Você está na página 1de 3

A REALIDADE DO INFERNO

De acordo com pesquisas recentes, 81% dos americanos adultos acreditam no céu, e 80% esperam ir
para lá quando morrerem. Em comparação, cerca de 61% acredita no inferno, mas menos de 1% pensa que é
provável que ele irá para lá. Em outras palavras, uma pequena maioria de americanos ainda acredita que o
inferno existe, mas o medo genuíno do inferno é quase inexistente.

Mesmo os evangélicos mais conservadores não parecem mais levar o inferno muito a sério. Durante
décadas, muitos evangélicos têm minimizado verdades bíblicas inconvenientes, negligenciando qualquer
tema que pareça exigir sombria reflexão. Doutrinas como a depravação humana, a ira divina, a excessiva
pecaminosidade e a realidade do julgamento eterno desapareceram da mensagem evangélica.

A tendência não escapou da atenção de todos. Trinta anos atrás, por exemplo, Martin Marty,
historiador religioso, professor na Escola de Divindade da Universidade de Chicago e crítico de tudo o que é
evangélico, discursou sobre o tema imortalidade em sua palestra na Escola de Divindade de Harvard. O
título de sua mensagem foi “O Inferno Desapareceu. Ninguém Notou”. A pesquisa de Marty não conseguiu
encontrar nem sequer um artigo acadêmico que lidasse com o tema do inferno em nenhuma publicação
teológica importante do último século. Mencionando a escassez de atenção sendo dada a um tópico tão
amplo, Marty sugeriu que se os evangélicos realmente levassem a sério o que a Escritura diz a respeito da
punição eterna, alguém de renome deveria notar.

Quase ninguém notou. Dezoito anos mais tarde, o jornal The Los Angeles Times publicou um artigo
de primeira página intitulado “Cessar Fogo e Enxofre”, observando que muitos líderes “na moda” de igrejas
evangélicas estavam deliberadamente omitindo o tema da retribuição divina:

Em igrejas por toda a América, o inferno está sendo congelado, visto que os cleros ficam cada vez
mais hesitantes em pregar a respeito […] de um enredo com o qual aqueles que frequentam igrejas não se
identificam mais. [De acordo com] Harvey Cox Jr., um célebre escritor, historiador religioso e professor
na Escola de Divindade de Harvard, “Você pode ir a um monte de igrejas, semana após semana, e você
ficaria impressionado se ouvisse sequer uma menção sobre o inferno”.

O fato de o inferno sair da moda indica como porções-chave da teologia cristã foram influenciadas
por uma sociedade secular que enfatiza o individualismo acima da autoridade, e a psique humana acima de
absolutos morais. A ascensão da psicologia, da filosofia do existencialismo e da cultura consumista jogou
baldes de água no inferno.

O artigo descreveu um pastor evangélico que disse que acredita no inferno, mas (de acordo com o
Times) “você nunca saberia disso ouvindo-o pregar […]. Ele nunca menciona o tópico; seu rebanho mostra
pouco interesse no assunto”. Ao ser perguntando por que a doutrina do inferno desapareceu, esse pastor
respondeu: “Ela não é mais atraente o bastante”.

O artigo também citou um renomado professor de seminário que, mais ou menos, concordou. O
inferno, ele disse, é “simplesmente negativo demais […]. As igrejas estão sob enorme pressão de serem
voltadas para o consumidor. As igrejas de hoje em dia sentem a necessidade de serem atraentes ao invés de
exigentes”.

O artigo fechou com uma citação de Martin Marty, quase duas décadas após sua famosa palestra
sobre o assunto. Ele concordava que as preocupações orientadas pelo mercado são a principal razão pela
qual o inferno está sendo eliminado da mensagem evangélica:

Uma vez que o evangelismo pop passou pela análise de mercado, o inferno foi simplesmente deixado
de lado. Quando igrejas vão de porta em porta e conduzem uma análise de mercado […] elas ouvem:
“Quero estacionamentos mais espaçosos. Quero guitarras nos cultos. Quero que meu carro seja encerado
enquanto estou na igreja”.
Anos de indiferença finalmente abriram caminho para hostilidade aberta. Na primeira década do
novo milênio, certas figuras proeminentes na “igreja emergente” declararam guerra contra a doutrina bíblica
do inferno. O ponto alto pareceu ser poucos anos atrás com a publicação do best-seller de Rob Bell O Amor
Vence. Bell argumentou que é absurdo pensar que um Deus amoroso algum dia condenaria alguém à
punição eterna. Ele retratou o amor de Deus como uma força que entra em conflito e, no fim das contas,
elimina as exigências da justiça. No enredo que Bell prevê, Deus não requer qualquer pagamento ou punição
pelo pecado. A resposta divina ao mal é sempre reparadora, nunca punitiva. Além disso, o salário do pecado
é moderado, temporário e reservado apenas para vilões gritantemente malévolos — assassinos em massa,
estupradores de crianças, tiranos que engendram genocídios e (supõe-se) cristãos que contam aos incrédulos
que eles devem temer a Deus. Quando tudo isso acabar, todos estarão juntos no paraíso.

Em tal sistema, a justiça de Deus é comprometida, o arrependimento é opcional, a expiação é


desnecessária e a verdade da Palavra de Deus é anulada. Em outras palavras, não resta mais nada do
cristianismo bíblico. Uma vez que qualquer um estabelece suavizar ou domar as difíceis verdades da
Escritura, é para onde o processo inevitavelmente conduz.

Apenas algumas poucas vozes de liderança no movimento evangélico têm pressionado


corajosamente para uma abordagem mais ortodoxa da doutrina do inferno. Elas parecem ser ultrapassadas
em número por aqueles que pensam que o desaparecimento do inferno é um desenvolvimento positivo.

Alguns propuseram maneiras alternativas de falar sobre o pecado e o julgamento com uma
terminologia mais gentil, suave, refinada e mais socialmente aceitável do que a que a Escritura usa. O
pecado é considerado errado não por ser uma ofensa contra a justiça de Deus, mas por causa do dano que ele
causa aos outros. O inferno é descrito não como um lugar de eterna punição, mas simplesmente como uma
esfera de existência à parte de Deus. Na escatologia reinterpretada dos evangélicos da moda, ninguém
jamais é “enviado” ao inferno; os pecadores, na verdade, escolhem passar a eternidade à parte de Deus — e
o “inferno” que eles sofrem é meramente uma abundância daquilo que eles mais amaram e desejaram. O
inferno é necessário apenas porque Deus é relutante em sobrepor-se ao livre-arbítrio das pessoas. Portanto,
com uma aquiescência mais ou menos benigna ele, em última análise, se submete à escolha do pecador. A
justa indignação de Deus não tem lugar significativo em tal cenário.

É um sério equívoco imaginar que nós melhoramos a Escritura ou intensificamos sua eficácia ao
cegarmos suas pontas afiadas. A Escritura é uma espada, não um cotonete, e ela precisa ser totalmente
desembainhada antes de poder ser posta ao uso a que se destina. “A palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais
cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e
medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração” (Hb 4.12). O evangelho é para ser
uma afronta ao orgulho carnal, ofensivo às sensibilidades humanas, tolice aos olhos da sabedoria mundana e
contrário a todos os julgamentos carnais.

Nenhum ensino cristão exemplifica essas características mais poderosamente do que a doutrina do
inferno. Trata-se de uma verdade apavorante. Nós corretamente recuamos ao pensar sobre ela. A doutrina do
inferno, portanto, permanece como uma advertência e um lembrete da realidade repugnante que o pecado é.
Nenhuma pessoa razoável ou piedosa se deleita na realidade da condenação eterna. O próprio Deus diz:
“Tão certo como eu vivo, diz o SENHOR Deus, não tenho prazer na morte do perverso” (Ez 33.11).

Ainda assim, a severidade da ira de Deus e as angústias do inferno são proeminentes na Escritura. O
Novo Testamento fala mais vividamente e mais frequentemente sobre o inferno do que o Antigo
Testamento. De fato, o próprio Jesus tinha mais a dizer a respeito do assunto do que qualquer outro profeta
ou autor bíblico. Longe de suavizar as verdades que parecem constranger tantos evangélicos hoje em dia,
Jesus disse:

Não temais os que matam o corpo e, depois disso, nada mais podem fazer. Eu, porém, vos mostrarei
a quem deveis temer: temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno. Sim, digo-vos, a
esse deveis temer. (Lc 12.4-5)
Se a tua mão ou o teu pé te faz tropeçar, corta-o e lança-o fora de ti; melhor é entrares na vida
manco ou aleijado do que, tendo duas mãos ou dois pés, seres lançado no fogo eterno. Se um dos teus olhos
te faz tropeçar, arranca-o e lança-o fora de ti; melhor é entrares na vida com um só dos teus olhos do que,
tendo dois, seres lançado no inferno de fogo. (Mt 18.8-9)

Não fazemos nenhum favor a ninguém quando minimizamos a verdade da ira de Deus ou
negligenciamos mencionar a severidade do seu julgamento. Nós certamente não eliminamos a ameaça do
inferno ao nos recusarmos a falar ou pensar sobre isso. Se nós verdadeiramente cremos no que a Bíblia
ensina sobre o destino eterno dos incrédulos, de maneira alguma é “amoroso” permanecer em silêncio e
recusar-se a soar o alarme apropriado.

Quais, afinal, são as boas novas que nós proclamamos no evangelho? Não é um anúncio de que
ninguém precisa temer a Deus ou se atormentar com a possibilidade do inferno. Na verdade, as notícias não
seriam nada boas se Deus meramente tivesse a intenção de se render à vontade obstinada do homem e
renunciasse às exigências de sua perfeita justiça.

As boas novas são ainda melhores do que a maioria dos crentes entende: Deus fez um caminho para
que a sua justiça e o seu amor fossem plenamente reconciliados. Em sua encarnação, Cristo cumpriu toda a
justiça (satisfazendo, não anulando, as exigências de sua lei). Em sua morte na cruz, ele pagou o preço do
pecado do seu povo integralmente (garantindo o triunfo da perfeita justiça). E em sua ressurreição dos
mortos, ele colocou um poderoso ponto de exclamação em sua perfeita e consumada obra de expiação
(selando, assim, a promessa de justificação para sempre para aqueles que confiam nele como Senhor e
Salvador).

Essa é a mensagem que devemos declarar a uma cultura mundana, completamente desprovida de
qualquer temor real a Deus. Nós não podemos fazer isso de forma fiel ou efetivamente se, desde o princípio,
omitimos a dura verdade que a Escritura declara a respeito do “furor da ira do Deus Todo-Poderoso” (Ap
19.15).

Você também pode gostar