos subalternizados - oferecem explicações sobre a vida social
como um todo mais amplas. Isso porque "nos permitem um olhar de baixo para cima essa
perspectiva nos permite ter um olhar mais amplo, completo e menos distorcido do social"
(HOLLAND et al, 2019, p. 121) e ainda nos "permitiria tonar mais vísivel a forma como tal
matriz opera", partindo de um questionamento da experiência de quem está mais abaixo na
escala do privilégio.

A reflexão de Miñoso sobre a genealogia e experiência não é apenas uma análise teórica, mas
uma convocação à ação. Ela propõe a valorização e integração dessas dimensões nos
processos de decolonização, tanto na academia quanto na prática política e social. Isso implica
não apenas reconhecer, mas também agir a partir dessas perspectivas, promovendo a
transformação e a reconstrução de estruturas opressivas.

Em conclusão, Miñoso oferece um olhar perspicaz e comprometido com a descolonização a


partir da genealogia e da experiência. Sua contribuição para o pensamento decolonial destaca
a importância de revisitar o passado colonial, reconhecendo e dando voz às experiências
subalternizadas como um passo fundamental na construção de um futuro mais inclusivo e
igualitário. É um convite para repensar não apenas o conhecimento, mas também as relações
sociais e políticas, colocando as vivências e histórias dos marginalizados no centro do
processo de descolonização.

A EXPERIÊNCIA: DISCUSSÕES E PROPOSTAS

A convergência entre a colonialidade e as artes cênicas também revela possibilidades


transformadoras. O teatro, enquanto forma de expressão artística, possui o potencial de se
tornar um espaço de resistência e de construção de narrativas alternativas. Através da
desconstrução de estereótipos, da ampliação de vozes marginalizadas e da exploração de
diferentes linguagens e formas de representação, o teatro pode desafiar ativamente as
estruturas coloniais internalizadas na sociedade.

Um exemplo disso é o conceito de TEATRE proposto por Dourado (2022). Fazendo referência
ao gênero neutro, tirando o gênero masculino do teatro, o autor reivindica assim a
transformação e ressignificação, buscando reconfigurar as colonialidades do poder e do saber
que habitam o teatro. Ele explica que o objetivo é

uma tomada do teatro por todos os grupos marginalizados, povos, comunidades,


desempoderados do mundo: mulheres, negros, trans, indígenas, não brancos, etnicizados,
periféricos, ao sul. Não se pode dizer que façam teatro, não porque o teatro seja maior que
eles, ou algo que não possam alcançar; mas porque ao trazer suas formas de vida, seus jeitos
de ser e estar no mundo, dilatam, expandem, reconfiguram, indagam, alargam as convenções,
princípios e estruturas do teatro (DOURADO, 2022 p. 4-5).

Ora, o termo teatro vem do grego theatron, e significa “lugar de onde se vê”. Portanto, é
importante ter em vista o outro (não como objeto e sim como s

O teatro seria uma invenção grega, advinda dos rituais em homenagem ao deus Dionísio.
Mesmo que a historiografia eurocêntrica tenha revisado as afirmações sobre essa origem,
reconhecendo outras formas ritualísticas, como a do culto a Osíris no Egito, como anteriores ou
paralelas à emergência da cultura teatral grega, continua sendo o teatro a medida da produção
dessas outras culturas. Era teatro ou não? Ritual ou teatro? Nessa discussão subjaz a noção
de que o teatro é uma evolução do ritual e que, portanto, mesmo que essas outras civilizações
e culturas tivessem seus rituais espetaculares/cênicos, foram os gregos que desenvolveram o
teatro, civilizaram o ritual para que o teatro emergisse. Felizmente, há um sem-número de
pesquisadores devotados a recontar essa história, documentando as outras culturas cênicas
que estão para além do teatro.

não o outro como objeto e sim como


sujeito, um outro que articula, ele próprio, seus conteúdos e suas formas. Assalta
o teatro para torná-lo um contralugar, um avesso. 6

A busca por um teatro decolonial, então, não é apenas uma chamada para a desconstrução
das narrativas hegemônicas, mas também um convite à construção de novas formas de
conhecimento e compreensão do mundo. Essa jornada implica a valorização de saberes e
estéticas não ocidentais, a desconstrução de binarismos e hierarquias e a celebração da
diversidade cultural, étnica e social.

Entretanto, os desafios são consideráveis. O teatro, assim como outras formas artísticas,
muitas vezes é influenciado por estruturas institucionais e padrões de representação
consolidados ao longo do tempo. A superação desses condicionamentos exige uma revisão
crítica das práticas teatrais existentes, a promoção de um diálogo intercultural e a criação de
espaços que permitam a expressão de múltiplas identidades e perspectivas.

Além disso, a transformação para um teatro decolonial requer um compromisso coletivo e


contínuo, não apenas por parte dos artistas, diretores e produtores, mas também das
instituições, espectadores e da sociedade como um todo. É um convite para repensar não
apenas as produções teatrais, mas também as estruturas sociais e culturais que moldam e são
refletidas no teatro.

CONCLUSÃO

Ao longo deste estudo, exploramos as intrincadas interseções entre a teoria decolonial e as


linguagens do teatro, em um esforço para compreender como esses domínios de conhecimento
podem se entrelaçar de maneira enriquecedora. A partir dos aportes teóricos de pensadores
como Aníbal Quijano, Maria Lugones e outros expoentes do pensamento decolonial, buscamos
promover um diálogo fecundo entre as críticas à colonialidade e as possibilidades
emancipatórias e subversivas do teatro.

Ao examinar as estruturas de poder colonial presentes na tessitura da sociedade e no próprio


tecido das representações teatrais, identificamos a necessidade premente de questionar,
subverter e reconstruir narrativas hegemônicas. A compreensão das relações de poder e
dominação, analisadas à luz da teoria decolonial, abre espaço para a reflexão crítica sobre
como o teatro pode se posicionar como um agente de resistência e transformação.

A proposta de um "teatro decolonial" não é meramente uma busca por uma forma artística
alternativa, mas sim uma convocação para a desconstrução das estruturas que perpetuam a
opressão e a marginalização. Através da linguagem teatral, podemos desafiar as normas
estabelecidas, ressignificar narrativas históricas e culturais, e ampliar as vozes e perspectivas
que historicamente foram silenciadas.

As reflexões de Quijano e Lugones sobre a colonialidade e as dinâmicas de poder fornecem


um alicerce sólido para repensar o papel do teatro na sociedade contemporânea. Ao
reconhecer a multiplicidade de identidades, epistemologias e saberes, o teatro decolonial
emerge como um espaço para a celebração da diversidade e uma ferramenta para
desmantelar as estruturas que perpetuam a exclusão e a opressão.

Portanto, ao final deste estudo, resta-nos a convicção de que o diálogo entre a teoria decolonial
e as linguagens do teatro não apenas é possível, mas é essencial para a construção de um
espaço cultural mais inclusivo, plural e justo. Este é um convite para que o teatro, enquanto
forma artística, se posicione como um catalisador de mudança, um espaço de resistência e um
agente de transformação social, contribuindo assim para a construção de um mundo mais
equitativo e diversificado.

Este trabalho, embora represente uma imersão inicial nesse diálogo promissor, abre portas
para futuras investigações e práticas artísticas que promovam a descolonização do
pensamento, a ampliação de vozes e a construção de um teatro que não apenas represente,
mas que também transforme a realidade em direção a um horizonte de justiça e liberdade para
todos.
REFERÊNCIAS

HOLLANDA, Heloisa Buarque de et al. Pensamento feminista: conceitos fundamentais. Rio


de Janeiro: Bazar do tempo, p. 83-94, 2019.

QUIJANO, Aníbal. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais.


Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, p. 117-142, 2005.

DOURADO, Rodrigo Carvalho Marques. Teatres da Decolonialidade. Urdimento: Revista de


Estudos em Artes Cênicas, v. 2, n. 44, p. 1-29.

DA FONSECA PALMIERE, Júlia Arruda et al. Teatro de Rua e Slam Camélias: pensando sobre
decolonialidade em pesquisa. Revista Ñanduty, v. 7, n. 11, p. 145-166, 2019.

BISIAUX, Lîlâ. Deslocamento Epistêmico e Estético do Teatro Decolonial. Revista


Brasileira de Estudos da Presença, v. 8, p. 644-664, 2018.

RIVERA, Juliana Capilé et al. Por uma poética cartográfica: estratégias para a construção da
dramaturgia e da encenação em EntreNãoLugares. 2021.

Partindo para uma reflexão da própria experiência, analisamos aqui as propostas de Trupe, grupo
de teatro cuiabano cujas características são o endereçamento de quilombo, viés periférico e
discussões de gênero e sexualidade. Lanço mão aqui da ideia de cartografia caminho também
feito por Miñoso. Teóricos e pesquisadores apresentam a cartografia como uma metodologia de
pesquisa que envolve uma abordagem sensível, intuitiva e experimental, com destaque para a
importância da observação e da escuta atenta durante o processo cartográfico, permitindo que o
pesquisador identifique os elementos que emergem durante a pesquisa-travessia-viagem.
Baseada na ideia de mapear territórios e os processos, a cartografia busca compreenderas
relações entre esses. Em outras apalavras, nessa abordagem, o mapa é visto como um dispositivo
de investigação que permite capturar e representar as múltiplas dimensões da experiência. Para
Rivera (2021), a cartografia – ao fornecer pistas – não pretende atingir um objetivo concreto
justamente por não ser um modelo a ser aplicado, mas experimentado. Um anti-método, explica
a pesquisadora. Isso porque, cartografar não implica o uso de um conjunto de regras e métodos
preestabelecidos, e sim, uma estratégia de abordagem do tema.

Observamos aqui os processos e trocas do gripo que apresentou espetáculos em Cuiabá e outras
cênicas em comunidades de Santo Antônio do Leverger, Nossa Senhora do Livramento e no
Distrito do Sucuri, também na capital. Formado em 2021, Trupe tem como principal
característica a investigação do texto poético na cênica teatral. Tocar a alma humana através da
arte é ofício para o jovem grupo que, com respeito ao sagrado, ao marginal e ao profano, visitou
comunidades da Baixada Cuiabana, levando textos poéticos e cênicos que conversam com as
realidades de cada uma delas. Na comunidade Quilombo de Mata Cavalo de Cima, em Nossa
Senhora do Livramento, o grupo encenou "Benedito Santo", em homenagem a São Benedito.
Com o texto "Partilha" que versa sobre a adicção, Trupe se apresentou na comunidade
terapêutica Bem Viver, em Cuiabá, que abriga mulheres em tratamento contra a dependência
química e durante o evento Hip Hop Combate às Drogas. Em Santo Antônio do Leverger, o
grupo presenteou o quintal do Boi Estrela com uma performance em tributo ao tradicional Boi-à-
Serra, festa da cultura popular do município e de Mato Grosso.

Ainda no ano passado, com outra formação, o grupo apresentou Flor de Mamona, acontecimento
cênico em comemoração ao aniversário de Cuiabá, com poemas de Luciene Carvalho, Daniella
Paula de Oliveira e Ivens Cuiabano Scaff. Já em 2023, Trupe proporcionou ao público uma
experiência imersiva no Cerrado, apresentando um mergulho nos versos de Luciene Carvalho e,
ainda, uma temporada com cênicas do livro Dona, da mesma autora.

Focado na investigação do texto poético na cênica teatral, Trupe assume a estética do Teatro Hip
Hop, conceito que surge no Brasil justamente no sentido da contraposição, da contracena unindo
a cultura urbana e marginalizada ao teatro. Segundo Roberta Marques do Nascimento (2012),
que atende ao nome artístico de Roberta Estrela D‟alva e é precursora do movimento, a junção
de linguagens resultou num repertório diverso de espetáculos teatrais, intervenções cênicas
urbanas, músicas e criações audiovisuais. Segundo Nascimento (2012), o encontro do teatro com
a cultural hip hop, que dá origem ao Teatro Hip Hop é auspicioso. Isso tendo em vista que os
elementos do gênero serviram "como uma luva" aos propósitos estéticos na busca por uma "nova
teatralidade" que está diretamente ligada ao posicionamento de indivíduos marginalizados ou
excluídos, imprimindo assim novas formas estéticas e políticas de se fazer arte.

As experiências propostas pelo grupo fazem pensar uma descentralização tanto dos espaços onde
o teatro acontece quanto da linguagem. No primeiro caso, optar por deixar o tradicional palco do
teatro - que habitualmente é chamado de italiano - e ocupar espaços onde o teatro ainda não foi,
seja ele a rua ou uma comunidade afastada do centro urbano, significa romper com um espaço
que é ocupado majoritariamente por uma classe média urbana.

Em se falando da linguagem, utilizar a poesia como dramaturgia especialmente nesse contexto


em que o alinhamento com o rap (rythm and poetry), encontra na oralidade

Uma das características mais marcantes do teatro hip hop é a sua habilidade em apropriar-se de
espaços que tradicionalmente não são destinados à arte teatral. Ruas, praças, paredes grafitadas e
centros comunitários tornam-se palcos improvisados para performances teatrais que transmitem
histórias de vida, lutas políticas e culturas urbanas.

A apropriação desses espaços assume uma dimensão política e social significativa. Ao utilizar
locais antes ignorados ou desconsiderados pela cena teatral tradicional, o teatro hip hop traz à
tona questões de pertencimento, acesso e representatividade. Ele oferece uma plataforma para
vozes marginalizadas, narrativas comunitárias e expressões artísticas autênticas que raramente
encontram espaço nos circuitos teatrais convencionais.

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