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REVISTA DE DIREITO ELETRÔNICO – REDE 03

Publicação Oficial do IBDE - Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico

Meio de Divulgação: on line – Gratuito


ISSN – 1679-1045
Acessível em http://www.ibde.org.br/revista

REDE
Ano I – Nº 03

Periodicidade: Trimestral
Dezembro de 2003 a Fevereiro de 2004

Produção do IBDE
http://www.ibde.org.br

Conselho Editorial da Revista de Direito Eletrônico


ISSN – 1679-1045

NACIONAL
Prof. José Carlos de Araújo Almeida Filho – Coordenador e Presidente – Rio de Janeiro
Prof. Aldemario Araujo Castro – Brasília - DF
Prof. Cláudio Luiz Braga Dell´Ortto – Rio de Janeiro
Profa. Josília Fassbender Barreto do Nascimento – Rio de Janeiro
Profa. Georgiana Portella – Rio de Janeiro
Prof. Renato M. S. Opice Blum – São Paulo
David Paterman Brasil – Rio de Janeiro

INTERNACIONAL
Manuel David Masseno – Portugal
Verônica E. Melo – Argentina
Fernando Gallindo – Universidad de Zaragoza - Espanha

1
REVISTA DE DIREITO ELETRÔNICO

A Re vista d e Dire ito Ele trô nico é uma p ub licação o ficial d o Instituto Brasile iro d e Dire ito Ele trô nico e
não p o ssui q ualq ue r caráte r me rcantilista. É o b je tivo d a Re vista ap re se ntar ao ce nário nacio nal o
q ue há d e mais mo d e rno e m te rmo s d e Dire ito Ele trô nico – o u Dire ito d a Info rmática -, se ja e m
te rmo s d e d o utrina, se ja no q ue d iz re sp e ito à jurisp rud ê ncia.

O Instituto Brasile iro d e Dire ito Ele trô nico fo i fund ad o e m 09 d e julho d e 2002, co m a p articip ação d e
d ive rso s me mb ro s d o Brasil e d o Exte rio r. Ho je , o Instituto já p articip a d e p o líticas p úb licas, atravé s
d e p are ce re s e se us me mb ro s vê m se d e stacand o na p e sq uisa d o Dire ito , na áre a d a info rmática
ap licad a ao Dire ito .

Para e nviar artig o s p ara a Re vista, ace sse o site e ate nte p ara as no rmas d e e d ição . Os artig o s
p o d e rão se r e nviad o s p ara o e -mail p re sid e nte @ib d e .o rg .b r.

Dad o s p ara catalo g ação :

REVISTA DE DIREITO ELETRÔNICO? – ISSN 1679-1045 – Órgão de divulgação oficial do Instituto Brasileiro de
Direito Eletrônico – IBDE – http://www.ibde.org.br.

O material contido na Revista é gratuito, mas os articulistas são detentores do direito de autor e, nos termos da Lei
9.610/98, as fontes deverão ser citadas, em qualquer publicação.

O Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico se mantém com as contribuições de seus sócios, nos termos do Estatuto e
não há vendas de obras ou assinaturas por seu intermédio. O IBDE não possui cobradores ou agenciadores. Todos
os contatos devem ser mantidos com a Diretoria, através de correio eletrônico, ou para o endereço: Rua Nelson
Silva, 294 – Carangola – Petrópolis – RJ – Brasil – Cep.: 25715-310

José Carlos de Araújo Almeida Filho


Presidente

2
SUMÁRIO

??DOUTRINA NACIONAL

Responsabilidade Civil do Estado por danos provenientes de veiculação de dados nos sites
dos Tribunais – Prof. Mário Antônio Lobato de Paiva ........................................................06

O Direito Penal e a Internet: O Surgimento de Novos Crimes – Prof. Jorge José


Lawand..................................................................................................................................15

O Novo Código Civil e a Internet – Prof. Renato M. S. Opice Blum ..................................36

A Internet e os Tipos Penas que Reclamam Ação Criminosa em Público – Prof. Aldemario
Araujo Castro........................................................................................................................41

A Regulamentação da Internet no Brasil – Prof. Aldemario Araujo Castro.........................52

Do Delito de Dano e de sua Aplicação ao Direito Penal Informático – Prof. Túlio Lima
Vianna ..................................................................................................................................64

O Reflexo do Direito Eletrônico sobre os Direitos da Personalidade – Prof. Jorge José


Lawand..................................................................................................................................76

O Uso da Arbitragem como Solução para os Conflitos da Tecnologia da Informação e os


Métodos ODR ( online dispute resolution ) como Alternativas não Adversariais para
Resolução de Controvérsias por meio Eletrônico - Prof. Marcelo Bechara de Souza
Hobaika.................................................................................................................................98

Pornografia na Internet – Marcelo de Luca Marzochi........................................................130

A utilização da Lei do fac-símile para o e-mail – Prof. Mário Antônio Lobato de Paiva .150

Questões Técnicas que Dificultam Condenações por Crimes Cometidos na Internet –


Demócrito Reinaldo Filho...................................................................................................154

O Crime de Divulgação de Pornografia Infantil pela Internet – Breves Comentários à Lei


10.764/03 – Demócrito Reinaldo Filho...............................................................................159

Controvérsias acerca de Prazos em virtude de Informações nos sites dos Tribunais – Profa.
Josília Fassbender Barreto do Nascimento.........................................................................164

??DOUTRINA INTERNACIONAL

Spamming – Uma Perspectiva Portuguesa – Prof. Celso António Serra............................175

3
??PESQUISAS ACADÊMICAS

Resumo de Trabalho Desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Direito Eletrônico e Cidadania


– Profa. Josília Fassbender Barreto do Nascimento............................................................193

Pesquisa na Universidade – ou como estamos nos tornando americanos - Prof. Dr. Hugo
Lovisolo...............................................................................................................................202

??JURISPRUDÊNCIA

??NA ÍTEGRA

Superior Tribunal de Justiça................................................................................................213

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios..........................................................231

Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.............................................................................237

ERRATA

Na edição nº 02, da Revista de Direito Eletrônico, foi omitido o currículo do Prof.


Jorge José Lawand. Emitimos uma declaração, transcrita na íntegra:

DECLARAÇÃO
Na qualidade de Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico e Editor da
Revista de Direito Eletrônico - REDE -, com ISSN 1679-045, declaro, para os
devidos fins, que os artigos publicados pelo Prof. Jorge José Lawand, abaixo
indicados, não foram devidamente formatados, uma vez que faltaram dados a
serem corrigidos na Edição nº 03:
IMPORTANTES ASPECTOS DASEGURANÇA JURÍDICA NA INTERNET - Prof.
Jorge José Lawand - pág. 15.
O DIREITO PENAL E A INTERNET: O SURGIMENTO DE NOVOS CRIMES -
Prof. Jorge José Lawand - pág. 36
Tendo em vista, pois, a impossibilidade de correção, será lançada uma errata na
edição nº 03, a fim de a titulação ser corrigida, constando:
JORGE JOSÉ LAWAND - Bacharel, Mestre e Doutorando em direito pela PUC/SP
Especialista em direito civil pela UniFMU - Advogado militante e professor de
Direito da Universidade São Francisco.
Assim, declaro, para os devidos fins, que na edição nº 03 será feita a devida
errata.
E, para a verdade, firmo a presente

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José Carlos de Araújo Almeida Filho
Presidente do IBDE
Coordenador da Revista de Direito Eletrônico

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Responsabilidade Civil do Estado por danos provenientes de veiculação de dados nos sites
dos Tribunais
Mário Antônio Lobato de Paiva (*)

Sumário: I- Introdução; II- Marco Latino-americano; III- Danos concretos; IV-


Responsabilidade Civil do Estado; V- Conclusão.

I- Introdução

O mundo moderno e virtual tem proporcionado uma verdadeira revolução de


costumes no mundo real a medida em que os aparatos tecnológicos invadem todos os
setores de nossa sociedade.

A comunidade jurídica por estar inserida neste contexto não teve alternativa senão a
de adaptar-se as novas tecnologias sob pena de ser taxada de inerte e o que é pior, ineficaz.

No entanto este “caminho sem volta” deve ser trilhado com o máximo de cuidado
para que não venha a transformar aquele benefício, facilidade ou utilidade trazida pela
tecnologia em sérios prejuízos ao cidadão que necessita do bem chamado Justiça.

Por isso, antes de qualquer implementação a nível institucional (OAB, Ministério


Público, Tribunais de Justiça, etc...) de sistemas de informação, principalmente os que
possam ser acessados pelo público em geral, devem ser chamados especialistas na área de
informática e na área jurídico para a elaboração de pareceres bem como estudos que
vislumbrem a menor agressão possível aos direitos constitucionalmente protegidos.

Daí a necessidade da realização de congressos, seminários e encontros que reúnam


os profissionais do direito para discutir as questões relacionadas ao chamado Direito

(*)
Mário Antônio Lobato de Paiva é advogado em Belém; sócio do escritório Paiva &
Borges Advogados Associados; Professor (pós-graduação em Direito de Informática) da
Universidade Estácio de Sá em Minas Gerais; Sócio-fundador do Instituto Brasileiro da
Política e do Direito da Informática – IBDI; Membro do Instituto Brasileiro de Direito
Eletrônico; Membro da Associação de Direito e Informática do Chile; Presidente da
Comissão de Estudos de Informática Jurídica da OAB-PA; Conselheiro da Revista Jurídica
Cajamarca no Peru; Conferencista; e-mail: malp@interconect.com.br.

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Eletrônico possibilitando assim o avanço no estudo da matéria encontrando com isso
soluções adequadas os problemas advindos da comunidade cibernética.

II- Marco Latino-americano

Recentemente participamos do seminário “Internet y Sistema Judicial em América


Latina y el Caribe” (Home-page: http://www.iijusticia.edu.ar/Seminario_Taller/) realizado
pelo Instituto de Investigación para la Justicia Argentina, Corte Suprema da Costa Rica e
International Development Research Centre do Canadá onde foram analisados por
especialistas e ministros de cortes superiores de justiça de vários países da América Latina
os benefícios e dificuldades advindas das home-pages dos Poderes Judiciais na rede, os
programa de transparência e proteção de dados pessoais.

O evento foi considerado um marco latino-americano no estudo da difusão de


informação judicial na Internet. Nele foram expostas orientações imprescindíveis que
devem ser observadas por todos os dirigentes de tribunais que colocam a disposição da
população informações institucionais e processuais, como por exemplo a participação da
sociedade civil nos programas de transparência, regulamentação da proteção de dados e as
sociedades de informação creditícia, acesso a informação judicial proteção de dados sobre a
saúde dos envolvidos em processo judicial, dentre outros temas não menos importantes que
encontram-se na sua íntegra no site
(http://www.iijusticia.edu.ar/Seminario_Taller/programa.htm).

Estas orientações foram chamadas de “Regras de Heredia” e encontram-se


disponíveis no site (http://www.iijusticia.edu.ar/Reglas_de_Heredia.htm).
A parte que coube a nós explanar referiu-se a difusão de informações judiciais na Internet e
seus efeitos a esfera trabalhista disponível no
endereço:(http://www.iijusticia.edu.ar/Seminario_Taller/Lobato.rtf).

Expusemos em síntese que, infelizmente, as facilidades advindas do avanço da


informática não estão sendo devidamente acompanhadas pelos lidadores do direito que

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insistem primeiro em aproveitar-se dos benefícios e depois discutir as questões jurídicas
que envolvem seus atos.

Alertamos para a busca livre disponibilizada pelo site dos Tribunais brasileiros.
Esse recurso traz uma série de implicações negativas no que diz respeito à privacidade e
intimidade das pessoas que podem ter seus dados devassados pelo simples acesso a home-
page.

No caso dos Tribunais do Trabalho o prejuízo é ainda muito maior para o


trabalhador, pois põe em risco a conquista de um novo emprego, pois ao disponibilizar
essas informações de forma irrestrita, os Tribunais armam maus empregadores de um banco
de informação a respeito dos trabalhadores que possuíram ou possuem algum tipo de ação
contra seu empregador ou ex-empregador, motivo pelo qual, poderá funcionar como
empecilho para a obtenção por parte dos trabalhadores de novo emprego.

Referida discriminação já existia antes desse banco de dados através de “listas


negras” que circulavam e circulam em empresas, porém não com tamanha facilidade e
poder de inibição. Assim qualquer empregador que deseje saber se o empregado já ajuizou
alguma reclamação na Justiça do Trabalho bastará acessar a home-page do tribunal para
constatar e ao mesmo tempo impedir o acesso do empregado ao quadro de funcionários da
empresa.

Mencionada discriminação ocorria todos os dias e a princípio não havia como ser
exterminada totalmente, porém certos cuidados devem ser tomados para evitar essa atitude.
A principal medida a ser tomada (nossa recomendação à época) é a de que o acesso fique
restrito apenas aos advogados (de maneira livre pois exercemos uma função de
essencialidade para a justiça conforme o artigo 133 da Constituição Federal) e às partes no
processo em que estiverem envolvidos, evitando assim uma consulta geral e indiscriminada
e portanto, dificultando esta prática abusiva por parte do empregador. Prática esta que
dificilmente seria comprovada se viesse a ser suscitada perante a justiça.

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Nossa recomendação com absoluta certeza dificultaria de maneira decisiva esta
prática abusiva por parte de empregadores mal intencionados dando maiores possibilidades
ao trabalhador de conquistar seu tão almejado emprego. Nossa proposição espelhou-se na
Resolução do Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região que proibiu as
consultas por busca livre pelo nome das partes.

Discriminações que impeçam o acesso livre ao emprego com base em certidões


expedidas pelo SERASA ou em virtude do empregado já ter ajuizado reclamação
trabalhista contra seu antigo empregador são práticas abusivas e inconstitucionais que
devem ser combatidas pela sociedade. A OAB/PA através da Comissão de Estudos de
Direito da Informática apresentou projeto encaminhado aos tribunais no sentido de limitar o
acesso livre em sites jurídicos apenas aos advogados, restringindo às partes e demais
envolvidos o acesso apenas através do número do processo.

Com isso, almejamos assegurar o direito constitucional à liberdade de trabalho


estatuído no artigo 5º inciso XIII- “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou
profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.”

Ressaltamos ainda que todos os direitos fundamentais têm aplicação na relação de


trabalho, surgindo diante de nós um novo campo de estudo que é “a proteção dos
trabalhadores no que diz respeito ao tratamento automatizado de dados pessoais”.

Assim para não sermos ameaçados com a extinção ou lesão de direitos


fundamentais devemos nos posicionar claramente sobre os fatos advindos do caso concreto,
estabelecendo diretrizes gerais que não beneficiem apenas umas das partes. Por isso somos
favoráveis a interpretações e decisões baseadas no equilíbrio de direitos que permitam
resguardar o direito à publicidade das decisões e processos judiciais, bem como a proteção
à privacidade e intimidade do trabalhador.

Demonstramos que as autoridades brasileiras já vêm tomando medidas que coíbem


a prática discriminatória ensejada pela veiculação de informações processuais por

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intermédio da internet. O próprio Poder Judiciário através da eliminação da pesquisa pelo
nome do trabalhador nos processos em tramitação ou arquivados. O Poder Legislativo com
projeto que prevê até mesmo a detenção dos empregadores que discriminem o acesso livre
ao trabalho. O Poder Executivo através da Portaria acima mencionada. Medidas que visam
resguardar o direito dos trabalhadores de acesso ao emprego assegurando o respeito à
legislação constitucional e infra-constitucional que tem sido violada pelo avanço
tecnológico.

Alertamos ainda a todos os presentes que passamos por uma revolução cibernética
que atinge em cheio as relações de trabalho e que, portanto, devem ser estudados e
solucionados os conflitos provenientes dessas transformações munindo os atores sociais de
arcabouços jurídicos e legais aptos para lidar com esses tipos de relações, com vistas a criar
um equilíbrio social entre princípio da publicidade que rege a atividade dos órgãos
judiciais com os direitos de livre acesso do trabalhador ao emprego, sem que haja
discriminações provenientes pela difusão de informações advindas do Poder Judiciário.

III- Danos concretos

Ao longo dos debates pudemos perceber que, em vários casos ocorridos em


tribunais da América Latina, houve prejuízos efetivos com a vinculação indiscriminada de
dados pessoais do cidadão que pode ter sua privacidade e intimidade devassadas por
qualquer indivíduo que tenha acesso a rede mundial de computadores.

No Brasil não poderia ser diferente, pois como relatados acima vários trabalhadores
tiveram o seu direito a livre acesso ao emprego vetado pelo futuro empregador em virtude
da disponibilização de consulta por nome dos reclamantes nos sites dos tribunais. Tal
procedimento trouxe reconhecidos e concretos prejuízos a milhares de trabalhadores tanto
que foi admitido pelos próprios tribunais que alguns anos mais tarde resolveram abolir este
tipo de pesquisa.

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Os tribunais de justiça comuns continuam a trazer prejuízos aos jurisdicionados ao
veicularem em processos judiciais dados que invadem a esfera íntima do indivíduo como
por exemplo, seu estado de saúde ou doenças que levam a pessoa a sofrer situações
discriminatórias como AIDS.

Sendo assim consideramos que este tipo de violação do direito à intimidade e


privacidade daquele que procura a Justiça Estatal para solucionar suas inquietações gera o
direito a pleitear uma indenização respectiva e proporcional ao dano causado por
intermédio da teoria do risco administrativo que responsabiliza civilmente o Estado a
ressarcir o lesado pelo danos ocasionados em virtude de sua conduta.

IV- Responsabilidade Civil do Estado

Teoria adotada atualmente pela grande maioria dos doutrinadores é a de que a


responsabilidade Estatal é de natureza objetiva compreendendo atos omissivos ou
comissivos que independem de prova de culpa. A Constituição Federal de 1988 não deixa
dúvidas quanto a sua responsabilidade quando dispõe que:

“Art. 37, § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras


de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem
a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou
culpa”.

Em seu artigo 5º que prevê a indenização por dano moral que deverá ser fixada
conforme o prudente arbítrio do juiz:

"Art.5. X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação.”

11
José Cretella (1) ao abordar a questão da responsabilidade civil do Estado entende
que: a) a responsabilidade do Estado por atos judiciais é espécie do gênero
responsabilidade do Estado por atos decorrentes do serviço público; b) as funções do
Estado são funções públicas, exercendo-se pelos três poderes; c) o magistrado é órgão do
Estado; ao agir, não age em seu nome, mas em nome do Estado, do qual é representante;
d) o serviço público judiciário pode causar danos às partes que vão a juízo pleitear
direitos, propondo ou contestando ações (cível); ou na qualidade de réus (crime); e) o
julgamento, quer no crime, quer no cível, pode consubstanciar-se no erro judiciário,
motivado pela falibilidade humana na decisão; f) por meio dos institutos rescisórios e
revisionista é possível atacar-se o erro judiciário, de acordo com as formas e modos que
alei prescrever, mas se o equívoco já produziu danos, cabe ao Estado o dever de repará-
los; g) voluntário ou involuntário, o erro de conseqüências danosas exige reparação,
respondendo o Estado civilmente pelos prejuízos causados; se o erro foi motivado por
falta pessoal do órgão judicante, ainda assim o Estado responde, exercendo a seguir o
direito de regresso sobre o causador do dano, por dolo ou culpa; h) provado o dano e o
nexo causal entre este e o órgão judicante, o Estado responde patrimonialmente pelos
prejuízos causados, fundamentando-se a responsabilidade do Poder Público, ora na culpa
administrativa, o que envolve também a responsabilidade pessoal do juiz, ora no acidente
administrativo o que exclui o julgador, mas empenha o Estado, por falha técnica do
aparelhamento judiciário, ora no risco integral, o que empenha também o Estado, de
acordo com o princípio solidarista dos ônus e encargos públicos”

Basicamente para a caracterização da responsabilidade deve existir e o nexo causal,


ou seja, a relação entre o dano causado a ser reparado e a conduta do agente. A conduta
lesiva no caso dos tribunais do trabalho é a disposição do nome do reclamante no site por
intermédio do instrumento de pesquisa processual eletrônica e o dano é a vedação de acesso
ao emprego em decorrência daquela disposição de dados.

Nos tribunais comuns existem vários exemplos que trazem lesão ao cidadão por
intermédio da busca processual pelo nome dos litigantes que vão desde o abalo ao crédito

(1)
JÚNIOR, José Cretella. Responsabilidade do Estado por Atos Judiciais, RF, 230:46.

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até situações vexatórias que expõe os litigantes como no caso do mesmo ter contraído
doença grave que tenha sido ventilada ou discutida no mérito do processo.

Além disso nos casos citados podemos observar uma clara violação da intimidade e
privacidade dos jurisdicionados que tem em muitos casos sua vida invadida em questão de
segundos por qualquer pessoa que tenha acesso ao site do Tribunal violando estes direitos
assegurados na Constituição Federal, no título "Dos Direitos e Garantias Fundamentais,
artigo 5°.

Portanto é plenamente viável a ação de indenização por danos morais e materiais


contra o Estado que através dos sites oficiais dos tribunais divulgue indiscriminadamente
informações judiciais pela internet que venham a lesar direitos constitucionalmente
assegurados ao cidadão como o direito à intimidade, privacidade e livre acesso ao emprego.

V- Conclusão

O novo universo de utilidades e facilidades propiciado pela inserção dos sistemas


tecnológicos aos administradores do Poder Judiciário tem gerado avanços importantes que
culminam na satisfação de muitos que procuram nesta instituição a solução de suas aflições.

No entanto esta evolução não pode simplesmente ser implementada sem que haja
estudos sobre o impacto ocasionado aos direitos de toda população. Portanto, assim da
mesma forma com que um estabelecimento antes de abrir novas lojas necessita de um
estudo detalhado do mercado, o judiciário necessita primeiramente de estudos que
viabilizem a implantação de novas tecnologias sem que haja prejuízos a direitos
fundamentais de cidadão assegurados constitucionalmente.

No entanto como isto tem sido feito de forma precária e assim ocasionando todo o
tipo de lesão ao direito como, por exemplo, o de livre acesso ao emprego, restrições de
crédito, exposição do estado grave de saúde das partes, etc. Resta ao lesionado buscar as
portas do próprio Poder Judiciário para pleitear indenização civil contra o Estado por danos

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materiais e morais causados pela difusão indiscriminada de informações das partes nos sites
oficiais dos tribunais.

Por fim cabe a nós alertar mais uma vez que a informática é um poderoso
instrumento de efetivação de direitos que propicia grande celeridade na prestação
jurisdicional, porém apresenta vícios que devem ser eliminados pelos profissionais do
direito, se possível, antes de sua aplicação sob pena de que aquele benefício venha a tornar-
se um problema tão grave que seria melhor que não tivesse ocorrido.

Desejamos que o judiciário tome as devidas providências no sentido de resguardar


os direitos fundamentais a privacidade e intimidade através de programas de proteção de
dados daqueles que o procuram de forma preventiva sob pena de ser alvejado por uma
enxurrada de ações de indenização provenientes de da difusão de informações judiciais
discriminatórias.

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O Direito Penal e a Internet – O Surgimento de Novos Crimes

Jorge José Lawand

DOUTORANDO PUC-SP, MESTRE EM DIREITO PUC-SP, PROFESSORE NO


CURSO DE DIREITO DA UNIVERSIDADE SÃO FRANCISO - SP

RESUMO

Neste nosso trabalho visamos fornecer uma visão geral da problemática envolvendo
os crimes na internet e o despreparo da legislação brasileira, o que vem gerando
insegurança jurídica, o que contraria inclusive o princípio da legalidade estampado na
própria Constituição Federal de 1988 – a Constituição cidadã. Examinaremos os projetos de
lei em tramitação, bem como a jurisprudência de nossos tribunais, ante a impossibilidade
do juiz não julgar o caso que lhe é levado pelas partes em conflito.

Palavras – chave: internet, criminal, legalidade, projetos de lei, jurisprudência.

Sumário: 1. O impacto da internet no direito penal. 2. O princípio da legalidade. 3. Projetos


de lei acerca da temática. 4. Comportamento da jurisprudência – decisões dos tribunais
brasileiros. 5. Conclusão

O impacto da internet no direito penal

A internet é uma inovação tecnológica que provocou inúmeras transformações nas


relações jurídicas entendidas como sendo aquelas em que uma determinada pessoa pretende
de outrem um bem anteriormente convencionado por meio de algum instrumento legal,
como por exemplo, os contratos, sejam de que espécies forem: venda e compra, doação,
mandato etc.

Todavia, não podemos afirmar que há apenas uma única esfera da ciência jurídica
envolvida, ou seja, conforme a doutrina clássica, costuma-se dividir o direito em vários
ramos a fim de ser mais bem estudado, haja vista as especificidades da relação jurídica
dominante, como fica evidente quando estamos diante de um direito público e outro
privado, que possuem peculiaridades próprias.

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Mas isto não há de ocorrer com a internet que nas palavras de Maria Helena Diniz1 ,
quando entrevistada sobre o Novo Código Civil ponderou: “Não se poderá decretar a sua
velhice precoce. É verdade que nele não estão contidas questões sobre contratos
eletrônicos, parceria entre homossexuais, experiência científica em seres humanos, direitos
difusos, pesquisa com genoma humano, clonagem humana, efeitos jurídicos decorrentes da
reprodução assistida, medidas sócio-educativas aplicadas à criança e ao adolescente,
relações de consumo, entre outras. Essas e outras matérias não são objetos de estudo do
Direito Civil, por pertencerem a outros ramos jurídicos. Então, em razão de suas
peculiaridades, esses temas devem ser redigidos por normas especiais. O novo Código é
obra legislativa de grande importância, apesar de não ser perfeito, pois nenhuma obra
humana o será. Almejar isso seria uma utopia, ou melhor, pretender o irrealizável”.

Deveras, o legislador do novo estatuto civil não poderia ser compelido a fazer a
regulamentação do micro sistema jurídico relativo aos tipos contratuais eletrônicos e a suas
respectivas implicações jurídicas, dentre outras matérias relevantes como o biodireito e a
reprodução assistida.

A cada novo fenômeno jurídico, haverá necessidade de uma nova lei a fim de fixar
os parâmetros essenciais, principalmente de justiça, para que o Poder Judiciário possa
solucionar o conflito.

Isto se deve, conforme exposto em minha obra 2 : “Diante da incessante evolução da


economia – e sua principal conseqüência a tecnologia – proporcionou o surgimento de
novos tipos de acordos de vontade, dentro da premissa de que as relações jurídicas
contratuais refletem a própria essência do direito, que é dinâmico, prospectivo, e aberto”.

Um dos veículos a serem mais utilizados na construção de uma dogmática


relacionada com o direito da internet será a analogia. Com efeito, conforme a lei de

1
DINIZ, Maria Helena. Código Civil: inovações. Jornal Tribuna da Magistratura. São
Paulo, julho-agosto 2002. p.12 e 13. grifo nosso
2
LAWAND, Jorge José. Teoria geral dos contratos eletrônicos. São Paulo: Editora Juarez
de Oliveira, 2003. p. 17.

16
introdução ao código civil, comumente intitulada como norma das normas, estipula que em
hipótese de lacuna da lei, esta deverá ser preenchida pelo juiz que se socorrerá na analogia,
costumes e princípios gerais de direito, preferencialmente nesta ordem, pois consoante
Silvio de Salvo Venosa3 : “O juiz não pode, em hipótese alguma, deixar de proferir decisão
nas causas que lhe são apresentadas. Na falta de lei que regule a matéria , recorre às fontes
subsidiárias, entre as quais podemos colocar a analogia. Na realidade, a analogia não

17
como quando diz no inciso XLV: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado,
podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos
termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do
patrimônio transferido”.

No direito penal fica evidente o que Stammler5 afirma: “Law presents itself as an
external regulation of human conduct”. O crime é uma conduta que afronta a ordem dos
valores de uma determinada sociedade em certo tempo e espaço, ou seja, os ilícitos podem
surgir em decorrência de novas condutas, as quais ontologicamente representam perigo às
liberdades individuais e coletivas, haja vista a importância dos direitos difusos, coletivos e
individuais homogêneos nos problemas advindos com a contaminação do meio ambiente
por elementos poluentes, o que recebeu pronta resposta do Estado brasileiro, tendo
providenciado um arquétipo legislativo tendente a estabelecer punições com reprimenda
corporal, reclusão ou detenção, não sendo tratada como mera contravenção.

Um crime é a ofensa a determinado bem jurídico, como a internet, onde os direitos


decorrentes de transações eletrônicas podem sofrer a intervenção, de pessoas mal
intencionadas, que na gíria do e-commerce são designados de crackers, utilizando-se dos
dados de outrem obtidos de modo fraudulento.

Corroborando neste posicionamento Francisco de Assis Toledo6 afirma: “A tarefa


imediata do direito penal é, portanto, de natureza eminentemente jurídica e, como tal,
resume-se à proteção de bens jurídicos. Nisso aliás, está empenhado todo o ordenamento
jurídico. E aqui entremostra-se o caráter subsidiário do ordenamento penal: onde a proteção
de outros ramos do direito possa estar ausente, falhar ou revelar-se insuficiente, se a lesão
ou exposição a perigo do bem jurídico tutelado apresentar certa gravidade, até aí deve
estender-se o manto da proteção penal, como ultima ratio regum. Não além disso.”

Então como solucionar estar questões diante do direito penal vigente?

5
STAMMLER, Rudolf. The theory of justice. New York: Macmillan, 1925. p. 40.

18
O princípio da legalidade.

É clássico no direito penal o princípio da legalidade, onde não há crime sem lei
anterior que o defina.

Foi alçado a princípio constitucional, esculpido no artigo 5º, inciso XXXIX.

Daí Celso Delmanto7 ter afirmado: “Somente a lei, elaborada na forma que a
Constituição permite, pode determinar o que é crime e indicar a pena cabível. Deve,
portanto, ser lei federal, oriunda do Congresso Nacional”.

Logo, não há como penalizar determinada conduta anti-social sem estar previsto
especificamente em lei devidamente aprovada segundo a regulamentação do processo
legislativo constitucionalmente estipulado.

Afirmei em artigo recentemente publicado8 : “A tendência verificada é de controle,


que para o Direito Penal é fundamental pois é seu primado fundamental de que não há
crime sem lei anterior que o comine, não sendo outra a postura adotada por Júlio Fabrini
Mirabete9 , para o qual: “Exige o princípio ora em estudo que a lei defina abstratamente um
fato, ou seja, uma conduta determinada de modo que se possa reconhecer qual o
comportamento considerado como ilícito. Infringe, assim, o princípio da legalidade a
descrição penal vaga e indeterminada que não possibilita determinar qual a abrangência do
preceito primário da lei penal e possibilita com isso o arbítrio do julgador. Assim, é difícil,
senão impossível, delimitar, por exemplo, qual o fato incriminado pelo artigo 9º da Lei de
segurança Nacional, como definido: “Tentar submeter o território nacional, ou parte dele,

6
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. São Paulo: Saraiva,
1994. p 13-14.
7
DELMANTO, Celso. Código penal comentado. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p.4.
8
LAWAND, Jorge José. Importantes aspectos de segurança jurídica na internet. Revista
Electrónica de Derecho Informático 2003.02 nº 55

19
ao domínio ou à soberania de outro país”. Diante disto, Gustavo Testa Correa10 afirma: “A
tecnologia digital é uma realidade, e justamente por isso estamos diante da criação de
lacunas objetivas, as quais o direito tem o dever de estudar, entender e, se necessário,
preencher. Com a crescente popularização da Grande Rede, evidenciamos a criação de
novos conceitos sobre tradicionais valores, tais como a liberdade, a privacidade e o
surgimento dos “crimes digitais”.

Outrossim, não podemos olvidar o fato de que a legalidade gera inúmeras


conseqüências dentre as quais: não se pode aplicar a lei retroativamente a não ser em
benefício do réu, e, também quanto a analogia, anteriormente mencionada, esta sofre sérias
restrições, pois no crime apenas poderá ser utilizada quando for in bonam partem.

Com efeito, a analogia que é uma fonte do direito imprescindível para o magistrado
colmatar as lacunas porventura existentes, mas não pode ser livre e largamente empregada
no direito penal, pois conforme Júlio Fabrini Mirabete11 : “Diante do princípio da legalidade
do crime e da pena, pelo qual não se pode impor sanção penal a fato não previsto em lei, é
inadmissível o emprego da analogia para criar ilícitos penais ou estabelecer sanções
criminais. Nada impede, entretanto, a aplicação da analogia às normas não incriminadoras
quando se vise, na lacuna evidente da lei, favorecer a situação do réu por um principio de
equidade. Há, no caso, a chamada “analogia in bonam partem”, que não contraria o
princípio da reserva legal, podendo ser utilizada diante do disposto no já citado artigo 4º da
LICC. Ressalte-se, porém, que só podem ser supridas as lacunas legais involuntárias: onde
uma regra legal tenha caráter definitivo não há lugar para a analogia, ou seja não há
possibilidade de sua aplicação contra-legem.”

Assim sendo fica evidente que haverá a necessidade de serem criadas normas
incriminadoras daquelas condutas contrárias ao direito vigente, que aliás represente a forma

9
MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 1991. p. 56.
10
CORREA, Gustavo Testa. Aspectos Jurídicos da Internet, p. 3.
11
MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de direito... p.48.

20
mais elementar de se fazer justiça, pois conforme Stammler12 : “And just law is positive
law, the content os which possesses the quality of justice”.

Todavia, não se trata de posição unânime, como na ciência jurídica não podia deixar
de ser, haja vista a sua natureza equívoca, ou seja, há várias formas de interpretação de
determinado contexto dependendo do ponto de vista a ser tomado.

Nesta esteira, Vicente Greco Filho 13 afirma: “A Internet não passa de mais uma
pequena faceta da criatividade do espírito humano e como tal deve ser tratada pelo direito,
especialmente o penal. Evoluir, sim, mas sem querer "correr atrás", sem se precipitar e,
desde logo, afastando a errônea idéia de que a ordem jurídica desconhece ou não está apta a
disciplinar o novo aspecto da realidade. E pode fazê-lo no maior número de aspectos,
independentemente de qualquer modificação.”, e mais adiante sumarizando seu
pensamento: “A conclusão, portanto, salvo demonstração em contrário, é a de que devemos
deixar o direito penal em paz, porque está ele perfeitamente apto a atender à proteção dos
direitos básicos das pessoas e se houver alguma modificação a fazer deve ser feita dentro de
uma perspectiva de proteção genérica de um bem jurídico e não porque eu tenho um
Pentium II de 300 Mh, disco rígido de 4 Gb, 64 Mb de memória RAM, 4 Mb de memória
de vídeo e monitor de 20". (Esqueci: e modem de 56 K, CD-ROM de 32x e scanner de
1.200 dpi, além de outros cacarecos)”.

Entrementes, a tendência atualmente é no sentido da construção de arquétipos legais


que abarcam a problemática, pois, conforme pudemos verificar em nossa obra, já citada
anteriormente14 : “A tendência mundial é no sentido de regulamentar, e, além disso,
controlar o acesso e utilização da grande Rede, diante de uma intervenção legislativa com
base na publicização do direito”.

12
STAMMLER, Rudolf. The theory … p. 18.
13
GRECO FILHO, Vicente. Algumas observações sobre o direito penal e a internet.
Revista Direito Mackenzie nº 1/2000. p.35 e seguintes.
14
LAWAND, Jorge José. Teoria geral dos…p.39.

21
O legislador brasileiro já iniciou, doravante, com a Lei do Software – Lei nº 9.609,
de 19 de fevereiro de 1998 – que em seus artigos 12 usque 14 punem aquele que violar
direito de autor de programa de computador, mas que se demonstra insuficiente.

Projetos de lei acerca da temática

Há inúmeros projetos de leis tramitando no Congresso Nacional, todos tendentes a


proporcionar a devida e necessária segurança jurídica de lege ferenda, pois muito ainda será
discutido até o ato final da tramitação – promulgação e publicação.

Na seara penal podemos elencar os seguintes projetos em tramitação na seguinte


ordem cronológica:

PL 1070/1995 - Dispõe sobre crimes oriundos da divulgação de material pornográfico


através de computadores.

PL 3258/1997 - Dispõe sobre crimes perpetrados por meio de redes de informação,


caracterizando como crime a divulgação pela internet e demais redes de computadores
material pornográfico, instruções para fabricação de bombas caseiras e textos que incitam e
facilitam o acesso a drogas ilegais.

PL 3383/1997 - Acrescenta parágrafo único ao art. 241 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de


1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente incluindo dentre os crimes em espécie, com
pena de reclusão e multa, quem colocar a disposição da criança e do adolescente, ou do
público em geral, através de redes de computadores, incluindo a internet, sem método de
controle de acesso, material que contenha descrição ou ilustração de sexo explícito,
pornografia, pedofilia ou violência.

PL 3493/1997 - Acrescenta artigos no Código Penal, incluindo no capítulo – dos crimes


contra a privacidade, a violação da intimidade, mediante processo tecnológico, e o abuso da

22
informática, com a divulgação de dados pessoais alheios, fichário automatizado ou banco
de dados.

PL 4412/1998 - Acrescenta arts. à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, (Estatuto da


Criança e do Adolescente), para dispor sobre crimes de abuso sexual, incluindo a pena de
reclusão para quem pratica conjunção carnal, atentado violento ao pudor, ato libidinoso,
incluindo na mesma pena quem persuade, induz, atrai ou coage criança e adolescente a
praticar o crime.

PL 84/1999 - Dispõe sobre os crimes cometidos na área de informática, suas penalidades e


dá outras providências.Caracterizando como crime os ataques praticados por "hackers" e
"crackers", em especial as alterações de "home pages" e a utilização indevida de senhas.

PL 3891/2000 - Dispõe sobre o registro de usuários pelos provedores de serviços de acesso


a redes de computadores, inclusive à Internet, obrigando os provedores de serviços da
internet a manterem registros de seus usuários, e dados referentes a cada transação atendida
pelo provedor, para solucionar o problema da identificação do usuário em caso de
utilização ilícita da rede, cometidas, em geral, por hackers ou crackers.

PL 5460/2001 - Altera os arts. 240 e 241 da Lei 8069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente, incluindo como crime a produção de atividade fotográfica ou de
qualquer outro meio visual, utilizando-se de adolescente em cena de sexo explícito ou
simulado; agravando a pena se o crime tem como vítima a criança.

PL 6384/2002 - Acrescenta artigo 232-A e parágrafo único ao artigo 239; modifica os


artigos 236,241,242 e 243 da Lei 8069/90,de 13 de julho de 1990, e dá outras
providências.Agravando a penas para os crimes praticados contra a criança e o adolescente,
por ação ou omissão, incluindo a exploração do menor para obtenção de vantagem
patrimonial a prática de pedofilia.

23
4.Comportamento da jurisprudência – decisões dos tribunais brasileiros

A jurisprudência brasileira tem proferido decisões, quando surgem casos relativos a


crimes da internet, orientado-se pela base legal existente atualmente.

O magistrado em qualquer área da ciência do direito, não pode deixar de julgar, não
se aplica o non liquet.

Aliás, Vicente Greco Filho15 explicita a questão do seguinte modo: “Assim, se se


questiona a pornografia, adulta ou infantil, na Rede, a discussão não é diferente da que se
discute em função da televisão, revistas e, até, simples outdoors. Pode ocorrer uma maior,
ou menor, dificuldade de coibi-las (se for o caso), dependendo do meio, mas como se disse
com relação ao homicídio, a pornografia com abuso de crianças ou adolescentes merece
incriminação, qualquer que seja o instrumento utilizado para praticá-la.”
“Isso mostra que o direito penal, em geral, está perfeitamente aparelhado na missão de
coibir condutas lesivas, seja, ou não, o instrumento utilizado, a informática ou a Internet ou
a "peixeira".”

Deveras, enquanto não houver lei própria aplicar-se-á o direito posto, com a
observância e respeito aos ditames e princípios próprios da ciência criminal.

A seguir colacionamos alguns acórdãos, podendo ser denotado os seguintes bens


jurídicos transgredidos: concorrência desleal, fraude e estelionato, crimes relacionados ao
estatuto da criança e adolescente.

“PROCESSO PENAL – HABEAS CORPUS – PRISÃO PREVENTIVA –


CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL – GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA
– FRAUDES A INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS E A SEUS CLIENTES – UTILIZAÇÃO
DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES – INTERNET – REQUISITOS DO ART.

15
GRECO FILHO, Vicente. Algums observações sobre...p.35 e seguintes.

24
312 – ATENDIDO – 1. Paciente em liberdade provisória. Ocorrência de novas fraudes
contra instituições financeiras. Prisão Preventiva decretada. 2. Prisão Preventiva.
Necessidade. Garantia da ordem pública. Conveniência da instrução criminal. 3. Ordem
denegada. (TRF 1ª R. – HC 01000105586 – PA – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Carlos Olavo –
DJU 07.11.2002 – p. 90)”.

“ PROCESSUAL CIVIL – CIVIL – NOME DE DOMÍNIO NA INTERNET – REGISTRO


– ATRIBUIÇÃO DA FAPESP – FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO
ESTADO DE SÃO PAULO, POR DELEGAÇÃO DO COMITÊ GESTOR INTERNET
DO BRASIL – PRIMAZIA DO DIREITO DO PRIMEIRO REQUERENTE –
INEXISTÊNCIA DE PRÁTICA DE CONCORRÊNCIA DESLEAL – SENTENÇA
CONFIRMADA – I – O registro de nome de domínio ou concessão de endereço ip na rede
internet é função atribuída à fapesp – Fundação de amparo à pesquisa do Estado de São
Paulo, por delegação do comitê gestor internet do Brasil, órgão a quem incumbe coordenar
e integrar todas as iniciativas de serviços internet no país, consoante os termos da portaria
interministerial mct/mc nº 147/95. II – Dessa forma, diante da especificidade da matéria
que encontra fundamento na Resolução nº 001, de 15.04.1998, do comitê gestor internet do
Brasil, à Resolução da lide é indiferente as disposições da legislação que cuida da
propriedade industrial e do registro público de empresas mercantis e atividades afins,
respectivamente, Leis ns. 9.279/96 e 8.934/94. III – Assim, é de se conferir proteção
judicial a quem primeiramente registrou o nome de domínio no referido órgão, que na
hipótese foi a apelada. IV – Sem comprovação a alegação de prática de ilícito penal, qual
seja, concorrência desleal, é de rigor a rejeição de tal pretensão. V – Recurso improvido.
(TJDF – APC 20010110139208 – DF – 3ª T.Cív. – Rel. Des. Jeronymo de Souza – DJU
11.09.2002 – p. 52)”

“HABEAS CORPUS DELITOS PRATICADOS VIA INTERNET CARTÕES DE


CRÉDITO CLONADOS – MATÉRIA DE PROVA IMPOSSÍVEL EXAME NOS
ESTREITOS LIMITES DO WRIT – Se a verificação da ocorrência, ou não, do flagrante
preparado, em face da prisão de agentes, a quem são imputados vários delitos, praticados

25
pela internet, através de cartões de crédito clonados, depende do exame das provas colhidas
na instrução criminal, isso não pode ser objeto de apreciação nos estreitos limites do
Habeas Corpus. Ordem denegada. (TJRJ – HC 2542/2001 – 3ª C.Crim. – Rel. Des. Índio
Brasileiro Rocha – J. 30.10.2001)”

“EMBARGOS DECLARATÓRIOS – APELAÇÃO CRIMINAL – PUBLICAÇÃO DA


FICHA NA INTERNET – DIVERGÊNCIA COM O ACÓRDÃO PUBLICADO NO
DJMT – ERRO MATERIAL – CORREÇÃO QUE PODE E JÁ FOI FEITA PELO
PRÓPRIO SERVIDOR – CONTRADIÇÃO INEXISTENTE – RECURSO NÃO
CONHECIDO – O resultado do julgamento, divulgado na Internet logo após a sessão, não
é ato processual, e a divergência por acaso ocorrida com o que consta do acórdão publicado
no DJMT, pode ser corrigida pelo próprio servidor que se equivocou, razão pela qual não
devem ser conhecidos os embargos de declaração, propostos para esse fim, por ausência
dos requisitos de admissibilidade. (TJMT – RED 3.746/00 – Paranatinga – 2ª C.Crim. –
Rel. Des. Manoel Ornellas de Almeida – J. 10.10.2001)”

“CRIME DE COMPUTADOR” – PUBLICAÇÃO DE CENA DE SEXO INFANTO-


JUVENIL (E.C.A., ART. 241), MEDIANTE INSERÇÃO EM REDE BBS/INTERNET DE
COMPUTADORES, ATRIBUÍDA A MENORES – TIPICIDADE – PROVA PERICIAL
NECESSÁRIA À DEMONSTRAÇÃO DA AUTORIA – HC DEFERIDO EM PARTE – 1.
O tipo cogitado – na modalidade de “publicar cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente” – ao contrário do que sucede por exemplo aos da Lei
de Imprensa, no tocante ao processo da publicação incriminada é uma norma aberta: basta-
lhe à realização do núcleo da ação punível a idoneidade técnica do veículo utilizado à
difusão da imagem para número indeterminado de pessoas, que parece indiscutível na
inserção de fotos obscenas em rede BBS/Internet de computador. 2. Não se trata no caso,
pois, de colmatar lacuna da lei incriminadora por analogia: uma vez que se compreenda na
decisão típica da conduta criminada, o meio técnico empregado para realizá-la pode até ser
de invenção posterior à edição da lei penal: a invenção da pólvora não reclamou redefinição
do homicídio para tornar explícito que nela se compreendia a morte dada a outrem
mediante arma de fogo. 3. Se a solução da controvérsia de fato sobre a autoria da inserção

26
incriminada pende de informações técnicas de telemática que ainda pairam acima do
conhecimento do homem comum, impõe-se a realização de prova pericial. (STF – HC
76.689 – PB – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 06.11.1”

Conclusões

No Brasil tramitam centenas de projetos de leis que visam regulamentar a Internet –


Rede Mundial de Computadores, tendo sido inclusive alguns referidos por Newton de
Lucca16 , tais como os de nº 4102/93, 1070/95, 1713/96, 3173/97, 3483/97, 234/96 e 84/99,
além daqueles citados acima referente propriamente ao direito penal.

Tudo isto diz respeito ao direito eletrônico, o qual em última instância envolve a
utilização de todos os mecanismos tecnológicos existentes, sendo o mais expressivo a
Grande Rede, pelos impactos advindos com o seu surgimento, principalmente no tocante a
sua instantaneidade e rapidez de espraiamento dos mais vários tipos de informações, sejam
elas comerciais, financeiras, intelectuais etc.

Por isso, a necessidade de ser criado e estudado enquanto ramo autônomo, haja vista
não pertencer especificamente ao direito público ou privado, pois incide em todas as esferas
seja na penal, administrativa e civil.

Todo o arcabouço jurídico deverá ser focado para as relações estabelecidas na


Internet, já que os códigos, atualmente em vigor, dispõem sobre os instrumentos eletrônicos
tradicionais como o fax e telefone, este último amplamente explicitados no Estatuto Civil,
quando trata da formação dos contratos, tanto no anterior como o atual de 2002, que
recentemente entrou em vigor, o qual no artigo 428, inciso I traz a expressão meio de
comunicação semelhante.

27
Todavia, não podemos olvidar o fato de que o grande entrave para uma maior
expansão deste meio de comunicação é a questão da segurança. Com efeito na justificativa
do projeto de lei 3891/2000 está exposto o seguinte: “Não podemos ainda nos esquecer que
uma das maiores marcas deste século tem sido a globalização das quadrilhas, que passaram
a atuar em rede, quer para cometimento de crimes, como extorsão, quer para comunicação e
troca de informações, quer ainda para legitimar valores resultantes de seus crimes, na
denominada “lavagem de dinheiro”. E a Internet, especialmente a gratuita, por dispensar no
mais das vezes, informações cadastrais, passa a criar um ambiente favorável ao
desenvolvimento das atividades dessas quadrilhas”.

O legislador pátrio preocupado com esta realidade, pretende estipular uma


regulamentação para a questão, através do projeto de lei nº 3891, de 2000, que dispõe sobre
o registro de usuários pelos provedores de serviços de acesso a redes de computadores,
inclusive à Internet e mais recentemente o projeto de lei nº 6557/2002 que estabelece
obrigatoriedade de identificação para participantes com acesso a salas de encontrados
virtuais e troca de imagens na Rede Mundial de Computadores.

Isto visa num primeiro momento cercear a atuação de hackers e crackers, sendo que
estes últimos representam uma ameaça maior pois além de adentrarem aos sistemas
computacionais de empresas acabam por incidir em infrações penais, geradoras de
prejuízos enormes.

O órgão legislativo atentou para este fato, tanto que consta como uma das
justificativas do projeto 3891/2000, afirmando “... A Internet potencializou os danos
causados pelos chamados crimes de informática, que têm, por objeto, sistemas e bases de
dados de computadores, cometidos, em geral, por hackers e crackers”.

Haverá, sem dúvida alguma, os defensores da liberdade de expressão e da liberdade


na Internet, ou seja, o Estado não deveria intervir nas relações jurídicas que nela se

16
LUCCA, Newton. Títulos e Contratos eletrônicos, p. 66 in LUCCA, Newton de e Simão
Filho, Adalberto (coordenadores) e outros. Direito e Internet – aspectos jurídicos

28
estabelecem, como inclusive denotado por Tércio Sampaio Ferraz17 para quem: “Nesses
cenários, que muito têm de um “admirável mundo novo”, coloca-se o foco de luz, vindo do
futuro para o presente, sobre a necessidade atual de pensar (ou repensar) o tema da
liberdade, na medida em que a proteção da espontaneidade individual (livre iniciativa,
sigilo) contrapõe-se ao interesse público (transparência, direito à informação, repressão ao
abuso de poder) de forma imprecisa, ora pendendo para o fechamento do círculo
protecionista em torno do indivíduo (sigilo bancário, sigilo de dados como garantias
radicais), ora para o devassamento por meio da autoridade burocrática (legitimação de
investigações administrativas sem acompanhamento ou mesmo autorização judicial)”.

Percebemos, portanto, um nítido conflito entre uma ampla e irrestrita autonomia


privada frente a poder de fiscalização do Estado, tendo em vista que sopesá-los,
obviamente, com os direitos constitucionais referentes a liberdade do ser humano, expostos
na Constituição Federal18 . Trata-se na realidade do exercício do poder de polícia, que
conforme Hely Lopes Meirelles19 : “Através de restrições impostas às atividades do
indivíduo que afetem a coletividade, cada cidadão cede parcelas mínimas de seus direitos à
comunidade e o Estado lhe retribui em segurança, ordem, higiene, sossego, moralidade e
outros benefícios públicos, propiciadores do conforto individual e do bem-estar geral. Para
efetivar essas restrições individuais em favor da coletividade o Estado utiliza-se desse
poder discricionário, que é o poder de polícia administrativa. Tratando-se de um poder
discricionário a norma legal que o confere não minudeia o modo e as condições da prática
do ato de polícia. Esses aspectos são confiados ao prudente critério do administrador
público. Mas, se a autoridade ultrapassar o permitido em lei, incidirá em abuso de poder,
corrigível via judicial. O ato de polícia, como ato administrativo que é, fica sempre sujeito a
invalidação pelo Poder Judiciário, quando praticado com excesso ou desvio de poder”.

relevantes. Bauru, São Paulo: EDIPRO, 2000.


17
FERRAZ, Tércio Sampaio. A liberdade como autonomia recíproca, p. 242, in Direito e
Internet.
18
FERRAZ, Tércio Sampaio. A liberdade...p.242.
19
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros,
1992. p.119.

29
Nessa esteira vem o PL 3891/2002, o qual “obriga os provedores de serviço
adicionado de acesso a redes de computadores, inclusive à Internet, a manterem registro
dos usuários atendidos e dos acessos por eles realizados”20 .

Com isto, será facilitado o rastreamento da pessoa que está acessando a rede,
possibilitando uma punição mais rápida e eficiente, o que no direito comparado já vem
sendo realizado com sucesso.

Deveras, podemos citar o recente caso de Peter Towshend o pop star do rock inglês,
que está sendo processado por praticas relacionadas com a pedofilia. Conforme reportado
pela BBC de Londres, em 14 de janeiro de 2003, está exposto o seguinte21 : “When rock star
Pete Townshend gave his credit card details to view indecent images of children, for what
he claims was research, he left a trail found by the police months later. The card number -
which had been scrambled but was decoded by the US Postal Information Service along
with thousands of others - inevitably led back to him. Now card companies are using the
same method to track down those providing the pornography. Visa has an internet
monitoring programme costing hundreds of thousands of pounds a year”.

Logo, a empresa de cartões de crédito está desenvolvendo uma forma tecnológica


no sentido de informar às autoridades competentes, aqueles indivíduos que acessam sites
com conteúdo relacionado à pornografia infantil, cuja pena na Inglaterra é severa, tendo
sido inclusive reportado que o simples fato de acessar a página, na rede mundial de
computadores, como inclusive tem alegado o referido cantor em prol de sua defesa, pode
levar o “curioso” às barras dos Tribunais. Perante o direito inglês, não configuraria, em
princípio, crime o fato de receber, uma única vez, um spam por e-mail, o que de regra não
acarretaria sérias conseqüências.

Outrossim, mesmo que a pessoa tenha acessado alguma coisa ilícita, e tendo
apagado os vestígios de seu computador, mesmo assim há possibilidade de ser detectado o

20
PL 3891/2000, art.1º.
21
http://news.bbc.co.uk/2/hi/uk_news/2656135.stm, acessado em 24 de janeiro de 2003.

30
que foi acessado por meio de perícia técnica, que já vem sendo utilizada pela justiça
brasileira no combate ao crime organizado.

No Brasil não há ainda legislação adequada a respeito, devendo ser aplicado


analogicamente o Código Penal, promovendo assim a integração, que conforme André
Franco Montoro22 : “Em síntese, podemos dizer que há “interpretação”, em sentido estrito,
quando existe uma norma prevendo o caso; recorre-se à “integração”, quando não existe
norma explícita”. E, não podemos deixar de lado, concomitantemente o Estatuto da Criança
e do Adolescente, dependendo de cada caso.

Ademais, ainda na linha do projeto em tela, mesmo tendo o usuário deixado de


utilizar determinado provedor, o prestador de serviços é obrigado a manter os registros por
no mínimo três anos, assim poderá ser por tempo superior nunca inferior.

O projeto é bastante detalhista no sentido de quais dados devem ser mantidos dentre
os quais estatui, em seu artigo 3º, os seguintes: a identificação do usuário atendido; o
horário de conexão – login; o horário de desconexão – logout; o endereço atribuído ao
usuário na transação – IP Address – Internet Protocol Address; o número de telefone ou
identificação de ponto de rede utilizado para efetuar a conexão, salvo impossibilidade
técnica.

Um ponto relevante é a defesa da intimidade, amplamente defendido no artigo 4º,


donde os “dados e informações referidos (...) são confidenciais, não podendo ser divulgados
a terceiros, a qualquer título, salvo requisição judicial, na forma da lei”.

Aqui houve um certo paralelismo com a lei de interceptações telefônicas, Lei nº


9296/96, a fim de ser evitada a configuração da denominada prova ilícita, pois conforme o
artigo 10: “Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de
informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou como
objetivos não autorizados em lei”.

22
MONTORO, André Franco. Introdução à Ciência do Direito, p. 380.

31
O nosso direito incorporou definitivamente a teoria dos direitos da personalidade,
como podemos perceber pelo Novo Código Civil, que entrou em vigor em meados deste
ano. Dedicou um capítulo próprio, mais propriamente nos artigos 11 ao 21.

Inclusive, toda esta temática está proporcionado aos doutrinadores uma


reestruturação de conceitos, pois de acordo com José Adércio Leite Sampaio 23 : “Ainda que
não se aceite uma relação necessária e suficiente entre o problema da informática sobre os
direitos fundamentais e a solução adotada por diversos países, com a promulgação de leis
consagradoras de princípio de boas práticas de coleta e tratamento de dados, há de se
registrar o impacto produzido pelas novas técnicas de informação não apenas no plano das
políticas, sobretudo legislativas, que passaram a ser adotadas desde então, mas
principalmente na redefinição do sentido de intimidade, de sua identificação com posturas
asséticas e isolacionistas, próprias do pensamento individualista reinante no final do século
passado”.

Com efeito, advém disto a inédita responsabilidade civil na Internet, a qual num
primeiro instante irá se perfazer dos conceitos já existentes quanto às áreas civil,criminal e
administrativa. E, Antonio Lago Junior24 afirma não poder ser outro o posicionamento a ser
adotado, pois: “A interação de condutas humanas ocorrida por meio da Internet não poderia
receber um tratamento diferente. As ações recíprocas que ocorrem no espaço virtual nada
mais são do que condutas humanas que, em sua grande parte, são velhas conhecidas do
direito. É bem verdade que deixa de existir o convívio pessoal, e as pessoas passam a ser
reconhecidas por um login, seus endereços físicos passam a ser substituídos por endereços
lógicos etc., e é justamente por isso que causa tanta perplexidade. Mas toda e qualquer
evolução tecnológica, é preciso não descurar desse importante detalhe, ocorre em razão do
homem e deve para ele voltar-se. Não haveria sentido se assim não o fosse”.

23
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada: uma visão jurídica
da sexualidade, da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da morte.
Belo Horizonte: Del Rey, 1998. p. 492 e 493.
24
LAGO JÚNIOR, Antônio. Responsabilidade civil por atos ilícitos na Internet. São Paulo:
LTr, 2001. p. 40.

32
O projeto traz imposições de sanções pecuniárias para o descumprimento no tocante
a manutenção dos dados e respectivos registros conforme nela estipulado, além de criar o
crime de divulgação de dados e informações desconforme o artigo 4º, impondo uma pena
corporal de um a quatro anos de detenção, o que implica de acordo com a nossa Lei de
Execução Penal, o cumprimento inicial em regime semi-aberto, mais multa.

Mais recentemente, o projeto 3891/2000 foi apensado ao PL.6557/2002 tendo sido


determinada a mudança do regime de tramitação da matéria para Regime de Prioridade.

O PL 6557/2002, tem por escopo estabelecer de modo compulsório a identificação


para participantes com acesso a salas de encontros virtuais e troca de imagens na Rede
Mundial de Computadores – Internet.

A intenção do legislador está focada, consoante a sua justificativa, no fato de que:


“As recentes denúncias de prática de pedofilia e violência contra menores têm importante
foco nas salas de chat, bate-papo ou encontro virtual e troca de imagens disponibilizadas na
Rede Mundial de Computadores”.

A base é a mesma do projeto anteriormente comentado, mas com vistas mais


específicas, ou seja, controlar os ambiente de comunicação virtual procedido através de
chat, muito em voga para estabelecer por exemplo sala de conferências virtuais, para troca
de idéias e informações, e inclusive imagens.

Em suma, todos os esforços são válidos pois de acordo com Gustavo Testa
Correa25 : “... a Internet é um lugar propenso ao desenvolvimento de fraudes, devido,
sobretudo, ao anonimato que oferece aos seus usuários e à “imperfeição” dos programas de
computadores utilizados para o acesso a ela e seu desenvolvimento”. E, a intenção do
legislador é justamente desestimular práticas ofensivas, permitindo a quebra desta
sistemática e proporcionado uma eficiente identificação daquele que perpetra atividades

25
CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos Jurídicos....p.44.

33
ilícitas num ambiente digital multifacetado, ou seja, que viabiliza o acesso a um mundo de
informações a nível global, em qualquer parte do planeta.

BIBLIOGRAFIA:

CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos jurídicos da Internet. São Paulo: Saraiva, 2000.
DELMANTO, Celso. Código penal comentado. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
DINIZ, Maria Helena. Código Civil: inovações. Jornal Tribuna da Magistratura. São
Paulo, julho-agosto 2002.
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. A liberdade como autonomia recíproca de acesso à
informação. In: GRECO, Marco; SILVA MARTINS, Ives Gandra. Direito e Internet:
relações jurídicas na sociedade informatizada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.
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GRECO FILHO, Vicente. Algumas observações sobre o direito penal e a internet. Revista
Direito Mackenzie nº 1/2000.
LAGO JÚNIOR, Antônio. Responsabilidade civil por atos ilícitos na Internet. São Paulo:
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LAWAND, Jorge José. Teoria geral dos contratos eletrônicos. São Paulo: Editora Juarez
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Derecho Informático 2003.02 nº 55
LUCCA, Newton de. Títulos e contratos eletrônicos: o advento da informática e seu
impacto no mundo jurídico. In: LUCCA, Newton de; SIMÃO Filho, Adalberto (coords.).
Direito e Internet – aspectos jurídicos relevantes. 1ª ed. São Paulo – Bauru: Edipro, 2000.
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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1992.
MIRABETE, Julio. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 1991. v.1.
MONTORO, André Franco. Introdução à ciência do direito. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000.

34
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada: uma visão jurídica
da sexualidade, da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da
comunicação e informações pessoais, da vida e da morte. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.
STAMMLER, Rudolf. The theory of justice. New York: Macmillan, 1925.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. São Paulo: Saraiva,
1994.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. São Paulo: Atlas, 2003.

INTERNET

http://news.bbc.co.uk/2/hi/uk_news/2656135.stm, acessado em 24 de janeiro de 2003.

35
O Novo Código Civil e a Internet

Renato M. S. Opice Blum

Advogado e economista; Professor coordenador de pós-graduação em Direito Eletrônico;


Professor da Florida Christian University, Fundação Getúlio Vargas, PUC, Centro Técnico
Aeroespacial, Fenasoft e outras; Pós-graduado pela PUC-SP, com extensão na Eastern
Illinois University; MBA Essentials in Economics (University of Pittsburgh); Fundador e
Conselheiro do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática (IBDI); Presidente
do Conselho de Comercio Eletrônico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo;
Ex-Presidente e Fundador do Comitê de Direito da Tecnologia da Câmara Americana de
Comércio; Autor / Colaborador das Obras: "Direito Eletrônico - a Internet e os Tribunais",
"Comércio Eletrônico", "Direito & Internet - aspectos jurídicos relevantes", "Direito da
Informática - temas polêmicos", “Conflitos sobre Nomes de Domínios e outras questões
jurídicas da internet”, "Responsabilidade Civil do Fabricante e Intermediários por Defeitos
de Equipamentos e Programas de Informática", "O Bug do Ano 2000 - aspectos jurídicos e
econômicos" e outras.

Ainda que o Novo Código Civil Brasileiro (NCC), já em vigor, não conte com um
capítulo específico para as questões eletrônicas, algumas disposições são diretamente
aplicadas às questões jurídicas da internet, de forma positiva, ampliando os mecanismos
legais de proteção nesse novíssimo ramo do direito.

Inicialmente, destacamos o reforço legal26 na responsabilidade do administrador,


que, agora, ainda mais, deverá não só agir nas questões preventivas, mas também nas
reparatórias. Vale dizer que os diretores, gerentes ou CSOs (Chief Security Officers –
Chefes de Segurança - responsáveis por sistemas informáticos) tem o dever legal de não só
“fechar” vulnerabilidades em sistemas eletrônicos, mas também processar os responsáveis
por invasões, fraudes e outros ilícitos digitais, conforme dispõem os artigos 1.011 e 1.016
do NCC27 .

26
A Lei das S.A.s dispõe de forma semelhante.
27
Art. 1.011. O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o
cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na
administração de seus próprios negócios. Art. 1.016. Os administradores respondem
solidariamente perante a sociedade e os terceiros prejudicados, por culpa no
desempenho de suas funções.

36
Os negócios eletrônicos também foram privilegiados com as disposições da recente
Lei exaltando a boa-fé, finalidade social, usos e costumes (art. 113)28 . Significa dizer que
houve uma preocupação em garantir a manifestação de vontade por qualquer meio,
especialmente no eletrônico, já incorporado à nossa tradição tecnológica e que pode ser
equiparado à contratação via telefone, nas situações em que efetivamente ocorra a transação
“ao vivo”, configurando-se uma contratação entre presentes, como preceitua o art. 428, I29 .
A prova eletrônica foi, final e taxativamente reconhecida no art. 22530 , o que deve fomentar
o comércio eletrônico com certificação digital nos termos da Medida Provisória 2.200-2/01.
Anotamos, ainda, que o art. 889, § 3º31 , admite a emissão de títulos de crédito a partir de
caracteres criados em computador.

Quanto à responsabilidade civil, importantes reflexos poderão afetar os mais


diversos entes que transacionarem na internet. Dentre inúmeras questões trazidas pelo art.
92732 , selecionamos duas: a responsabilidade do provedor e daquele que envia mensagens
não solicitadas (spammer).

O primeiro deverá, preventivamente, rever e aditar os contratos celebrados com seus


respectivos clientes (hóspedes) de modo a garantir a possibilidade legal da participação
conjunta em processos judiciais. Isso em função do instituto da responsabilidade objetiva
(independente da culpa) trazida pelo citado artigo e que poderá gerar interpretações nesse

28
Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos
do lugar de sua celebração.
29
Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:
I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se
também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação
semelhante;
30
Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e,
em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas
fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar
a exatidão.
31
Art. 889. § 3o O título poderá ser emitido a partir dos caracteres criados em
computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente,
observados os requisitos mínimos previstos neste artigo.
32
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem.

37
sentido, ainda que contrária à nossa opinião, ou seja, de que o provedor seria o responsável
direto pelas atividades dos clientes que hospedam seus sites em seus servidores.
Exemplificando: identificado um site na internet de conteúdo difamatório, o magistrado
poderá interpretar a norma como sendo o provedor o responsável primário pelo ato ilegal, o
que colocaria em risco tal atividade, caso não haja a possibilidade da responsabilização do
efetivo causador do prejuízo (hóspede) no mesmo processo, exceções feitas às situações
que envolverem o Código do Consumidor. Acrescente-se que, quanto ao registro de logs,
acessos informações e cadastros, o provedor fica integralmente responsável pela
preservação de tais dados por no mínimo três anos, sob pena de responsabilidade pela
omissão (o que poderá gerar, sem qualquer dúvida, impunidade aos ilícitos eletrônicos, e
que jamais poderá subsistir na ordem legal nacional).

O segundo (spammer) encontrará mais dificuldades na sua atividade, repudiada por


grande parte da população mundial, que consiste no envio indiscriminado de mensagens
eletrônicas com os mais criativos conteúdos, muitas vezes nocivos aos destinatários. O art.
18733 abre a possibilidade de restrição na fonte, ou seja, impedir a conduta descrita em
conjunto com indenizações contra o spammer que poderá sofrer óbices do Judiciário na
respectiva prática. É uma grande inovação, vez que até a entrada em vigor do Novo Código
as possibilidades de atuação eram restritas ao momento posterior ao envio. Dessa forma,
apenas indenizações foram pleiteadas, sem a possibilidade legal de restrição da atividade
em função do princípio constitucional da reserva legal. Agora o cenário é outro, inclusive
quanto a atuação do Ministério Público.

A privacidade, igualmente, não foi esquecida. Pelo contrário, notamos uma


preocupação do legislador nessa proteção, ainda que de forma genérica e com ampliação do
poder do magistrado, que formará sua convicção, caso a caso, com a possibilidade de
adotar quaisquer providências necessárias à proteção, incluindo multas e outras restrições

33
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou
pelos bons costumes.

38
adequadas ao ambiente eletrônico. Os arts. 20 e 2134 tratam do tema e destacam a proteção
da divulgação de escritos, da transmissão da palavra, e da exposição ou utilização da
imagem das pessoas físicas ou jurídicas que poderão ser proibidas de imediato, inclusive se
o intuito for apenas comercial, sem falar em prejuízo no tocante à fama, honra e
respeitabilidade, questões também protegidas pelas normas citadas. O art. 21 poderá ser
aplicado em ocorrências relacionadas à coleta de dados, comercialização, cessão e
compartilhamento de endereços eletrônicos, bem como utilização de recursos específicos
para o registro e vinculação de informações de internautas, tais como cookies, webbugs e
spywares.

Por fim, cabe destacar o instituto do enriquecimento sem causa, tratado pelos arts.
884, 885 e 88635 , muito útil em situações relacionadas à proteção de idéias, sistemas,
métodos, projetos, planos, esquemas, etc., que fogem da proteção autoral e industrial em
determinadas características, mas que beiram a má-fé e a concorrência desleal, condutas
ilícitas reiteradamente combatidas pelo Novo Código.

Não obstante serem positivas as inovações do Novo Diploma e suas repercussões no


campo do direito eletrônico, o ideal seria contar com disposições mais específicas e

34
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à
manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou
a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser
proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe
atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins
comerciais.
Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para
requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.
Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do
interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato
contrário a esta norma.
35
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será
obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores
monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a
recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará
pelo valor do bem na época em que foi exigido.
Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique
o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.
Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado
outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.

39
adequadas ao ambiente digital, o que evitaria, inclusive, na discussão, muitas vezes isolada,
dos mais de cento e cinqüenta projetos em tramitação no Congresso Nacional sobre o tema.
Talvez fosse interessante o estudo conjunto dessas proposições visando incorporá-las às
futuras alterações no Novo Código, já em discussão em projeto de lei específico.

40
A Internet e os Tipos Penais que Reclama Ação Criminosa em Público

Aldemario Araujo Castro

Procurador da Fazenda Nacional; Procurador-Geral Adjunto da Fazenda Nacional; Ex-


Coordenador-Geral da Dívida Ativa da União; Professor da Universidade Católica de
Brasília – UCB; Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico - IBDE
Brasília, 10 de agosto de 2003

I. INTRODUÇÃO

Vivemos em plena “Sociedade da Informação” (1). Os inacreditáveis avanços


tecnológicos atualmente observados apresentam duas facetas muito bem definidas. Temos
um lado positivo ou construtivo, onde a vertiginosa velocidade da transmissão de
informações e a enorme quantidade de dados processados geram as mais variadas
comodidades. Por outro lado, como é a regra nos espaços humanos de interação, existe um
campo negativo ou destrutivo ligado às modernas tecnologias da informação baseadas nos
computadores eletrônicos. São vários os agentes, movidos por todo tipo de interesse, que
utilizam os computadores e as redes por eles formadas, notadamente a Internet (2), para
realizarem as condutas mais censuráveis ou condenáveis.

II. OS CRIMES DE INFORMÁTICA E SUAS CLASSIFICAÇÕES

Apesar de alguma discrepância doutrinária, são denominados de “crimes de


informática” as condutas descritas em tipos penais realizadas através de computadores ou
voltadas contra computadores, sistemas de informática ou os dados e as informações neles
utilizados (armazenados ou processados).

Os tais “crimes de informática” são classificados de diversas formas. Destacamos as


duas mais utilizadas. Existiriam os crimes de informática próprios e os impróprios. Os
primeiros são aqueles que somente podem ser efetivados por intermédio de computadores
ou sistemas de informática, sendo impraticável a realização da conduta por outros meios. Já
os qualificados como impróprios admitem a prática por diversos meios, inclusive os meios

41
informáticos. A outra classificação mais freqüente é tripartida. Teríamos: a) os crimes de
informática puros, onde o agente objetiva atingir o computador, o sistema de informática ou
os dados e as informações neles utilizadas; b) os crimes de informática mistos, onde o
agente não visa o sistema de informática e seus componentes, mas a informática é
instrumento indispensável para consumação da ação criminosa e c) os crimes de
informática comuns, onde o agente não visa o sistema de informática e seus componentes,
mas usa a informática como instrumento (não essencial, poderia ser outro o meio) de
realização da ação.

III. OS CRIMES DE INFORMÁTICA E A TIPICIDADE PENAL

A Constituição, no art. 5o , inciso XXXIX, estabelece que não há crime sem lei
anterior que o defina. Nestes termos, o chamado tipo penal consiste numa conduta clara e
nitidamente fixada em lei. A materialidade da conduta, os traços caracterizados da ação
criminosa, necessitam estar estabelecidos com suficiente densidade e precisão.

A legalidade penal e a legalidade tributária, notadamente por representarem


exceções aos direitos de liberdade e de propriedade, respectivamente, não admitem
operacionalização ou construções abertas, viabilizando desvios, abusos e, em última
instância, insegurança jurídica (3).

Constatamos, no campo do direito penal brasileiro, que a parte especial do Código


foi elaborada na década de 40 do século passado, estando os tipos penais mais relevantes
vinculados aos traços de materialidade e tangibilidade, completamente afastados do mundo
eletrônico ou virtual trazido pelas modernas tecnologias da informação (4).

Advogamos, portanto, a imperiosa necessidade de adoção, pela via legislativa, única


apropriada, de modernos tipos penais para permitir a repressão às ações realizadas nos
meios eletrônicos tendo como alvos as novas realidades intangíveis. Entendemos, apesar de

42
inúmeras vozes contrárias, que nestes últimos casos, à mingua de lei, as condutas flagradas
não são (ainda) criminosas (5).

IV. TIPOS PENAIS QUE EXIGEM AÇÃO CRIMINOSA EM PÚBLICO

Por outro lado, são vários os tipos penais atualmente existentes que reclamam
publicação, publicidade ou ação em local aberto ao público como elemento essencial para
efetivação da ação criminosa ou contravencional (6). Vejamos, num rápido apanhado sem
pretensão de esgotar as hipóteses, os crimes (ou contravenções) com esta característica:

“Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir


ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou
objeto de culto religioso” (art. 208 do Código Penal)

“Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público” (art. 233 do
Código Penal)

“Incitar, publicamente, a prática de crime” (art. 286 do Código Penal)

“Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de seu autor” (art. 287 do Código
Penal)

“Estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante


o pagamento de entrada ou sem ele” (art. 50 da Lei de Contravenções Penais)

“Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou


procedência nacional.

43
§2o Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de
comunicação social ou publicação de qualquer natureza” (art. 20 da Lei no 7.716, de
1989)

“Comete crime de concorrência desleal quem:

I - publica, por qualquer meio, falsa informação, em detrimento de concorrente, com o


fim de obter vantagem;” (art. 195 da Lei no 9.279, de 1996)

“Fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou


adolescente” (art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente)

V. IMPORTÂNCIA DO TEMA

O debate aqui proposto reveste-se de importância fundamental. Afinal, se a


veiculação de certos dados ou informações pela Internet (rede mundial de computadores)
não puder ser caracterizada como publicação, estaremos afastando para o campo da
atipicidade penal, para a ausência de conduta criminosa, uma série de ações altamente
reprováveis e alvo de intensa condenação social.

Neste sentido, da caracterização de atipicidade penal, já decidiu o Tribunal de


Justiça do Rio de Janeiro. Eis a parte mais significativa da ementa da decisão (7):

“A aplicação analógica de disposição penal atenta contra o princípio constitucional da


legalidade ou reserva legal. ‘Divulgar’ não é ‘publicar’: quem publica, divulga, certamente;
mas nem todo aquele que divulga, publica. A divulgação pode ser por qualquer forma, até
oral, mas a publicação não prescinde da existência de objeto material corpóreo.”

44
VI. A INTERNET COMO ESPAÇO PÚBLICO OU ABERTO AO PÚBLICO E ONDE É
VIÁVEL A AÇÃO DE PUBLICAR

A Internet (rede mundial de computadores) pode e deve ser vista como espaço
público, aberto ao público e onde é viável a ação de publicar (8). Sustentamos a afirmação
anterior com base em duas linhas de argumentação.

O primeiro argumento está assentado nos sentidos ou significados dos termos


“público” e “publicar”. Não há, nas definições dos vocábulos, necessidade de meios ou
formas específicos ou especiais. São termos abertos, dotados de significativa generalidade.
Vejamos como aparecem os verbetes em alguns dos dicionários mais reconhecidos:

“Público. 3. Que é do uso de todos; comum: hospital público; passeio público. 4. Aberto a
quaisquer pessoas: exposição pública; conferência pública; concurso público. 5. Conhecido
de todos; manifesto, notório: O escândalo tornou-se público. 6. Que se realiza em presença
de testemunhas, em público; não secreto: sessão pública; votação pública.”

Publicar. 1. Tornar público, manifesto, notório; vulgarizar: publicar um segredo. 2.


Divulgar, espalhar. Propalar. 3. Afirmar publicamente; proclamar, pregar.” (Novo
Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Editora Nova Fronteira. 2a Edição)”

“Público. Que se refere ao povo em geral. Manifesto, conhecido por todos. A que todas as
pessoas podem comparecer. Em público, em presença de muitas pessoas.”

Publicar. Levar ao conhecimento do público: publicar uma lei. Divulgar, propagar:


publicar uma notícia.” (Enciclopédia e Dicionário Koogan/Houaiss. Edições Delta. 1995)

45
O segundo argumento está assentado na idéia de uma interpretação evolutiva (9) da
legislação em consonância com o contexto em que a norma será aplicada. Com efeito, o
frenético surgimento de novas tecnologias impõe ao intérprete e ao aplicador do direito
uma responsabilidade anterior a do legislador. A ampliação do campo de abrangência de
atos ou atividades representadas por determinada fórmula lingüística (palavra ou expressão)
deve ser vista com naturalidade e prontamente acatada quando é uma imposição inexorável
da realidade, e não, um capricho do intérprete para o atendimento de interesses escusos ou
mesquinhos (10).

Neste sentido, o ato de publicar possuía contornos mais limitados antes do


surgimento dos meios eletrônicos de amplo acesso público, notadamente a Internet. Com as
novas formas eletrônicas de propagação da informação é irrecusável a ampliação do
significado de publicar para abranger estas novas realidades.
.
Assim, o registro em sites ou home pages, o envio de informações por intermédio
de listas de discussão ou distribuição de e-mails, a comunicação em chats ou salas de bate-
papo abertas são situações que se enquadram perfeitamente na delimitação apresentada
neste trabalho.

É preciso consignar que não é todo “local” na Internet que pode ser caracterizado
como público ou viabilizador da ação de publicar. Com efeito, os sites, ou partes deles, com
acesso restrito ou limitado, notadamente por conta da utilização de senhas, não permitem, à
toda evidência, o enquadramento referido anteriormente (11).

VII. A POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Em decisão, alçada à condição de paradigma, de enorme repercussão nas reflexões


sobre o direito da informática, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento

46
absolutamente consonante com aquele defendido neste trabalho. Eis a ementa da importante
decisão (12):

“’Crime de Computador’: publicação de cena de sexo infanto-juvenil (E.C.A., art.


241), mediante inserção em rede BBS/Internet de computadores, atribuída a menores:
tipicidade: prova pericial necessária à demonstração da autoria: HC deferido em parte. 1. O
tipo cogitado - na modalidade de ‘publicar cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente’ - ao contrário do que sucede por exemplo aos da Lei de
Imprensa, no tocante ao processo da publicação incriminada é uma norma aberta: basta-lhe
à realização do núcleo da ação punível a idoneidade técnica do veículo utilizado à difusão
da imagem para número indeterminado de pessoas, que parece indiscutível na inserção de
fotos obscenas em rede BBS/Internet de computador. 2. Não se trata no caso, pois, de
colmatar lacuna da lei incriminadora por analogia: uma vez que se compreenda na decisão
típica da conduta criminada, o meio técnico empregado para realizá-la pode até ser de
invenção posterior à edição da lei penal: a invenção da pólvora não reclamou redefinição do
homicídio para tornar explícito que nela se compreendia a morte dada a outrem mediante
arma de fogo. 3. Se a solução da controvérsia de fato sobre a autoria da inserção
incriminada pende de informações técnicas de telemática que ainda pairam acima do
conhecimento do homem comum, impõe-se a realização de prova pericial.”

VIII. CONCLUSÕES

Diante das considerações realizadas podemos concluir o seguinte:

1. A Internet (rede mundial de computadores) pode e deve ser vista como espaço público,
aberto ao público e onde é viável a ação de publicar.

47
1.1. O registro em sites ou home pages, o envio de
informações por intermédio de listas de discussão ou distribuição de e-mails, a
comunicação em chats ou salas de bate-papo abertas são situações com a marca da
publicidade.

1.2. Não é todo “local” na Internet que pode ser caracterizado


como público ou viabilizador da ação de publicar. Os sites, ou partes deles, com acesso
restrito ou limitado, notadamente por conta da utilização de senhas, não permitem, à toda
evidência, o enquadramento referido anteriormente.

2. O frenético surgimento de novas tecnologias impõe ao intérprete e ao aplicador do


direito uma responsabilidade anterior a do legislador. Impõe-se uma interpretação evolutiva
da legislação em consonância com o contexto em que a norma será aplicada. A ampliação
do campo de abrangência de atos ou atividades representadas por determinada fórmula
lingüística (palavra ou expressão) deve ser vista com naturalidade e prontamente acatada
quando é uma imposição inexorável da realidade.

NOTAS:

(1) “Hoje, a humanidade, atônita, se vê diante da incrível velocidade das mudanças. A


primeira (Revolução Agrícola) levou um pouco mais de 9.000 anos; a segunda (Revolução
Industrial) cerca de três séculos e agora pouco mais de 45 anos. Estamos frente a uma nova
mudança, tão profunda, que arriscamos afirmar que nos encontramos diante de uma nova
civilização. A civilização da Revolução Digital, tendo a América do Norte como o palco
principal deste novo período, chamado, por muitos, de Sociedade Pós-Industrial./É
importante frisar que estas três revoluções se caracterizaram, principalmente, por estarem
embasadas num sistema distinto de geração de riquezas. Mas todas, indistintamente,
produziram efeitos e conseqüências que interferiram de forma marcante, causando
mudanças nos diferentes sistemas político, social, cultural, filosófico, jurídico, ético e
institucionais, entre outros, como veremos a seguir” (Marco Antônio Machado Ferreira de

48
Melo. A Tecnologia, Direito e a Solidariedade em Direito, Sociedade e Informática -
Limites e perspectivas da vida digital. Fundação Boiteux. 2000. Págs. 22 e 23).

(2) “... é um sistema mundial de redes de computadores - uma rede de redes em que os
usuários em qualquer computador podem, se tiverem permissão, obter informações de
qualquer outro computador (e às vezes falar diretamente com usuários em outros
computadores). (...) Hoje, a internet é uma facilidade pública, cooperativa e auto-
sustentável acessível a milhões de pessoas em todo o mundo” (Dicionário de Tecnologia.
Editora Futura. 2003. Pág. 436).

(3) Nesta linha, temos uma situação radicalmente distinta da proteção presente na
legislação civil. Veja que os arts. 186 e 927 do Código Civil (Lei no 10.406, de 2002) fixam
a obrigatoriedade de reparação do dano para qualquer ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência. Não existem condutas previamente descritas ou estabelecidas.
Importa tão-somente a relação ou nexo entre a ação e o resultado.

(4) Neste sentido, a análise ou estudo do tipo penal do furto, consagrado no art. 155 do
Código Penal, é riquíssima de significados. Com efeito, a ação ou conduta criminosa
consiste em subtrair coisa alheia móvel. A marca da tangibilidade do bem sobre o qual recai
a ação criminosa fica patente nos termos "subtrair", "coisa" e "móvel". Temos, para
confirmar esta conclusão, o parágrafo terceiro do mesmo artigo estabelecendo
taxativamente, porque não compreendido no caput, o furto de energia elétrica, algo
desprovido de materialidade, consagrada como padrão.

(5) Importa, ainda, para não estender a conclusão anterior além do âmbito devido, fixar que
não é o simples fato do uso do computador ou da presença dele que conduz a atipicidade
penal. A conclusão decorre tão-somente das características não tangíveis dos bens afetados.

(6) “No Brasil, só há dois tipos de infrações penais: 1. Os crimes (também chamados
delitos). 2. As contravenções. Na verdade, inexiste um dado exato que sirva de divisor entre
crime e contravenção. (...) A única distinção entre crimes e contravenções reside na maior

49
ou menor gravidade com que a lei vê tais condutas, denominado ‘contravenções’ às mais
leves e ‘crimes’ às mais graves. Entretanto, dependendo da vontade do legislador, um
corportamento que hoje é crime pode passar, amanhã, a contravenção e vice-versa” (Celso
Delmanto. Código Penal Comentado. 2a Edição. 1988. Editora Renovar. Pág. 20).

(7) Habeas Corpus. Processo no 2000.059.01916. Sexta Câmara Criminal. Relator


Desembargador Eduardo Mayr. Julgamento em 27 de julho de 2000.

(8) “Publicar é tornar público, divulgar. Quem insere fotos de crianças ou adolescentes em
cena de sexo na Internet está publicando e, assim, cometendo a infração. O crime pode ser
praticado através de sites ou homepages, muitas delas destinadas à pornografia. É
importante salientar que não importa o número de internautas que acessem a página, ainda
que ninguém conheça o seu conteúdo, as imagens estarão à disposição de todos,
configurando a infração. Aliás, o crime se consuma quando as imagens estão à disposição
do público” (Carla Rodrigues Araújo de Castro. Crimes de Informática e seus Aspectos
Processuais. 2a Edição. 2003. Editora Lumen Juris. Pág. 46).

(9) O direito constitucional conhece o fenômeno da interpretação evolutiva. Segundo Luís


Roberto Barroso: “ A interpretação evolutiva é um processo informal de reforma do texto
da Constituição. Consiste ela na atribuição de novos conteúdos à norma constitucional, sem
modificação do seu teor literal, em razão de mudanças históricas ou de fatores políticos e
sociais que não estavam presentes na mente dos constituintes” (Interpretação e Aplicação
da Constituição. 4a Edição. 2002. Editora Saraiva. Pág. 145). O mesmo autor registra ainda:
“As normas, ensina Miguel Reale, valem em razão da realidade de que participam,
adquirindo novos sentidos ou significados, mesmo quando mantidas inalteradas as suas
estruturas formais” (Idem. Pág. 144).

(10) “Pensamos, no entanto, que não violenta o valor segurança jurídica, nem diminui a
força operacional da noção de conceito classificatório ou determinado, a adaptação de
elementos tributários estruturantes a mudanças radicais de paradigmas sociais. Não
advogamos a sensibilidade a qualquer mudança. Sustentamos a vinculação do conceito aos

50
cânones de uma nova etapa histórica, condutora de fatos e situações novas, mas nele
enquadráveis razoavelmente, porque apenas formas originais de efetivamente praticar os
mesmos atos, ou, sob o ângulo do conteúdo, da essência, realizar as mesmas manifestações
econômicas” (Aldemario Araujo Castro. Os meios eletrônicos e a tributação. Disponível
em: http://www.aldemario.adv.br/meios.htm. Acesso em: 8 jul 2003).

(11) A menos que a senha seja distribuída indiscriminadamente ou para número


significativo de pessoas.

(12) Habeas Corpus no 76.689/PB. Primeira Turma. Relator Ministro Sepúlveda Pertence.
Julgamento em 22 de setembro de 1998.

51
A Regulamentação da Internet no Brasil

Aldemario Araujo Castro

Procurador da Fazenda Nacional; Professor da Universidade Católica de Brasília – UCB;


Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico – IBDE - Brasília, 16 de
novembro de 2003

O Ministério das Comunicações e o Ministério da Ciência e Tecnologia, em nota


conjunta datada de maio de 1995, propugnaram pela constituição de um Comitê Gestor
Internet do Brasil. O órgão deveria estar voltado para tornar efetiva a participação da
sociedade nas decisões sobre a implantação, administração e uso da Internet no Brasil.

O Comitê foi “criado” pela Portaria Interministerial MC/MCT no 147, de 31 de


maio de 1995. Na composição do órgão foram contemplados representantes do Poder
Público, das entidades operadoras e gestoras das linhas de conexão de alta velocidade, de
provedores de serviços (acesso e informações), de usuários, do empresariado e da
comunidade acadêmica.

As principais atribuições do Comitê Gestor, definidas no ato de “criação”, foram as


seguintes:

a) fomentar o desenvolvimento de serviços Internet no Brasil;


b) recomendar padrões e procedimentos técnicos e operacionais para a Internet no Brasil;
c) coordenar a atribuição de endereços Internet, o registro de nomes de domínios, e a
interconexão de espinhas dorsais (backbones - linhas de conexão de alta velocidade de uma
rede que se conectam às linhas de baixa velocidade);
d) coletar, organizar e disseminar informações sobre os serviços Internet.
O ato normativo mais relevante expedido pelo Comitê Gestor foi a Resolução no 1, de 15 de
abril de 1998. Este ato trata de algo crucial para o funcionamento da Internet (verdadeiro
"oxigênio" da Grande Rede): a constituição dos domínios (endereços eletrônicos)
brasileiros (com "final" .br).

52
As principais diretrizes fixadas na Resolução no 1, de 1998, são as seguintes:
a) princípio de que o direito ao nome de domínio será conferido ao primeiro requerente que
satisfizer as exigências para o registro;
b) permitir registro de domínios tão-somente para pessoas jurídicas que funcionem
legalmente no país e para pessoas físicas;
c) cobrança de retribuições pelo registro (cobrado uma só vez) e pela manutenção anual;
d) fixação das hipóteses de extinção do direito de uso de um nome de domínio (renúncia,
não pagamento das retribuições, não uso regular, inobservância de regras e ordem judicial).

Por força da Resolução no 2, também de 15 de abril de 1998, o Comitê Gestor


delegou competência à FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo)
para realizar as atividades de registro de nomes de domínio e distribuição de endereços IPs
na Internet do Brasil.

Ocorre que toda a estrutura e a infra-estrutura montadas a partir do Comitê Gestor


Internet do Brasil padecem de uma grave insuficiência jurídica. Com efeito, a portaria
interministerial em questão não possui lastro ou fundamento legal.

O ato administrativo em tela foi expedido tão-somente com base no permissivo


inscrito no art. 87, parágrafo único, inciso II da Constituição. “Curiosamente”, a regra
constitucional fixa competência para o Ministro de Estado “expedir instruções para a
execução das leis, decretos e regulamentos”. O ato expedido não menciona a base legal e
nem conseguimos vislumbrar, na ordem jurídica em vigor, naquele ou neste momento, o
substrato legal necessário.

Registramos, por oportuno, que o diploma normativo anteriormente editado não se


limita a regular situações ou fatos ocorridos no seio da Administração Pública. No âmbito
de padrões e procedimentos técnicos e operacionais estabelece que o Comitê Gestor fará
meras recomendações. Entretanto, o órgão disciplinará a atribuição de endereços Internet e
o registro de nomes de domínio. Nesta última seara, que envolve complexas e significativas
relações entre os particulares, notadamente no desenvolvimento de atividades com

53
finalidade de lucro, como a exploração do provimento de acesso à rede mundial de
computadores, as normas expedidas pelo Comitê Gestor inovam diretamente a ordem
jurídica, ingressando em campo reservado constitucionalmente ao legislador.
Recentemente, mais precisamente no dia 3 de setembro de 2003, o Presidente da República
adotou decreto onde estabelece que “fica criado o Comitê Gestor da Internet no Brasil –
CGIbr”.

As atribuições do órgão “criado” pelo Decreto no 4.829, de 2003, são praticamente


idênticas às competências do Comitê “criado” pela Portaria Interministerial MC/MCT no
147, de 1995. Assumem particular relevo, no sentido da identidade das disposições
normativas, as funções de “recomendar procedimentos, normas e padrões técnicos e
operacionais, para a segurança das redes e serviços de Internet” e “estabelecer diretrizes
para a organização das relações entre o Governo e a sociedade, na execução do registro de
Nomes de Domínio, na alocação de Endereço IP (Internet Protocol) e na administração
pertinente ao Domínio de Primeiro Nível (ccTLD - country code Top Level Domain), ‘.br’”
Portanto, o novo Comitê Gestor, “criado” pelo decreto, assim como o antigo Comitê
Gestor, “instituído” pela portaria, pretende fixar normas de conduta a serem observadas por
um significativo número de pessoas físicas e jurídicas direta e indiretamente relacionadas
com a Grande Rede. No decreto, as atribuições normativas e executivas do novo Comitê
Gestor, envolvendo profundas relações entre particulares e entre estes e o Poder Público,
restam explicitamente consagradas nas expressões “relações entre o Governo e a
sociedade”, “execução do registro de Nomes de Domínio”, “na alocação de Endereço IP
(Internet Protocol)” e “administração pertinente ao Domínio de Primeiro Nível (ccTLD -
country code Top Level Domain), ‘.br’”. Por conseguinte, o decreto, assim como a portaria,
inova e viabiliza a inovação da ordem jurídica à margem da lei.

Verificamos, salvo melhor juízo, que o Decreto no 4.829, de 2003, padece da mesma
insuficiência jurídica apontada em relação à Portaria Interministerial MC/MCT no 147, de
1995. O referido decreto presidencial foi expedido com fulcro no disposto no art. 84, inciso
VI, alínea “a” da Constituição, assim redigido: “Compete privativamente ao Presidente da
República: (...)VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da

54
administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção
de órgãos públicos;”. Conforme demonstramos o decreto não trata exclusivamente da
organização e do funcionamento da Administração Federal, antes regula e viabiliza a
regulação, de forma inaugural na ordem jurídica, de inúmeras e complexas relações entre
particulares e entre estes e o Poder Público. Ademais, o decreto, já no seu primeiro
comando, exatamente no caput do artigo primeiro, cria (ou pretende criar) um órgão
público (o Comitê Gestor da Internet no Brasil).

Lembramos que na criação da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-


Brasil e do respectivo Comitê Gestor (Comitê Gestor da ICP-Brasil), voltados para “para
garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma
eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados
digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras”, foi seguido um modelo
de institucionalização significativamente diverso e escorreito. Adotou-se originariamente a
Medida Provisória no 2.200, de 21 de junho de 2001, atualmente vigorando como a Medida
Provisória no 2.200-2, de 24 de agosto de 2001, onde foi instituída a infra-estrutura de
chaves públicas, criado o Comitê Gestor, definida sua composição e fixadas as
competências a serem exercidas pelo órgão colegiado. Por esta via, as diretrizes básicas do
uso de chaves públicas no Brasil possui fundamento em norma com força de lei e os
diplomas normativos subseqüentes, expedidos por órgãos e entidades da Administração
Federal, nutrem-se desta validade inicial.

Observamos, por fim, que a fragilidade do formato jurídico adotado revela-se


particularmente problemática quando o exercício de uma das principais competências do
Comitê Gestor da Internet no Brasil, a ser efetivado no campo dos “procedimentos, normas
e padrões técnicos e operacionais, para a segurança das redes e serviços de Internet”,
consistirá em meras recomendações. A recomendação não é vinculante, não obriga a
conduta, não comporta sanções. Nesta seara, que não pode ficar no campo da
recomendação ou sugestão, encontramos aspectos cruciais para a segurança de pessoas,
informações e bens relacionados direta e indiretamente com a Grande Rede.
Exemplificamos. A guarda em si, bem como a forma e o tempo de manutenção, de registros

55
de IPs utilizados é absolutamente necessária para identificar os responsáveis pela prática de
atos, principalmente os escusos e os nocivos, na rede mundial de computadores. Eis um
importante precedente judicial exatamente nesta seara (destacamos):

"TELECOMUNICAÇÕES – QUEBRA DE SIGILO – “E-MAIL” ENVIADO A PARTIR


DO BRASIL AO ENDEREÇO ELETRÔNICO DA CASA BRANCA, NA CIDADE DE
WASHINGTON-DC, COM MENSAGEM REDIGIDA NA LÍNGUA INGLESA,
CONTENDO AMEAÇAS À INTEGRIDADE FÍSICA DA PESSOA DO PRESIDENTE
AMERICANO E DE SEUS FAMILIARES – IDENTIFICADOS, PELOS SERVIÇOS
TÉCNICOS DE VARREDURA NA INTERNET, O PROVEDOR DE ACESSO É O
NÚMERO DO IP (INTERNET PROTOCOL) DE QUE SE SERVIU O AUTOR DAS
AMEAÇAS PARA O ENVIO DA MENSAGEM ATRAVÉS DA REDE MUNDIAL,
ALÉM DO DIA E HORA DA REMESSA – NOTIFICAÇÃO POLICIAL AO
PROVEDOR PARA FORNECER A IDENTIDADE, QUALIFICAÇÃO E
ENDEREÇO DO USUÁRIO CONECTADO NAQUELE INSTANTE AO
REFERIDO NÚMERO DE “IP”- RECUSA EM ATENDER À NOTIFICAÇÃO SOB A
ALEGAÇÃO DE QUE OS DADOS REQUISITADOS ESTARIAM ACOBERTADOS
PELO SIGILO GARANTIDO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL AOS SERVIÇOS DE
TELECOMUNICAÇÕES, DE MODO QUE SUA QUEBRA ESTARIA SUJEITA ÀS
FORMALIDADES IMPOSTAS PELA LEI Nº 9.296/96, PRINCIPALMENTE NO QUE
SE REFERE À NECESSIDADE DE ORDEM JUDICIAL – HABEAS CORPUS
IMPETRADO PARA NÃO SE VER PROCESSADO POR DESOBEDIÊNCIA.
Habeas corpus denegado.

Prescinde-se de autorização judicial para a quebra do sigilo de uma


telecomunicação – seja postal, telefônica ou de transmissão de mensagens ou de dados –
sempre quando, sendo evidente que , através dela, um crime foi ou está sendo cometido, a
identificação de sua fonte e conteúdo for necessária à repressão dessa infração penal – seja
para identificação e localização do autor, seja para comprovar a materialidade do crime
mediante competente exame de corpo de delito, ou ainda para impedir a impunidade ou a
consumação do delito – e isso porque, naquelas hipóteses, não se cogita da incidência, nem

56
da garantia constitucional do inciso XI do art. 5º da constituição federal, nem da lei nº
9.296, de 4/7/1996."
TJ-SP. Relator Desembargador Érix Ferreira. 2a Câmara Criminal. Recurso de Habeas
Corpus no 1236031/4. Campinas (Ação Penal no 2546/99)

Concluímos, depois das considerações antes postas, pela inarredável necessidade de


se buscar fundamento legal expresso para a regulamentação da Internet no Brasil,
notadamente a instituição do Comitê Gestor e a definição de suas competências básicas.

NOTAS:
(1) Portaria Interministerial N° 147, de 31 de maio de 1995
O Ministro de Estado das Comunicações e o Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia,
no uso das atribuições que lhes confere o artigo 87, parágrafo único, inciso II, da
Constituição, e com o objetivo de assegurar qualidade e eficiência dos serviços ofertados,
justa e livre competição entre provedores, e manutenção de padrões de conduta de usuários
e provedores, e considerando a necessidade de coordenar e integrar todas as iniciativas de
serviços Internet no país, resolvem:
Art. 1°. Criar o Comitê Gestor Internet do Brasil, que terá como atribuições:
I - acompanhar a disponibilização de serviços Internet no país;
II - estabelecer recomendações relativas a: estratégia de implantação e interconexão de
redes, análise e seleção de opções tecnológicas, e papéis funcionais de empresas,
instituições de educação, pesquisa e desenvolvimento (IEPD);
III - emitir parecer sobre a aplicabilidade de tarifa especial de telecomunicações nos
circuitos por linha dedicada, solicitados por IEPDs qualificados;
IV - recomendar padrões, procedimentos técnicos e operacionais e código de ética de uso,
para todos os serviços Internet no Brasil;
V - coordenar a atribuição de endereços IP (Internet Protocol) e o registro de nomes de
domínios;
VI - recomendar procedimentos operacionais de gerência de redes;
VII - coletar, organizar e disseminar informações sobre o serviço Internet no Brasil; e
VIII - deliberar sobre quaisquer questões a ele encaminhadas.

57
Art. 2°. O Comitê Gestor será composto pelos seguintes membros, indicados
conjuntamente pelo Ministério das Comunicações e Ministério da Ciência e Tecnologia:
I - um representante do Ministério da Ciência e Tecnologia, que o coordenará;
II - um representante do Ministério das Comunicações;
III - um representante do Sistema Telebrás;
IV - um representante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
- CNPq;
V - um representante da Rede Nacional de Pesquisa;
VI - um representante da comunidade acadêmica;
VII - um representante de provedores de serviços;
VIII - um representante da comunidade empresarial; e
IX - um representante da comunidade de usuários do serviço Internet.
Art. 3°. O mandato dos membros do Comitê Gestor será de dois anos, a partir da data de
nomeação.
Parágrafo único: A nomeação dos membros do Comitê Gestor será mediante portaria
conjunta do Ministério das Comunicações e Ministério da Ciência e Tecnologia.
Art. 4°. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
Sérgio Motta José Israel Vargas

(2) DECRETO Nº 4.829, DE 3 DE SETEMBRO DE 2003.


Dispõe sobre a criação do Comitê Gestor da Internet no Brasil - CGIbr, sobre o
modelo de governança da Internet no Brasil, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,
incisos II e VI, alínea "a", da Constituição,
DECRETA:
Art. 1o Fica criado o Comitê Gestor da Internet no Brasil - CGIbr, que terá as
seguintes atribuições:
I - estabelecer diretrizes estratégicas relacionadas ao uso e desenvolvimento da
Internet no Brasil;
II - estabelecer diretrizes para a organização das relações entre o Governo e a
sociedade, na execução do registro de Nomes de Domínio, na alocação de Endereço IP

58
(Internet Protocol) e na administração pertinente ao Domínio de Primeiro Nível (ccTLD -
country code Top Level Domain), ".br", no interesse do desenvolvimento da Internet no
País;
III - propor programas de pesquisa e desenvolvimento relacionados à Internet, que
permitam a manutenção do nível de qualidade técnica e inovação no uso, bem como
estimular a sua disseminação em todo o território nacional, buscando oportunidades
constantes de agregação de valor aos bens e serviços a ela vinculados;
IV - promover estudos e recomendar procedimentos, normas e padrões técnicos e
operacionais, para a segurança das redes e serviços de Internet, bem assim para a sua
crescente e adequada utilização pela sociedade;
V - articular as ações relativas à proposição de normas e procedimentos relativos à
regulamentação das atividades inerentes à Internet;
VI - ser representado nos fóruns técnicos nacionais e internacionais relativos à
Internet;
VII - adotar os procedimentos administrativos e operacionais necessários para que a
gestão da Internet no Brasil se dê segundo os padrões internacionais aceitos pelos órgãos de
cúpula da Internet, podendo, para tanto, celebrar acordo, convênio, ajuste ou instrumento
congênere;
VIII - deliberar sobre quaisquer questões a ele encaminhadas, relativamente aos
serviços de Internet no País; e
IX - aprovar o seu regimento interno.
Art. 2o O CGIbr será integrado pelos seguintes membros titulares e pelos respectivos
suplentes:
I - um representante de cada órgão e entidade a seguir indicados:
a) Ministério da Ciência e Tecnologia, que o coordenará;
b) Casa Civil da Presidência da República;
c) Ministério das Comunicações;
d) Ministério da Defesa;
e) Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
f) Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;
g) Agência Nacional de Telecomunicações; e

59
h) Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico;
II - um representante do Fórum Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de
Ciência e Tecnologia;
III - um representante de notório saber em assuntos de Internet;
IV - quatro representantes do setor empresarial;
V - quatro representantes do terceiro setor; e
VI - três representantes da comunidade científica e tecnológica.
Art. 3o O Fórum Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e
Tecnologia será representado por um membro titular e um suplente, a serem indicados por
sua diretoria, com mandato de três anos, permitida a recondução.
Art. 4o O Ministério da Ciência e Tecnologia indicará o representante de notório
saber em assuntos da Internet de que trata o inciso III do art. 2o, com mandato de três anos,
permitida a recondução e vedada a indicação de suplente.
Art. 5o O setor empresarial será representado pelos seguintes segmentos:
I - provedores de acesso e conteúdo da Internet;
II - provedores de infra-estrutura de telecomunicações;
III - indústria de bens de informática, de bens de telecomunicações e de software; e
IV - setor empresarial usuário.
§ 1o A indicação dos representantes de cada segmento empresarial será efetivada por
meio da constituição de um colégio eleitoral, que elegerá, por votação não-secreta, os
representantes do respectivo segmento.
§ 2o O colégio eleitoral de cada segmento será formado por entidades de
representação pertinentes ao segmento, cabendo um voto a cada entidade inscrita no
colégio e devendo o voto ser exercido pelo representante legal da entidade.
§ 3o Cada entidade poderá inscrever-se somente em um segmento e deve atender aos
seguintes requisitos:
I - ter existência legal de, no mínimo, dois anos em relação à data de início da
inscrição de candidatos; e
II - expressar em seu documento de constituição o propósito de defender os interesses
do segmento no qual pretende inscrever-se.

60
§ 4o Cada entidade poderá indicar somente um candidato e apenas candidatos
indicados por entidades inscritas poderão participar da eleição.
§ 5o Os candidatos deverão ser indicados pelos representantes legais das entidades
inscritas.
§ 6o O candidato mais votado em cada segmento será o representante titular do
segmento e o candidato que obtiver a segunda maior votação será o representante suplente
do segmento.
§ 7o Caso não haja vencedor na primeira eleição, deverá ser realizada nova votação
em segundo turno.
§ 8o Persistindo o empate, será declarado vencedor o candidato mais idoso e, se
houver novo empate, decidir-se-á por sorteio.
§ 9o O mandato dos representantes titulares e suplentes será de três anos, permitida a
reeleição.
Art. 6o A indicação dos representantes do terceiro setor será efetivada por meio da
constituição de um colégio eleitoral que elegerá, por votação não-secreta, os respectivos
representantes.
§ 1o O colégio eleitoral será formado por entidades de representação pertinentes ao
terceiro setor.
§ 2o Cada entidade deve atender aos seguintes requisitos para inscrição no colégio
eleitoral do terceiro setor:
I - ter existência legal de, no mínimo, dois anos em relação à data de início da
inscrição de candidatos; e
II - não representar quaisquer dos setores de que tratam os incisos I, II, IV e VI do art.
2o.
§ 3o Cada entidade poderá indicar somente um candidato e apenas candidatos
indicados por entidades inscritas poderão participar da eleição.
§ 4o Os candidatos deverão ser indicados pelos representantes legais das entidades
inscritas.
§ 5o O voto será efetivado pelo representante legal da entidade inscrita, que poderá
votar em até quatro candidatos.

61
§ 6o Os quatro candidatos mais votados serão os representantes titulares, seus
suplentes serão os que obtiverem o quinto, o sexto, o sétimo e o oitavo lugares.
§ 7o Na ocorrência de empate na eleição de titulares e suplentes, deverá ser realizada
nova votação em segundo turno.
§ 8o Persistindo o empate, será declarado vencedor o candidato mais idoso e, se
houver novo empate, decidir-se-á por sorteio.
§ 9o O mandato dos representantes titulares e suplentes será de três anos, permitida a
reeleição.
Art. 7o A indicação dos representantes da comunidade científica e tecnológica será
efetivada por meio da constituição de um colégio eleitoral que elegerá, por votação não-
secreta, os respectivos representantes.
§ 1o O colégio eleitoral será formado por entidades de representação pertinentes à
comunidade científica e tecnológica.
§ 2o Cada entidade deve atender aos seguintes requisitos para inscrição no colégio
eleitoral da comunidade científica e tecnológica:
I - ter existência legal de, no mínimo, dois anos em relação à data de início da
inscrição de candidatos; e
II - ser entidade de cunho científico ou tecnológico, representativa de entidades ou
cientistas e pesquisadores integrantes das correspondentes categorias.
§ 3o Cada entidade poderá indicar somente um candidato e apenas candidatos
indicados por entidades inscritas poderão participar da eleição.
§ 4o Os candidatos deverão ser indicados pelos representantes legais das entidades
inscritas.
§ 5o O voto será efetivado pelo representante legal da entidade inscrita, que poderá
votar em até três candidatos.
§ 6o Os três candidatos mais votados serão os representantes titulares, seus suplentes
serão os que obtiverem o quarto, o quinto e o sexto lugares.
§ 7o Na ocorrência de empate na eleição de titulares e suplentes deverá ser realizada
nova votação em segundo turno.
§ 8o Persistindo o empate, será declarado vencedor o candidato mais idoso e, se
houver novo empate, decidir-se-á por sorteio.

62
§ 9o O mandato dos representantes titulares e suplentes será de três anos, permitida a
reeleição.
Art. 8o Realizada a eleição e efetuada a indicação dos representantes, estes serão
designados mediante portaria interministerial do Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da
Presidência da República e dos Ministros de Estado da Ciência e Tecnologia e das
Comunicações.
Art. 9o A participação no CGIbr é considerada como de relevante interesse público e
não ensejará qualquer espécie de remuneração.
Art. 10. A execução do registro de Nomes de Domínio, a alocação de Endereço IP
(Internet Protocol) e a administração relativas ao Domínio de Primeiro Nível poderão ser
atribuídas a entidade pública ou a entidade privada, sem fins lucrativos, nos termos da
legislação pertinente.
Art. 11. Até que sejam efetuadas as indicações dos representantes do setor
empresarial, terceiro setor e comunidade científica nas condições previstas nos arts. 5o, 6o
e 7o, respectivamente, serão eles designados em caráter provisório mediante portaria
interministerial do Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República e
dos Ministros de Estado da Ciência e Tecnologia e das Comunicações.
Art. 12. O Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República e os
Ministros de Estado da Ciência e Tecnologia e das Comunicações baixarão as normas
complementares necessárias à fiel execução deste Decreto.
Art. 13. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 3 de setembro de 2003; 182o da Independência e 115o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
José Dirceu de Oliveira e Silva
Miro Teixeira
Roberto Átila Amaral Vieira

63
Do Delito de Dano e de sua Aplicação ao Direito Penal Informático

Túlio Lima Vianna*

1. Prolegômenos – 2. Analogia e interpretação extensiva – 3. Bem jurídico tutelado – 4.


Dados informáticos – 5. Dados como objeto material do crime de dano – 6. Dano
informático e divulgação de vírus – 7. Dano informático e acesso não autorizado a sistemas
computacionais – 8. Consumação e tentativa – 9. Conclusões – 10. Bibliografia.

Prolegômenos

O crime de dano está previsto no art. 163 do Código Penal Brasileiro e sua
aplicação na proteção dos dados informáticos têm sido muito discutida em congressos e
seminários dedicados ao estudo do Direito Informático no Brasil.

O busílis encontra-se na palavra coisa, utilizada pelo legislador de 1940 para


designar o objeto material do delito de dano.

Argumenta-se que, em respeito ao princípio constitucional da legalidade – que veda


a analogia como instrumento da criação de tipos – não se poderia considerar típico um dano
a dados informáticos.

Assim, se um agente formatasse um disco rígido sem a autorização de seu legítimo


proprietário, com o único intuito de lhe causar um prejuízo, não haveria crime de dano, pois
nenhuma “coisa” foi destruída, inutilizada ou deteriorada.

A hipótese reveste-se de grande importância, pois, em suma, esta é a conduta de


quem cria e divulga vírus de computador, prática que tem causado grandes prejuízos não só
às grandes corporações, mas também a usuários individuais que, muita vez, perdem todas
as suas informações armazenadas sobre a forma de dados em seu computador.

*
Professor de Direito Penal da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Mestre em
Ciências Penais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (FD-UFMG). Assessor

64
Procuraremos demonstrar neste trabalho que é perfeitamente possível a tipificação
das citadas condutas como crime de dano sem que haja qualquer ofensa ao princípio
constitucional da legalidade.

Analogia e interpretação extensiva.

Em princípio, cabe-nos determinar se o entendimento do dado informático como


coisa é uma atividade interpretativa ou integrativa da lei penal.

A interpretação não se confunde com a integração, pois, enquanto esta visa


preencher as lacunas existentes na lei36 , aquela objetiva tão-somente o correto entendimento
da intentio legis.

Assim, a analogia não é uma atividade interpretativa, mas sim um instrumento de


integração das normas, pois preenche com hipóteses semelhantes as lacunas legais.

No dizer de Heleno Cláudio FRAGOSO:

“A analogia distingue-se da interpretação, porque constitui um processo de integração da


ordem legal, e não meio de esclarecer o conteúdo da norma. Através da analogia aplica-se
a lei a hipótese por ela não prevista, invocando-se substancialmente, o chamado
argumento a pari ratione. Há aplicação analógica quando a norma se estende a caso não
previsto, mas semelhante, em relação ao qual existem as mesmas razões que fundamentam
a disposição legal. A analogia distingue-se da interpretação extensiva, porque nesta não

Judiciário da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG). Membro-fundador
do Instituto de Ciências Penais (ICP). Editor do site www.tuliovianna.org .
36
“Interessante exemplo da lógica da integração é uma brincadeira em que alguém conta um caso
aparentemente sem sentido e o resto do grupo tenta deduzir um fator que tornaria a situação lógica por meio
de perguntas que só podem ser respondidas com sim, não ou irrelevante. Vejamos: um homem entra num bar,
pede um copo d’água. O garçom dá um tiro para o alto, ele agradece e vai embora. Á primeira vista parece
uma situação totalmente absurda, sem a menor coerência. As primeiras perguntas mais desviam a atenção do
que guiam para o caminho correto: _ O tiro matou alguém? _ Não. _O garçom trouxe a água para ele? _
Não. Porém, depois de algum tempo, as perguntas fundamentais são feitas: _O homem estava com sede? _
Não. _ Mas ele pretendia beber a água: _ Sim. Após uma meia hora, alguém, num momento de iluminação,
solta a frase reveladora: _ Ele estava com soluços! E o problema está soluçonado (Com o perdão do
trocadilho).” (VIANNA, 1998. p. 253-254)

65
falta a vontade da lei, mas tão-somente a expressão verbal que a ela corresponda.”
(FRAGOSO, 1985. p. 87)

Se na integração o intérprete acrescenta à norma elementos previamente não


existentes, na interpretação extensiva, ele tão-somente revela a intentio legis já existente,
porém não expressa verbalmente de forma adequada.

“A interpretação extensiva é perfeitamente admissível em relação à lei penal, ao contrário


do que afirmavam autores antigos. Nestes casos não falta a disciplina normativa do fato,
mas, apenas, uma correta expressão verbal. Há interpretação extensiva quando se aplica o
chamado argumento a fortiori, que são casos nos quais a vontade da lei se aplica com
maior razão. É a hipótese do argumento a maiori ad minus (o que é válido para o mais,
deve necessariamente prevalecer para o menos) e do argumento a minori ad maius (o que
é vedado ao menos é necessariamente no mais). Exemplo deste último argumento: se o
Código Penal incrimina a bigamia, logicamente também pune o fato de contrair alguém
mais de dois casamentos (Manzini).” (FRAGOSO, 1985. p. 86)

Destarte, se advogássemos a tese de que o art. 163 do CP pudesse ser interpretado


como: “destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia ou dados informáticos”, estaríamos
defendendo a analogia.

Se, porém, admitirmos que os dados informáticos são “coisas”, não haverá analogia,
mas sim interpretação extensiva, pois a intentio legis é evitar um dano patrimonial, seja ele
praticado em objetos tangíveis ou não.

Não se está, pois, acrescentando novo conteúdo à lei, mas sim evidenciando um
novo significado da palavra “coisa” impossível de ter sido previsto pelo legislador de 1940,
mas certamente contido na norma.

Bem jurídico tutelado

O bem jurídico penalmente tutelado no delito de dano é o patrimônio, que deve ser
entendido como conjunto de bens de valor econômico, valor-utilidade e valor afetivo para
seu proprietário.

Se a vítima tem armazenada, em papel ou em formato digital, uma tabela em que


catalogou o número de manchas nas asas de inúmeras espécies de borboletas,

66
possivelmente estes dados não terão valor econômico (quem iria comprar isso?), mas
certamente terão um valor utilidade para a vítima que levou anos realizando tal pesquisa.

Por outro lado, caso a vítima tenha as cartas – ou os e-mails – de seus ex-namorados
guardados e seu companheiro atual, num momento de ira, destrua todas estas mensagens,
certamente haverá crime de dano, pois não obstante a inexistência de valor econômico ou
utilidade, há aqui um claro valor afetivo para a vítima.

Obviamente o agente deve ter plena consciência de que o bem danificado tem valor
para a vítima. Nos casos de valor econômico isto é bastante óbvio para o autor, mas quando
se trata de valor utilidade ou valor afetivo, muita vez, pode o agente não imaginar que
aquele bem tenha alguma importância para a vítima. Nesta hipótese, caso danifique a coisa,
não poderá ser penalmente punido, pois agiu em erro de tipo, uma vez que lhe faltava o
elemento cognoscitivo do dolo.

Vale lembrar ainda que o valor da coisa tem que ser significativo, pois caso
contrário aplicar-se-ia o princípio da insignificância que exclui a própria tipicidade penal
em respeito ao princípio da lesividade, corolário natural do Estado Democrático de Direito
constitucionalmente previsto.

Dados informáticos

Dados são informações representadas em forma apropriada para armazenamento e


processamento por computadores.

Ainda que em sua maioria estas informações estejam na forma de texto, sendo, pois,
compostas de palavras, as informações são representações da mente humana que podem
abranger os cinco sentidos: uma foto, uma música, um perfume, um sabor, um beijo.

Os computadores se comparados à mente humana, no entanto, são máquinas muito


simples e não conseguiriam reconhecer as complexas representações criadas pelo homem.
Assim, criou-se um artifício pelo qual todas as informações são passadas aos computadores
na forma de presença ou ausência de corrente elétrica.

67
As informações digitais – ou dados – podem representar qualquer informação
humana através de uma seqüência ordenada de zeros e uns, sendo que o 0 (zero) representa
a ausência de correntes elétricas no circuito e o 1 (um) representa sua presença37 .

Estes dados podem ser armazenados em diversos meios físicos. Nos discos-rígidos e
nos disquetes estas informações são armazenadas na forma magnética, sendo que a
presença de corrente magnética representa o 1 (um) e sua ausência representa o 0 (zero).
Em CDs e DVDs, sejam eles de dados, músicas ou filmes, estas informações digitais
também são representadas na forma de dados, sendo que o 1 (um) indica a reflexão do laser
pelo CD/DVD e o 0 (zero) a sua não reflexão.

Ontologicamente não há qualquer distinção entre um CD de áudio e um CD-ROM,


assim, como não há qualquer distinção entre um DVD-ROM e um DVD de filmes. Em
todos eles há uma seqüência gigantesca de 0 (zeros) e 1 (uns) que o aparelho decodificador
irá transpor para informações humanamente inteligíveis.

Dados como objeto material do delito de dano.

Tanto as fitas K7 como as VHS armazenavam informações por meio magnético,


ainda que de forma analógica e não digital. Assim, a exposição destas fitas a um imã,
poderia causar a perda completa das informações nelas armazenadas, ainda que
posteriormente fosse possível gravar novos dados na fita.

Suponhamos então que Tício, utilizando-se de um imã e com o claro propósito de


causar um prejuízo a Mévio, danifique a fita VHS na qual está gravada a cerimônia de seu
casamento.

37
Evidentemente foi necessária a criação de uma tabela que correlacionasse cada uma das letras do alfabeto
humano a uma seqüência de zeros e uns inteligíveis pela máquina. Assim, verbi gratia, a letra A passou a ser
representada pelo código 01000001, a B por 01000010, a C por 01000011 e assim sucessivamente de forma
tal que toda palavra humana pudesse ser entendida como uma seqüência de passagem ou ausência de corrente
elétrica. As imagens por outro lado, foram divididas em milhares de linhas e colunas e cada um dos pontos
formados pela interseção destas linhas e destas colunas, x1, x2, y1, y2, passou a ser representado pela

68
Certamente não houve um prejuízo patrimonial propriamente pois é possível que,
com um pouco de sorte, Mévio ainda possa gravar alguma nova informação naquela fita.

O dano causado por Tício não foi, pois, ao continente, mas ao próprio conteúdo da
fita, isto é, às informações nela armazenadas. A tipicidade do crime de dano é evidente,
pois Tício produziu a perda de uma informação que possuía grande valor afetivo para
Mévio.

Ainda que se pudesse cogitar na aplicação do princípio da insignificância como


excludente da tipicidade da conduta em razão do baixíssimo valor da fita virgem,
impossível seria desconsiderar o imenso valor afetivo das informações nela armazenadas.

Uma “coisa” é uma fita virgem. Outra “coisa” é uma fita gravada. Trata-se de uma
constatação de senso comum, mas que muitos estudiosos do Direito Informático parecem
não perceber.

Da mesma forma, se Tício com o uso de um imã intencionalmente danifica um


disquete de Mévio no qual estão armazenados seus trabalhos escolares, estará cometendo a
conduta típica de dano, não pela perda do disquete, mas pela perda dos dados nele
armazenados.

A hipótese torna-se um pouco mais sutil se Tício, em vez de utilizar-se de um imã,


coloca o disquete de Mévio em um computador e emite um comando para que ele seja
formatado.

Ora, o dolo de Tício é exatamente o mesmo. Do ponto de vista objetivo, por outro
lado, a conduta também é idêntica diferindo-se tão-somente pelo instrumento utilizado para
produzir o dano. No primeiro caso utilizou-se de um imã. No segundo, de um computador.
Ambos, o imã e a controladora do disquete, através de um processo magnético, apagaram
as preciosas informações de Mévio armazenadas no disquete.

passagem ou ausência de corrente elétrica. Evidentemente todos estes dados são processados em velocidades

69
Está clara mais uma vez a tipicidade do delito de dano pois uma “coisa” é um
disquete com trabalhos escolares gravados e outra “coisa” é um disquete virgem.

A utilidade que a primeira “coisa” tinha, não existe mais. O dano se deu, pois, na
modalidade de inutilizar coisa alheia.

Dano informático e divulgação de vírus.

A palavra vírus deriva do latim e significava originariamente:

“1. Suco (das plantas). 2. Baba, peçonha (dos animais). 3. (Em geral) Veneno, peçonha. 4.
Mau cheiro, cheiro fétido.” (FERREIRA, p. 1228)

O termo acabou sendo usado pelas Ciências Biológicas para designar diminutos
agentes infecciosos, visíveis apenas ao microscópio eletrônico, que se caracterizam por não
ter metabolismo independente e ter capacidade de reprodução apenas no interior de células
hospedeiras vivas.

Os vírus informáticos à semelhança de seus homônimos biológicos também são


capazes de causar graves danos a seus hospedeiros, em geral um disquete ou um disco
rígido.

Se, nos seres vivos, os vírus agem comandados por uma seqüência de ácidos
nucléicos que são injetados na célula da vítima, nos computadores os vírus são uma
seqüência pré-ordenada de 0 (zeros) e 1(uns) que obrigam o computador a realizar uma
série de funções não desejadas por seu proprietário.

Suponhamos então que Tício, em vez de utilizar-se de um imã ou da formatação por


meio de um computador, prefira infectar o disquete de Mévio com um vírus capaz de

incríveis razão pela qual muita vez não nos damos conta da complexidade em que se baseia o sistema digital.

70
obrigar o computador de Mévio a formatar os dados nele armazenados na próxima sexta-
feira 13.

Mais uma vez, a conduta é absolutamente típica. O dolo é idêntico ao das condutas
anteriores, pois a intenção de Tício é a de apagar os dados armazenados e causar um
prejuízo a Mévio. Objetivamente, também há uma inutilização por meios magnéticos dos
dados.

O que diferencia esta hipótese dos casos precedentes é tão-somente o momento do


resultado que nos primeiros exemplos dá-se logo em seguida aos atos executórios e aqui só
ocorre em data futura pré-determinada pelo agente.

Conclui-se, pois, que, quando alguém divulga um vírus de computador,


objetivamente está emitindo comandos para que no futuro o próprio computador da vítima
inutilize os dados armazenados seja em um disquete ou, mais comumente na atualidade, em
um disco rígido.

Dano informático e acesso não autorizado a sistemas computacionais

O acesso não autorizado a sistemas computacionais é ainda conduta atípica no


Direito Penal Brasileiro, mas pode, muita vez, servir de instrumento para a prática do crime
de dano.

Se Tício com seu computador conectado à Internet, obtém por meios ilícitos acesso
a uma página na Internet e altera seu conteúdo, colocando no ar uma página de protesto,
verbi gratia, estará, por meio de um acesso não autorizado, praticando crime de dano.

É necessário demonstrar, porém, que aquela página possui um valor para a vítima, o
que em páginas comerciais, é demasiadamente óbvio. Os anúncios que deixam de ser
exibidos e as vendas que não se concretizaram por ter sido o site desfigurado, por si só,
demonstram os prejuízos econômicos da vítima.

71
Em uma página que preste informações sobre as condições climáticas, tráfego, etc.
o valor-utilidade é claro, caracterizando-se também o crime de dano.

Em páginas pessoais, o valor sentimental da página para a vítima deverá ser levado
em conta, mormente se a vítima não tinha cópia (backup) dos documentos danificados.

Consumação e tentativa

O crime de dano é material e consuma-se no momento do resultado.

Na maioria absoluta dos casos analisados, o resultado se dá logo em seguida dos


atos de execução, não gerando, pois, maiores problemas na análise da tentativa.

O dano praticado através de vírus de computador, porém, só se consuma muito


tempo após a prática do último ato executório, razão pela qual merece uma análise mais
acurada.

A simples criação de um vírus de computador não é punida pelo Direito Penal


Brasileiro. Trata-se de fase preparatória do delito de dano informático e, como tal, não pode
ser punida, pois, se o agente não divulgar o vírus, o dano não se concretizará.

O início da execução do crime de dano realizado através de vírus informáticos se dá


no momento em que o agente disponibiliza por qualquer meio o vírus a outrem.

Se Tício infecta um disquete com um vírus de computador e o oferece a Mévio


alegando tratar-se de um excelente jogo de computador, haverá o início de execução do
crime de dano.

Se Tício dolosamente envia um email infectado com vírus a Mévio haverá início de
execução do crime de dano.

72
Se Tício disponibiliza em sua página na Internet um vírus de computador, alegando
tratar-se de um excelente programa, haverá também o início da execução de crime de dano.

Em todos estes casos o vírus tornou-se acessível à vítima por meio de uma conduta
dolosa de Tício.

A consumação do delito dar-se-á no momento do resultado, isto é, quando o vírus


praticar o dano nos dados da vítima.

Se a vítima, porém, jamais executar o vírus, haverá a tentativa, pois não obstante o
agente ter praticado todos os atos de execução, o crime não se consumou por circunstâncias
alheias à sua vontade.

Conclusões

O crime de dano previsto no art. 163 do Código Penal Brasileiro é perfeitamente


aplicável à tutela dos dados informáticos, sendo completamente prescindível a criação de
um novo tipo penal para tal fim. Trata-se de interpretação extensiva da palavra “coisa”,
elemento objetivo do tipo penal.

A proteção patrimonial dos dados não se limita a seu valor econômico, pois a
intentio legis é proteger todo patrimônio da vítima, compreendido não só como tutela de
valores econômicos, mas também do valor-utilidade e do valor afetivo que porventura
tenha a coisa.

A divulgação de vírus informáticos, com intenção de dano, pode ser punida como
tentativa de dano, caso o resultado não se concretize ou como dano consumado, caso o
resultado naturalístico venha a ocorrer efetivamente.

Bibliografia

73
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penal comentado. 4.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. 961 p.
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aspectos legais internacionais. Rio de Janeiro: Esplanada, 2001. p.81-93.
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______. Prolegômenos à Hermenêutica Jurídica. Revista do CAAP, Belo Horizonte, a.3,
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74
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal
Brasileiro: parte geral. 2.ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.
888 p.,

75
O Reflexo do Direito Eletrônico sobre os Direitos da Personalidade

Jorge José Lawand

Bacharel, Mestre e Doutorando em direito pela PUC/SP; Especialista em direito civil pela
UniFMU; Advogado militante e professor de direito da Universidade São Francisco

A evolução tecnológica colocou os seres humanos diante de novos desafios;


devendo ser incumbida à ciência jurídica a formulação de proposições no sentido de serem
protegidos os direitos fundamentais, que se encontram insculpidos no texto constitucional
brasileiro de 1998, mais precisamente, artigo 5º e seus incisos, e mais recentemente na Lei
nº 10.046, de 10/01/2002, que dispõe sobre o novo código civil brasileiro, artigos 11 ao 21.

O direito eletrônico, resultado do avanço das modernas tecnologias, compreende


todos os ramos do direito, é multifacetário e contém peculiaridades próprias.

Com efeito, não é dever apenas do direito civil, por exemplo, dispor sobre as
conseqüências dos meios informáticos sobre os negócios jurídicos, pois como bem
observou Maria Helena Diniz38 , quando entrevistada sobre o novo estatuto civil: “Não se
poderá decretar a sua velhice precoce. É verdade que nele não estão contidas questões
sobre contratos eletrônicos, parceria entre homossexuais, experiência científica em seres
humanos, direitos difusos, pesquisa com genoma humano, clonagem humana, efeitos
jurídicos decorrentes da reprodução assistida, medidas sócio-educativas aplicadas à criança
e ao adolescente, relações de consumo, entre outras. Essas e outras matérias não são
objetos de estudo do Direito Civil, por pertencerem a outros ramos jurídicos. Então, em
razão de suas peculiaridades, esses temas devem ser redigidos por normas especiais. O
novo Código é obra legislativa de grande importância, apesar de não ser perfeito, pois
nenhuma obra humana o será. Almejar isso seria uma utopia, ou melhor, pretender o
irrealizável”.

38
DINIZ, Maria Helena. Código Civil: inovações. Jornal Tribuna da Magistratura. São Paulo,
julho-agosto 2002. p.12 e 13. grifo nosso

76
Então qualquer seara do conhecimento jurídico que faça uso dos meios
informáticos, notadamente a rede mundial de computadores – Internet, será objeto de
análise e estudo do direito eletrônico.

Espraia-se por todo e qualquer ramo, seja o direito civil, direito administrativo,
direito penal, direito tributário e dentre outros. Trata-se de uma esfera do conhecimento sui
generis, pois não há como abordá-lo, livre de equívocos, sem ser levado em consideração a
incidência das outras esferas acima referidas.

Patrícia Peck39 diz: “O Direito é resultado da união entre linguagem e


comportamento. Quando a linguagem e o comportamento mudam, o Direito também deve
mudar. É o que está acontecendo com o Direito em uma sociedade digital como é a nossa
hoje. (...) Para isto, a tecnologia vem contribuindo desde 1920, com a expansão dos
veículos de massa e mais recentemente com o Telefone Celular, o e-mail, a Internet, a
Banda Larga, a TV Interativa, e assim por diante. (...) O Direito Digital consiste na
evolução do próprio Direito, abrangendo todos os princípios fundamentais e institutos que
estão vigentes e são aplicados até hoje, assim como introduzindo novos institutos e
elementos para o pensamento jurídico, em todas as sua áreas (Direito Civil, Direito Autoral,
Direito Comercial, Direito Contratual, Direito Econômico, Direito Financeiro, Direito
Tributário, Direito Penal, Direito Internacional etc.). Esse novo direito é resultante da
aplicação da fórmula tridimensional do Direito, com seus 3 elementos – Fato, Valor e
Norma, adicionado de um quarto elemento importantíssimo – Tempo”.

Exemplificando, podemos citar a recente jurisprudência do Superior Tribunal de


Justiça, cuja ementa transcrevemos a seguir: “TRIBUTÁRIO. PROVEDOR DA
INTERNET. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO, ESPÉCIE DE
SERVIÇO DE TELECOMUNICAÇÃO. RELAÇÃO DE NATUREZA NEGOCIAL COM
O USUÁRIO. FATO GERADOR DE ICMS DETERMINADO. INCIDÊNCIA. LEI
COMPLEMENTAR Nº 87/1996. LEI Nº 9.472/1997. 1. Recurso Especial interposto contra

39
PECK, Patrícia. Direito digital e os novos desafios para o profissional do Direito. Folha do
Acadêmico, p. 14.

77
v. Acórdão que entendeu que "o provedor de acesso à internet não presta serviço de
comunicação ou de telecomunicação, não incidindo sobre a atividade por ele desempenhada
o ICMS". 2. O Provedor da Internet é um agente interveniente prestador de serviços de
comunicação, definindo-o como sendo "aquele que presta, ao usuário, um serviço de
natureza vária, seja franqueando o endereço na INTERNET, seja armazenando e
disponibilizando o site para a rede, seja prestando e coletando informações etc. É
designado, tecnicamente, de Provedor de Serviços de Conexão à INTERNET (PSC), sendo
a entidade que presta o serviço de conexão à INTERNET (SCI)". (Newton de Lucca, em
artigo "Títulos e Contratos Eletrônicos", na obra coletiva Direito e INTERNET", pág. 60)
3. O provedor vinculado à INTERNET tem por finalidade essencial efetuar um serviço que
envolve processo de comunicação exigido pelo cliente, por deter meios e técnicas que
permitem o alcance dessa situação fática. 4. O serviço prestado pelos provedores está
enquadrado como sendo de comunicação, espécie dos serviços de telecomunicações. 5. A
Lei Complementar nº 87, de 13/09/1996, estabelece, em seu art. 2º, que incide o ICMS
sobre "prestações onerosas de Serviços de Comunicação, por qualquer meio, inclusive a
geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição a ampliação de
comunicação de qualquer natureza", círculo que abrange os serviços prestados por
provedores ligados à INTERNET, quando os comercializam. 6. Qualquer serviço oneroso
de comunicação está sujeito ao pagamento do ICMS. 7. A relação entre o prestador de
serviço (provedor) e o usuário é de natureza negocial visando a possibilitar a comunicação
desejada. É suficiente para constituir fato gerador de ICMS. 8. O serviço prestado pelo
provedor pela via da Internet não é serviço de valor adicionado, conforme o define o art.
61, da Lei nº 9.472, de 16/07/1997. 9. Recurso provido. (RESP 323358 / PR ; RECURSO
ESPECIAL 2001/0056816-9, Rel. Min José Delgado – STJ)”

Na hipótese acima argüida, aplicou-se a teoria geral do direito tributário, mas


também do direito civil, pois estamos diante de um contrato de prestação de serviços, e
também do direito administrativo, porque cabe ao Poder Público regularizar os meios de
comunicação, através da ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações).

78
Assim, podemos afirmar que o direito eletrônico é um novíssimo ramo do direito,
com características de micro sistema, pois é regido por princípios próprios, que conforme já
expusemos na obra Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos40 , são os seguintes: 1) princípio
da equivalência funcional dos atos jurídicos produzidos por meios eletrônicos com os atos
jurídicos tradicionais; 2) princípio da neutralidade tecnológica; 3) princípio da
inalterabilidade do direito existente sobre obrigações e contratos; 4) princípio da boa-fé e 5)
princípio da autonomia privada.

Entrementes, o direito eletrônico deve preservar os direitos da personalidade,


porque conforme o artigo 11, do novo código civil, verifica-se: “Com exceção dos casos
previstos em lei, os direitos da personalidade, são intransmissíveis e irrenunciáveis, não
podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”. E, no artigo 12: “Pode-se exigir que
cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem
prejuízo de outras sanções previstas em lei”.

A teoria geral dos direitos da personalidade está estreitamente relacionada com a


preservação da intimidade, pois, muitos estudiosos do assunto afirmam com freqüência,
embora sem maiores delongas, a necessidade de algum isolamento, pois isto é fundamental
para o desenvolvimento da personalidade. Esta, tomada na acepção da Medicina Legal e da
Filosofia Geral denotamos ser um: “elemento determinante da individualidade de uma
pessoa, distinguindo-a de outra. Conjunto de qualidades da pessoa. Função psicológica pela
qual o indivíduo considera-se como um eu uno e permanente (Lalande) 41 ”.

Nascendo com vida a pessoa se torna sujeito de direitos – é o que dispõe o artigo 2º
do Código Civil: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida: mas a
lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos da personalidade”, já tendo a integrar o seu
patrimônio pessoal todas as faculdades que concernem à individualidade de cada pessoa:

40
LAWAND, Jorge José. Teoria geral dos contratos eletrônicos. São Paulo: Juarez de Oliveira,
2003. p.39
41
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico: volume 3. São Paulo: Saraiva, 1998.

79
direito à vida, à integridade física e psíquica, à dignidade da pessoa humana, que pressupõe
a preservação de valores fundamentais como o nome, a honra, a liberdade, o recato42 .

Os direitos da personalidade que evoluíram a passos largos, sendo atualmente a


principal ferramenta para a preservação de direitos relevantes à pessoa, tal como, por
exemplo, o próprio direito à vida, alçado a nível constitucional e em diversas legislações
alienígenas, inclusive a brasileira. E ganharam mais força, pois atualmente vivenciamos
uma quarta geração de direitos, ou seja, há que prevalecer tanto na empresa, propriedade e
nos contratos a função social e econômica, ou seja, aquela voltada para os interesses
difusos, coletivos e individuais homogêneos da sociedade.

E deste modo, Fabrício Zamprogna Mattielo 43 , sintetiza um conceito, nestes termos:


“O conjunto formado pelos atributos derivados da capacidade, constitui a personalidade
(aquela, portanto, é elemento desta), que transforma o ente em sujeito de direito e tem como
conseqüências principais a aquisição de direitos daquele momento em diante e a
incorporação definitiva dos que estiverem em estado de latência desde a concepção como
expectativa de concretização futura”.

Todavia, uma pergunta inicial deve ser colocada: onde se enquadraria a


classificação dos direitos que seriam eventualmente violados pela utilização inadequada e
de má-fé dos meios eletrônicos dentro da concepção moderna dos direitos da
personalidade?

Amaro Moraes e Silva Neto44 , abordando o tema da revolução tecnológica e a


questão da privacidade, esboça as preocupações que podem surgir, ponderando: “Com o
surgimento de um Mundo unido pela Rede das redes, o direito à privacidade passou a ser
desejo de privacidade. No ciberespaço, que se encontra numa dimensão inapontável, a
distância perdeu seu sentido em razão da base tecnológica que permitiu a Internet. O que

42
Os direitos da personalidade são inatos?, Revista dos Tribunais, n. 694, ago/1993, p.31.
43
MATTIELO, Fabrício Zamprogna. Código Civil Comentado. São Paulo: LTR, 2003. p.22
44
SILVA NETO, Amaro Moraes e. Privacidade na internet: um enfoque jurídico. Bauru: EDIPRO,
2001. p. 31.

80
era difícil de se localizar se tornou facilmente localizável (eis que tudo passou a estar no
mesmo lugar e, de quebra, ao mesmo tempo). Agora, para enviarmos uma carta já não
precisamos de tinta ou papel ou envelope ou selos ou carteiros. Fronteira deixou de ser um
conceito limitado pela distância ao alcance dos canhões. A intrínseca transnacionalização
da rede mundial de computadores mudou nossas vidas, alterou nossos hábitos e impões
uma reavaliação da aplicação do que cremos como direito”.

E este mesmo doutrinador45 , aborda uma série de fatos em que possivelmente a


intimidade da pessoa humana estará sendo revelada de alguma forma: “Sistemas
biométricos sabem o ADN de sua voz. Mecanismos de escuta captam conversas através de
paredes. Pequenas (e baratas) câmeras de vídeo vêem no escuro. Existem raios
infravermelhos que possibilitam a detecção de fatos dentro de edifícios, propiciando a visão
do que ocorre em seu interior. Certos microfones parabólicos são capazes de ouvir
conversas a distâncias superiores a 1.500m. Os hospitais trocam informações on line. As
universidades dispõem a todos os nossos currículos na web. Os dados relativos ao FGTS
encontram-se disponíveis na rede. Órgãos do governo e órgãos particulares detêm
informações nossas que sempre podem ser acessadas por qualquer um; legal ou
ilegalmente.”

As respostas a estas questões de alta indagação, podem ser encontradas na própria


doutrina nacional, mais precisamente em Rubens Limongi França, precursor de toda uma
teoria, e que atualmente vem experimentando um crescente desenvolvimento, o qual se
denota, de início, extremamente complexo, haja vista as nuances que encerram as relações
sociais, e a importância de se preservar a dignidade humana.

Pois bem, para o autor supracitado46 , há de ser usada a seguinte técnica para
classificar os direitos da personalidade:

45
SILVA NETO, Amaro Moraes e. Privacidade na internet... p. 34.
46
FRANÇA, Rubens Limongi. Direitos da Personalidade. Coordenadas Fundamentais. Revista do
Advogado nº 38, p 8-11.

81
I – Direito à Integridade Física
1.1 Direito à vida e aos alimentos
1.2 Direito sobre o Próprio Corpo, Vivo
1.3 Direito sobre o Próprio Corpo, Morto
1.4 Direito sobre o Corpo Alheio, Vivo
1.5 Direito sobre o Corpo Alheio, Morto
1.6 Direito sobre as partes separadas do corpo,vivo
1.7 Direito sobre as partes separadas do corpo, morto

II – Direito à integridade intelectual


2.1. Direito à liberdade de pensamento
2.2. Direito pessoal de autor científico
2.3. Direito pessoal de autor artístico
2.4. Direito pessoal de inventor

III- Direito à integridade moral


3.1. Direito à liberdade civil, política e religiosa
3.2. Direito à honra
3.3. Direito à honorificência
3.4. Direito ao recato
3.5. Direito ao segredo pessoal, doméstico e profissional
3.6. Direito à imagem
3.7. Direito à intimidade pessoal, familiar e social.

Deveras, esta é a classificação mais completa que se pode encontrar no direito


brasileiro, constituindo-se num verdadeiro marco inicial para qualquer estudo que se queira
proceder em torno da problemática e polêmica questão dos direitos da personalidade, mais
precisamente no que tange às conseqüências oriundas da crescente utilização pelas pessoas
de meios informáticos.

82
Todavia, a classificação acima, conforme o próprio Rubens Limongi França, é uma
das variadas espécies classificatórias que podem ensejar o início do estudo científico dos
direitos da personalidade.

Denotam-se, inclusive, por meridiana razão, que não vemos expresso os possíveis
direitos da personalidade que podem ser atingidos pelo uso inadequado dos meios
informáticos (internet). Mas, podemos induzir que estará em jogo, principalmente, a
liberdade de pensamento e o direito à imagem e à intimidade pessoal, familiar e social.

Ademais, fazendo-se um paralelo com o direito norte-americano, José Adércio Leite


Sampaio47 afirma que: “Em meio à efervescência econômica e social dos Estados Unidos
no final do século passado, que transformava um país de dotes rurais em uma potência
industrial e econômica a nível mundial, a ponto de pouco tempo depois lhe dar a liderança
no mundo, surge um artigo na Harvard Law Review, intitulado Right to Privacy, que viria a
constituir o marco inicial da reforma do direito à intimidade e vida privada, deixando antes
de si seus precedentes e a pré-história”.(...) Em 28 páginas, seus autores Samuel Dennis
Warren e Louis Dembitz Brandeis, com notável maestria, apresentaram os contornos de um
novo direito, extraído da própria evolução do Common Law, diante da necessidade criada
pelos novos inventos, e pelo seu alto poder de contornar as clássicas formas de proteção da
pessoa: “Recentes invenções e métodos negociais chamam a atenção para o próximo passo
que deve ser dado com vistas à proteção da pessoa e para segurança do indivíduo, aquilo
que o Juiz Cooley chama de o direito de ‘ser deixado em paz’ (right ‘to be alone’).
Fotografias instantâneas e empresas jornalísticas invadiram o espaço sagrado da vida
doméstica; e numerosos aparelhos mecânicos ameaçam tornar realidade o vaticínio de
‘what whispered in the closet shall be proclaimed from the house-tops’”.

Ainda quanto a esta característica, continua o autor48 acima referido: “Não se pode
identificar, de modo expresso, a consideração da vida privada e da intimidade como objetos

47
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada: uma visão jurídica da
sexualidade, da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da morte. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998. p.57
48
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada... p.209-220

83
específicos de um direito, mas antes, receberam proteção reflexa, sob o recurso de um
fundamento jurídico já sedimentado pela doutrina e jurisprudência ocidentais, como o
direito à propriedade, à honra, o direito contratual ou, no plano do Direito Público, o direito
à liberdade, a inviolabilidade de domicílio e de correspondência. Sua formulação, contudo
far-se-á de modo mais preciso como direito autônomo somente a partir do final do século
XIX, com o deslocamento do centro de proteção para o que se chamaria de “patrimônio
moral do homem” ou da personalidade humana inviolável.” Inicia-se, com essa mudança de
objetivo, a história de um dos “mais amplos dos direitos e o direito mais valioso do homem
civilizado”, ao mesmo tempo que inusitado e instigante, a ponto de seu poder germinador
fazer do que antes fora seu precedente apenas mais um de seus aspectos”.

Qualquer ofensa aos direitos da personalidade, gerará, inexoravelmente, a reparação


por dano moral. De fato, não se pode olvidar as características fundamentais dos direitos da
personalidade, quais sejam: absolutismo, extrapatrimonialidade, instransmissibilidade,
imprescritibilidade, impenhorabilidade, vitaliciedade e necessidade. E qualquer ofensa,
necessita ser reparada imediatamente sob pena de atingir profundamente os direitos mais
fundamentais da pessoa humana.

Deveras, dispõe o artigo 186 do estatuto civil: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Cumpre ser frisado o fato de que a sanção àquele que viola a intimidade será tarefa
tanto do direito civil bem como do direito penal, sendo que este tipifica todos aqueles atos
que contrariem a ordem jurídica.

Deveras, citem-se os artigos 184 e seguintes do código penal, recentemente


modificados pela Lei Federal nº 10.695, de 01-07-2003, que trata da violação dos direitos
de autor e os que lhe são conexos. Ora, conforme Silvio de Salvo Venosa49 : “... os direitos
intelectuais, conhecidos como direitos autorais, são modalidade de direitos da

49
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. São Paulo: Atlas, 2003. p. 583

84
personalidade. Direitos intelectuais são aqueles disciplinadores da relação entre a pessoa e
sua criação intelectual, de cunho pecuniário ou simplesmente moral.”

Portanto, encontramos nestas disposições um excelente exemplo da sanção penal


imposta à violação dos direitos inatos ao ser humano. Inclusive o parágrafo terceiro do
artigo 184, reforça os aspectos que são objeto de estudo do direito eletrônico, haja vista que
conforme o parágrafo terceiro: “Se a violação consistir no oferecimento ao público,
mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário
realizar a seleção da obra ou produção pra recebê-la em um tempo e lugar previamente
determinados por quem formula a demanda, com intuito de lucro, direto ou indireto, sem
autorização expressa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete ou executante, do
produtor de fonograma, ou de quem os represente: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro)
anos, e multa.”

Outrossim, como direito é fato, valor e norma, cotidianamente são noticiados pela
imprensa inúmeros casos de violação dos direitos da personalidade pelos meios eletrônicos.

Podemos referir a notícia de 11 de outubro de 2003, no jornal O Estado de São


Paulo: “Pela primeira vez, o governo dos Estados Unidos investe contra uma série de
páginas Web, que representariam organizações terroristas no mundo físico. (...) Segundo
lista divulgada pelo Departamento de Estado norte-americano, os sites newkach.org,
kahane.org, kahane.net e kahanetzadak, seriam a base virtual do grupo judeu Kahane Chai
ou Kach, suspeito de organizar ataques contra os palestinos. (...) Por lei, seus responsáveis
podem ter seus vistos cancelados e contas bancárias bloqueadas. Os sites, porém, não
podem ser fechados. (...)”.

Ora, há violação, na hipótese em tela, aos direitos da personalidade, pois ocorreu


um abuso evidente no tocante a manifestação de pensamento, extravasando o limite da
normalidade.

85
O código civil, em seu artigo 187 explicita: “Também comete ato ilícito o titular de
um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim
econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Isto é o que se denomina de
abuso de direito, que de acordo com Fabrício Zamprogna Mattielo 50 : “...é tido, como ato
ilícito no ordenamento pátrio, dele decorrendo todas as conseqüências da ilicitude civil, tais
como : dever de indenizar, obrigação de fazer cessar a abusividade, reposição ao estado
anterior etc. (...) O ato ilícito com origem no exercício do direito de maneira estranha ao
desejado pelo legislador pressupõe que o agente exceda manifestamente os limites ditados
pelos fins econômico ou social, pela boa-fé ou bons costumes, ou seja, ultrapasse
notoriamente as barreiras do razoável e tolerável, descambando para o abuso do direito.
(...).”

Um aspecto relevante é o fato de os norte-americanos terem procedido as


investigações das páginas web, mas não poderem sustá-las definitivamente. Isto se justifica,
como alerta José Adércio Leite Sampaio 51 : “Não se pode haver ingerência de autoridade
pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e
constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a
segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar econômico do país, a defesa
da ordem e a prevenção das infrações penais, a proteção da saúde ou da moral, ou a
proteção dos direitos e das liberdades de terceiros”.

Outro problema que se demonstra grave, e fere os direito da personalidade, são as


divulgações de imagens envolvendo menores, sem a devida autorização dos representantes
legais respectivos, dos quais Damásio de Jesus e Gianpaolo Poggio Smanio 52 , tiveram a
oportunidade de proferir parecer, abarcando tanto os aspectos civis bem como o criminal,
com a seguinte interpretação: “O Estatuto da Criança e do Adolescente - (ECA) adotou, em

50
MATTIELO, Fabrício Zamprogna. Código Civil... p.149
51
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada... p.82.
52
JESUS, Damásio E. de. SMANIO, Gianpaolo Poggio. INTERNET: CENAS DE SEXO
EXPLICITO ENVOLVENDO MENORES E ADOLESCENTES - ASPECTOS CIVIS E
PENAIS.http://www.trlex.com.br/resenha/damasio/adolesc.doc acessado em 14/10/2003.

86
seu art. 1º, o princípio da proteção integral da criança e do adolescente, estendendo-se a
todas as suas necessidades e direitos, no sentido do pleno desenvolvimento de sua
personalidade. E o seu art. 4º expressa que "é dever da família, da comunidade, da
sociedade em geral e do Poder Público, assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação
dos direitos referentes... à dignidade e ao respeito". Como corolário desses princípios, o art.
5º proíbe que a criança ou adolescente seja objeto de qualquer exploração, sendo punido, na
forma da lei, qualquer atentado aos seus direitos fundamentais.(...) Evidentemente, a
divulgação via Internet de cenas de sexo explícito envolvendo crianças e adolescentes
constitui exploração e atentado contra os direitos da personalidade dos mesmos, incidindo
na proibição legal. Realmente, o art. 17 do ECA dispõe sobre o direito à inviolabilidade
física, psíquica e moral do objeto da tutela legal, referindo-se expressamente à preservação
de sua imagem e de seus, valores. Esse dispositivo não contém simples norma
programática, uma vez que o art. 18 do mesmo diploma impõe a todos o dever de zelar pela
dignidade dos menores contra situações constrangedoras e vexatórias, significando que seus
direitos são oponíveis "erga omnes", ou seja, contra todos.(...) Os direitos e interesses da
pessoa humana, ainda que criança ou adolescente, são difusos, uma vez que transcendem a
esfera individual, referindo-se à toda sociedade, que deles não pode dispor. Assim, o
referido Estatuto estipula sua proteção judicial por via da ação civil pública, visando a
impedir a veiculação de "sites" nocivos, à sua imagem e personalidade via Internet, nos
termos do seu art. 208, parágrafo único, sendo o Ministério Público, dentre outras, a
instituição com atribuições para a propositura judicial (art. 210, I). De observar-se que
qualquer pessoa pode provocar a iniciativa do Ministério Público, conforme o art. 220 do
mencionado Estatuto, representando e apresentando elementos para sua atuação. (...)
Considerando que o ECA determina a competência funciona1 absoluta do foro do local
onde ocorreu a ação conforme seu art. 209, a representação deverá ser encaminhada ao
Ministério Público com atribuição do domicílio do responsável pelo "site". Caso o acesso
seja difícil, ou os domicílios sejam de complicada localização, a representação poderá ser
endereçada à Procuradoria-Geral de Justiça estadual, que a encaminhará à sua destinação
específica. (...) Assim, por intermédio do Ministério Público é possível proibir-se a
veiculação via Internet de cenas pornográficas envolvendo menores, responsabilizando-se
civilmente os responsáveis. (...) Aspectos Penais: O art. 241 da Lei .. 8.069/90 (ECA)

87
tipifica como crime o fato de fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança e adolescente, cominando pena de l (um) a 4 (quatro) anos de reclusão.
Publicar significa tornar público, permitir o acesso ao público, o sentido de um conjunto de
pessoas, pouco importando o processo de publicação (Nélson Hungria, Comentários ao
Código Penal, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1958, VII:340). Em face disso, a divulgação
dos "sites" via Internet constitui o núcleo da norma penal incriminadora ("publicar") e
adequa-se à figura típica. (...) Não se exige dano individual efetivo, bastando o potencial.
Significa não se exigir que, em face da publicação, haja dano real à imagem, respeito à
dignidade etc. de alguma criança ou adolescente, individualmente lesados. O tipo se
contenta com o dano à imagem abstratamente considerada.(...) A consumação do delito
ocorre o instante e o local a partir do qual é permitido o acesso ao público que atua na
Internet, ou seja, o endereço do responsável pelo "site" (lugar da publicação). (...) A
competência é determinada pelos arts. 69 e 70 do Código de Processo Penal, indicando o
lugar da infração: aquele onde o crime se consumou. Portanto, no local do endereço do
responsável pelo "site" ("endereço real").(...) No que se refere à representação sobre a
prática do crime, aplica-se o que foi exposto sobre os aspectos civis, podendo ser deduzida
perante a Promotoria de Justiça do Ministério Público Estadual, com atribuição no referido
endereço do responsável pelo "site", ou a Procuradoria-Geral de Justiça.”

Quanto a este aspecto, qual seja, os direitos da personalidade da criança e do


adolescente, quanto à sua imagem, há julgados sobre a problemática nos seguintes termos:
“PENAL – ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI Nº 8.069/90) –
ARTIGO 241 – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – ART. 109, V, DA CF/88 –
CONVENÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA – DECRETO LEGISLATIVO Nº 28/90
E DECRETO Nº 99.710/90 – SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO –
DIVULGAÇÃO DE IMAGENS PORNOGRÁFICAS DE MENORES PELA INTERNET
– FIXAÇÃO DA PENA – ATENUANTE DA MENORIDADE – PRESCRIÇÃO DA
AÇÃO – 1. O Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo nº 28, de 24.09.1990,
bem como o Governo Federal, por força do Decreto nº 99.710, de 21.11.1990,
incorporaram ao direito pátrio os preceitos contidos na Convenção Sobre os Direitos da
Criança, que prevê, entre outras coisas, que os Estados Partes darão proteção legal à criança

88
contra atentados à sua honra e a sua reputação (art. 16), bem como tomarão as medidas que
foram necessárias para impedir a exploração da criança em espetáculos ou materiais
pornográficos (art. 34). 2. A justiça federal é competente para o processamento e
julgamento da causa, aplicando-se à hipótese o disposto no art. 109, V, da CF/88, pois o
delito praticado (art. 241 do ECA) encontra previsão no citado tratado, bem como sua
execução teve início no País. Quanto ao resultado, levando-se em conta que o meio de
divulgação utilizado foi a rede mundial de computadores (INTERNET), as fotos podem ter
alcançado todos os países que tem conexão com a rede, ou seja, praticamente todo o
planeta. 3. Tendo o réu se conformado com a decisão que lhe negou a suspensão do
processo, não é possível, já em fase recursal, quando toda a instrução probatória já foi
realizada, bem como todos os atos processuais, se falar em suspender o processo.
Preliminar não conhecida por se tratar de questão preclusa. 4. Comprovadas a materialidade
e a autoria do delito pelo farto conjunto probatório, é de ser reconhecida a responsabilidade
penal do réu pelo cometimento do ilícito previsto no art. 241 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, pois o mesmo utilizava-se de seu site na Internet para divulgar pornografia
infantil, através da publicação de fotos pornográficas envolvendo crianças, que eram
enviadas a ele por correio eletrônico (e-mail). 5. Em havendo concurso entre uma
circunstância agravante (art. 61, II, 'a' do CP – motivo torpe) e uma atenuante (art. 65, I do
CP – menoridade) e sendo ambas preponderantes, deve prevalecer a circunstância legal da
menoridade, conforme o entendimento do STF (HC 71323/SP, 1ª Turma, Rel. Min.
Sepúlveda Pertence, decisão unânime, DJU de 19.05.1995). 6. Fixada a pena definitiva em
1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. 7. Fixada definitivamente a pena e comprovada a
menoridade do réu ao tempo do fato, cumpre reconhecer a prescrição da pretensão punitiva.
Tendo havido sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, a prescrição
regula-se pela pena aplicada (cfe parágrafo 1º do art. 110 do CP). Nos termos do art. 115 do
CP, o prazo de prescrição reduz-se à metade quando o criminoso era, ao tempo do crime,
menor de vinte e um anos. Uma vez comprovado que o réu iniciou a atividade criminosa
antes dos 21 anos, é indiferente que tenha ele completado a maioridade antes de encerrada a
conduta criminosa (art. 4º do CP), devendo incidir a redução prescricional pela idade. 8.
Condenado o réu à pena de um ano e seis meses de reclusão, transcorreu lapso temporal
superior a dois anos entre os fatos delituosos, que ocorreram no período de dezembro de

89
1997 a 22 de abril de 1998, e o recebimento da denúncia, que se deu em 20 de junho de
2000 (fl. 04), impondo-se a declaração da extinção da punibilidade face à ocorrência da
prescrição da pretensão punitiva (Código Penal, arts. 107, V e 109, VI, 110, § 1º, c/c 115).
(TRF 4ª R. – ACr 2002.04.01.033189-7 – PR – 7ª T. – Rel. Des. Fed. José Luiz B.
Germano da Silva – DOU 21.05.2003 – p. 806).”

E ainda, podemos relatar, mais um problema que o direito eletrônico precisará


resolver, como exposto no seguinte julgado: “AGRAVO REGIMENTAL – SUSPENSÃO
DE SEGURANÇA – SENTENÇA CONCESSIVA DA SEGURANÇA –
RADIODIFUSÃO DE SONS E IMAGENS – SERVIÇOS DE MULTIMÍDIA
PRESTADOS POR PROVEDORA DE INTERNET – PRÉVIA AUTORIZAÇÃO
ESTATAL PARA FUNCIONAMENTO – GRAVE LESÃO À SEGURANÇA PÚBLICA
– INTERFERÊNCIA NAS COMUNICAÇÕES EM GERAL E RISCO À SEGURANÇA
DA COLETIVIDADE – 1. Os serviços de radiodifusão sonora e de imagens são, por
definição, serviços a serem explorados pela união, ou mediante permissão, concessão ou
autorização. Conseqüentemente, para seu funcionamento, dependem de prévia autorização
estatal pelo órgão competente, circunstância que afasta a plausibilidade jurídica do direito
de exploração dos serviços de comunicação multimídia sem aquela autorização, pelo que
não há como se falar em possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação na
espécie. 3. Situação apta a causar grave lesão à segurança pública porque a execução dos
serviços de multimídia, envolvendo radiodifusão de sons e imagens, pode ocasionar
interferências nas comunicações em geral e colocar em risco a segurança da coletividade. 4.
Agravo Regimental rejeitado. 5. Decisão confirmada. (TRF 1ª – AgRg 2002.01.00.036260-
8 – MG – Rel. Des. Fed. Catão Alves – J. 27.02.2003).”

A Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL, em sede de pedido de


suspensão dos efeitos da sentença proferida em mandado de segurança, argüiu que a
Impetrante: “Ao se utilizar de faixa de radiofreqüência de forma desordenada e sem
qualquer autorização do órgão competente, por meio de enlaces via rádio ponto-multiponto,
explorando clandestinamente os serviços de telecomunicações de caráter secundário, teve
suas atividades imediatamente interrompidas, com o fito de se evitar interferências

90
maléficas em transmissões legalmente autorizadas, aparelhos de telecomunicações,
inclusive aqueles essenciais à segurança pública”.

O direito eletrônico, como ramo autônomo que pretende ser, terá que no futuro
prepar-se para todas estas intricadas questões, as quais já estão surgindo, e se tornarão mais
comuns, a partir do incremento no uso das novas tecnologias, como aliás já ocorre com a
internet, como inclusive divulgado pela imprensa, que diagnosticando o continente africano
constatou: “O uso da internet e de telefones celulares se encontra em expansão na África,
de acordo com especialistas em tecnologia da ONU (Organização das Nações Unidas).(...)
O número de pessoas usando (e pagando) provedores de internet aumentou em 20% nos
últimos 18 meses, segundo a Força-Tarefa de Informação e Tecnologias de Comunicação
da ONU.(...)A popularidade das comunicações sem fio também está crescendo. Mais
telefones celulares foram adquiridos nos últimos cinco anos do que linhas fixas foram
instaladas no último século”53 . Trata-se, portanto, de um fenômeno mundial, decorrência da
globalização em todos os setores da vida humana.

E o direito brasileiro, como se colocariam as questões do direito eletrônico, estamos


preparados?

Há vários projetos de lei, sendo o principal o PL 84/99 anexado ao final, que


disciplinam o direito eletrônico, especificamente quanto aos seus reflexos no tocante aos
direitos da personalidade. Urge uma lei para regular os problemas, e conflitos de interesses
que surgirem a fim de possibilitar ao Judiciário decidir as questões de forma mais justa e
consentânea aos princípios próprios do direito eletrônico.

53
Aumenta uso de internet e telefone celular na África.
http://www0.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/021002_africamtc.shtml, acessado em 14/10/2003.

91
BIBLIOGRAFIA:

Aumenta uso de internet e telefone celular na África.


http://www0.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/021002_africamtc.shtml, acessado em
14/10/2003.
DINIZ, Maria Helena. Código Civil: inovações. Jornal Tribuna da Magistratura. São
Paulo, julho-agosto 2002.
__________. Dicionário Jurídico: volume 3. São Paulo: Saraiva, 1998.
FRANÇA, Rubens Limongi. Direitos da Personalidade. Coordenadas Fundamentais.
Revista do Advogado nº 38.
JESUS, Damásio E. de. SMANIO, Gianpaolo Poggio. INTERNET: CENAS DE SEXO
EXPLICITO ENVOLVENDO MENORES E ADOLESCENTES - ASPECTOS CIVIS E
PENAIS.http://www.trlex.com.br/resenha/damasio/adolesc.doc acessado em 14/10/2003.
LAWAND, Jorge José. Teoria geral dos contratos eletrônicos. São Paulo: Juarez de
Oliveira, 2003.
MATTIELO, Fabrício Zamprogna. Código Civil Comentado. São Paulo: LTR, 2003.
Os direitos da personalidade são inatos?, Revista dos Tribunais, n. 694, ago/1993.
PECK, Patrícia. Direito digital e os novos desafios para o profissional do Direito. Folha do
Acadêmico.
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada: uma visão jurídica da
sexualidade, da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da morte. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998.
SILVA NETO, Amaro Moraes e. Privacidade na internet: um enfoque jurídico. Bauru:
EDIPRO, 2001.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. São Paulo: Atlas, 2003. p. 583

92
ANEXO

SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI Nº 84, DE 1999

(Do Sr. Luiz Piauhylino)


Dispõe sobre os crimes de informática, suas penalidades e outras providências.
O Congresso Nacional decreta:
CAPÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS QUE REGULAM A PRESTAÇÃO DE SERVIÇO POR MEIOS
ELETRÔNICOS
Art. 1º. O processamento, o acesso e a disseminação de informações das pessoas físicas e
jurídicas através de meios eletrônicos, devem respeitar os direitos fundamentais.
Art. 2º. É livre a estruturação e o funcionamento dos meios eletrônicos e seus serviços,
ressalvadas as disposições específicas reguladas em lei.
Art. 3º. Os provedores de serviço de acesso eletrônico de-verão obter informações
cadastrais de seus usuários:
I – nome;
II – inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF ou no Cadastro Nacional de Pessoas
Jurídicas – CNPJ, do Ministério da Fazenda, ou outro documento público de identificação;
III – endereço;
Parágrafo Único. No caso de usuário que tenha deixado de utilizar os serviços do provedor,
os dados respectivos serão mantidos em registro por prazo não inferior a seis meses,
contados da data de encerramento da prestação dos serviços, salvo nos casos em que for
notificado por terceiro interessado.
Art. 4º. Deverão ser mantidos em registro, por um prazo de seis meses, salvo nos casos de
notificação por terceiro interessado, os seguintes dados referentes a cada transação atendida
pelo provedor:
I – identificação do usuário atendido;
II – os horários de abertura e encerramento da conexão devem incluir minuto e segundo,
registrados pelo relógio da máquina onde a conexão foi estabelecida. Este relógio deverá
estar sincronizado, através do serviço de cliente NTP (Network Timing Protocol, parte do

93
padrão TCP/IP), com um servidor de sincronização de rede NTP, cujo funcionamento e
responsabilidades devem ser regulamen-tados pela agência ANATEL;
III – endereço atribuído ao usuário na transação (IP Address – Internet Protocol Address);
IV – número do telefone ou identificação de ponto de rede utilizado para efetuar a conexão,
salvo impossibilidade técnica.
Art. 5º. Os dados e informações referidos nesta lei são confidenciais, não podendo ser
divulgados a terceiros, a qualquer tí-tulo, salvo requisição judicial, na forma da lei.
Art. 6º. A desobediência ao disposto nos artigos 3º e 4º desta lei sujeita o infrator a multa
não inferior a R$ 1.000,00 (um mil reais) por informação ou dado não registrado, acrescida
de um terço em caso de reincidência.
CAPÍTULO II
DO USO DE INFORMAÇÕES DISPONÍVEIS EM MEIOS ELETRÔNICOS
Art. 7º. Para fins desta lei, entende-se por dados aquelas informações inerentes à pessoa
física identificada ou identificável.
Parágrafo Único. É identificável toda pessoa que direta ou indiretamente, através de
referência a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica,
psíquica, econômica, cultural ou social possa ser individualizada.
Art. 8º. Ninguém será obrigado a fornecer informações próprias ou de terceiros, salvo nos
casos previstos em lei.
Art. 9º. A coleta, o processamento e a distribuição de dados ficam sujeitos à prévia
autorização da pessoa física ou jurídica a que se referem. O titular dos dados pode, a
qualquer momento, sus-pender a utilização de seus dados, assegurado o seu direito de
ressarcimento por dano material ou moral, quando couber.
§ 1º. À toda pessoa cadastrada, dar-se-á conhecimento dos dados pessoais armazenados e
das respectivas fontes.
§ 2º. Fica assegurado ao titular dos dados pessoais, o direito à requerer a retificação de
qualquer dado pessoal incorreto, assim como o de contestar ou solicitar explicações sobre a
veracidade do dado mesmo que justificável.
§ 3º. Salvo por disposição legal ou determinação judicial em contrário, nenhum dado
pessoal será mantida à revelia da pessoa a que se refere ou além do tempo previsto para a
sua validade.

94
§ 4º. Qualquer pessoa, física ou jurídica, tem o direito de saber o respectivo teor dos dados
a seu respeito mantidos por qualquer terceiro.
Art. 10. Os serviços de informações ou de acesso a bancos de dados não distribuirão dados
pessoais referentes, direta ou indiretamente, a origem racial, opinião política, filosófica,
religiosa ou de orientação sexual, e de filiação a qualquer entidade, pública ou privada,
salvo autorização expressa do interessado.
Art. 11. O acesso de terceiros aos dados pessoais mantidos em meios eletrônicos dependerá
de prévia autorização judicial.
[OBS: A FORMA DE PROTEÇÃO AOS DADOS DE PESSOAS JURÍDICAS AINDA
NÃO FOI DEFINIDA ATÉ O PRESENTE MOMENTO, CONFORME AS
CONCLUSÕES DAS COMISSÕES]
CAPÍTULO III
DOS CRIMES DE INFORMÁTICA
Seção I
Dano a dado, programa de computador, banco de dados ou mecanismos de acesso
Art. 12. Apagar, destruir, modificar ou de qualquer forma inutilizar, total ou parcialmente,
dado, programa de computador, banco de dados ou mecanismos de acesso armazenados em
meios eletrônicos, com a utilização de meio fraudulento ou de forma não autorizada:
Pena: detenção, de .... e multa
Parágrafo Único: Se o crime é cometido:
I – contra o interesse da União, Estado, Distrito Federal,
Município ou órgão ou entidade da administração direta ou indireta ou de empresa
concessionária de serviços públicos;
II – com intuito de lucro ou vantagem de qualquer espécie,
própria ou de terceiro ou;
III – com o uso indevido de senha ou processo de
identificação de terceiro.
Pena: detenção, .... e multa.
Seção II Acesso não autorizado ou fraudulento
Art. 13. Obter acesso não autorizado ou com utilização de

95
meio fraudulento, de dados, programas de computador, banco de dados ou mecanismos de
acesso armazenados em meios eletrônicos.
Pena: detenção e multa
Parágrafo Único: Se o crime é cometido:
I – contra o interesse da União, Estado, Distrito Federal,
Município ou órgão ou entidade da administração direta ou indireta ou de empresa
concessionária de serviços públicos;
II – com intuito de lucro ou vantagem de qualquer espécie,
própria ou de terceiro ou;
III – com o uso indevido de senha ou processo de
identificação de terceiro.
Pena: detenção, e multa.
Seção III Divulgação ilegal de dados ou banco de dados
Art. 14. Divulgar ou fornecer dados ou banco de dados
armazenados em meios eletrônicos em desacordo com o disposto no art. 5º desta lei:
Pena: detenção, .... e multa.
Seção IV Inserção de dados em meios eletrônicos com fins nocivos
Art. 15. Inserir dado ou programa de computador em meios
eletrônicos com a finalidade de apagar, destruir, inutilizar ou modificar dado, programa de
computador, banco de dados ou mecanismos de acesso, ou de qualquer forma dificultar ou
impossibilitar total ou parci-almente a utilização de meios eletrônicos:
Pena: detenção, .... e multa.
§ 1º: Se o crime é cometido:
I – contra o interesse da União, Estado, Distrito Federal,
Município ou órgão ou entidade da administração direta ou indireta ou de empresa
concessionária de serviços públicos;
II – com intuito de lucro ou vantagem de qualquer espécie,
própria ou de terceiro ou;
III – com o uso indevido de senha ou processo de
identificação de terceiro.
Pena: detenção, .... e multa.

96
§ 2º: Se o crime é culposo:
Pena: detenção, .... e multa.
[OBS: AS PENAS PREVISTAS PARA OS CRIMES ACIMA TRATADOS AINDA NÃO
FORAM ANALISADAS PELAS COMISSÕES]
Seção V
Veiculação de pornografia através de meios eletrônicos
[OBS: OS CRIMES RELATIVOS À MATÉRIA ACIMA MENCIONADA AINDA NÃO
FORAM ANALISADOS PELAS COMISSÕES]
CAPÍTULO IV
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
[OBS: AS DISPOSIÇÕES FINAIS TAMBÉM NÃO FORAM ANALISADAS PELAS
COMISSÕES]

IBDE – Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico

97
O Uso da Arbitragem como Solução para os Conflitos da Tecnologia da Informação e os
Métodos ODR ( online disput e resolut ion ) como Alternativas não Adversariais para
Resolução de Controvérsias por meio Eletrônico

Marcelo Bechara de Souza Hobaika

Belo Horizonte
Setembro/2.003

RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo a análise jurídica do instituto arbitral
previsto na Lei n.º 9.307, de 23 de setembro de 1996, focando sua adoção para a solução
dos conflitos patrimoniais da Tecnologia da Informação, bem como a realização desse e
outros métodos não adversariais para resolução de controvérsias através da Internet, em
procedimentos praticados online, sistema conhecido como no mundo como ODR (Online
Dispute Resolution) ou E-resolution, ressaltando ainda as experiências bem sucedidas no
cenário internacional, as vantagens e desvantagens do sistema e finalmente a sua
aplicabilidade no Brasil.

SUMÁRIO: 1. O Direito e os conflitos da Tecnologia da Informação- 2. As formas


negociais de solução de conflitos, a competência jurisdicional no Direito de Informática e
os principais métodos não adversariais para resolução de controvérsias - 3. Arbitragem.
Conceito, aspectos legais e vantagens - 4. A arbitralidade dos conflitos da Tecnologia da
Informação - 5. O ICANN - The Internet Corporation for Assigned Names and Numbers, a
WIPO - World Intellectual Property Organization e o UDRP - Uniform Domain-Name
Dispute-Resolution Policy - 6. E–resolution ou Online Dispute Resolution (ODR).
Conceito, bases normativas no Direito Comparado, projetos e experiências internacionais -
7. Aspectos jurídicos do ODR. Aplicabilidade no Brasil.– 8. Conclusão – 9. Bibliografia.

1. O Direito e os conflitos da Tecnologia da Informação.

A consolidação dos aspectos jurídicos e sua interação interdisciplinar com a Ciência


da Informação são motivos de estudo e discussão que vem se aprofundando em nível e se
elevando em quantidade nos últimos anos.

98
Com o avanço da Internet e demais expressões tecnológicas, o Direito tem sido
constantemente chamado a responder e solucionar os novos conflitos, haja vista que a
informática atingiu importantes setores da vida pública e privada, sendo diversos os
exemplos de situações em que a Tecnologia da Informação está presente nas relações
sociais e jurídicas.

Seja na busca pela informação ou como meio de comunicação, seja na prestação de


serviços, no exercício da democracia, no consumo, na educação, na arte, na publicidade, na
economia ou mesmo na informatização do aparelho judiciário, a verdade é que hoje a
Internet é um grande negócio.

Neste contexto, o processo eletrônico é uma importante realidade que se materializa


e tende a auxiliar e muito o funcionamento do Poder Judiciário, em todas as suas instâncias.
Não apenas pela consulta aos andamentos e o acesso ao teor das decisões, mas
principalmente a informatização dos atos processuais pode otimizar o já desgastado e
arcaico sistema de papel. Entretanto, apesar de ser uma tendência bem-vinda para a
desburocratização, o processo eletrônico não é uma garantia efetiva de solução contra a
morosidade e o acúmulo de litígios que sobrecarregam a Justiça.

A relevância desta abordagem surge, então, da necessidade do emprego de meios


legais e eficazes para a solução dos conflitos que envolvam aspectos informáticos, levando-
se em consideração suas peculiaridades técnicas e a rapidez (com eficiência) no deslinde
das demandas.

Diante disso, serão abordados alguns métodos não adversariais para a solução dos
conflitos, com total ênfase na arbitragem, instituto previsto na Lei n.º 9.307, de 23 de
setembro de 199654 , bem como a realização desse e outros métodos através da Internet, em

54
A Lei de Arbitragem entrou em vigor sessenta dias após a data de sua publicação, ou seja, em 23 de
novembro de 1996, tendo decorrido do Projeto de Lei do Senado n.º 78/1992 e n.º 4.018/93 da Câmara dos
Deputados.

99
procedimentos praticados online, sistema conhecido como ODR (Online Dispute
Resolution) ou e-resolution.

2. As formas negociais de solução de conflitos, a competência jurisdicional no Direito


de Informática e os principais métodos não adversariais para resolução de
controvérsias.

Compulsando-se o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa55 , o primeiro significado que


encontramos para a palavra conflito é “profunda falta de entendimento entre duas ou mais
partes”. O desentendimento, por óbvio, é o núcleo do conflito. Todavia, este não pode ser
entendido como algo necessariamente negativo e pode conduzir os envolvidos a um
aprendizado, a uma situação construtiva.

Para tanto, a capacidade de negociar ou de solucioná-los produtivamente deve


superar as barreiras psicológicas que inibem o acordo e inviabilizam a negociação. Para
JOSÉ MARIA ROSSINI GARCEZ “os mecanismos tradicionais como a força, o poder e a
autoridade perderam, assim, espaço no mundo contemporâneo, cedendo lugar aos métodos
negociais, em que cada vez mais se tem consciência da necessidade de se obter o
consentimento da outra parte como método construtivo e de resultados duradouros para a
produção de contratos e resolução de controvérsias56 ”.

A competência jurisdicional e a legislação aplicável no Direito de Informática


levantam questões e suscitam dúvidas em relação à eficácia das normas legais para a
solução dos dissídios vinculados à Tecnologia da Informação.

Neste implexo, partes que interagem, mas são domiciliadas em lugares ou mesmo
países distintos; a urgência na solução das contendas em contraposição à morosidade da
Justiça; as barreiras culturais dos assuntos de natureza tecnológica no Poder Judiciário e a

55
HOUAISS, Antônio (1915-1999) e VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
56
GARCEZ, José Maria Rossini. (Coord.) A arbitragem na era da globalização. Rio de Janeiro: Editora
Forense, 1997; 2ª ed., 1999.

100
lentidão do processo legislativo são alguns embaraços experimentados pelo Direito de
Informática em sua materialização jurídica.

Em relação aos contratos, por exemplo, a Lei de Introdução ao Código Civil57


preceitua que a legislação aplicável é aquela do país em que as obrigações se constituírem,
conforme disposição do art. 9º, § 2º, in verbis:

“Art. 9° - Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que


constituírem.
(...)
§ 2° - A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o
proponente”.

Apesar do art. 9º da LICC que determina a lex loci contractus, há uma crescente
valorização da autonomia da vontade das partes para efeitos de escolha da lei de regência.
Além do mais, o Supremo Tribunal Federal, através da Súmula 335 pacificou a liberdade de
escolha de foro, seja em contratos domésticos ou internacionais. Cumpre salientar, que a
mesma LICC, através de seu art. 17, estabeleceu a eficácia das decisões estrangeiras no
Brasil, senão vejamos:

“As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não
terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons
costumes”.

Haja vista suas peculiaridades, as soluções dos conflitos no Direito de Informática


podem concretizar-se de forma eficaz, se forem adotados, sempre que possível,
procedimentos alternativos e privados para a construção de uma negociação que atenda aos
anseios das partes e reflita uma resolução justa da questão jurídico-tecnológica.

57
Decreto-lei n° 4.657, de 04 de setembro de 1942.

101
Os principais métodos não adversariais para a solução de controvérsias ou ADR
(Alternative Dispute Resolution) são a mediação, a conciliação e a arbitragem. Em relação
às duas primeiras modalidades, cumpre fazer uma breve exposição, citando apenas suas
características básicas, enquanto a última será analisada com minúcia, haja vista sua maior
complexidade, além de estar prevista em legislação própria e atender com mais precisão às
necessidades da Ciência da Informação.

A conciliação é uma forma de solução em que as próprias partes, com a ajuda de


terceiro(s) buscam negociar uma maneira de por fim à controvérsia. O conciliador não se
limita apenas a auxiliar as partes, mas tenta induzi-las a um acordo.

A norma processual civil brasileira tem previsão legal para a conciliação no curso
do processo judicial58 , tendo a Lei n.º 9.099/95 sido fundamental para a consolidação deste
método de autocomposição. A Justiça do Trabalho igualmente persegue as conciliações59
entre empregadores e trabalhadores a fim de por fim às reclamações. Há ainda a
possibilidade, com previsão em lei, de conciliações prévias em comissões de composição
paritária, com representantes das duas classes, nos termos da Lei no 9.958, de 12 de janeiro
de 2000.

Na mediação, por sua vez, a figura do terceiro é mais destacada, na medida em que
esse colaborador tem por objetivo encorajar as partes e expor as vantagens de uma solução
negociada, sem, contudo, emitir qualquer juízo de valor. O mediador, além de neutro e
imparcial, tem formação específica e conhecimentos práticos de mediação60 .

No Direito Comparado, se observadas as legislações de alguns países, a mediação é


prevista como uma forma necessária de tentativa de solução da controvérsia antes do
ajuizamento da demanda. É a mediação incidental. No Brasil, existem anteprojetos de lei

58
O art. 125 do CPC prevê a tentativa de conciliação das partes pelo juiz, a qualquer tempo. O art.331, por
sua vez, determina que o juiz designará audiência de conciliação, quando a causa versar sobre direitos
disponíveis. Já o art. 275 trata da figura do conciliador como auxiliador do juiz nos procedimentos sumários
com causas de menor valor. Por fim, o art. 447 determina a tentativa de conciliação antes da instrução.
59
O art. 114 da CLT expressa que a função básica da Justiça do Trabalho é conciliar e julgar os dissídios
individuais e coletivos.

102
sobre o método, sendo que um deles prevê a mediação incidental no curso do processo
civil, de modo que futuramente o instituto poderá se tornar consagrado processualmente em
nosso ordenamento.

Cumpre salientar, todavia, que existem outras formas e técnicas de solução de


controvérsias, todas com o objetivo de conduzir as partes a uma composição extrajudicial,
sendo a mais completa delas a arbitragem, em que o(s) terceiro(s) chamado(s) para a
apreciação da causa emite(m) um julgamento fundado em conhecimentos específicos,
conforme será demonstrado a seguir.

3. A Arbitragem. Conceito, aspectos legais e vantagens.

Historicamente, a arbitragem está presente em nosso ordenamento jurídico desde o


século XIX, com a Constituição Imperial de 1824 e o Código Comercial de 1850.
Posteriormente, foi introduzida no Código Civil de 1916 e no Código de Processo Civil de
1973. Entretanto, foi com a na Lei n.º 9.307, de 23 de setembro de 1996 que a arbitragem
ganhou força.

A arbitragem é uma instituição pela qual as pessoas capazes de contratar confiam a


terceiros (árbitros), o julgamento de seus litígios relativos a direitos transigíveis
patrimoniais disponíveis, conforme previsão legal do art. 1º da Lei 9.307/96, senão
vejamos:

“Art. 1º - As pessoas capazes de contratar poderão valer–se da arbitragem para dirimir


litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”.

Primeiramente, é preciso salientar que nem todas as questões são passíveis de serem
submetidas à arbitragem. A arbitralidade passa apenas pelos direitos patrimoniais (que
tenham valor econômico) e disponíveis, ou seja, aqueles em que as partes podem
livremente ceder, alienar, onerar, transacionar e renunciar.

60
A própria Lei de Arbitragem preceitua a possibilidade de conciliação, nos termos do art. 7º, § 2º.

103
Conseqüentemente, são indisponíveis aqueles que façam parte de litígios que
dependam exclusivamente de sentença judicial, como nos processos que haja interesse
público, os de natureza criminal, falimentar, fiscal ou que tratem da capacidade ou estado
das pessoas, por exemplo.

O uso da arbitragem decorre da vontade expressa pelas partes na convenção arbitral,


que é gênero, da qual são espécies a cláusula compromissória e o compromisso arbitral (art.
3º). A primeira é introduzida na esfera contratual para submeter qualquer dissídio futuro ao
método arbitral (art. 4º). Pode ser cheia ou vazia, dependendo do grau de completude das
determinações procedimentais preliminares previstas em contrato. Já o compromisso
arbitral (art. 9º) é um termo que detalha a arbitragem depois de surgido o conflito,
definindo todos os aspectos que norteiam o procedimento. O compromisso pode ser
assinado livremente pelas partes, ou perante o Juiz, quando uma delas se nega a cumprir a
arbitragem pactuada (art. 7º).

Os efeitos da sentença arbitral são os mesmos da decisão monocrática judicial,


podendo ser executada em caso de descumprimento, nos termos do art. 31 da Lei de
Arbitragem, a saber:

“Art. 31 - A sentença arbitral produz entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da
sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título
executivo”.

Entretanto, a sentença arbitral não depende de homologação judicial, e nem


comporta a interposição de recurso (art. 18). Se proferida no estrangeiro, pode ser
reconhecida ou executada no Brasil (arts. 34 a 40).

A arbitragem já é bastante utilizada na comunidade internacional, seja nos contratos


financeiros ou comerciais. A ampla utilização do método surge na medida em que, nos

104
contratos internacionais, as partes não querem se submeter ao crivo do Judiciário do país do
outro contratante, tampouco depender de procedimentos demorados.

Algumas instituições já são tradicionais na arbitragem internacional como a CCI –


Cour Internationale d’Arbitrage 61 de Paris, a LCIA – London Court of International
Arbitration62 de Londres e a AAA – American Arbitration Association63 de Nova York. A
arbitragem também é utilizada para a solução de dissídios de Direito Público Internacional,
entre Estados, como nos países que integram a União Européia.

As vantagens da arbitragem são visíveis quando promovemos uma análise


comparativa em relação à forma judicial. Para o advogado comercialista JOSÉ
ANCHIETA DA SILVA, “em linhas gerais, e em análise extrínseca, a arbitragem apresenta
tantas vantagens sobre o processo judicial tradicional que só mesmo por absoluta
desinteligência entre os envolvidos no caso concreto, não seria esta a forma eleita para se
obter solução para os litígios de natureza patrimonial64 ”.

Diante disso, algumas características atraentes e próprias da arbitragem devem ser


destacadas em analogia ao processo tradicional, a saber:

Os custos são em regra menores do que no processo judicial;

O prazo para emissão de sentença é mais curto (6 meses), podendo inclusive as


partes estipulá-lo (art. 23);

A despeito da publicidade dos atos processuais, na arbitragem a confidencialidade e


privacidade são garantidas por sigilo absoluto;

61
http://www.iccwbo.org/index_cour.Asp
62
http://www.lcia-arbitration.com/lcia/
63
http://www.adr.org
64
SILVA, José Anchieta da. Arbitragem dos Contratos Comerciais no Brasil. Belo Horizonte: Editora Del
Rey, 1997.

105
A informalidade ou desburocratização;

A flexibilidade das regras é imensa, podendo as partes interferir na metodologia que


será empregada;

Há neutralidade decisória por parte do(s) árbitro(s) e

O impacto na continuidade do relacionamento entre as partes é baixo, ao contrário


do litígio submetido à Justiça, que quase sempre leva ao desgaste e não preserva a relação
das partes.

Entretanto, a maior vantagem deste sistema no que diz respeito aos aspectos
informáticos, além da celeridade, é a especialização dos árbitros, ou seja, o conhecimento
técnico do julgador em relação à contenda em análise.

Isto porque o árbitro responsável pelo procedimento é escolhido de acordo com o


seu conhecimento, o que elimina, em princípio, o laudo pericial adotado pelo sistema
judiciário, em que o experto nomeado é da “confiança” do juiz, e não necessariamente das
partes interessadas, que podem no máximo indicar assistentes técnicos. Aliás, o art. 13 da
Lei de Arbitragem expressa com clareza que “pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que
tenha a confiança das partes”.

Ora, o magistrado não é obrigado a conhecer profundamente os aspectos técnicos


que muitas vezes são essenciais para a solução da demanda, mais até do que a própria
legislação. Nas controvérsias que envolvem a Tecnologia da Informação, o conhecimento
sobre conceitos e a operacionalização de aspectos informáticos ou telemáticos, específicos
da causa, pode ser fundamental para uma decisão acertada.

Nos processos ajuizados em repressão à contrafação de programas de computador,


por exemplo, na Ação Cautelar de Vistoria, Busca e Apreensão, segundo as determinações

106
dos artigos 13 e 14 da Lei n.º 9.609/98, cumulados com os artigos 797, 798 e 842, § 3º, do
Código de Processo Civil Brasileiro, o juiz deve nomear 02 (dois) peritos para fins de
vistoria prévia, em caráter liminar, como forma de apuração dos programas irregulares,
senão vejamos:

“Art. 13. A ação penal e as diligências preliminares de busca e apreensão, nos casos de
violação de direito de autor de programa de computador, serão precedidas de vistoria,
podendo o juiz ordenar a apreensão das cópias produzidas ou comercializadas com violação
de direito de autor, suas versões e derivações, em poder do infrator ou de quem as esteja
expondo, mantendo em depósito, reproduzindo ou comercializando”. (art. 13 da Lei n.º
9.609/98)
“Art. 842 (...)
§ 3o Tratando-se de direito autoral ou direito conexo do artista, intérprete ou executante,
produtores de fonogramas e organismos de radiodifusão, o juiz designará, para
acompanharem os oficiais de justiça, dois peritos aos quais incumbirá confirmar a
ocorrência da violação antes de ser efetivada a apreensão”. (§ 3º do art. 842 do CPC)

O mesmo procedimento deve ser adotado na Produção Antecipada de Provas,


instituto formal previsto no art. 846 do Código de Processo Civil Brasileiro, que dispõe que
“a produção antecipada da prova pode consistir em interrogatório da parte, inquirição de
testemunhas e exame pericial”.

Sem o laudo elaborado pelos peritos nomeados, a constatação da contrafação, bem


como a apreciação da demanda ficam comprometidas, haja vista o necessário conhecimento
na área de informática para a realização da prova e apuração dos fatos.

E é nesse aspecto que o método arbitral surge como uma extraordinária


possibilidade de submeter a quem realmente entenda do assunto, o poder de conferir uma
decisão justa, imparcial, fundada em conhecimentos específicos da área em discussão.
Evidentemente, o procedimento arbitral também comporta a realização de provas periciais

107
ou outras que se façam necessárias á apuração e demonstração dos fatos (art. 22), como
complemento à formação da convicção arbitral.

4. A arbitralidade dos conflitos da Tecnologia da Informação.

A Tecnologia da Informação, pela sua própria natureza, envolve questões de caráter


técnico e quase sempre patrimoniais, em que os direitos em sua maioria são disponíveis. A
arbitralidade dos conflitos informáticos decorre justamente de questões que podem ser
resolvidas a partir de conhecimentos específicos não só da área de informática, bem como
do direito.

Isto porque a flexibilidade do procedimento arbitral permite um número coletivo de


árbitros de áreas distintas, porém conexas em relação àquela controvérsia específica.
Assim, além de um árbitro com conhecimentos informáticos, um profissional da área de
direito poderia integrar a equipe de árbitros a fim de auxiliar nos aspectos jurídicos
pertinentes. Cumpre ressaltar, que o número de árbitros deve ser sempre ímpar (art. 13,
§1º).

Desta forma, diversos são os aspectos abordados pelo Direito de Informática que
poderiam ser passíveis de submissão ao método da arbitragem, dentre eles a celebração dos
contratos de tecnologia, os praticados presencialmente ou online de qualquer espécie
(B2B65 , B2C66 , C2C67 ), as questões relativas ao nome de domínio e outras disputas
autorais, o comércio eletrônico, as prestações de serviços e outras relações patrimoniais
como o e-banking68 , e-marketing69 , e-learning70 , e-supply ou e-procurement71 , dentre
outras.

65
B2B – business-to-business
66
B2C – business-to-consumer
67
C2C – consumer- to-consumer
68
Realização de operações bancárias, meio eletrônico, em sua maioria disponibilizadas pelos sites de bancos.
69
Exposição de produtos ou serviços prestados por empresas na Internet, em sua maioria através dos banners.
70
Educação à distância, sobretudo com a promoção de cursos e matérias isoladas pela Internet.
71
Cadeia de suprimentos das empresas, atendendo a demanda de estoque por meio eletrônico, facilitando a
localização de produtos e reduzindo os custos operacionais, inclusive com a realização de leilões.

108
No caso do e-commerce, a arbitralidade é tão evidente, que o Projeto de Lei no
1.589/99 sobre Comércio Eletrônico, elaborado pela Ordem dos Advogados do Brasil,
Seccional de São Paulo, expressamente prevê a possibilidade de solução dos conflitos pelo
método arbitral, senão vejamos:

“Art. 51 - Para a solução de litígios de matérias objeto desta lei poderá ser empregado
sistema de arbitragem, obedecidos os parâmetros da Lei no 9.037, de 23 de setembro de
1996, dispensada a obrigação decretada no §2o de seu art. 4o , devendo, entretanto, efetivar-
se destacadamente a contratação eletrônica da cláusula compromissória”.

Assim sendo, da mesma forma em que a arbitragem se tornou um sucesso entre os


contratantes internacionais, sobretudo no comércio, poderia ser aplicada vastamente nos
negócios que envolvam questões da Tecnologia da Informação, como forma de driblar não
somente as barreiras impostas pelas distâncias geográficas e regulamentações distintas, mas
também pela falta de legislação que atenda em sua plenitude as necessidades e urgências do
setor. É importante repisar que a celeridade do procedimento arbitral vai de encontro à
pressa do mundo informatizado, em que as decisões e as transformações acontecem e
repercutem em tempo econômico.

5. O ICANN - The Internet Corporation for Assigned Names and Numbers , a WIPO -
World Intellectual Property Organization e o UDRP - Uniform Domain-Name
Dispute-Resolution Policy.

O método de solução arbitral na apreciação de questões do Direito de Informática já


vem sendo praticado com sucesso por instituições internacionais, principalmente em
relação às controvérsias da propriedade intelectual, mais especificamente em relação às
disputas pelos nomes de domínio72 ou cybersquatting73 .

72
O nome de domínio tem natureza jurídica de signo distintivo, com proteção prevista nos termos do art. 5º,
inciso XXIX da Constituição da República de 1988. Está previsto na Resolução n.º 01/98 do Comitê Gestor
Internet do Brasil , sendo o registro de competência da FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo, nos termos da Resolução n.º 02/98 do Comitê Gestor Internet do Brasil.

109
O ICANN - The Internet Corporation for Assigned Names and Numbers74 é uma
organização internacional privada, autorizada pelo Departamento de Comércio dos Estados
Unidos, para alterar o mercado de registro de domínios de um modelo concentrado para um
ambiente de livre concorrência, credenciando empresas privadas para se tornarem
responsáveis pelos registros de domínios.

Foi formado para assumir a responsabilidade por alocar o espaço de endereços IP


(internet protocol), atribuir parâmetros de protocolo, gerenciar o sistema de nomes de
domínio e desempenhar as funções de gerenciamento do sistema de servidores-raiz,
anteriormente realizadas pela IANA75 , bem como de outras entidades, segundo contratos
com o governo dos Estados Unidos.

Para o desenvolvimento das políticas de coordenação, o ICANN possui três


organizações de apoio, uma para cada sistema de identificadores na Internet: a
Organização de Apoio a Nomes de Domínio - para o Sistema de Nomes de Domínio
(DNS)76 ; a Organização de Apoio a Endereços (ASO)77 - para o sistema de Endereços IP e
a Organização de Apoio ao Protocolo (PSO)78 - para a atribuição de números de portas e
parâmetros de protocolo.

Dito isso, o importante é mencionar que o ICANN possui um método próprio para a
resolução de disputas de nomes de domínios de primeiro nível (gTLD)79 que é conhecido
como UDRP - Uniform Domain-Name Dispute-Resolution Policy. Os titulares de domínios
.com, .net e .org, por exemplo, estão sujeitos a esse procedimento por força de disposição
contratual, existente no momento do registro.

73
De acordo com uma legislação federal norte-americana, a Anti-Cybersquatting Consumer Protect Act, o
cybersquatting é o "registro, tráfego, ou uso de um nome de domínio com má-fé e intenção de obter lucro a
partir da boa-fé de terceiro detentor de marca registrada" (tradução de Rodney de Castro Peixoto).
74
http://www.icann.org
75
Internet Asigned Number Authority (http://www.iana.org)
76
Generic Names Supporting Organization (http://www.dnso.icann.org)
77
The Address Supporting Organization (http://www.aso.icann.org)
78
Protocol Supporting Organization (http://www.pso.icann.org)
79
General Top Level Domain Name (gTLD) (.com, .org e. net, por exemplo)

110
Trata-se o UDRP de um Procedimento Administrativo Compulsório (Mandatory
Administrative Proceeding) que pode ser interposto quando: (i) o domínio é idêntico ou
suscetível de gerar confusão com marca de produto ou de serviço sobre a qual o reclamante
tenha direitos; (ii) o proprietário do domínio não detém qualquer direito ou interesse
legítimo sobre o domínio; e (iii) o domínio registrado está sendo utilizado de má fé. No
procedimento administrativo, o reclamante deve provar que cada um destes três elementos
estão presentes.

Aparentemente, o UDRP é um procedimento que se assemelha à arbitragem,


todavia é de caráter obrigatório. Por mais contra sensu que isso possa parecer, em verdade,
trata-se de uma “arbitragem forçada” e pode ser praticada pelo ICANN e pelos providers,
instituições afiliadas para a solução de disputas. São elas a:
Asian Domain Name Dispute Resolution Centre - ADNDRC 80 , aprovada em 28 de
fevereiro de 2002 e com dois escritórios, em Honk Kong e em Beijing, na China. A
ADNDRC é um empreendimento em conjunto entre a China International Economic and
Trade Arbitration Commission - CIETAC 81 e o Hong Kong International Arbitration Centre
- HKIAC 82 .
CPR Institute for Dispute Resolution - CPR83 , aprovada em 22 de maio de 2000. A CPR ou
Center for Public Resources foi fundada em 1979 e é composta por integrantes, sobretudo
dos Estados Unidos e da Europa.
The National Arbitration Forum - NAF 84 , aprovada em 23 de dezembro de 1999. A NAF
atua desde 1986 nos Estados Unidos.
World Intellectual Property Organization - WIPO85 , aprovada em 01 de dezembro de 1999.

A WIPO foi criada por Convenção assinada em Estocolmo no dia 14 de julho de


1967 e posteriormente emendada no dia 28 de setembro de 1979. Tem 179 (cento e setenta
e nove) países como membros, inclusive o Brasil, e será tratada com mais detalhes a seguir.

80
http://www.adndrc.org/adndrc/index.html
81
http://www.cietac.org.cn
82
http://www.hkiac.org
83
http://www.cpradr.org
84
http://www.arbforum.com/domains
85
http://www.wipo.int

111
A WIPO – World Intellectual Property Organization, conhecida em nosso país
como OMPI – Organização Mundial da Propriedade Intelectual, é uma organização
intergovernamental, com sede em Genebra, na Suíça e é responsável pela solução de
diversas controvérsias através de seu Arbitration and Mediation Center86 .

O Centro de Arbitragem e Mediação da OMPI foi fundado em 1994 e oferece seus


serviços para resolver disputas de comércio internacional entre partes privadas envolvendo
a propriedade intelectual. Destaca-se pelas decisões sobre os nomes de domínio 87 . O Centro
de Arbitragem e Mediação da OMPI é a principal instituição de resolução de disputas
relacionadas aos registros abusivos e uso de nomes de domínio, proporcionando este
serviço tanto para os domínios gTDL, como para os domínios com caracteres
suplementares identificadores de países ou ccTDL88 . Os proprietários de marca podem
promover as demandas usando os documentos de modelo que estão disponíveis no site da
WIPO.

O procedimento inteiro é conduzido online, resultando em decisões exeqüíveis


dentro de dois meses. Assim, as disputas são resolvidas em cerca de 60 (sessenta) dias. O
custo pode variar se o reclamante pede um árbitro ou se prefere um colegiado de três
árbitros, sem contar, evidentemente, os honorários dos advogados normalmente
contratados.

O Centro de Arbitragem e Mediação da OMPI tem um quadro de mais de uma


centena de árbitros espalhados em diversos países, inclusive no Brasil, todos com
experiência em propriedade intelectual, arbitragem e mediação. Na OMPI é possível a
inclusão de países para a solução de disputas acerca do ccTLD. O nosso país não é filiado à
OMPI para a resolução de disputas de domínios .br, de modo que as decisões aqui têm sido
proferidas pelo Judiciário.

86
http://arbiter.wipo.int/center
87
Domain Name Dispute Resolution Service (http://arbiter.wipo.int/domains). Em 2002, segundo informações
da própria WIPO, o Centro de Arbitragem e Mediação recebeu 1.494 casos sob o método UDRP e
procedimentos semelhantes, envolvendo partes de 89 países. Além do mais, 13.600 casos de nome de domínio
foram decididos sob procedimentos especiais.

112
Apenas em caráter complementar, cumpre mencionar ainda o Infrastructure
Domain, representado pelo domínio .arpa (Address and Routing Parameter Area),
designado em uso exclusivo para propósitos de infraestrutura da Internet. É administrado
pela IANA em cooperação com a comunidade técnica da Internet, sob a direção da Internet
Architecture Board89 .

Para a realização do procedimento administrativo perante a OMPI, obviamente são


necessários os mesmos 03 (três) requisitos estabelecidos pelo ICANN, já mencionados,
lembrando que todos devem ser necessariamente demonstrados para que o reclamante tenha
êxito na disputa.

Com efeito, quando a reclamação é recebida, o órgão de registro é notificado para


que informe os dados do proprietário do domínio, bem como para que não haja alteração
dos dados cadastrais ou transferência. Posteriormente, o proprietário do domínio é
notificado para apresentação de defesa no prazo de 20 (vinte) dias.

Feito isso, a OMPI escolhe um ou mais julgadores a fim de apreciarem a


questão.Após a análise, devem então apresentar a sua decisão por escrito. O órgão
responsável pelo registro é comunicado do teor em um prazo de 10 (dez) dias úteis. Após, o
órgão de registro informa a OMPI, as partes litigantes e o ICANN da data em que será
executada a decisão proferida pelos árbitros, repetindo o procedimento depois de concluída
a execução.

O proprietário do domínio, inconformado com a decisão prolatada, poderá manejar


ação de natureza judicial a fim de modificar o resultado do UDRP, suspendendo os efeitos
até a conclusão da ação judicial. As regras do UDRP autorizam expressamente que as
partes ingressem em Juízo antes, durante ou após o curso do procedimento administrativo.

88
Country Code Top Level Domain. Caracteres integrantes dos nomes de domínio que indicam o país como o
.br (Brasil), .ar (Argentina) e .pt (Portugal), por exemplo.
89
http://www.iab.org

113
Os julgadores podem decidir de 03 (três) formas: pela transferência do domínio para
o titular da marca, pelo cancelamento do nome de domínio ou ainda pela manutenção do
nome de domínio. Entretanto, não podem condenar ao pagamento de indenizações.

O processo administrativo compulsório e uniforme para a solução das controvérsias


de nomes de domínio ou UDRP, implementado pelo ICANN e adotado pela OMPI e
demais afiliadas, gera sérias dúvidas em relação à sua natureza como um procedimento
arbitral.

Segundo o advogado RAFAEL FEDERICI, “tendo em vista o entendimento da


doutrina no sentido de que as decisões da ICANN e afiliadas não têm natureza arbitral, vale
ressaltar que a possibilidade de ingressar na via judicial também é possível para resolver
conflitos decorrentes dos nomes de domínio sob a competência da ICANN.90 ”

Isto porque o UDRP não apresenta alguns elementos essenciais, típicos da


arbitragem. Diante disso, destacam-se algumas características do procedimento
administrativo que diferem do arbitral, tais como:

ser obrigatório;
não ser revestido de confidencialidade (sigilo);
não por fim à demanda, podendo ser contestado em juízo e
não haver as duas partes envolvidas como integrantes da convenção arbitral, somente uma.

6. Os métodos Online Dispute Resolution (ODR). Características e fundamentos.

Os métodos não adversariais de solução de conflitos são instrumentos já


consolidados em todo o mundo e uma forte tendência evolutiva em nosso ordenamento
jurídico. Assim como em tudo, os métodos do sistema ADR também vêm sendo
influenciados pelos avanços tecnológicos, principalmente pela Internet

90
FREDERCI, Rafael. A má-fé no registro de domínios da Internet. Há como reverter essa situação ou os
piratas de domínio venceram? Disponível em <http://www.vieiraceneviva.com.br/tribuna/artigos/mafe.html>.
Acesso em 09 de setembro de 2003.

114
Diante disso, já é possível a realização de soluções de controvérsias por mediação e
arbitragem, em tempo real (online), representando isso uma verdadeira revolução chamada
de E-resolution ou Online Dispute Resolution (ODR), como é mais conhecida.

Alguns países já prevêem em suas legislações a resolução de conflitos originados de


transações de comércio eletrônico. Algumas normas podem ser encontradas, por exemplo,
no Código de Processo Civil Alemão91 e na legislação italiana92 . Além do mais, o Código
de Processo Civil Espanhol93 permite a aplicação de meios eletrônicos ao procedimento
civil.

A Diretiva 2000/31/EC em comércio eletrônico, por sua vez, expressamente


encoraja a criação de mecanismos de soluções extrajudiciais nos países integrantes da
União Européia. A Comissão da Comunidade Européia, realizada em Bruxelas no dia
19/04/2002, através de Diretiva aos Estados Membros, estabeleceu prioridades para
políticas de resolução no contexto da sociedade de informação, reconhecendo o papel dos
novos procedimentos de resolução online, conforme se extrai do Green Book on
Alternative Dispute Resolution in Civil and Commercial Law, senão vejamos:

“40. ADRs relacionados às disputas de consumo foram o foco de discussão no campo do


comércio eletrônico, em particular no e-Europe 2002 Action Plan. Isso engloba tanto os
“tradicionais” métodos alternativos quanto o “ODR” ou “Online Dispute Resolution”, que,
além disso, também pode ser utilizado para resolver disputas que não são vinculadas ao
comércio eletrônico.”

Promovendo uma análise das posições adotadas pelos países, a tendência ideológica
que vem sendo estudada na Europa é para impor aos sites que se associem a órgãos de
resolução online, sob pena de submissão ao foro (privilegiado) do consumidor, no caso de

91
O artigo 1031 (V) do Código de Processo Civil Alemão permite a realização de cláusulas arbitrais por meio
eletrônico.
92
O Código de Processo Civil Italiano em art. 837 prevê a possibilidade da arbitragem por meio eletrônico.
93
Artigo 162 sec. 1 e art. 135 sec. 5; art. 152 sec. 2 subsec. 2a. da LEC.

115
uma ação judicial. Todavia, a submissão do litígio ao sistema de solução eletrônico não é
obrigatório para o consumidor que poderá optar pela interpelação judicial.

O nosso Código de Defesa do Consumidor estabelece privilégios ao consumidor


brasileiro, inclusive com preferência em relação ao seu domicílio, na interpretação conjunta
dos artigos 6º, VII e VIII, 47, 51, IV e expressa do art. 101, I. De outro giro, a proteção
consumerista em aspectos tecnológicos merece temperos do art. 4º, III, que expressamente
prevê a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e a
compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento
econômico e tecnológico.

Insta ressaltar, que existem formas variadas de realização de métodos ODR como
videoconferências94 , chats, julgamentos online, bem como pela troca de informações pelos
sites responsáveis pelos procedimentos. Atualmente, destacam-se quatro tipos de sistemas
de ODR, a saber:
Sistema automatizado online de reivindicações financeiras, com a utilização de perícia para
a solução;
Arbitragem online. Existem duas modalidades, quais sejam, a binding e a non-binding. A
arbitragem non-binding implica resultados e decisões que não são de pronto exeqüíveis,
como no procedimento UDRP do ICANN. Sendo assim, os resultados podem ser
contestados em juízo. Aparentemente, pode parecer estranho um sistema não obrigatório,
de eficácia duvidosa. Entretanto, esta espécie de arbitragem pode se fazer eficaz pela
utilização de mecanismos de controle técnico como no registro dos domínios, o depósito
prévio do dinheiro em disputa, escrow accounts e acordos com empresas de cartão de
crédito, seguradoras e financeiras. Já a forma binding é plenamente exeqüível e não pode
ser revista em procedimento judicial.
Serviços online de Ombudsman95 para reclamações de consumidores e

94
A videoconferência já foi utilizada em caráter experimental no processo penal brasileiro, nos
interrogatórios, em um procedimento já intitulado de “teleinterrogatório” e que trouxe muita discussão e
polêmica em relação à sua credibilidade e constitucionalidade.
95
Exemplos: Euro-Ombudsman (http://www.euro-ombudsman.eu.int) e
(http://www.ombudsman.at/index_e.html).

116
Mediação online. Existem duas formas. A automatizada e a assistida. Na primeira as partes
submetem a um computador uma proposta de ajuste em valor monetário. O computador
compara-os e soluciona o caso pelo cálculo aritmético proporcional das duas propostas. É
uma modalidade que sofre diversas críticas. Já a mediação assistida é promovida com o
auxílio de um terceiro com conhecimentos técnicos e/ou legais.

O sistema ODR é geralmente aplicável em disputas originadas de atividades


realizadas na própria Internet (disputas online ou e-disputes). Alguns métodos de ODR,
entretanto, são também aplicáveis aos conflitos tradicionais (conflitos offline).

O termo ODR ou resolução eletrônica de disputa, entretanto, não se refere ao tipo de


conflito, mas ao meio pelo qual o procedimento é executado. Além do mais, em alguns
casos, nem todas as formas de resolução de disputa e nem todas etapas dos procedimentos
são executados inteiramente online.

A solução para conflitos envolvendo nomes de domínio através do já tratado UDRP


é um exemplo de e-resolution, mas de longe não é o único. Diversas são as instituições
(ODR providers) que se propõem a promoverem soluções dos mais variados conflitos
patrimoniais através da World Wide Web. Obviamente, como em qualquer mercado e
principalmente na grande rede mundial de computadores, existem instituições mais sérias e
outras nem tanto que prometem solucionar os litígios.

Dentre elas, podemos destacar algumas, apenas a título de amostragem, como a


Online Resolution96 ; Virtual MagistrateSM 97
; Online Ombuds Office98 ; ICouthouse99 ;
Internet Neutral - Online Mediation Specialists100 ; Arbitraje y Mediación (ARyME)101 ;
Better Business Bureau Online102 ; Camera Arbitrale di Milano103 ; Résolution électronique

96
http://www.onlineresolution.com
97
http://www.vmag.org
98
http://www.ombuds.org/center/ombuds.html
99
http://www.i-courthouse.com
100
http://www.internetneutral.com
101
http://www.aryme.com
102
http://www.bbbonline.org
103
http://www.camera-arbitrale.com

117
des disputes commerciales104 ; E-Arbitration-T105 ; SquareTrade106 e a Smart Settle Online
Negotiation System107 . Na América Latina, destaque apenas para o Cibertribunal
Peruano 108 , e na Ásia para o Cyberarbitration.com109 da Índia e o e@dr110 de Singapura.

A Online Resolution apresenta algumas possibilidades interessantes como a


evaluation, uma espécie de avaliação especializada, bem como as tradicionais negociação,
arbitragem e mediação. O procedimento é voluntário, confidencial e as partes podem a
qualquer tempo, desistir, sem necessitar, contudo, expor qualquer razão para tanto. É
dividido em cinco etapas:

1ª- O querelante preenche um formulário confidencial informando a controvérsia, o que é


visualizado apenas pela parte declarante e posteriormente pelo árbitro responsável;
2ª - A instituição entra em contato com a outra parte, questionando seu interesse pela
solução online da disputa, pelo método escolhido pelo querelante (avaliação especializada,
negociação, mediação ou arbitragem). Se há a concordância, o querelado também preenche
o formulário confidencial;
3ª - Após a adesão das partes, um terceiro neutro é designado e entra em contato com cada
um dos interessados;
4ª - Se a decisão ou proposta de acordo são aceitas pelas partes, um termo é elaborado com
o teor do que foi resolvido. Como parte integrante deste termo, as partes determinam como
a decisão será legalmente exeqüível;
5ª - Depois que o processo é concluído, as partes são convidadas a preencher um formulário
sobre o seu nível individual de satisfação, bem como promovem uma avaliação do terceiro
(colaborador, mediador ou árbitro).

104
http://www.fundp.ac.be
105
http://www.e-arbitration-t.com
106
http://www.squaretrade.com
107
http://www.smartsettle.com
108
http://www.cibertribunalperuano.org
109
http://www.cyberarbitration.com
110
http://www.e-adr.org.sg

118
Já a Virtual MagistrateSM é um sistema ODR desenvolvido pela Chicago-Kent
College of Law111 , em conjunto com o Illinois Institute of Technology112 , além da AAA –
American Arbitration Association113 de Nova York.

O sistema eletrônico de arbitragem da Virtual MagistrateSM se propõe a receber e


resolver reclamações dentro de 72 (setenta e duas) horas ou 03 (três) dias úteis da aceitação.
O programa de arbitragem aceita como questões as disputas online sobre propriedade e
conflitos contratuais. Os exemplos incluem queixas sobre mensagens indesejáveis (spam),
infração a direitos autorais, direito marcário, apropriação ilícita de segredos comerciais,
difamação, fraude, práticas enganosas de negócio, remoção de sites, dentre outras
controvérsias por atividades online.

O procedimento inicia-se, obviamente, com a apresentação da reclamação à Virtual


Magistrate que entra em contato com as partes a fim de verificar a concordância de ambas
pela solução do conflito mediante o procedimento arbitral. Com a aceitação, a instituição
nomeia um árbitro. O grupo original de árbitros são selecionados em conjunto pela AAA –
American Arbitration Association e por um subcomitê do Cyberspace Law Institute
(CLI)114 e a solução da disputa é promovida em um prazo de 72 (setenta e duas) horas.

Outro projeto que merece destaque é o Ombuds Online Office, do Center for
Information Technology and Dispute Resolution da Universidade de Massachusetts que foi
estabelecido em junho de 1996 e promove diversos estudos e debates sobre o ODR, sempre
com profundidade.

Existem vários outros projetos em andamento disseminando a cultura do e-


resolution pelo mundo, como o International Competition for Online Dispute Resolution
(ICODR)115 que é uma competição entre escolas de Direito de várias partes do mundo

111
http://www.kentlaw.edu
112
http://www.iit.edu
113
http://www.adr.org
114
http://www.cli.org
115
O ICODR 2003 foi apoiado tecnologicamente pelo West Group e pela SquareTrade. Os casos foram
viabilizados pelo Harvard Program on Negotiation (http://www.ombuds.org/cyberweek2003/ICODR2.html).

119
envolvendo estudantes em aplicações de ODR, bem como o E-Arbitration-T116 , projeto de
1997 criado para implementar um sistema de resolução de disputas dentro da Global Trade
Point Network of United Nations Transaction Centre (UNTPDC - UNCTAD).

Como se percebe, no âmbito internacional, muitas iniciativas relacionadas ao ODR


vêm sendo discutidas há alguns anos. A maioria das questões lida com a proteção do
consumidor em comércio eletrônico, como o Guidelines for Consumer Protection in the
Context of Electronic Commerce117 , adotado pelo Organisation for Electronic Development
and Co-operation (OECD)118 ; o 2000 Miami Recommendations for ADR119 e o 2001
Tokyo Recommendationos for ADR120 , adotados pelo Global Business Dialogue on
electronic Commerce121 , bem como o Stockholm European Council122 .

De fato, as relações de consumo praticadas pela Internet tendem a passar por


transformações significativas. Segundo CARLOS MOTTA, em breve artigo que foi
publicado na Gazeta Mercantil (09/08/2002 – página 02), “já existe um modelo de
arbitragem que pode ser conduzida on-line e com baixo custo para as partes envolvidas. Na
maioria dos casos, a empresa que vendeu o produto ou o serviço coloca em seu site um link
para o endereço de um centro de arbitragem especializado. Evidente que este serviço não
significa que a empresa coordena ou detém algum controle sobre este centro de arbitragem,
apenas indica umas das fontes de solução de conflitos, que são terceirizadas e
independentes e apenas são indicadas para facilitar o processo de escolha do centro arbitral
pelo consumidor”.123

116
http://www.e-arbitration-t.com e http://sunsite.icm.edu.pl/untpdc/welcome1.html
117
http://www.oecd.org/dsti/sti/it/consumer/prod/CPGguidelines.Htm
118
http://www.oecd.org
119
http://consumerconfidence.gbde.org/adrmiami2000.pdf.
120
http://consumerconfidence.gbde.org/adrtokyo2001.pdf .
121
http://www.gbde.org
122
http://europa.eu.int/comm/stockholm_council/factsheets/fiche39a_en.htm.
123
MOTTA, Carlos. A Arbitragem para solução de conflitos no E-Commerce. Disponível em
<http://www.cbeji.com.br/br/novidades/artigos/index.asp>. Acesso em 03 de setembro de 2003.

120
Outro projeto bem sucedido que merece atenção é o da SquareTrade124 . Segundo
informações da própria instituição, já são resolvidas disputas em 120 (cento e vinte) países,
num total de pouco mais de 200.000 (duzentas mil) resolvidas desde 1999. Na SquareTrade
há uma primeira fase com tentativa de negociação e uma segunda fase de mediação. O seu
sucesso está intimamente vinculado à sua parceria com o eBay125 , um grande mercado
eletrônico de compra e venda de bens. A promoção de demandas em razão do eBay é
gratuita. Primeiramente, as partes são conduzidas a um ambiente seguro da SquareTrade a
fim de tentarem uma negociação. O envolvimento de um mediador profissional é opcional e
custa U$ 15 (quinze dólares), sendo o resto do custo do trabalho deste profissional
subsidiado pela própria eBay. O processo leva geralmente 10 (dez) dias para ser concluído.

7. Aspectos jurídicos do ODR. Aplicabilidade no Brasil.

Promovendo uma análise reflexiva sobre os aspectos concernentes ao sistema ODR,


algumas vantagens devem ser ressaltadas. A primeira é o acesso. Contrário aos mecanismos
tradicionais de resolução de disputa, a submissão de um caso a um dos métodos ODR não
exige muitos requisitos. O procedimento inteiro ou pelo menos suas partes essenciais são
promovidas por meio eletrônico.

Outrossim, a disponibilidade de comunicação rápida pela Internet e a eliminação de


audiências presenciais, contribuem para que os procedimentos de ODR possam ser
concluídos dentro de um período curto. Como conseqüência, o custo do processo é
significativamente reduzido e a eficácia concomitantemente aumentada.

Não há uma legislação específica que discipline os procedimentos de ODR. As


instituições que adotam o e-resolution têm regras próprias. Isto permite as partes em disputa
tomarem ciência do modo em que o procedimento é executado, bem como acompanharem
todo o trâmite de sua disputa pelo site da instituição prestadora do serviço.

124
O World Economic Forum elegeu a SquareTrade entre os “Top 100 Technology Pioneers of 2001 and
2002”, além do “2002 Outstanding Practical Achievement Award", reconhecido pela CPR Institute for
Dispute Resolution.

121
Por outro lado, algumas dúvidas podem inibir a adoção dessa alternativa. Dois
aspectos essenciais para o sucesso dos métodos não adversariais para a solução de conflitos,
seja em disputas surgidas de atividades tradicionais ou da Internet, são a credibilidade e a
imparcialidade do procedimento. Neste diapasão, instituições tradicionais já consolidadas
pela aplicação dos métodos ADR tendem a se destacar também no sistema eletrônico ODR.

Em uma atividade B2B (business-to-business), as formas alternativas para solução


de disputas ou ADRs geralmente são promovidas por partes que já se conheciam antes do
conflito e que mantêm uma costumeira relação negocial. Em caso de disputa, a meta
comum das partes é alcançar uma solução aceitável a ambos para poupar suas relações e a
manutenção dos negócios.

Já em uma relação B2C (business-to-consumer), quase sempre as partes não se


conhecem e não mantêm um relacionamento comercial contínuo. Muitas vezes estão
envolvidos em apenas uma única operação de comércio eletrônico e usualmente não
estabelecem uma forma prévia de solução antes de surgir o desentendimento. Sendo assim,
é muito mais difícil para estas partes se submeterem às possibilidades do ODR em que o
contato é totalmente indireto.

Outros pontos que devem ser privilegiados são a segurança dos dados, a
confidencialidade e a privacidade das informações, elementos essenciais para a
legitimidade e eficácia do ODR. As partes devem estar cientes dos mecanismos de proteção
de privacidade, assim como da política de uso e armazenagem dos dados pelo prestador de
ODR. Ao mesmo tempo, o direito à privacidade dos negócios e do consumidor deve ser
respeitado.

Um aspecto polêmico que envolve as instituições prestadoras de ODR é a


autorização para a realização das atividades de solução das disputas. Há duas correntes que
tratam da necessidade de autorização formal e aprovação para funcionamento de
prestadoras de ODR por autoridades governamentais. Aqueles que defendem a autorização,

125
http://www.ebay.com e http://pages.ebay.com/services/buyandsell/disputeres.html

122
argumentam que os prestadores de ODR devem ser regulados para assegurar padrões
aceitáveis de qualidade e confiabilidade. Já os que são contra, entendem que processos
formais de autorização impedirão o desenvolvimento rápido e autônomo dos processos
online de resolução de disputas.

Em verdade, a necessidade para o desenvolvimento de normas regulamentares surge


principalmente em razão das partes que não consideram ter recebido um nível aceitável de
serviço e que recorrem posteriormente ao Judiciário, alegando aspectos irregulares no
procedimento. Além do mais, a ploriferação indiscriminada de instituições pode não ser
salutar, gerando uma privatização desordenada da função estatal de julgar, bem como a
desmoralização da atividade, em razão do descontrole sobre a conduta dos provedores.

Por outro lado, resta claro que o ODR está em plena fase de amadurecimento,
apesar de sua rápida multiplicação. Muitos fornecedores tidos como pioneiros deste
sistema, não funcionam mais e já venderam seus nomes de domínio. Conforme foi
noticiado em abril de 2003, pela Ontario Bar Association126 , do Canadá, “em março de
2003, havia 57 fornecedores online de ADR para disputas B2C, sendo 43 nos EUA, 20 na
Europa, 4 no Canadá, 4 na Austrália e 4 no resto do mundo. Aproximadamente 19 outros
fornecedores de ODR, incluindo o eResolution, um pioneiro canadense, cessaram suas
atividades127 ."

É sempre bom lembrar que as partes litigantes num processo alternativo de


resolução de disputa são livres para escolher as regras aplicáveis a cada etapa do
procedimento. Todavia, os princípios consagrados pelo ordenamento jurídico não podem
ser violados. A Lei de Arbitragem assim prevê em seu art. 2º, § 1º, devendo tal
determinação ser estendida a todos os procedimentos, realizados por qualquer meio.

O respeito aos preceitos constitucionais e legais são essenciais para a legitimidade


de todos os métodos alternativos de resolução de disputa. Há certas diferenças estruturais

126
http://www.oba.org
127
http://www.intlawyers.com/E-Commerce/odr_providers.htm

123
entre os procedimentos em ADR e em ODR, mas a maioria dos aspectos procedimentais
offline são também aplicáveis ao sistema eletrônico128 .

A livre escolha da lei aplicável em procedimentos de ADR/ODR é baseado no


princípio da liberdade de contrato. Este princípio encontra aplicação em quase todas as
disputas de negócios, modalidade B2B, onde a recomendação, nestes casos, é de se evitar
legislações nacionais muito detalhadas129 . Em conflitos de consumidor, entretanto, as
legislações especiais de proteção do consumidor devem ser respeitadas e aplicadas no caso
de lacunas. A escolha da lei aplicável perde sentido, contudo, se os regulamentos
respectivos de ADR/ODR já apresentam elementos sólidos para resolução das disputas,
como no já tratado UDRP do ICANN.

Agora, o ponto mais delicado do procedimento ODR é sem dúvida a exigibilidade


das decisões, ou seja, a força executiva das determinações e das negociações resultantes da
aplicação do método. Isto é devido ao fato de que os tratados internacionais e convenções
não são aplicáveis à execução dos resultados do ODR.

Entre os métodos de ODR só o UDRP do ICANN proporciona, pelos seus próprios


meios, uma certa exigibilidade de suas decisões. Repete-se que o procedimento é
obrigatório. Dado o caráter e o assunto em disputa (nomes de domínio), as possíveis
soluções do conflito podem ser impostas com mais facilidade pelas instituições de registro.
Entretanto, a eficácia deste procedimento compulsório ainda pode ser contestado, haja a
vista a decisão final do ICANN e afiliadas não impedir as partes de submeter o caso ao
Poder Judiciário.

Para tornar exeqüível o resultado de um ODR, originado de um ambiente de


comércio eletrônico, na modalidade B2B, é preciso que a imposição esteja de acordo com
as práticas negociais estabelecidas pela comunidade daquele setor específico.

128
Orientação expressa da União Européia, artigo III da Commission Recommendation 2001/310/EC (Doc. C
2001/1016) (http://europa.eu.int/comm/consumers/policy/developments/acce_just/acce_just12_en.pdf)
129
Recomendações da Global Action Plan Prepared by Business with Recommendations to Govenrments p.
32, (http://www.giic.org/focus/ecommerce/agbecplan.pdf), bem como da ICC Policy Statement em seu
“Jusrisdiction and Aplicable Law in Electronic Commerce”, p. 1.

124
Em disputas que envolvam o consumidor, a prestação de ODR não deve privá-lo do
direito de procurar previamente o Judiciário. Assim, os procedimentos ODR são
considerados non-binding nas relações B2C, não sendo o fornecedor do bem ou prestador
do serviço tratado da mesma forma privilegiada.

No Brasil, ao contrário dos Estados Unidos e da Europa, as formas não adversariais


de solução de conflitos ainda estão em processo de consolidação, inclusive em relação às
disputas offline. A expectativa, contudo, é que as instituições nacionais promovam também
os métodos por meio eletrônico, principalmente em relação às disputas que tratem do e-
commerce.

Este caminho vai de encontro à nova ordem mundial e o Brasil deve estar preparado
para se inserir nesta ótica, sob pena de exclusão. Evidentemente, qualquer importação de
idéias deve ser precedida da promoção de debates e discussões a fim de adaptar as novas
situações e possibilidades à realidade nacional.

8. Conclusão.

O ciberespaço é um ambiente fascinante formado por atividades e interações sociais


diversificadas. Portanto, os conflitos inevitavelmente surgirão. Todavia, estas disputas
devem ser resolvidas de uma maneira que corresponda aos anseios desta sociedade
informatizada, ou seja, devem acontecer de forma rápida e com um custo reduzido.

Em relação à regulamentação do ciberespaço, não podemos nos esquecer da


utilização dos meios de controle tecnológico e a possibilidade de uma normatização
abrangente, porém flexível. A elaboração de leis rígidas, ao meu ver, não surtirão os efeitos
desejados.

O renomado Professor LAWRENCE LESSIG, da Universidade de Stanford, nos


ensina que nem todos os conflitos no ciberespaço poderão ser solucionados com a aplicação

125
da legislação130 . Para ele, o mercado e as normas sociais também estabelecem formas de
regulamentação. A isto se adicione a arquitetura dos códigos (code), onde os mecanismos
de programação e a tecnologia também contribuem para a regulamentação no ciberespaço.

Para o Professor LESSIG, code is law131 .


O processo eletrônico, neste cenário, é um instrumento indispensável, mas que ainda
depende de transformações estruturais nos órgãos judicantes, na sociedade jurídica como
um todo, bem como na própria legislação pátria 132 . A Lei n.º 9.800, de 26 de maio de 1999
já permite o peticionamento eletrônico, mas desde que os originais sejam necessariamente
entregues em juízo, no prazo de 05 (cinco) dias. Segundo o especialista ALEXANDRE
ATHENIENSE, “infelizmente, a lei 9.800/99 ainda está no papel133 ”.

E é neste aspecto que as disputas não adversariais para a solução de controvérsias


reúnem qualidades significativas, haja vista o seu caráter informal e a flexibilidade das
normas. Assim, não há qualquer impedimento legal para a sua pronta utilização no Brasil,
por meio eletrônico, nos moldes do sistema ODR já praticado em várias partes do mundo,
ressalvados obviamente os fundamentos de nosso ordenamento.

O Professor ETHAN KATSH, da Universidade de Massachusetts, um dos maiores


134
estudiosos sobre o assunto, em sua palestra ministrada no “2nd Annual UNECE Forum
135
on Online Dispute Resolution (ODR) ” realizado nos dias 30 de junho e 01 de julho de
2003, no Palais des Nations, em Genebra, apontou para o fato de que há 10 (dez) anos atrás
não havia discussão sobre o ODR. Ele também ressaltou o crescimento constante da ADR
nos EUA nos últimos 25 (vinte e cinco) anos. De acordo com o professor, “o ODR/ADR

130
LESSIG, Lawrence. Code and Others Laws of Cyberspace. Basic Books, 2002.
131
http://code-is-law.org
132
Está em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei n.º 71/2002 que dispõe sobre a informatização do
processo judicial.
133
ATHENIENSE, Alexandre Rodrigues. Direito na Informática. Direito da Informática e Direito Processual.
Belo Horizonte: PUC Minas Virtual, 2003.
134
United Nations Economic Commission for Europe (http://www.unece.org)
135
O 2nd Annual UNECE Forum on Online Dispute Resolution (ODR) contou com a participação da WIPO,
ITU, UNCTAD, ICC e 50 (cinqüenta) juristas internacionais e especialistas
(http://www.ombuds.org/center/adr2003-9-Hornle.doc) e
(http://www.unece.org/press/pr2003/03ireedd_p11e.htm).

126
não é a alternativa, mas uma forma preliminar de resolução de disputa. O ODR/ADR
ajudará a satisfazer uma necessidade de crescimento para resolução de disputas no mundo”.

Já para ERNEST THIESSEN, da prestadora Smartsettle, em palestra proferida no


mesmo encontro anual, o “ODR ainda é basicamente online, mas que isto mudará - o uso de
celulares e wireless networking, em PCs portáteis estão chegando. Isto capacitará as partes
negociar qualquer coisa, em qualquer lugar, a qualquer hora. A ODR móvel interagirá com
a inteligência artificial e será um instrumento bem poderoso para negociação e resolução de
disputas”.

No Brasil, contudo, não é preciso que esperemos uma consolidação preliminar


efetiva da cultura arbitral e demais métodos alternativos, realizados através de
procedimentos offline, para somente após as práticas serem adaptadas e estendidas ao meio
eletrônico no sistema ODR. A evolução de ambos os métodos, quais sejam, ADR e ODR,
pode ocorrer em conjunto, inclusive como uma forma complementar de aprimoramento,
atualização e interação imediata das duas modalidades.

Diante deste quadro, em que muito há o que ser explorado e estudado, a Era da
Informação se mostra a cada dia mais sólida e a expressão “virtual” perde mais sentido, na
medida em que as atividades, os negócios e os conflitos da Tecnologia da Informação se
materializam bem reais, concretos, apesar do meio eletrônico.

Assim, fica claro que os conflitos da Ciência da Informação não podem esperar e
suas inovações devem ser priorizadas, como aliadas do Direito, auxiliando na sua
modernização e eficácia, para que cumpra a sua função de pacificação. E é nesse sentido
que a utilização da tecnologia para solução dos conflitos da própria tecnologia se mostra
mais do que lógico, mostra-se uma tendência inevitável.

Bibliografia.
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Acesso em 12 de setembro de 2003.

129
Pornografia na Internet

Marcelo De Luca Marzochi136

marcelomarzochi@yahoo.com.br

Resumo
Sexo é o assunto mais popular em qualquer tipo de mídia e com a Internet não seria
diferente. Mas a rede trouxe também facilidade para a circulação da pornografia. Mas o que
pornografia? É um meio de expressão que tem sua liberdade garantida como outro qualquer, desde
que não seja ou não se torne ilegal. A pedofilia é o fato mais preocupante. Não se pode reduzir a
pedofilia ao ato em si, nem tampouco se esquecer da dimensão penal do fato, por causa da violência
praticada. O pedófilo precisa de médico, não de cadeia. Entretanto, aquele que simplesmente troca
fotos de pornografia infantil pela Internet não deve ser tratado da mesma maneira daquele que abusa
e explora sexualmente a criança. O art. 241 da lei 8069/90 (Estatuto da criança e do Adolescente)
iguala duas condutas distintas. A conduta de fotografar é mais grave, pois pressupõe a exploração
sexual do menor, a realização efetiva do ato para produção do material, enquanto que publicar
consiste em disponibilizar algo já realizado. Nem sempre quem publica é o mesmo que fotografa.
Na maior parte das vezes, aquele que publica ou transaciona fotos utiliza material produzido por
terceiros.
PALAVRAS-CHAVE : PORNOGRAFIA. INTERNET . SEXO . ABUSO S EXUAL . PEDOFILIA. CRIME. ESTATUTO
DA CRIANÇA E ADOLESCENTE.

Abstract
Sex is the most popular subject in any kind of media, and with Internet it wouldn’t be
diferent. So, the Net become very easy the circulation of pornography. But, what is pornography?
It’s a free way of expression, since it doesn’t be or become ilegal. The pedophilia is the most
worrying fact. We can’t reduce pedophilia to the conduct itself, nor forget the penalty for that,
because the violence was practice. The pedophile needs a doctor, not the jail. The Act 8069/90, in
the article 241, considers equal the actions of to photograph and to publish. However, the first is
more dangerous than the second, because the sexual abuse happens in the production of the
pornographic material, when occurs the efective damage to the child, while who publish just use
what was already done by others. Who published isn’t necessarily the same who produced the
material, took the pictures.

136
Autor do livro “direito.br – Aspectos Jurídicos da Internet no Brasil” publicado pela Editora LTR e pós-graduando em
Direito Público pela Universidade de Taubaté, em São Paulo.

130
Keywords: Pornography. Internet. Sex. Sexual abuse. Pedophilia. Crime. Act 8069/90.
SUMÁRIO: 1) Sexo. 2) Pornografia. 3) Pornografia Infantil e Pedofilia. Conclusão

1) Sexo
Sexo é o assunto mais popular não só na Internet, mas em todo tipo de mídia. Em
novembro de 2000, uma decisão judicial proibiu a participação de menores de idade na
novela “Laços de Família” da Rede Globo de Televisão por causa das cenas de sexo e
violência (WERNECK, 2000) (COMIM, 2000).

Segundo Carlos Eduardo Novaes e César Lobo (NOVAES; LOBO, 1997), a


sociedade, como forma de controlar o desejo sexual, algo instintivo e biológico, foi
deslocando o sexo do plano natural para o cultural, submetendo-o às regras e governos.
Essa passagem para o plano cultural se deu com a proibição do incesto. A condenação do
sexo veio com a Igreja, que evoluiu da total proibição, por causa do pecado original de
Adão e Eva, à permissão desde que fosse heterossexual e orientado para reprodução.
Enquanto no Ocidente ocorre a repressão da Igreja, nas culturas orientais, como China e
Índia, o sexo é considerado o caminho para o paraíso.

Ainda segundo os autores, o sexo sai da clandestinidade no século XX, com Freud e
a psicanálise. Passamos da “moral vitoriana” para a liberdade sexual. Surge o movimento
feminista, a pílula e a consciência da independência sexual que a mulher passa a ter. Toda
essa revolução sexual encontra um grande obstáculo na década de oitenta com o surgimento
da AIDS.

Entretanto, o surgimento dessa nova e mortal doença não tornou o comportamento


sexual precavido e ajustado aos novos tempos. Estudos recentes mostram que no Brasil
aumentou o número de casos de doenças sexualmente transmissíveis, não apenas AIDS,
mas doenças cuja cura é conhecida a mais de cinqüenta anos, como sífilis e gonorréia.

2) Pornografia

A indústria da pornografia, também chamada de “entretenimento adulto”,


movimenta milhões em todo o mundo. Chega a ser uma indústria mais lucrativa que tráfico

131
de drogas e de armas. Não apenas com profissionais estabelecidos, mas também com
amadores, que se utilizam das facilidades proporcionadas pelas novas tecnologias.

Walter Maierovitch (MAIEROVITCH, 2002) mostra dados que impressionam. Nos


Estados Unidos, na classe média, trezentos mil menores de dezoito anos se prostituem para
satisfação do impulso consumista: comprar roupas de grife, carros, telefone celular, etc. O
preço médio de cada programa sai por oitenta dólares e o cliente acaba virando freguês fixo
ou um multiplicador que espalha aos amigos os detalhes, fornecendo o telefone para
contato. Muitas jovens prostitutas nos Estados Unidos chegam a ganhar de quinhentos a
seiscentos dólares por noite, sendo que as clandestinas ficam com vinte e cinco e as demais
com não mais que cem dólares, segundo dados da ECPAT (End Child Prostitution in Asia
Tourism, organização não-governamental criada em 1991 na Tailândia). A maior parte do
dinheiro fica com o crime organizado que garante o ponto, a freguesia e dá proteção.
Segundo o autor, a miséria, a fome e a falência do modelo econômico neoliberal
alavancaram esse mercado. Estima-se com a pedofilia, uma das vertentes de exploração
sexual, um faturamento de cinco bilhões de dólares por ano, sem contar o lucro com fotos,
Internet e revistas. Só o mercado de vídeo de pedofilia gera-se anualmente 280 milhões de
dólares. Na Internet estima-se a exibição de doze milhões de crianças entre dez e doze anos.
O autor explica que na Europa as estatísticas sobre menores vitimados são separadas em
três áreas, entre as quais pode haver interligação: tráfico (imigração clandestina), trabalho
escravo e desfrutamento sexual (prostituição adulta, infantil e pedofilia). Cita também
recente estudo da ECPAT que mostra um preocupante crescimento do tráfico de menores
do Leste Europeu, para exploração sexual.

Ana Luísa Vieira (VIEIRA, 2002) afirma que, segundo a ONU, algumas das razões
da exploração sexual no Brasil, que agora se expande para a Internet, são pobreza,
discriminação, crime organizado, comércio de drogas. O diferencial do meio eletrônico é a
possibilidade de vigilância e controle, principalmente pela memória dos acessos guardada
pelos provedores nos arquivos log, os quais permitem o rastreamento de um site.

Pornografia vem do grego pornographos, que significa escritos sobre prostitutas,


originalmente, referência à vida, costumes e hábitos das prostitutas e clientes. O Dicionário
Michaelis conceitua pornografia como arte ou literatura obscena, tratado acerca da

132
prostituição, coleção de pinturas ou gravuras obscenas, caráter obsceno de uma publicação,
devassidão. O Dicionário Aurélio traz como uma das definições figura, fotografia, filme,
espetáculo, obra literária ou de arte, relativos a, ou que tratam de coisas ou assuntos
obscenos ou licenciosos, capazes de motivar ou explorar o lado sexual do indivíduo137 .

De acordo com Eliane Moraes e Sandra Lapeiz (MORAES; LAPEIZ, 1985) a


pornografia existe desde a Antigüidade. Na Bíblia há várias passagens, referindo-se
principalmente à prostituição. Na Grécia o sexo era cultuado, principalmente na literatura
com temas como prostituição e incesto. Na pintura e escultura também se encontram
representações de cena eróticas, com destaque ao coito anal e símbolos fálicos. A
homossexualidade era comum entre os gregos. Dildos – pênis artificiais – eram produto de
exportação de Mileto. No Oriente temos o Kama Sutra, de Vatsayana, um estudo detalhado
o amor e o prazer sexual. No Império Romano começa o interesse pelas formas mórbidas
de prazer, como o sadismo e a flagelação. Esse interesse pelo castigo físico, que se estende
pela Idade Média, se deve à moral católica, como forma de reprimir o desejo sexual. Os
castigos antes aplicados nas costas e ombros foram transferidos para partes baixas do
corpo, como as nádegas, por exemplo, por medo que os danos se tornasse irreversíveis.
Acabou se transformando em mais uma forma de prazer.

Segundo as autoras, a popularização da pornografia se dá com o Marquês de Sade,


pela perversão, devassidão e libertinagem. O principal crime do Marquês foi o estupro de
uma mulher a quem açoitou com um ramo de árvore, fazendo cortes no corpo dela com um
canivete e colocando cera nas feridas. Há ainda Leopold Von Sacher-Masoch, o Barão
Sacher-Masoch, criador do masoquismo, destacado em seus livros por causa da atração
pela crueldade. No século XIX há uma disseminação do erotismo, com publicações
clandestinas, na moda e na fotografia, com o destaque dado ao corpo feminino. No século
XX, com o avanço tecnológico – fotografia e cinema no início, televisão a partir da década

137
Em inglês, pornografia é conceituada como descrever ou mostrar pessoas nuas ou atos sexuais com o
objetivo de causar excitação. No original: “ the describing or showing of naked people or sexual acts in order to
cause sexual excitement”. Oxford Advanced Learner’s Dictionary. Oxford University Press, 1995.
Em espanhol, pornografia é conceituada como obscenidade, narrações ou imagens de tipo erótico com
finalidade comercial e sem qualquer pretensão científica ou artística. No original: “Obscenidad. Lecturas,
narraciones o imagenes de tipo erótico com fin comercial y al margen de cualquier pretensión científica o artística”.
Diccionario básico de la lengua española. Sociedad Española de Libreria, 1996.

133
de 50 e Internet e meios digitais de comunicação na de 90 – ocorre uma explosão do
erotismo, principalmente a partir dos anos 60 com a revolução sexual.

Segundo as autoras:

(...) A pornografia é consumida. Mesmo sendo produzida


para consumo, não pode ser considerada um produto comum. (...)
Ao ser consumida ela aciona um mecanismo todo particular do ser
humano: a fantasia. Apesar de todo esforço das sociedades de
massa em direção à homogeneização da sexualidade, podemos
supor que cada indivíduo possa se relacionar de modo singular com
o material pornográfico. Essa relação consumidor/produto, ou
imaginação individual/pornografia, se inscreve no universo do
proibido, ou mais especificamente, essa relação vai passar pela
forma particular que cada pessoa tem de digerir as proibições, de
transgredir. (...) A proibição existe para ser violada. Esse é o ponto
de partida dessa reflexão. Por isso, o proibido pressupõe sempre a
sua contrapartida oposta e inseparável: a transgressão. (...) A
prática do proibido só é possível na forma de transgressão e é isso
que alimenta e impulsiona a nossa vida sexual. É isso que vai dar o
colorido singular que nós chamamos de desejo.

A mulher era considerada na Antigüidade como o símbolo do desejo sexual, mito


reforçado pelo cristianismo, com Eva seduzindo Adão e dando origem ao pecado original.
No século XVIII, com o surgimento da classe média nasce o mito da mulher como anjo
doméstico (BORGES, 2000). A percepção da mulher como objeto continua até os dias
atuais, difundida através da mídia a qual trata meninas como adultas pelo culto à beleza
física e à sedução, como um produto a ser consumido (MIGLIACCIO, 2001).

Sobre pornografia há uma decisão do Supremo Tribunal Federal:

BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Recurso em Mandado


de Segurança: RMS-18534, Segunda Turma, Relator: Ministro
Aliomar Baleeiro, 1/10/1968. Obscenidade e pornografia. O direito

134
constitucional de livre manifestação do pensamento não exclui a
punição penal, nem a repressão administrativa de material
impresso, fotografado, irradiado ou divulgado por qualquer meio,
para divulgação pornográfica ou obscena, nos termos e forma da
lei. À falta de conceito legal do que é pornográfico, obsceno ou
contrário aos bons costumes, a autoridade deverá guiar-se pela
consciência de homem médio de seu tempo, perscrutando os
propósitos dos autores do material suspeito, notadamente a
ausência, neles, de qualquer valor literário, artístico, educacional ou
científico que o redima de seus aspectos mais crus e chocantes. A
apreensão de periódicos obscenos cometida ao Juiz de Menores
pela Lei de Imprensa visa à proteção de crianças e adolescentes
contra o que é impróprio à sua formação moral e psicológica, o que
não importa em vedação absoluta do acesso de adultos que os
queiram ler. Nesse sentido, o Juiz poderá adotar medidas razoáveis
que impeçam a venda aos menores até o limite de idade que julgar
conveniente, desses materiais, ou a consulta dos mesmos por parte
deles.

Germaine Greer (GREER, 2000) diz o seguinte sobre pornografia:

A pornografia ilícita é a desbravadora. Onde ela vai, a mídia


legítima precisa ir atrás se não quiser deixar para os inescrupulosos
a parte do leão dos lucros, e finalmente, o negócio todo. Se os
filmes cults conseguem gerar, por uma bagatela, o tipo de interesse
da mídia que custa milhões aos filmes normais, estes vão copiá-los
– lenta, mas inevitavelmente. Por mais saliva que se gaste na
questão do que as crianças devem ou não assistir, o problema real é
o que a geração dos pais quer que seja mostrado. Enquanto houver
demanda, a indústria pornô estará ali para servi-la. Enquanto
houver cigarros, as crianças fumarão. Enquanto papai guardar
revistas de mulher pelada e vídeos pornôs na gaveta das meias, seus

135
rebentos vão vê-los. A idéia de que as crianças podem existir num
mundo e seus pais noutro é uma ilusão. Histórica e
etimologicamente, a pornografia é tão somente a publicidade da
prostituição. Ela é distinta, portanto, da obscenidade. Obscenidade
é a descrição do que não pode ser visto. Alguma pornografia, mas
de modo algum toda, é obscena: boa parte da obscenidade não é
minimamente pornográfica. (...) Boa parte da pornografia abastece
nichos de mercado e é absolutamente irrelevante para as pessoas
cuja sexualidade não foi desviada nessa direção. As preferências de
minorias sexuais são classificadas, em geral, como parafilias e
consideradas anormais; a sociedade permissiva tendia a aceitar as
parafilias como um aspecto essencial da atividade sexual humana.
“Aquilo que ligar você” era o que você estava autorizado a fazer
nos inocentes anos 60, antes de a tampa ser levantada e termos uma
visão da lata de vermes que é a sexualidade humana. O que os
reformadores sexuais dos anos 60 pensavam estar liberando era o
desejo das pessoas de agradarem umas às outras; o que eles não
estavam preparados para enfrentar foi a intensidade da necessidade
que muitas pessoas têm de machucar umas as outras e inclusive
ferir, para chegar mais perto de seu próprio orgasmo total. (...)
Numa sociedade sem liberdade, a maioria das atividades chamadas
consensuais representa a capitulação do que não tem poder às
exigências do poderoso. O poder vem em diversos disfarces, como
dinheiro, status, patriarcalismo e invulnerabilidade emocional. O
propósito da pornografia é despertar desejo na ausência deste,
despertar apetite onde não existe fome (...) Onde existe
necessidade, não é preciso estimular a demanda; onde não existe
qualquer necessidade, uma imagem sedutora terá de ser usada para
criar a demanda. As pessoas que não têm o menor desejo de comer
um pedaço de pão com manteiga porque não estão com fome,
podem ser estimuladas a desejar chocolate se o chocolate lhes for

136
apresentado como algo mais que comida, como êxtase, exultação e
orgasmo. O chocolate é uma guloseima que engorda,
comercializada como se fosse uma droga; quando os alimentos, de
tortas de maçã a queijos processados, são apresentados como
causadores de euforia, é a experiência da droga apresentada como
meio para o bem-estar. O alimento produzido comercialmente é
também falso, quase sempre não produzidos com as substâncias
mencionadas no rótulo, mas com químicos análogos e aditivos, e
incrementados com aditivos aromáticos e quantidades exageradas
de sal e adoçantes. Da mesma forma, o sexo rápido comercial é
falso, divorciado da paixão e da reprodução. A propaganda de
alimentos vende comida de fantasia e a de sexo, sexo de fantasia.
Do mesmo jeito que a publicidade de fast-food e doces eliminou o
apetite de tal forma que ninguém sabe agora que a fome é o melhor
tempero para qualquer comida, a pornografia eliminou o desejo. O
marketing de alimentos nos trouxe distúrbios alimentares e é bem
provável que o marketing do sexo terá as mesmas conseqüências.
Já nos empanturramos ou morremos de fome por sexo de tal forma
que fazer amor virou atividade substitutiva – fetichista, obsessivo-
compulsiva e profundamente sem graça. (...) A pornografia
desencadeia uma reação genital, provoca excitação e sugere uma
descarga iminente; a pornografia é o que torna o sexo rápido
possível, sozinho ou acompanhado. O fast-food é um meio de
neutralizar a fome e, portanto, da intrusão de imagens de alimentos
em outras ocupações mentais. O sexo rápido também deveria
preparar o terreno para um tipo diferente de ação. A disseminação
da pornografia é muito parecida com a ascensão da batata chips que
agora ocupa dois lados inteiros de um corredor do supermercado
local. Agora as fritas vêm temperadas, e também embebidas de
produtos químicos que simulam sabores de camarão, bacon
defumado, molho inglês... (...) As fritas são um excelente exemplo

137
de alimento que engorda e não alimenta; o sexo virtual, como a
comida virtual, é planejado para deixar o consumidor insatisfeito.
A discussão do que pode ou não ser visto em vídeos e filmes não
têm nada a ver com pornografia e sim com limiares de capacidade
de chocar, que recuam sem parar. (...) Durante quase 70 anos, o
movimento avançou na direção de mostrar mais; o que deveríamos
esperar, mais cedo ou mais tarde, é que o estômago da sociedade
fique virado, já que houve todo tipo de práticas, das brigas de cães
e de galos, saunas gays e sex shops à queima de livros, prisão de
desviados, véus cobrindo mulheres e raspagem da cabeça de
homens. O Taliban não é nenhum fenômeno novo; o que
deveríamos almejar, talvez, seria por uma revolução mais pacífica e
menos cruel, em que as pessoas ficassem longe de espetáculos
indecentes e brutais simplesmente por não ter estômago para eles, e
seus promotores começassem a perder muito dinheiro.

Jimena Pettinato (PETTINATO, 2001) mostra como funciona a pornografia na


Internet:

Onde começou esta estória? Qualquer pessoa com uma


câmara e uma mente um pouco perversa pode criar uma imagem
para este tipo de site. A pornografia de amateurs é bastante
comum, mas as maiorias dos sites que tratam estes temas são
profissionais. Felizmente para os que se dedicam a este tipo de
negócios, não faltam pessoas que posem frente a uma câmara e
tirem a roupa. Os fotógrafos com conexões na tradicional indústria
sabem onde localizar os modelos que começam a se apresentar nas
páginas Web com a intenção de se fazerem conhecer para depois
serem convocados para filmes ou revistas. Mas ainda assim é um
negócio legítimo, cada modelo deve ser maior de idade e confirmar
aos fotógrafos, os direitos de vender suas imagens. Nos últimos
dois anos, a regulação segura tem-se convertido numa realidade

138
aceitada, e a maioria dos fotógrafos não se arrisca a vender seus
produtos sem a devida autorização. Uma vez que o material está
pronto deve-se fazê-lo chegar até aquelas pessoas que desejam
publicá-lo on-line. Quando a Rede era algo recente e desconhecido,
muitas pessoas simplesmente escaneavam fotografias de algumas
revistas especiais, ou as apresentações dos vídeos pornográficos, e
depois as publicavam em grupos de debate. Assim começaram a
formar-se os primeiros sites pornográficos com material copiado de
um site a outro. (...) Alguns fotógrafos vendem diretamente seu
material a este tipo de site. Porém geralmente este processo tem
duas partes: Um distribuidor compra pornografia de um grande
número de fontes originais, e depois revende as imagens aos
proprietários dos sites. A maior parte das fotografias são
digitalizadas, escaneadas, e depois armazenadas em CD-ROMs.
Cada CD contém ao redor de 600 imagens e pode ser vendido por
diferentes preços, segundo o tipo do material que seja. (...) Com
tanta pornografia gratuita disponível, os sites pagos devem exibir
algo mais que simples imagens. Os vídeos interativos, as atuações
das celebridades, e imagens de famosas personagens, têm um alto
custo de produção, e ademais pode ser uma diversão não muito
produtiva para os consumidores. Por isto, a maior parte do material
pago é distribuído pelas mesmas companhias que os desenvolvem.
(...) Aproximadamente umas 30 milhões de pessoas por dia entram
nos sites pornográficos, e provavelmente, naqueles que oferecem
imagens gratuitas. De acordo às estatísticas, os sites que oferecem
material gratuito compreendem entre 70 e 80 % do material
pornográfico disponível. Estes sites são os que verdadeiramente
atrapalham aqueles nos quais se deve pagar para obter informação.
Os sites de pornografia gratuita só ganham dinheiro quando um
usuário visita o site do anunciante e realiza uma compra.
Geralmente, um site "premium" partilha entre 30 e 60% de cada

139
venda com o site ao qual se refere. E ainda que esta cifra lhe pareça
bastante generosa, deve pensar que atualmente é difícil os sites
gratuitos capitalizarem seus acordos. Ainda que o 5 ou o 10% dos
visitantes poderiam clicar sobre um banner, só um ou dois de cada
mil usuários comprará o serviço oferecido. Por isto, os sites
gratuitos utilizam alguns truques para atrair a maioria dos usuários
para que cliquem sobre seus banners e assim possam ganhar
dinheiro; como por exemplo, prometer mais conteúdo gratuito, e
exibir mais anúncios cada vez que um usuário deixar a página.
Geralmente, os usuários não se importam com a utilização de
determinados truques para chamar a atenção, desde que haja
suficiente material gratuito para satisfazer suas necessidades. A
última palavra é do usuário, que realmente decide se o material que
encontra nos sites gratuitos satisfaz todas suas necessidades. De
repente, algum dia decide clicar sobre alguns dos banners dos sites
não gratuitos, registrar-se, e começar a pagar... O conteúdo dos
sites pornográficos pagos, particularmente os vídeos ao vivo e os
chats interativos, são extremamente custosos de produzir, e a
maioria dos sites pagos compram seu material de centenas de
fornecedores que o oferecem. Para poder pagar este material, os
sites necessitam não só atrair, mas também manter a milhares de
usuários que contratem seus serviços. Uma vez que o cliente se
registra, é muito importante que se mantenha sua atenção e sua
visita durante alguns meses. Os sites pornográficos pagos oferecem
o mesmo tipo de incentivo, ou seja, preços mais baratos durante um
período determinado de tempo, tratos especiais, desconto para o
registro de algum amigo, etc., igual que outras empresas que assim
o fazem também na base dos registros. (...) Alguns prometem um
mês grátis de acesso, mas finalmente, o usuário termina pagando.
(...).

140
Carlos Alberto Di Franco (DI FRANCO, 2001) diz o seguinte sobre Internet e
pornografia:

(...) Os problemas levantados pelo mau uso da Internet, são


infinitamente menores que os benefícios trazidos por esse
fascinante canal de aproximação dos povos, de democratização dos
conhecimentos e de globalização da solidariedade. Seus desvios
não serão resolvidos por meio de tutelas governamentais. Na
verdade, a Internet salienta uma nova realidade: chegou para todos,
sobretudo para a família, a hora da liberdade e da responsabilidade.
Se a família não cumprir o seu papel, não será o paternalismo do
governo que preencherá esse espaço com a devida competência.
Não há regulamento capaz de suprir a ausência da família. A
educação para o exercício da liberdade é o grande desafio dos
nossos dias. Como salientou matéria do The Economist, ‘ao atingir
tantas pessoas, com tanta facilidade, a Internet pode resultar,
ironicamente, em que as pessoas precisem menos dos governos, à
medida que coloca a tecnologia nas mãos de quem a quiser. Os
crivos contra a pornografia não são perfeitos, mas são menos
permeáveis do que os toscos instrumentos brandidos pelos censores
do governo’. A aventura da liberdade, desguarnecida de ilusórias
intervenções do Estado, acabará gerando uma sociedade mais
consciente e amadurecida.

3) Pornografia Infantil e Pedofilia

A pornografia é um meio de expressão que tem sua liberdade garantida como outro
qualquer, desde que não se seja ou não se torne ilegal, como no caso do envolvimento de
crianças ou o material ser vendido a menores.

A pornografia infantil é a maior preocupação dentro e fora da Internet, não apenas


sobre veiculação de imagens de crianças em cenas de sexo, mas principalmente a
exploração de crianças para elaboração dessas imagens.

141
Uma contradição dos novos tempos: a cultura de massa exalta a sexualidade infantil
enquanto os pedófilos são demonizados (ADAMS, 2002).

A Interpol define pornografia infantil como a conseqüência da exploração ou abuso


sexual perpetrado contra a criança, podendo ser caracterizado como qualquer meio de
representar ou promover o abuso sexual de uma criança, inclusive impresso e/ou gravado,
focalizando atos sexuais ou órgãos sexuais de crianças (MAUR, 1999).

Importante a diferenciação entre a pedofilia e a exploração sexual. Na pedofilia, o


pedófilo seduz a criança para si próprio. Na exploração, crianças são aliciadas para serem
exploradas sexualmente por terceiros (HAIDAR, 2001).

Hélia Barbosa (BARBOSA, 1999) define abuso sexual como a utilização para fins
sexuais do corpo de uma criança ou adolescente, por parte de um adulto, caracterizando-se
pelo não consentimento da vítima, que é coagida física, emocional ou psicologicamente. É
uma relação bilateral para satisfação unilateral do abusador, compreendendo desde atos
libidinosos até o estupro. A autora define ainda exploração comercial da sexualidade
infantil como a prática de sexo com criança ou adolescente, mediante o comércio de seus
corpos através de meios coercitivos ou persuasivos, caracterizados como transgressão a
seus direitos e à liberdade individual. A exploração comercial da sexualidade é praticada
para oferecer satisfação e prazer unilateral ao cliente, assim como para proporcionar ganhos
econômicos ao intermediador. É uma atividade sistêmica, triangular e criminosa.

Patrice Dunaigre (DUNAIGRE, 1999) define pedofilia como manifestações e


práticas de desejo sexual que alguns adultos desenvolvem em relação a crianças de ambos
os sexos na pré-puberdade. Para o autor, sua origem está na proibição do incesto e na
instituição de um sistema de parentesco. Esses elementos formam a identidade da criança
dentro de uma estrutura codificada. Com isso a criança passa a ter um status social
específico. O autor destaca o tom usado pela mídia nas coberturas sobre abuso sexual, nas
quais se acusa o agressor adulto – o pedófilo – e a incompetência e negligência dos
responsáveis pela criança e das autoridades. A vítima – a criança – fica reduzida a objeto do
ato cometido. E a mídia assume o papel de seu porta-voz. Demoniza-se o agressor ao
mesmo tempo em que se infantiliza a vítima. Mantém-se o estereótipo da criança

142
inconseqüente, irresponsável, um mero objeto de poder ou desejo, uma superfície
unidimensional sobre a qual pode ser projetado todo tipo de fantasia.

Ficou famoso no Brasil um caso de estupro no qual o suposto agressor foi absolvido
no Supremo Tribunal Federal, quando o juiz alegou na sentença que devido ao acesso que o
jovem tem à informação, não haveria mais meninas de doze anos, mas sim moças. A
menina disse no processo que sabia o que estava fazendo e queria manter relações sexuais
com o suposto agressor.

Sobre o comportamento pedófilo, Patrice Dunaigre explica que há uma distinção


entre o tipo exclusivo – aquele sexualmente atraído por crianças – e o não-exclusivo –
aquele que também é ativo com adultos. Esses comportamentos variam do exibicionismo
sem contato físico até atos de penetração, visando ou não às zonas sexuais. Numa
classificação, ainda segundo o mesmo autor, temos a pedofilia de situação, quando adultos
– geralmente com personalidade patológica – atacam crianças sem necessariamente
sentirem atração sexual por elas. E a forma convencional, a pedofilia preferencial, que
envolve um desvio sexual visando crianças na pré-puberdade (treze anos ou menos) e é
cometido de várias formas, segundo diversos critérios, entre os quais: preferência sexual,
tipo de violação sexual, estratégias usadas, formas de penetração, traços de caráter,
competências sociais fracas ou fortes, etc.

Segundo Leandro Sarmatz (SARMATZ, 2002), a OMS define pedofilia como a


ocorrência de práticas sexuais entre um indivíduo maior de dezesseis anos com uma criança
em pré-puberdade (treze anos ou menos). Para o pedófilo a criança é um objeto, não um
parceiro. A maioria dos pedófilos tem entre 30 e 45 anos, sendo 95% do sexo masculino.
Embora não sejam em sua maioria homossexuais, 71% preferem meninos. Proteção e
dominação constituem os pilares básicos da pedofilia. Ainda segundo o autor, à medida que
amadurecem, homens procuram pessoas mais jovens por causa de insegurança psicológicas,
inclusive em relação ao tamanho e desempenho do pênis. O sexo com menores seria a
forma de afirmar sua própria segurança. A psicanálise define pedofilia como uma perversão
sexual, não como doença, mas como uma parafilia138 .

138
O Dicionário Aurélio define parafilia como “cada um de um grupo de distúrbios psicossexuais em que o
indivíduo sente necessidade imediata, repetida e imperiosa de ter atividades sexuais, em que se incluem, por

143
Gianni Carta (CARTA, 2001) mostra que a pedofilia é facilitada pela miséria,
turismo sexual e pela Internet, tornando-se uma lucrativa indústria. Não afeta apenas países
pobres como Tailândia, Camboja e Costa Rica – considerada o paraíso da pedofilia, pois
não considera crime a posse de pornografia infantil – mas também países ricos como
Estados Unidos e Bélgica, os quais, através da cooperação entre suas polícias, na chamada
Operação Catedral, acabaram com uma das maiores redes internacionais de pedofilia, o
clube virtual Wonderland. Diz o autor:

O abuso sexual contra crianças é uma das mais lucrativas


indústrias globais. Dados levantados pelo juiz Walter Fanganiello
Maierovitch – e apresentados por ele na Itália, em dezembro de
2000, durante a convenção da ONU sobre crime organizado
transnacional – mostram a dimensão do mercado internacional da
pedofilia. Segundo Maierovitch, o lucro anual com a pedofilia
chega a US$ 5 bilhões. Vídeos envolvendo crianças rendem um
lucro anual de US$ 280 milhões. E, ainda de acordo com o juiz, no
ano passado foram localizados 7750 sites de pedofilia na Internet –
50% deles nos EUA – a previsão de especialistas é que o número
total de sites do gênero deve ser cerca de dez vezes maiores que
esse. “Aproximadamente, 2 milhões de crianças são cooptadas e
escravizadas pelas internacionais criminosas”, afirma Maierovitch.
Como em todos os tipos de comércio, a indústria da pedofilia existe
porque há demanda. E nos últimos anos, a exploração sexual de
menores vem crescendo. Devido aos preços cada vez mais baixos
das passagens aéreas e dos pacotes turísticos, viajantes pedófilos,
em sua maior parte norte-americanos e europeus, vão com maior
freqüência a países na Ásia, África e América Latina. E com a
introdução da Internet, a rede global de pedófilos ganhou força.
Cresceu o fluxo de informações sobre crianças em diversos países,
e também a comercialização de fotografias e vídeos pornográficos.

vezes, fantasias com objeto não humano, auto-sofrimento ou auto-humilhação, ou sofrimento ou humilhação,
consentidos ou não, de parceiro. [Deste grupo fazem parte o exibicionismo, o fetichismo, a frottage, a

144
(...) O psiquiatra francês Pierre Sabourin diz que o pedófilo, quase
sempre homem, pode ter qualquer idade, orientação sexual, religião
e nacionalidade. Muitas vezes sofreu abuso sexual na infância.
Tende a viver só, a não ter emprego, e tem dificuldade em fazer
amizade com adultos. O que explica o fato de ele se sentir à
vontade com crianças. Segundo o site da Interpol, o pedófilo
predador, aquele que rapta e estupra, é a exceção, não a regra. O
mais comum é o pedófilo que compra pornografia infantil e não
realiza suas fantasias. Forças inibidoras internas, diz ainda a
Interpol, controlam seus impulsos. E forças inibidoras externas
(medo de ser pego, encarcerado, e de ser exposto publicamente)
contribuem para que o pedófilo não moleste crianças. Porém, o
tédio e o estresse podem desencadear um novo ciclo. O pedófilo
passa, então, a ir a lugares públicos, como piscinas, ou parques
freqüentados por crianças. Ele detecta aquelas que lhe parecem
mais vulneráveis, talvez tímidas, e faz contato. Oferece presentes,
quem sabe um passeio de automóvel. As táticas são várias. O
processo de aproximação entre pedófilo e presa pode levar anos.
Em certos casos, nunca haverá contato sexual. Mas, quando e se
ocorre o ato sexual, o pedófilo usa artifícios para que a criança não
conte nada a ninguém: ameaças, favores, sentimento de culpa. (...)
Membros de sofisticados clubes de internautas globais, como o
Wonderland, que envolveu 13 países e 180 homens, trocaram, até
serem descobertos no início do ano, imagens de 1236 vítimas, todas
menores. Em várias ocasiões, crianças foram estupradas ao vivo,
via Internet. Como combater a pedofilia na Internet? Parcerias
como aquela entre a polícia belga e a americana. Em março, 30
pessoas que distribuíam imagens pornográficas de crianças foram
presas em Manchester, graças à colaboração entre a polícia e a
empresa privada SurfControl.

pedofilia, o masoquismo sexual, o sadismo sexual e o voyeurismo.]”.

145
O Estatuto da Criança e do Adolescente determina:

Art. 241 – Fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou


pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão
de um a quatro anos.

Sobre essa conduta há um julgamento do Supremo Tribunal Federal:

BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus -


76689/PB, Primeira Turma, Relator: Ministro Sepúlveda Pertence,
22/09/98. “Crime de Computador“: publicação de cena de sexo
infanto-juvenil (E.C.A., art. 241), mediante inserção em rede
BBS/Internet de computadores, atribuída a menores: tipicidade:
prova pericial necessária à demonstração da autoria: HC deferido
em parte. 1. O tipo cogitado - na modalidade de “publicar cena de
sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”
— ao contrário do que sucede, por exemplo, aos da Lei de
Imprensa, no tocante ao processo da publicação incriminada é uma
norma aberta: basta-lhe à realização do núcleo da ação punível a
idoneidade técnica do veículo utilizado à difusão da imagem para
número indeterminado de pessoas, que parece indiscutível na
inserção de fotos obscenas em rede BBS/Internet de computador. 2.
Não se trata no caso, pois, de colmatar lacuna da lei incriminadora
por analogia: uma vez que se compreenda na decisão típica da
conduta criminada, o meio técnico empregado para realizá-la pode
até ser de invenção posterior à edição da lei penal: a invenção da
pólvora não reclamou redefinição do homicídio para tornar
explícito que nela se compreendia a morte dada a outrem mediante
arma de fogo. 3. Se a solução da controvérsia de fato sobre a
autoria da inserção incriminada pende de informações técnicas de
telemática que ainda pairam acima do conhecimento do homem
comum, impõe-se a realização de prova pericial.

146
O Estatuto foi criado em 1990 quando se pensava apenas em publicação impressa
ou vídeo. Agora com as mídias digitais isto precisa ser revisto para que não haja dúvida
quanto à aplicação do Estatuto. Organizações não-governamentais e autoridades têm
criticado este artigo por causa da pena muito branda. Mas não é esse o caminho.

Conclusão

É preciso observar os dois núcleos do tipo previsto no artigo 241 do ECA. Foram
igualadas duas condutas de natureza distinta. Enquanto fotografar pressupõe a exploração
sexual do menor, pois será a realização efetiva do ato, requerendo toda uma preparação
para a elaboração da fotografia, portanto uma conduta muito mais grave, publicar
consiste apenas em tornar público algo já realizado, disponibilizar a cena pornográfica.
Nem sempre quem publica é o mesmo que fotografa. Na maior parte das vezes, aquele
que publica ou transaciona fotos utiliza material produzido por terceiros.

Não se pode reduzir a conduta pedófila ao ato em si. Deve-se observar todo o contexto
social. Mas também não se pode afastar a dimensão penal, pois há violência praticada. O
pedófilo precisa primeiramente de tratamento, não de cadeia. Muitas vezes, a prática
daquela conduta para o indivíduo se torna inevitável, irresistível, embora saiba que seja
errado, tenha consciência de seu ato. Há que se pensar em tornar o tratamento para o
pedófilo obrigatório, como já se faz em alguns países.

O objetivo deve ser a repressão à produção do material, quando se pratica o dano


efetivo ao menor.

As duas condutas devem ser reprimidas. Mas o simples aumento de pena não é a
solução. É preciso separar as condutas buscando uma punição conforme a gravidade de
cada ação. Na maioria dos casos são punidos da mesma forma aquele que abusou para
elaboração de fotos e aquele que apenas transacionou, trocou fotos pela Internet.

147
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149
A Utilização da Lei do fac- símile para o e- mail

Mário Antônio Lobato de Paiva

Assessor da Organização Mundial de Direito e Informática


Membro da Federação Iberoamericana de Associações de Direito e Informática
Membro da Associação de Direito e Informática do Chile
Membro do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico
E-mail: malp@interconect.com.br

Estamos vivenciando uma verdadeira revolução de conceitos e procedimentos


ocasionada pela invasão da informática em quase todas as atividades. Não seria diferente
com a administração da justiça que é diretamente influenciada pelos costumes provenientes
do seio de nossa sociedade.
Passamos por diversas transformações. A máquina de escrever, por exemplo,
utilizada para a elaboração de sentenças e petições foi totalmente substituída pelo
computador. Verdadeiros tribunais virtuais foram disponibilizados na Internet com
informações institucionais, consultas processuais e de jurisprudência. Caminhamos assim
para a informatização dos atos judiciais e processo.
O desencadeamento destas inovações teve como importante marco a lei nº.9.800 de
26 de maio de 1999 que em seu artigo possibilitou às partes “a utilização de sistema de
transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, para a prática de atos
processuais que dependam de petição escrita.”
Em um futuro próximo visualizamos um processo virtual onde todos os atos sejam
executados e transmitidos pela via eletrônica. Alguns tribunais já deram impulso a idéia de
tornar o processo tradicional em virtual. Um dos maiores exemplos disso é o chamado
peticionamento eletrônico.
Algumas Cortes de Justiça já disponibilizam este serviço em seus sites oficiais
proporcionando ao advogado a faculdade de enviar petições pela Internet. A nível de
Tribunais Estaduais de Justiça exemplificamos o do Rio de Janeiro que através de seu
presidente Desembargador Marcus Antônio de Souza Faver e Corregedor- Geral
Desembargador Paulo Gomes da Silva Filho no uso de suas atribuições expediram o Ato
Executivo Conjunto nº. 07/2001 que entrou em vigor no dia 02 de maio de 2001 permitindo
em seu artigo 1º. “a utilização do sistema de transmissão de dados por meios eletrônicos

150
para a prática de atos processuais que dependam de petição escrita, em primeiro e segundo
graus de jurisdição, através da página do Tribunal de Justiça – por e-mail.” e em seu artigo
3º. dispondo especificamente sobre o peticionamento eletrônico que “só poderá ser
utilizado por advogados e unidades judiciárias previamente cadastrados e credenciados
através do preenchimento de formulário disponível no "site" do Tribunal de Justiça, aos
quais será fornecida senha de acesso”. Os demais artigos especificam as normas
procedimentais pertinentes.
Na esfera trabalhista encontramos no Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo o
Provimento 05/2002 expedido pelo então Presidente Dr. Francisco Antônio Oliveira que
criou e regulamentou o chamado PET – Processo Eletrônico Trabalhista que começou a
vigorar em setembro de 2002. Nele podemos verificar a possibilidade de transmissão de
petições e atos processuais pela Internet.
Curioso é que um dos tribunais considerados por nós como um dos mais jovens do
país em matérias de teses e inovações jurídicas o STJ Superior Tribunal de Justiça não
disponibilize aos advogados o serviço de peticionamento eletrônico. Porém essa
indisponibilidade foi quebrada pela boa vontade do Ministro Humberto Gomes de Barros
que através do voto proferido em exame de embargos de declaração proveniente do agravo
de instrumento 389.941 extraiu-se a seguinte Ementa:
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO - APRESENTAÇÃO - CORREIO
ELETRÔNICO - INTERNET - POSSIBILIDADE - LEI 9.800/99.
I - O art. 1º, da Lei 9.800/99, outorga às partes a faculdade de utilizar sistema de
transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, para a prática de atos
processuais que dependam de petição escrita.
II - É plenamente eficaz, como ato processual, a petição remetida por correio
eletrônico (Internet), quando os originais, devidamente assinados, são entregues até cinco
dias da data do término do prazo recursal. Inteligência da Lei n.º 9.800/99.
III - Ausência de omissão. Preclusão das questões levantadas, que deveriam ter sido
discutidas na instância a quo.
IV - Embargos conhecidos, mas rejeitados.

151
Assim mesmo sem o serviço apropriado de recebimento de petições via internet o
Ministro permitiu o regular desenvolvimento da peça demonstrando um imenso
profissionalismo no sentido de efetivar a prestação jurisdicional.
No entanto, este caso isolado não deverá ser precedente para os advogados que
pretendam encaminhar suas peças pelo meio eletrônico, pois não seria viável que petições e
recursos fossem encaminhados para o e-mail do Tribunal ou dos próprios Ministros
aleatoriamente.
Mais interessante ainda foi a foi a decisão prolatada em 27 de maio de 2003 pelo
ministro Ives Gandra Martins Filho, da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais
do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que em recurso de agravo de instrumento,
entendeu que a Lei nº 9.800/99 diz respeito apenas a utilização do fac-símile diferenciando
para efeito legal do e-mail.
Tomamos conhecimento da decisão através do site www.conjur.com.br que
transcreveu a ementa que assim determina:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO - TRANSMISSÃO DO APELO POR E-MAIL -
NECESSIDADE DE CERTIFICAÇÃO DIGITAL ACEITA PELA ICP-BRASIL -
INAPLICABILIDADE DA LEI 9.800/99 - INTEMPESTIVIDADE - PROTOCOLO APÓS
O ENCERRAMENTO DO EXPEDIENTE FORENSE - ORIGINAL NÃO
APRESENTADO. A Lei n° 9.800/99 aplica-se unicamente ao fac-símile, mecanismo díspar
do e-mail. O envio de recurso por correio eletrônico é juridicamente aceitável apenas se
houver certificação digital reconhecida pela ICP-Brasil, nos termos da MP 2.200-2/01.
Logo, é juridicamente inexistente petição apresentada por intermédio de e-mail sem
qualquer tipo de certificação digital. Ademais, se o envio tivesse se dado por fac-símile, o
que não foi o caso, ainda assim o recurso seria inaceitável, pois este só deve ser
considerado interposto quanto protocolado na repartição judiciária. In casu, o agravo de
instrumento foi recebido pelo 2° TRT, por e-mail, no último dia do octídio recursal, às
18h52min, após encerrado o expediente forense, tendo sido protocolado somente no dia
seguinte. Ora, os atos a cargo das partes devem ser realizados até o fechamento normal do
expediente forense. Por fim, se fosse o caso de aplicação da legislação sobre fac-símile,
seria necessária a apresentação do original do agravo de instrumento, visando à

152
convalidação do ato processual, o que não ocorreu na hipótese dos autos. Agravo não
conhecido." (Proc. nº TST-AIRO-76787/2003-900-02-00.4)
As ementas transcritas acima trazem consigo uma velha reinvidicação feita por nós
em matéria de peticionamento eletrônico que é a de elaborar e promulgar lei específica
criando e regulamentando a questão do procedimento, assinatura digital e cadastramento de
forma unificada para todos os tribunais dando maior segurança aqueles que se utilizam
deste importante serviço pois normas claras e unificadas evitarão em parte discussões e
interpretações que venham a causar perda de prazos por falhas técnicas e outras que
venham a ser causadas pela diversidade de procedimentos.
Aplaudimos a atitude inovadora e compromissada com os ditames da Justiça
proporcionada pelo voto proferido por Ministro do STJ e desconsideramos totalmente a
interpretação feita pelo Ministro do TST pois vai de encontro frontalmente com a lei que
refere-se claramente a transmissão de dados além de representar tal decisão um retrocesso
para a modernização do processo do trabalho que tem como um de seus princípios o da
celeridade.
Para que se tenha idéia a lei fala “utilizar sistema de transmissão de dados”. Ora a
própria natureza jurídica do e-mail reconhecida em diversos países é a de que o mesmo é
uma espécie de conjunto de dados pessoais do usuário que é transmitido através de
mensagens de dados por intermédio do computador. Assim, a lei abarca literalmente o e-
mail e, portanto, não pode o intérprete negar a letra da lei e desconsiderar que o e-mail não
seja um meio de transmissão de dados.
Salientamos por fim e, mais uma vez, que os operadores do direito e, em geral,
todos os usuários das novas tecnologias preocupam-se apenas com os benefícios e
utilidades que o aparato tecnológico proporciona ao seu trabalho ou lazer, dando pouca
importância para os problemas que podem advir desta utilização a nível jurídico que se não
forem previstas com cautela por regulamentos legais poderão ensejar debates intermináveis
em doutrina e interpretações ao sabor do julgador ou do advogado trazendo com isso
grande instabilidade nas instituições e insegurança nas relações jurídicas e processuais
estabelecidas pela via eletrônica.

153
Questões Técnicas Dificultam Condenações por Crimes Cometidos na Internet
Demócrito Reinaldo Filho
Juiz de Direito em PE
e-mail: demo@infojus.com.br
URL: www.infojus.com.br

Sempre imaginamos que a parte mais complicada na tarefa de persecução dos


criminosos que atuam no ciberespaço estaria na sua identificação. Por causa da arquitetura
da Internet, que favorece o anonimato, o grande obstáculo divisado para a imposição da lei
penal sempre foi a dificuldade de identificação e localização dos criminosos que atuam na
rede. Muitos crimes não são punidos devido à impossibilidade técnica de se rastrear as
pessoas que os cometem. Essa realidade serve inclusive como incentivo à prática do crime
nos ambientes cibernéticos.

Mas para quem pensava que a grande dificuldade quanto à responsabilização dos
criminosos acabava aí, ou seja, que uma vez localizado e identificado o agente, este não se
furtaria à sanção penal, o dia-a-dia das cortes judiciárias começa a comprovar o contrário:
que a grande dificuldade pode aparecer em fase posterior, já depois de iniciado o processo
judicial. O que parece estar se formando é a cruel constatação de que, nas causas
envolvendo crimes na Internet, o Estado está sempre em desvantagem.

Essa constatação sobreveio no julgamento de casos recentes, em que os réus


levantaram novas linhas de defesa, baseadas em questões técnicas de difícil solução. Num
dos casos mais famosos, julgado por uma corte da Inglaterra no início de outubro passado,
o réu Aaron Caffrey (um adolescente de 19 anos) foi absolvido da acusação de ter atacado o
servidor de uma empresa. Denunciado com base na lei inglesa de crimes informáticos (o
Computer Misuse Act)139, ele alegou que seu computador foi tomado por um vírus do tipo
trojan e, dessa forma, utilizado remotamente por um terceiro para o cometimento do crime.
Muito embora especialistas tenham confirmado não terem encontrado sinais de vírus no
computador dele, o Júri terminou por inocentá-lo – o réu alegou também que o vírus foi

154
programado para se auto-destruir após realizar a operação. Esse foi apenas um de um total
de três casos onde a alegação de vírus trojan teve sucesso (para os réus). Os dois anteriores
estavam relacionados a acusações de pedofilia; os réus foram acusados de fazer
downloading de pornografia infantil. Os seus advogados também sustentaram a tese de que
os computadores foram “seqüestrados” por um vírus colocado por outra pessoa.

Não se pode dizer que o resultado desses julgamentos tenha sido incorreto.
Especialistas confirmam a possibilidade de “seqüestro” de computadores por meio de vírus
que permitem a um hacker controlar remotamente o computador “seqüestrado”, sem deixar
sinais dessa operação. O vírus pode se instalar no computador quando o usuário, sem saber,
faz o download de um programa infectado, através de um website de aparência amistosa
(mas preparado intencionalmente pelo hacker). Também pode vir junto com uma
mensagem de e-mail enviada ao usuário. Esses precedentes demonstram, isso sim, a
dificuldade que os órgãos estatais envolvidos com a persecução criminal terão daqui por
diante, especialmente quando a defesa levanta questões altamente técnicas.

É claro que nós temos uma vantagem em relação ao sistema processual inglês, pois
aqui apenas os crimes dolosos contra a vida é que são julgados por um Júri. Os demais são
julgados por um juiz, dotado de formação técnica, mais inclinado a valorizar os aspectos
meritórios da questão e menos influenciável por uma simples argumentação inteligente.
Nem por isso as autoridades judiciárias brasileiras tenderão a encontrar menos dificuldade
quando se tratar de processar crimes praticados no ciberespaço. É que o ônus da prova
técnica será sempre um fardo por demais pesado. Com efeito, a prova pericial vai ficar cada
vez mais importante nesses casos, mas o ônus de produzi-la permanecerá com a acusação.
E sua produção será cada vez mais difícil, pois qualquer resquício de dúvida pode resultar
na absolvição dos acusados.

A disciplina do onus probandi está prevista no art. 156 do Código de Processo


Penal, que dispõe: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer; mas o juiz poderá, no
curso da instrução ou antes de proferir a sentença, determinar, de ofício, diligências para
dirimir dúvidas sobre ponto relevante”. A primeira parte do dispositivo citado, como se vê,
é que trata especificamente da questão do ônus da prova, e a segunda, sobre os poderes

139
http://www.hmso.gov.uk/acts/acts1990/Ukpga_19900018_en_1.htm

155
instrutórios do Juiz. A doutrina a considera (a primeira parte do art. 156) uma regra
insatisfatória, pois dá a entender que todo tipo de prova cabe à acusação. Não é bem assim.
Conforme anota Vicente Greco Filho, o Código de Processo Penal em verdade acolhe o
critério “de que à acusação cabe a prova do fato constitutivo de sua pretensão ou de seu
direito, que são as elementares do tipo e a autoria”140. É dizer: ao Estado somente incumbe
provar a existência do fato criminoso e a sua autoria, elementos que embasam o jus
puniendi. Ao acusado, de sua vez, caberá a demonstração de outros fatos que possam
impedir, modificar ou extinguir aquele jus puniendi, como, por exemplo, as causas de
exclusão de ilicitude ou culpabilidade. Em suma, o réu tem que provar o fato que, a
despeito da existência do fato constitutivo do jus puniendi, “tem, no seu plano material, o
condão de impedir, modificar ou extinguir aquela pretensão – que são as excludentes”141.

A alegação de “seqüestro” do computador por um “spyware” pode ser aceita como


uma negativa de autoria. O réu, nesse caso, alega que não ele, mas uma outra pessoa, foi
responsável pelo cometimento do crime. A Promotoria, assim, é quem tem que provar que
foi realmente ele que cometeu o crime, isto é, tem que fazer prova da não existência de
vírus em seu computador. E essa prova não pode ser relativa, mas tem que ser plena,
completa, de maneira a não deixar qualquer dúvida quanto à autoria. Isso em razão do
princípio in dubio pro reo, que leva à absolvição no caso de dúvida quanto à procedência
da imputação. Basta que o réu suscite dúvida razoável, porque a dúvida milita em seu
favor, para se ver livre da condenação. Havendo dúvida quanto à autoria, o Juiz tende a
absolvê-lo apoiado no art. 386 do CPP, “por não haver prova suficiente para a condenação”
(inc. VI).

Essa realidade processualística bem revela as dificuldades que os órgãos


encarregados da persecução criminal terão daqui por diante, sempre que se depararem com
defesas baseadas na alegação de existência de vírus e “spywares”. Na prática, a Promotoria
vai ter que provar, amparada na prova pericial, que o computador não foi infectado, que
nenhum vírus apoderou-se dele e que não existe a possibilidade de ter se evaporado após
completar a operação.

140
VICENTE GRECO FILHO. “Manual de Processo Penal”. São Paulo: Ed. Saraiva, 5ª ed., 1998,
pág. 205.
141
Cf. José Francisco Cagliari, Prova no Processo Penal, artigo publicado em
http://www.mp.sp.gov.br/justitia/CRIMINAL/crime%2038.pdf

156
Parece que essa dificuldade não vai se resolver somente aumentando as estruturas
das Promotorias e Delegacias, dotando-lhes de unidades especializadas no combate ao
crime informático. O que dizer, por exemplo, da alegação de que o vírus se “evaporou”
após completar a operação criminosa. Sempre vai haver dúvida sobre essa possibilidade,
mesmo que a perícia diga em contrário. Se isso é tecnicamente possível – de um hacker
apoderar-se de um computador alheio sem deixar vestígios -, o juiz sempre vai considerar
essa possibilidade e admiti-la para apontar como duvidosa a prova (pericial) produzida pelo
MP. Como se vê, algo mais precisa ser feito.
Há quem enxergue que esse tipo de questão tende a obscurecer os limites da
responsabilidade penal individual. Michael Geist, professor de Direito na University of
Ottawa Law School, no Canadá, prevê que “nós vamos ter que escolher o nível de
responsabilidade que uma pessoa tem quando está operando o seu próprio computador” (em
reportagem publicada no site da CNN142, do dia 28 de outubro). De nossa parte,
entendemos que a solução específica para lidar com problemas desse tipo reside em se
promover uma alteração dos princípios clássicos de distribuição do onus probandi, no
processo penal. Pelo menos em relação a certos tipos de defesa (alegações de fatos), o ônus
da prova tem que ser expressamente transferido para o acusado, sob pena de se
comprometer irremediavelmente a atividade de persecução criminal. As novas leis que
dispuserem sobre crimes informáticos, sobretudo a modalidade de acesso não autorizado a
sistema computacional, têm que prever o ônus da prova do réu, sempre que este alegar ter
sido vítima de um ataque de vírus “spyware” ou “trojan”, ou qualquer outra defesa que
represente um ônus de prova técnica exagerado para a acusação.
A tendência de se alterar a distribuição do ônus da prova, em matéria de crimes
informáticos, na verdade já vem ocorrendo. Nos EUA, muitos acusados pela prática de
disseminação de pornografia infantil estavam sendo beneficiados com a alegação de que o
material apreendido continha apenas imagens de adultos com aparência infantil, ou que era
resultado de trabalho de computação gráfica, não envolvendo, assim, o abuso efetivo de
crianças. O resultado prático foi que, na grande maioria dos casos, as pessoas flagradas na
posse de imagens ilícitas (de pornografia infantil) escaparam à condenação ou ao simples
indiciamento. Diante desse quadro, os legisladores norte-americanos editaram o “Protec

142
http://www.cnn.com/

157
Act”143, que previu que a prova de não uso de crianças em material de pedofilia seria
considerada uma affirmative defense, isto é, ônus processual do réu ou incriminado (ver, a
respeito, artigo anterior de nossa autoria144).
Iniciativa semelhante certamente deverá ser observada em relação às alegações de
seqüestro de computador por vírus “spyware”, a título de negativa de autoria. Se por um
lado deve-se ter a preocupação de não condenar uma pessoa pelo que ela efetivamente não
fez, por outro surge a preocupação de que a alegação de vírus seja utilizada para absolver
qualquer um, vítima ou não de um hacker. Alguém pode simplesmente alegar que outra
pessoa seqüestrou seu computador, cometeu o crime e que, após isso, o programa (vírus)
simplesmente se evaporou. Tal possibilidade pode se transformar em uma porta aberta para
a impunidade. A preocupação aumenta quando se sabe que esse tipo de defesa tende a se
tornar cada vez mais comum, na medida em que a utilização de “spywares”, programas que
permitem o roubo de senhas e bisbilhotar o computador de outro usuário, torna-se cada vez
mais freqüente.
A questão está em debate.

Recife, 17.11.03.

143
http://www.house.gov/judiciary/s151conf_002.pdf
144
O "PROTECT Act" - a lei americana de proteção às crianças na Internet (parte II), publicado em
http://www.infojus.com.br/webnews/noticia.php?id_noticia=1891&

158
O Crime de Divulgação de Pornografia Infantil pela Internet – Breves Comentários à Lei
10.764/03

Demócrito Reinaldo Filho


Juiz de Direito em PE
e-mail: demo@infojus.com.br

Foi publicada (no DOU do dia 13/11) a Lei Federal 10.764, de 12.11.2003, que
atualizou e alterou alguns dispositivos do Estatuto da Criança e Adolescente (Lei 8.069/90),
modificando a estrutura e conceituação legal e passando a prever penas mais severas para
alguns crimes contra crianças e adolescentes. Em particular, a Lei altera o art. 241 do ECA,
que trata do crime de produção e divulgação de imagens de menores em cenas de sexo
explícito. A norma foi originária de projeto de lei (n. 135/99) de autoria da Senadora e atual
Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (PT/AC), e tramitou na Câmara dos Deputados
sob o número n. 5.460/01, com redação final aprovada em plenário no dia 30/07.
Retornando ao Senado, foi apreciado e aprovado em 21/10.
Trata-se de um pacote legislativo145 que visa a adequar a proteção legal das crianças
e adolescentes às mudanças sociais, especialmente contra crimes e abusos sexuais, que têm
aumentado de proporção. A proteção das crianças é assunto que ganha cada vez mais
atenção da nossa sociedade e, por decorrência, dos nossos legisladores. Com toda razão,
sobretudo quando novas tecnologias favorecem a prática de crimes dessa natureza. Durante
a discussão do projeto, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) apresentou estatísticas
preocupantes: em maio deste ano, a Interpol, sediada em Madri, fez chegar à Polícia
Federal brasileira a indicação de 272 sites, com origem no Brasil, onde eram exibidas
fotografias de adultos explorando sexualmente crianças e adolescentes. Um convênio
(protocolo de cooperação técnica) entre o Ministério Público do Rio Grande do Sul, o
Ministério Público Federal, a Interpol, a Polícia Federal e outros organismos revelou que,
em 2002, houve 1.245 denúncias de páginas na Internet contendo material de pornografia
infantil. De janeiro a 31 de maio do corrente ano, houve 401 denúncias de páginas contendo

145
A Lei 10.764 também modificou a estrutura e aumentou as penas de outros crimes, tais como facilitação e
envio de criança ou adolescente para o exterior (art. 239); emprego de criança ou adolescente em
representação teatral, televisiva, cinematográfica ou fotográfica (art. 240); venda ou fornecimento a menor de
arma, munição ou explosivo (art. 242); e venda a menor de produtos que possam causar dependência física ou
psíquica (art. 243).

159
esse tipo de material146 . A deputada Telma de Souza (PT-SP) afirmou que o universo da
pedofilia precisa ser encarado com muita seriedade. "Não é apenas aquele que pratica o ato
sexual com crianças ou adolescentes que deve estar sujeito às penalidades previstas, mas
também aquele que mantém e veicula, principalmente pela Internet, fotos e vídeos que
fazem proliferar a pedofilia em proporções indescritíveis", disse ela.
O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, que é de 1990, precisava realmente
ser atualizado. Na época de sua edição, a Internet (em especial o seu canal gráfico – a
World Wide Web ou WWW) ainda não era uma realidade com a popularização que alcançou
nos dias de hoje. A redação original do seu art. 241 previu pena (reclusão de um a quatro
anos) somente para o ato de “fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente”. A não tipificação exata, indicando os meios da
publicação, poderia servir como porta aberta para a impunidade. Pela nova redação, quem
"apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de
comunicação, inclusive Internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo
explícito envolvendo criança ou adolescente", estará sujeito a reclusão de 2 (dois) a 6 (seis)
anos, e multa. O art. 241, assim, passa a abranger de modo específico a pornografia infantil
na Internet.
Muito apropriado. A rede mundial tem sido um ambiente extremamente favorável à
proliferação da pornografia e, de um modo ainda mais sensível, tem servido como campo
fértil para a disseminação da “pedofilia”147 . Os pedófilos têm se utilizado da Internet para
trocar fotos e imagens que descrevam práticas sexuais com menores pré-púberes, não
somente para simplesmente extravasar suas (doentias) fantasias sexuais e até mesmo para
difundir uma espécie de filosofia pedófila. Por sua vez, o Estado tem um interesse direto na
repressão da pedofilia, quer seja ela a prática direta de um ato de abuso sexual contra
menores, seja quando representa uma perpetuação ou um incentivo a esse tipo de crime – o
que ocorre quando imagens de crianças molestadas sexualmente são divulgadas. Muitas

146
Esses dados foram reproduzidos em artigo de Omar Kaminski (Pornografia infantil - Projeto que inclui a
Internet é votado na Câmara) publicado no site Consultor Jurídico (www.conjur.com.br) , em 09.07.03.
147
O Dicionário Aurélio descreve pedofilia como a “parafilia representada por desejo forte e repetido de
práticas sexuais e de fantasias sexuais com crianças pré-púberes; perversão sexual que visa a criança”.

160
pesquisas sugerem que a divulgação de “pornografia infantil”148 contribui para o aumento
de crimes sexuais contra menores.
A nova redação do art. 241 não alcança as “simulações” de pornografia infantil, isto
é, ela só tipifica a disseminação de imagens que sejam efetivamente a reprodução de cenas
que envolvam a participação real de menores. Durante a tramitação do projeto pela Câmara,
o relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (CCJR), Deputado Carlos
Biscaia (PT-RJ), ofereceu subemenda em forma de substitutivo que propunha uma redação
diferente a esse artigo, de maneira alcançar também a utilização de imagens contendo sexo
explícito que não utilizassem crianças reais (fruto da técnicas de computação gráfica ou
através do emprego de adultos com aparência infantil). O substitutivo acrescentava um
parágrafo (3o .) ao art. 241, definindo pornografia infantil como “qualquer representação,
por qualquer meio, de criança ou adolescente no desempenho de atividades sexuais
explícitas ou simuladas ...”149 . Pretendia assim, como se disse, criminalizar a chamada
“pornografia infantil virtual”, entendida esta como o material visual que aparenta descrever
cenas de menores envolvidos em relações sexuais explícitas, mas que na verdade é
produzido sem a participação efetiva de uma criança (menor de 18 anos). Esse adendo, no
entanto, foi suprimido quando o projeto retornou ao Senado para reapreciação.
A não inclusão da “pornografia infantil virtual” no descritor normativo do crime do
art. 241 traz duas conseqüências. A primeira é evitar que a regra possa ser acusada de
inconstitucionalidade, por conflito com o princípio da liberdade de expressão (art. 5º, IV,
VI, VIII e IX, da CF). Nos EUA, por exemplo, uma lei de 1996 (Child Pornography
Prevention Act)150 tentou expandir o conceito de pornografia infantil para nele incluir
qualquer descrição visual que seja ou aparente ser de um menor engajado em conduta
sexual explícita. A Suprema Corte invalidou a lei, por considerar que ela dava margem à
proibição de material cuja produção não utilizasse efetivamente crianças. A Corte recorreu
ao princípio do freedom of speech, encapsulado na Emenda n. 01 da Constituição norte-
americana, que inspirou e corresponde ao nosso princípio constitucional da liberdade de

148
Assim entendido o material visual que retrata crianças e adolescentes em práticas libidinosas ou de cunho
sexual explícito.
149
A redação do § 3º do substitutivo: “Para fins desta Lei, considera-se pornografia qualquer representação,
por qualquer meio, de criança ou adolescente no desempenho de atividades sexuais explícitas reais ou
simuladas ou qualquer representação dos órgãos sexuais de uma criança para fins predominantemente
sexuais." (NR)

161
expressão151 . É claro que a nossa jurisprudência em torno desse princípio é mais restritiva
do que a norte-americana, que lhe atribui maior largueza. Mas a supressão produzida na
redação quando o substitutivo retornou ao Senado evita esse tipo de discussão.
A outra conseqüência é que a não tipificação da “pornografia infantil virtual” pode
dificultar a persecução criminal, em casos de efetivo crime de disseminação de material
pedófilo. Uma vez identificados os autores do ato produção ou divulgação do material na
Internet, estes podem, durante o procedimento judicial, alegar que não se trata de imagens
ou representações de crianças reais e, assim, escapar à condenação. Esse tipo de alegação,
como estratégia de defesa, tem o efeito de lançar sobre os ombros da Promotoria o ônus
processual da prova do crime, isto é, a obrigação de provar que o material eventualmente
apreendido trata-se efetivamente de pornografia infantil, fruto da reprodução de um abuso
sexual perpetrado contra uma criança. Prova técnica desse tipo sempre será de difícil
produção e a conseqüência, como se disse, pode ser a absolvição dos incriminados. A
solução seria a lei transferir para a defesa o onus probandi, nessas hipóteses152 .
A Lei Federal 10.764 ainda produziu outras alterações no art. 241 do ECA. Foi mais
além, prevendo a mesma pena (de reclusão de 02 a 06 anos e multa) para quem “assegura
os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens” (inc. II do
par. 1o .) ou ainda “assegura, por qualquer meio, o acesso, na rede mundial de computadores
ou internet, das fotografias, cenas ou imagens” (inc. III do par. 1o .) de sexo explícito
produzidas com a participação de crianças ou adolescentes.
Pela redação desses dois dispositivos, fica claro que o legislador pretendeu
responsabilizar o provedor de serviço de hospedagem de página web e o provedor de
serviço de acesso à Internet, sempre que contribuam para a disseminação de pornografia
infantil. Não somente o praticante direto do ato, mas também aquele que fornece os meios
técnicos para sua realização incorre no mesmo tipo penal. Assim, por exemplo, quando um
provedor sabidamente fornece os meios para a transmissão de uma mensagem de e-mail

150
O texto pode ser encontrado em: http://www.politechbot.com/docs/cppa.text.html
151
Para completa informação sobre esse julgamento, sugerimos a leitura de artigo anterior de nossa autoria –
“A questão da Pornografia Infantil Virtual - A Lei dos EUA aue tentou combater sua difusão” -, publicado no
site Infojus - http://www.infojus.com.br/webnews/noticia.php?id_noticia=1816&
152
Para uma melhor compreensão dessa questão, sugerimos a leitura de artigo anterior de nossa lavra –
“Questões técnicas dificultam condenações por crimes praticados na Internet” -, que pode ser encontrado em
http://www.infojus.com.br/webnews/noticia.php?id_noticia=1955& . Ainda recomendamos a leitura de um

162
contendo pornografia infantil pratica conduta típica (descrita no inc. III do par. 1o .). O
mesmo ocorre quando hospeda conscientemente página web contendo esse tipo de material
(inc. II do par. 1o .). Mas é preciso salientar que a configuração dessa modalidade do crime –
de fornecimento dos meios técnicos para a sua realização – somente se configura quando o
provedor tem conhecimento da natureza do material que ele está transportando ou
hospedando. Se ele desconhece que uma página eletrônica contendo pornografia infantil
está hospedada em seu sistema informático, ou que estão se servindo dele para o envio de
material dessa natureza, não pode ser responsabilizado por esses atos.
Por uma questão de ordem prática153 , não se pode atribuir ao provedor o dever de
vigilância sobre o material que hospeda ou que trafega em seu sistema. A responsabilidade
dele nasce a partir do momento em que toma conhecimento, por ato próprio ou por
comunicação de terceiro, da existência do material ilícito hospedado em seu sistema. Se
não toma qualquer providência, impedindo o acesso ao material pornográfico ou cessando a
transmissão das mensagens, ou ainda comunicando sua existência às autoridades
competentes, aí sim pode ser responsabilizado nas mesmas penas do praticante originário
do ato.

Recife, 30.11.03.

outro – “O ‘PROTECT Act’ - a lei americana de proteção às crianças na Internet (parte II)”, disponível em:
http://www.infojus.com.br/webnews/noticia.php?id_noticia=1891& .
153
É reconhecido que os provedores de acesso à Internet ou que atuam fornecendo serviços de webhosting
(hospedagem) não têm condições de fiscalizar o conteúdo dos milhões de páginas que hospedam ou dos
milhões de mensagens de e-mail que trafegam diariamente em seu sistema.

163
Controvérsias acerca de Prazos em Virtude de Informações nos sit es dos Tribunais

Profa. Josília Fassbender Barreto do Nascimento


Mestranda em Direito, Estado e Cidadania – UGF/RJ; Professora dos Cursos de Graduação
e Pós-Graduação da Faculdade de Direito da UCP – Petrópolis – RJ

SUMÁRIO: I – Introdução. II – A Lei do “Fax” e a possibilidade de uso dos meios


eletrônicos. III – A divergência jurisprudencial. IV. Conclusão. V. Bibliografia

I - INTRODUÇÃO

Apesar da tecnologia avançar, diariamente, ainda há uma séria resistência


quanto a utilização dos meios eletrônicos quando se trata de atos processuais. O formalismo
exacerbado introduzido pela Escola Científica do Processo, que vem encontrando
contrariedade no que se resolveu denominar 3ª fase do Processo, não nos permite, ainda,
uma maior agilização dos procedimentos.

Quando o Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico elaborou parecer para o


Tribunal Regional Federal, acerca dos Juizados Especiais Federais, chamou-nos a atenção o
trabalho desenvolvido pela magistrada MARISA FERREIRA DOS SANTOS, Juíza
Presidente do Juizado Especial Federal Previdenciário de São Paulo, quando transcreve
texto dos idos de 20, do século passado, apresentando a resistência à máquina de escrever –
hoje já ultrapassada:

“Com effeito, o emprego da machina torna o serviço mais rendoso, mais


limpo, mais legivel, mais barato... Se a dactylographia assegura a
authenticidade e a durabilidade da escripta, que a lei quer resguardar, por
que não preferil-a aos irritantes manuscriptos?” LIMA, HEROTIDES DA
SILVA, A dactylographia no fôro, RT, vol. LXXI, fasc. 356, pág. 421,
28/08/1929154

Com efeito, se em 1929 se apresentavam resistências ao uso da máquina de


escrever, com temor de adulterações, a resistência hoje diz respeito ao uso dos meios
eletrônicos.

164
Se, com o passar dos anos, verificou-se que os manuscritos poderiam ser
adulterados, assim como os tipos das máquinas de escrever etc., não há por que tanta
resistência na utilização dos meios eletrônicos para a prática de atos processuais.

Contudo, à inexistência de normas permissivas – à exceção da Lei


10.259/2001 -, os Tribunais se apresentam vacilantes quando a questão diz respeito a
prazos.

II – A LEI DO “FAX” E A POSSIBILIDADE DE USO DOS MEIOS


ELETRÔNICOS

Desde 1991, quando implantada a Comissão de Reforma do CPC,


encabeçada pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual, o Processo Civil vem se
transformando de forma acelerada. Preferiram-se as mini-reformas, a partir de 1994, com
grandes avanços para a sistemática processual.

Hoje já se discute a deformalização do processo, diante do princípio da


instrumentalidade155 . Contudo, ainda que promulgada a Lei 9800/90, pouco avanço se
conseguiu no que se referem a aspectos tecnológicos. As últimas reformas do CPC tentaram
introduzir um parágrafo único ao art. 154, mas restou infrutífera a proposta legislativa156 .

Ferrenhas são as críticas do Prof. Dr. Cândido Rangel Dinamarco157 :

“Embora a lei autorize o emprego do fac-símile ou de outro meio similar, ainda há


enorme resistência ao emprego do correio eletrônico para a transmissão de petições e
outros atos (tem-se a notícia de que o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo o
admite para a impetração de habeas corpus, aceitando também que por essa via o juiz
impetrado preste suas informações). Nos provimentos administrativos que editaram para
regulamentação da nova lei, a Presidência do Supremo Tribunal Federal e a do
Tribunal de Justiça de São Paulo silenciaram sobre esse outro meio eletrônico de

154
Extraído da apresentação da MMª Juíza, acessível em http://www.trf3.gov.br
155
N.A. Aqui se faz uma referência à instrumentalidade das formas e não à instrumentalidade do processo.
156
N.A. Aconselhamos a leitura do artigo Veto ao Parágrafo Único do Art. 154 do CPC, Prof. José Carlos de
Araújo Almeida Filho, in Revista de Direito Eletrônico, nº 02.
157
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da Reforma, Malheiros Editores, 3 ed., 2002:SP

165
comunicação2 e essa omissão parece significar que o e-mail ainda permanece sob
suspeita, não sendo admitido; sem a disposição dos tribunais a ampliar o emprego das
conquistas da telemática não será viável a prática desse meio moderníssimo, porque,
como está na lei n. 9.800, permis siva das transmissões eletrônicas, "o disposto nesta lei
não obriga a que os órgãos judiciários disponham de equipamentos para recepção" (art.
5C). Enquanto os juízos e tribunais não organizarem um serviço para a recepção de
mensagens eletrônicas, a prática do e-mail continuará fora das rotinas forenses. Infeliz-
mente!158 ”

O anacronismo vivenciado parece lembrar a resistência à máquina


de escrever, como se jamais houvesse quem violasse (adulterasse) um manuscrito.
Posteriormente à máquina de escrever, também não se pode admitir que a mesma
jamais pudesse ser objeto de adulteração e, agora, com meios eficazes, nosso
Direito retrocede, temendo a tecnologia, que em muito colabora para o acesso à
Justiça.
III – A DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL
Para fins de análise da divergência jurisprudencial trazida, sendo o foco
deste trabalho a necessidade de afirmar que os sites dos Tribunais devem ser confiáveis o
bastante para justificarem justa causa em termos de perda de prazo, dois acórdãos foram
analisados, quais sejam:

RECURSO ESPECIAL Nº 514.412 - DF (2003/0053302-5)


RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
RECORRENTE : REGIUS SOCIEDADE CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
ADVOGADO : LISBETH VIDAL DE NEGREIROS BASTOS E OUTRO
ADVOGADA : VANESSA CAMARGO GARCIA LEÃO

158
Cf. DINAMARCO, Ob.cit. “Modernizador e mais amplo que o art. 1º da Lei do Fax era o dispositivo
contido no novo parágrafo que a Reforma da Reforma pretendeu introduzir no art. 154 do Código de Processo
Civil, para estabelecer que "atendidos os requisitos de segurança e autenticidade, poderão os tribunais
disciplinar, no âmbito da sua jurisdição, a prática de atos processuais e sua comunicação às partes, mediante a
utilização de meios eletrônicos". Essa disposição, contida no projeto que gerou a lei n. 10.358, de 27 de
dezembro de 2001, foi vetada pela Presidência da República mediante a impertinente invocação da
preexistência de uma medida provisória portadora da disciplina do emprego das comu nicações eletrônicas
(MP n. 2.200, de 24.8.2001). Essa medida provisória, que cria um sistema chamado Infra-Estrutura de
Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, traz disciplinas e regras profundamente burocráticas e encarrega
órgãos vinculados à Administração de trazer, em regulamento, normas para o emprego de códigos
criptográficos e outros elementos de utilização completamente inviável nos processos judiciários. Mais
uma vez, a medida provisória levou de vencida a lei.”

166
RECORRIDO : CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA E OUTROS
ADVOGADO : CLÓVIS FERREIRA DE MORAIS E OUTROS
EMENTA
Processual civil. Intimação. Prazo. Internet.
I - As informações trazidas pela Internet têm natureza meramente informativa e não
vinculativa, não podendo, pois, substituir a forma prevista em lei para contagem dos prazos
processuais.
II - Recurso especial conhecido mas desprovido

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

Órgão : 3ª Turma Cível


Classe : AGI – Agravo de Instrumento
N. Processo : 2003002007389-2
Agravante : POSTO CÉU 070 COMBUSTÍVEIS LTDA.
Agravada : COMPANHIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO IPIRANGA
Relator Des. : LÉCIO RESENDE

EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONTESTAÇÃO –
INTEMPESTIVIDADE – INFORMAÇÕES – INTERNET
– VEICULAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO –
UNÂNIME. A introdução da informática e sua freqüente
utilização pelos diversos setores da Justiça, tem como
finalidade maior agilidade e rapidez no trabalho diário,
possuindo caráter meramente subsidiário, não
substituindo a publicação em Órgão Oficial. O advogado
tem o dever de zelar pelos processos que patrocina.

O primeiro acórdão, cuja ementa se traz para análise, não admite o uso de
informações prestadas nos sites dos Tribunais com o fim de rechaçar perda de prazo. Trata-
se de decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça.

167
Antes de proceder a uma análise crítica acerca da decisão, mister se faz a
transcrição do trabalho do Prof. Dr. Leonardo Greco159 :

“Nos últimos três anos, todos os tribunais superiores, tribunais regionais e


muitos tribunais estaduais implantaram sistemas de acompanhamento de
processos e de pesquisas de jurisprudência acessíveis através da Internet,
extensivo, em muitos casos, ao acompanhamento de processos nos órgãos
jurisdicionais de 1.° grau.
Além de facilitar o exercício profissional pelos advogados que, sem sair dos seus
escritórios, obtêm informações oficiais sobre os andamentos dos processos de seu
interesse em qualquer parte do país, e sobre os avanços da jurisprudência, esses
serviços são importante instrumento de acesso a essas informações por parte
dos próprios jurisdicionados e cidadãos em geral.
Na medida em que se generalizar entre os advogados a utilização desses
serviços, através da aquisição e manuseio de recursos computacionais
modernos, poder-se-á prever para futuro bastante próximo a real virtualização
do processo judicial, através da prática de muitos tipos de atos, especialmente os
de movimentação, exclusivamente por meio eletrônico.”

Não resta a menor dúvida que o acompanhamento de processos pela Internet


somente facilita o acesso à Justiça. Uma grande queixa dos advogados e dos jurisdicionados
é o congestionamento dos cartórios. Assim sendo, a partir do momento em que se pode
confiar nos sites dos Tribunais, não haverá necessidade do advogado ir, diariamente, ao
Fórum a fim de saber se o mandado foi juntado, se a publicação no Diário Oficial se
encontra certificada etc.

São enormes os benefícios trazidos pela informática e, segundo pesquisa do


Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico, para o Projeto CITAQ 160 , mais de 90% dos
Tribunais se encontram na Internet.

Há, ainda, a facilidade do acompanhamento push, serviço prestado pela


maioria dos Tribunais, inclusive pelo próprio Superior Tribunal de Justiça – o que, sem
dúvida alguma, não só agiliza o serviço de informação, como descongestiona os cartórios e
serventias judiciais.

159
GRECO, Leonardo et al. Direito e Informática. Ed. Revista dos Tribunais, SP:2001
160
Holanda

168
Quanto ao acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios,
apesar de admitir a celeridade quanto aos atos processuais por meio eletrônico, também não
releva prazo, afirmando ser dever do advogado zelar pelos processos de seus clientes.

Ocorre, contudo, que a verificação diária junto aos sites dos Tribunais
demonstra este zelo e a rapidez com que a informação é transmitida ao cliente. O
anacronismo não pode prosperar em pleno século XXI, quando o processo civil, segundo
alguns doutrinadores, avança para sua terceira fase, demolindo alguns conceitos seculares,
notadamente aqueles imprimidos pela Escola Científica do séc. XIX.

Jurisprudência divergente, contudo, se apresenta no Tribunal de Justiça do


Estado do Rio de Janeiro:

MANDADO DE CITACAO
PRAZO PARA CONTESTACAO
PUBLICACAO NO ORGAO OFICIAL
DEVOLUCAO DE PRAZO
RECURSO PROVIDO

PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO. PRAZO DE CONTESTAÇÃO. O


prazo para apresentar a defesa corre da juntada do mandado de citação ou do
aviso de recebimento, quando feito pela forma postal, aos autos. Havendo
sistema informatizado que disponibiliza a informação do andamento
processual via internet, inclusive com a notícia de expedição do mandado, a
falta de lançamento no sistema da data de juntada constitui evento
imprevisto que justifica a devolução do prazo para efetivação do ato
processual. A vida moderna impõe a utilização de meios eletrônicos que
facilitem a atuação profissional dos advogados e do acompanhamento
processual pelas partes. A utilização da informática para comunicação
daqueles atos praticados pela serventia e que não foram objeto de
publicação, quando não lançados de maneira correta, induz, injustamente, a
parte a erro, caracterizando a exceção do § 1º do artigo 183 do CPC.
Provimento do recurso.

Tipo da Ação: AGRAVO DE INSTRUMENTO


Número do Processo: 2003.002.13305
Data de Registro : 11/11/2003
Órgão Julgador: QUINTA CAMARA CIVEL

169
DES. ANTONIO CESAR SIQUEIRA
Julgado em 14/10/2003

Há, contudo, que se fazer uma distinção entre aqueles atos praticados pelos
serventuários, como certidões, juntada de mandados etc., com os publicados no Diário
Oficial.

Deve haver um meio termo a fim de se relevar os prazos processuais. No


acórdão ora apresentado, também do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, fica
claro que a publicação no Diário Oficial prevalece sobre aquela havida no site do Tribunal:

APELACAO
CONTAGEM DO PRAZO
SISTEMA DE INFORMACOES DO TRIBUNAL DE JUSTICA -
ACOMPANHAMENTO PROCESSUAL
INTERNET
INVALIDADE
PUBLICACAO NO ORGAO OFICIAL
VALIDADE
AGRAVO DE INSTRUMENTO
RECURSO DESPROVIDO

PROCESSO CIVIL. PRAZO. PUBLICAÇÃO. ANDAMENTO


PROCESSUAL. INTERNET. E-MAIL. TERMINAIS ELETRÔNICOS.
Somente a publicação em Diário Oficial tem validade para contagem de
prazo e isto é expressamente consignado em todos os meios alternativos de
acompanhamento de andamento processual. Recurso improvido.

Tipo da Ação: AGRAVO DE INSTRUMENTO


Número do Processo: 2002.002.00365
Data de Registro : 10/07/2002
Órgão Julgador: SETIMA CAMARA CIVEL
DES. MARLY MACEDONIO FRANCA
Julgado em 28/05/2002

A verificação quanto aos prazos, pela Internet, ressalvando-se as publicações


por Diário Oficial, devem prevalecer. Mister se faz, enquanto nossos legisladores não
avançam nos meios tecnológicos, até mesmo em face da grande burocracia do Congresso

170
Nacional, é preciso uma pacificação na jurisprudência – que, certamente, jamais poderá ser
casuística.

Extraindo a gravura do site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio


de Janeiro, se pode concluir pela agilização quanto aos prazos, no que diz respeito a juntada
de mandados etc.:

161

IV - CONCLUSÃO

A jurisprudência dos Tribunais se apresenta vacilante. Contudo, deverá


prevalecer o bom senso em termos de relativização dos prazos processuais em virtude de
informações prestadas pelos sites dos Tribunais.

161
http://www.tj.rj.gov.br

171
A doutrina, neste momento, é de grande importância para trazer aos
Tribunais o anseio dos profissionais que militam no Direito, dia-a-dia.

Uma experiência norte-americana, adotada pelo American Law Institute, é a


adoção dos Restatement´s, que são orientações doutrinárias e servem de embasamento para
diversos julgamentos.

Estamos longe de adquirirmos esta prática, ainda que as regras da common


law sejam uma crescente em nosso sistema. Se, de um lado, alcançamos vitórias em termos
de aplicação de princípios anglo-saxônicos, por outro, ainda estamos atravancados no
dilema se as máquinas de escrever facilitarão a adulteração dos atos processuais.

O processo eletrônico já é uma realidade mundial e algumas Cortes, como a


da Austrália, já se utilizam de meios eletrônicos para a resolução de conflitos.

O objetivo do processo é a pacificação social. Se, de um lado, o direito


material controla a sociedade, provoca o controle social por meio de imposições e
dispositivos não permissivos, de outro lado temos a ciência do processo a pacificar os
conflitos – seja na esfera cível, seja na criminal.

A evolução é própria do Direito e, em especial, do Direito Processual.

Neste diapasão, a Lei 10.259/2001 – promulgada juntamente com uma das


últimas reformas – prevê a utilização de meios eletrônicos para os atos processuais.
Contudo, ainda que a norma em questão tenha sido promulgada próxima da reforma do
CPC, ainda assim o parágrafo único do art. 154 restou vetado, quando previa a
possibilidade de utilização dos meios eletrônicos para a realização dos atos processuais.

Dentro deste raciocínio, entre manuscrito, máquina de escrever e fax, é fácil


concluir que os meios eletrônicos da telemática são mais seguros que um papel que se
dissolve com o sol ou com a queda de um café quente – o papel térmico do fax.

172
Para inutilizar um documento eletrônico é preciso muito mais que um
simples copo de café.

Somente para confirmar a expectativa de um dia possuirmos meios


eletrônicos, não restam dúvidas que se houvesse um incêndio – como ocorreu no TRT da 1ª
Região – os dados eletrônicos armazenados virtualmente, seriam recuperados com um
simples clique no mouse.

Contudo, talvez permaneçamos mais e mais anos discutindo a máquina de


escrever e os manuscritos tão confiáveis.

A evolução se faz necessária!

V – BIBLIOGRAFIA

DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da Reforma. Malheiros Editores, SP: 2002

GRECO, Leonardo et al. Direito e Internet. Ed. Revista dos Tribunais, SP: 2001

Fontes de Pesquisa

Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico – http://www.ibde.org.br

Superior Tribunal de Justiça – http://www.stj.gov.br

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – http://www.tjdf.gov.br

Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – http://www.tj.rj.gov.br

173
Revista de Direito Eletrônico – http://www.ibde.org.br/revista

Site Acadêmico do Prof. José Carlos de Araújo Almeida Filho –


http://www.almeidafilho.adv.br/academica

174
DOUTRINA INTERNACIONAL

SPAMMING: UMA PERSPECTIVA PORTUGUESA


Celso António Serra

Lisboa – 2003
1. As mensagens de carácter comercial transmitidas por correio electrónico.

O correio electrónico ou e-mail, na língua inglesa, é uma funcionalidade da world


wide web que permite que um ficheiro de computador seja transferido para outro
computador diferente. Essa funcionalidade é possibilitada pela acção de um modem, no que
concerne ao hardware e pela intervenção de um dos protocolos da Internet que é o
SMPT162 , sendo certo que as aplicações destinadas ao comércio podem usar protocolos
mais complexos, como por exemplo o X.400163 .
É corrente afirmar-se que o correio electrónico funciona com os mesmos princípios
que o correio clássico, com a vantagem de ser instantâneo. No que diz respeito ao envio de
correio de carácter comercial, podemos afirmar que não se trata de um fenómeno novo -
antes da Internet as empresas já procediam ao envio de mensagens comerciais através do
correio. Todavia, a Internet potenciou essa prática, tornando-se hábito a sua utilização
como meio de promoção, seja do sítio electrónico, seja dos produtos ou serviços das
empresas que realizam tal tipo de acção.
As possibilidades quanto ao conteúdo da mensagem electrónica enviada por correio
electrónico são tantas que ela pode ser constituída por ficheiros de texto, fotografia,
desenho, som ou imagem isoladamente, ou por alguns ou todos misturados. Por tudo isto,
os anunciantes, tal como na publicidade domiciliária, por telefone ou por fax, usam o
correio electrónico para mostrarem os seus produtos ou serviços. Mas existem limites a
essa actuação.

162
SMTP significa Simple Mail Transfer Protocol. Para uma descrição sumária dos vários protocolos que
compõe a Internet, ver LAWRENCE LESSIG, Code and Other Laws of Cyberspace, New York, Basic Books,
1999, pp. 101-102.
163
DAVID E. SORKIN, Unsolicited Commercial E-Mail and the Thelephone Consumer Protection Act of
1991, Buffalo Law Review, Buffallo University, n.º 45, 1997, ponto I.B, acessível a partir de
www.spamlaws.com.

175
O junk mail164 é um problema já conhecido que decorre do uso abusivo e massivo
do correio electrónico de carácter publicitário e que se insere, com muita acuidade, no
âmbito da publicidade ilícita efectuada na Internet. Este fenómeno já assalta o legislador
comunitário, que deseja que os Estados-Membros da União Europeia, o regulem de modo a,
pelo menos, existir uma disciplina jurídica, de tal sorte que a Directiva sobre o Comércio
Electrónico prescreve, no seu art. 7.º, uma série de regras para solucionar este problema 165 .
Apesar de tudo, a questão das mensagens publicitárias não solicitadas na Europa não tem a
mesma dimensão que atinge os EUA.
De acordo com a Directiva em questão, se o Estado-Membro permitir a
comunicação comercial não solicitada por correio electrónico, por parte dos prestadores de
serviços estabelecidos no seu território, ainda assim, ela terá que ser identificável como tal,
de forma inequívoca, a partir do momento da sua recepção166 . O princípio da identificação
da publicidade, plasmado no Código da Publicidade, vê-se agora também no art. 6.º, al. a)
da Directiva n.º 2000/31/CE, bem como em vários instrumentos de auto-regulação. Por
tudo, deve-se manter o princípio da necessidade de identificação da publicidade, o qual, na
verdade, decorre da necessidade de a publicidade não ser oculta167 .
Em suma, este princípio exige que a publicidade deve surgir aos olhos do público
identificada como tal, e, com isso, visa proteger o consumidor, aquele que é alvo da

164
Junk Mail é a publicidade entregue através de serviços postais, em mão, directamente no domicílio e,
mais recentemente, através de correio electrónico. Diz-se junk pois é este o adjectivo inglês para significar
lixo; aqui no sentido de inútil ou indesejado.
165
A Directiva sobre comércio electrónico é uma directiva-quadro horizontal, ou seja, que se aplica a
todos os serviços da sociedade da informação, exercido em linha. Assim, quando um serviço é promovido em
linha mas fornecido fora dela então só aquela primeira actividade está sujeita à disciplina da Directiva. Cfr.
quanto ao âmbito da Directiva sobre o comércio electrónico o estudo Comércio Electrónico e Serviços
Financeiros, Comissão das Comunidades Europeias, COM (2001) 66, Bruxelas 07.02.2001, pp. 6 e ss..
Ainda, sobre o art. 7.º da Directiva, LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens de correio
electrónico indesejadas (SPAM), in Direito da Sociedade da Informação, Vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora,
2003, p. 206.
166
Já em Abril de 2001, a Espanha tinha o seu Anteprojecto de Lei sobre os serviços da sociedade da
informação e comércio electrónico, e nos artigos 22.º e 23.º desse Anteprojecto trata-se das comunicações
comerciais por correio electrónico não solicitadas. Impõe-se a necessidade de identificação das comunicações
comerciais enviadas por correio electrónico, através da inserção das palavras «publicidade» ou «publi» no
local reservado ao assunto.
167
Veja-se o nosso Publicidade ilícita e abusiva na Internet, in Direito da Sociedade da Informação, Vol.
IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, p. 478 e A LEXANDRE LIBÓRIO DIAS PEREIRA, Comércio electrónico na
Sociedade da Informação: Da segurança técnica à confiança jurídica, Coimbra, Almedina, 1999, p. 90, onde
afirma que a publicidade oculta ou dissimulada leva à proibição do “uso de imagens subliminares ou outros
meios dissimuladores” (...) que veiculam publicidade “sem que os destinatários se apercebam da natureza
publicitária da mensagem”.

176
publicidade, de modo a que ao aperceber-se que está perante uma forma de publicidade se
previna ante o tipo de linguagem mais agressiva que pode ser utilizado.
Diremos agora que, face a esta exigência, não pode restar qualquer dúvida quanto à
natureza comercial ou publicitária da mensagem, difundida na Internet ou noutro suporte
publicitário qualquer. Mas, para lá da mensagem, do conteúdo, deve também ser claramente
identificável a pessoa por conta da qual a publicidade é efectuada168 . Este princípio permite
ao consumidor distinguir a publicidade de outro tipo de informação e, por outro lado,
obriga os profissionais da publicidade a um mínimo de lealdade e probidade, para defesa do
próprio consumidor.
Quanto ao direito vigente em Portugal, o art. 3.º do Código da Publicidade não
permite a diferença entre publicidade, no sentido de promoção dirigida ao público, e
contacto individual, persuasão individual sobre uma pessoa a fim de publicitar um bem ou
serviço. O facto de a publicidade efectuada através de correio electrónico ser destinada a
uma pessoa concreta, através de um endereço electrónico individualizado, e de ser
repetitiva, igual para todos os seus destinatários, não lhe retira a qualificação de
publicidade. Analogicamente podemos referir que também a publicidade feita nas ruas se
destina apenas à pessoa que é abordada e também é repetitiva, não sendo por isso que não é
qualificada como publicidade169 .
Na Internet as mensagens electrónicas comerciais não solicitadas são padronizadas
mas, muitas vezes, socorrem-se de algum tipo de software que permite acrescentar à
mensagem padronizada, indicadores personalizantes. Há programas que permitem
incorporar, numa mensagem de conteúdo repetido e igual para todos a quem for enviada, os
dados que o próprio internauta forneceu aquando da realização de algum inquérito na
Internet perante esse anunciante ou, mais grave, quando através dos cookies, ou outros
dispositivos, o anunciante consegue que se determinem esses dados sem o consentimento
do internauta170 .

168
É isso o que exige o art. 6.º, al. b), da Directiva n.º 2000/31/CE. Neste sentido, apresentava-se também
o art. 21.º, n.º 1 do Anteprojecto espanhol de transposição daquela Directiva. Cabe advertir que a identificação
da pessoa por conta da qual a publicidade é efectuada não é uma exigência actual plasmada nas leis da
publicidade. Essa exigência, prevê-se, só vigorará na nossa ordem jurídica após a entrada em vigor do
Decreto-Lei ou Lei de transposição da Directiva sobre Comércio Electrónico.
169
Vide o nosso Publicidade ilícita e abusiva na Internet, p. 538.
170
Os cookies e outras técnicas de tracking permitem a recolha, reprodução e disseminação de dados
pessoais e profetiza-se a sua expansão na Internet, cfr. BAKER & M CKENZIE, E-Commerce Law Practice, s/l,

177
Para além disso, pode muito bem acontecer que se utilizem listas de endereços, os
quais consubstanciam verdadeiros dados protegidos, pela Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro,
conhecida como Lei de Protecção de Dados Pessoais. Ora, esta lei consagra um regime de
protecção para as pessoas que têm os seus dados inscritos naquelas listas, tanto que o titular
dos dados pode exigir que os mesmos (v.g. nome e endereço) sejam eliminados de ficheiros
ou listas utilizadas para fins de marketing directo171 .
Quanto às mensagens electrónicas que acabámos de referir, ainda que de certa
forma individualizadas e personalizadas, não deixam de ter carácter publicitário pois elas
não são verdadeiramente individualizadas172 .
ALEXANDRE DIAS PEREIRA afirma que o correio electrónico, quando tenha carácter
comercial e se destine a transmitir mensagens publicitárias, se deve sujeitar ao regime do
art. 23.º Código da Publicidade, mas não ao regime da Lei n.º 6/99, de 27 de Janeiro173 . Por
nós, permitimo-nos discordar desta opinião e dizer que nem esta Lei, porque expressamente
afasta do seu campo de aplicação as mensagens enviadas por correio electrónico, nem o art.
23.º Código da Publicidade são passíveis de abarcar essa realidade.
Na verdade, o art. 23.º Código da Publicidade dirige-se a publicidade entregue no
domicílio do destinatário e não a publicidade enviada para a caixa de correio electrónico do
destinatário. Parecem-nos ser realidades diversas, na medida em que a caixa de correio
electrónico de uma qualquer pessoa não é passível de entrar no conceito de domicílio. E se
avançar mais, basta dizer que se o destinatário estiver em férias em país estrangeiro, sem lá
possuir qualquer domicílio, pode muito bem aceder àquela caixa de correio electrónico.

s/d, pp. 9 e 10, acessível em www.bakernet.com. Este assunto é de extrema importância pois os dados
pessoais constantes de ficheiros electrónicos são protegidos pela lei que também estabelece o regime da sua
utilização. Sobre este assunto, na literatura portuguesa, PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, Protecção de Dados
Pessoais e direito à privacidade, in Direito da Sociedade da Informação, Vol. I, Coimbra, Coimbra Editora,
1999, pp. 241 e ss.; A MADEU GUERRA, A Lei de Protecção de Dados Pessoais, in Direito da Sociedade da
Informação, Vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, 2001, pp. 145 e ss.; M ANUEL LOPES ROCHA e M ÁRIO
M ACEDO, Direito no Ciberespaço, Lisboa, Cosmos, 1996, pp. 100 e ss..
171
Cfr. LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., pp. 210 e ss.
172
No mesmo sentido, PASCAL W ILHELM e GAËL KOSTIC, Internet, l’émergence..., p. 8. Entre nós, a
qualificar este tipo de mensagens electrónicas como publicidade, PAULO M OTA PINTO, Publicidade
Domiciliária..., p. 275.
173
A LEXANDRE LIBÓRIO DIAS PEREIRA, Comércio electrónico..., p. 94.

178
Enfim, ou se toma o conceito de domicílio por demasiado amplo de sorte que um
mero computador portátil, munido com um modem, pode ser considerado um domicílio, ou
então a tese de ALEXANDRE DIAS PEREIRA não colhe174 .
O envio pelo anunciante ao internauta que solicitou uma mensagem de carácter
comericial não traz problemas de maior à ordem jurídica pois existe um acto de
consentimento permitindo à empresa ou ao anunciante efectuar comunicações do género
daquelas a que nos vimos referindo. O problema começa a existir quando se trata de
mensagens electrónicas, de carácter comercial, não solicitadas.

2. A tutela do receptor da mensagem electrónica não solicitada.

As mensagens comerciais, ou publicitárias, não solicitadas enviadas por via


electrónica175 a potenciais clientes conduzem-nos a uma tensão entre os interesses em jogo
no âmbito do comércio electrónico. Sejam eles dos internautas, dos anunciantes ou outros,
como sejam as agências de publicidade.
Temos que verificar quais os interesses coincidentes, quais os que estão em choque
e quais as possíveis saídas para a resolução do problema 176 . Para se chegar a uma solução
válida e equilibrada temos ainda que olhar aos intervenientes e ao seu interesse no envio ou
recepção de mensagens publicitárias através de correio electrónico177 .

174
Já nos tinhamos pronunciado neste sentido no nosso Publicidade ilícita e abusiva na Internet, in Direito
da Sociedade da Informação, Vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, pp. 539-540 e, entretanto, também
LUÍS M ENEZES LEITÃO , no seu estudo A distribuição de mensagens de correio electrónico indesejadas
(SPAM), primeiro nos Estudos em Homenagem à Professora Doutora Magalhães Collaço e agora em Direito
da Sociedade da Informação, Vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, p. 210, aderiu ao nosso pensamento.
175
PAULO M OTA PINTO admite tratar-se de publicidade, embora diga não ser a mesma, em rigor, entregue
no domicílio do destinatário. E diz ainda que aquele tipo de publicidade pode ter, em alguns aspectos, o
mesmo tipo de soluções que são apresentados para a publicidade entregue no domicílio em suporte escrito,
por telefone ou telecópia. Sobre este tema ver, deste autor, Publicidade Domiciliária..., p. 275.
176
Por exemplo, nos Estados Unidos da América, desde Novembro de 1996, que os anunciantes se
socorrem de preceitos constitucionais, in casu, da primeira emenda da Constituição, alegando que a liberdade
de expressão não pode ser coartada por uma entidade privada, como o são os servidores de acesso e de
serviços, os quais, nalguns casos não permitem a realização do envio de milhões de mensagens por correio
electrónico num mesmo dia. Para este assunto, relatando o caso da empresa Cyber Promotions vs. AOL,
KARIN M IKA, Information v. Commercialization: The Internet and Unsolicited Electronic Mail, The Richmond
Journal of Law and Technology, Vol. IV, Issue 3, 1998, ponto III.
177
No que diz respeito aos interesses na publicidade domiciliária por telefone ou telecópia, cfr. PAULO
M OTA PINTO, Publicidade Domiciliária..., pp. 279 e ss..

179
Primeiro, temos que atender ao receptor da publicidade assim veiculada. É certo que
o destinatário não quer ser incomodado com mensagens que não deseja. Não pretende ser
interrompido ou levado a interromper a sua actividade, seja laboral178 , ou outra, para abrir e
ler as mensagens que lhe são enviadas para a sua caixa de correio electrónico, quando assim
o não solicitar. Não pretende perder tempo com o exercício de verificar o que lhe enviaram.
É o receptor de tais mensagens quem sai onerado, com vantagem para todos os
restantes, uma vez que o anunciante anuncia, a agência publicitária e empresas que
organizam a mensagem facturam, bem como, os servidores de acesso à Internet e os
exploradores das linhas telefónicas. Só o internauta sai a pagar, logo terá que ser sobre ele
que recairá a protecção desejada neste domínio. É ele que perde tempo, o qual pode revestir
significado económico179 , a identificar e a eliminar o junk mail, é ele que paga o acesso
para poder efectuar tal triagem e é ele que pode ver a sua caixa de correio electrónico
entupida por ter um limite quantitativo de espaço para essas mesmas mensagens ou, ainda,
ver o seu computador atingido por vírus informáticos.
De todo o modo, não se pode colocar em causa a afirmação de que o consumidor
deve poder escolher quais as mensagens de carácter publicitário que quer receber e ainda
que ele deve ter a possibilidade de se opor ao seu envio pelos anunciantes.
É que a publicidade, via correio electrónico, assemelha-se aos serviços publicitários
efectuados por telefone e à publicidade postal não solicitada. É uma prática vantajosa para
o anunciante, uma vez que leva ao conhecimento do consumidor só aquilo que deseja e não
aquilo que o consumidor procura. Pode ser efectuada simultaneamente para milhares de
pessoas, a partir de qualquer local, a qualquer hora e numa fracção de segundo180 .
O comerciante ou anunciante, se assim lhe quisermos chamar, descobriu que a
Internet lhe permite chegar directamente ao consumidor sem grande esforço ou
investimento, mediante este mecanismo das mensagens comerciais não solicitadas. E mais,
sabe que é muito mais eficiente uma mensagem publicitária deste género do que a

178
Quanto a este aspecto colocam-se problemas de despedimento por excessiva utilização da Internet e
ainda quanto ao controlo e verificação daquela utilização assim como do conteúdo das mensagens enviadas
pelos trabalhadores. Sobre este tema cfr. o trabalho de PETER SCHNAITMAN, Building a Community Through
Workplace E-mail: The New Privacy Frontier, Michigan Telecommunication Technology Law Review, n.º 5,
177, 1999, acessível em www.mttlr.org/volfive/schnaitman.html.
179
PAULO M OTA PINTO, Publicidade Domiciliária..., p. 284. Todavia, duma perspectiva relacionada com o
tráfico na rede, apontando para a ideia de que o spam também é oneroso para os fornecedores de acesso, LUÍS
M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., pp. 192-193.

180
realização de um sítio electrónico, onde anuncie os seus produtos, na medida em que a
esperança dos internautas irem lá directamente pode não ser muito grande181 .
Em conclusão, diríamos que o internauta, destinatário da mensagem publicitária,
tem a legítima expectativa de não estar sujeito a receber publicidade na sua caixa de correio
electrónico, pelo menos quando assim manifestar esse desejo. Quanto a nós, é a ele que
deve ser dada a possibilidade de escolher182 .
Para o anunciante, ao contrário do que sucede com a publicidade por via postal ou
por telefone, não há custos avultados de envio; poucos ou nenhuns empregados são
necessários183 . Já para o receptor, este tipo de acção publicitária, não deixa de trazer custos
e é por isso que os problemas e conflitos começaram a surgir. Se a mensagem é realmente
indesejada pelo seu receptor, ela pode tornar-se incómoda e até dispendiosa. Pode demorar-
se tempo a ler mensagens indesejadas, simplesmente a apagá-las em virtude do seu assunto
ou de uma leitura rápida. O mail cover184 é um dos aspectos que permite dizer que este tipo
de mensagem é dispendiosa para o receptor, nem que seja a nível de tempo.
Contudo, a nível monetário também há perdas - será o caso do tempo de ligação a
mais à rede, necessário para efectuar aquelas operações, que onera aquele que estabelece a
ligação. Mesmo com softwares destinados a filtrar as mensagens e permitir que cheguem à
caixa de correio electrónico apenas as que passam os critérios definidos, não se colmata o
problema185 . Os emissores de mensagens publicitárias não desejadas conseguem iludir tais
instrumentos. É que eles visam, sem dúvida, atingir o maior número de potenciais
consumidores ou adquirentes dos seus produtos, pelo que tentam sempre obviar a qualquer
defesa dos consumidores. Para além disso, pretendem chegar ao que PAULO MOTA PINTO186
chama de destinatários apropriados, ou seja, ao público-alvo. Este será, regra geral, o
interesse das empresas que organizam a comunicação publicitária, porque só com o sucesso
da campanha é que a sua imagem sai reforçada.

180
KARIN M IKA, Information..., parágrafo 10.
181
DAVID E. SORKIN, Unsolicited Commercial E-Mail..., ponto I.B.. Denota-se neste campo que é hoje
preocupação das empresas titulares de marcas anunciarem fora da rede o seu endereço electrónico por forma a
divulgá-lo e a que se visite o mesmo.
182
Veja-se o nosso Publicidade ilícita e abusiva na Internet, in Direito da Sociedade da Informação, Vol.
IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, pp. 541-542.
183
Cfr. LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., p. 192.
184
Mail cover é o nome inglês para a actividade de controlo das comunicações com base no seu aspecto
exterior.
185
Cfr. LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., pp. 197-198.

181
Finalmente, quanto aos que são titulares do suporte publicitário, desejam que se
realize o maior número de comunicações possíveis, porquanto essa é uma forma de
obterem, em princípio, mais rendimento. E isto porque as ligações aos servidores estão a
decorrer e os períodos telefónicos a cair enquanto os destinatários abrem os seus correios
electrónicos.
Como já vimos, para haver publicidade terá que existir necessariamente uma
comunicação ao público, destinada a pessoas indiferenciadas, logo não determinadas. A
mensagem, para integrar o campo que vimos abordando terá que ser publicitária, o que nem
sempre é fácil de distinguir de outro tipo de discurso187 .
Na rede é possível que, para além das mensagens de carácter público e
indiferenciado, se enviem mensagens a sujeitos determinados e individualizados. Um
banner é dirigido a todos os internautas, está aberto a quem quiser vê-lo e a quem quiser
utilizar aquilo que ele permite, que, na maioria dos casos, é um hipernexo para outro sítio
electrónico. Contudo, através dos cookies188 , o anunciante pode obter informações acerca
dos visitantes do seu sítio electrónico, ou mesmo através de inquéritos dirigidos aos
internautas que lhe permitem reunir dados daqueles que têm contacto com as páginas que
ele disponibiliza na Internet.
Com isso, tornou-se fácil saber quem são os utilizadores de determinado sítio
electrónico e assim dirigir-lhe mails individualizados e até personalizados.

186
PAULO M OTA PINTO, Publicidade Domiciliária..., pp. 279-280.
187
Idem, p. 315 e n. 44.
188
O problema destas formas de controlo traduz-se em restrições de acesso a determinados sítios
electrónicos e suas páginas, na medida em que só pode aceder quem tiver o cookie no seu computador, para
além de que há muitos internautas que não desejam ver tal software instalado no seu computador. De acordo
com LAWRENCE LESSING, estas opções técnicas decorrem da necessidade da rede se adaptar ao comércio e
gerar uma maior segurança na transferência de dados, em virtude da Internet não ser na origem destinada ao
comércio. Daqui derivam, na opinião daquele autor, diversos desvios ao código original da Internet. Sobre as
mudanças na arquitectura e estrutura da Internet vide, daquele autor, Code and Other Laws of Cyberspace,
New York, Basic Books, 1999, pp. 30 e ss.; The Code in Law, and the Law in Code, texto base da
apresentação efectuada no pcForum 2000, Phoenix e Architecting for Control, apresentação realizada no
Internet Political Economy Forum, Cambrige, Reino Unido, estes acessíveis a partir de acessível a partir de
http://cyberlaw.stanford.edu/lessig/content/index.html. Podemos ainda dizer que, os cookies já têm a
capacidade de escolherem a publicidade que aparece nos banners em função das características que reconhece
ao internauta. SÉVERINE DUSSOLLIER, Les Outils..., pp. 42-43, dá o exemplo de que num qualquer motor de
busca, que tenha um contrato nesse sentido com alguma empresa, onde se coloque a palavra “car” ou
“viatura”, surja logo em seguida uma publicidade a determinada marca ou modelo de automóvel produzido
pela referida empresa. Ou que, de acordo com as informações recolhidas pelo software que o cookie encerra,
assim se vá escolhendo qual a mensagem publicitária a colocar em linha.

182
Apesar de normalmente o internauta não desejar este tipo de correio electrónico
publicitário, olhando para ele como algo de irrelevante e, por isso, a evitar, pensamos que
esse sentimento decorre da própria história da Internet como uma rede não comercial e
ainda sustentada, inicialmente, numa cultura anti-comercial189 .

3. Os modelos de solução.

Quanto às opções para a resolução deste problema várias soluções se nos deparam.
Podia proibir-se a publicidade enviada através de correio electrónico190 . Poderia também,
optar-se por uma desregulamentação total. Parece que, neste particular, é isso que ainda
acontece em Portugal, uma vez que não temos qualquer norma emanada dos competentes
órgãos estatais a regular este fenómeno 191 .
A nós, salvo o devido respeito, é-nos incompreensível o n.º 2 do art. 1.º da Lei n.º
6/99, de 27 de Janeiro sobre publicidade domiciliária por telefone ou telecópia, uma vez
que não abrange a realidade que agora estudamos192 .
Quanto às intervenções do domínio da auto-regulação por parte das empresas de
marketing directo, que são quem actua neste âmbito, conhecem-se algumas. São já
conhecidos Códigos de Conduta sobre o junk mail em diversos países. Por exemplo, PAULO
MOTA PINTO apresenta, entre outros, os seguintes: Estados Unidos da América, Canadá,

189
Cfr. DAVID E. SORKIN, Unsolicited Commercial E-Mail..., Ponto I.B. e o nosso Publicidade ilícita e
abusiva na Internet, in Direito da Sociedade da Informação, Vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, p.
544.
190
A doutrina mais autorizada nesta matéria, ainda assim afirma que uma das contribuições para que o
spam prolifere é a própria legislação que o regula sem o proibir, cfr. DAVID E. SORKIN, Technical and Legal
Approaches to Unsolicited Electronic Mail, in University of San Francisco Law Review, Vol. 35, 2001, p.
343, n. 84. Para as razões duma possível inconstitucionalidade desta proibição vide, PAULO M OTA PINTO,
Publicidade Domiciliária..., pp. 285 e 288 e ss..
191
Apenas nos podemos ancorar na Directiva 2000/31/CE, que está em fase de transposição e irá abordar a
matéria aqui em questão, conforme temos vindo a fazer ao longo deste estudo.
192
Neste sentido, apontando para o facto de se dever remeter a publicidade por correio electrónico para o
regime da publicidade domiciliária previsto no Código da Publicidade, A LEXANDRE LIBÓRIO DIAS PEREIRA,
Comércio electrónico..., p. 94. Os Estados Unidos da América, já em 1991, tinham o Telephone Consumer
Protection Act, legislação também destinada a combater as chamadas telefónicas de carácter publicitário pré-
gravadas e as mensagens publicitárias por telecópia, e onde se não aceitava a sua aplicação ao junk mail.
Temos conhecimento que entraram no Congresso dois projectos de Lei sobre a questão do correio electrónico
não solicitado, um deles é o denominado Commercial Electronic Mail Act of 2001, de 3 de Janeiro, que opta
pelo sistema de opt-out, que se dirige ao coreio electrónico de carácter comercial e outro é o Anti-Spamming
Act of 2001, de14 de Março, que visa tão só combater o spam, mas fora do âmbito comercial. Apesar disso,
diz-nos LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., pp. 204-205, que nos EUA, a nível federal,
não foi aprovada qualquer legislação apesar de existirem projectos em discussão.

183
Austrália, Reino Unido, França, Bélgica, Países-Baixos, Espanha e Itália193 . Exemplo são
também, numa lógica de cariz planetário, as Linhas directrizes da Câmara de Comércio
Internacional em matéria de publicidade e marketing na Internet, que já existem desde
1998.
No entanto, o recurso ao fenómeno da auto-regulação pode não ser o melhor, uma
vez que tal recurso importa limitações naturais. Desde logo, não está sujeito a fiscalização
estatal e só abrange os sujeitos que se encontrem agregados em alguma associação, o que
permite sempre a existência de comportamentos desviantes paralelos. E, pensamos que
pode também ser facilmente dominado pelos interesses de grupos de pressão mais fortes194 .
No campo fáctico, os os utilizadores têm oportunidade, eles próprios, de tomar
algumas atitudes para combater o spamming, como seja a utilização de filtros de mensagens
ou a destruição das mensagens sem sequer tomarem tempo com a sua leitura195 . Todavia,
essas práticas importam custos para quem as pratica e, por outro lado, o software destinado
a eliminar o junk mail é capaz de reduzi-lo, mas não de o eliminar por completo. É que as
mensagens de correio electrónico, nesse caso, terão de passar por um crivo definido e pré-
determinado pelo internauta a fim de poderem entrar na sua caixa do correio electrónico, o
que nem sempre conduz a resultados de absoluto sucesso.
De facto, estes mecanismos pessoais não são, na maioria dos casos, suficientes,
colocando-se então a questão da colaboração com terceiros. Será que os provedores de
serviços podem eles próprios filtrar à partida as mensagens indesejadas por um seu cliente,
se assim tiverem acordado? Pensamos que um provedor de serviços pode até bloquear todo
o correio electrónico proveniente de um spammer conhecido196 .
Os internautas ainda poderão, para além das medidas defensivas já apresentadas,
adoptar outras. Há quem mantenha dois endereços electrónicos, um pessoal e outro de cariz

193
PAULO M OTA PINTO, Publicidade Domiciliária..., p. 286.
194
Vide DAVID E. SORKIN, Technical..., p. 327, onde afirma que a baixa confiança na auto-regulação leva
à opção por medidas técnicas e legais, de constrangimento da acção dos anunciantes que praticam o spam.
Ainda pode compulsar-se o nosso, Publicidade ilícita e abusiva na Internet, in Direito da Sociedade da
Informação, Vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, p. 545 e LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de
mensagens..., pp. 195 e ss., onde se apresenta a reacção ao spamming através das normas sociais e da auto-
regulação. Quanto às formas de constranger as acções e actividades on-line, LAWRENCE LESSIG, Code and
Other Laws of Cyberspace, New York, Basic Books, 1999, p. 89.
195
Para uma abordagem sobre a origem do termo spam, vide LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de
mensagens..., p. 191, n. 1.
196
DAVID E. SORKIN, Technical..., p. 346. Contudo, poderá haver interferência em mensagens legítimas e
desconexas com qualquer actividade menos própria (Ob. cit., p. 349).

184
mais aberto para relacionamentos comerciais. Ainda há quem demande o emissor deste tipo
de mensagem para este deixar de o fazer, mas, na maioria destes casos, estes pedidos são
ignorados.
Finalmente, pode apontar-se como solução, e que é muitas vezes levada a cabo, até
de modo desorganizado, mas com grandes repercussões, a retaliação contra os anunciantes
que utilizam o spam. E isso faz-se entupindo a própria caixa postal do anunciante ou
através da colocação de mensagens e informações na web acerca dele e do seu
comportamento197 . O perigo destas retaliações é que, muitas vezes, a agressão pode tomar
contornos de acto criminoso, o que de todo se deve evitar e afastar, assim como se poderão
violar direitos de autor e da propriedade industrial198 .
No entanto, as acções que o internauta tem que tomar para se defender, ainda assim
são onerosas e envolvem o dispêndio de recursos económicos.
De modo, relativamente comparativo, podemos chamar aqui à colação os
argumentos que levaram a uma perseguição contra a publicidade não solicitada através de
telecópia199 . Entre eles, o custo e a inconveniência para o receptor ou destinatário da

197
Tivemos conhecimento de que o Tribunal Correccional de Lyon condenou, em 20 de Fevereiro de 2001,
um particular por este ter entupido a caixa de correio electrónico do seu ex-patrão, uma empresa de
informática. O seu novo empregador, uma empresa, também dedicada à informática, e de cujos meios o
trabalhador se muniu para praticar tal acção foi desresponsabilizada. O resumo deste caso pode ser visto em
www.legalis.net/jnet/2001/actualite_03_2001.htm.
198
Com base nisto muitas empresas aproveitam a qualificação destes direitos como absolutos para
retirarem da linha muitos sítios electrónicos que lhes são desfavoráveis. Veja-se o caso francês do sítio
electrónico <jeboycottedanone.com>, em que, com base no direito à marca, a empresa Danone conseguiu que
o Tribunal de Grande Instance de Paris (Ordonnance de Référé, de 14.05.2001) encerrasse aquele sítio
electrónico, que lhe era desfavorável, pois denunciava a política social e de (des)emprego daquela empresa,
na medida em que nele se encontravam reproduções da marca Danone atentatórias a direitos protegidos pela
propriedade industrial. Todavia, o principal interesse, em nosso entender, da empresa detentora da marca é o
terminar com o proliferar da divulgação de mensagens que lhes são desfavoráveis, assim como o apelo ao
boicote. Num primeiro momento a jurisprudência, nomeadamente alemã, admitiu como prevalecente o
interesse económico face à liberdade de expressão, sendo que os que faziam a crítica se teriam que ater ao
princípio do maior cuidado possível com os direitos alheios (argumento também utilizado no aresto do
Tribunal sobre o caso Danone) e de evitar toda a causação de danos não incondicionalmente necessários para
a defesa dos interesses. Mas a partir do caso Lüth essa concepção foi abandonada, presumindo-se uma
legitimidade do “livre discurso”, mas sempre com determinados limites. Vide, para o caso Lüth e toda a
problemática da legitimidade e limites à crítica ao livre desenvolvimento comercial, SINDE M ONTEIRO,
Responsabilidade..., pp. 207-222. Ainda sobre o “direito à empresa”, que tutela estas situações, cfr. LUÍS
M ANUEL TELES DE M ENEZES LEITÃO , O Enriquecimento..., p. 762, n. 117, onde informa que se trata de um
direito que se teorizou como “outro direito”. Quanto à posição da jurisprudência alemã, tem aceitado a
protecção delitual deste direito, no âmbito do §823, I BGB, não sendo susceptível de se lhe aplicar o instituto
do enriquecimento sem causa (ob. cit., pp. 763-764).
199
DAVID E. SORKIN, Unsolicited Commercial E-Mail..., ponto I.C..

185
publicidade, objecção que vale tanto para a telecópia, como para o correio electrónico não
solicitado, assim como para o telefone.
Quanto à telecópia apontavam-se ainda os custos com papel e tinta por parte do
receptor. É certo que isto não acontece no caso do correio electrónico. Todavia, pode ser
que o internauta pague ao seu servidor de acesso contraprestações conforme o número de
mensagens que abrir e certamente pagará a ligação à rede seja à hora ou por uma taxa de
utilização mensal ou outra.
Para além disso, o próprio espaço que a mensagem ocupa, seja no disco rígido do
computador, seja na própria caixa do correio, que muitas vezes são limitadas, consubstancia
um encargo para o receptor de tais mensagens publicitárias.
Outra questão tem a ver com a intromissão na vida privada e, desde já se diga, que a
chamada telefónica, com fins publicitários, não solicitada é mais intromissiva que o correio
electrónico. É que aquelas são interactivas e exigem um comportamento activo por parte do
receptor - terá que atender a chamada e, com isso, contactar directamente com outra pessoa.
No que diz respeito à mensagem publicitária enviada por correio electrónico ela
pode ser também intromissiva, uma vez que, nalguns casos, a sua chegada ao computador
faz com que este emita um sinal audível ou visual e leve o utilizador a carregar numa ou
mais teclas de modo a poder prosseguir a operação que anteriormente estava a levar a cabo.
Por tudo isto, parece-nos que o correio electrónico não solicitado pode ser mais
intromissivo que o próprio fax, mas nunca o será mais que o telefone 200 .
DAVID E. SORKIN aponta, como solução, a combinação de iniciativas voluntárias da
indústria da publicidade, como a identificação das mensagens publicitárias enviadas por
correio electrónico, a existência de listas de exclusão e a utilização de meios técnicos, como
o uso de filtros para correio electrónico201 .
Denota-se aqui o afastamento da regulação ou intervenção estatal, como é próprio
dos autores norte americanos.

200
Não se fala aqui, por deslocado em relação ao tema deste trabalho, do problema que é a própria recolha
de dados na Internet, como seja o seu endereço electrónico para depois se lhe enviarem este tipo de
mensagens. Vide, LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., p. 194, onde realça os problemas
sobre a lesão da privacidade que o internauta opde sofrer, uma vez que não é deixado sozinho.
201
DAVID E. SORKIN, Unsolicited Commercial E-Mail..., Conclusion.

186
Há ainda alguns, como KARIN MIKA 202 que para além destes aspectos pensam ser
possível a resolução do problema através da intervenção dos provedores de acesso e de
serviço que, através de esquemas contratuais, não permitirão a realização de acções do
género daquelas que temos estado a analisar até aqui.

4. O opting-out.

A nosso ver a solução deste problema passará, como decorrerá da transposição da


Directiva n.º 2000/31/CE, por uma intervenção legislativa, que terá apenas que ter em
atenção dois tipos de possibilidades203 . Por um lado, a possibilidade de um sistema de
proibição da realização de comunicações publicitárias, efectuadas através de correio
electrónico, excepto quando o receptor a permita. É o chamado opting-in. Ou então, um
sistema assente numa regra geral de permissão de realização de comunicações publicitárias,
efectuadas através de correio electrónico, salvo quando o internauta a isso se opuser. É
nisto que consiste o opting-out 204 .
Apesar do envio de correio electrónico com mensagens comerciais, hoje já é
possível, nalguns casos, ao internauta inscrever-se em listas de consumidores que não
desejam receber esse tipo de mensagens ou documentos promocionais 205 . A Directiva sobre
o Comércio Electrónico prevê, no seu art. 7.º, n.º 2 que os Estados-Membros deverão tomar
providencias no sentido de os prestadores de serviços que enviem as comunicações
comerciais não solicitadas por correio electrónico deverem consultar regularmente e
respeitar os registos de opção de não receber tais comunicações.
O sistema do opt-out é razoável e aceite pelas associações de empresas de marketing
directo, podendo ser complementado com as listas Robinson, que são precisamente aqueles

202
KARIN M IKA, Information..., parágrafos 36-37.
203
PAULO M OTA PINTO, Publicidade Domiciliária..., pp. 287-288.
204
Já no Luxemburgo se tomou a opoção do opt-out, através da sua lei, de 14 de Agosto 2000, relativa ao
comércio electrónico. Cfr. M ATHIEU A BBOUD, Marketing Direct: La Communication Commerciale Non
Sollicitée face à La Réglementation Concernant Les Nouvelles Technologies, Juriscom.net, de 11 Junho de
2001, acessível em www.juriscom.net/pro/2 /cns20010611.htm.
205
PASCAL W ILHELM e GAËL KOSTIC, Internet, l’émergence..., p. 6.

187
registos a que nos acabámos de referir. Todavia, existem várias formas de efectivação do
sistema de opt-out 206 .
Por exemplo, a possibilidade de solicitação de retirada do endereço electrónico ou
outros dados da lista de destinatários pode ser feita através de uma chamada para um
número de telefone grátis ou para um determinado endereço, electrónico ou não,
disponibilizado pelo anunciante ou por uma entidade central, se apenas houver uma lista
controlada por essa entidade, com obrigação da sua consulta periódica, pelos emissores de
correio electrónico de carácter comercial207 .
Apesar de considerarmos que através do recurso ao sistema do opting-out se
consegue evitar a publicidade indesejada, achamos também necessária a intervenção do
legislador, para lá de possíveis atitudes tomadas pelos publicitários, de modo a dar-se
garantias de uma tutela efectiva do consumidor208 . Ao invés, apenas com a acção dos
internautas e sem a possibilidade de controlo estatal decorrente da natureza descentralizada
da Internet, os anunciantes poderão continuar a tomar medidas de circunvenção aos
obstáculos que lhes aparecem.
No que respeita ao Código da Publicidade, ele prevê, no art. 23.º, o regime para a
publicidade domiciliária e aí estabelece apenas exigências quanto ao conteúdo da
publicidade e não quanto à sua forma ou suporte utilizado. Contudo, cremos que essa
norma não visa disciplinar o fenómeno que aqui tratamos. Já o art. 8.º, n.º 1 Código da
Publicidade, onde se exige que a publicidade deve ser identificável como tal, deve ser
sempre respeitado. Facto que também está estatuído no art. 7.º, n.º 4, da Lei n.º 24/96, de 31
de Julho (Lei de Defesa do Consumidor).

206
Veja-se, LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., p. 199, onde se refere que o sistema de
opt-out não é isento de críticas, apesar de ter a preferência de quem se debruça sobre o tema.
207
DAVID E. SORKIN, Technical..., p. 374.
208
DAVID E. SORKIN, Technical..., p. 352, afirma que o sistema de opt-out é mais eficaz no caso da
publicidade veiculada por fax e telefone, do que por correio electrónico pois este é barato, necessita de quase
nenhuma mão de obra e não são precisos materiais. Chamando ainda a atenção para o facto de, uma resposta a
solicitar a retirada da lista de possíveis destinatários da publicidade veiculada por correio electrónico se tornar
numa confirmação da veracidade do endereço electrónico e de que o internauta presta alguma atenção à
mensagem enviada (Ob. cit., p. 353 e n. 130). Para uma discussão dos sistemas de opt-in e opt-out, no
contexto da política da privacidade, vide M ARC ROTNBERG, Fair Information Practices and the Architcture of
Privacy (What Larry Doesn’t Get), in Stanford Technology Law Review, Vol. 1, 2001, Parágrafo 29, acessível
a partir de www.strl.stanford.edu.

188
Este princípio exige-se sempre pois só assim se confere ao destinatário da
mensagem publicitária a possibilidade de adquirir consciência dos objectivos dela.
Evitando-se, por outro lado, a existência de influências subliminares ou inconscientes.
Mas mais, a identificação permite a actuação mais eficaz dos filtros de correio
electrónico indesejado. E, se se exigisse uma rotulagem, digamos assim, da mensagem,
com a utilização de um código predefinido no início do assunto (normalmente aquilo que
aparece na caixa postal como subject:) permitir-se-ia uma filtragem ainda mais eficiente
dessas mensagens 209 . Mesmo no caso de se não utilizarem filtros seria mais fácil evitar uma
demasiada perda de tempo a ler a mensagem publicitária porque o mail cover também se
torna mais fácil de realizar.
Por tudo o que dissémos, parece-nos que não será lícito o envio de uma mensagem
promocional por correio electrónico se não estiver identificada. Com isto, é ilícita a
mensagem publicitária que estiver disfarçada, como se de uma correspondência particular
se tratasse210 . Sendo ainda certo que autores como PAULO MOTA PINTO qualificam como
enganosa a publicidade oculta, na medida em que visa tirar vantagens a partir do engano
que provoca sobre a própria natureza da mensagem e devido à falta de consciência do
destinatário sobre a própria mensagem211 .
Por nós, propendemos por uma solução de opting-out no campo do correio
electrónico de carácter publicitário não solicitado, em que é suficiente a existência de uma
lista Robinson junto de cada anunciante, também conhecida por do-not-call list 212 , em que
quem não desejasse ser um dos destinatários possíveis da publicidade lá se inscreveria,
acompanhada, ou não, de listas de preferências como acontece, na Inglaterra213 .

209
Neste sentido, DAVID E. SORKIN, Technical..., pp. 375 e ss..
210
No mesmo sentido, PAULO M OTA PINTO, Publicidade Domiciliária..., p. 294.
211
Idem, p. 314. Neste particular, cabe referir, no que respeita à publicidade efectuada através de correio
electrónico, que começou a proliferar uma prática, que temos por publicidade enganosa, que é a de se
receberem mensagens como se o seu emissor fosse um nosso amigo, a combinar um encontro num
determinado estabelecimento ou mesmo a falar de um pretenso encontro lá e sempre enaltecendo o mesmo.
212
Ver DAVID E. SORKIN, Unsolicited Commercial E-Mail and the Thelephone Consumer Protection Act
of 1991, Buffalo Law Review, Buffallo University, n.º 45, 1997, acessível a partir de www.spamlaws.com.
Cfr. LUÍS M ENEZES LEITÃO , A distribuição de mensagens..., maxime pp. 211-212, onde conclui que em
Portugal já está implementado o sistema de opt-out no que se refere ao correio electrónico indesejado de cariz
comercial, decorrente das regras dos art. 12.º da Lei 69/98, de 28 de Outubro e do art. 11.º do Decreto-Lei n.º
143/2001, de 26 de Abril que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva 97/7/CE sobre a protecção do
consumidor nos contratos à distância.
213
Já assim, no nosso, Publicidade ilícita e abusiva na Internet, in Direito da Sociedade da Informação,
Vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, p. 551.

189
Quanto às soluções que se podem apontar para a resolução do problema do correio
electrónico não solicitado, poderá dizer-se que uma simples alteração legislativa respeitante
ao art. 1.º, n.º 2 da Lei n.º 6/99, de 27 de Janeiro, sobre publicidade domiciliária por
telefone e por telecópia, de modo a aplicá-la a este fenómeno, seria a nosso ver suficiente e
desejável.
Assim, restarão os esforços dos governos com a sua intervenção legislativa e
persuasiva para com as entidades que actuam neste campo, como sejam as associações de
marketing directo, muitas das quais, em abono da verdade, já têm códigos de conduta para
regular o fenómeno do junk mail. Também é verdade que muitos servidores de acesso
impõem uma política de respeito pelos internautas, não permitindo aos anunciantes a
prática do spam, como também é conhecido este fenómeno. Contudo, devido à natureza
descentralizada da Internet e do baixo custo deste modo de promoção de produtos, os
esforços levados a cabo no âmbito da auto-regulação não têm colhido.

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Droit des Technologies de l’Information, Bruxelles, Bruylant, 1999.

192
Resumo de Trabalho desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Direit o Elet rônico e Cidadania
Josília Fassbender Barreto do Nascimento
Mestranda em Direito, Estado e Cidadania – UGF-RJ; Professora da Faculdade de Direito da
Universidade Católica de Petrópolis; Professora do Curso de Pós-Graduação em Direito
Processual Civil da Faculdade de Direito da Universidade Católica de Petrópolis

RESUMO DO TRABALHO DESENVOLVIDO PELO GRUPO DE


PESQUISAS DIREITO ELETRÔNICO E CIDADANIA

Profa. Josília Fassbender Barreto do Nascimento


Pesquisadora

Grupo de Pesquisa
Direito Eletrônico e Cidadania

Identificação Recursos Humanos Linhas de Pesquisa Indicadores do Grupo

Identificação
Dados básicos
Nome do grupo: Direito Eletrônico e Cidadania
Status do grupo: certificado pela instituição
Ano de formação: 2002
Data da última atualização: 30/11/2003 20:17
Líder(es) do grupo: José Carlos de Araújo Almeida Filho - josecarlos@direitoprocessual.org.br
Aires Jose Rover - airesjr@ccj.ufsc.br

Área predominante: Ciências Sociais Aplicadas; Direito


Instituição: Universidade Católica de Petrópolis - UCP
Órgão: Faculdade de Direito Unidade: Departamento de Direito Privado
Endereço
Logradouro: Rua Benjamin Constant, 213
Bairro: Centro CEP: 25600000
Cidade: Petropolis UF: RJ
Telefone: 22375062 Fax:
E-mail: almeidaf@compuland.com.br Home page: http://www.direito.ucp.br
Repercussões dos trabalhos do grupo
Grupo destinado ao estudo sistemático do novo instituto jurídico que vem sendo ampliado com o uso da informática.
O tema Direito Eletrônico e Cidadania busca, desta forma, conciliar a informática com o acesso à Justiça e outros
Direitos Fundamentais.

193
Recursos humanos
Pesquisadores Total: 4
Aires Jose Rover Josília Fassbender Barreto Nascimento
José Carlos de Araújo Almeida Filho Túlio Lima Vianna

Estudantes Total: 5
Ana Paula Peixoto Morais Rodrigo Monteiro Camara
Daniel Tercariol Vitral Tatiana Mendes da Fonseca
Estela Cristina Nogueira Domingues de Araújo Almeida

Técnicos Total: 3
Camila Salvini Affonso Salerno de Freitas - Graduação - Assistente de Pesquisa
David Paterman Brasil - Graduação - \Outra Função
Diego Antonio Ferreira Villa - Graduação - Assistente de Pesquisa

Linhas de pesquisa Total: 3

?? Direito Eletrônico e Cidadania

?? Direito Eletrônico e Crimes na Informática

?? Documento Eletrônico

Relações com o setor produtivo Total: 1

?? Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico - IBDE

Indicadores de recursos humanos do grupo


Integrantes do grupo Total
Pesquisador(es) 4
Estudante(s) 5
Técnico(s) 3

TRABALHOS CONCRETIZADOS

194
O Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico, com o auxílio do Grupo de Pesquisas Direito
Eletrônico e Cidadania, elaborou parecer para o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, a
fim de implementar atos processuais por meios eletrônicos junto aos Juizados Especiais
Federais, nos termos da Lei 10.259/01.

O parecer encaminhado ao TRF da 2ª Região, após instauração de processo administrativo,


foi aprovado pelo Exmo. Sr. Dr. Desembargador Federal – Corregedor.

Tendo em vista o Encontro de Juízes Federais promovido pelo Conselho da Justiça Federal,
o Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico fez encaminhar o aludido parecer àquele órgão,
recebendo a missiva que segue:

195
196
JORNADA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA NOS 50 ANOS DA
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS

O Grupo de Pesquisa Direito Eletrônico e Cidadania se fez apresentar na


Jornada de Iniciação Científica nos 50 Anos da Universidade Católica de Petrópolis. O
evento teve a Coordenação Geral do Professor Dr. Maurício Castanheira.
OBJETIVOS
Grupo destinado ao estudo sistemático do novo instituto jurídico que vem
sendo ampliado com o uso da informática. O tema Direito Eletrônico e
Cidadania busca, desta forma, conciliar a informática com o acesso à Justiça e
outros Direitos Fundamentais.

APRESENTAÇÃO NA JORNADA

O grupo esteve representado na Jornada pelo Professor José Carlos de


Araújo Almeida Filho, que traçou as metas e os projetos já desenvolvidos pelo mesmo.
Importante destacar a inserção do Grupo de Pesquisa no Projeto LEFIS, da Comunidade
Européia.

197
214

COMUNIDADE EUROPÉIA

Tendo em vista o Grupo de Pesquisa Direito Eletrônico e Cidadania contar


com o apoio do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico, o mesmo passou a integrar o
Projeto LEFIS215 , cujos objetivos se encontra delineados em sua página na Internet,
podendo resumir:

The Legal Framework for the Information Society, Erasmus Thematic


Network approved in 2003, has as objective to introduce, starting from
the elaboration of normative proposals, the Information and
Communication Technologies in the Faculties and Schools of Law, and to
promote the study of regulations and practice codes in the Polytechnic
Centers. LEFIS wants to elaborate also didactic solutions with the
possibilities that offers the use of the web and the didactic resources "on
line"
Another objective of LEFIS is to elaborate policies on Law and new
technologies coming from discussions originated in the different regions
of the European Union, assisting to the characteristic necessities,
traditions and requirements of the groups of countries that integrate the
Thematic Network. This is made in four steps:

214
Prof. José Carlos de Araújo Almeida Filho na Jornada
215
http://www.lefis.org

198
. The first moment is on national/regional discussion of the
problems, these and their solutions, always treated with
interdisciplinarity, or what is the same thing starting from
juridical, economic and technical proposals.
·The second moment is the scientific, European, study of
the problems in relation with different Sub themes of
specialization.
· The third moment is the study of the problems with
professional associations.
· The products of the different discussions, finally, are
integrated in educational modules that the participant will
adapt to the characteristic conditions and requirements of
each country in which the participant Universities teach
and research on the matter
The LEFIS Network incudes also the activities of the AECI and ALFA
Networks on electronic government, of European and Central- and
Southamerican character.

Sendo assim, são, hoje, membros do Projeto LEFIS:

European members

Austria:
Donau-Universität Krems
Czech Republic :
Tomas Bata University in Zling
Spain:
TB-Solutions Advanced Technologies, S.L.
Net 2 You Sl.
Wirelessland S.L.
University of Zaragoza, Accounting and Finance
Análisis y Aplicaciones S.A. Ayanet
Prometric Thomson Learning Limited
Thomson Aranzadi
Cristina Malo Navarro, Lawyer
Despacho Colectivo de Abogados
Switzerland:
University of Zürich, Department of Law, Rechtshistorische Bildstelle
United Kingdom:
Thomson Legal & Regulatory Europe
Prometric Thomson Learning Limited
Non European members

199
Brazil:
Universidade Católica de Petrópolis
Brazilian Institute of Eletronic Law
Canada:
University of Ottawa, Faculty of Law, Common Law Section
Chile:
Universidad de Talca
Uruguay:
Universidad de la República, Facultad de Derecho
Asociación de Escribanos del Uruguay
USA:
Universidad de Puerto Rico, Facultad de Derecho
University of Arizona, School of Law

CONCLUSÃO

Apesar da pesquisa na área do Direito ainda não ser o que todos nós,
acadêmicos desejamos, fica a certeza de que nosso trabalho vem rendendo frutos.

O Grupo de Pesquisa se encontra em plena atividade e demonstrando que


uma pesquisa séria pode conquistar grandes progressos.

ADENDO

Clicando sobre os itens, abrir-se-ão os documentos:

200
Acrobat Document

Trabalho do Prof. Dr. Aires Rover - UFSC

201
Pesquisa na Universidade ou de como nos estamos tornando
filosoficamente americanos
Hugo Lovisolo216

Introdução
As Instituições de Ensino Superior privadas aumentaram notoriamente sua
participação no total da matrícula de ensino superior de graduação, que, pela sua vez, teve uma
tremenda explosão na última década no Brasil. Contudo, no campo da pós-graduação e da
pesquisa ainda tem um desenvolvimento e participação baixa. Esta contradição, entre ambas
as participações, será meu fio condutor. Concentrarei meus comentários sobre as condições e
os mecanismos que dificultam a expansão da pós-graduação e pesquisa nas IES privadas.
Tentarei demonstrar que o "novo modelo" de expansão da pesquisa e da pós-graduação,
proposto pelas políticas públicas mediante seus órgãos competentes, está pouco adequado às
dinâmicas das IES privadas. Realizo, no final, um apelo no sentido do de desenvolvermos um
modelo que, sem abandonar o objetivo do desenvolvimento da pesquisa na graduação,
esteja mais adequado ao funcionamento e dinâmica das IES privadas.

Argumentos
1.- As atividades de pesquisa ganharam crescente importância nas políticas
educacionais de ensino superior. A legislação distingue a "universidade" pelo
desenvolvimento da pesquisa, prática e historicamente no Brasil associada ao
217
funcionamento das pós-graduações estrito senso (mestrado e doutorado). Assim, para se
ascender ao reconhecimento oficial de Universidade fez-se necessário contar com cursos de
pós-graduação reconhecidos pelo órgão oficial do MEC, a CAPES. Por outro lado, os
documentos oficiais de educação, ciência e técnica, enfatizam o desenvolvimento da
pesquisa já na graduação, concretizado mediante programas de iniciação científica,
encarregando-se especialmente o CNPq (PBIC), além dos organismos estaduais de apoio a
pesquisa, dos mesmos. Nos marcos da política oficial, as jornadas de iniciação científica
tornaram-se eventos cada vez mais freqüentes no Brasil, onde o que importa, destaquemos
este aspecto, é muito mais a apresentação dos processos formais de pesquisa e os

216
Professor Doutor – Coordenador Geral do Programa de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Gama
Filho - RJ

202
relatórios, em padrões codificados de apresentação de trabalhos científicos, do que os
resultados. Em vários aspectos, a avaliação da pesquisa tornou-se formal e quantitativa ao
invés de substantiva e qualitativa.218 A valorização da pesquisa na Universidade ganhou carta de
cidadania, apesar das dificuldades em termos de recursos humanos e materiais
existentes. Pari passu com a valorização, tivemos um processo de formalização dos
currículos dos participantes, dos formulários de solicitação de recursos, dos processos de
pesquisa e de apresentação dos resultados que, por sua vez, devem estar dentro das normas
de publicação dominante nos Estados Unidos.
Criamos um sistema de pós-graduação e pesquisa cuja referência principal foi o das
fundações americanas. Este é o primeiro sentido da americanização, contudo, não é o mais
importante.

2.- Podemos pensar que a valorização da pesquisa é resultado de um longo esforço


de procura de reconhecimento social, por parte dos cientistas e dos amigos da ciência, que
levou à aceitação do papel estratégico da ciência e suas aplicações no desenvolvimento
econômico e social. Creio que a força do reconhecimento do papel da ciência e suas
aplicações no processo de desenvolvimento é consensual. A afirmação negativa, não
teremos desenvolvimento sem produção científica e tecnológica, é amplamente partilhada,
embora a formação de comunidades científicas nacionais não signifique por si mesma
desenvolvimento. Supomos que se desenvolvêssemos uma massa crítica de pesquisadores e
produção científica básica, a inovação naturalmente se derivaria dela. Contudo, um dos
problemas centrais que enfrentamos é o da transformação da comunidade científica
nacional, e suas atividades de pesquisa, em patentes e inovações que gerem novos produtos
e processos de acumulação e desenvolvimento. Creio que por esta razão, a comparação do
registro de patentes de Brasil e Coréia tornou-se repetitiva. Contando com comunidades
científicas e investimentos próximos, a Coréia registra internacionalmente quase 100 vezes

217
Observo que a opção escolhida foi uma das possíveis. De fato, seria factível desenvolver um modelo
de
pesquisa não associado à pós-graduação.
218
Os exemplos mais gritantes deste formalismo podem ser encontrados nas estórias e anedotas, ligadas
às
reclamações e pedidos constantes de revisão, na avaliações das comissões da CAPES. O formalismo
é

203
mais patentes que o Brasil. A criação dos fundos setoriais e do mestrado profissional pode
ser vista como resposta ao problema da transformação de conhecimentos em produtos que
gerem retornos econômicos. (A reação aos mestrados profissionalizantes, por parte das
comissões acadêmicas e de numerosos pesquisadores, deve ainda ser equacionada).

3.- Creio que além das relações postas em jogo entre pesquisa e desenvolvimento,
existe também uma tendência global para pensarmos que o conhecimento dos processos e
das experiências de pesquisa, embora sem produção de resultados significativos (sob o
ponto de vista social) e relevantes (para o desenvolvimento de teorias), deve formar parte
da formação dos alunos do terceiro grau. Em outros termos, conhecer os elementos das
metodologias, dos métodos e técnicas de pesquisa e experimentar sua realização tornou-se
objetivo dos estudos de graduação. Por vezes, a simples realização de uma monografia ou
de um trabalho final é vista como iniciação à pesquisa. O ideal de formação inclui a
experiência em pesquisa na graduação e esta experiência deveria ser um vetor da formação
emotiva e intelectual que o processo educacional deveria comportar. Creio que estamos
supondo e valorizando a capacidade de argumentar em relação a evidências — eixo
central da formação emocional e intelectual em pesquisa — como significativa e relevante
para a vida profissional, para a inserção no mercado e mesmo para as relações
interpessoais. A pesquisa seria um caminho de crescimento da reflexividade e da
autoreflexividade, atitudes, estas, constitutivas enquanto valores generalizados da
modernidade tardia ou pós-modernidade219 .
De modo resumido, diria que a valorização da iniciação científica, seja quais forem
seus argumentos, significa o reconhecimento da cultura científica, de seu valor e da
necessidade de ser transmitida emocional e culturalmente no processo educacional220 .

também central na avaliação das revistas, onde domina a adequação aos padrões técnicos internacionais e em
algumas das dimensões dos processos de avaliação dos cursos de graduação.
219 Na obras de Giddens, entre outros, o leitor poderá encontrar a descrição da valorização da reflexividade. Ver. como exemplo,
Giddens, A., A transformação de intimidade. São Paulo, Ed. UNESP, 1993.
220
Uma obra interessante e acessível é a Ciência como Cultura, Colóquio Promovido pelo Presidente da
lepública, Portugal, Estudos Gerais -Imprensa NacionalVCasa da Moeda, 1992. A clássica -distinção e
(reocupação <le Snow , The two culture. sobre a separação das duas culturas, a humanista e a cienlífico-écnica,
mereceria ser revista. Em provocativo trabalho Gouldner, A., The future of intelectuais and the ri se •ew class,
USA, The Mcmíllan, Press, 1979, sugeriu a hipótese por implicação de que a interação estar-se-ia ando na própria
estrutura familiar, pelo domínio dos casais formados por membros de cada uma delas.

204
A pesquisa na graduação, então, teria como finalidade principal a socialização
emocional e intelectual na cultura científica.
Se esta é a finalidade partilhada, diria que o modelo proposto de organização da
pesquisa tem pouca capacidade de expansão nas IES privadas, dadas às condições de
funcionamento que exige, e que, portanto, outros modelos deveriam ser construídos para um
sistema de ensino superior democráticos ou de massas para o qual devemos nos dirigir se
pretendemos atingir essa finalidade.

4.- A valorização, entretanto, parece estar gerando a proposta de uma forma nova de
organização do ensino superior. Basicamente, aquilo que ocorria em poucos laboratórios de
forma espontânea e seletiva passou a ser posto como ideal organizacional, como política,
reconhecida oficialmente no estímulo à constituição do Grupo de Pesquisa pelo CNPq
(cujo recenseamento concluiu recentemente) e à participação dos alunos de graduação nos
mesmos. Cresce, por imposição, o sentimento de que não estar dentro de um Grupo de
Pesquisa e não figurar com o próprio currículo no sistema Lattes constitui um índice de
marginalidade científica e acadêmica. Classicamente, no laboratório, tínhamos desde
pesquisadores experientes até estudantes inexperientes, além de assistentes técnicos e de
apoio, participando de programas ou projetos de pesquisa. O ideal atual centra-se na
generalização de tal tipo de participação e interação para o conjunto da Universidade. Creio
que a imagem desejada é a dos doutores produtivos desenvolvendo projetos com
doutorandos, mestres e alunos da graduação.
Formando uma pirâmide de base larga, os técnicos e o pessoal de apoio e os
estudantes de graduação; um nível intermediário de doutorandos e mestres e, no topo, um ou
mais pesquisadores experientes e produtivos. Cursos de pós-graduação e grupos de pesquisa
são, assim, os pilares da formação e produção de pesquisas na Universidade.

5.- A organização da produção científica, e de sua formação, se assemelha à militar.


Tal semelhança foi repetidas vezes salientada por cientistas ao longo da história da procura do
reconhecimento, como exemplo temos os escritos de Ramón y Cajal221 . Na visão
democratizante da organização militar, o último dos soldados e o primeiro dos generais,

221
Ver Lovisolo, H. Vizinhos distantes :universidade e ciência na Argentina e no Brasil, Rio de Janeiro,
EdUerj, 2000, cap. 3

205
ambos, são Igualmente importantes para ganhar a guerra. Da mesma forma, na-organização da
produção do conhecimento, todos os participantes da pirâmide são relevantes. O segundo
aspecto, então, é a imagem ideal de organização que está sendo proposta, hierarquia na
gestão acompanhada do reconhecimento da participação de todos os envolvidos.
A publicação crescente de trabalhos com os nomes de todos os participantes é
produto dessa visão democratizante da organização militar ou hierárquica.

6.- Tal tipo de organização pode já estar generalizando-se no campo das pós-
graduações, contudo, é de difícil expansão para o conjunto do corpo docente e discente
para se tornar o modelo novo e dominante de Universidade. Há várias razões que operam
contra essa expansão. De fato, o modelo proposto coexiste com a organização tradicional da
universidade que funciona como agregado de cursos. Apesar dos objetivos de ensino e
pesquisa figurarem na legislação, nos documentos orientadores de políticas e nos projetos
das Instituições de Ensino Superior, o fato é que grande parte do corpo docente, por
tradição porém talvez até por funcionalidade ou adequação, é constituído por professores não
pesquisadores. Professores competentes de Cálculo l, Anatomia, Processo Civil ou
Contabilidade, entre muitas outras matérias, são indispensáveis para os cursos de
graduação e nada indica, contra a visão dominante e que partilhamos, que a realização de
pesquisa de ponta, nem mesmo o fato de serem mestres ou doutores, os faça mais
competentes no campo do ensino de graduação222 . Todavia, é discutível a necessidade, sob o
ponto de vista do ensino, de que esses professores participem do modelo (talvez teriam
uma contribuição ainda maior se sua competência fosse transformada em material de
ensino, um tipo de produção pouco valorizada em nosso meio acadêmico). Indo além da
tradição elitistas do ensino superior brasileiro, caracterizada pela seleção rigorosa na
entrada, a explosão da matrícula universitária dos últimos anos tornou cada vez mais
necessária e importante a participação dos docentes competentes no ensino da& disciplinas

222
É fácil comprovar que em muitas áreas, como em Direito, por exemplo, a realização de mestrados
e doutorados é vista como preenchimento de requisito para atuar na graduação universitária, ao invés
de caminho de pesquisa e realização pessoal na mesma. O Dr. Leonardo Greco, cuja experiência no
ensino do Direito é notória, despertou minha atenção sobre os motivos dos pós-graduandos em Direito.

206
básicas223 . Assim, há uma parte do corpo docente que ficará de fora da expansão do modelo
da pesquisa. Em segundo lugar, os cursos universitários se caracterizam no Brasil pela alta
carga horária curricular, embora este aspecto tenha melhorado nos últimos anos. O
currículo, transformado em alta carga horária semanal de disciplinas, faz com que parte
considerável dos recursos seja utilizada na estrutura tradicional, deixando pouco tempo para a
dedicação dos alunos e docentes às atividades de pesquisa. Agrega-se, ainda, o
crescimento na participação na matrícula dos cursos de orientação profissional, inseridos no
movimento mais geral de valorização dos mesmos por seu vínculo funcional ou utilitário
com o horizonte profissional ou de mercado. O estágio, então, continua sendo
sobrevalorizado quando comparado à iniciação científica e, nem sempre, os melhores
talentos, como os cientistas desejariam, se inclinam pelo desenvolvimento da capacidade de
argumentar baseada em evidências. Há, então, condições que afirmam a dificuldade de
expansão do modelo ou, em outras palavras, a existência de sérias dificuldades para
compatibilizar a tradição de ensino na graduação com o modelo de organização que a
política de pesquisa implica em sua definição de Universidade. Eu tenho trabalhado a
hipótese, que creio seja compartilhada por muitos, de que o funcionamento do sistema
levará na direção de sua dualização, de um lado, instituições basicamente de formação de
graduação; do outro, instituições centradas na pesquisa e pós-graduação. Enfrentamos, tudo
indica, uma forte contradição entre a tradição dos cursos de graduação e os objetivos de
desenvolvimento da iniciação científica.
Creio que a contradição, que é forte, favorece a tendência à dualização e que, a
grosso modo, o desenvolvimento do modelo de pesquisa tem maiores possibilidades de
realização nas instituições com docentes contratados em tempo integral e que desenvolvem
programas de pós-graduação (sobretudo nas públicas e em algumas privadas, especialmente as
ditas confessionais) e poucas são suas possibilidade onde a contratação docente efetua-se por
hora aula, como na maioria das instituições privadas. Nestas instituições, a pesquisa terá
que encontrar novas formas organizacionais para realizar o axioma político e pedagógico
de pesquisa na graduação.

223
Comentários sobre a explosão ou democratização do ensino superior e sua dualização podem ser vistos
em Lovisolo, H., "A crescente dualidade do Ensino Superior". Ciência Hoje, vol. 29, N° 173/julho de 2001,
p.56-60. Rio de Janeiro.

207
7- O panorama das instituições privadas lucrativas, não confessionais ou
comunitárias, merece alguns apontamentos particulares. As IES privadas são responsáveis,
como os dados indicam, pelo violento processo de expansão da matrícula de ensino
superior nos últimos anos. São responsáveis, então, pela democratização do ensino superior
entendido, prima face, como eliminação das barreiras tradicionalmente postas pelos
processos seletivos de entrada. Salvo em alguns cursos — como medicina, por exemplo,
cujos custos, em princípio, emperram a expansão da oferta — as EES privadas criaram uma
situação de oferta que parece exceder a demanda, embora com nuanças regionais 224 . A oferta
concretizou-se mediante uma estratégia de redução tendencial dos preços (que fez que
grande parte dos cursos universitários custem igual ou menos que o ensino fundamental, pois
não poderia existir democratização sem barateamento), um crescente aumento dos
investimentos em instalações e equipamentos (mesmo para suportar os processos de
avaliação do MEC)225 , um crescimento significativo nos gastos publicitários e a
generalização da contratação do professor horista. Embora a contratação no regime de
horista seja tradicional (talvez por favorecer custos menores), tornou-se funcional em vários
sentidos, sendo principal p de permitir a expansão da oferta, dado que se os professores
trabalhassem em regime de dedicação exclusiva seu recrutamento tornar-se-ia um freio para a
expansão. O recrutamento de professores das públicas pelas privadas, hoje um fenômeno
visível, foi favorecido pela queda salarial, nas primeiras, que levou a procura de outras
fontes de renda. Porém, esse recrutamento, foi feito muito mais na configuração tradicional do
ensino de graduação, o professor horista, da que dentro dos marcos do modelo da
pesquisa226 . Assim, a demanda docente para o ensino conseguiu ser abastecida pela
funcionalidade do sistema de horista e, ao mesmo tempo, as privadas passaram a contar com
um corpo docente mais qualificado, formado por professores atuante e aposentados das

224
Incluiria entre os custos de Medicina os provocados pela inserção profissional dos médicos, sua
dedicação
exclusiva ao ensino para a aumentar a oferta, se isto for conveniente, coisa que duvido, levaria a um aumento
significativo dos custos educacionais.
225
A multiplicação dos campi, estratégia recorrente de muitas universidades e centros universitários
privados,
significa a multiplicação da administração, das bibliotecas, dos laboratórios de informática, entre outros
custos.

208
públicas ou mestres e doutores nelas formados sem expandir a contratação em tempo integral.
A curto prazo, as instituições privadas poderão demonstrar que, sob o ponto de vista da
qualificação e mesmo da trajetória profissional, o perfil de seus docentes não se distingue
notoriamente do que vigora nas públicas, ainda quando domine a contratação por hora aula. O
sistema horista, sendo funcional para completar a oferta, faz que o docente circule por várias
EES, especialmente nos grandes centros urbanos. Este vínculo de emprego é tradicional no
Brasil, até no ensino fundamental, e há uma sabedoria que indica que não devemos, os
docentes, colocar todos os ovos na mesma cesta ou, em outros termos, que o chapéu preferido
é o que têm vários bicos227 . Creio que no caso do Rio de Janeiro, onde várias IES privadas
passam por dificuldades financeiras, que se manifestam como atraso de salários e benefícios,
a estratégia está sendo reativada e, paradoxalmente, talvez beneficiando tanto
228
empregadores quanto empregados . Os argumentos apresentados, levam na direção de
avaliar como tarefa árdua a constituição do modelo de pesquisa nas IES privadas que agem
em situação competitiva. A única forma de desenvolver na graduação a pesquisa
associada à pós-graduação implica a transferência de recursos volumosos gerados na
graduação229 . Entretanto, a situação concorrencial, com todas suas implicações, parece não
fornecer suficiente "gordura" para manter a pós-graduação e a pesquisa nos níveis de
exigência dos organismos de recomendação e regulação. De modo geral, nos inclinamos a
considerar que as condições financeiras de funcionamento atuais não parecem ser favoráveis
a transferência de recursos no curto prazo. Assim, muitas IES privadas deverão escolher pelo
modelo do Centro Universitário e criar formas adequadas para desenvolver a iniciação
científica na graduação; outras, deverão articular suas pós-graduações como novas formas de
desenvolvimento da iniciação científica na graduação.

226
Na tarefas de direção das privadas e nas suas pós-graduações. os docentes aposentados das públicas
ocupam
crescentemente diversas posições.
227
Observe-se a relação na linguagem entre os bicos do chapéu e a estratégia malandra de se apoiar em
vários bicos para sobreviver. Estamos diante de um caso que deliciaria a qualquer hermenéuta. Ver Lovisolo,
H., "Engenharia escolar: motivação e autonomia". Ciência Hoje, Vol. 16-N° 91, junho de 1993, p. 10-13,
Rio de Janeiro.
228
Talvez no Rio de Janeiro a concorrência entre as privadas se manifestou de forma bem mais violenta do
que
noutras regiões do país. Essa concorrência passa por queda nos preços, aumento nos gastos publicitários e
investimentos, enfim, na redução da gordura dos negócios educativos.
229
Dada a restrições impostas petas comissões avaliadoras da CAPES à relação orientandos/orientador
é
impossível desenvolver programas autofinanciados.

209
O que está em crise, sob o ponto de vista das privadas, é a expansão do modelo.
Está em crise, então, a possibilidade de que a iniciação científica seja realizada com
qualidade e com abrangência mínima significativa.
As dificuldades, mesmo a impossibilidade, do desenvolvimento da pós-graduação e do
modelo ideal de organização da pesquisa, deverá conduzir as instituições de ensino superior
a formulação de caminhos de formação em pesquisa na graduação com outras características.
A questão sobre como fazer formação em pesquisa na graduação, quando não há
possibilidades de expansão significativa da pós-graduação e de formação de grupos de
pesquisa, é uma questão central para os projetos políticos pedagógicos das instituições de
ensino superior privadas.
Assim a questão é: quais são os modelos adequados para desenvolver a pesquisa na
graduação da IES, em princípio, privadas230 ?

8.- Há por baixo da política de pesquisa na graduação um interessante processo de


mudança nas representações da pesquisa, e este é o aspecto principal de estarmos nos
tornando filosoficamente americanos. Uma mudança da qual parece estarmos pouco
cientes. Se remontarmos há vinte ou trinta anos atrás, poderemos observar que os cursos de
formação científica começavam distinguindo o conhecimento científico do vulgar ou de
bom senso. A epistemologia francesa, sobretudo a inspirada em Bachelard231 , insistia em
núcleos argumentativos tais como: obstáculo epistemológico, corte ou ruptura
epistemológica e problema do objeto teórico entre os principais sinais de distinção do
modo de conhecimento científica do não científico (senso comum, conhecimento empírico,
ideologia e outros indicadores)232 . Creio que hoje domina o naturalismo americano ou
naturalismo pragmático que, ao invés de marcar a distinção radical ou estrutural, afirma a

230
Embora não seja objeto destas nota, destaco que o panorama das instituições públicas é altamente
heterogêneo e que o modelo que se tenta expandir não se adapta a maioria delas. De fato, o modelo parece
estar baseado nas estaduais paulistas, na Federal do Rio de Janeiro e em alguns casos distribuídos pelo Brasil.
231
E, de modo bem mais geral, na suposição de que existe um conhecimento das aparências, o do sentido
comum, e um das essências, o do filósofo e, por extensão, do cientista. Insisto na questão de grau, o erro
cientifico apenas pode ser visto como refinado quando comparado com o vulgar.
232
O estruturalismo marxista francês, cuja figura paradigmática foi Althousser, talvez seja o exemplo mais
relevante, embora tais distinções também estejam presentes em autores anglo-saxões. Nesta corrente, o termo
revolução (teórica de Marx, por exemplo) marca a ruptura entre o não científico e o científico. Não podemos
confundir essa 'revolução' com a de Kuhn, pois aqui trata-se do abandono de um paradigma por outro. A
nova matriz disciplinar científica, permite explicar mais e melhor algumas coisas, isto não significa que a

210
continuidade233 . Assim, o conhecimento vulgar e o científico se caracterizam por diferenças de
graus e não de qualidade. O científico é mais sistemático, trabalha com controles lógicos
e empíricos mais rigorosos, enfim, ele é mais refinado sob o ponto de vista metodológico
na aplicação dos critérios de consistência e verificação. Contudo, há continuidade entre o
conhecimento vulgar da cultura, sem qualificativos, e o gerado na cultura científica. Se isto
é assim, significa que a cultura científica é um prolongamento aprofundado da cultura
ocidental234 Dito de modo resumido e grosseiro, a cultura científica é uma extensão da
cultura da pergunta e cuja tarefa operacional é a procura de resposta mediante a elaboração
de argumentações consistentes relacionadas à fabricação de evidências que verificam a
argumentação. O fato de que as respostas sejam parciais, dinâmicas ou transitórias,
processuais e não reducionistas não modifica o núcleo operacional, as tarefas, da cultura
científica.
Fazer iniciação científica é desenvolver, no sentido de refinar e sistematizar, a
cultura do aluno no sentido de potencializar as capacidades de elaborar argumentos e
fabricar evidências relacionadas.

9.- Se o leitor compartilha dos argumentos apresentados, pedimos que nos


acompanhe na tarefa de aceitar que o Ensino Superior tem por objetivo principal
desenvolver a cultura, especificamente a cultura científica. Desta tarefa pode ser dito: é
óbvio! E, é. Entretanto, o tremendo problema é que nos dedicamos a formar profissionais e,
então, priorizamos a assimilação de conhecimentos sobre o desenvolvimento das
capacidades. Temos uma visão estreita e de curto prazo da utilidade e transmitimos essa visão
para os alunos. Temos, então, uma visão muito curta da adequação. Ampliar a visão da
utilidade ou adequação significa tornar o óbvio em tarefa reconhecida e planejada. Significa
abandonar a idéia de que desenvolveremos as capacidades apenas mediante a assimilação
de estoques de conhecimentos. Os que defendem o modelo da iniciação científica na
graduação creio que partilham o objetivo da tarefa. Contudo, apenas nos separa a avaliação

velha fosse produzida em outra matriz de conhecimento, pré ou não científica. Creio que Kuhn é pragmático
em vários aspectos.
233
Diria que estamos retomando as contribuições de Anísio Teixeira. Uma excelente apresentação ao
naturalismo pragmático e a de Land. M. A mente externa, Rio e Janeiro, Garamond/FAPERJ, 2001.
Introdução
234
Creio que esta idéia sempre esteve presente entre aqueles que distinguiram as^ culturas de um lado e outro
dos Pirineus. De nosso lado, a cultura barroca; do outro, a cultura que favorecia o eixo de desenvolvimento da
ciência desde a Itália aos países nórdicos. Ver Lovisolo, H. '"Portugal, Espanha e as nossas razões", in Revista
Logos, Ano 5-N° 8, 1° semestre de 1998, 36-41, Rio de Janeiro .

211
de que ela não poderá ser realizada no Ensino Superior Privado no formato que está sendo
proposto. Teremos que fazer um exercício coletivo de recreação e criação para chegarmos à
formulação de um modelo de desenvolvimento da cultura científica adequado às suas
condições de funcionamento e ao valor democrático do Ensino Superior.

212
JURISPRUDÊNCIA NA ÍNTEGRA

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL Nº 514.412 - DF (2003/0053302-5)


RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
RECORRENTE : REGIUS SOCIEDADE CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
ADVOGADO : LISBETH VIDAL DE NEGREIROS BASTOS E OUTRO
ADVOGADA : VANESSA CAMARGO GARCIA LEÃO
RECORRIDO : CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA E OUTROS
ADVOGADO : CLÓVIS FERREIRA DE MORAIS E OUTROS
EMENTA
Processual civil. Intimação. Prazo. Internet.
I - As informações trazidas pela Internet têm natureza meramente informativa e não
vinculativa, não podendo, pois, substituir a forma prevista em lei para contagem dos prazos
processuais.
II - Recurso especial conhecido mas desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
conhecer do recurso especial e, por maioria, vencido o Sr. Ministro Castro Filho, negar-lhe
provimento.
Votou vencido o Sr. Ministro Castro Filho.
Votaram com o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro os Srs.
Ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi.
Brasília, 02 de outubro de 2003 (Data do Julgamento)
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro
Presidente e Relator para Acórdão

213
RECURSO ESPECIAL Nº 514.412 - DF (2003/0053302-5)
RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : REGIUS SOCIEDADE CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
ADVOGADO : LISBETH VIDAL DE NEGREIROS BASTOS E OUTRO
RECORRIDO : CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA E OUTROS
ADVOGADO : CLÓVIS FERREIRA DE MORAIS E OUTROS

RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO(Relator): Na origem, REGIUS SOCIEDADE
CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA opôs embargos à execução que lhe foi movida por
CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA e outros, alegando excesso dos valores cobrados a
título de restituição de descontos securitários.
Ao receber os autos, o juiz singular extinguiu de plano o feito, sem julgamento do mérito
(artigos 267, VI, e 739, I, do Cód. de Proc. Civil), à consideração de serem intempestivos
os embargos.
A decisão foi confirmada pela Segunda Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, à unanimidade, por acórdão assim ementado:
“PROCESSUAL CIVIL. ANDAMENTOS PROCESSUAIS VEICULADOS NA
INTERNET. CARÁTER INFORMATIVO.
A indicação de andamentos processuais via internet tem natureza meramente informativa e
não vinculativa, não substituindo a forma prevista em lei para a contagem de prazos.”
Inconformada, a embargante interpôs recurso especial, com fundamento nas alíneas “a” e
“c” do permissivo constitucional, alegando violação aos artigos 187 e 507 do Código de
Processo Civil, bem como divergência jurisprudencial com o entendimento assentado por
este Tribunal no Resp 390.561/PR, DJ 26/08/2002, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros.
Admitido o recurso, na origem, ascenderam os autos a esta Corte,
vindo-me conclusos.
É, em síntese, o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 514.412 - DF (2003/0053302-5)

214
RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : REGIUS SOCIEDADE CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
ADVOGADO : LISBETH VIDAL DE NEGREIROS BASTOS E OUTRO
RECORRIDO : CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA E OUTROS
ADVOGADO : CLÓVIS FERREIRA DE MORAIS E OUTROS
VOTO-VENCIDO
O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO(Relator): Na origem, os recorridos
propuseram ação de cobrança contra a recorrente, objetivando a aplicação de índices
expurgados nos diversos planos econômicos sobre o saldo de suas respectivas reservas de
poupança, as quais haviam sido levantadas, em conformidade com a legislação vigente à
época.
Julgado procedente o pedido, os recorridos extraíram carta de sentença e propuseram
execução provisória, pretendendo receber a importância de R$ 540.638,96 (quinhentos e
quarenta mil, seiscentos e trinta e oito reais e noventa e seis centavos).
A recorrente, então, opôs embargos do devedor, alegando que a quantia pleiteada excedia
em muito o valor arbitrado na sentença, correspondente a R$ 122.451,16 (cento e vinte e
dois mil, quatrocentos e cinqüenta e um reais e dezesseis centavos), incluídos a correção
monetária e os honorários advocatícios, de 5% sobre o valor da causa.
O MM juiz singular extinguiu os embargos, sem julgamento do mérito, por considerá-los
intempestivos, vez que a indicação de andamentos processuais via internet tem natureza
meramente informativa e não vinculativa, não substituindo a forma prevista em lei para a
contagem de prazos, decisão que veio a ser confirmada pela Segunda Câmara Cível do
egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios Contra esse entendimento é
que a recorrente se insurge por meio do presente recurso especial, com amparo em ambas
as alíneas do permissivo constitucional.
Quanto à alegada violação à lei federal, registro que a controvérsia não foi dirimida no
tribunal de origem à luz dos dispositivos processuais reputados violados, sem que a
recorrente opusesse embargos de declaração, a fim de suscitar sua discussão. Ressente-se o
recurso, nesse particular, do necessário prequestionamento viabilizador desta instância
excepcional (Súmulas 282 e 356/STF).
Entretanto, pelo dissídio, melhor sorte lhe socorre.

215
No caso vertente, infere-se do aresto hostilizado que a embargante, ora recorrente, foi
intimada da penhora em 21/02/2001 (quarta-feira), tendo sido juntado o mandado de
intimação aos autos em 22/02/2001(quinta-feira). Iniciando-se a contagem no dia
23/02/2001(sexta-feira), o prazo recursal de 10 dias teria se exaurido no dia 04/03/2001
(domingo), ficando prorrogado para o primeiro dia útil subseqüente, 05/03/2001 (segunda-
feira). Logo, tendo sido protocolizados os embargos no dia 07/03/2001, haveria de ser
reconhecida a sua intempestividade.
Não obstante, em consulta processual obtida via internet (fls. 305), cientificou-se a
recorrente de que o termo ad quem para a apresentação dos embargos seria o dia
09/03/2001 (sexta-feira), fato esse que ocasionou a confusão quanto ao prazo final a ser
observado, cuja responsabilidade, a meu sentir, não pode ser atribuída à parte.
Nesse sentido, aliás, o entendimento assentado no precedente trazido a confronto, Resp
390.561/PR, DJ 26/08/2002, no qual, em situação análoga, assinalou o eminente Ministro
Humberto Gomes de Barros:
“Não há dúvida de que as informações prestadas pela rede de computadores operada pelo
Poder Judiciário são oficiais e merecem Confiança. Bem por isso, eventual erro nelas
cometido constitui 'evento imprevisto, alheio à vontade da parte e que a impediu de praticar
o ato'. Reputa-se, assim, justa causa (CPC, Art. 183, § 1º), fazendo com que o juiz permita a
prática do ato, no prazo que assinar (Art. 183, § 2º).”
Evidencia-se assim dos autos que, na hipótese, os embargos à execução não foram
apresentados em tempo hábil em decorrência de informação equivocada prestada pelo
tribunal, via internet, quanto ao término do prazo legal. A meu sentir, tal fato está a
configurar justa causa em favor da embargante, ora recorrente, haja vista que a parte não
pode ser prejudicada por deficiência no serviço de informações processuais prestado pelo
órgão judiciário, o qual é responsável pela alimentação dessa base de dados. Mormente nos
dias de hoje, em que o uso da informática mais e mais se generaliza, associado a um
conceito de agilidade e modernidade – características que devem permear também o
sistema processual civil -, faz-se mister que as informações relativas ao andamento
processual oriundas de órgãos do Judiciário possam ser prestadas com correção e presteza,
a fim de se tornarem merecedoras da confiança dos usuários.

216
Em conformidade com esse entendimento, segundo leciona Moniz de Aragão, “Para que se
repute justa a causa do impedimento na prática do ato, há de ser ela alheia à vontade do
agente e resultante de evento imprevisto” (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio
de Janeiro, 1991, 7ª ed., p. 140). Ensina, ainda, o ilustre jurista que “não apenas o embaraço
processual proveniente da parte, como também o que se origina de qualquer dos integrantes
do Juízo, ocasiona, igualmente, a suspensão do prazo.” (obra citada, p.133).
A propósito, colho, no âmbito da egrégia Quarta Turma, o seguinte julgado:
“APELAÇÃO. TEMPESTIVIDADE. ADVOGADO RESIDENTE FORA DA SEDE DO
PROCESSO. INFORMAÇÕES ERRÔNEAS ORIUNDAS DA SECRETARIA SOBRE A
ÉPOCA DE INTIMAÇÃO DA SENTENÇA, INCLUSIVE VIA SISTEMA DE
COMPUTADOR. É SUSCETÍVEL DE OCASIONAR A SUSPENSÃO DO PRAZO O
EMBARAÇO PROCESSUAL PROVENIENTE DEINFORMAÇÃO EQUIVOCADA
PRESTADA PELA SECRETARIA DO JUÍZO. APLICAÇÃO DOS ARTS. 183 E PAR. 1.
E 507 DO CPC.
RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.” (Resp 49.456/DF, DJ 19/12/94, Rel. p/ Ac.
Min. Barros Monteiro).
Por todo o exposto, e, nos termos das considerações retro transcritas, conheço do recurso
pela divergência, e lhe dou provimento, para que, afastada a intempestividade dos
embargos à execução, possa o magistrado singular prosseguir no seu julgamento,
decidindo-lhe o mérito como de direito.
É o voto.
MINISTRO CASTRO FILHO
Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 514.412 - DF (2003/0053302-5)


RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : REGIUS SOCIEDADE CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
ADVOGADO : LISBETH VIDAL DE NEGREIROS BASTOS E OUTRO
ADVOGADA : VANESSA CAMARGO GARCIA LEÃO
RECORRIDO : CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA E OUTROS
ADVOGADO : CLÓVIS FERREIRA DE MORAIS E OUTROS

217
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
(PRESIDENTE): Srs. Ministros, com a devida vênia, divirjo do voto do Sr. Ministro
Relator, porquanto, até o momento, não há respaldo legal para que as intimações ocorram
via internet.
Como bem salientou o acórdão recorrido, as informações trazidas pela internet têm
natureza meramente informativa e não vinculativa, não substituindo a forma prevista em lei
para a contagem dos prazos.
No caso, segundo salientado no voto do ilustre Relator do acórdão recorrido, há a Portaria
nº 962, de 13 de setembro de 2000, que determinou a exclusão do termo ad quem dos
prazos processuais, reforçando o caráter meramente subsidiário das informações
transmitidas via internet. E diz mais:
"Com relação ainda à requisição à Central de Mandados do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal de informações sobre o prazo de devolução do mandado, nessa sede recursal, torna-
se inapropriada, já que a produção de provas não é admitida nesta Instância, inclusive
quando poderia a própria apelante requisitar tais informações."
Com essas breves considerações, peço vênia ao eminente Ministro Relator para conhecer
do recurso especial, mas negar-lhe provimento.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2003/0053302-5 RESP 514412 / DF
Número Origem: 20010110237530
PAUTA: 18/09/2003 JULGADO: 02/10/2003
Relator
Exmo. Sr. Ministro CASTRO FILHO
Relator para Acórdão
Exmo. Sr. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
Subprocuradora-Geral da República

218
Exma. Sra. Dra. ARMANDA SOARES FIGUEIREDO
Secretária
Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : REGIUS SOCIEDADE CIVIL DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
ADVOGADO : LISBETH VIDAL DE NEGREIROS BASTOS E OUTRO
RECORRIDO : CLAYTON TEIXEIRA DE SOUZA E OUTROS
ADVOGADO : CLÓVIS FERREIRA DE MORAIS E OUTROS
ASSUNTO: Execução - Embargos - Devedor
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso especial e, por maioria, vencido o Sr.
Ministro Castro Filho, negou-lhe provimento."
Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro.
Votou vencido o Sr. Ministro Castro Filho.
Votaram com o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro os Srs. Ministros Ari Pargendler,
Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi.
O referido é verdade. Dou fé.
Brasília, 02 de outubro de 2003
SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO
Secretária

219
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 14.530 - SE (2003/0093422-0)
RELATOR : MINISTRO JORGE SCARTEZZINI
RECORRENTE : JUAREZ DE CAMPOS LIMA
ADVOGADO : JUAREZ DE CAMPOS LIMA
RECORRIDO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE
PACIENTE : MARCOS JOSÉ SANTOS VIEIRA (PRESO)
EMENTA
PROCESSUAL PENAL - TENTATIVA DE HOMICÍDIO - PRISÃO EM
FLAGRANTE - EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA - PROCESSO
NA FASE DO ART. 499, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - SÚMULA 52,
DESTA CORTE .
- Consoante informações disponibilizadas pela internet, o processo se encontra na fase do
art. 499, do Código de Processo Penal. Dessa forma, considera-se encerrada a instrução
criminal, não ocorrendo constrangimento ilegal por excesso de prazo, nos termos do
verbete da Súmula 52, desta Corte.
- Ordem denegada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do
Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir,
por unanimidade, em negar provimento ao recurso. Votaram com o Sr. Ministro Relator os
Srs. Ministros LAURITA VAZ, JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, FELIX FISCHER e
GILSON DIPP.
Brasília, DF, 4 de setembro de 2003 (data do julgamento).
MINISTRO JORGE SCARTEZZINI, Relator

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 14.530 - SE (2003/0093422-0)


RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI (Relator): Cuida-se de recurso ordinário
em habeas corpus interposto por JUAREZ DE CAMPOS LIMA, em favor de MARCOS
JOSÉ SANTOS VIEIRA, em face do v. acórdão proferido pela colenda Câmara Criminal do

220
egrégio Tribunal do Estado de Sergipe, que denegou ordem ali impetrada, nos termos da
seguinte ementa:
“HABEAS CORPUS – PRISÃO – CONSTRANGIMENTO ILEGAL POR EXCESSO DE
PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA – DENÚNCIA OFERECIDA – FASE
ULTRAPASSADA – INEXISTÊNCIA – INTERPOSIÇÃO DE RECURSO – PRISÃO EM
FLAGRANTE – NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR
DEMONSTRADA – LEGALIDADE – DENEGAÇÃO DA ORDEM IMPETRADA.
Oferecida a denúncia, não cabe mais a alegação de excesso de prazo com fundamento na
falta desta, pois ultrapassada a fase de propositura da ação penal. Correta a manutenção
da prisão efetuada em flagrante com base em elementos concretos que demonstram a
necessidade. Ordem denegada. Decisão unânime.” (fl. 30)
Consta dos autos que o paciente foi preso em flagrante delito, em 1º/02/2002, pela prática
do crime previsto no art. 121, c/c o art. 14, ambos do Código Penal.
A defesa impetrou habeas corpus perante o e. Tribunal a quo, argumentando estar o
paciente sofrendo coação ilegal, em virtude do excesso de prazo para o oferecimento da
denúncia e ausência de motivos que justifiquem a constrição cautelar. A ordem foi
denegada, ao argumento de que “com o oferecimento da denúncia cessa o constrangimento
ilegal”, restando evidenciada no decisum a necessidade da manutenção da prisão do
paciente.
No presente recurso, o recorrente alega, em síntese, constrangimento ilegal em face da
manutenção da prisão cautelar do paciente, preso desde 1º/02/2002, sem que tenha ocorrido
o encerramento da instrução criminal. Sustenta, ainda, violação ao princípio da presunção
de inocência. Requer, ao final, seja o paciente colocado em liberdade. A douta
Subprocuradoria-Geral da República opina, às fls. 55/57, pelo desprovimento do recurso.
Após, vieram-me conclusos os autos.
É o relatório.
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 14.530 - SE (2003/0093422-0)
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI (Relator): Sr. Presidente, o recorrente
alega, em síntese, constrangimento ilegal em face da manutenção da constrição cautelar do
paciente, preso desde 1º/02/2002, sem que tenha ocorrido o encerramento da instrução

221
criminal. Sustenta, ainda, violação ao princípio da presunção de inocência. Requer, ao final,
seja o paciente colocado em liberdade.
Quanto ao alegado excesso de prazo, cumpre ressaltar que, consoante informações
disponibilizadas pela internet, o feito encontra-se na fase do art. 499, do Código de
Processo Penal. Encerrada, então, a instrução para a acusação, eventual demora deve ser
atribuída exclusivamente à defesa.
Tal circunstância – encerramento da instrução criminal, estando o feito na fase do art. 499,
do CPP – supera o possível excesso de prazo ocorrido (Súmula 052 do STJ) . A
jurisprudência desta E. Corte é pacífica:
"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO
ORDINÁRIO. ARTS. 159 § 1º E 158 § 1º DO C. P. (MULTIPLICIDADE DE AÇÕES
DELITUOSAS). POLICIAIS CIVIS. PRISÃO PREVENTIVA. MOTIVAÇÃO. EXCESSO DE
PRAZO.
I - Não se cassa decreto de segregação antecipada suficientemente fundamentado,
mormente em se tratando de imputação por delitos gravíssimos atribuídos a policiais. A
extrema periculosidade evidenciada, nos limites do writ, até recomenda - em termos,
inclusive, de senso comum - a aplicação da prisão ad cautelam.
II - Se o processo se evidencia fora do comum, com apuração complexa, elevado número
de testemunhas de defesa, pedido de adiamento, precatórias, etc., a inobservância do prazo
comum não gera, de pronto e de per si, constrangimento ilegal, ainda mais se as
testemunhas de acusação já foram ouvidas (Súmulas nº 52 e 64-STJ).
Writ indeferido." (HC 12.882/SP, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, Rel. p/ Acórdão
Ministro FELIX FISCHER, DJU de 04/09/2000) "PROCESSUAL PENAL. HABEAS
CORPUS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL: EXCESSO DE PRAZO E CESSAÇÃO DOS
MOTIVOS ENSEJADORES DA PRISÃO PREVENTIVA. INOCORRÊNCIA. SUMULAS
NUMS. 52 E 64 DO STJ. INTIMIDAÇÃO DE TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO.
EVIDENCIADO OBJETIVO DE OBSTRUIR A COLHEITA DE PROVAS.
- EVIDENCIADO QUE O PROCESSO SE ENCONTRA NA FASE DE INQUIRIÇÃO DAS
TESTEMUNHAS DE DEFESA, NÃO SE VISLUMBRA O ALEGADO
CONSTRANGIMENTO ILEGAL, AUTORIZADOR DA PRETENSÃO DE LIBERDADE

222
PROVISORIA, VEZ QUE EVENTUAL DEMORA DECORRE DA PRÓPRIA DEFESA.
ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NA SUMULA 64 DO STJ.
- DECRETADA A PRISÃO PREVENTIVA DO REU EM RAZÃO DA PRATICA DE ATOS
INTIMIDATÓRIOS PRATICADOS CONTRA TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO E
ENCONTRANDO-SE O PROCESSO EM FASE DE OITIVA DAS TESTEMUNHAS DE
DEFESA, IMPÕE-SE A MANUTENÇÃO DA MEDIDA CONSTRITIVA DA LIBERDADE
POR CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL, FACE A POSSIBILIDADE DE
EVENTUAL OBSTRUÇÃO DA COLHEITA DE PROVAS, DENOTADA POR AQUELE
COMPORTAMENTO.
- RECURSO DESPROVIDO." (RHC 5.067/SP, Rel. Ministro VICENTE LEAL, DJU de
11/03/96).
No que tange à alegada violação ao princípio da presunção de inocência, a impetração
também não merece prosperar.
Conforme entendimento pacificado nesta Corte, a medida constritiva em questão não viola
o princípio da presunção de inocência que, em verdade, não impede a tutela cautelar
quando decretada com lastro nos dispositivos do Código de Processo Penal. Nas
informações, à fl. 21, restou evidenciado que "foi decretada a prisão preventiva do
paciente por haver este Juízo entendido que era ela necessária para a garantia da ordem
pública e da instrução criminal.", não havendo, portanto, coação a ser corrigida.
Sob esse prisma, HÉLIO TORNAGHI, in “Compêndio de Processo Penal”, Tomo III,
pág. 1037/1038, com precisão esclareceu: “A situação do réu durante o processo está
ligada, não propriamente a qualquer presunção, de inocência ou de culpa, mas ao
convencimento que o juiz vai haurindo da prova, à medida que essa vai sendo feita. Pode o
juiz a princípio suspeitar que o réu é culpado, ou que é perigoso, ou que se prepara para
fugir, ou qualquer outra coisa, e depois verificar que a suspeita era infundada. Ou, ao
contrário, pode vir a convencer-se de fatos que militem contra o réu e que a princípio lhe
tenham passado despercebidos. No sistema das provas legais essa contínua e permanente
avaliação da prova era feita segundo cânones preestabelecidos em lei. O que deve ser
regulado não é propriamente a presunção de inocência ou de culpabilidade, pois onde
entra a prova já não há que falar em mera presunção. Regulada deve ser a situação do

223
acusado ou melhor os câmbios de situação e dos direitos, deveres, faculdades, podêres e
encargos decorrentes de cada um.”
Por tais fundamentos, nego provimento ao recurso.
É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA
Número Registro: 2003/0093422-0 RHC 14530 / SE
MATÉRIA CRIMINAL
Números Origem: 200285020628 350
EM MESA JULGADO: 04/09/2003
Relator
Exmo. Sr. Ministro JORGE SCARTEZZINI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro GILSON DIPP
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA
Secretária
Bela. LIVIA MARIA SANTOS RIBEIRO
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : JUAREZ DE CAMPOS LIMA
ADVOGADO : JUAREZ DE CAMPOS LIMA
RECORRIDO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE
PACIENTE : MARCOS JOSÉ SANTOS VIEIRA (PRESO)
ASSUNTO: Penal - Crimes contra a Pessoa (art.121 a 154) - Crimes contra a vida -
Homicídio ( art. 121 ) -
Tentado
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso."

224
Os Srs. Ministros Laurita Vaz, José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer e Gilson Dipp
votaram com o Sr. Ministro Relator.
O referido é verdade. Dou fé.
Brasília, 04 de setembro de 2003
LIVIA MARIA SANTOS RIBEIRO
Secretária

225
RECURSO ESPECIAL Nº 538.642 - RS (2003/0058826-1)
RELATOR : MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA
RECORRENTE : BANCO A J RENNER S/A
ADVOGADO : LÚCIA DO COUTO E SILVA E OUTROS
RECORRIDO : CÉSAR ADRIANO DOS SANTOS MENDES
ADVOGADO : SANDRA FUMAGALLI FONTOURA E OUTROS
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. CONTAGEM DE PRAZO PARA CONTESTAÇÃO.
SERVIÇO OFICIAL DE INFORMÁTICA. INFORMAÇÃO EQUIVOCADA.
É justificável o equívoco cometido pela parte fora do prazo regular se a tanto foi induzida por
informação errada ou imprecisa obtida no serviço oficial de informações posto à disposição das
partes e dos seus advogados pelo próprio Poder Judiciário. Todavia, na espécie, não houve
informação equivocada quanto à data de juntada do mandado, porém mera omissão.
Ademais, a juntada do cumprimento do mandado é ato que independe de intimação, sendo
desimportante para o início do prazo da contestação a ciência da parte quanto a esse ato em
particular e, por conseguinte, não constituindo justa causa eventual informação equivocada.
Recurso não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir,
por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho
Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro.
Brasília, 09 de setembro de 2003 (data do julgamento).
MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA, Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 538.642 - RS (2003/0058826-1)


RELATÓRIO
EXMO. SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA:
Cesar Adriano dos Santos Mendes propôs ação declaratória de inexistência de débito contra
Banco A. J. Renner S.A., cuja citação foi realizada em 24.04.2002 (fl. 49, verso) e juntada

226
aos autos em 02.05.2002 (fl. 48). O réu, contudo, somente apresentou contestação em
24.05.2002, fora do prazo legal.
Decretada a revelia pela sentença, o réu interpôs apelação, sustentando equívoco do serviço
de informática do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que o teria induzido
em erro sobre a data da juntada do mandado de citação.
Mesmo assim, foi decretada a revelia do réu porquanto a sua contestação foi considerada
intempestiva, sendo improvida a sua apelação, pelo r. aresto assim ementado:
"AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. REVELIA DECRETADA.
PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. PRETENSÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DA
SENTENÇA. ERRO NAS INFORMAÇÕES APRESENTADAS VIA INTERNET. PRAZO
PARA A CONTESTAÇÃO. CONTAGEM A PARTIR DA JUNTADA AOS AUTOS DO
MANDADO DE CITAÇÃO CUMPRIDO. VERIFICAÇÃO DEVE SER FEITA PELO RÉU A
VISTA DO QUE CONSTA NOS AUTOS DO PROCESSO." ( fl. 101).
Irresignado, o revel interpôs o presente recurso especial pela alínea "c" do permissivo
constitucional, sob o fundamento de divergência jurisprudencial.
Respondido, o recurso foi admitido na origem, ascendendo os autos a esta Corte.
É o relatório.
Recurso não conhecido.

VOTO
EXMO. SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA (Relator):
Sustenta o recorrente que foi induzido em erro por informação equivocada em consulta
processual pela internet, extraída do site do próprio Tribunal de origem, que apontara em
23.05.2002, antes do oferecimento da contestação:
"Últimas Movimentações:
18/04/2002 AUTOS RETORNADOS AO CARTÓRIO
18/04/2002 CUMPRIR DESPACHO
22/04/2002 CUMPRIR DESPACHO
26/04/2002 CUMPRIR DESPACHO
02/05/2002 CONCLUSÃO AO JUIZ
07/05/2002 CUMPRIR DESPACHO

227
08/05/2002 ORDENADA EXPED. DE OFICIO
ORDENADA EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO
08/05/2002 EXPEDIDO OFÍCIO
09/05/2002 VISTA RÉU
23/05/2002 CONCLUSÃO AO JUIZ" (fl. 87).
O réu aduz que as informações processuais fornecidas eletronicamente têm valor de
certidão e fé pública, constituindo seu erro hipótese de justa causa, apresentando dissídio
com julgados do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que restituíram o
prazo no caso de informações incorretas obtidas por via eletrônica.
Não merece prosperar o inconformismo.
Sobre o tema que aqui interessa, qual seja qual a importância que se deve dar, para
configuração de justa causa, à informação obtida através de serviço auxiliar de notícia que
contenha equívoco induzindo a parte em erro e, por decorrência, em perda de prazo, adotei
a mesma tese aqui defendida pelo recorrente, no voto-vencido proferido no REsp n.
268.037/PB.
Ali asseverei que, primeiramente, deve-se ter em conta que quase todos - senão todos - os
tribunais brasileiros exaltam como grande realização a informatização dos seus trabalhos,
imprimindo no espírito dos jurisdicionados e de todos os operadores do Direito,
especialmente no dos advogados, a idéia de ser um serviço absolutamente confiável.
Esses serviços têm como finalidade não apenas facilitar o acompanhamento processual por
parte dos advogados e seus clientes, mas também e sobretudo de desafogar o trabalho nas
secretarias das varas, que não mais seria interrompido na busca de informações sobre os
processos, sempre que ocorra uma movimentação processual.
Daí decorre a absoluta necessidade de que esse serviço seja rigorosamente confiável, sob
pena de perder a sua razão de ser. Pontifica o art. 183 do Código de Processo Civil:
"Art. 183 - Decorrido o prazo, extingue-se, independentemente de declaração judicial, o
direito de praticar o ato, ficando salvo, porém, à parte provar que o não realizou por justa
causa.
§ 1º - Reputa-se justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte, e que a
impediu de praticar o ato por si ou por mandatário.

228
§ 2º - Verificada a justa causa o juiz permitirá à parte a prática do ato no prazo que lhe
assinar".
A referida informação errada, obtida no site do próprio Tribunal, que induziu o advogado
em erro e o levou, por decorrência, a perder o prazo, importa em justa causa, daí porque
incidente a regra acima mencionada.
Todavia, na hipótese em tablado, a informação constante em 09.05.2002, no site do
Tribunal de origem, era de "VISTA AO RÉU", em nada pertinente à juntada do mandado
citatório, não havendo informação errônea quanto ao ponto, porém mera omissão incapaz
de ensejar justa causa.
Ademais, a juntada do cumprimento do mandado é ato que independe de intimação, sendo
desimportante para o início do prazo da contestação a ciência da parte quanto a esse ato em
particular e, por conseguinte, não constituindo justa causa eventual informação equivocada
quanto ao ponto.
Diante desses pressupostos, não conheço do recurso especial.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2003/0058826-1 RESP 538642 / RS
Número Origem: 70004920542
PAUTA: 04/09/2003 JULGADO: 09/09/2003
Relator
Exmo. Sr. Ministro CESAR ASFOR ROCHA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FERNANDO HENRIQUE OLIVEIRA DE MACEDO
Secretária
Bela. CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : BANCO A J RENNER S/A
ADVOGADO : LÚCIA DO COUTO E SILVA E OUTROS

229
RECORRIDO : CÉSAR ADRIANO DOS SANTOS MENDES
ADVOGADO : SANDRA FUMAGALLI FONTOURA E OUTROS
ASSUNTO: Civil - Contratos - Financiamento
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo
Teixeira e Barros Monteiro votaram com o Sr. Ministro Relator.
O referido é verdade. Dou fé.
Brasília, 09 de setembro de 2003
CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
Secretária

230
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

Órgão : 3ª Turma Cível


Classe : AGI – Agravo de Instrumento
N. Processo : 2003002007389-2
Agravante : POSTO CÉU 070 COMBUSTÍVEIS LTDA.
Agravada : COMPANHIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO IPIRANGA
Relator Des. : LÉCIO RESENDE

EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONTESTAÇÃO –
INTEMPESTIVIDADE – INFORMAÇÕES – INTERNET
– VEICULAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO –
UNÂNIME. A introdução da informática e sua freqüente
utilização pelos diversos setores da Justiça, tem como
finalidade maior agilidade e rapidez no trabalho diário,
possuindo caráter meramente subsidiário, não
substituindo a publicação em Órgão Oficial. O advogado
tem o dever de zelar pelos processos que patrocina.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da 3ª Turma


Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios LÉCIO
RESENDE - Relator, JERONYMO DE SOUZA e VASQUEZ CRUXÊN -
Vogais , sob a presidência do Desembargador JERONYMO DE SOUZA, em
CONHECER; REJEITAR A PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO, À
UNANIMIDADE, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília, 30 de outubro de 2003
Des. JERONYMO DE SOUZA
Presidente

Des. LÉCIO RESENDE

Relator

231
REVISTA DE DIREITO ELETRÔNICO – REDE
ANO I – Nº 03 – ISSN 1679-1045

RELATÓRIO

Posto Céu 070 Combustíveis Ltda. interpõe


Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, em desfavor de
Companhia Brasileira de Petróleo Ipiranga, visando desconstituir decisão
proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Circunscrição Judiciária
da Ceilândia, que considerou intempestiva a contestação apresentada.
O pedido de efeito suspensivo foi indeferido,
conforme despacho de fls. 33/34.
O MM. Juiz de Direito prestou informações de
fls. 37/39, esclarecendo que manteve o decisum por seus próprios
fundamentos.
A agravada contraminutou o recurso, fls. 45/54,
argüindo preliminar de não conhecimento do recurso, ao fundamento de
ausência de informação sobre os advogados do feito, bem como a ausência de
procuração.
No mérito, pugna pelo não provimento do
recurso, mantendo-se a decisão agravada que decretou a revelia do agravante.
É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador LÉCIO RESENDE - Relator


Trata-se de Agravo de Instrumento interposto
por Posto Céu 070 Combustíveis Ltda., em desfavor de Companhia Brasileira de
Petróleo Ipiranga, visando desconstituir decisão proferida pelo MM. Juiz de
Direito da 1ª Vara Cível da Circunscrição Judiciária da Ceilândia, que considerou
intempestiva a contestação apresentada.

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Ao contraminutar o recurso, a agravada argüiu


preliminar de não conhecimento, ao fundamento de ausência de informação
sobre os advogados, no feito, bem como a ausência da procuração.
Consta dos autos a procuração do agravante, fls.
14, onde consta o endereço profissional dos ilustres advogados, localizados na
SHCGN 704/705, Bloco “E”, entrada 52, salas 101/102, Brasília-DF, cumprindo,
assim, o determinado em lei.
Às fls. 19, encontra-se o substabelecimento da
procuração da agravada, onde consta o nome da ilustre advogada subscritora da
inicial, bem como seu endereço comercial, sito na Avenida T-2, 917 – Pavimento
Superior, Setor Bueno, Goiânia/GO.
Rejeito, pois, a preliminar.
Presentes os pressupostos processuais,
conheço do recurso interposto, passando à análise do mérito.
Quando da análise do efeito suspensivo,
praticamente esgotei a matéria de mérito, razão por que permito-me transcrever
o decisum, verbis:
“A ora agravada ajuizou Ação Cominatória
em desfavor da agravante. Consta dos autos,
conforme certidão de fls. 21, que o Oficial de
Justiça-Avaliador citou e intimou Céu 070
Combustíveis, na pessoa de sua gerente-
financeira que recebeu contrafé e exarou a sua
nota de ciente. Certifica, ainda, que o ato foi
realizado na pessoa da gerente em face do
representante legal não ter sido encontrado na
empresa e que acompanhou o Sr. Oficial uma
equipe da agravada, para fazer as mudanças
contidas na determinação judicial, que não
ocorreram sob a alegação de que a gerente da
empresa não permitiu, face à ausência do
representante.
Referido Mandado foi juntado aos autos,
cumprido quanto à citação e intimação no dia 07
de abril de 2003, conforme juntada de fls. 20
verso.
Como parte da determinação contida no
Mandado não foi cumprida, o MM. Juiz de Direito
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determinou o desentranhamento do Mandado,


sendo ele cumprido, em 25 de abril de 2003,
quanto ao restabelecimento da apresentação
externa do local, bem como a instalação de
equipamento de controle do fornecimento de
combustível nos tanques. O Mandado e a
certidão foram juntados em 05 de maio de 2003,
conforme juntada de fls. 24.
A Contestação foi apresentada no dia 20
de maio de 2003, intempestivamente, vez que a
citação foi efetivada em 04 de abril de 2003, e o
Mandado juntado aos autos, com esta parte
cumprida, em 07 de abril de 2003.
A alegação de que o fornecimento de
informações por meio eletrônico encontrava-se
errado e, por isso, ofertou contestação
intempestivamente, não tendo como ser
responsabilizado, não merece prosperar.
A introdução da informática e sua freqüente
utilização pelos diversos setores desta Corte de
Justiça, trouxe mais agilidade e rapidez ao
trabalho diário, sendo de maior relevância.
Entretanto, tal serviço possui caráter meramente
subsidiário, não substituindo a publicação no
Órgão Oficial. Tem o advogado o dever de zelar
pelos processos que patrocina.”

Sobre o tema em questão, trago à colação


ementas desta augusta Corte de Justiça, verbis:
“Ementa
PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE
INSTRUMENTO – APELAÇÃO –
INTEMPESTIVIDADE – INFORMAÇÕES
VEICULADAS PELA INTERNET – PRAZO –
REABERTURA – NÃO CABIMENTO. AS
INFORMAÇÕES CONTIDAS NA PÁGINA DO
TRIBUNAL, VEICULADA PELA INTERNET, OU
NA FOLHA DE ACOMPANHAMENTO
PROCESSUAL DA SECRETARIA, SE
PRESTAM TÃO-SOMENTE A SUBSIDIAR
ADVOGADOS E PARTES QUANTO AO
ANDAMENTO DOS PROCESSOS, NÃO
DETENDO, AS INFORMAÇÕES ALI
CONTIDAS, CUNHO OFICIAL QUE AS FAÇA
PREVALECER SOBRE AQUELAS CONTIDAS
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NOS PRÓPRIOS AUTOS. REJEITA-SE O


PEDIDO DE REABERTURA DE PRAZO,
MÁXIME PORQUE INEXISTENTE QUALQUER
EQUÍVOCO NA INFORMAÇÃO PRESTADA NA
INTERNET E NA FOLHA DE
ACOMPANHAMENTO DO CARTÓRIO.” (AGI
20020020061678 – Relator Desembargador
Sérgio Bittencourt, 4ª Turma Cível)

“Ementa
AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE
COBRANÇA – RESTITUIÇÃO DE PRAZO
PARA CONTESTAÇÃO – RAZÕES DE
RECURSO DIVERSAS DA QUE DEU ORIGEM
À DECISÃO AGRAVADA – PRAZOS
PROCESSUAIS. 01. 0 TRIBUNAL NÃO PODE
APRECIAR MATÉRIA QUE AINDA NÃO FOI
OBJETO DE ANÁLISE NA INSTÂNCIA
MONOCRÁTICA. 02. COMPETE AO
ADVOGADO CONHECER OS PRAZOS NÃO
PODENDO SE VALER DE INFORMAÇÕES
ERRÔNEAS, PORVENTURA PRESTADAS
POR FUNCIONÁRIO DA SECRETARIA OU VIA
INTERNET, PREVALECENDO A PUBLICAÇÃO
NO ÓRGÃO OFICIAL. 03. É VÁLIDA A
CITAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA, QUANDO
COMPROVADA A ENTREGA DA
CORRESPONDÊNCIA, MEDIANTE AR, NA
SUA SEDE E SEU RECEBIMENTO POR QUEM
SE IDENTIFICOU COMO EMPREGADO DA
MESMA. 04. RECURSO DESPROVIDO.
UNÂNIME.” (AGI 20010020058216 – Relator
Desembargador Romeu Gonzaga Neiva, 5ª
Turma Cível)

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

O Senhor Desembargador JERONYMO DE SOUZA - Presidente e Vogal


Com o Relator.

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O Senhor Desembargador VASQUEZ CRUXÊN - Vogal


Com a Turma.

DECISÃO
Conhecido. Rejeitada a preliminar. Negou-se provimento. Unânime.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 137.379-9, DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA


DE CURITIBA

AGRAVANTE: SALOMÃO CATEB E ASSOCIADOS - ASSESSORIA JURÍDICA

AGRAVADO: CARLA FERNANDES ARAUJO

RELATOR: JUIZ SUBST. EM 2º GRAU, AUGUSTO CÔRTES

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. CAUTELAR


INOMINADA E AÇÃO ORDINÁRIA DE REPARAÇÃO DE DANOS. OFENSAS
IRROGADAS POR E-MAILS COM DIVULGAÇÃO ATRAVÉS DA INTERNET.
ATO DIVULGADO EM VÁRIOS LUGARES. COMPETÊNCIA DO FORO DO
LUGAR EM QUE SE FAZ SENTIR OS REFLEXOS DO ATO. ADMISSIBILIDADE.
EXEGESE DO ART. 100, V, a DO CPC. IMPROCEDÊNCIA. DECISÃO CORRETA.
AGRAVO DESPROVIDO.

Se lugar do ato é todo aquele onde acontecer pelo menos parte dele e ele se deu em vários
lugares podendo qualquer deles ser considerado competente, parece razoável admitir-se
como competente aquele onde a vítima dele tomou conhecimento e este passou a produzir
reflexos danosos na sua esfera de atuação, justificando-se, assim, plenamente a escolha
pela agravada do foro do seu domicílio como competente para o julgamento da respectiva
ação de reparação de dano.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO nº


137.379-9, da 4ª Vara Cível da Comarca de Curitiba, em que é agravante SALOMÃO
CATEB E ASSOCIADOS - ASSESSORIA JURÍDICA e agravado CARLA
FERNANDES ARAUJO.

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por Salomão Cateb e Associados


Assessoria Jurídica contra decisão proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de
Curitiba que julgou improcedente a exceção de incompetência oposta à ação de
indenização por danos contra si promovida por Carla Fernandes Araújo, declarando-se
competente para julgar a referida demanda (fls. 100/101).

Narra que a agravada promoveu inicialmente cautelar inominada pretendendo a


identificação de usuário da internet em razão da autoria de textos ofensivos que lhe foram
dirigidos e obtendo indicação da sua pessoa, antes de apresentada contestação à cautelar,
ingressou com ação ordinária de indenização por danos morais e materiais.

Oposta exceção declinatória de foro sustentando que as ações deveriam tramitar no foro

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do seu domicílio, deu-se a rejeição contra a qual ora se debate, entendendo não ter sido
correta a decisão, primeiramente porque negando a autoria e não havendo prova pré-
constituída da autoria dos textos, entende que a agravada não poderia optar pelo seu foro,
calcada no art. 100, parágrafo único do CPC.

Argumenta, ainda, que as ações fundadas em direito pessoal, consoante dispõe o art. 94
do CPC, é o foro do domicílio do réu, além do que, se tratando de pessoa jurídica, a
competência é do lugar onde está sua sede, conforme dispõe o art. 100, IV, a do CPC.

Em segundo, porque, atribuindo aos réus a autoria dos e-mails, só se pode deduzir que o
lugar em que foram redigidos é o do domicílio dos réus, na comarca de Belo Horizonte, e
não o de Curitiba, ainda que com base no art. 100, V, a do CPC.

Propugnando pela concessão do efeito suspensivo, pleiteia o provimento para reformar a


decisão e determinar como competente para o julgamento das ações a comarca de Belo
Horizonte/MG.

Recepcionado o recurso com a concessão do efeito pretendido (fls. 117), a agravada


apresentou suas contra-razões (fls. 123/133).
É o relatório necessário.

VOTO

Em que pesem as ponderações do agravante não há como prosperar sua pretensão,


devendo ser mantida a decisão do Juízo singular quando conclui ser competente para o
julgamento das demandas em questão.

Com efeito, esta competência não é determinada pelo parágrafo único do art. 100 do
CPC, posto que se refere, além dos acidentes de trânsito, aos danos decorrentes em razão
de delito e, como bem ressalta Celso Agrícola Barbi, esta expressão legal deve ser
tomada como abrangendo apenas o delito penal e não o civil; isto porque nossa legislação
geralmente não usa a palavra delito, quando se refere ao ilícito civil. ( in Comentários ao
Código de Processo Civil, I Vol., Forense, 2ª ed., p.457/458), implicando, pois, no
reconhecimento por sentença criminal, com trânsito em julgado. Daí o julgado deste
Tribunal a qual se reporta o agravante, da lavra do Juiz Conv. Ruy Cunha Sobrinho (fls.
08).

Portanto, a questão deve ser decidida com fulcro no art. 100, V, a do CPC que prevê ser
competente o foro do lugar do ato ou fato para a ação de reparação do dano, norma
invocada pelo próprio agravante, mas com solução diversa da que preconiza em
decorrência da sua aplicação.

E assim o é porque como leciona Celso Agrícola Barbi lugar do ato ou fato é todo aquele
onde acontecer pelo menos parte dele; assim, se ele se deu em vários lugares, o foro de
qualquer desses é considerado como competente. (ob. cit., pg. 456).

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Ademais, a prática do ilícito em discussão exige uma série de procedimentos para a


consumação do ato, não sendo o primeiro deles, o de redigir, e nem o segundo, o envio
pela internet, vez que pode nem chegar ao destinatário, os que efetivamente causam os
eventuais danos morais e materiais, mas sim a ciência da divulgação pelo ofendido,
porquanto a partir desse momento os reflexos da ofensa, em forma de dano, se fazem
sentir.

Portanto, se lugar do ato é todo aquele onde acontecer pelo menos parte dele e ele se deu
em vários lugares podendo qualquer deles ser considerado competente, parece razoável
admitir-se como competente aquele onde a vítima dele tomou conhecimento e este passou
a produzir reflexos danosos na sua esfera de atuação, justificando-se, assim, plenamente a
escolha pela agravada do foro do seu domicílio como competente para o julgamento da
respectiva ação de reparação de dano.

Quanto a ação cautelar inominada, sendo preparatória à ação de reparação de danos


haveria de ser proposta, por força do que dispõe o art. 800 do CPC, perante o juiz
competente para conhecer da ação principal, resolvendo-se a exceção declinatória de
competência de maneira uniforme em relação a ambas, sendo, por outro lado, de todo
irrelevante nesta fase a admissão ou não da autoria do fato, questão a ser debatida e
enfrentada na demanda à vista do conjunto probatório a ser formado no curso do
processo.

Feitas essas considerações e ainda que com fundamento um tanto diverso daquele
adotado pelo Juízo singular, voto no sentido de negar provimento ao presente recurso,
mantendo íntegra a correta decisão objurgada.

Diante do exposto, ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da Quarta


Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, em negar
provimento ao recurso, nos termos do voto.

Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores ANGELO ZATTAR,


Presidente sem voto, WANDERLEI RESENDE e DILMAR KESSLER.

Curitiba, 24 de setembro de 2003.

Augusto Côrtes
Relator

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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 139.771-1, DE CURITIBA 3ª VARA CÍVEL.


Agravante: BANCO SANTANDER BRASIL S/A.
Agravado: LUIS FILIPE SANCHES DE SOUSA DIAS REIS.
Relator: Des. DOMINGOS RAMINA.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVELIA DECRETADA. ALEGAÇÃO DE JUSTA


CAUSA NA PERDA DO PRAZO DA CONTESTAÇÃO. INFORMAÇÃO ERRÔNEA
SOBRE O TÉRMINO DO PRAZO VEICULADA NA INTERNET, EM SISTEMA
NÃO OFICIAL. PREVALÊNCIA DAS REGRAS PROCESSUAIS DE INTIMAÇÃO.
DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1. A contagem dos prazos legais para a prática de atos processuais é de responsabilidade


das partes, por seus advogados, ou do juiz, não competindo à escrivania estabelecer o
termo final.

2. As informações veiculadas na Internet sobre a movimentação processual da Justiça


Estadual em primeira instância são de responsabilidade da Associação dos Serventuários
da Justiça e servem apenas como meio de facilitação ao trabalho dos advogados, mas não
têm caráter oficial para a prática dos atos processuais, não substituindo os meios legais de
intimações dos atos processuais, seja por certidões nos autos ou por publicação no Diário
da Justiça.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 139.771-1,


oriundos da 3ª Vara Cível da Comarca de Curitiba, em que é agravante BANCO
SANTANDER BRASIL S/A, sendo agravado LUIS FILIPE SANCHES DE SOUSA
DIAS REIS.

Relatório

Cuida-se de recurso de agravo de instrumento interposto em face da decisão proferida nos


autos de Indenização por Danos Morais proposta por Luis Filipe Sanches de Sousa Dias
Reis contra o Banco Santander Brasil S/A, que considerou intempestiva a contestação e
declarou a revelia do requerido.

Asseverou o recorrente que, de acordo com o site da ASSEJEPAR, constou em


informação de 07/08/2002, como data de vencimento do prazo de contestação o dia
22/08/2002; que essa incorreta informação na Internet exime o agravante dos efeitos da
revelia, a teor do art. 183 e seus parágrafos, do Código de Processo Civil, pois foi levado
a erro, caracterizando justa causa para a prática do ato fora do prazo legal, por fato
totalmente alheio à vontade do recorrente.

Requereu, assim, a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, o seu


provimento com a reforma da decisão agravada.

O pleiteado efeito suspensivo foi indeferido.

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A agravado respondeu ao recurso, insistindo na intempestividade da contestação e no


caráter extra-oficial do site de onde o agravante obteve a informação errônea; aduziu que
as informações ali prestadas não valem como certidão de intimação e que não houve
informação errada sobre a juntada do AR, mas apenas quando à contagem do prazo, razão
pela qual deveria o advogado ter diligenciado para conferir a data de tal juntada; por fim,
asseverou que o sistema mantido pela ASSEJEPAR existe para auxiliar os funcionários
do cartório, podendo ser consultado pelos procuradores e partes, mas os prazos ali
consignados referem-se ao trabalho do cartório e não prazos judiciais.
O Juízo de origem deixou de prestar informações.

Voto

O recurso não merece provimento.

Como visto do relato supra, visa o recorrente seja reconhecida a justa causa na
apresentação tardia da contestação, em face de informação errônea veiculada na internet,
a fim de afastar os efeitos da revelia.

Verifica-se dos autos que a juntada do AR deu-se em 05/08/2002, mas a contestação


apenas foi protocolizada em 22/08/2002, dois dias, portanto, após o término do prazo
legal.

Inicialmente, é de se consignar que não houve erro na informação sobre a data de juntada
do AR, pois ali constou como sendo dia 05/08/2002, mas sim erro na informação de que
o prazo de 15 dias para resposta terminaria em 22/08/2002, enquanto o correto era
20/08/2003.

Entretanto, a contagem dos prazos legais para a prática de atos processuais é de


responsabilidade das partes, por seus advogados, ou do juiz, não competindo à escrivania
estabelecer o termo final.

Outrossim, os precedentes jurisprudenciais do egrégio Superior Tribunal de Justiça,


colacionados pelo agravante, são oriundos da Justiça Federal, cujo site na Rede de
Computadores tem caráter oficial porque operado pelo Poder Judiciário.
Neste caso, ao contrário, como já asseverado na decisão inicial deste agravo de
instrumento, as informações veiculadas na Internet sobre a movimentação processual da
Justiça Estadual em primeira instância são de responsabilidade da Associação dos
Serventuários da Justiça e servem apenas como meio de facilitação ao trabalho dos
advogados, mas não têm caráter oficial para a prática dos atos processuais.
Daí porque não tem o condão de substituir os meios legais de intimações dos atos
processuais, seja por certidões nos autos ou por publicação no Diário da Justiça.

Tanto é que, ao acessar a referida página da internet para a realização de consulta


processual, o internauta depara-se com o seguinte aviso:

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Alertamos que as movimentações contidas nos autos não substituem os avisos e


intimações publicados no Diário de justiça, e não valem como certidão.
Sobre o tema, a jurisprudência pátria corrobora o entendimento aqui adotado, como se vê
destes julgados colacionados pelo agravado (cfr. fls. 167/169):

Embargos de declaração. Intimação. - Para efeitos legais, a intimação publicada no Diário


da Justiça é que é válida. As informações prestadas pelo sistema de computação da Corte
são meros subsídios aos advogados, não tendo a finalidade de se substituírem às formas
previstas na lei. (Supremo Tribunal Federal, Pleno, AR 1323 ED/RS, rel. Min. Moreira
Alves, julg. 2/5/91, DJU de 2/6/91, p. 8.427).

PROCESSUAL CIVIL ANDAMENTO FORNECIDO PELA INTERNET NÃO


CONSIGNAÇÃO DA JUNTADA DO AR AOS AUTOS PERDA DO PRAZO PARA
APRESENTAÇÃO DA CONTESTAÇÃO 1. A jurisprudência é uníssona no sentido de
que as informações prestadas pela internet servem de mero subsídio às partes e seus
advogados, não substituindo as formas previstas na Lei. É dever dos interessados
diligenciar no sentido de fiscalizar o início e término dos prazos processuais pois,
independentemente da informação lançada pela internet, uma vez juntado aos autos o AR
cumprido, o prazo pra o oferecimento da defesa começa a fluir. 2. Tanto assim o é que ao
abrir a página da internet está inserida a seguinte mensagem: estes serviços não
dispensam o uso dos instrumentos oficiais de comunicação para produção de efeitos
legais. As informações são disponibilizadas no momento e na forma em que são inseridas
na base de dados pelos serventuários dos órgãos judiciários. 3. Sentença mantida.
Apelação improvida. (TJDF, Ap. Cív. 20000110545358, 3ª Turma Cível, rel. Des.
Jeronymo de Souza, DJU 25.9.2002, p. 52).

Compete ao advogado conhecer os prazos, não podendo se valer de informações


errôneas, porventura prestadas por funcionário da secretaria ou via internet, prevalecendo
a publicação no órgão oficial. (TJDF, AGI 20010020058216, 5ª Turma Cível, rel. Des.
Romeu Gonzaga Neiva, DJU 13.3.2002, p. 73).

AGRAVO DE INSTRUMENTO DEVOLUÇÃO DE PRAZO PARA CONTESTAÇÃO


SISTEMA DE INFORMAÇÕES PROCESSUAIS ART. 241, IV, DO CPC ART. 322, IN
FINE EFEITOS DA REVELIA Muito embora o sistema de informações
computadorizado seja instrumento de apoio aos advogados, não tem o condão de alterar o
termo inicial para contagem do prazo para contestação, disciplinado pelo Código de
Processo Civil. Ocorrência de revelia. (TRF 2ª Região, AI 98.02.39690-7, 4ª Turma, rel.
Des. Fed. Rogério Vieira de Carvalho, DJU 08.06.1999, p. 368).

Portanto, não está caracterizada a justa causa, como acontecimento imprevisto e alheio à
vontade da parte, que a impediu de praticar o ato processual tempestivamente.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Decisão

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ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de


Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, em desprover o recurso de agravo de
instrumento, de acordo com o voto do Relator.

O julgamento foi presidido pelo Senhor Desembargador ANTONIO GOMES DA


SILVA, com voto, e dele participou o Senhor Desembargador LUIZ CEZAR DE
OLIVEIRA.

Curitiba, 12 de agosto de 2003.

Des. DOMINGOS RAMINA Relator.

APELAÇÃO CÍVEL N. 130075-8, DE LONDRINA


9ª VARA CÍVEL
Apelantes : 1 - Délio Nunes Cesar 2 - Netcom Provider Comunicação
Virtual Ltda.
Apelado : Oswaldo de Jesus Militão
Relator : Des. Antônio Gomes da Silva
Red./ acórdão : Des. Luiz Cezar de Oliveira

PROCESSUAL CIVIL - RECURSO - PREPARO - PROVA A SER FEITA NO


MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO - ÔNUS DESATENDIDO - DESERÇÃO -
APELAÇÃO DO PRIMEIRO RÉU NÃO CONHECIDA.

CIVIL - DANO MORAL - INTERNET - MATÉRIA OFENSIVA À HONRA


INSERIDA EM PÁGINA VIRTUAL - AÇÃO MOVIDA PELO OFENDIDO EM FACE
DO TITULAR DESTA E DO PROVEDOR HOSPEDEIRO - CO-
RESPONSABILIDADE - NÃO CARACTERIZAÇÃO - CONTRATO DE
HOSPEDAGEM - EXTENSÃO - PERTINÊNCIA SUBJETIVA QUANTO AO
PROVEDOR - AUSÊNCIA - SENTENÇA QUE IMPÕE CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA
- REFORMA.

Em contrato de hospedagem de página na Internet, ao provedor incumbe abrir ao


assinante o espaço virtual de inserção na rede, não lhe competindo interferir na
composição da página e seu conteúdo, ressalvada a hipótese de flagrante ilegalidade. O
sistema jurídico brasileiro atual não preconiza a responsabilidade civil do provedor
hospedeiro, solidária ou objetiva, por danos morais decorrentes da inserção pelo
assinante, em sua página virtual, de matéria ofensiva à honra de terceiro.

PROVIMENTO DO RECURSO DA SEGUNDA RÉ.

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REVISTA DE DIREITO ELETRÔNICO – REDE
ANO I – Nº 03 – ISSN 1679-1045

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 130075-8, da 9ª Vara


Cível da comarca de Londrina, em que são apelantes, DÉLIO NUNES CESAR e
NETCOM PROVIDER COMUNICAÇÃO VIRTUAL LTDA., e, apelado, OSWALDO
DE JESUS MILITÃO.

1 - Conforme exposto no relatório de fls. 228/230, que a este se integra, cuida-se de ação
indenizatória por danos morais intentada por OSWALDO DE JESUS MILITÃO,
jornalista, em face de DÉLIO NUNES CESAR e NETCOM PROVIDER
COMUNICAÇÃO VIRTUAL LTDA., que o Juízo em epígrafe julgou procedente,
condenando ambos os réus, solidariamente, a pagar indenização de 250 (duzentos e
cinqüenta) salários mínimos, com juros e correção monetária, além dos ônus
sucumbenciais, os honorários arbitrados em 20% sobre o valor da condenação.

Ao fundo, fato relacionado com a inserção, no jornal eletrônico do réu DÉLIO, veiculado
na Internet mediante acesso pela ré NETCOM, de matéria ofensiva à honra subjetiva do
apelado.

O réu, DÉLIO, protocolou apelação que foi recebida pelo despacho constante de fl. 167,
contra o qual o autor interpôs agravo retido, pleiteando seja o apelo declarado deserto,
por falta de preparo (fls. 195/199).

Manifestou a ré, NETCOM, por seu turno, tempestivo e regularmente preparado recurso
de apelação (fls. 168/181), pedindo reforma da sentença, primeiro, porque os provedores
de acesso à Internet não são responsáveis pelos atos dos seus assinantes, sendo
inadmissível aplicar-se à hipótese a legislação de imprensa, devendo responder tão
somente o autor da matéria; segundo, porque, a prevalecer contrário entendimento, o
pedido deve ser julgado improcedente, na medida em que o contexto do caso não enseja
obrigação de indenizar, pois o autor/apelado não foi ofendido moralmente.

As contra-razões foram oferecidas, no sentido de ser mantida a sentença recorrida.

2 - Deve prosperar o agravo retido, manifestado contra a decisão que deu seguimento à
primeira apelação, interposta por DÉLIO NUNES CESAR, eis que a petição recursal,
bem como denuncia o agravante, veio desacompanhada da indispensável prova do
preparo, a qual, segundo a sistemática processual, deve ser apresentada no ato da
interposição.

Nos termos do art. 511, do Código de Processo Civil, como conseqüência de tal omissão,
considera-se deserta a apelação, de sorte que a decisão agravada, ao lhe dar curso,
distanciou-se dos cânones processuais.

Logo, declarada a deserção, não se conhece do recurso de apelação interposto por DÉLIO
NUNES CESAR.

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3 - Na insurgência recursal da segunda apelante, NETCOM, destaca-se o primeiro


fundamento, no sentido de que os provedores de acesso não têm responsabilidade pela
matéria inserida pelos assinantes, nas páginas eletrônicas de seu uso exclusivo.

Com efeito, é de se ponderar que o provedor não exerce interferência na utilização da


página pelo assinante, ou na criação da matéria por este ali diariamente inserida.
Ademais, o ato de inserção produz efeitos imediatos, não dispondo o provedor de meios
eficientes, ou mesmo legais, para exercer tal controle ou censura, que, urge lembrar, até
se defrontaria com óbices jurídicos.

Note-se, no caso em exame, especificamente, que a imputação é de ofensa à honra


subjetiva do autor/apelado, por afirmações injuriosas ou difamatórias feitas pelo réu
DÉLIO, através de inserção em sua página virtual. Não se cogita, portanto, de uma
flagrante ilegalidade, que despertasse a atenção e abrisse perspectiva à exigibilidade de
uma pronta iniciativa da parte do provedor, no sentido de coibir uma utilização
flagrantemente ilegal ou abusiva do espaço virtual.

Por outro lado, não há amparo jurídico para se estabelecer, no caso, a responsabilidade
objetiva da apelante, enquanto provedora e hospedeira.

Para decidir como decidiu, a MM.ª Juíza singular tomou como fundamento essencial o
art. 5º, inc. V, da Constituição Federal, afastando qualquer obstáculo da legislação
infraconstitucional, que se apresentasse à pretensão indenizatória do autor. Atenta,
certamente, ao princípio de que não há responsabilidade sem culpa, invocou o art. 159 do
Código Civil, assinalando, como requisitos à caracterização desta, e da conseqüente
obrigação de indenizar: ação ou omissão do agente; relação de causalidade; existência do
dano; dolo ou culpa do agente.

Entretanto, se no tocante ao agir do primeiro réu - titular da página e autor da matéria


tomada como ofensiva - tais fatores estão claramente revelados e a sentença bem os
enfatizou, de outro vértice, deixou a douta Magistrada de aprofundar análise a respeito da
conduta da ré NETCOM, de modo a demonstrar a presença de ação ou omissão
caracteristicamente culposa ou dolosa a ela imputável, além do indispensável vínculo
direto de causalidade, na produção dos danos experimentados pelo autor.

Anotou, apenas, que: O mesmo vale para a responsabilidade da ré Netcom Provider, que,
por ser órgão de divulgação de conteúdo, inclusive com previsão contratual de
determinação final sobre o conteúdo (cláusula 4.5 do contrato de hospedagem de domínio
virtual - fls. 80), é igualmente responsável por eventuais danos causados a terceiros, que
não são atingidos pelas cláusulas de exclusão de responsabilidade, que somente valem
entre as partes contratantes. (fl. 138)

A visão assim delineada, portanto, é da existência de uma responsabilidade contratual

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solidária, emergente da relação entre DÉLIO e NETCOM, por danos causados a terceiros.
Um enfoque, data venia, equivocado, pois a aludida cláusula 4.5 estabelece condições
entre as partes signatárias, para o uso da página virtual, limitando-o a propósitos
agasalhados pela ordem jurídica. Prevê o direito da provedora fiscalizar o conteúdo, com
possibilidade desta desfazer o contrato em caso de inserção de matéria obscena ou ilegal.

Mas, na leitura de todo o texto, não se depara com qualquer disposição que autorize a
alvitrada compreensão de que a provedora teria assumido responsabilidade solidária, por
ofensas morais que o titular da página viesse a dirigir contra terceiros, em quaisquer
circunstâncias.

Ademais, não há, no específico contexto do caso, nenhuma previsão legal expressa de
solidariedade, como se pode verificar dos art. 1.518 e seguintes, do Código Civil. Nem na
legislação consumerista, na medida em que o autor não está na posição de um
consumidor, em demanda contra o fornecedor. E, como impõe o art. 896, do mesmo
Código Civil, a solidariedade não se presume, só podendo decorrer da lei ou do contrato.

A já referida responsabilidade objetiva, de outro vértice, não está presente na hipótese em


foco, certo que, por igual, só poderia existir quando prevista no sistema jurídico, e em
função da natureza da atividade desempenhada pela apelante.

É de se ponderar que o tema referente à responsabilidade dos provedores de acesso à


Internet é novo, não tendo ainda merecido tratamento específico da lei. É algo incipiente
a doutrina, e praticamente inexistente a jurisprudência a respeito. Elementos importantes
foram trazidos a lume pela apelante, valendo reprodução o seguinte excerto contido em
suas razões recursais, extraído da obra Aspectos Jurídicos da internet, de Gustavo Testa
Corrêa, Saraiva, p. 100:

Primeiramente, um provedor de serviço é entidade que presta serviço de conexão à


Internet, e esta última se caracteriza por ser uma rede mundial, não regulamentada, de
sistemas de computadores conectada por comunicações por meio de fio de alta
velocidade, e que compartilham um protocolo comum que lhes permite intercambiar
informações, sendo, assim, de domínio público. O ordenamento jurídico brasileiro possui
como um de seus princípio fundamentais e norteadores, a legalidade.

Tal princípio está expressamente definido na Constituição de 1988, como direito e


garantia fundamental. O art. 5º, II, afirma que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de
fazer alguma coisa senão em virtude de lei. No Brasil inexiste lei imputando
responsabilidade aos provedores de serviço por ato de seus usuários, nem mesmo no
sentido de fiscalizar as suas ações; pelo contrário, a Constituição de 1988 até proíbe tal
fiscalização, conforme o art. 5º, XII, que diz: (...) é inviolável o sigilo da correspondência
e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no
último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins
de investigação criminal ou instrução processual penal (...) (fl. 170 - destaque em negrito
não original).

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São do mesmo autor, outrossim, as seguintes ponderações:

Ou seja, além de inexistir lei acerca da responsabilidade dos provedores, existe norma
constitucional que lhes proíbe o exame dos dados de seus servidores. Também, é
impossível a fiscalização de todas as informações que entram e saem de um provedor,
pois, além de servir seus usuários, também serve de (pista) para a Internet. Assim, um
infindável número de informações, como e-mails, home-pages, listas de discussões, chats,
é atualizado instantaneamente por meio de procedimentos eletrônicos automáticos, sobre
os quais o provedor não tem nenhum controle. Como responsabilizar alguém por aquilo a
que não deu causa?

É bem verdade que, atualmente, pode o provedor de Internet, até como meio de constatar
a eficiência de sua publicidade indireta, rastrear as páginas visitadas pelo seu usuário,
mas tal rastreamento não pode, em hipótese alguma, ser confundido com controle ou
censura, ficando completamente impossível ao provedor limitar ou tutelar o acesso de seu
usuário às infinitas variedades de home pages, serviços e produtos disponibilizados na
rede mundial de computadores.

Há, é bem de ver, quem cogite de co-responsabilidade, quando, através de contrato de


hospedagem, o provedor de acesso converte-se em provedor de conteúdo, distinção à qual
aludiu a douta Magistrada sentenciante, porém, sem atenção à exigência de que, então,
deveria estar evidenciada a conduta culposa da ré/apelante. Na verdade, em razão dos
fatores antes assinalados, o caso em cena não é daqueles em que é possível detectar, no
agir do provedor, uma ação ou omissão caracterizadora de culpa concorrente, ainda que
remota.

Conclui-se, enfim, que o pleito indenizatório do autor, a rigor, não tem pertinência
subjetiva com a apelante NETCOM, que não praticou o ato ofensivo à honra no qual
repousa a causa de pedir, nem tem, na condição de provedora de acesso à Internet e
hospedeira, co-responsabilidade a derivar da lei ou do contrato, pela malsinada inserção
na página virtual do assinante e co-réu DÉLIO NUNES CESAR, seu autor e único
responsável.

O pleito indenizatório foi julgado procedente, em primeira instância, e fixada a


indenização, a cujo pagamento restaram condenados DÉLIO NUNES CESAR e
NETCOM PROVIDER COMUNICAÇÃO VIRTUAL LTDA., solidariamente. O apelo
do primeiro réu não deve lograr conhecimento, por falta de preparo, remanescendo
quanto a ele, a condenação. Ao recurso da segunda - NETCOM -, conhecido, dá-se
provimento, para reformar em parte a sentença, julgando-se, com relação a esta,
improcedente a ação, com inversão da sucumbência, os honorários advocatícios
arbitrados em vinte por cento (20%), calculados sobre a metade do valor atualizado da
condenação, em conta do trabalho e zelo profissionais verificados, em processo bem
instruído documentalmente, mas com procedimento abreviado pela antecipação do
julgamento.

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Do exposto:

ACORDAM os desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de


Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em dar provimento ao recurso de
Netcom Provider Comunicação Virtual Ltda., e, por unanimidade de votos, em dar
provimento ao agravo retido e não conhecer da apelação de Délio Nunes Cesar.

Presidiu o julgamento o Senhor Desembargador Antônio Gomes da Silva, relator,


vencido no tocante ao recurso da ré Netcom, ao qual negou provimento, tendo dele
participado o Senhor Desembargador Bonejos Demchuk, que acompanhou o revisor.

Curitiba, 19 de novembro de 2002.

Des. Antônio Gomes da Silva - Relator


(vencido em parte, declara voto em separado)

Des. Luiz Cezar de Oliveira - Revisor


(designado para lavrar o acórdão)

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