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Mariana Silva

Desvendando e Aplicando a Integral de


Lebesgue

Volta Redonda, RJ
2019
Mariana Silva

Desvendando e Aplicando a Integral de Lebesgue

Trabalho de Conclusão de Curso submetido


ao Curso de Matemática da Universidade
Federal Fluminense como requisito parcial
para a obtenção do título de Bacharel em
Matemática.

Universidade Federal Fluminense


Instituto de Ciências Exatas
Curso de Matemática

Orientador: Prof. Alan Prata de Paula

Volta Redonda, RJ
2019
Ficha catalográfica automática - SDC/BAVR
Gerada com informações fornecidas pelo autor

S586d Silva, Mariana


Desvendando e Aplicando a Integral de Lebesgue / Mariana
Silva ; Alan Prata de Paula, orientador. Volta Redonda, 2019.
74 p. : il.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Matemática)-


Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências
Exatas, Volta Redonda, 2019.

1. Integral de Lebesgue. 2. Teoria da Medida. 3. Espaços de


Hilbert. 4. Produção intelectual. I. Prata de Paula, Alan,
orientador. II. Universidade Federal Fluminense. Instituto de
Ciências Exatas. III. Título.

CDD -

Bibliotecária responsável: Ana Claudia Felipe da Silva - CRB7/4794


Silva, Mariana
Desvendando e Aplicando a Integral de Lebesgue/ Mariana Silva. – Volta Redonda, RJ,
2019. 74 f., 30cm. : il.

Orientador: Prof. Alan Prata de Paula

Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Matemática) – Universidade Federal


Fluminense
Instituto de Ciências Exatas
Curso de Matemática, 2019.

1. Palavra-chave Lebesgue. 2. Palavra-chave Riemann. 3. Palavra-chave Hilbert. I. Prof. Alan


Prata de Paula. II. Universidade Federal Fluminense. III. Instituto de Ciências Exatas. IV.
Título.
Mariana Silva

Desvendando e Aplicando a Integral de Lebesgue

Trabalho de Conclusão de Curso submetido


ao Curso de Matemática da Universidade
Federal Fluminense como requisito parcial
para a obtenção do título de Bacharel em
Matemática.

Trabalho aprovado. Volta Redonda, RJ, 11 de dezembro de 2019:

Prof. Alan Prata de Paula – UFF


Orientador

Prof. Alessandro Gaio Chimenton – UFF

Prof. Honório Joaquim Fernando – UFF

Volta Redonda, RJ
2019
Este trabalho é dedicado às crianças adultas que,
quando pequenas, sonharam em se tornar cientistas.
Agradecimentos

Começo, agradecendo à Deus, por ter me dado força nos momentos difíceis e por
ter colocado pessoas tão especiais no meu caminho.
Agradeço aos meus pais e a minha irmã, por todo apoio, carinho e assistência.
Quero agradecer ao meu professor orientador Alan Prata por ter me dado uma
oportunidade, me dado apoio, me ajudado, me mostrado o que é realmente importante ter
para continuar nesse caminho da Matemática e, não menos importante, ter acreditado em
mim.
À todos os professores que do departamento de Matemática e aos professores do
departamento de Física, que eu tive algum contado. Em especial, a professora Rosemary
Pires, por estar sempre preocupada com os alunos e ajudando sempre que possível, a
professora Marina Ribeiro, por ter disponibilizar o seu tempo para me ajudar na disciplina
de Cálculo I, foi nesse momento que eu descobri o meu método de aprender, a professora
Vera Prudêncio, ao professor Alessandro Gaio, por todo tempo disponibilizado para me
ajudar de alguma forma, aos professores Miguel Schnoor, Leandro Egea, Ivan Aguilar e
Gilmar Garbugio.
Com muito carinho agradeço agradeço a Larissa de Farias, por ter sido a minha
amiga desde o início desta trajetória, por ser a minha dupla nos estudos e por ser a melhor
amiga que eu poderia ter. Ao Uilton Cesar e ao Mateus Sant’Anna, por toda generosidade,
amizade e piadas. Ao Alexandre Esposte, por ser meu amigo, por me ajudar e por todo
apoio. Agradeço também as amigos Lucas Thiago, Mariella Bogoni, Matheus Elis, Vitor
Sercio, Thalles Reis, Aline Reis, João Portilho, Erick Landim e Guilherme Souza. À todos
o meu muito obrigada, por todas as risadas e por fazerem a minha graduação muito feliz!!!
Por fim, gostaria de agradecer aos professores Alessandro Gaio e Honório Joaquim
que aceitaram a participar dessa banca examinadora.
Sucess ins’t about how much money you make,
it’s about the difference you make in people’s lives.1
(Michelle Obama)

1
Sucesso não tem a ver com o dinheiro que você ganha, tem a ver com a diferença que você faz na vida
das pessoas.
Resumo
O objetivo deste trabalho é estudar a teoria de medida e integral de Lebesgue, motivado
por três problemas fundamentais. Primeiramente, será discutido “O problema da medida”
em que se busca atribuir uma medida para cada subconjunto da reta, estendendo a
noção padrão para (união de) intervalos. Com essa noção de medida bem estruturada,
será possível definir a integral de Lebesgue que se mostrará melhor do que a integral
de Riemann para resolver “O problema da permutabilidade do limite com a integral”.
Finalmente, será discutido a questão da busca por espaços de funções completos e como
isso nos leva naturalmente ao belíssimo Teorema de Riesz-Fisher, um dos mais marcantes
na teoria da Série de Fourier.

Palavras-chave: Integral de Riemann. Integral de Lebesgue. Espaço de Hilbert.


Abstract
The aim of this paper is to study Lebesgue’s theories of measure and integral, which are
motivated by three fundamental problems. First,to be discussed is "The problem of measure"
which seeks to assign a measure to each subset of the line, by extending the standard
notion to (union of) intervals. The well-structured notion of measure, defines Lebesgue’s
integral which is better at solving "The problem of limit-to-integral interchangeability."
than Riemann integral. Finally, the search for complete function spaces will be discussed
and how this naturally leads us to the beautiful Riesz-Fisher Theorem, one of the most
striking in Fourier’s series theory.

Keywords: Riemann Integral. Lebesgue Integral. Hilbert’s space.


Lista de ilustrações

Figura 1 – Integrais de Riemann e Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33


Lista de abreviaturas e siglas

q.t.p. Quase todo ponto.


Lista de símbolos

A álgebra

Σ σ-álgebra

β σ-álgebra de Borel

λ medida de Lebesgue

P(R) família de todos os subconjuntos da reta.

R conjunto dos reais estendidos, ou seja, R = R ∪ {−∞, +∞}

M + (X, Σ) conjunto das funções mensuráveis não negativas

M (X, Σ) conjunto de todas as funções mensuráveis

f+ parte positiva da função f

f− parte negativa da função f

L(X, Σ, λ) coleção de todas as funções integráveis em X, onde f + e f − tem integrais


finitas.

fn ↑ f fn > f e n→∞
lim fn = f

`: Afirmação

#E cardinalidade do conjunto E

R + R + = R ∪ {+∞}
Sumário

1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

2 MEDIDA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
2.1 σ-álgebra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
2.2 Função de Medida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.3 Medida de Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

3 FUNÇÕES MENSURÁVEIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
3.1 Funções mensuráveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
3.2 Função escada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
3.3 Funções simples . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

4 INTEGRAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
4.1 Integral de Lebesgue para funções não-negativas . . . . . . . . . . . 19
4.2 Teorema da Convergência Monótona . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
4.3 Integral de Lebesgue para funções não-negativas e negativas . . . . 27
4.4 Teorema da Convergência Dominada . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
4.5 Integral de Riemann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
4.6 Riemann x Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

5 OS ESPAÇOS Lp . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
5.1 Norma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
5.2 Lp , com 1 ≤ p < ∞: . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

6 ESPAÇOS DE HILBERT E SÉRIES DE FOURIER . . . . . . . . . . 45


6.1 Espaços de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
6.2 Ortogonalidade e Bases Ortonormais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
6.3 Séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
1

1 Introdução

Sabemos que a integral de Riemann é de fundamental importância em várias


áreas da matemática, apesar de sua importância houve a necessidade de criar uma outra
definição de integral. Neste texto temos como uns dos principais objetivos apresentar
a integral de Lebesgue, mostrar a importância que ela tem para as séries de Fourier e
ainda veremos algumas diferenças entre as integrais de Riemann e Lebesgue. Começaremos
com as seguintes perguntas: Por que se teve o interesse de criar o conceito de integral
(integral de Riemann)? Por que depois disso criar um outro conceito de integral (integral
de Lebesgue)?
Há muito tempo, mais especificamente na Grécia antiga, onde surgiu o interesse
em calcular a área e o volume de figuras geométricas, Arquimedes (287-212 A.C.) foi o
primeiro a fazer tais cálculos para figuras geométricas mais simples, usando o método de
exaustão criado por Eudoxo (408-355 A.C.), assim nasceu a ideia de integral. Nos séculos
XVI e XVII, Newton (1642-1727) e Leibniz (1646-1716) criaram o Cálculo diferencial
formalizando as ideias de Arquimedes, mas em vários pontos dessa formalização haviam
questionamentos, pois faltavam-los a noção clara de limite. Cauchy (1789-1857) e Riemann
(1826-1866) concretizaram o conceito de integral, resolvendo vários problemas da época.
No final do século XIX, Riemann estabeleceu uma definição de integral que incluía
funções altamente descontínuas, no entanto essa definição levou a contradições. Deste
modo, o matemático Camille Jordan tentou formular isso com a teoria de medida que
começava a surgir com os trabalhos de Borel. Esse é exatamente o ponto de partida de
Lebesgue [4].
Com essa ligação entre a teoria de integração e a teoria da medida, Lebesgue
conseguiu perceber que uma generalização das noções de medida e mensurabilidade implica
em generalizações das noções de integral e integrabilidade. Em 1901, Lebesgue publicou
um artigo onde propõe pela primeira vez a ideia de sua generalização da integral definida.
A ideia da tese de doutorado de Lebesgue, que foi publicada em 1902, foi primeiro
definir a noção de medida, para conjuntos mais gerais do que intervalos. Com isso, ele
começou a construir a integral, para o que ele chamou de funções simples, que são funções
que assumem um número finito de valores. Em seguida, ele definiu para funções mais
complicadas como o limite superior de todas as integrais de funções simples menores do
que a função em questão.
Agora que entendemos o contexto histórico do surgimento da integral de Lebesgue,
percebemos a importância da teoria de medida para o surgimento de outro conceito de
integração. Iremos começar esse trabalho com o problema da boa definição do conceito de
Capítulo 1. Introdução 2

medida, em seguida os dois outros problemas que serão a permutação do sinal de limite
com o da integral e a obtenção de espaços de funções completos.

1. Boa definição da medida


Tudo começa com a função de medida, pois se ela não estiver bem definida não
conseguiremos definir a integral de Lebesgue e não teremos como ampliar o conjunto
de funções integráveis.
Inicialmente temos uma função de medida capaz somente de medir intervalos na reta,
estamos interessados em estender essa função de medida para assim conseguirmos
medir subconjuntos mais gerais de R, de tal forma que a função m : P(R) →
R+ ∪ {+∞} esteja bem definida.
Depois que conseguirmos definir a própria, teremos que construir uma medida que
mede tanto os intervalos da reta, quanto conjuntos mais gerais, e que é única, essa
medida será a medida de Lebesgue.

2. Passar o sinal de limite sobre o sinal de integral1


Em várias áreas da matemática temos interesse de passar o sinal de limite sobre o
sinal de integral Z b Z b
lim
n→∞
fn (x) dx = lim fn (x) dx, (1.1)
a a n→∞
mas em que condições podemos fazer isso na integral de Riemann?
Para fazer isso na integral de Riemann precisamos que a sequência de funções (fn )
convirja uniformemente para uma função f (x), mas se retirarmos essa hipótese as
coisas podem mudar radicalmente. Um exemplo disso é dado pelo fato de que se
pode construir uma sequência de funções contínuas (fn ) convergindo em todo ponto
para f , tal que
a) 0 6 fn (x) 6 1, para todo x.
b) A sequência (fn ) é monótona decrescente em n → ∞.
c) A função limite f não é Riemann integrável, pois f pode ser descontínua, como
por exemplo a função de Dirichlet.
Z 1
No entanto, tendo a) e b), a sequência fn (x) dx converge para um limite. Assim,
0
nos perguntamos: Existe um método capaz de integrar a f para obter (1.1)?
Veremos mais adiante qual será esse método.

3. Obter espaços de funções completos


Após definirmos a integral de Lebesgue gostaríamos de obter espaços de funções
completos. Sabemos que para um espaço vetorial normado V ser completo precisamos
1
Essa maneira intuitiva de ver está em [7].
Capítulo 1. Introdução 3

que toda sequência de Cauchy em V seja convergente na métrica induzida pela


norma. A integral de Lebsgue possibilita a permutação da integral com o limite de
forma mais fácil e isso seria uma peça fundamental para a construção de espaços de
funções completos.
Contudo, qual a necessidade de criar um espaço completo? Uma motivação para essa
pergunta vem do fato de querermos concluir esse texto mostrando a convergência
de séries de Fourier para funções não contínuas. Para isso precisamos garantir que
conseguimos uma bijeção entre espaços, tal que funções não contínuas são levadas em
sequências, mas para conseguirmos isso precisamos de um teorema muito importante
que é o Teorema de Riesz-Fischer para séries de Fourier e esse teorema está ligado
com os espaços completos.

Primeiramente, melhoraremos a noção de medida, pois só assim conseguiremos


definir a integral de Lebesgue, em seguida apresentaremos os espaços Lp ’s e por fim
mostraremos o Teorema de Riesz-Fischer para séries de Fourier.
A maioria das definições, teoremas, lemas, corolários e proposições que se encontram
neste texto, podem ser encontradas nos seguintes livros : [1], [7] e [10].
4

2 Medida

Inicialmente temos uma função de medida capaz somente de medir intervalos. É


muito importante conseguir estender essa função medida, pois queremos medir conjuntos
mais gerais. Precisamos também que ela esteja bem definida. Então, para começar, queremos
definir uma função de medida µ com as seguintes propriedades:
(i) µ((a, b]) = b − a, ou seja, conseguimos medir conjuntos na reta;
(ii) sejam um conjunto A ⊆ R e o conjunto transladado Ax = {x + y|y ∈ A}, então

µ(A) = µ(Ax ),

ou seja, essa função de medida é invariante por translação;


[
(iii) seja A = Ej , com Ei ∩ Ek = ∅, ∀i 6= k, então:
j≥1
 
[ X
µ(A) = µ  Ej  = µ(Ej ),
j≥1 j≥1

ou seja, essa função de medida é σ-aditiva;


(iv) µ : P(R) → R+ ∪ {∞}, ou seja, essa função de medida está definida em todos
os subconjuntos da reta.
No entanto, é impossível termos uma função com todas essas propriedades. Podemos
mostrar isso com a seguinte construção. Considere a seguinte relação, x ∼ y, sempre que
x − y é racional. Observe que esta relação é uma relação de equivalência, pois satisfaz as
seguintes propriedades
(i) x ∼ x, para cada x ∈ [0, 1]
(ii) se x ∼ y, então y ∼ x
(iii) se x ∼ y e y ∼ z, então x ∼ z.
Então, duas classes de equivalência ou são disjuntas ou coincidem, com isso o
intervalo [0, 1] é a união disjunta de todas as classes de equivalência,
·
[
[0, 1] = Eα
α≥1

Assim, construímos o conjunto N escolhendo exatamente um elemento xα de cada


Eα e definindo N = {xα } 2 . Agora considere {rk }∞
k=1 como sendo a enumeração de todos
2
Não é trivial a montagem dessa construção e não mostraremos ela aqui, mas ela pode ser encontrada
no livro [9], nas páginas 24, 25 e 26.
Capítulo 2. Medida 5

os racionais em [−1, 1] e o conjunto transladado

Nk = N + rk .

Os conjuntos Nk são disjuntos. De fato, suponha que Nk ∩ Nk0 é não vazia, então
existem racionais rk 6= rk0 e ,α e β, tal que xα + rk = xβ + rk0 , com isso xα − xβ = rk0 − rk .
Consequentemente, α 6= β e xα − xβ é racional, com isso xα ∼ xβ , o que contradiz o fato
de N ter apenas um representante de cada classe de equivalência.
Temos ainda que

[
[0, 1] ⊂ Nk ⊂ [−1, 2].
k=1

De fato, por construção cada Nk está contido em [−1, 2]. Já a primeira inclusão, seja
x ∈ [0, 1], então x ∼ xα , para algum α, com isso x − xα = rk , para algum k. Portanto,
x ∈ Nk .
Assim,

X
16 m(Nk ) 6 3.
k=1

Como Nk é o conjunto transladado de N , então m(Nk ) = m(N ), para todo k, com isso

X
16 m(N ) 6 3,
k=1

assim m(N ) 6= 0 e m(N ) > 0 o que é uma contradição.


Com isso, para definir uma função de medida temos que retirar alguma dessas
propriedades. Não tiramos a propriedade (i), pois ainda queremos que a medida de um
intervalo qualquer (a, b] seja b − a; não retiramos a propriedade (ii), pois assim perderemos
a intuição do que é a medida de um conjunto; não retiramos a propriedade (iii), pois
assim não conseguiremos estender para conjuntos da reta a noção de comprimento, área e
volume. Então, definiremos uma função de medida não mais para todo o subconjunto da
reta, mas sim para uma família de subconjuntos, que esperamos ser a maior possível de
forma que (i), (ii) e (iii) sejam satisfeitas. Portanto, iremos primeiro definir uma estrutura,
que com ela seremos capaz de obter essa família de subconjuntos, para depois definirmos
uma função de medida.

2.1 σ-álgebra
Para as próximas definições tomaremos um conjunto não-vazio X.

Definição 1. Uma coleção A de subconjuntos de X é chamada de álgebra em X (ou


álgebra de subconjuntos de X), se
(i) X ∈ A;
Capítulo 2. Medida 6

(ii) F ∈ A ⇒ F c = X\F ∈ A;
(iii) F, G ∈ A ⇒ F ∪ G ∈ A.

Exemplo 1. Seja A uma família que consiste precisamente de dois subconjuntos de X,


que são ∅ e X, ou seja, A = {∅, X}. Vemos facilmente que A é uma álgebra.

Exemplo 2. Seja X = (0, 1]. Para F ⊆ X, diga que F ∈ A, se F pode ser escrito como
uma união finita
F = (a1 , b1 ] ∪ ... ∪ (ar , br ], (2.1)

onde r ∈ N e 0 6 a1 6 b1 6 ... 6 ar 6 br 6 1. Então, A é uma álgebra em (0, 1]. De fato,


(i) X ∈ A, pois o intervalo (0, 1], pode ser escrito como união finita de intervalos.
(ii) se F ∈ A, então F = (a1 , b1 ] ∪ ... ∪ (ar , br ],com isso F c = X \ F que também
dá para escrever como a união finita de intervalos. Portanto, F c ∈ A.
(iii) se F, G ∈ A, então F = (a1 , b1 ] ∪ ... ∪ (ar , br ] e G = (c1 , d1 ] ∪ ... ∪ (cr , dr ], com
isso
F ∪ G = (a1 , b1 ] ∪ ... ∪ (ar , br ] ∪ (c1 , d1 ] ∪ ... ∪ (cr , dr ],

ou seja, F ∪ G, pode ser escrito como a união finita de intervalos. Portanto, F ∪ G ∈ A.

Definição 2. Uma família Σ, de subconjuntos de um conjunto X, é dita uma σ-álgebra


quando Σ é uma álgebra em X, tal que se (An )n é uma sequência de conjuntos em Σ, então

[
An ∈ Σ.
n=1
T
Exemplo 3. Sejam Σ1 e Σ2 duas σ-álgebras de subconjuntos de X. Então, Σ3 = Σ1
Σ2 também é uma σ-álgebra. De fato:
(i) Temos que ∅ e X pertencem tanto a Σ1 , quanto a Σ2 , então ∅, X ∈ Σ3 .
(ii) Seja um conjunto A ∈ Σ3 , então A ∈ Σ1 e A ∈ Σ2 . Com isso, Ac = X\A ∈
Σ1 e Ac = X\A ∈ Σ2 e, portanto, Ac = X\A ∈ Σ3 .
(iii) Seja uma sequência de conjuntos (An )n ∈ Σ3 , então (An )n ∈ Σ1 e (An )n ∈
Σ2 . Com isso,

[ ∞
[
An ∈ Σ1 e An ∈ Σ2 .
n=1 n=1

Portanto,

[
An ∈ Σ3 .
n=1

A seguir temos a definição de uma σ-álgebra que é construída por uniões finitas,
ela se faz necessária para podermos definir a álgebra de Borel, que será definida logo após
o exemplo.
Capítulo 2. Medida 7

Definição 3. Seja C uma coleção de conjuntos em X, definimos σ(C) como a interseção


de todas as σ-álgebras que contém C, ou seja, σ(C) = {B ⊂ X; B ∈ Σ, ∀ Σ σ-álgebra, com
C ⊂ Σ}.

Proposição 1. σ(C) é σ-álgebra.

Demonstração.
i) X ∈ σ(C), pois Σ ⊃ C σ-álgebra, então X ∈ Σ;
ii) Afirmamos que A ∈ σ(C) ⇒ Ac ∈ σ(C).
Seja A ∈ σ(C), se Σ ⊃ C σ-álgebra, então A ∈ Σ, com isso Ac ∈ Σ, portanto
Ac ∈ σ(C).
iii) Sejam (An )n∈N ∈ σ(C) e Σ ⊃ C σ-álgebra, então An ∈ Σ, ∀n ∈ N, com isso
[ [
An ∈ Σ, portanto An ∈ σ(C).
n>1 n>1

Definição 4. σ(C) é chamada σ-álgebra gerada por C.

Proposição 2. σ(C) é a menor σ-álgebra que contém C, isto é,


(i) C ⊂ σ(C);
(ii) A é σ-álgebra e C ⊂ A, então σ(C) ⊂ A.
A seguir um exemplo simples de σ-álgebra gerada por um determinado conjunto.

Exemplo 4. Seja X = {1, 2, 3}, então a σ-álgebra gerada pelo subconjunto único {1} é

σ({1}) = {∅, {1}, {2, 3}, {1, 2, 3}}

Definição 5. Considere o conjunto R dos números reais. A σ-álgebra de Borel é a σ-álgebra


β gerada pelos conjuntos abertos em R, ou seja, β(R) = σ(O), onde O ⊂ R aberto.
Observe que a σ-álgebra de Borel também é a σ-álgebra gerada pelos intervalos
fechados em R, isto é, β(R) = σ{[a, b]; a, b ∈ R}. De fato, como β é formado por todos os
intervalos abertos de R, temos que para todo n ∈ N o conjunto
( )
1 1
An = x ∈ R; a − < x < b + (2.2)
n n

pertence a β. Assim Acn está em β, para todo n, com isso e pela lei de De Morgan, obtemos
que ! c
Acn
[ \
= An ∈β (2.3)
n∈N n∈N

isso implica que


( )
\ \ 1 1
An = x ∈ R; a − < x < b + ∈ β. (2.4)
n∈N n∈N n n
Capítulo 2. Medida 8

Note que, essa sequência é decrescente, ou seja, A1 ⊃ A2 ⊃ ... ⊃ Ak ⊃ ..., então tomando
k
\
a interseção finita temos que An = Ak , mas queremos a interseção infinita, para isso
n=1
basta tomar o limite de Ak , para k → ∞, obtemos então
1 1
lim a − 6 lim x 6 lim b − . (2.5)
k→∞ k k→∞ k→∞ k
Logo, ( )
\ 1 1
x ∈ R; a − < x < b + = {x ∈ R; a 6 x 6 b} ∈ β. (2.6)
n∈N n n

Também conseguimos provar o mesmo para os intervalos (a, b] e [a, b), ou seja, a
σ-álgebra de Borel também é a σ-álgebra gerada pelo intervalo (a, b] ou pelo intervalo
[a, b).

2.2 Função de Medida


Daqui em diante usaremos R como sendo o conjunto dos números reais estendidos,
ou seja, R = R ∪ {−∞, +∞}. Assim, poderemos dizer que o comprimento da linha real é
igual a +∞.
Começaremos definindo o que é uma função aditiva e o que é uma função σ-aditiva.
São duas definições muito importantes que serão usadas ao longo desse texto. Mais a frente
definiremos o que é uma função medida.

Definição 6. Seja m : A −→ R + uma função. A função m é chamada de aditiva, se


(i) m(∅) = 0;
(ii) F, G ∈ A, com F ∩ G = ∅, então m(F ∪ G) = m(F ) + m(G).

Definição 7. Seja uma função m : A −→ R + . A função m é dita σ-aditiva, se


(i) m(∅) = 0;
[
(ii) (Fn )n é uma sequência de conjuntos disjuntos em A, com F = Fn ∈ A,
n>1
então ! ∞
[ X
m(F ) = m Fn = m(Fn ).
n>1 n=1

Exemplo 5. Para F como no Exemplo 2, temos


r
X
µ0 (F ) = (bk − ak ). (2.7)
k=1

Então, µ0 é bem definida e aditiva em Σ. De fato, seja F, G ∈ Σ, com F ∩ G = ∅, tal que


n
[ m
[
F = (ai , bi ] e G = (cj , dj ], n, m ∈ N. Então,
i=1 j=1

µ0 (F ∪ G) = µ0 ((a1 , b1 ] ∪ (a2 , b2 ] ∪ ... ∪ (an , bn ] ∪ (c1 , d1 ] ∪ (c2 , d2 ] ∪ ... ∪ (cm , dm ])


Capítulo 2. Medida 9

n X
X m
= (bi − ai ) + (dj − cj )
i=1 j=1
n
X m
X
= (bi − ai ) + (dj − cj )
i=1 j=1

= µ0 (F ) + µ0 (G).

Proposição 3. µ0 é σ-aditiva em Σ.

Demonstração.
A prova dessa proposição não é trivial e não faremos ela aqui, mas ela pode ser
encontrada em [10], nas páginas 200 e 201.

Obtemos na seção anterior uma estrutura que nos permite ter uma família de
subconjuntos suficientemente grande para definirmos a seguinte função de medida.

Definição 8. Uma medida é uma função µ : Σ → R + , tal que


(i) µ(∅) = 0
(ii) µ(E) > 0, ∀E ∈ Σ
(iii) µ é σ-aditiva: dado (En )n uma sequência disjunta de conjuntos quaisquer em
Σ, então:
∞ ∞
!
[ X
µ En = µ(En ).
n=1 n=1

Exemplo 6. Seja (N, P(N)), sendo P(N) a σ-álgebra de todos os subconjuntos de N. Se


E ∈ P(N), definimos a medida de E como:


 #E, se E é finito
µ(E) =  (2.8)
+∞, se E é infinito
Chamamos µ de medida de contagem.

Definição 9. Um espaço de medida é um trio (X, Σ, µ) que consiste de um conjunto X,


uma σ-álgebra Σ de subconjuntos de X e uma medida µ definida em Σ.
Algumas propriedades da função de medida, que acabamos de definir.

Lema 1. Seja µ uma medida definida na σ-álgebra Σ.


a) Se E, F ∈ Σ e E ⊆ F , então µ(E) 6 µ(F ).
b) Se µ(E) < +∞, então µ(F \ E) = µ(E) − µ(F ).

Demonstração.
Capítulo 2. Medida 10

a) Sabemos que E, F ∈ Σ e E ⊆ F , então F = E ∪ (F \ E) e E∩ (F \ E) = ∅,


com isso µ(F ) = µ(E) + µ(F \ E). Como µ(F \ E) ≥ 0, obtemos que µ(E) 6 µ(F ).
b) Agora seja µ(E) < +∞, então µ(F ) − µ(E) = µ(E) + µ(F \ E) − µ(E), ou seja,
µ(F ) − µ(E) = µ(F \ E).

Lema 2 (Continuidade da medida). Seja µ uma medida definida na σ-álgebra Σ.


a) Se (En )n é uma sequência crescente em Σ, ou seja, E1 ⊂ E2 ⊂ E3 ⊂ ..., com
E = ∪En , isto é, En ↑ E,então

!
[
µ En = n→∞
lim µ(En ). (2.9)
n=1

b) Se (Fn )n é uma sequência decrescente em Σ, ou seja, F1 ⊃ F2 ⊃ F3 ⊃ ..., com


F = ∩Fn , isto é, Fn ↓ F , e µ(F1 ) < +∞, então

!
\
µ Fn = lim µ(Fn ). (2.10)
n→∞
n=1

Demonstração.
a) Seja µ(En ) = +∞, para algum n, então ambos os lados da equação (2.9) são
+∞. Agora, suponha µ(En ) < +∞, ∀n. Tome A1 = E1 e An = En \ En−1 , para n > 1.
Com isso, a sequência de conjuntos (An )n é disjunta e tal que:
n
[ ∞
[ ∞
[
En = Ai e En = An . (2.11)
i=1 n=1 n=1

Como µ é σ-aditiva, temos que


∞ ∞ ∞ m
! !
[ [ X X
µ En = µ An = µ(An ) = m→∞
lim µ(An ). (2.12)
n=1 n=1 n=1 n=1

Pelo Lema 1, obtemos µ(An ) = µ(En ) − µ(En−1 ), para n > 1, então a série finita da 2.12
é telescopia e
m
X m
X m
X
µ(An ) = µ(A1 ) + µ(An ) = µ(E1 ) + [µ(En ) − µ(En−1 )] = µ(Em ).
n=1 n=2 n=2

Logo,

!
[
µ En = lim µ(Em ). (2.13)
m→∞
n=1

b) Seja En = F1 \ Fn , então (En ) é uma sequência crescente de conjuntos em Σ. Se


aplicarmos a parte a) e o Lema 1, temos que

!
[
µ En = n→∞ lim [µ(F1 ) − µ(Fn )] = µ(F1 ) − n→∞
lim µ(En ) = n→∞ lim µ(Fn ). (2.14)
n=1
Capítulo 2. Medida 11

S∞ T∞
Por outro lado, n=1 En = F 1 \ n=1 Fn , com isso
∞ ∞
! !
[ \
µ En = µ(F1 ) − µ Fn . (2.15)
n=1 n=1

Portanto,

!
\
µ(F1 ) − lim µ(Fn ) = µ(F1 ) − µ Fn .
n→∞
n=1

Logo,

!
\
n→∞
lim µ(Fn ) = µ Fn .
n=1

2.3 Medida de Lebesgue


Até aqui temos definições do que é uma função ser σ-aditiva e de função medida,
sendo que a medida da Definição 8 está definida na σ-álgebra, e é tal que
 
[ X
µ Ej  = µ(Ej ), sempre que Ei ∩ Ek = ∅, ∀i 6= k.
j≥1 j≥1

Porém, queremos uma função de medida com as três propriedades do início deste
capítulo. Então, para começar queremos estender a função medida µ, tal que essa nova
função de medida vai ter as duas propriedades das funções de medida acima, e ela será
única.
Para isso usaremos o Teorema de extensão de Carathéodory, mas não provaremos
ele, pois sua demonstração é longa e não trivial, ela pode ser encontrada em [10], na página
198.

Teorema 1 (Teorema de extensão de Carathéodory). Sejam X um conjunto, A uma


álgebra em X e Σ = σ(A). Se m : A → [0, +∞] é σ-aditiva, então existe uma medida µ0
em (X, Σ), tal que µ0 = m em Σ. Se m(X) < ∞, então esta extensão é única.

Definição 10. A medida λ é chamada de medida de Lebesgue em ((0, 1], β(0, 1]), tal que
λ((a, b]) = b − a.

Exemplo 7. A medida de Lebesgue dos conjuntos dos racionais no intervalo [0, 1] ([0, 1] ∩
Q) e dos irracionais no intervalo [0, 1] ([0, 1] \ Q) são, respectivamente, zero e um. Pois,
[
pela σ-aditividade, Q = {qn }, onde λ({qn }) = n→∞ lim λ({qn }) = 0, com isso λ(Q) =
n>1
X
λ({qn }) = 0. E sabemos que λ([0, 1]) = 1 e λ([0, 1] ∩ Q) = 0, então λ([0, 1] \ Q) = 1.
n>1

Com isso, temos uma função de medida com duas propriedades que queríamos lá
no início, que são as propriedades (i) e (iii). Porém, ainda falta mostrar que a medida de
Capítulo 2. Medida 12

Lebesgue possui a propriedade (ii), que é ela ser invariante por translação. O próximo
teorema nos garante isso.

Teorema 2. 4 Sejam λ medida de Lebesgue em R e x ∈ R, então λ é invariante por


translação, ou seja, para todo B ∈ β(R), temos

λ(x + B) = λ(B),

onde x + B = {x + b; b ∈ B}.

Demonstração.
Primeiro devemos nos convencer que

B ∈ β(R) ⇒ x + B ∈ β(R), ∀x ∈ R, (2.16)

pois caso contrário, a tese desse teorema não teria sentido. Observe o seguinte conjunto

Ax = {B ∈ β(R); x + B ∈ β(R)} ⊂ β(R).

É claro que Ax é σ-álgebra e que J = {(a, b); a, b ∈ R} ⊂ Ax . Consequentemente,


β(R) = σ(J ) ⊂ Ax ⊂ β(R), com isso obtemos (2.16).
Seja λx (B) = λ(x + B), para x ∈ R fixado. É fácil ver que λx é uma medida em
(R, β(R)). Tome I = [a, b) ∈ J e observe que

x + I = [a + x, b + x) ∈ J ,

então
λx (I) = λ(x + I) = (b + x) − (a + x) = b − a = λ(I).

Isto significa que λx (I) = λ(I), ∀I ∈ J . Como J gera β(R), então λx = λ em β(R).

Portanto, obtemos uma função de medida com todas as propriedades que queríamos
no início deste capítulo.

4
Esse teorema foi retirado da referência [6] .
13

3 Funções Mensuráveis

Neste momento estamos interessados em definir um novo espaço e saber qual é tipo
de função que se encontra nele. O principal objetivo desse capítulo é apresentar a caracte-
rística de uma função que é Lebesgue integrável. A integral de Lebesgue será apresentada
no capítulo seguinte. Veremos ainda as propriedades dessas funções e definiremos um tipo
de convergência muito importante no espaço de funções.

3.1 Funções mensuráveis


Apresentaremos primeiro as funções mensuráveis e suas propriedades.

Definição 11. Um par ordenado (X, Σ) consistindo de um conjunto X e uma σ-álgebra


Σ de subconjuntos de X é chamado de espaço mensurável. Pode ainda ser denotado
por M (X, Σ).
A seguir definiremos o tipo de função que temos no espaço mensurável.

Definição 12. Uma função f : X → R é dita Σ-mensurável ou simplesmente mensu-


rável, se para todo α ∈ R , o conjunto

f −1 ((−∞, α]) = {x ∈ X|f (x) 6 α}

é mensurável. Isto é, f −1 ((−∞, α]) ∈ Σ, ∀α ∈ R.


Observe que a função f −1 leva um elemento σ-álgebra β para um elemento na
σ-álgebra Σ.
Em alguns momentos usaremos a seguinte definição,

{f < α} := {x ∈ X|f (x) < α} ∈ Σ.

Definição 13. Sejam X um conjunto e Σ a σ-álgebra de subconjuntos de X. A coleção


de todas as funções não-negativas Σ-mensuráveis em X é denotada por M + (X, Σ).

Lema 3. Seja f : X −→ R. As seguintes afirmações são equivalentes:


(i) ∀α ∈ R, o conjunto {f (x) > α} ∈ Σ;
(ii) ∀α ∈ R, o conjunto {f (x) 6 α} ∈ Σ;
(iii) ∀α ∈ R, o conjunto {f (x) < α} ∈ Σ;
(iv) ∀α ∈ R, o conjunto {f (x) > α} ∈ Σ.
Capítulo 3. Funções Mensuráveis 14

Demonstração.
(i) ⇒ (ii) ∀α ∈ R, {f (x) 6 α} = {f (x) > α}c , por hipótese {f (x) > α} ∈ Σ, com
isso {f (x) > α}c ∈ Σ. Logo, {f (x) 6 α} ∈ Σ.

[
(ii) ⇒ (iii) {f (x) < α} = {f (x) 6 α − 1/k} , por hipótese
k=1

[
{f (x) 6 α − 1/k} ∈ Σ, com isso {f (x) 6 α − 1/k} ∈ Σ. Logo, {f (x) < α} ∈ Σ.
k=1

(iii) ⇒ (iv) ∀α ∈ R, {f (x) > α} = {f (x) < α}c , por hipótese {f (x) < α} ∈ Σ,
com isso {f (x) < α}c ∈ Σ. Logo, {f (x) > α} ∈ Σ.

[
(iv) ⇒ (i) ∀α ∈ R, {f (x) > α} = {f (x) > α − 1/k} , por hipótese
k=1

[
{f (x) > α − 1/k} ∈ Σ, com isso {f (x) > α − 1/k} ∈ Σ. Logo, {f (x) < α} ∈ Σ.
k=1

Proposição 4. A função f : X −→ R é mensurável se, e somente se, f −1 (O) é mensurável,


para cada conjunto aberto O.

Demonstração.
(⇐) Sabemos que qualquer intervalo da forma (c, +∞) ou (−∞, c), com c ∈ R, é
aberto. Por hipótese, f −1 (O) é mensurável, para cada O sendo um conjunto aberto, com
isso f −1 (R ) é mensurável. Logo, f é mensurável.
(⇒) Suponha que f seja mensurável. Seja O um conjunto aberto, então podemos
expressar O como a união enumerável de intervalos limitados e abertos {Ik }∞ k=1 , pois a
topologia de R tem base enumerável de intervalos, onde cada Ik pode ser expresso como
Bk ∩ Ak , com Bk = (−∞, bk ) e Ak = (ak , +∞). Como f é mensurável, então cada f −1 (Bk )
e f −1 (Ak ) são conjuntos mensuráveis. Por outro lado, os conjuntos mensuráveis são uma
σ-álgebra e, portanto, f −1 (O) é mensurável, pois
 
∞ ∞ h i
f −1 (O) = f −1  f −1 (Bk ) ∩ f −1 (Ak ) .
[ [
Bk ∩ Ak  =
k=1 k=1

Exemplo 8. Se E ∈ Σ, então a função característica χE , definida por


 1, se x ∈ E
χE (x) =  (3.1)
0, se x ∈
/E
é mensurável. De fato,

∅, se α > 1




{χE 6 α} = E, se 0 6 α 6 1 (3.2)


 X, se α < 0

Capítulo 3. Funções Mensuráveis 15

Proposição 5. Seja uma função contínua f em Rd , então f é mensurável.

Demonstração. Por hípotese f é contínua em Rd , com isso f −1 (A) é aberto, ∀A aberto


em Rd , logo f −1 (A) ∈ β(Rd ), ∀A ⊂ Rd aberto.

Proposição 6. Sejam uma função mensurável e finita f e uma função contínua g, então
g ◦ f é mensurável.

Demonstração. Seja G ⊂ R um conjunto aberto. Como f é contínua, temos que f −1 (G) é


aberto em Rd , com isso f −1 (G) ∈ β(Rd ), assim g −1 (f −1 (G)) ∈ Σ. Logo, (f ◦ g)−1 (G) ∈ Σ,
∀G ⊂ R aberto.

Lema 4. Sejam f , g funções mensuráveis e c um número real. Então,

c · f, f 2 , f + g, f · g, |f |

são também mensuráveis.

Demonstração.
Por hipótese temos que c ∈ R e que f é mensurável, então {x ∈ X : f (x) > α} ∈
Σ, ∀α ∈ R

`: c · f é mensurável.
Se c = 0, então {x ∈ X : c · f > α} = {x ∈ X : 0 > α} ∈ Σ.
Se c > 0, então {x ∈ X : c · f > α} = {x ∈ X : f > α/c} ∈ Σ.
Se c < 0, então {x ∈ X : c · f < α} = {x ∈ X : f < α/c} ∈ Σ ⇒ {x ∈ X : f >
α/c} ∈ Σ.
Portanto, c · f é mensurável.

`: f 2 é mensurável.
Se α < 0, então {x ∈ X : (f (x))2 > α} = X ∈ Σ.

Se α > 0, então {x ∈ X : (f (x))2 > α} = {x ∈ X : f (x) > α} {x ∈ X : f (x) <
S

− α} ∈ Σ.
Portanto, f 2 é mensurável.

`: f + g é mensurável.
Se r ∈ Q, então Sr = {x ∈ X : f (x) > r} {x ∈ X : g(x) > α − r} ∈ Σ. Com isso,
T

{x ∈ X : (f + g)(x) > α} = {Sr : r ∈ Q}.


S

Portanto, f + g é mensurável.
Capítulo 3. Funções Mensuráveis 16

`: f · g é mensurável.
1
Temos que f · g = [(f + g)2 − (f − g)2 ], então pelos itens acima obtemos que f · g
4
é mensurável.

`: |f | é mensurável.
Sabemos que | · | é uma função contínua e por hipótese f é mensurável, então pela
proposição anterior (f ◦ | · |) = |f (·)| é mensurável.

Lema 5. Sejam (fn ) uma sequência em M (X, Σ), as seguintes funções são mensuráveis:

f (x) = inf fn (x), F (x) = sup fn (x),


n n

f ∗ (x) = lim inf fn (x), F ∗ (x) = lim sup fn (x).


n→∞ n→∞

Demonstração. Observe que



\
{x ∈ X|f (x) > α} = {x ∈ X|fn (x) > α} (3.3)
n=1

e ∞
[
{x ∈ X|F (x) > α} = {x ∈ X|fn (x) > α}, (3.4)
n=1

assim como fn (x) é mensurável, então f e F também são.


Agora, observe que podemos escrever f ∗ e F ∗ da seguinte forma
n o
f ∗ (x) = lim inf fn (x) = sup
n→∞
inf fn (x) (3.5)
n>1 m>n

e
n o
F ∗ (x) = lim sup fn (x) = inf sup fn (x) , (3.6)
n>1 m>n

com isso e com o fato de fn (x) ser mensurável, obtemos que f e F são mensuráveis.

Corolário 1. Se (fn ) é uma sequência em M(X, Σ) a qual converge para f em X, então


f está em M(X, Σ).

Demonstração. Por hipótese, f (x) = lim fn (x), com (fn ) ∈ M (X, Σ). Sabemos que
n→∞
lim
n→∞
f n (x) = lim inf
n→∞
f n (x), pelo lema anterior temos que lim inf fn (x) ∈ M (X, Σ), logo
n→∞
f ∈ M (X, Σ).

A definição a seguir estabelece o que entendemos por convergência de uma sequência


de funções em alguns pontos. Essa definição será muito útil em um teorema importante,
que será apresentado no capítulo seguinte.
Capítulo 3. Funções Mensuráveis 17

Definição 14. Diz-se que uma sequência de funções fn em M (X, Σ) converge µ-quase todo
ponto (µ-q.t.p.) se existe um conjunto N ∈ Σ, com µ(N ) = 0, tal que f (x) = lim fn (x),
para todo x ∈/ N . Neste caso, se escreve

f = lim fn , µ-q.t.p.. (3.7)

3.2 Função escada


Para uma função ser Riemann integrável precisamos que ela sejam contínua na
maior parte de seu domínio. Conseguimos aproximar as próprias por funções escada. Esse
fato é necessário para conseguirmos mostrar uma das diferenças entre as integrais de
Riemann e Lebesgue.

Definição 15. Se uma função ϕ é uma combinação linear finita de funções características
de intervalos Ij :
n
X
ϕ(x) = aj χIj (x) (3.8)
j=1

então dizemos que ϕ é uma função escada.

Exemplo 9. A função de Heaviside dada por



 0, se x ∈ (−∞, 0)
H(x) =  (3.9)
1, se x ∈ (0, +∞)

é uma função escada.

3.3 Funções simples


Como dito acima conseguimos aproximar uma função Riemann integrável por uma
função escada. Para a integração de Lebesgue temos funções que fazem o mesmo papel
que as funções escada na integração de Riemann, que são as funções simples. O papel das
próprias é aproximar uma função mensurável(que é Lebesgue integrável).

Definição 16. Uma função de valores reais ϕ : X → R é simples, se ela é mensurável e


assume apenas um número finito de valores.
Uma função mensurável simples ϕ pode ser representada da forma
n
X
ϕ= aj χEj (3.10)
j=1

onde aj ∈ R são os valores que f assume em em cada Ej e χEj é uma função característica
de um conjunto Ej em Σ
Capítulo 3. Funções Mensuráveis 18

Exemplo 10. A função de Dirichlet dada por



 1, se x ∈ Q
D(x) =  (3.11)
0, se x ∈ R \ Q

é uma função simples, mas não é uma função escada.


Para fechar este capítulo apresentamos o lema que nos assegura que conseguimos
aproximar funções mensuráveis por funções simples.

Lema 6. Se f é uma função não negativa em M (X, Σ), então existe uma sequência (ϕn )
em M (X, Σ), tal que
(a) 0 6 ϕn (x) 6 ϕn+1 (x), para x ∈ X, n ∈ N.
(b) f (x) = lim ϕn (x), para cada x ∈ X.

Demonstração.
Vamos começar definindo uma função que nos ajudará a provar o que queremos.
Para N > 1, seja QN = [−N, N ], então definimos





f (x), se x ∈ QN e f (x) 6 N
FN (x) =

N, se x ∈ QN e f (x) > N .

 0,

caso contrário

Primeiro mostraremos que FN (x) → f (x), quando N → ∞ e ∀x. Para isso, nós
particionamos o intervalo de FN , ou seja, [0, N ]. Fixando N, M > 1, definimos
( )
l l+1
El,M = x ∈ QN ; < FN (x) 6 , para 0 6 l < M N.
M M

Então, podemos formar


X l
FN,M (x) = χE (x).
l M l,M
Com isso, FN,M é uma função simples.
Assim,
1
0 6 FN (x) − FN,M (x) 6 , ∀x.
M
Portanto, FN (x) → f (x).
Agora, escolha N = M = 2k , com k 6 1 e seja ϕk = F2k ,2k , então

1
0 6 FN (x) − ϕk (x) 6 , ∀x.
2k

Logo, ϕk é crescente e essa sequência satisfaz todas as propriedades desejadas.


19

4 Integral

Vamos expor neste capítulo a integral de Lebesgue e as algumas diferenças entre


as integrais de Lebesgue e de Riemann.

4.1 Integral de Lebesgue para funções não-negativas


Começaremos definindo a integral de uma função simples.

Definição 17. Se ϕ é uma função simples em M + (X, Σ), definimos a integral de ϕ com
respeito a λ como:
Z n
X
ϕ(x) dλ = aj λ(Ej )
j=1

Exemplo 11. Seja


 1, se x ∈ [0, 1] \ Q
f (x) =
 0, se x ∈ [0, 1] ∩ Q

Então, a função f é simples e pode ser escrita como

f (x) = 1 · χ[0,1]\Q + 0 · χ[0,1]∩Q

Com isso, temos a integral de f como


Z
f (x) dλ = 1 · λ([0, 1] \ Q) = 1 · 1 = 1.

O próximo Lema mostra a linearidade da integral de funções simples.

Lema 7. Sejam ϕ, ψ funções simples em M + (X, Σ) e c ∈ R, com c > 0. Então,

Z Z Z Z Z
c · ϕ(x) dλ = c ϕ(x) dλ e (ϕ(x) + ψ(x)) dλ = ϕ(x) dλ + ψ(x) dλ. (4.1)

Demonstração.
Se c = 0, então
Z Z Z Z
c · ϕ(x) dλ = 0 dλ = 0 = 0 ϕ(x) dλ = c ϕ(x) dλ.

Se c > 0, então c · ϕ ∈ M + (X, Σ), com isso


n
X
c · ϕ(x) = c · ai · χEi (x).
i=1
Capítulo 4. Integral 20

Assim,
Z n
X n
X Z
cϕ(x)dλ = cai λ(Ei ) = c ai λ(Ei ) = c ϕ(x)dλ.
i=1 i=1

Por hipótese ϕ e ψ são funções mensuráveis, então


n
X m
X
ϕ(x) = c · ai · χEi (x) e ψ(x) = c · bj · χFj (x),
i=1 j=1

assim
n X
X m n X
X m
ϕ(x) + ψ(x) = (ai χEi (x) + bj χFj (x)) = (ai + bj )χEi ∩Fj (x).
i=1 j=1 i=1 j=1

Com isso,
Z n X
X m n X
X m
ϕ(x) + ψ(x) dλ = (ai + bj )λ(Ei ∩ Fj ) = ai λ(Ei ∩ Fj ) + bj λ(Ei ∩ Fj )
i=1 j=1 i=1 j=1

Z n X
X m n X
X m
ϕ(x) + ψ(x) dλ = ai λ(Ei ∩ Fj ) + bj λ(Ei ∩ Fj ).
i=1 j=1 i=1 j=1

Como, X é a união de ambas as famílias disjuntas {Ei } e {Fj }, então


m
X n
X
λ(Ei ) = λ(Ei ∩ Fj ) e λ(Fj ) = λ(Ei ∩ Fj ).
j=1 i=1

Com isso,
Z n
X m
X
ϕ(x) + ψ(x) dλ = ai λ(Ei ) + bj λ(Fj ).
i=1 j=1

Lema 8. Se γ está definida em E ∈ Σ por


Z
γ(E) = ϕ(x)χE dλ,

então γ é uma medida em Σ.

Demonstração.
Observe que
n
X
ϕχE = aj χEi ∩E ,
i=1
com isso
Z n
Z X n
X Z n
X
γ(E) = ϕχE dλ = aj χEi ∩E dλ = aj χEi ∩E dλ = aj λ(Ei ∩ E)
i=1 i=1 i=1

Uma vez que a transformação E 7→ λ(EJ ∩ E) é uma medida, expressamos γ como


a combinação linear de medidas em X, logo γ é uma medida.
Capítulo 4. Integral 21

Agora apresentaremos a integral de Lebesgue e suas propriedades.

Definição 18. Se f ∈ M + (X, Σ), definimos a integral f com respeito a λ em R, como


Z Z 
f (x) dλ = sup ϕ(x) dλ; ϕ é simples e 0 6 ϕ(x) 6 f (x), ∀x ∈ X , (4.2)

ou seja, o supremo é estendido para todas as funções simples ϕ ∈ M + (X, Σ), satisfazendo
0 6 ϕ(x) 6 f (x) , ∀x ∈ X.
Se f ∈ M + (X, Σ) e E ∈ Σ, então f χE ∈ M + (X, Σ) e definimos a integral de f em
E com respeito a λ: Z Z
f (x) dλ = f (x)χE dλ (4.3)
E

Exemplo 12. Seja a função



 2, se x ∈ (1, 3)
f (x) =  ,
1, se x ∈ [3, 5)

então a integral de f com respeito a λ em R é


Z Z
f (x) dλ = f (x)χ(1,5) dλ = 2·λ((1, 3)) + 1·λ([3, 5)) = 2·(3−1) + 1·(5−3) = 2·2 + 1·2 = 6.
(1,5)

O lema a seguir mostra a monotonicidade da integral de Lebesgue.

Lema 9. Sejam as funções f, g ∈ M + (X, Σ).


a) Se f (x) 6 g(x), ∀ x ∈ X, então
Z Z
f (x) dλ 6 g(x) dλ.

b) Se os conjuntos E, F ∈ X, com E ⊆ F , então


Z Z
f (x) dλ 6 f (x) dλ.
E F

Demonstração.
a) Observe que
(Z ) (Z )
ϕ(x); ϕ simples e 0 6 ϕ 6 f ⊂ ϕ(x); ϕ simples e 0 6 ϕ 6 g ,

pois f 6 g.
Portanto,
Z (Z )
f (x) dλ = sup ϕ(x); ϕ simples e 0 6 ϕ 6 f 6

(Z ) Z
6 sup ϕ(x); ϕ simples e 0 6 ϕ 6 g = g dλ.
Capítulo 4. Integral 22

b) Sabemos que
Z Z (Z )
f (x) dλ = f (x)χE dλ = sup ϕ(x); ϕ simples e 0 6 ϕ 6 f χE .
E

Por hipótese E ⊆ F , então f χE 6 f χF . Com isso, pela parte a), obtemos que
Z Z Z Z
f (x) dλ = f (x)χE dλ 6 f (x)χF dλ = f (x) dλ.
E F

4.2 Teorema da Convergência Monótona


A integral de Lebesgue possui dois importantes teoremas de permutabilidade
do sinal de limite sobre o sinal de integral. O primeiro que veremos é o Teorema da
Convergência Monótona. Observe as hipóteses dos teoremas de passagem de limite sobre
integral que serão apresentados nesse capítulo, para podermos comparar com o teorema
que faz a mesma ação na integral de Lebesgue. Ao final seremos capazes de perceber a
maneira como a integral de Lebesgue facilita a ação de troca do sinal de limite com o sinal
de integral, em relação à integral de Riemann.

Teorema 3. (Teorema da Convergência Monótona) Se (fn ) é uma sequência de funções


monótona crescente em M + (X, Σ), a qual converge em todo ponto para f , então
Z Z
f (x) dλ = lim fn (x) dλ.
n→∞

Demonstração.
Por hipótese, temos que f n ↑ f , com fn mensurável, então pelo Corolário 1 obtemos
que f é mensurável. Sabemos que fn 6 fn+1 6 f , então pelo Lema 9,
Z Z Z
fn (x) dλ 6 fn+1 (x) dλ 6 f (x) dλ, ∀n ∈ N.

Assim, Z Z
lim fn (x) dλ 6 f (x) dλ. (4.4)
n→∞

Queremos mostrar a igualdade em (4.4). Então para a outra desigualdade sejam


α ∈ R, tal que 0 < α < 1, e ϕ uma função simples mensurável, satisfazendo 0 6 ϕ 6 f .
Considere
An = {x ∈ X; fn (x) > α · ϕ(x)},

temos que An ∈ Σ, An ⊆ An+1 e X = ∪An . Pelo Lema 9, obtemos que


Z Z Z
α · ϕ(x) dλ 6 fn (x) dλ 6 fn (x) dλ. (4.5)
An An+1
Capítulo 4. Integral 23

Como a sequência (An ) é monótona crescente e a união está em Σ, segue-se dos


lemas 7 e 3 que Z Z
ϕ(x) dλ = lim ϕ(x) dλ.
n→∞ An

Com isso, tomando o limite em (4.5) com respeito a n, obtemos


Z Z
α ϕ(x) dλ 6 lim fn (x) dλ.
n→∞

Como 0 < α < 1, ∀α, temos que


Z Z
lim
ϕ(x) dλ 6 n→∞ fn (x) dλ

e como ϕ é uma função simples mensurável arbitrária em M + (X, Σ), satisfazendo 0 6


ϕ 6 f , concluímos que
Z Z Z
f (x) dλ = sup ϕ(x) dλ 6 lim fn (x) dλ (4.6)
ϕ n→∞

Logo, juntando (4.4) e (4.6), obtemos


Z Z
f (x) dλ = lim fn (x) dλ.
n→∞

Exemplo 13. Seja {q1 , q2 , ...} = Q ∩ [0, 1] uma enumeração dos racionais entre 0 e 1.
Para cada k = 1, 2, ... , defina-se fk : [0, 1] −→ R por

 1, se x = {q1 , ..., qk }
fk (x) =
 0, caso contrário.

Então, f (x) = lim fk (x) é a função de Dirichlet. Concluímos do teorema da convergência


k→+∞
monótona que Z Z
f (x) dλ = lim fk (x) dλ = 0,
[0,1] k→+∞ [0,1]

logo f é integrável à Lebesgue. É claro que este resultado podia ser obtido de forma mais
rápida observando que a função de Dirichelet é uma função simples. Esse exemplo foi
retirado da seguinte referência [2].
O corolário a seguir mostra a linearidade da integral de Lebesgue.

Corolário 2. Sejam f, g ∈ M + (X, Σ) e c ∈ R, com c > 0, então


a) c · f ∈ M + (X, Σ) e
Z Z
c · f (x) dλ = c f (x) dλ.

b) f + g ∈ M + (X, Σ) e
Z Z Z
[f (x) + g(x)] dλ = f (x) dλ + g(x) dλ.
Capítulo 4. Integral 24

Demonstração.
a) Para c = 0, temos
Z Z Z Z
c · f (x) dλ = 0 dλ = 0 = 0 · f (x)dλ = c f (x) dλ.

Para c > 0, seja (ϕn ) uma sequência monótona crescente de funções simples em
+
M (X, Σ), então pelo Lema 6 (ϕn ) converge para f . Com isso, c · (ϕn ) é uma sequência
monótona convergindo para c · f . Assim, aplicando o Lema 7, parte a), e o Teorema da
Convergência Monótona, obtemos que
Z Z Z Z
c · f (x) dλ = n→∞
lim c · ϕn (x) dλ = c n→∞
lim ϕn (x) dλ = c f (x) dλ.

b) Sejam (ϕn ) e (ψn ) sequências monótonas crescentes de funções simples, então


pelo Lema 6 (ϕn ) e (ψn ) convergem para f e g, respectivamente. Com isso, (ϕn + ψn ) é
uma sequência monótona crescente que converge para f + g. Assim, aplicando o Lema 7,
parte a), e o Teorema da Convergência Monótona, obtemos que
Z Z
[f (x) + g(x)] dλ = n→∞
lim [ϕn (x) + ψn (x)] dλ
Z Z
= lim ϕn (x) dλ + lim ψn (x) dλ
n→∞ n→∞
Z Z
= f (x) dλ + g(x) dλ.

O Lema de Fatou é muito importante, pois é com ele que conseguimos a desigualdade
da permutabilidade do sinal de integral com o sinal de limite, quando não temos a hipótese
da sequência (fn ) ser crescente.

Lema 10. (Lema de Fatou) Seja (fn ) ∈ M + (X, Σ) uma sequência de funções. Então
Z Z
[lim inf fn (x)] dλ 6 lim inf fn (x) dλ.

Demonstração.
Seja gm = inf{fm , fm+1 , ...}, então gm 6 fm , para m 6 n. Com isso,
Z Z Z Z
gm (x) dλ 6 fn (x) dλ ⇒ gm (x) dλ 6 lim inf fn (x) dλ
n→∞

Uma vez que (gm ) é uma sequência crescente e que converge para lim inf fn , o
n→∞
Teorema da Convergência Monótona implica que
Z Z Z
lim inf fn (x) dλ = n→∞
n→∞
lim gm (x) dλ 6 lim inf
n→∞
fn (x) dλ.

Logo, Z Z
lim inf fn (x) dλ 6 lim inf fn (x) dλ.
n→∞ n→∞
Capítulo 4. Integral 25

Corolário 3. Se f pertence a M + (X, Σ) e ρ está definida em Σ por


Z
ρ(E) = f dλ,
E

então ρ é uma medida.

Demonstração.
Como f > 0 segue que ρ(E) > 0. Se E = 0, então fχE = 0 para todo ponto tal que
ρ(∅) = 0. Para ver que ρ é σ-aditivo, sejam (En )n∈N uma sequência disjunta de conjuntos
[
em Σ, com E = En e fn uma função definida por
n>1

n
X
fn = f χE k .
k=1

Pelo Corolário 2, item b), e pela indução, temos


Z n Z
X n
X
fn dλ = fχE dλ = ρ(Ek ).
k=1 k=1

Se fn é uma sequência crescente em M + (X, Σ) convergindo para fχE , o Teorema


da Convergência Monótona implica que
Z Z ∞
X
ρ(E) = fχE dλ = lim fn dλ = ρ(Ek ).
n→∞
k=1

Corolário 4. Suponha que f pertence a M + (X, Σ). Então,


Z
f (x) = 0 λ-q.t.p. em Σ se, e somente se, f (x) dλ = 0.

Demonstração.
(⇒) Sejam ϕ um função simples, com 0 6 ϕ(x) 6 f (x), ∀x, e o conjunto E = {x ∈
[
X; f (x) > 0} = En = {x ∈ X; f (x) > 1/n}. Então, por hipótese temos que λ(En ) = 0
n61
e ϕ(x) = 0 em E c .
Assim,
Z
ϕ(x) dλ = 0 · λ(E c ) + a1 · λ(E1 ) + ... + an · λ(En ) = 0,

pois cada λ(Ei ) = 0, para i ∈ {1, ..., n}.


Portanto,
Z (Z )
f (x) dλ = sup ϕ(x) dλ; ϕ é simples e 0 6 ϕ(x) 6 f (x) = 0.
Capítulo 4. Integral 26

(⇐) Seja
( )
[ 1 [
E = {x ∈ X; f (x) > 0} = x ∈ X; f (x) > = En ,
n>1 n n>1

1
um conjunto, temos que · χEn 6 f (x) · χEn , com isso
n
Z Z
1
0 = f (x) dλ > f (x) dλ > · λ(En ) > 0
En n

Assim, λ(En ) = 0, com isso λ(E) = 0.


Portanto, f (x) = 0, λ-q.t.p. .

Com o Corolário 4 ganhamos a permissão de colocar no corolário seguinte a hipótese


de que fn converge λ-q.t.p. para f .

Corolário 5. Se uma sequência de funções monótonas crescente (fn ) em M + (X, Σ), na


qual converge λ-q.t.p. em X para a função f ∈ M + (X, Σ), então
Z Z
f (x) dλ = lim fn (x) dλ.

Demonstração.
Seja N = {x ∈ X; fn (x) ↑ f (x)} ∈ Σ um conjunto, com λ(N c ) = 0.
Podemos, então, escrever

fn (x) = fn (x) · χN + fn (x) · χN c e f (x) = f (x) · χN + f (x) · χN c .

Com isso, fn (x) · χN c = fn (x) · λ(N c ) = 0 e f (x) · χN c = f (x) · λ(N c ) = 0, ambos


λ-q.t.p. , assim Z Z
fn (x) dλ = 0 e f (x) dλ = 0.
Nc Nc

Por hipótese, fn (x) · χN ↑ f (x) · χN , logo


Z Z Z Z
lim
n→∞
fn (x) dλ = n→∞
lim fn (x) dλ = f (x) dλ = f (x) dλ
N N

Com a integral de Lebesgue conseguimos passar o somatório infinito sobre o sinal


de integral. Isso é o que ganhamos com o resultado mostrado a seguir.

Corolário 6. Seja (gn ) uma sequência em M + (X, Σ), então


∞ ∞
Z ! Z !
X X
gn (x) dλ = gn (x) dλ . (4.7)
n=1 n=1
Capítulo 4. Integral 27

Demonstração.
Seja (hn ) uma sequência, dada por
n
X ∞
X
hn = gk (x) e h= gk (x).
k=1 k=1

Temos que hn ↑ h. Assim pelo teorema da Convergência Monótona, obtemos



Z X Z n
X n
Z X
gk (x) dλ = lim
n→∞
gk (x) dλ = n→∞
lim gk (x) dλ,
k=1 k=1 k=1

como o somatório é finito podemos passar ele sobre o sinal de integral, portanto
n
Z X n Z
X ∞ Z
X
lim
n→∞
gk (x) dλ = n→∞
lim gk (x) dλ = gk (x) dλ
k=1 k=1 k=1

Logo,

Z X ∞ Z
X
gk (x) dλ = gk (x) dλ
k=1 k=1

4.3 Integral de Lebesgue para funções não-negativas e negativas


Definimos, primeiramente, a integral de Lebegue somente para funções não-negativas
e apresentamos suas propriedades. Agora vamos estender essa definição para funções
negativas também.
Podemos escrever uma função f (x) da seguinte forma f (x) = f + (x) − f − (x), com
f + (x), f − (x) > 0.

Definição 19. A coleção L = L(X, Σ, λ) de funções integráveis consiste de todas as


funções Σ-mensurável de valores reais f em X, tal que ambas as partes positiva e negativa
f + , f − , de f tem integrais finitas com respeito a λ. Neste caso, definimos a integral de f
com respeito a λ como:
Z Z Z
f (x) dλ = +
f (x) dλ − f − (x) dλ. (4.8)

Se E ∈ Σ, definimos
Z Z Z
f (x) dλ = +
f (x) dλ − f − (x) dλ. (4.9)
E E E

Teorema 4. Uma função mensurável f pertence à L se, e somente se, |f | pertence à L.


Neste caso,
Z Z
f (x) dλ 6 |f (x)| dλ.
Capítulo 4. Integral 28

Demonstração.
(⇒) Observe que |f (x)| = f + (x) + f − (x). Por hipótese f é integrável, com isso f +
e f− também são integráveis, ou seja,
Z Z
+
f (x) dλ < ∞ e f − (x) dλ < ∞.

Portanto,
Z Z Z
|f (x)| dλ = +
f (x) dλ + f − (x) dλ < ∞.

Logo, |f | é integrável.
(⇐) Observe que 0 6 f + 6 |f | e 0 6 f − 6 |f |. Por hipótese |f | é integrável, então
f+ e f − também são integráveis, ou seja,
Z Z
f + (x) dλ < ∞ e f − (x) dλ < ∞.

Portanto,
Z Z Z
f (x) dλ = f + (x) dλ − f − (x) dλ < ∞.

Logo, f é integrável.
Assim,
Z Z Z
f (x) dλ = +
f (x) dλ − f − (x) dλ
Z Z
6 f + (x) dλ + f − (x) dλ
Z Z
= +
f (x) dλ + f − (x) dλ
Z
= |f (x)|dλ.

Corolário 7. Se f é mensurável, g é integrável e |f | 6 |g|, então f é integrável e


Z Z
|f (x)| dλ 6 |g(x)| dλ.

Demonstração.
Sabemos que |f | 6 |g|, então −|g| 6 f 6 |g|. Por hipótese g é integrável, então,
pelo Teorema 4, |g| é integrável, com isso f e |f | são integráveis também. Como |f | 6 0 e
|g| 6 0, então pela parte a) do Lema 8, obtemos que
Z Z
|f (x)| dλ 6 |g(x)| dλ.
Capítulo 4. Integral 29

Teorema 5. Sejam f, g ∈ L e c ∈ R. Então, c · f e f + g pertencem a L e


Z Z Z Z Z
α · f (x) dλ = α f (x) dλ, [f (x) + g(x)] dλ = f (x) dλ + g(x) dλ.

Demonstração.
Se α = 0, então 0 · f = 0, assim
Z Z Z Z
α · f (x) dλ = 0 dλ = 0 = 0 f (x) dλ = α f (x) dλ.

Se α > 0, então (αf )+ = αf + e (αf )− = αf − , assim


Z Z Z
α · f (x) dλ = +
α · f (x) dλ − α · f − (x) dλ
Z Z !
+ −
=α α · f (x) dλ − ·f (x) dλ
Z
=α f (x) dλ.

Se α < 0, então (αf )+ = −αf − e (αf )− = −αf + , assim


Z Z Z
α · f (x) dλ = −α · f − (x) dλ − −α · f + (x) dλ
Z Z

= −α f (x) dλ + α f + (x) dλ
Z Z !
+ −
=α α · f (x) dλ − ·f (x) dλ
Z
=α f (x) dλ.

Por hipótese f + g ∈ L, então f + g = (f + g)+ − (f + g)− = (f + + g + ) − (f − + g − ),


assim
Z Z Z
[f (x) + g(x)] dλ = + +
[f (x) + g (x)] dλ − [f − (x) + g − (x)] dλ
Z Z Z Z
= f + (x) dλ + g + (x) dλ − f − (x) dλ − g − (x) dλ
Z Z Z Z

= +
f (x) dλ − f (x) dλ + +
g (x) dλ − g − (x) dλ
Z Z
= f (x) dλ + g(x) dλ.

4.4 Teorema da Convergência Dominada


Já vimos um teorema para a permutação do sinal de limite com o sinal de integral
para a integral de Lebesgue, só que ele serve somente para sequência de funções monótonas
crescentes e abrange somente funções em M + (X, Σ), que é o Teorema da Convergência
Monótona. Agora com a ampliação da definição de integral de Lebesgue para funções
negativas ganhamos um outro teorema para a permutação dos determinados sinais.
Capítulo 4. Integral 30

Teorema 6. (Teorema da Convergência Dominada) Seja (fn ) uma sequência de funções


integráveis a qual converge µ-q.t.p. para f . Se existe uma função integrável g, tal que
|fn | 6 g para todo n, então f é integrável e
Z Z
f (x) dλ = n→∞
lim fn (x) dλ.

Demonstração.
Como fn → f e |fn | 6 g, temos que −g 6 fn 6 g ⇒ −g 6 f 6 g. Temos por
hipótese que g é integrável, então −g também é, com isso f é integrável.
Por hipótese, g − fn > 0 e g − fn → g − f , com isso o lema de Fatou implica que
Z Z
[g(x) − f (x)] dλ 6 lim inf [g(x) − fn (x)] dλ,
n→∞

assim Z Z Z Z !
g(x) dλ − f (x) dλ 6 g(x) dλ + lim inf
n→∞
− fn (x) dλ .

Sabemos que lim inf (−xn ) = − lim sup xn . Com isso


n→∞
Z Z Z Z
g(x) dλ − f (x) dλ 6 g(x) dλ − lim sup fn (x) dλ
n→∞
Z Z Z Z
⇒ − f (x) dλ 6 − lim sup fn (x) dλ ⇒ f (x) dλ > lim sup fn (x) dλ
n→∞ n→∞

Por outro lado, g + fn > 0 e g + fn → g + f , com isso o lema de Fatou implica que
Z Z
[g(x) + f (x)] dλ 6 lim inf [g(x) + fn (x)] dλ,
n→∞

assim Z Z Z Z
g(x) dλ + f (x) dλ 6 g(x) dλ + lim inf fn (x) dλ
n→∞
Z Z
⇒ f (x) dλ 6 lim inf
n→∞
fn (x) dλ.

Portanto,
Z Z Z
lim sup fn (x) dλ 6 f (x) dλ 6 lim inf fn (x) dλ.
n→∞ n→∞

Logo, Z Z
f (x) dλ = n→∞
lim fn (x) dλ.
Capítulo 4. Integral 31

4.5 Integral de Riemann


Nesta seção vamos relembrar a definição de integral de Riemann e algumas de suas
propriedades.

Definição 20. Uma partição do intervalo [a, b] é um subconjunto finito de pontos P =


{t0 , t1 , ..., tn } ⊂ [a, b], com a = t0 < t1 < ... < tn = b, tal que a, b ∈ P .
n
X
Observe que o somatório dos i-ésimos intervalos de P é dado por (ti −ti−1 ) = b−a.
i=1

Definição 21. Sejam uma função limitada f : [a, b] −→ R e P = {t0 , t1 , ..., tn } uma
partição de [a, b]. Temos as seguintes notações

mi = inf{f (x)|ti−1 6 x 6 ti }, Mi = sup{f (x)|ti−1 6 x 6 ti } e ωi = Mi − mi

que indicarão o ínfimo, o supremo e a oscilação de f no i-ésimo intervalo de P.

Definição 22. As somas inferior e superior de f relativamente à partição P são respecti-


vamente n
X
s(f ; P ) = m1 (t1 − t0 ) + ... + mn (tn − tn−1 ) = mi (ti − ti−1 )
i=1
e n
X
S(f ; P ) = M1 (t1 − t0 ) + ... + Mn (tn − tn−1 ) = Mi (ti − ti−1 )
i=1

Com isso, as integrais inferior e superior da função limitada f : [a, b] −→ R são definidas,
respectivamente, por Z b
f (x) dx = sup s(f ; P )
a P
e Z b
f (x) dx = inf S(f ; P ),
a P

o sup e o inf sendo tomados relativamente a todas as partições de P do intervalo [a, b].

Definição 23. Uma função limitada f : [a, b] −→ R diz-se integrável à Riemann quando
sua integral superior e sua integral inferior são iguais. Esse valor em comum chama-se a
integral de Riemann de f e é indicado por
Z b
f (x) dx.
a

Já apresentamos os teoremas para a passagem do sinal de limite sobre o sinal de


integral da integral de Lebesgue, agora mostraremos o teorema para fazer essa ação na
integral de Riemann. O teorema a seguir foi retirado da seguinte referência [3].

Teorema 7. Considere a sequência de funções integráveis fn : [a, b] −→ R, n ∈ N. Se fn


converge uniformemente para f : [a, b] −→ R, então f é integrável e
Z b Z b Z b
lim fn (x) dx = f (x) dx = lim fn (x) dx.
a x→∞ a x→∞ a
Capítulo 4. Integral 32

Definição 24. Seja f : [a, +∞) −→ R uma função, tal que para todo α ∈ (a, +∞), a
restrição de f ao intervalo [a, α] é limitada e Riemann integrável. A integral imprópria de
Riemann de f é definida por
Z ∞ Z α
f (x) dx = α→∞
lim f (x) dx,
a a

desde que o limite acima exista em R . Quando o limite é finito, dizemos que a integral
imprópria de f é convergente.

4.6 Riemann x Lebesgue


Nessa seção mostraremos algumas das diferenças das integrais de Riemann e
Lebesgue. Começaremos com um teorema que nos garante que se uma função é Riemann
integrável, então essa mesma função é Lebesgue integrável. Isso nos mostra que a integral
de Lebesgue veio justamente para expandir a noção de integral de Riemann.

Teorema 8. (Riemann x Lebesgue) Se f : [a, b] −→ R é integrável a Riemann, então f é


mensurável em [a, b] e
Z b Z
f (x) dx = f (x) dλ.
a [a,b]

Demonstração.
Observe que, existe M > 0, tal que |f (x)| 6 M . Por hipótese, f é Riemann
integrável, então existem (ϕn ) e (ψn ) funções escadas, tais que

1. |ϕn (x)| 6 M e |ψn (x)| 6 M , para n 6 1 e ∀x ∈ [a, b];

2. ϕ1 (x) 6 ϕ2 (x) 6 ... 6 f (x) 6 ... 6 ψ2 (x) 6 ψ1 (x) , ∀x ∈ [a, b];


Z b Z b Z b
3. limn→∞ ϕn (x) dx = n→∞
lim ψn (x) dx = f (x) dx.
a a a

Pela definição de função escada, obtemos que


Z b Z Z b Z
ϕn (x) dx = ϕn (x) dλ e ψn (x) dx = ψn (x) dλ.
a [a,b] a [a,b]

Defina ϕ(x) = limn→n ϕn (x) e ψ(x) = limn→n ψn (x), assim ϕ e ψ são mensuráveis
e pelo item 2 obtemos que ϕ(x) 6 f (x) 6 ψ(x). Com isso, o Teorema da Convergência
Dominada implica que
Z Z Z Z
lim ϕn (x) dλ = ϕ(x) dλ e lim ψn (x) dλ = ψ(x) dλ.
n→∞ [a,b] [a,b] n→∞ [a,b] [a,b]

Assim,
Capítulo 4. Integral 33

Z Z
ϕ(x) − ψ(x) dλ = lim ϕn (x) − ψn (x) dλ
[a,b] n→∞ [a,b]
Z Z
= lim ϕn (x) dλ − lim ψn (x) dλ
n→∞ [a,b] n→∞ [a,b]
Z b Z b
= lim ϕn (x) dx − lim ψn (x) dx
n→∞ a n→∞ a
Z b Z b
= f (x) dx − f (x) dx = 0.
a a

Temos que ϕn 6 ψn , então ϕ 6 ψ, assim ψ − ϕ > 0. Com isso, obtemos que


ψ − ϕ = 0, λ-q.t.p, assim ψ = ϕ, λ-q.t.p., portanto ψ = ϕ = f , λ-q.t.p, logo f é
mensurável.
Obtemos então que n→∞
lim ϕn (x) = ϕ(x) = f (x), λ-q.t.p., com isso o Teorema da
Convergência Dominada implica que
Z Z
lim ϕn (x) dλ = f (x) dλ,
n→∞ [a,b] [a,b]

pela definição de função escada e pelo item 3, obtemos que


Z b Z b Z Z
f (x) dx = lim ϕn (x) dx = lim ϕn (x) dλ = f (x) dλ.
a n→∞ a n→∞ [a,b] [a,b]

Abaixo temos duas figuras, uma representando a integral de Riemann e outra


representando a integral de Lebesgue. Nessas imagens podemos ter uma intuição de
como é cada uma das integrais. Vemos que cada uma das particiona eixos diferentes, na
integral de Riemann se particiona o domínio, enquanto a integral de Lebesgue particiona
o contra-domínio.

Figura 1 – Integrais de Riemann e Lebesgue

Agora vamos escrever a integral de uma função não-negativa que é Riemann


integrável da seguinte forma
Z (Z )
f (x) dx := sup φ(x) dx; 0 6 φ 6 f, φ é função escada .
Capítulo 4. Integral 34

E a integral de Lebesgue é da seguinte forma


Z (Z )
f (x) dλ := sup ϕ(x) dλ; 0 6 ϕ 6 f, ϕ é função simples

Lembrando que
Z n
X
φ(x) dx = aj |Ij |
j=1
e Z n
X
ϕ(x) dλ = aj λ(Ej ).
j=1

Com isso, podemos ver que na integral de Riemann multiplicamos cada aj pelo comprimento
de cada intervalo Ij , já na integral de Lebesgue multiplicamos cada aj pela medida de
cada conjunto Ej , isso vem do fato de termos estendido a função de medida para assim
ela conseguir medir conjuntos mais gerais. Observe ainda que os conjuntos Ej pode ser
intervalos como também podem não ser.
Vimos que na integral de Lebesgue temos três teoremas para a passagem do sinal
de limite sobre o sinal de integral, cujas suas hipóteses são mais fáceis de se obter, do
que pedir que uma sequência de funções (fn ) convirja uniformemente para uma função f ,
como é na integral de Riemann.
O exemplo a seguir mostra como temos a permutação do limite com a integral na
integração de Lebesgue, mas não temos na integração de Riemann.

Exemplo 14. Sejam a enumeração dos racionais no intervalo [a, b], dada por r1 , r2 , ..., rn , ...,
e 
 1, se x = rk
fn (x) = ,
 0, caso contrário

onde k = 1, 2, ..., n, ... .



 1, se x ∈ Q ∩ [a, b]
Então, limn→∞ fn (x) = f (x) =  .
0, se x ∈ [a, b] \ Q
Com isso, na integração de Riemann obtemos que
Z b
lim
n→∞ a
fn (x) dx = 0

e que Z b
f (x) dx (4.10)
a
não existe.
Assim, não conseguimos escrever
Z b Z b
f (x) dx = lim fn (x) dx (4.11)
a n→∞ a
Capítulo 4. Integral 35

Já na integral de Lebesgue, obtemos


Z
f (x) dλ = 0.

Logo, conseguimos escrever a equação (4.11) .


Agora vamos mostrar como a integral de Lebesgue se comporta na integração
imprópria, com o teorema seguir. Esse teorema e o próximo exemplo podem ser encontrados
na referência [8].

Teorema 9. Seja f : [a, +∞) −→ R uma função, tal que para todo α ∈ (a, +∞), a
restrição de f ao intervalo [a, α] é limitada e Riemann integrável. Então,
i) f é mensurável
ii) se f é Lebesgue integrável em [a, +∞), obtemos que
Z Z +∞
f dλ = f dx. (4.12)
[a,+∞) a

Demonstração.
Seja (un )n∈N uma sequência arbitrária em (a, +∞), tal que un → ∞. Pelo Teorema
8, a restrição de f ao intervalo [a, un ] é Lebesgue integrável e:
Z Z un
f dλ = f dx, (4.13)
[a,un ] a

∀n > 1. Com isso, n→∞


lim fχ[a,un = f . Como fχ[a,un é mensurável, ∀n > 1, então f é
mensurável.
Agora para mostrar (4.12), lembre-se de (4.13), é suficiente mostrar que
Z Z
lim
n→∞
f dλ = f dλ, (4.14)
[a,un ] [a,+∞]

para todo sequência un em (a, +∞), com un → ∞. Vamos verificar (4.14), primeiro para
o caso em que f é não negativa. Pelo Lema de Fatou, temos
Z Z Z Z
f dλ = lim inf fχ[a,un ] dλ 6 lim inf fχ[a,un ] = lim inf f dλ.
[a,+∞] [a,+∞] n→∞ n→∞ [a,+∞] n→∞ [a,un ]

Por outro lado, Z Z


f dλ 6 f dλ,
[a,un ] [a,+∞]

∀n > 1, com isso


Z Z Z Z
f dλ 6 lim inf
n→∞
f dλ 6 lim sup f dλ 6 f dλ,
[a,+∞] [a,un ] n→∞ [a,un ] [a,+∞]

portanto (4.14) está provado para f > 0. Em geral, se f : [a, +∞) −→ R é uma função
Lebesgue integrável, então (4.14) é satisfeita para f + e f − , pois f + > 0 e f − > 0, ou seja,
Z Z Z Z

lim
n→∞ [a,un ]
+
f dλ = f dλ+
e lim
n→∞ [a,un ]
f dλ = f − dλ.
[a,+∞] [a,+∞]
Capítulo 4. Integral 36

Com isso,
Z Z Z
lim f dλ = lim +
f dλ − lim f − dλ
n→∞ [a,un ] n→∞ [a,un ] n→∞ [a,un ]
Z Z
= +
f dλ − f − dλ
[a,+∞] [a,+∞]
Z
= f dλ.
[a,+∞]

No exemplo a seguir veremos que é possível que uma função tenha uma integral
imprópria de Riemann convergente, mas que não seja Lebesgue integrável.
sin (x)
Exemplo 15. Considere a função f : [0, +∞) −→ R definida por f (x) = , ∀x > 0
x
e f (0) = 1. Temos que f é contínua e portanto f |[0,u] é limitada e Riemann integrável
para todo u ∈ (0, +∞). Temos que f se anula nos pontos kπ, com k inteiro positivo, f é
positiva nos intervalos da forma (kπ, kπ + π), com k inteiro positivo par e f é negativa nos
intervalos da forma (kπ, kπ + π), com k inteiro positivo ímpar. Para cada inteiro k > 0,
seja Z
ak = |f | dλ > 0.
[kπ,kπ+π]

Assim,
Z ∞ Z ∞
+ −
X X
f dλ = ak , f dλ = ak (4.15)
[0,+∞] k=0,kpar [0,+∞] k=1,kímpar

Além do mais,
Z n−1
(−1)k ak ,
X
f dλ =
[0,nπ] k=0
e portanto,
Z n−1 ∞
(−1)k ak = (−1)k ak .
X X
lim
n→∞
f dλ = n→∞
lim
[0,nπ] k=0 k=0

Façamos algumas estimativas sobre os números ak . Para x ∈ [kπ, kπ + π], temos


sin x 1
6
x kπ
e portanto
1 1
(kπ + π − kπ) = ,
ak 6
kπ k
para todo k > 1. Segue que ak → 0. Vamos mostrar que a sequência (ak )k>1 é decrescente.
Temos Z
sin (x)
ak+1 = dλ
[kπ+π,kπ+2π] x
Z
sin (x + π)
= dλ
[kπ,kπ+π] x+π
Capítulo 4. Integral 37

Z
sin (x)
= dλ
[kπ,kπ+π] x+π
Z
sin (x)
6 dλ = ak ,
[kπ,kπ+π] x
note que na segunda igualdade acima fizemos a mudança y = x − π na integral de Riemann
e como a medida λ é invariante por translação, com isso temos o resultado que queríamos.

(−1)k ak
X
Com esse resultado e o fato de ak → 0, segue do critério de Dirichlet que a série
k=0
converge.
Defina

(−1)k ak = L ∈ R.
X

k=0
Agora vamos mostrar que Z
lim f dλ = L. (4.16)
u→∞ [0,u]

Dado  > 0, existe n0 , tal que


n

(−1)k ak < ,
X
L−
k=0 2

para todo n > n0 . Podemos escolher n0 também de modo que an < /2, ∀n > n0 . Dado
u ∈ R, u > n0 π, seja n > n0 o maior inteiro, tal que nπ 6 u, com isso nπ 6 u < nπ + π e
Z Z Z n Z
k
X
f dλ = f dλ − f dλ = (−1) ak − f dλ.
[0,u] [0,nπ+π] [u,nπ+π] k=0 [u,nπ+π]

Com isso,
Z n Z
(−1)k ak +
X
L− f dλ 6 L − f dλ
[0,u] k=0 [u,nπ+π]

n
(−1)k ak + an < ,
X
6 L−
k=0

∀u > n0 π. Isso prova (4.16). Concluímos então que


Z ∞
f dx = L ∈ R.
0

A seguir mostraremos que f não é Lebesgue integrável. Para isso, vamos fazer
uma estimativa inferior para os números ak . Dado um inteiro k > 0, obtemos, para
kπ + π/4 6 x 6 kπ + π − π/4, que
√ √
2 sin (x) 2 1
| sin (x)| > e > ,
2 x 2 kπ + π
com isso

Z Z
sin (x) 2 1 π
ak = |f | dλ > dλ > .
[kπ,kπ+π] [kπ+ π4 ,kπ+π− π4 ] x 2 kπ + π 2
Capítulo 4. Integral 38

Segue que as séries em (4.15) são divergentes. Portanto,


Z Z
f + dλ = +∞ = f − dλ.
[0,∞] [0,∞]

Logo, f não é Lebesgue integrável.


39

5 Os espaços Lp

Neste capítulo vamos apresentar o espaços Lp , com 1 6 p < ∞, cujos os elementos,


que são funções, são Lebesgue integráveis. Veremos mais adiante que com a norma adequada
os espaços Lp são completos.
Depois de expormos os espaços Lp vamos focar no espaço L2 , esse espaço é chamado
espaço de Hilbert.

5.1 Norma
Queremos construir um espaço de funções Lebesgue integráveis, para que ele seja
um espaço vetorial normado. Então, para começarmos vamos definir o que é uma norma.

Definição 25. Se V é um espaço vetorial. Uma função N em V é dita uma norma para
V se satisfaz:
i) N (v) > 0, ∀v ∈ V ;
ii) N (v) = 0 se, e somente se, v = 0;
iii) N (αv) = |α|N (v), para todo v ∈ V e α ∈ R;
iv) N (u + v) 6 N (u) + N (v), ∀u, v ∈ V .
Se a condição ii) é descartada, a função N é dita uma semi-norma (ou uma pseudo-
norma) para V. Um espaço vetorial normado é um par (V, N ), onde V é um espaço vetorial
e N é uma norma.
Assim, a seguir definiremos quem é a norma do espaço L(X, Σ, λ) e mostraremos
que ela é uma semi-norma.

Definição 26.
Z Seja (X, Σ, λ) um espaço de medida. Se f ∈ L(X, Σ, λ), definimos
Nλ (f (x)) = |f (x)| dλ.

Lema 11. O espaço L(X, Σ, λ) é um espaço vetorial com as operações definidas por

(f + g)(x) = f (x) + g(x) e (αf )(x) = αf (x) , x ∈ X

e Nλ é uma semi-norma em L(x, Σ, λ). Além disso, Nλ (f (x)) = 0 se, e somente se, f (x) = 0,
λ-q.t.p, para x ∈ X.

Demonstração.
É claro que L = L(X, Σ, λ) é um espaço linear sobre as operações indicadas.
Capítulo 5. Os espaços Lp 40

`: Nλ é uma semi-norma.
Z
i) Nλ (f (x)) = |f (x)| dλ > 0, para f ∈ L.
Z Z Z
iii) Nλ (α · f (x)) = |αf (x)| dλ = |α||f (x)| dλ = |α| |f (x)| dλ = |α|Nλ (f (x)).
Z Z Z
iv) Nλ (f (x) + g(x)) = |f (x) + g(x)| dλ 6 |f (x)| + |g(x)| dλ = |f (x)| dλ +
Z
+ |g(x)| dλ = Nλ (f (x)) + Nλ (g(x)).
Agora vamos mostrar que Nλ (f (x)) = 0 ⇔ f (x) = 0, λ-q.t.p., para x ∈ X.
(⇒) Se Nλ (f (x)) = 0, então
Z
f (x) dλ = 0

Com isso, pelo Corolário 4, obtemos que f (x) = 0, λ-q.t.p., para x ∈ X.


(⇐) Se f (x) = 0, então pelo Corolário 4 obtemos que
Z
f (x) dλ = 0,

ou seja, Nλ (f (x)) = 0, λ-q.t.p., para x ∈ X.

Como dito no início procuramos um espaço vetorial normado de funções Lebesgue


integráveis. Apresentaremos esse espaço e a seguir provaremos que de fato ele é normado.

Definição 27. Sejam f , g ∈ L = L(X, Σ, λ), f e g são ditas λ-equivalente. Se f = g em


λ-q.t.p., x ∈ X. A classe de equivalência determinada por f em L é às vezes denotada por
[f ] e consiste no conjunto de todas as funções em L, as quais são λ-equivalentes a f .

Definição 28. O espaço de Lebesgue L1 = L1 (X, Σ, λ) consiste de todas as λ-classes de


equivalência em L. Se [f ] ∈ L1 , então f ∈ L e definimos a norma de [f ], por
Z
k [f ] k1 = |f (x)| dλ.

Teorema 10. O espaço de Lebesgue L1 (X, Σ, λ) é um espaço vetorial normado.

Demonstração.
Sabemos que as operações vetoriais em L1 estão definidas por α[f ] = [αf ] e
[f ] + [g] = [f + g],Z e que o elemento neutro em L1 é [0]. Mostraremos somente que a
equação k [f ] k1 = |f | dλ define uma norma em L1 .
Z
Certamente k [f ] k1 > 0 e k [0] k1 = 0. Além disso, se k [f ] k1 = 0, então |f | dλ = 0,
assim f (x) = 0, λ-q.t.p., para x ∈ X. Portanto, [f ] = [0], com isso as propriedades (iii) e
(iv) da primeira definição são satisfeitas. Logo, k · k1 rende uma norma em L1 .
Capítulo 5. Os espaços Lp 41

5.2 Lp, com 1 ≤ p < ∞:


Agora queremos considerar uma família de espaços vetoriais relacionados com
normas de equivalência de classes de funções mensuráveis.
Nesta seção veremos o que um espaço vetorial precisa para ser completo e conhece-
remos os espaços de Banach.
Para facilitar a notação, daqui em diante, denotaremos a classe de equivalência de
f em L por f , em vez de [f ].

Definição 29. Se 1 6 p < ∞, o espaço Lp = Lp (X, Σ, λ) consiste de todas as λ-classes


de equivalência de funções mensuráveis reais f , onde |f |p tem integral finita, com respeito
a λ. Duas funções são λ-equivalentes, se elas são iguais µ-q.t.p., com isso temos a seguinte
norma
Z ! 1/p
k f (x) kp = |f (x)|p dλ

Os teoremas seguintes são três desigualdades importantes no espaço Lp . Suas


demonstrações não estarão aqui, pois não são relevantes ao objetivo deste texto. Elas
podem ser encontradas na referência [1] na página 56.
1 1
Teorema 11 (Desigualdade de Holder). Sejam f ∈ Lp e g ∈ Lq , onde p > 1 e p
+ q
= 1.
Então, f (x) · g(x) ∈ L1 e

k f (x) · g(x) k1 6 k f (x) kp · k g(x) kq .

Teorema 12 (Desigualdade de Cauchy-Schwarz). Se f, g ∈ L2 , então f (x)·g(x) é integrável


e Z Z
f (x) · g(x) dλ 6 |f (x) · g(x)| dµ 6 k f (x) k2 · k g(x) k2 .

Teorema 13 (Desigualdade de Minkowski). Se f, h ∈ Lp , p > 1, então f (x) + h(x) ∈ Lp


e
k f (x) + h(x) kp 6 k f (x) kp + k h(x) kp .

Definição 30. Uma sequência (fn )n∈N em Lp converge em Lp para f ∈ Lp , se para todo
 > 0 dado, existe um número natural N > 0, tal que se n > N , então k fn − f kp < .

Definição 31. Uma sequência (fn )n∈N é dita de Cauchy se para todo  > 0, existir um
n0 ∈ N, tal que m, n > n0 implica que k fm − fn kp < .

Lema 12. Se a sequência (fn )n∈N ∈ Lp converge para f ∈ Lp , então esta é uma sequência
de Cauchy.

Demonstração.
Capítulo 5. Os espaços Lp 42

Por hipótese (fn ) → f em Lp , ou seja, ∀/2 > 0, ∃n0 ∈ N, tal que n > n0 ⇒
k fn (x) − f (x) k< /2. Com isso, para m, n > n0 temos que

k fm (x) − fn (x) k=k fm (x) − f (x) + f (x) − fn (x) k=k fm (x) − f (x) − [fn (x) − f (x)] k6
 
6k fm (x) − f (x) k + k fn (x) − f (x) k< + = .
2 2

Teorema 14 (da Completude). Se 1 6 p < ∞, então o espaço Lp (R) é um espaço vetorial


normado completo com a norma
(Z )1/p
p
k f (x) kp = |f (x)| dλ .

Demonstração.
Como visto anteriormente o espaço Lp (R) é um espaço vetorial normado. Agora,
para estabelecer a completude, seja (fn )n∈N uma sequência de Cauchy relativa a norma
k · kp . Assim, dado  > 0, existe M (), tal que se m, n > M (), então
Z
|fm − fn |p dλ = k fm − fn kpp < p . (5.1)

Com isso, existe uma subsequência, (gk )k∈N , de fn , tal que k gk+1 − gk kp < 2−k ,
para k ∈ N. Defina g por

X
g(x) = |g1 (x)| + |gk+1 (x) − gk (x)|, (5.2)
k=1

com isso g ∈ M + (X, Σ). Então, pelo lema de Fatou, temos que
Z Z ( n
)p
P
X
|g| dλ 6 lim inf
n→∞
|g1 | + |gk+1 − gk | dλ.
k=1

Pegando a p-ésima raiz de ambos os lados e aplicando a Desigualdade de Minkowski


obtemos
(Z )1/p ( n
)
p
X
|g| dλ 6 lim inf k g1 k + k gk+1 − gk k 6 k g1 kp +1.
n→∞
k=1

Consequentemente, se E = {x ∈ X; g(x) < +∞}, então E ∈ X e λ(X \ E) = 0.


Assim, a série em (5.2) converge λ-q.t.p. e gχE ∈ Lp (R).
Agora, definimos f em X por
 P∞
g1 (x) + k=1 {gk+1 (x) − gk (x)}, se x ∈ E

f (x) = .
 0, caso contrário
Capítulo 5. Os espaços Lp 43

k−1
X
Como |gk | 6 |g1 |+ |gj+1 (x)−gj (x)| 6 g e gk converge λ-q.t.p. para f , o Teorema
j=1
da Convergência Dominada implica que f ∈ Lp (R). Desde que |f − gk |p 6 2p g p , obtemos,
do Teorema da Convergência Dominada, que 0 = n→∞lim k f − gk kp , com isso gk converge
em Lp (R) para f .
Como visto em (5.1), se m > M () e k é suficientemente grande, então
Z
|fm − gk |p dλ < p .

Aplicando o Lema de Fatou, concluímos que


Z Z
p
|fm − f | dλ 6 lim inf
n→∞
|fm − gk |p dλ 6 p ,

sempre que m > M (). Isto prova que a sequência fn converge para f , na norma de
Lp (R).

Um espaço X é um espaço de Banach se, e somente se, toda sequência de Cauchy


em X converge e seu limite ainda é um elemento de X. Ou seja, X é um espaço normado
completo. Com isso, Lp é um espaço de Banach. Assim, o teorema anterior pode ser escrito
como: O espaço Lp é um espaço de Banach sobre a norma dada por
(Z )1/p
p
k f (x) kp = |f (x)| dλ . (5.3)

A definição e o teorema a seguir vamos fazer somente para L1 e L2 , respectivamente,


pois é o que iremos utilizar no próximo capítulo.

Definição 32. Dizemos que uma família G de funções integráveis é densa em L1 , se para
qualquer f ∈ L1 e  > 0, existe g ∈ G, tal que k f − g k1 < .

Teorema 15. O espaço L2 (R) é separável, no sentido de que existe uma coleção enumerável
{fk } de elementos em L2 (R), de modo que suas combinações lineares sejam densas em
L2 (R).

Demonstração.
Considere a família de funções da forma rχE (x), onde r é um número complexo com
partes reais e imaginárias racionais, e E é um retângulo em R com vértices de coordenadas
racionais.
`: Combinações lineares finitas desse tipo de função são densas em L2 (R).
Suponha f ∈ L2 (R) e seja  > 0. Considere, para cada n > 1, a função gn definida
por 
 f (x), se |x| 6 n e |f (x)| 6 n
gn (x) = .
 0, caso contrário
Capítulo 5. Os espaços Lp 44

Então, |f − gn |2 6 4|f |2 e gn (x) → f (x), q.t.p.. O Teorema da Convergência Dominada,


implica que k f − gn k22 → 0, quando n → ∞, com isso

k f − gN k2 < , para algum N.
2

Seja g = gn . Observe que g é uma função limitada, com g(x) 6= 0, ∀x em um


conjunto limitado,
Z com isso g ∈ L1 (R). Assim, conseguimos uma função escada, ϕ, tal que
|ϕ| 6 N e |g − ϕ| dλ < 2 /16N . Substituindo os coeficientes e retângulos, que aparecem
na forma canônica de ϕ, por números complexos, com partes racionais reais e imaginárias,
e retângulos, por coordenadas racionais, podemos encontrar um ψ com |ψ| 6 N e
Z
|g − ψ| dλ < 2 /8N . Com isso, podemos notar que

Z
2
Z
2
|g − ψ| dλ 6 2N |g − ψ| dλ 6 .
4

Logo, k g − ψ k< /2, assim k f − ψ k< , ou seja, L2 (R) é separável.


45

6 Espaços de Hilbert e Séries de Fourier

Agora que sabemos o que é um espaço Lp , vamos focar em um espaço específico


que é o L2 , pois ele é o único dos espaços Lp munido do produto interno, o que o torna
um espaço de Hilbert. Daremos mais atenção a ele, pois um dos objetivos desse texto
é perceber a importância do Teorema de Riez-Fisher para com as séries de Fourier e,
para isso, precisaremos da estrutura do espaço de Hilbert. Este capítulo é baseado nas
referências [7] e [5].

6.1 Espaços de Hilbert

Definição 33. Seja V um espaço vetorial sobre R. Um produto interno sobre V é uma
função h·, ·i : V × V −→ R que satisfaz as seguintes propriedades, para todo u, v, w ∈ V e
α, β ∈ R,
i) hv, vi > 0;
ii) hv, vi = 0 se, e somente se, v = 0;
iii) hαu + βv, wi = αhu, wi + βhv, wi;
iv) hv, wi = hw, vi;
O produto interno induz uma norma via k f k2 = hf, f i. De fato k f k é uma norma
i) k f k2 = hf, f i > 0;
ii) k f k2 = hf, f i = 0 ⇔ f = 0;
iii) k αf k2 = hαf, αf i = αhf, αf i = α2 hf, f i;
iv) k f + g k2 = hf + g, f + gi = hf, f i + hf, gi + hg, f i + hg, gi
=k f k2 +2hf, gi+ k g k2
6k f k2 +2 k f kk g k + k g k2
= (k f k + k g k)2
∀f, g ∈ V e ∀α ∈ R.

Definição 34. Um espaço de Hilbert é um par (H, h·, ·i), onde H é um espaço vetorial sobre
R e hf, gi é o produto interno, ∀f, g ∈ H, onde H é completo na métrica d(f, g) = k f −g k.
Nos exemplos a seguir apresentamos dois importantes espaços de vetoriais e mos-
tramos que de fato eles são espaços de Hilbert.

Exemplo 16. Se E é um subconjunto mensurável de R, com m(E) > 0, então L2 (E)


Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 46

denota o espaço de funções integráveis quadradas, que são diferentes de 0, que estão em E,
( Z )
2
L2 (E) = f ∈ E; |f (x)| dλ < ∞ .
E

Z !1/2
2
Vamos mostrar que k f k= |f (x)| dλ é uma norma. Sejam f, g ∈ L2 (E)
E
e α ∈ R. Então
Z !1/2
2
i) k f k= |f (x)| dλ > 0, pois |f (x)| > 0;
E

Z !1/2
2
ii) (⇒) Se k f k= 0, então |f (x)| dλ = 0. O Corolário 4 implica que
E
f = 0, λ-q.t.p. .
Z !1/2
2
(⇐) Se f (x) = 0, então pelo Corolário 4, obtemos que |f (x)| dλ = 0, ou
E
seja, k f k = 0.
Z !1/2
2
iii) k αf k = |αf (x)| dλ
E

Z !1/2
2 2
= |α| |f (x)| dλ
E

Z !1/2
2 2
= |α| |f (x)| dλ
E

Z !1/2
2
= |α| |f (x)| dλ
E

= |α| k f k.
Z
iv) k f + g k = 2
|f (x) + g(x)|2 dλ
E
Z
= |f 2 (x) + 2f (x)g(x) + g 2 (x)| dλ
E
Z
6 |f (x)|2 + 2|f (x)g(x)| + |g(x)| dλ
E
Z Z Z
2
= |f (x)| dλ + 2|f (x)g(x)| dλ + |g(x)| dλ
E E E
Z
=k f k2 +2 |f (x)g(x)| dλ+ k g k2 .
E
Pela Desigualdade de Cauchy - Schwarz, temos que
Z
2
k f k +2 |f (x)g(x)| dλ+ k g k2 6 k f k2 +2 k f kk g k + k g k2 .
E

Com isso,

k f + g k2 6 k f k2 +2 k f kk g k + k g k2
= (k f k + k g k)2 .
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 47

Logo, k f + g k 6 k f k + k g k.
Sabemos que E ⊂ Rd e que L2 (Rd ) é completo com a métrica d(f, g) = k f − g k,
então L2 (E) é completo com a métrica d(f, g) = k f − g k.
Logo, L2 (Rd ) é um espaço de Hilbert.
Note que L2 (Rd ) é separável e que E ⊂ Rd , então obtemos que L2 (E) é separável.

Exemplo 17. Seja `2 (N) o espaço, definido por


+∞
( )
2 2
X
` (N) = (a0 , a1 , ...); ai ∈ R, |an | < ∞ .
n=0

Sejam (an )n∈N , (bn )n∈N sequências numéricas. Se denotarmos sequências infinitas por a e
b, o produto interno e a norma em `2 (N) são, respectivamente,
+∞ +∞
!1/2
2
X X
ha, bi = ak b k e kak= |an | . (6.1)
n=0 n=0

Vamos provar que h·, ·i é realmente um produto interno. Sejam a, b, c ∈ `2 (N) e α ∈ R,


então
+∞ +∞
a2k > 0;
X X
i) ha, ai = ak aK =
n=0 n=0
+∞
a2k = 0 ⇒ a2k = 0 ⇒ ak = 0, ∀k. Logo, a = 0.
X
ii) (⇒) Se ha, ai = 0, então
n=0
+∞
a2k = 0.
X
(⇐) Se a = 0, então ha, ai =
n=0
+∞
X
iii) hαa + b, ci = (αak + bk )ck
n=0
+∞
X
= αak ck + bk ck
n=0
+∞
X +∞
X
= αak ck + bk c k
n=0 n=0
+∞
X +∞
X
=α ak c k + bk c k
n=0 n=0

= αha, ci + hb, ci.


+∞
X +∞
X
iv) ha, bi = ak b k = bk ak = hb, ai.
n=0 n=0

Portanto, h·, ·i é um produto interno. Esse produto interno induz a norma em (6.1).
Agora, vamos provar que `2 (N) é completo na métrica d(a, b) =k a − b k. De fato,
seja (an )n∈N sequência de Cauchy em `2 (N). Dado  > 0, existe N , tal que m, n > N ⇒
k an − am k=k an − am k< .
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 48

Fixado k, temos que (ank )n∈N é de Cauchy em R, como R é completo, então existe
aek , tal que ank → aek .
Seja a∞ = (ae1 , ae2 , ae3 , ...).
`: a∞ ∈ `2 .
Fixe L ∈ N. Sabemos que toda sequência de Cauchy é limitada, então
L L
|ank |2 6 c < ∞ ⇒ |aek |2 6 c < ∞ ⇒k a∞ k`2 = |aek |2 6 c < ∞.
X X X

k=1 k=1 k>1

`: an → a∞ em `2 .
Fixado L ∈ N. Dado  > 0, existe N , tal que m, n ∈ N, então
L L ∞
|ank − amk |2 <  ⇒ |aek − amk |2 6  ⇒ |aek − amk |2 6 .
X X X

k=1 k=1 k=1

Logo, `2 (N) é um espaço de Hilbert.

6.2 Ortogonalidade e Bases Ortonormais


Os espaços de Hilbert possuem uma propriedade especial que os distingue dos
outros espaços vetoriais normados, que é a propriedade de ortogonalidade.

Definição 35. Dois elementos f e g em um espaço de Hilbert H, com produto interno


h·, ·i, são ortogonais (ou perpendiculares), se hf, gi = 0. Escrevemos f ⊥ g .

Teorema 16 (Teorema de Pitágoras). Se f ⊥ g, então k f + g k2 = k f k2 + k g k2 .

Demonstração.
Por hipótese hf, gi = 0, então hg, f i = 0.
Assim,

k f + g k2 = hf + g, f + gi
= hf + g, f i + hf + g, gi
= hf, f i + hg, f i + hf, gi + hg, gi
= hf, f i + hg, gi.

Logo, k f + g k2 = k f k2 + k g k2 .

Definição 36. Um subconjunto finito ou infinito enumerável {e1 , e2 , ...} de um espaço de


Hilbert é ortonormal, se 
 1, se i = j
hei , ej i = 
0, se i 6= j
Em outras palavras, cada ei tem norma unitária e é ortogonal a ej , sempre que i 6= j.
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 49

Proposição 7. Se {ek }∞ ak ek ∈ H, onde a soma é finita, então


P
k=1 é ortonormal e f =
n
|ak |2 .
X
k f k2 =
k=1

Demonstração.

n
k f k2 = k ak ek k2
X

k=1
Xn n
X
= h ak e k , ak e k i
k=1 k=1
n
X Xn
= hak ek , ak e k i
k=1 k=1
Xn Xn
= hak ek , ak ek i
k=1 k=1
Xn
= hak ek , ak ek i
k=1
n
|ak |2 .
X
=
k=1

Adiante definiremos o que é uma base ortonormal e mostraremos que qualquer


espaço de Hilbert separável tem uma base ortonormal.

Definição 37. Seja {e1 , e2 , ...} = {ek }∞


k=1 um subconjunto ortonormal de H. Se as combi-
nações lineares finitas de elementos em {e1 , e2 , ...} são densas em H, então {ek }∞
k=1 é uma
base ortonormal para H.
Com essa definição, conseguimos escrever qualquer função do espaço de Hilbert
como um somatório dos elementos da base ortonormal com constantes, ou seja, tome
{ek }∞
k=1 sendo uma base ortonormal em H, então qualquer f ∈ H é da seguinte forma

X
f= ak ek , para algumas constantes ak ∈ R.
k=1
E ainda que, se aplicarmos o produto interno de ambos os lados com ej , ou seja,
hf, ej i = h ak ek , ek i, lembrando-se que {ek } é ortonormal, então hf, ej i = aj , isto é, a
P

representação é única.

Teorema 17. Qualquer espaço de Hilbert separável tem uma base ortonormal.

Demonstração.
Por hipótese um espaço de Hilbert H é separável, então podemos escolher uma
coleção enumerável de elementos F = {hk } em H, de modo que as combinações lineares
finitas de elementos em F sejam densas em H.
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 50

Se em seguida, sucessivamente, desconsiderarmos os elementos hk que são com-


binações lineares dos elementos anteriores h1 , h2 , ..., hk−1 , então a coleção resultante
h1 = f1 , f2 , ..., fk , ... consiste de elementos linearmente independentes, cujas combina-
ções lineares finitas são as mesmas dadas por h1 , h2 , ..., hk , ... e portanto, essas combinações
lineares também são densas em H.
Afirmação: Existe uma sequência de vetores ortonormais e1 , e2 , ..., tal que Span({e1 , ..., en })
= Span({f1 , ..., fn }), ∀n > 1.
De fato, pela hipótese de independência linear, f1 6= 0, então podemos tomar
e1 = f1 / k f1 k, com isso, pelo processo de Gram-Schmidt Span({e1 }) = Span({f1 }).
Agora, suponha que os vetores ortonormais e1 , ..., ek foram encontrados, tais que
Span({e1 , ..., ek }) = Span({f1 , ..., fk }), para um dado k. Então, para e 0 k+1 , temos que
k
X
fk+1 + aj ej , com isso para termos he 0 k+1 , ej i = 0, precisamos que aj = −hfk+1 , ej i, e
j=1
essa escolha de aj , para 1 6 j 6 k, assegura que e 0 k+1 seja ortogonal a e1 , ..., ek . Além disso,
nossa hipótese de independência assegura que e 0 k+1 6= 0, portanto ek+1 = e 0 k+1 / k e 0 k+1 k.
Assim, pelo processo de Gram-Schmidt, Span({e1 , ..., ek , ek+1 }) = Span({f1 , ..., fk , fk+1 ).
Logo, encontramos uma base ortonormal para H.

Teorema 18 (Identidade de Parseval). Um conjunto ortonormal {ek }∞


k=1 em H é uma
base ortonormal se, e somente se, para todo f ∈ H, temos que

k f k2 = |hf, ek i|2 .
X

k=1

Demonstração.
(⇒) Note que se {ek }∞
k=1 é uma base ortonormal, então

X ∞
X
k f k2 = hf, f i = h hf, ek iek , hf, ek iek i
k=1 k=1

X ∞
X
= hhf, ek iek , hf, ek iek i
k=1 k=1
∞ X
X ∞
= hhf, ek iek , hf, ek iek i
k=1 k=1
∞ X
X ∞
= hf, ek ihf, ek ihek , ek i
k=1 k=1

X
= hf, ek ihf, ek i
k=1

|hf, ek i|2 .
X
=
k=1

|hf, ek i|2 . Queremos mostrar que {ek }∞
X
(⇐) Seja k f k2 = k=1 é uma ortonormal.
k=1
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 51


X ∞
X
Dado f ∈ H, existe ak , tal que f = ak ek . Considere g = f − hf, ek iek , para
k=1 k=1
mostrar que g = 0. Então

X ∞
X
k g k2 = hf − hf, ek iek , f − hf, ek iek i
k=1 k=1

X ∞
X ∞
X ∞
X
= hf, f i − hf, hf, ek iek i − h hf, ek iek , f i + h hf, ek iek , hf, ek iek i
k=1 k=1 k=1 k=1

X ∞
X ∞ X
X ∞
= hf, f i − hf, hf, ek iek i − hf, hf, ek iek i + hhf, ek iek , hf, ek iek i
k=1 k=1 k=1 k=1

X ∞
X ∞ X
X ∞
= hf, f i − hf, ek ihf, ek i − hf, ek ihf, ek i + hf, ek ihf, ek ihek , ek i
k=1 k=1 k=1 k=1
∞ ∞ ∞
2 2
|hf, ek i|2
X X X
= hf, f i − |hf, ek i| − |hf, ek i| +
k=1 k=1 k=1
2 2 2 2
= kf k −kf k −kf k +kf k
= 0.

A seguir definiremos o conceito de dois espaços de Hilbert serem unitariamente


isomórficos, para adiante observamos um fato muito importante sobre os espaços de Hilbert.

Definição 38. Sejam dados dois espaços de Hilbert, H e H0 , com os respectivos produtos
internos k · k e k · k0 . Uma transformação U : H −→ H0 entre esses espaços é chamada de
unitária, se
(i) U é linear, isto é, U (αf + βg) = αU (f ) + βU (g);
(ii) U é uma bijeção;
(iii) k U f k0 =k f k, ∀f ∈ H.
Observe que como U é bijetivo, então ele possui uma inversa U −1 : H0 −→ H, que
é também é unitária.
Observe também que de (iii), temos que se U é unitário, então hU f, U gi0 = hf, gi,
∀f, g ∈ H.

Definição 39. Dois espaços de Hilbert, H e H0 , são unitariamente equivalentes ou


unitariamente isomórficos, se existe uma transformação linear unitária, U : H −→ H0 .
Observe que com essa definição conseguimos afirmar que todos os espaços de Hilbert
de dimensão infinita são “`2 (N) disfarçados”.

Corolário 8. Quaisquer dois espaços de Hilbert com dimensão infinita são unitariamente
equivalentes.
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 52

Demonstração.
Se H e H0 são dois espaços de Hilbert de dimensão infinita, podemos escolher para
cada uma base ortogonal, {e1 , e2 , ...} ⊂ H e {e 0 1 , e 0 2 , ...} ⊂ H0 . Em seguida, considere

X
a transformação definida da seguinte maneira: se f = ak ek , então U (f ) = g, onde
k=1

0
X
g = ak e k . Claramente, a transformação U é linear e invertível. Além disso, pela
k=1

|ak |2 =k f k2H0 e o corolário
X
identidade de Parseval, devemos ter k U f k2H0 =k g k2H0 =
k=1
está provado.

Corolário 9. Quaisquer dois espaços de Hilbert com dimensão finita são unitariamente
equivalentes se, e somente se, eles têm a mesma dimensão.
O próximo teorema caracteriza bases de um espaço de Hilbert .

Teorema 19. As seguintes propriedades de conjunto ortonormal {ek }∞


k=1 são equivalentes:

(i) As combinações lineares finitas de elementos em {ek } são densos em H.


(ii) Se f ∈ H e hf, ej i = 0, ∀j, então f = 0.
N
X
(iii) Se f ∈ H e SN (f ) = ak ek , onde ak = hf, ek i, então SN (f ) → f , com
k=1
N → ∞ na norma de H.

|ak |2 .
X
(iv) Se ak = hf, ek i, então k f k2 =
k=1

Demonstração.
(i) ⇒ (ii) Sejam as combinações lineares finitas de elementos em {ek }, que são
densas em H. Dado f ∈ H, com hf, ej i = 0, ∀j, desejamos provar que f = 0. Por hipótese,
existe uma sequência {gn } de elementos em H que são combinações lineares finitas de
elementos em {ek }, tal que k f − gn k→ 0, quando n → ∞. Como hf, ej i = 0, ∀j, então
hf, gn i = 0, ∀n. Com isso,

k f k2 = hf, f i = hf, f i − hf, gn i = hf, f − gn i,

pela desigualdade de Cauchy Schwarz, obtemos hf, f − gn i 6k f k · k f − gn k, ∀n. Fazendo


n → ∞, então k f k · k f − gn k→ 0, assim k f k= 0, portanto f = 0. Logo, (i) ⇒ (ii).
N
X
(ii) ⇒ (iii) Suponha (ii). Para f ∈ H definimos SN (f ) = ak ek , onde ak = hf, ek i.
k=1
Vamos provar primeiramente que SN (f ) converge para algum elemento g ∈ H. De fato,
percebe-se da definição de ak que (f − Sn (f )) ⊥ SN (f ), então o teorema de Pitágoras e a
Proposição 7 nos dá
N
k f k2 =k f − SN (f ) k2 + k SN (f ) k2 =k f − SN (f ) k2 + |ak |2 .
X
(6.2)
k=1
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 53

n
|ak |2 , se N → ∞, então obtemos a desigualdade de Bessel
X
Com isso, k f k2 >
k=1
∞ ∞
|ak |2 6k f k2 , a qual implica que a série |ak |2 converge. Assim, {SN (f )}∞
X X
k=1 forma
k=1 k=1
N
|ak |2 , quando N > M .
X
uma sequência de Cauchy em H, pois k SN (f ) − SM (f ) k2 =
k=M +1
Como H é completo, existe g ∈ H, tal que SN (f ) → g, quando N → ∞. Fixe j e
note que ∀N suficientemente grande, hf − SN (f )i, ej = aj − aj = 0. Como SN (f ) → g,
então hf − g, ej i = 0, ∀j. Com isso, f − g = 0, por hipótese f = 0, assim f = g. Logo,

X
f= ak ek .
k=1

(iii) ⇒ (iv) Seja (iii). Observe que de (6.2), para N → ∞, obtemos que
N
2 2
|ak |2 ,
X
k f k =k f − f k +
k=1

|ak |2 .
X
com isso k f k2 =
k=1

(iv) ⇒ (i) Seja (iv). Então, novamente por (6.2), vemos que lim k f −SN (f ) k= 0,
N →∞
N
X
com isso f = lim SN (f ). Como SN (f ) = ak ek , com ak = hf, ek i, ou seja, SN (f ) é uma
N →∞
k=1
combinação linear finita de elementos em {ek }, então temos i).

6.3 Séries de Fourier


Nessa parte final do texto mostraremos a relação entre o espaço de Hilbert e as
séries de Fourier. Assim, vamos começar definindo o que é uma série de Fourier.

Definição 40. Seja f ∈ L2 ([a, b]). A série



" ! !#
X nπx nπx
S f = a0 + an cos + bn sin ,
n=1 l l
onde l = (b − a)/2, e
! !
1 Z 1Z nπx 1Z nπx
a0 = f (x) dλ, an = f (x) cos dλ, bn = f (x) sin dλ,
2l [a,b] l [a,b] l l [a,b] l
para n = 1, 2, ..., é chamada de série de Fourier de f , e a0 , an e bn são chamados de
coeficientes de Fourier de f .
Resta determinar se essa série infinita converge e, em caso afirmativo, para qual
função ela converge. Até que a convergência possa ser determinada, escrevemos

f ∼ Sf

para indicar que a soma à direita é a série de Fourier da função à esquerda no intervalo
(a, b).
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 54

Teorema 20. Se f ∈ C([0, 2π]), com f (0) = f (2π) e a série de Fourier de f converge
uniformemente para g, então g = f .
Esse teorema nos diz que as séries de Fourier de funções contínuas e periódicas que
convergem uniformemente, convergem necessariamente para a respectiva função.

Teorema 21. Se f é 2π-periódica, contínua e suave por partes, então a série de Fourier
de f converge para f absolutamente e uniformemente em R.
Como visto no teorema acima as condições para uma função convergir uniforme-
mente para sua série de Fourier, são periodicidade, continuidade e suavidade por partes.
Ou seja, qualquer função que não se enquadra nessas três condições não irá convergir
uniformemente para a sua série de Fourier. Além disso, sabemos que o espaço L2 não
possui somente funções contínuas, ou seja, nem sempre é possível obter a convergência
uniforme. Então, como conseguir a convergência de uma função qualquer no espaço L2
para sua série de Fourier? É essa pergunta que queremos responder com o Teorema de
Riesz-Fischer.

Teorema 22. O seguinte conjunto em [−π, π],

1 cos (nx) sin (mx)


√ , √ , √ , para n, m = 1, 2, ... (6.3)
2π π π

é um conjunto ortonormal em L2 ([−π, π]).

Demonstração.
De fato, vamos provar as seguintes relações
Z π !2
1
√ dx = 1 (6.4)
−π 2π

1 Zπ 1 Zπ
√ cos (nx) dx = √ sin (mx) dx = 0 (6.5)
2π −π 2π −π

Z π
cos (nx) cos (mx)  1, se m = n
dx =  (6.6)
−π π 6 n
0, se m =

Z π
sin (nx) sin (mx) 1, se m = n

dx =  (6.7)
−π π 0, se m 6= n
Z π
cos (nx) sin (mx)
dx = 0 (6.8)
−π π
Para provar as seguintes relações, vamos precisar das seguintes relações trigonomé-
tricas
1
sin (nx) sin (mx) = {cos [(m − n)x] − cos [(m + n)x]} (6.9)
2
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 55

1
cos (nx) cos (mx) = {cos [(m − n)x] + cos [(m + n)x]} (6.10)
2

1
cos (nx) sin (mx) = {sin [(m − n)x] + sin [(m + n)x]} (6.11)
2
isso para m 6= n. Para m = n, temos
1
sin (mx)2 = {1 − cos (2mx)} (6.12)
2

1
cos (mx)2 = {1 + cos (2mx)} (6.13)
2

1
cos (mx) sin (mx) = sin (2mx). (6.14)
2
Com isso, vamos provar as relações
• relação (6.4):
Z π !2 π
1 x π π
√ dλ = = + =1
−π 2π 2π −π
2π 2π

• relação (6.5):
!
1 Zπ 1 sin (nπ) sin (−nπ)
√ cos (nx) dλ = √ − = 0, ∀n = 1, 2, ...
2π −π 2π n n
!
1 Zπ 1 −cos(mπ) cos (−mπ)
√ sin (mx) dλ = √ + = 0, ∀n = 1, 2, ...
2π −π 2π n n

• relação (6.6): se m 6= n, então


Z π ( )
cos (nx) cos (mx) 1 Zπ
dx = cos [(m − n)x] + cos [(m + n)x] dλ
−π π 2π −π
" #π
1 1 1
= sin [(m + n)x] + sin [(m − n)x]
2π m + n m−n −π
" #
1 1 1
= sin [(m + n)π]+ sin [(m − n)π] = 0,
π m+n m−n
∀m = 1, 2, ... e n = 1, 2, ... .
Se m = n, então
( )
Z π
cos2 (mx) 1 Zπ
dx = 1 + cos (2mx) dx
−π π 2 −π
" #π
1 1
= x + sin (2mx)
2π 2m −π
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 56

1
=1+ sin (2mπ) = 1
2πm
• relação (6.7): se m 6= n, então
Z π ( )
sin (nx) sin (mx) 1 Zπ
dx = cos [(m − n)x] − cos [(m + n)x] dx
−π π 2π −π
" #π
1 1 1
= sin [(m − n)x] − sin [(m + n)x]
2π m − n m+n −π
" #
1 1 1
= sin [(m − n)π]− sin [(m + n)π] = 0,
π m−n m+n
∀m = 1, 2, ... e n = 1, 2, ... .
Se m = n, então

sin2 (mx)
Z π ( )
1 Zπ
dx = 1 − cos (2mx) dx
−π π 2π −π
" #π
1 1
= x − sin (2mx)
2π 2m −π
1
=1− sin (2mπ) = 1
2πm
• relação (6.8): se m 6= n, então
Z π ( )
cos (nx) sin (mx) 1 Zπ
dx = sin [(m − n)x] + sin [(m + n)x] dx
−π π 2π −π
" #π
1 1 1
= − cos [(m − n)x]− cos [(m + n)x]
2π m − n m+n −π
(
1 1
= − [cos [(m − n)π] − cos [(m − n)π]]−
2π m−n
)
1
− [cos [(m + n)π] − cos [(m + n)π]] = 0.
m+n

Se m = n, então
Z π ( )
cos (nx) sin (mx) 1 Zπ
dx = sin (2mx) dx
−π π 2π −π
" #π
1 1
= − cos (mx)
2π 2m −π
( )
1 1
= − [cos (2mπ) − cos (2mπ)] = 0.
2π 2m

Ou seja, (6.3) é um conjunto ortonormal.


Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 57

Teorema 23 (Teorema de Riesz-Fischer para séries de Fourier). O conjunto trigonométrico

1 cos (nx) sin (mx)


√ , √ , √ , para n, m = 1, 2, ...
2π π π

forma uma base ortonormal em L2 ([−π, π]). Ou seja, se f é uma função em L2 , tal que |f |2
é integrável, então sua série de Fourier converge para f . A convergência é a convergência
na norma k · k2 , isto é,
"Z " n n
!#2 #
a0 X X
lim f (x) − + ak cos (kx) + bk sin (kx) dλ = 0. (6.15)
n→∞ [−π,π] 2 k=1 k=1

Demonstração.
Estabelecemos anteriormente que o conjunto trigonométrico é ortonormal. Então,
agora precisamos mostrar somente que o conjunto trigonométrico é uma base. Para isso,
seja f uma função contínua em R, com hf, ek i = 0, para cada ek . Se f 6= 0, então existe
um x0 , tal que |f | atinge um máximo. Suponha que f (x0 ) > 0. Seja δ suficientemente
f (x0 )
pequeno para que f (x) > , ∀x ∈ (x0 − δ, x0 + δ).
2
Considere a seguinte função:

t(x) = 1 + cos (x0 − x) − cos (δ).

Esta função é um exemplo de um polinômio trigonométrico em que t(x) é uma combinação


linear finita das funções no sistema trigonométrico, tal que
i) 1 < t(x), ∀x ∈ (x0 − δ, x0 + δ);
ii) |t(x)| 6 1, ∀x ∈ (x0 − δ, x0 + δ).
Mostramos que f é ortogonal a todos os membros do sistema trigonométrico e,
portanto, f é ortogonal a todos os polinômios trigonométricos. Particularmente, f é
ortogonal a tn para todo número inteiro positivo n. Vamos provar que f = 0 leva a uma
contradição. Nós temos
Z π Z x0 −δ Z x0 +δ Z π
n n n n
0 = hf, t i = f (x)t (x) dλ = f (x)t (x) dλ+ f (x)t (x) dλ+ f (x)tn (x) dλ.
−π −π x0 −δ x0 +δ

A primeira e a terceira integrais são delimitadas, em valor absoluto para cada n,


por 2πf (x0 ), isso vale pelo item ii) acima. Entretanto, a integral do meio é maior ou igual
a Z b
f (x)tn (x) dλ (6.16)
a
onde [a, b] é qualquer intervalo fechado em (x0 − δ, x0 + δ). Sabemos que t atinge um valor
mínimo, m, pois t é contínuo em [a, b]. De i) temos que m > 1, então
Z b
f (x0 )
f (x)tn (x) dλ > · mn · (b − a),
a 2
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 58

que converge para +∞, quando n → ∞. Isso é uma contradição da suposição 0 = hf, tn i, ∀n.
Portanto, qualquer função real com valor real ortogonal a todo polinômio trigonométrico
deve ser identicamente zero.
Agora, considere f uma função não contínua. Definimos, então, a seguinte função
contínua Z x
F (x) = f (t) dλ.
−π

cos (kx)
Seja fk (x) = √ . Aplicando nossa hipótese, obtemos que
π
Z π
0= f (x) cos (kx) dλ
−π

Fazendo integração por partes, temos que


Z π
1Zπ
F (x) sin (kx) dλ = f (x) cos (kx) dλ = 0.
−π k −π

Da mesma forma, podemos mostrar que


Z π
F (x) cos (kx) dλ = 0.
−π

Para F , temos que F − C é ortogonal a cada um dos membros não constantes do


sistema trigonométrico, para cada constante C. Por outro lado, se olharmos para o termo
1
√ , temos que
π
1 Zπ
C0 = √ F (x) dλ.
π −π
Então, F − C0 é ortogonal a a todos os membros do sistema trigonométrico. Como F é
contínua,F − C0 é contínua e temos que F − C0 é identicamente zero. Portanto, temos
que f = F 0 é zero em quase todos os ponto.
Logo, a implicação ii) ⇒ i), do Teorema 19, implica que o conjunto trigonométrico
é uma base ortonormal em L2 ([−π, π]).

Esse Teorema foi retirado de [5].


Agora apresentaremos um outro ponto de vista importante do Teorema de Riesz-
Fischer para séries de Fourier. Seja
( Z )
2
R = f : [−π, π] −→ R; |f (x)| dx < ∞ ,

o conjunto das funções de quadrado integrável segundo a Riemasnn. Defina a função


T : R −→ `2 (N)×`2 (N), como T (f ) = ((an )∞ ∞
n=0 , (bn )n=0 ), onde os an e bn são os coeficientes
de Fourier de f . Observe que essa função não é bijetiva, já que se pode mostrar que existe
((an )∞ ∞ 2
n=0 , (bn )n=0 ) que não tem um representante em R, pois há sequências em ` (N) × ` (N)
2
Capítulo 6. Espaços de Hilbert e Séries de Fourier 59

que levam em funções não contínuas integráveis a Lebesgue que não pertencem a R. Isso
se deve pelo fato de `2 (N) × `2 (N) ser completo, mas R não ser.
Por outro lado, considere a função G : L2 −→ `2 (N) × `2 (N), definida por G(f ) =
((an )∞ ∞
n=0 , (bn )n=0 ), onde os an e bn são os coeficientes de Fourier de f . Pelo Teorema 17,
o conjunto trigonométrico é base de L2 , logo, pelo Corolário 8, G é uma transformação
unitária, em particular uma bijeção. Com isso, a série de Fourier induz uma bijeção do L2
em `2 (N).
60

7 Considerações finais

Começamos esse texto mostrando um pouco a história da integral de Lebesgue e


nos perguntando o porque de se criar um outro conceito de integral. Entendemos que a
integral de Riemann tem algumas limitações, então é natural querer estender essa definição
para funções mais gerais.
A partir daí entendemos as propriedades que queríamos para uma função medida,
que fosse capaz de estar definida num conjunto amplo, sem ser o conjunto das partes e
que ainda assim tivesse propriedades para ser capaz de medir conjuntos mais gerais, além
de intervalos.
Em seguida conhecemos as funções mesuráveis que são as funções Lebesgue inte-
gráveis. Com toda a estrutura criada fomos capazes de definir a integral de Lebesgue e
conhecer fortes teoremas para a permutação do sinal da integral com o sinal do limite e
notamos incomplexidade das hipóteses de tais teoremas para fazer a troca da integral com
o limite, comparado com o teorema dessa mesma ação para a integral de Riemannn.
Logo adiante, conhecemos os espaços de Hilbert, em especial, L2 e `2 , e vimos que
com eles conseguimos um forte teorema sobre base ortonormal. Ao final alcançamos um
rico entendimento sobre Teoria da Medida, Integral de Lebesgue e suas consequências.
Essa teoria é muito rica e pode ser aplicada em várias áreas da matemática, como por
exemplo nas áreas de Probabilidade, Análise Funcional e Equações Parciais Diferenciáveis.
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Referências

[1] Robert G. Bartle. The Elements of Integration and Lebesgue Measure. Wiley Classics
Library, New York, 1 edition, 1995. Citado 2 vezes nas páginas 3 e 41.

[2] Rui Loja Fernandes. O integral de lebesgue. Notas NBSIR 78-1434, Departamento
de Matemática Instituto Superior Técnico, Lisboa, 2004. Citado na página 23.

[3] Elon Lages Lima. Análise Real, Volume 1. Coleção Matemática Universitária, IMPA,
Rio de Janeiro, 12 edition, 2017. Citado na página 31.

[4] LUIS RECALDE. Las raíces históricas de la integral de lebesgue. Matemáticas:


Enseñanza Universitaria, XV:103–127, 2007. Citado na página 1.

[5] Karen Saxe. Beginning Functional Analysis. Springer, St. Paul, USA, 2002. Citado
2 vezes nas páginas 45 e 58.

[6] René L. Schilling. Measures, Integrals and Martingales. Cambridge University Press,
Cambridge, UK, 1 edition, 2005. Citado na página 12.

[7] Elias M. Stein and Rami Shakarchi. Real Analysis: Measure Theory, Integration, and
Hilbert Spaces. Princeton University Press, New Jersey, 1 edition, 2005. Citado 3
vezes nas páginas 2, 3 e 45.

[8] Daniel V. Tausk. Notas para o curso de medida e integração. Notas. Citado na
página 35.

[9] S.J. Taylor. Introduction to Measure ande Integration. British Library, Londres, 1
edition, 1972. Citado na página 4.

[10] David Williams. Probability with Martingales. Cambridge University Press, New
York, 1 edition, 1991. Citado 3 vezes nas páginas 3, 9 e 11.

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