O livro Paulo e Estevão nos remete ao momento em que Lucas toma
conhecimento da existência dos Irmãos do Caminho (como eram denominados os seguidores do Cristo), quando ele conhece Paulo. O que Lucas e Paulo nos ensinam é que esta troca sincera, de quem quer aprender e também ensinar, deste laço de amizade, surgem coisas maravilhosas. Deste encontro, nasceu um evangelista. Viajantes ilustres visitavam-na cheios de interesse. Os mais generosos faziam questão de lhe amparar os encargos de benemerência social. Foi aí que surgiu, certa vez, um médico muito jovem, de nome Lucas. De passagem pela cidade, aproximou-se da igreja animado por sincero desejo de aprender algo de novo. Sua atenção fixou-se, de modo especial, naquele homem de aparência quase rude, que fermentava as opiniões, antes que Barnabé empreendesse a abertura dos trabalhos. Aquelas atitudes de Saulo. evidenciando a preocupação generosa de ensinar e aprender simultaneamente, impressionaran-no a ponto de apresentar-se ao ex-rabino, desejoso de ouvi-lo com mais freqüência. — Pois não — disse o Apóstolo satisfeito —, minha tenda está às suas ordens. E enquanto permaneceu na cidade, ambos se empenhavam diariamente em proveitosas palestras, concernentes ao ensino de Jesus. Retomando aos poucos seu poder de argumentação, Saulo de Tarso não tardou a incutir no espírito de Lucas as mais sadias convicções. Desde a primeira entrevista, o hóspede de Antioquia não mais perdeu uma só daquelas assembléias simples e construtivas. Na véspera de partir, fez uma observação que modificaria para sempre a denominação dos discípulos do Evangelho.” Irmãos, afastando-me de vós, levo o propósito de trabalhar pelo Mestre, empregando nisso todo o cabedal de minhas fracas forças. Não tenho dúvida alguma quanto à extensão deste movimento espiritual. Para mim, ele transformará o mundo inteiro. Entretanto, pondero a necessidade de imprimirmos a melhor expressão de unidade às suas manifestações. Quero referir-me aos títulos que nos identificam a comunidade. Não vejo na palavra “caminho” uma designação perfeita, que traduza o nosso esforço, Os discípulos do Cristo são chamados viajores”, “peregrinos”, “caminheiros”. Mas há viandantes e estiadas de todos os matizes, O mal tem, igualmente, os seus caminhos, Não seria mais justo chamarmo-nos — cristãos — uns aos outros? Este título nos recordará a presença do Mestre, nos dará energia em seu nome e caracterizará, de modo perfeito, as nossas atividades em concordância com os seus ensinos.
Lucas deu-nos um nome, cabe a cada um tornar-se digno
de usá-lo. O mérito particular do terceiro Evangelho lhe vem da personalidade muito cativante do seu autor, que nele transparece continuamente. […] Lucas é um escritor de grande talento e uma alma delicada. Elaborou sua obra de modo original, com um esforço de informação e de ordem. É tido como um bom escritor pelo estilo elegante da língua (o grego) usada no prólogo, considerado um clássico da época. O próprio costume de escrever prólogos, dedicando o livro, era comum entre os grandes escritores. Corrige o grego de Marcos, substituindo termos vulgares ou banais por palavras eruditas. À vista dos acontecimentos da época, procurou relacionar os acontecimentos narrados com fatos conhecidos da história, obedecendo a detalhes cronológicos. Alguns estudiosos procuram ver no seu Evangelho um certo olho clínico, por ser ele um médico. Vê-se isto, por exemplo, nos episódios da sogra de Pedro, do Samaritano, da hemorroíssa. Lucas nos apresenta Jesus como o Messias dos pobres, dos humildes, dos desprezados, dos doentes e dos pecadores. Nota-se, ainda, em Lucas, uma preocupação com a valorização das mulheres, tendo em vista o conceito que delas tinha a sociedade da época. Assim, refere-se a Ana e a Isabel; às mulheres que acompanhavam os apóstolos; a Maria e Marta de Betânia; à viúva de Naim e à mulher da multidão que exaltou a mãe de Cristo. Cita também Maria, chamada Madalena, da qual haviam saído sete demônios, e Joana, mulher de Cuza, alto funcionário de Herodes; Susana e várias outras mulheres; que ajudavam a Jesus e aos discípulos com os bens que possuíam (Lucas, 8.1-3). E num lugar todo especial está Maria, mãe de Jesus. Fornece muitos detalhes da vida familiar do Mestre, fato que levanta a hipótese de Lucas ter entrevistado Maria de Nazaré. Algumas das histórias mais bem conhecidas do cristianismo são exclusivas do evangelho de Lucas: as circunstâncias do nascimento de João Batista (ver Lucas 1:5–25, 57–80); a narrativa tradicional do Natal (ver Lucas 2:1–20); a história de Jesus quando era um menino de 12 anos no templo (ver Lucas 2:41–52); as parábolas como a do bom samaritano (Lucas 10:30–37), o filho pródigo (ver Lucas 15:11–32), e o rico e Lázaro (ver Lucas 16:19–31); a história dos dez leprosos (ver Lucas 17:11–19); e o relato do Senhor ressurreto andando com Seus discípulos na estrada de Emaús (ver Lucas 24:13–32).