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Abstract: This work identified through the analysis of discourse and content
representations of women in the women's magazine. Were analyzed from 1990 to
1994 editions of the magazine NOVA/Cosmopolitan. In 1990’s, the tripod that
supports the publication of women, especially in Nova, is marriage, beauty and
success.
Keywords: Communication, Discourse, Magazine for female market
Quem são e o que buscam as mulheres do fim do século XX? Entre os diversos
caminhos que poderia percorrer para responder a essa questão escolhi aquele
que me é familiar: análise dos fenômenos sociais através da imprensa. Tirando
proveito da formação jornalística optei por analisar uma revista feminina. Surgiu
então uma nova questão: a revista feminina seria o revelador mais adequado das
inquietações, interesses e desejos dessas mulheres?
Para Sarti e Moraes (1980), as revistas de mulher são produtos históricos e
transformam seu conteúdo, sua linguagem e sua apresentação gráfica de acordo
com o desenrolar da vida social.
Aliando o faro jornalístico ao olhar antropológico, este trabalho procurou identificar
as representações da mulher na revista feminina e os discursos mais freqüentes
acerca da mulher no contexto de uma revista mensal. Para isso foram analisadas
edições de 1990 a 1994, da revista NOVA/Cosmopolitan.
Em 1973, a NOVA chegou ao mercado brasileiro como a revista da mulher
moderna. Sarti & Moraes (1980) oferecem numa breve análise do momento da
publicação do primeiro número de NOVA:
“Frente ao avanço das teses feministas e ao questionamento
dos papéis tradicionalmente atribuídos à mulher, esta
tradução adaptada da Cosmopolitan vende a proposta de
igualdade entre sexos, a partir da afirmação da sexualidade
feminina, independente do casamento” (p. 26)
1
Para Rabaça & Barbosa (1987), pauta é a “agenda ou roteiro dos principais assuntos a serem
noticiados em uma edição de jornal ou revista, programa de rádio ou TV etc. Súmula das matérias
a serem feitas em uma determinada edição; Planejamento esquematizado dos ângulos a serem
focalizados numa reportagem, como um resumo dos assuntos (no caso de suíte) e a indicação ou
sugestão de como o tema deve ser tratado”. Verbete Pauta.
2
Formadores de opinião, esferas públicas de debate, os veículos de comunicação
têm sido grandes responsáveis pela reafirmação dos papéis sociais, incluso, aqui,
a questão de gênero. Nesse sentido, a análise de uma revista feminina radiografa
que papéis estão sendo atribuídos à mulher na última década do século XX.
A NOVA foi a primeira publicação feminina que colocou a leitora em “contato” com
o mundo exterior. Um mundo masculino por excelência. Isso fica claro no editorial
do número de lançamento, onde se lê:
“[a revista] nasceu da necessidade de oferecer à mulher
brasileira uma companheira útil e atualizada para permitir-lhe
o ingresso no fechadíssimo clube das cabeças que pensam,
julgam e decidem. (...) este clube estava reservado aos
homens e só a eles. Hoje, com Nova, estamos pretendendo
fornecer-lhes as chaves deste clube”.2
2
Extraído de Sarti & Moraes, 1980.
3
literatura significava adotar uma linha conservadora em
relação à imagem da mulher, enfatizando suas virtudes
domésticas” (p. 40)
Com o passar dos anos, o espaço dedicado à literatura começa a incluir textos
sobre comportamento e afetividade. Falar de moda, coração e beleza tem
garantido a audiência das publicações femininas. Claro que com suas variáveis e
ênfases de acordo com sua época e público-alvo.
Para entender porque a imprensa feminina adotou a revista como veículo e
formato preferencial, foi necessário resgatar o surgimento das revistas na
imprensa e para isso utilizei as autoras Dulcília Schroeder Buitoni (1986) e Cynthia
Sarti & Maria Quartim de Moraes (1980), precursoras na análise da imprensa
feminina. Os trabalhos das autoras são resultados de “uma efervescência teórica
significativa para os estudos antropológicos centrados na questão do gênero”3 nas
décadas de 1970 e 1980.
A palavra inglesa magazine, derivada da francesa magasin, de mesma origem
árabe de armazém, designava as publicações de conteúdo diversificado,
correspondendo ao que se chamava revista em português. A revista era, então,
aquela publicação que trazia mercadorias variadas, que vendia de tudo um pouco.
Para Buitoni (1986), lazer e um certo luxo foram-se associando à idéia de revista
no século XX. Na opinião da autora, a imprensa feminina elegeu a revista como
seu veículo por excelência, “[a] revista é ilustração, é cor, jogo, prazer, é
linguagem mais pessoal, é variedade: a imprensa feminina usa tudo isso” (Ibid., p.
18)
Por trás das publicações, existe uma grande estrutura empresarial. As revistas
acabaram por se transformar em vitrines onde são expostas mercadorias com o
objetivo de criar e até reforçar certos hábitos de consumo. As novidades vão
sendo absorvidas, reelaboradas e propagadas. Ao longo dos anos, a revista
feminina já foi canal de expressão literária, palanque para reivindicação de
direitos, assessora de moda e beleza, amiga e confidente.
3
Lasmar (1997)
4
A primeira grande revista feminina brasileira surgiu em junho de 1914 e circulou
até 1936, a Revista Feminina.
“A Revista Feminina apresentava um toque de modernidade
não só nos produtos que anunciava, mas na diagramação
bastante inovadora para a época. A força estava
demonstrada no número de suas páginas, 90 em média.
Essa publicação pode ser considerada como precursora das
modernas revistas brasileiras dedicadas à mulher”
(BUITONI, 1986,p. 45)
5
efervescência teórica dos estudos antropológicos centrados na questão de
gênero:
“Foi nesse período, caracterizado basicamente pela busca
de modelos analíticos que resolvessem o problema da
generalidade da subordinação política da mulher nas
sociedades humanas, que as relações sociais entre os
sexos tornaram-se objeto de discussão e análise
antropológica sistemática” (LASMAR,1997,p: 75)
6
que as seções são exatamente as mesmas: Artigos e Reportagens, Moda e
Beleza, Culinária e Decoração, Sempre em Nova.
Os resultados a seguir surgem da leitura sistemática de 36 textos jornalísticos, nos
quais procurei identificar atores, temas e conceitos predominantes na construção
do discurso da revista. Este artigo apresenta os resultados das análises das capas
e seção Moda e Beleza.
A Mulher da Capa
No século passado, quando as revistas eram vendidas por assinatura, as capas
não eram tão valorizadas. A situação mudou quando elas começaram a disputar a
atenção das leitoras nas livrarias e, mais tarde, nas bancas de revistas. De acordo
com Buitoni (1986):
“Inicialmente, as capas às vezes nem possuíam ilustração.
Depois, passaram a trazer desenhos geralmente de cenas
em que a mulher participava de algum modo. A inovação
aconteceu na França, em 1937, com o lançamento de Marie-
Claire, que estampava todas as semanas um rosto de
mulher bonita, jovem e alegre. De pequenas figuras, a
mulher passou para um close em primeiro plano” (p. 58).
4
“Texto jornalístico ou opinativo, escrito de maneira impessoal e publicado sem assinatura,
referente a assuntos ou acontecimentos locais, nacionais ou internacionais de maior relevância.
Define e expressa a opinião do veículo ou empresa (...) “(...) A página editorial (...) consubstancia
7
fotos”.5 Como apresentadora do Fantástico, programa dominical da Rede Globo,
Valéria ficou cinco anos longe das câmeras dos fotógrafos.
A fotografia explora a sensualidade, confirmando um estilo que vem sendo
adaptado por NOVA de acordo com os costumes de cada época. Neste caso,
Valéria Monteiro aparece com um vestido preto, com aplicações de pedras na
altura do busto e nas alças. Fotografada de pé, a modelo suspendeu os braços na
altura da cabeça, segurando os cabelos com as mãos. A composição,
calculadamente descontraída, acaba vendendo a idéia de que a leitora também
pode ficar linda como a Valéria. Basta “um pouquinho” de produção.
Na capa de agosto de 1991, quem dá o ar da sua graça é a atriz Cristiana Oliveira,
que acabava de alcançar o sucesso com a novela Pantanal, da TV Manchete. O
editorial explica que a foto saiu um pouco atrasada:
“ Nós e a atriz Cristiana de Oliveira realizamos um antigo
desejo. Na época da gravação da novela Pantanal,
marcamos e desmarcamos várias vezes a foto da capa por
causa de sua apertada agenda de viagens e gravações.
Finalmente, aqui está toda a beleza de Cristiana e o seu jeito
de usar jeans (...)”6 (p. 7)
(...) o conjunto de opiniões de diretores e editorialistas [que] escrevem e atuam com autonomia e
independência, critério e responsabilidade, garantindo um critério de opinião que busca dignificar o
veículo”. (Juarez Bahia), conferir Rabaça & Barbosa, Verbete Editorial.
5
NOVA, jul. 1991.
6
NOVA, ago. 1991.
7
Prado, Zélia. Escandalosamente Feliz, NOVA, nov. 1992.
8
“Esse mulherão de 1,80 m conseguiu provar que além de
‘gostosa’, tem talento para dar e vender. Perua, brega,
cômica, ela assume todos esses adjetivos. Descobriu o
equilíbrio entre eles e resolveu usá-los a seu favor. (...) Seu
fôlego invejável é o segredo do sucesso que soube
conquistar com muito trabalho” 8 (p. 84)
8
Ibid.; p. 84 e 86.
9
NOVA, fev. 1993.
9
Nessa capa, Valéria está de calça jeans e um top branco, com franja de canutilhos
transparentes. Os cabelos estão soltos, penteados para o lado. A mão esquerda
está na cabeça, segurando os cabelos; a direita está enfiada no bolso da calça.
Em julho de 1994, a atriz Cláudia Ohana chega à NOVA a bordo do sucesso de
sua personagem Camila, na novela global Fera Ferida. O perfil mostra os
malabarismos que a atriz precisa fazer para conciliar a agenda sempre cheia. E
ela dá conta de tudo: filha, trabalho, namorado, ex-marido, cuidados com o corpo.
Nas duas últimas linhas, a atriz conta seu segredo: “Descobri que as pessoas só
vão gostar de mim se eu me gostar”.10
Na capa, Cláudia aparece de vestido preto, com aplicações em vermelho
formando desenhos geométricos. Mangas curtas caem nos ombros, o decote
acompanha o contorno dos seios. A saia esvoaçante deixa à mostra as coxas da
atriz. Os cabelos, longos e encaracolados, estão soltos, penteados para trás, com
um quê de natural.
Moda e Beleza
Ao analisar essa seção, meu propósito era descobrir o que merece maior
preocupação de NOVA a boa forma ou o bem estar da leitora. Sim, porque nem
tudo que é moda é confortável e agradável de ser usado e, no mais das vezes,
sequer se adapta igualmente às regiões do país. Algumas tendências reveladas
na seção Moda e Beleza, são discutidas a seguir.
Os cuidados com o corpo vêm em primeiríssimo lugar:
“Corpo perfeito - Estamos falando de músculos. Nada
parecido com as formas duras e masculinizadas das
halterofilistas, mas sim uma musculatura de pantera: macia,
flexível - e trabalhada. Chegar lá não é difícil. (...) Para
aumentar e delinear os músculos é preciso uma dieta
específica (...). Aí então basta respirar fundo, escolher o
exercício e colocar braços, pernas, costas e até a barriga
para trabalhar (...)” Fevereiro/93, p. 78
10
Extraído da NOVA, jun. 1994
10
“Beleza zen - Da colorpuntura ao banho de ofurô, técnicas
deliciosamente relaxantes para ficar mais bonita por dentro e
por fora”. Junho/94, p. 94
Eternamente Jovem
A idade é um elemento fundamental. A ordem é não envelhecer jamais. A
supervalorização da juventude pode ser lida em matérias como:
“Janelas indiscretas - Olheiras, bolsas, rugas. Dá para
evitar ? Consertar ? Claro que sim desde os 20 anos”.
Junho/94, p. 66
“Verdades e mentiras sobre o rejuvenescimento - X-
ADENE, autocolágeno, ácido retinóico injetável. Guarde
estes nomes se você quer rejuvenescer o rosto”. Junho/94,
p. 118.
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As publicações femininas podem ser consideradas termômetros sociais. Deixando
de lado preconceitos e idéias pré-concebidas é possível encontrar muito mais do
que “conselhos de comadres” e futilidades.
Um olhar atento enxerga quem são as mulheres desse tempo, o que pensam, o
que querem – desejos, anseios, medos, vergonhas – e principalmente, o que se
espera dessas mulheres. É através da revista que são definidas as regras de
comportamento, num “ordenamento de conduta” disfarçado pelo tom coloquial da
linguagem, como afirma Buitoni (1986).
A NOVA é a revista mais vendida em todo o mundo. Traduzida ao gosto do
freguês, ela é publicada em diversos países. No Brasil, já são quase 40 anos no
mercado se intitulando porta-voz da mulher moderna.
Nesse mundo multicor identifiquei transformações nos resultados encontrados em
análises realizadas nas décadas de 1970 e 1980. Segundo Buitoni (1986), o tripé
era composto por moda, casa e coração:
“O vestir, o morar, o sentir.(...) Coração é o tema mais
interior, relacionado à subjetividade e ao sentimento (....)
coração é literatura romântica, amor aos filhos, o sexo. (...)
Casa pode ser o corpo; nosso corpo é nossa morada.
Habitar bem esse corpo, conduz a habitar de verdade uma
casa (...) o mesmo mecanismo acontece com a moda –
apesar de ser aparência externa, tem muito a ver com quem
a usa” (p. 68)
Acredito que, hoje - falo do caso NOVA - esse tripé seja sustentado por três
temáticas: casamento, beleza e sucesso. Talvez não uma mudança substancial,
mas uma adaptação ao tempo. O casamento corresponde ao coração de outrora.
Em NOVA a leitora é levada a acreditar que o matrimônio é, senão o caminho, um
dos caminhos para a felicidade.
O sucesso é incentivado e cobrado em todos os setores. A mulher-NOVA deve
ser boa esposa, amante surpreendente, mãe dedicada, competente no trabalho,
enfim, uma mulher excepcional.
A revista utiliza uma reciclagem dos temas que se dispõe a abordar. É comum
encontrar, por exemplo, assuntos que foram tratados em reportagens
transformados em testes alguns números depois.
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Ao analisar as capas da revista, confirmei uma suspeita. Em NOVA, o padrão de
beleza é o televisivo, Global, eu arriscaria dizer. A mulher escolhida para
estampar a capa traduz os conceitos de beleza e sucesso. E quando falamos de
um país onde o maior meio de entretenimento é a televisão, só alcança o
estrelato quem conseguir um espaço na “telinha”. A Rede Globo, por ser líder de
audiência, tem o poder de lançar e até criar sucessos, que transformam-se em
referência para outros meios de comunicação.
Televisão e revista acabam tendo a mesma função. Segundo Nolasco (1998), os
dois veículos funcionam como “uma fábrica de sonhos”. Para o autor, a televisão,
que poderia ser um veículo formador de opinião, vem sendo utilizada para manter
antigos padrões morais.
Para uma revista escrita para mulheres, senti falta de artigos e reportagens que
discutissem as implicações do “ser mulher” no contexto atual. A mulher de NOVA
continua dependendo de outro para se firmar enquanto pessoa, coloca a beleza
acima do bem-estar e se tornou escrava do sucesso.
REFERÊNCIAS
BUITONI, Dulcília Schroeder. Imprensa Feminina. São Paulo: Ed. Ática, 1986.
_______, Mulher de Papel. São Paulo: Edições Loyola, 1981.
COLLIER, Jane & YANAGISAKO, Sylvia. Toward an Unified Analysis of Kinship
and Gender. IN: COLLIER, J. & YANAGISAKO, S. (Eds.) Kinship and Gender:
essays toward a unified analysis. Stanford University Presse, 1987.
LASMAR, Cristiane. Antropologia do Gênero nas Décadas de 70 e 80: Questões e
Debates. Teoria & Debate. Universidade Federal de Minas Gerais, nº 2, pp. 75 a
110, dezembro de 1997.
NOLASCO, Sócrates. Representações Masculinas e Femininas na Televisão. IN
RABAÇA, Carlos Alberto & BARBOSA, Gustavo. Dicionário da Comunicação.
São Paulo: Ática, 1987.
SARTI, Cynthia & MORAES, Maria Quartim de. Aí a porca torce o rabo. IN.
BRUSCHINI, Maria Cristina e ROSEMBERG, Fúlvia. Vivência - História,
sexualidade e imagens femininas. São Paulo: Brasiliense, 1980.
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