Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Autora: Lu Fonseca
Capa: Mariana Oliveira
Diagramação: Lu Fonseca
Revisão: Lilian Lopes
1ª edição: 2023
* Esta é uma obra de ficção e embora alguns lugares citados sejam reais, todo o resto, fatos e
personagens são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas, nomes e acontecimentos é mera
coincidência.
A Série Irmãos de Coração fala sobre segredos, traição e,
principalmente, sobre perdão.
Igor Medeiros é um anestesiologista que conheceu Helena, Rafael e
Saulo durante a residência. Para ele, as mulheres sempre foram sinônimos de
aventuras. Beatriz Mairinque é uma ortopedista recém contratada pelo
BHMed.
Beatriz fez parte do seu passado e reencontrá-la não estava em seus
planos, só que o destino a colocou em seu caminho mais uma vez.
Uma noite de amor. Erros são cometidos, mágoas são reveladas,
verdades são descobertas.
Ele a machucou no passado e agora precisa de uma nova chance.
Quantas vezes podemos errar?
Quantas vezes podemos perdoar?
É possível construir uma relação depois de tudo?
Dr. Igor Medeiros é um homem de muitas conquistas. Nascido em
família humilde e negro, já sofreu muita discriminação ao longo de sua vida.
Os percalços, no entanto, não o impediram de conquistar seu "lugar ao sol".
Afinal, ele é um dos anestesistas do corpo clínico do Hospital BHmed e tem
muitas conquistas femininas em seu "portfólio"...
O que não inclui a Dra. Beatriz Mairinque, a nova especialista da área
ortopédica recém-contratada pelo hospital. O problema é que Beatriz tem em
seu passado, uma história de "amor às avessas" com o tal anestesista gostoso
e ao se reencontrarem anos depois, está armada a confusão!!!
Com estes dois "enemies to lovers" - Igor e Beatriz - a autora Lu
Fonseca constrói, aos poucos, uma história onde há paixão, traição, mágoas e
perdão.
Do jeitinho tão dela, a escritora conquista a nós, leitoras e leitores,
com esta série incrível de médicos do renomado hospital da capital mineira.
Abordando assuntos polêmicos, explorando sentimentos distintos e às vezes
contraditórios, a autora constrói personagens únicos e cativantes, em histórias
de vida que se entrelaçam e se encaixam perfeitamente a cada livro desta
talentosa escritora.
AVISOS IMPORTANTES:
➡ Pela linha do tempo, a história de Igor inicia após o
Bônus Noite dos Irmãos no fim do livro “Uma esposa para Davi”.
➡ Este livro trata de temas como preconceito, assédio e racismo.
Caso se sinta desconfortável com algum destes temas, interrompa a
leitura.
OBS: Indicado para maiores de 18 anos, por ter conteúdo erótico e
assuntos sensíveis.
Boa Leitura!
Para você que já precisou de uma nova chance.
Torço para que tenha conseguido!
Só houve duas coisas nessa vida que desejei. Quando digo desejar é
almejar, ter como objetivo, realizar um sonho.
A primeira delas foi me formar em medicina. Eu era daquelas garotas
que ao brincar de boneca, eu não era a “mamãe”, eu era a médica. Costumava
dar injeção e até mesmo operar minhas bonecas. Não preciso dizer que
destruí algumas no processo. Depois caía no choro porque minha
reconstrução não era bem-sucedida. Talvez não seja boa ideia seguir como
cirurgiã plástica. Minha mãe me consolava, meu irmão caía na gargalhada e
meu pai apenas comprava outra, coitado. Se eu enterrasse todas as bonecas
que assassinei em cirurgias malsucedidas, teria um grande cemitério em
nosso quintal.
Por sorte meu pai acreditou em meu talento, segundo ele, me faltava
conhecimento e não vontade. Ele me mostrou que, se quisesse ser médica,
deveria estudar muito e me dediquei. Bastante. Não sou uma garota com QI
alto, daquelas que aprendem com facilidade, mas compenso com muito
esforço. Após me formar no colégio, fiz dois anos de cursinho em horário
integral, até ser admitida na UFMG. Minha família tem recursos, mas pagar
uma Universidade particular estava fora de cogitação.
No início do curso, conheci Igor. Meu segundo desejo. E minha única,
enorme e amarga decepção.
De início já me senti atraída, o cara é o pecado em forma humana.
Um espetáculo de homem. Um negro lindo, com um corpo bem definido, um
sorriso safado e um olhar destruidor de boas condutas.
Nunca fui uma garota tímida, sempre fui extrovertida, brincalhona e
assanhada. Eu gosto de namorar, perdi minha virgindade cedo, com dezessete
anos e nunca me arrependi. Bem, entrei na fila das candidatas a uma noite
com meu crush universitário, meu diamante negro.
Me aproximei aos poucos, fizemos amizade, saímos em turma e
chegamos a fazer alguns trabalhos juntos. Eu sempre me insinuei para ele,
acho que a sala inteira sabia que eu estava a fim de pular na sua cama e tenho
certeza que ele também. Às vezes nossos olhares se cruzavam e se prendiam
um no outro por mais tempo que o necessário. E nesses momentos meu
coração acelerava, tanto quanto minha intimidade se contraía em desejo. Só
Igor fazia isso comigo. Só meu diamante negro.
Eu sabia que a concorrência era brava. Eu não era a única a querer
comer esse chocolate apetitoso. Eu me garantia, sou uma mulher atraente,
mas ele parecia se encantar por Valesca. E o nome da figura não poderia ser
mais propício, da mesma forma que a cantora, a dita cuja tinha uma
retaguarda e tanto. A apelidaram de popozuda e ela se achava.
Bem, eu não entro em uma disputa para perder e tracei minha
estratégia. Se ele queria se deitar com a popozuda, que o fizesse. Eu sabia que
não ia durar, depois ele seria meu, assim que ela o trocasse por outro. Eu
podia esperar.
E foi assim que aconteceu, ao menos a primeira parte. No dia seguinte
que eles ficaram juntos, eu soube. Valesca espalhou pelo campus inteiro sua
noite de amor com meu diamante negro. Ressaltou em alto e bom tom para
quem quisesse ouvir, o quanto ele era gostoso e bem-dotado. Deus, precisava
ter dado tanto para um homem só? Eu sabia que eles ficariam juntos, mas
doeu ouvir tudo aquilo. Doeu mais do que imaginei. Ainda assim, me
mantive por perto, como uma boa colega.
O inesperado foi que o rolo entre eles durou mais do que supus. Eles
não assumiram um namoro, mas em quase todas as festas eles ficavam juntos,
durante o primeiro ano inteiro. E eu me alimentei de ilusões, achando que um
dia ele se cansaria dela e olharia para mim.
No segundo ano, o bendito dia chegou, eu só não sabia que quando
ele finalmente me enxergasse, destruiria todo meu sonho em alguns minutos,
em poucas palavras. Na verdade, aquele era o maldito dia.
Havia rumores que Valesca estava com um cara do quarto ano e não
vi Igor e ela juntos nas últimas baladas que estivemos. Então, fomos
convidados para uma festa de aniversário de um colega. Um evento em uma
danceteria. Fiz minha produção com um vestido curtíssimo e uma
maquiagem caprichada. Quando cheguei eu o vi dançando na pista com
alguns colegas. Peguei uma tequila no bar e tomei de uma vez, para criar
coragem. Depois de mais de um ano de espera, chegou a minha vez.
Entrei na pista e me aproximei dançando. Ouvi alguns assobios
quando entrei na rodinha do grupo e rebolei sensualmente o encarando. Vi
seus olhos acompanharem o movimento do meu corpo e seu sorriso sutil de
aprovação.
Quando seus olhos subiram para meu rosto, tive um vislumbre do que
seria pertencer a ele. Seu olhar me deixou encharcada de tesão. Eu só sabia
que o queria e chegava a doer. Nos aproximamos instintivamente enquanto
dançamos, até que nossos corpos começaram a roçar. Me virei de costas para
ele e ergui os braços deixando que ele tivesse uma visão do meu quadril.
Tudo bem, eu sabia que não tinha um terço do material da popozuda, mas eu
não era desprovida de tudo. Senti suas mãos pegarem minha cintura e me
puxarem contra si.
— Tá gostosa hoje, Bia!
Jesus, eu não sei se foi ouvir sua voz sussurrada junto ao meu ouvido,
ou foi sentir seu corpo pela primeira vez grudadinho ao meu, só sei que
minhas pernas bambearam e me faltou voz para responder. Parei de dançar
porque minhas pernas não respondiam e ele aproveitou para me puxar para
fora da pista.
Sem dizer nada, ele me levou até um cantinho escuro e me beijou. Se
não estivéssemos em um lugar público, não sei o que seria de mim. Foi uma
sensação indescritível. Eu o desejei como nenhum outro, esperei por ele,
aguentei a dor de vê-lo com outra, mas agora finalmente eu o tinha em
minhas mãos.
Seus lábios firmes me devoravam, sua língua quente invadiu minha
boca e levou qualquer resquício de sanidade que eu ainda possuía. Gemi em
sua boca e me entreguei em suas mãos.
As mãos dele passearam devagar pelo meu corpo, deixando um rastro
de fogo onde tocava. Eu tentava retribuir, mas minha coordenação motora
estava momentaneamente prejudicada. Em um instante empolgado, ele me
apertou contra si e senti o volume generoso entre nós. Pai do céu, eu
literalmente escorri por ele. Nunca senti tanto tesão na vida, acho que gozaria
nesse beijo se ele permanecesse nesse ritmo. Por sorte, ele teve mais controle
que eu e se afastou. Deu um sorriso lindo ao me encarar. Tenho certeza que
viu em meu rosto todo o desejo que sentia por ele, toda a paixão guardada em
meu peito.
Ele deu um beijo em meu nariz e me puxou para o bar. Tomamos
duas cervejas de mãos dadas e enquanto as horas passavam, minha
expectativa aumentou exponencialmente. Trocamos muitos beijos, inclusive
na frente da turma, até que em um abraço veio o convite que tanto esperei:
— Vamos sair daqui? Passa a noite comigo?
— É o que mais quero – respondo, acariciando seu rosto.
Recebo mais um beijo e ele diz:
— Só vou ao banheiro, me espere perto do bar.
Aceno e caminho em direção ao bar. Confiro as horas no celular,
envio um recado para minha mãe que não vou dormir em casa e aguardo.
Cinco minutos e nada. Estranho, banheiro de homem não costuma ter
fila. Dez minutos e nada. Começo a ficar inquieta e o busco no ambiente.
Calma Bia, o homem pode ter tido uma dor de barriga. Rio com o
pensamento. Ele não bebeu muito, tomamos três cervejas, não é o caso de
estar passando mal. Vinte minutos. Decido ir em busca dele. Vou até o
corredor do banheiro e não o encontro. Retorno ao bar e me sento em uma
banqueta alta, ela me dá uma visão privilegiada do local. Então eu vejo.
Igor e a popozuda aos beijos. As mãos dele na bunda dela, como
estiveram na minha há alguns minutos. Eles se afastam o suficiente para ele
falar alguma coisa em seu ouvido, ela concorda e os dois caminham de mãos
dadas em direção à saída. Ele sequer olhou para trás. Não sei quantos minutos
fiquei imóvel naquele lugar encarando a porta. Foi difícil acreditar no que
meus olhos viram. Cheguei a pensar que os minutos que passei em seus
braços foram um devaneio da minha mente. Não foi, ainda sinto minha
calcinha úmida e a sensação das suas mãos em mim. Pago a conta e pego um
táxi para casa.
Foi assim que aprendi o que é se sentir usada e descartada, descobri
que sonhos podem ser destruídos e que não podemos entregar nosso coração
a ninguém. Nesse dia, meu diamante negro se tornou um chocolate amargo.
Abro a porta do meu apartamento e o analiso com calma. Leo fez um
bom trabalho. Depois de seis anos fora, estou de volta. Foi necessária uma
pequena reforma depois que os locatários saíram. Meu irmão coordenou tudo
e agora de tarde meus móveis chegam. Nem acredito que estou em BH
novamente.
Depois que me formei, fiz a prova para a residência no BHMed[1]. Eu
passei, mas minha colocação não foi boa e peguei a vaga que restou na
unidade de Contagem. Decidi que moraria lá, não suportaria enfrentar horas
de congestionamento todos os dias para ir e voltar do trabalho. Aluguei meu
apê aqui em BH, consegui outro lá e foi uma boa decisão. Ótima na verdade.
Meu preceptor era um pequeno gênio da ortopedia e traumatologia. Ele me
abriu caminhos que não imaginava trilhar.
Aprendi a fazer reconstruções que não fazia ideia serem possíveis e
descobri que sou excelente com isso. Depois da residência, decidi fazer uma
especialização na área, com indicação do meu preceptor. Pedi licença no
hospital e fui para São Paulo. Conheci os melhores, estudei muito e hoje
tenho um conhecimento que poucos em BH possuem.
Terminei a especialização e iria retornar para Contagem, mas fui
contatada pelo RH e me ofereceram uma vaga como efetiva na Unidade de
Santa Efigênia, a mais disputada. Lá é a maior unidade da rede. É perto do
meu apartamento e da minha família. Não havia motivos para recusar. E foi
assim que voltei para casa.
Meu celular toca e vejo o nome de Nina, minha grande amiga, que
saudades.
— Oi Nina!
— Bia, já chegou? Está mesmo de volta?
— Acabei de entrar no apartamento. Ainda não acredito que estou de
volta, foram muitos anos fora.
— Precisa de ajuda? Hoje é sábado, saio do hospital mais cedo,
posso passar aí.
— Os móveis não chegaram ainda. Pode deixar que me viro aqui,
descansa hoje e amanhã a gente se encontra.
— Ah, quero saber tudo sobre esse tempo em São Paulo, imagino que
tenha muitas histórias para contar.
— Tenho, boas e ruins, de todos os tipos que quiser ouvir.
— Quer almoçar conosco amanhã? Nem vai conhecer a Sofia!
— Quero sim, quero muito ver essa garotinha linda!
— Combinado então, amanhã lá em casa!
— Combinadíssimo, me aguarde.
O resto do dia, passa voando. Os móveis que havia deixado em um
depósito chegam e as horas são gastas entre limpeza e organização dos meus
pertences.
Nina mora na Pampulha e pego um Uber para chegar lá. Vendi meu
carro antes de ir para São Paulo e preciso comprar outro com urgência. Bato a
campainha e sorrio ao ver minha amiga correndo para abrir. Nina não mudou
nada, continua linda! Alta, magra e linda.
— Deus, como consegue manter esse corpo enxuto? – Questiono ao
abraçá-la.
— Trabalhando mais horas que o normal. E até parece que você está
gorda, está ótima Bia!
Engordei alguns quilos ao longo dos anos, mas tento me manter em
forma, controlando a alimentação.
— Graças a muita fome e esforço. Não tenho essa genética
maravilhosa que você possui.
— Entra, Lipe e Sofia estão lá dentro.
Assim que passo pela porta encaro um Felipe sorridente, que me toma
em um abraço apertado.
— Ei gata! Que bom que está de volta.
— Ah Lipe, saudades de você também, gato!
O marido da Nina é um pedaço de mau caminho e somos amigos há
muitos anos. Felipe é amigo do meu irmão Leo e nos conhecemos antes dele
se casar, aliás, foi graças a mim que ele conheceu Nina. Nós morávamos
juntas enquanto eu estudava medicina e, em uma viagem no carnaval para
Búzios, eles se conheceram.
Observo a menina tímida me encarando do corredor.
— Gente, aquela lindeza é a Sofia?
— Vem cá filha, dá um abraço na Tia Bia – pede Felipe.
Sofia lembra muito Nina, em seu jeitinho tímido e seu sorriso bonito,
mas a aparência é uma mistura dos dois. Ela tem a pele morena de Nina, no
entanto, o cabelo e os olhos são do Lipe. Eu a puxo em um abraço apertado
quando ela se aproxima.
— Meu Deus, sua mãe está te dando fermento no café da manhã? Não
é possível que tenha crescido tanto. Eu te carreguei no colo e era
pequenininha a última vez que te vi. Foi ontem, como pode isso?
— Ela já tem seis anos, Bia. Já está no primeiro ano da escola – conta
Nina, orgulhosa.
— Meu Deus! Hora de ter outro, amiga, quer um irmãozinho Sofia?
Nina me dá um tapa e Lipe cai na gargalhada.
— Eu quero, meu pai também, mas minha mãe não quer – ela
responde com um pequeno sorriso.
— Nina, para de amarrar miséria, dá um irmãozinho para ela. E dessa
vez eu vou ser a madrinha!
— Que tal você ter um e eu ser a madrinha? – Rebate Nina, com um
olhar perspicaz.
— Já estou velha para isso e mesmo que quisesse, não consigo fazer
isso sozinha.
— Ah Bia, não acredito que faltem homens para você, nunca
faltaram.
Balanço a cabeça pensando na melhor resposta para a situação.
— Homens com quem eu encararia uma missão como essa, ainda não
encontrei. É um fato, nem todas mulheres nasceram para serem felizes no
amor. Eu sou a prova viva disso.
— Vem, fiz uma lasanha, vou colocar no forno e conversamos
melhor.
Nina me puxa para a cozinha, me sento e aguardo que coloque a
travessa no forno. Ela me oferece uma cerveja e aceito de bom grado. Nos
sentamos ali mesmo e fazemos um brinde.
— Agora você bebe? – Pergunto, curiosa. Nina não gostava de
cerveja.
— Com o tempo aprendi a tomar, mas só um copo de vez em quando.
Me conta, nenhum feio em vista?
Caio na risada com seu comentário. Nina é uma das poucas pessoas
que sabem minha preferência. Depois da minha decepção com Igor, aprendi a
olhar e apreciar os rapazes desprovidos de uma beleza padrão. Quando digo
“feios” não são aqueles que mal conseguimos olhar, se consigo beijar de
olhos abertos está de bom tamanho.
Homem bonito nunca mais, só dá trabalho e decepção. Os menos
atraentes são namorados maravilhosos. Nos tratam como uma rainha, não
traem, são companheiros e, caso saibam usar bem a língua, podem se tornar
perfeitos. Nem faço questão de pau grande, isso é ilusão de juventude. Se
souber fazer um bom oral, não me importo com o tamanho do instrumento e
já tive muito prazer com membros pequenos. O tal ditado “tamanho não é
documento” é bem verdadeiro. O que importa é saber o que fazer com a
ferramenta.
Tive dois namorados em Contagem, terminei com o segundo quando
fui para São Paulo e lá, bem, rolou outra decepção.
— Nenhum feio em vista, acabei de chegar, Bia. Não tive tempo de
caçar nada.
— Então me conta de São Paulo, aproveitou demais?
— Sampa é outro nível, aquela cidade borbulha 24 horas por dia!
Aprendi demais, foi uma experiência e tanto.
— Profissionalmente ou pessoalmente?
— As duas coisas. Profissionalmente foi mais do que imaginei que
seria. Descobri o que realmente gosto e sou boa. Depois da especialização,
fiquei um ano praticando as técnicas que aprendi e são fantásticas, vou ajudar
muita gente. Essa sua amiga aqui vai brilhar naquele hospital.
— Ah, eu não duvido disso, você merece Bia.
— Sim, eu mereço, me esforcei muito para isso. Fiz muitas cirurgias
longas, algumas de mais de dez horas, hoje tenho um conhecimento e uma
experiência diferenciada, mas não veio de graça.
— E o que teve de ruim em São Paulo? Disse que tinha histórias boas
e ruins...
— Meu dedo podre para o amor. Garanti mais uma decepção para
minha lista e uma falha na minha regra, nem todos os feios são confiáveis.
Nina abre a boca surpresa e sinto um gosto amargo na garganta. É
difícil contar meu fracasso, mas se tem alguém com quem posso desabafar é
ela. Olho ao redor e confirmo que Felipe não está por perto.
— Me envolvi com meu professor em São Paulo.
— Não acredito! — Ela começa a rir e não consigo rir com ela —
Bia, você não é fácil.
— Ah querida, quem dera fosse apenas safadeza. Eu me apaixonei
por ele.
— Ele não é velho? Como ele é?
— Um quarentão super bem conservado. Não é bonito, esses eu não
pego, mas não era de se jogar fora. Aparência não é importante para mim,
sabe disso. Ele é cativante, inteligente, simpático e isso o tornava charmoso,
atraente. O cara é um gênio em cirurgia reconstrutiva. Eu o admirava acima
de tudo.
— Como foi?
— Foi gostoso, bom demais da conta. Nos envolvemos no segundo
ano de especialização e, quando a concluí, ele me convidou para morar com
ele.
— Sério?
— Sim, já dormíamos juntos quase todas as noites. Enfim, eu aceitei,
me mudei para o apartamento dele, começamos a trabalhar juntos também,
ficávamos praticamente 24 horas por dia grudados.
— E o que aconteceu?
— Duas coisas. Um dia minha menstruação atrasou e o homem
surtou. Descobri que ele não queria ter filhos. Até aí tudo bem, já passei da
idade de ter filhos e sei que não vou ter nenhum, mas, eu não esperava aquela
reação. Acho que tudo mudou ali. Foi como se ele perdesse a confiança em
mim e aos poucos ele se afastou.
— Mas você não estava grávida?
— Não, não estava, mas o comportamento dele mudou comigo.
Comecei a me sentir mal dentro do apartamento dele até que um dia... –
pauso para respirar e criar coragem de terminar.
— Um dia?
— Eu o peguei aos beijos com outra aluna no hospital.
— Que canalha!
— Subi direto ao RH, pedi as contas, voltei ao apartamento, peguei
minhas coisas e fui embora.
— Não conversou com ele?
— Deixei a chave na mesa e fui para um hotel naquele momento. No
dia seguinte ele me ligou, eu disse o que vi e ele disse que “aconteceu”, mas
não era nada sério, que eu era impulsiva e imatura, enfim, falamos um monte
de merda um para o outro, agradeci a oportunidade ironicamente e fim.
— E como você está?
— Estou firme. Não vou dizer que não sofri, seria mentira, mas vou
sobreviver, não é minha primeira decepção. Aprendi mais uma lição: poder é
como beleza. Não se apaixone por homens com poder na mão, eles se acham
a última bala do pacote, ainda que sejam feios — Nina não consegue segurar
a risada e dessa vez a acompanho. É melhor rir do que chorar — Você deu
sorte amiga, muita sorte. Um gato como seu marido comendo na sua mão, é
raro!
— Eu sei, mas nem todos os bonitos são safados.
— Eu só conheço o Felipe que regenerou depois de você, porque
antes era MUITO safado.
— Eu conheço outro. Lembra do Rafael? Lindo, as enfermeiras caíam
de amores por ele e sua fama era de pegador. Casou, é fiel e maluco pela
esposa.
— O Rafael Rabelo? Deus, eu me lembro dele, era galinhaço na
Universidade. Sério que casou?
Ela me conta a história do Rafael e fico chocada, é uma história e
tanto. Ele era gente boa, chegamos a trocar alguns olhares e podia ter ficado
com ele se quisesse, mas já tinha me decepcionado com Igor e corria dos
bonitões. Pensando em Igor, decido perguntar por ele. Pensar em encontrá-lo
me revira o estômago. Mesmo depois de tantos anos? Sim, mesmo depois
desse tempo, que maldição.
— E o Igor Medeiros? Ainda por lá?
— Dr. Igor? Sim.
Nina não sabe da minha história e decepção com ele, aliás, sempre
evitei tocar no nome do meu antigo diamante negro. Quando conheci Nina,
tudo aquilo já tinha acontecido.
— Ele foi da minha turma na UFMG. Ele se casou? – Indago, sem
conter minha curiosidade.
— Verdade? Nunca me disse isso... não, Igor é do time dos galinhas,
ele não casa, nem namora, quer dizer, não que eu saiba.
— Aposto que pega todas as enfermeiras nas noites de plantão –
comento com amargura.
— Não, depois da Valentina ele não ficou com mais ninguém no
hospital, mas boatos rolam e ele....
— Quem é Valentina?
— Você não soube da Valentina? Meu Deus, foi um escândalo!
Felipe entra com Sofia na cozinha e interrompe nossa conversa.
— Tomando cerveja sem me convidar? Que falta de educação é essa,
meninas?
Felipe busca um copo e Sofia se senta no colo da mãe. Por hora nossa
conversa está encerrada.
O almoço é delicioso, a tarde é muito agradável e me sinto bem em
voltar. Amanhã inicio no hospital, vida nova mais uma vez.
O fim de semana chega e vou para a casa dos meus pais. Preciso de
colo, me sinto egoísta ao pensar, com alívio, que tenho meus pais quando a
pequena Ana perdeu os dois. Meu pai me abraça, orgulhoso, mas percebe
minha tristeza e desabafo com eles.
— Filha, não se sinta culpada por nos ter aqui, o que aconteceu foi
uma fatalidade. É terrível, mas de forma alguma deve se sentir culpada. Pelo
contrário, você deu a ela a oportunidade de andar com sua própria perna.
Imagina se, além de tudo, se tornasse uma pessoa com deficiência, seria mais
um trauma.
— Eu sei, mas é difícil entender a vida em alguns momentos, aceitar
que coisas assim acontecem aleatoriamente.
— Não sabemos se é aleatório. São os mistérios da vida.
É verdade, nos apegamos à religião em situações como essa, só Deus
para nos consolar em momentos de tanta dor. Aproveito cada segundo com os
dois, cada abraço e beijo que recebo guardo no coração. Volto para casa no
domingo com meu coração mais calmo.
Assim que entro no hospital na segunda-feira encontro Nina e ela vem
me abraçar.
— Bia, não se fala de outra coisa pelos corredores. Está famosa no
BHMed.
— Gente, foi apenas um procedimento, não é razão para tanto.
— Ah é sim. Uma cirurgia longa de reimplante total de membro não é
pouca coisa.
— Foi um trabalho em equipe, Dr. João ajudou muito e Dr.
Wellington finalizou, porque já estava morta, não sei como ainda estava em
pé.
— Pena que o Dr. Saulo não estava mais aqui. Ele faria um trabalho
fantástico na sutura. Sabia que o chamavam de “mãos de ouro”?
— Não sabia, interessante.
— Ele é um excelente cirurgião, sempre se destacou aqui. Hoje
trabalha em uma clínica chique lá no Belvedere e no PS[5].
— Eu já tinha ouvido falar dele, mas não sabia do apelido. Eu o
conheci no Bar do Leo, lá no seu aniversário, ele parece um cara simples.
— Ele é, Dr. Saulo é uma das melhores pessoas que já conheci, em
termos de caráter.
— E o Igor? O que acha dele? – Questiono sem resistir.
— Dr. Igor? Também é muito competente. O Dr. Wagner adora
quando ele está na emergência e olha que agradar o Dr. Wagner não é fácil.
Igor é bom em traumas, vai gostar de trabalhar com ele.
— Sim, eu já trabalhei com ele, sei que é um excelente médico, mas
estava perguntando sobre personalidade, o que acha dele?
— Ah sim, ele é legal comigo. A Mara é mais amiga dele que eu, mas
eu gosto dele.
— Eles têm um caso? Ele é pegador, tipo, o sucesso entre as
enfermeiras?
Nina começa a rir e tampa a boca para não chamar atenção.
— Não — ela responde quando consegue parar — depois da Vacatina
ele não pegou mais ninguém aqui. Acho que já te falei isso.
— Depois de quem?
— Da Valentina. É uma longa história, vou resumir. Ela era
Coordenadora dos residentes e os assediava. Rafael e Igor foram algumas das
vítimas, até que os dois elaboraram um plano e ela foi denunciada. Foi um
babado dos grandes, ela foi mandada embora e perdeu a licença.
Ok, estou chocada. Quando penso que nada no mundo pode me
chocar, algo inesperado me surpreende. É comum termos mulheres
assediadas no trabalho, mas homens, é algo inusitado.
— Eu até participei do plano, não te contei na época porque estava em
São Paulo. Igor me avisou que estava indo para a sala dela, eu avisei Rafael e
Dr. Emerson que tinha algo errado acontecendo na sala dela. Os dois foram
para lá e a pegaram fazendo um boquete nele. Dr. Emerson é um médico
antigo e respeitado, ele foi direto no Dr. Guilherme.
— Meu Deus, e não deu problema para o Igor?
— Ele levou uma suspensão, não foi pior porque ele era a vítima. Foi
comprovado o assédio, Rafael tinha provas das conversas entre eles e outros
residentes denunciaram também. Por isso o apelido, ela era uma vaca.
— Nina, estou cho-ca-da!
— Chocados ficaram Rafael e Dr. Emerson quando pegaram os dois
— Nina recomeça a rir — dizem que o tamanho do Dr. Igor é absurdo.
Nina afasta as mãos e demoro a entender do que ela está falando,
então meu espanto se torna maior. O tamanho que ela me apresenta é
extremamente exagerado.
— Isso é fake, ninguém tem um pau desse tamanho.
— Eu não vi, mas o boato que rola é esse.
Boato esse que escuto desde a Universidade, deve ser verdade.
Merda, além de bonito é bem-dotado. Ninguém merece, ou melhor, alguém
deve merecer, alguém que não seja eu.
— Feliz da Vacatina — afirmo dando de ombros — ou infeliz, sei lá,
nunca experimentei algo assim.
— Nem eu. Lipe tem um tamanho perfeito, não preciso de nada maior
que ele. Imagino que deve ser desconfortável algo tão grande, mas por que
me perguntou sobre ele?
— Só curiosidade, ele me acompanhou na cirurgia da menina e depois
me levou para casa. Foi gentil.
— Ele é, muito educado e gentil, simpático... ficou interessada?
— Eu? De jeito nenhum, bonito e com pau grande? Sem chance
comigo, é problema e desilusão na certa.
— Para com isso Bia. Me dá nos nervos quando começa com essa
coisa de homem feio.
— Beleza não põe mesa, já ouviu esse ditado? É verdade e eu gosto
de uma mesa farta.
— Seu professor lá de São Paulo não era bonito e se deu mal do
mesmo jeito. O problema não é beleza, é caráter.
Não tenho argumentos contra isso. A campainha toca e Nina é
obrigada a se afastar. A história da Vacatina fica na minha mente o dia
inteiro. Que mulher atrevida! Preciso saber melhor sobre isso.
Estou olhando meu armário e escolhendo uma roupa para jantar com
Igor. Passei a semana refletindo se deveria ou não ter aceitado esse convite.
Me recordo mais uma vez que é apenas um jantar de agradecimento e tento
ignorar o tremor que sinto na barriga. — É fome sua besta, nada além disso.
Visto uma lingerie bonita apenas para me garantir. — Vai que
acontece um acidente e alguém precisa tirar minha roupa — ofereço a
desculpa mais ridícula para mim mesma.
O tempo está agradável e decido usar um vestido. Escolho um
modelito preto, preto sempre favorece. Grande parte dos meus vestidos são
pretos. Esse tem decote “V”, mangas curtas e vai até o meio das coxas. Tem
um estampado delicado em linhas prateadas, formando um desenho abstrato
na borda da saia.
Opto por uma sandália de salto médio, não sou boa com os altos e não
pretendo cair na frente dele. Jogo meu perfume favorito e me analiso no
espelho. Não estou mal, ainda dou um caldo. Viro de costas e analiso minha
bunda. Eu engordei um pouco nestes anos, mas minha bunda não chega na
metade da que a popozuda tinha.
Bia, juízo, ele não vai olhar sua bunda, aliás, ele nem vai reparar em
você garota, é só um jantar de agradecimento. – Relembro pela milésima
vez. Caprichei no cabelo e fiz uma maquiagem suave. Passo um batom rosa
delicado e finalizo minha produção.
Estou ajeitando uma clutch, quando o interfone toca. Atendo e aviso
que estou descendo. Tento acalmar meu coração no elevador e desisto
quando o vejo no portão me aguardando. Porra de homem gostoso! Igor
veste uma calça social preta e uma camisa de botão cinza. Estamos o par
perfeito.
Assim que me aproximo, sinto seu perfume amadeirado e seus olhos
medem meu corpo inteiro.
— Boa noite! – Eu o cumprimento com um sorriso tímido.
Ele estende a mão e assim que a pego ele desce o rosto e beija minha
bochecha.
— Boa noite, está linda!
— Obrigada, onde vamos?
— Pensei em um restaurante de comida árabe na Savassi, você gosta?
— Gosto, sou boa de garfo, como quase tudo.
Seguimos de mãos dadas até a esquina onde ele parou sua
caminhonete. Assim que ele abre a porta, desanimo com a altura e o meu
vestido.
— Para que um carro tão grande?
Ele ri baixinho e me ergue com facilidade, me colocando no banco do
carona.
— Poderia dizer que era meu sonho ter uma caminhonete, mas
descobri que a melhor parte é ajudar as mulheres a entrarem nela.
Bato minha clutch de leve em seu braço.
— Safado. Devia ter imaginado que seria algo assim.
Ele dá a volta e se senta ao meu lado. Antes de ligar o carro, ele liga o
som e a voz de Vander Lee invade o ambiente.
— Gosta? Posso trocar se quiser.
— Gosto muito, ele é sensacional, não me conformo que tenha
morrido tão jovem.
— É verdade, é um dos meus cantores favoritos. Foi uma grande
perda.
Seguimos conversando sobre música até o restaurante. O ambiente é
agradável, a comida deliciosa e fico surpresa quando uma música árabe
começa a tocar e algumas garotas surgem fazendo a dança do ventre entre as
mesas.
Uma delas para diante da nossa mesa e requebra com os olhos fixos
em Igor. Eu não consigo sequer ficar com raiva dela, meu chocolate favorito
é o homem mais bonito presente no restaurante. Mais do que a atitude da
garota, fico atenta à atitude dele. Ele observa a dança por alguns segundos e
me surpreende quando aproxima sua cadeira da minha e passa o braço ao
redor dos meus ombros. Como se fôssemos um casal.
Sinto meu rosto esquentar, a garota gira algumas vezes e sai na
direção de outra mesa.
— Ela é bonita — comento para puxar assunto — e dança muito bem.
— Verdade, mas você é mais interessante que ela.
— Não precisa me elogiar, não dá para me comparar com uma garota
como ela.
— Realmente não dá. Eu não gosto de meninas, hoje aprecio
mulheres e você se tornou uma mulher maravilhosa.
Não sei o que responder, ele está muito perto e sinto tudo esquentar,
das minhas bochechas até minha intimidade. Cruzo as pernas e acho que ele
percebe, porque escuto um riso baixinho. Ele acaricia meu ombro com o
polegar e aproxima o rosto do meu.
— Posso pedir a conta? Vamos sair daqui?
Deus, onde foi parar minha voz? Abro a boca, mas nada sai, me tornei
uma boneca de pano com seu carinho no meu ombro. Aceno em
concordância e tento colocar meus pensamentos em ordem enquanto ele paga
a conta.
Nós dividimos uma garrafa de vinho. Estou leve, mas não estou
bêbada. Continuo dona das minhas vontades. Beatriz reage! Você não é mais
uma tonta deslumbrada por ele, essa fase passou.
Sou uma mulher autoconfiante, responsável e dona de mim.
Então, por que minhas pernas fraquejam quando fico em pé? Me
apoio na mesa por um instante e Igor me oferece o braço. É melhor aceitar e
sair de braço dado com um homem gostoso que quebrar o nariz no chão.
Apenas por isso aceito seu apoio. Só por isso.
Quando chegamos na rua, ele solta meu braço e enlaça minha cintura,
passo o braço ao seu redor por instinto. Caminhamos abraçados até seu carro.
Na porta do carona, ele se vira e com a outra mão me puxa em um abraço.
Apoio as mãos em seu peito encarando seu pescoço, sem coragem de subir
meus olhos.
Ele desce o rosto e passa seu nariz entre meu cabelo, até encontrar
minha orelha. Todos os poros do meu corpo se arrepiam e, nesse instante, sei
que perdi a batalha.
— Quero te beijar — ele sussurra — quero muito, posso?
Eu não tenho voz, eu a perdi no restaurante e provavelmente ela ficou
por lá. Apenas ergo o rosto e encaro seus olhos negros brilhantes de desejo.
Abro meus lábios em um convite mudo que ele aceita de imediato.
Sua boca gruda na minha e me torno uma massa líquida em seus
braços. Ela é mais gostosa do que me lembrava, sua língua é mais afoita que
a minha e Igor me devora. E eu me deixo ser devorada por ele. Qualquer
pensamento racional me abandona e apenas sinto e sinto muito, mais que já
senti em minha vida.
Não sei quanto tempo ficamos nesse beijo, perco a noção de tudo, do
tempo, do espaço, das pessoas, do mundo ao nosso redor. Quando ele se
afasta, gemo em protesto, ele apoia o queixo na minha cabeça e me encosto
em seu peito recuperando o fôlego. Escuto seu coração batendo acelerado,
talvez tanto quanto o meu.
Depois de um minuto inteiro, ele abre a porta e me coloca no banco.
Passo o cinto de segurança com um aperto no peito, sem saber o que vai
acontecer agora. Igor se senta ao meu lado e busca minha mão.
— O que quer fazer?
Olho para ele surpresa, como assim o que eu quero fazer?
— Quer ir para casa? A decisão aqui é sua Bia, claro que eu quero
estender a noite com você, mas não quero precipitar nada, é você quem
decide.
Estou excitada, muito excitada, completamente molhada e tenho
certeza que o quero. Acho que nunca quis um homem como agora. Tento
pensar racionalmente, mas meu corpo se recusa a dar voz à minha mente.
Uma noite, eu mereço uma noite com ele, ainda que seja com anos de atraso.
Vou matar esse desejo do meu corpo e talvez então consiga superar essa coisa
que sinto por ele.
— Eu quero você – me forço a dizer e mal reconheço minha voz.
— Tem certeza? Podemos ir devagar.
Ir devagar? Eu o quero há mais de dez anos, tenho vontade de rir, mas
me controlo e apenas confirmo com a cabeça positivamente.
Ele liga o carro e entramos no trânsito. Igor liga o som e busca minha
mão. Não reparo o caminho que ele faz, apenas relaxo no banco e tento
controlar meu coração. Ele coloca minha mão sobre sua coxa e o encaro
enquanto dirige. Ele é lindo, uma perdição, minha tentação. Sei que nada vai
continuar como antes depois dessa noite. Igor um dia me rejeitou e mudou
minha visão dos homens. Hoje, ele vai me fazer sua e de alguma forma sei
que tudo vai mudar novamente.
Me perco em pensamentos e, quando percebo, estamos entrando em
um motel. Ele abre a porta do quarto e mal reparo o ambiente, minha atenção
é toda do homem ao meu lado. Igor vai até a cabeceira da cama, diminui as
luzes e coloca uma música baixinho.
— Gosta?
Não reconheço quem canta, mas é uma música antiga internacional,
romântica e sim, eu gosto, dá um clima perfeito. Jogo a bolsa na mesinha ao
meu lado e me aproximo. Se eu vou fazer isso, quero aproveitar o máximo
possível. Ele tira os sapatos, meias e desabotoa a camisa. Antes que ele a tire,
eu o puxo pela cintura e busco sua boca. Nos beijamos sem pressa. Ele me
segura pela cintura e começamos a dançar lentamente enquanto nos beijamos.
A música termina e ele se afasta retirando a camisa.
— Tira a roupa, te quero nua, Bia – ele pede, ansioso.
Descalço as sandálias e minhas mãos tremem quando puxo o vestido
pela cabeça. Me viro de costas e deixo que ele faça o resto. Sinto seus dedos
desabotoarem o sutiã e a peça escorrega até o chão. Igor se ajoelha atrás de
mim e desce minha calcinha devagar. Não tenho vergonha da minha nudez,
mas talvez de estar tão excitada.
Ele empurra minhas coxas abrindo minhas pernas e sinto seus dedos
subirem vagarosamente por elas. Cruzo os braços sobre o peito, tentando
inconscientemente acalmar meu coração. Seus dedos chegam na minha
intimidade e ele me toca com tanto cuidado que sinto vontade de chorar.
Igor desliza dois dedos suavemente pela minha fenda e testa minha
entrada com a pontinha do indicador. Então se ergue e me vira, vejo ele
provar meu gosto em seu dedo e em seguida ele me beija novamente. Desta
vez, mais contido.
— Vem cá delícia, quero você bem devagar.
Ele me puxa para a cama e nos deitamos um de frente para o outro.
Igor passa os dedos pelo meu rosto e fecho os olhos. Seus dedos descem pelo
meu pescoço, até meus seios. Igor brinca lentamente com eles, apenas
acarinhando. Abro os olhos e nos encaramos por um instante. Ele sorri e
retribuo. Ergo minha mão e começo a tocar seu peito em uma lenta
exploração como a dele. É como se estivéssemos nos conhecendo e é
gostoso. Como ele, quero que dure, também não tenho pressa.
Aos poucos, desço minha mão para o cós da sua calça e ergo os olhos.
— Tira, estou em desvantagem aqui – peço a ele.
— Ainda não, se eu sentir você tocar meu pau não vou conseguir ir
devagar.
Olho o volume se destacando em sua calça. Realmente parece ser
grande, rio baixinho lembrando de todos boatos que ouvi, finalmente vou
saber se é verdade ou não o que dizem sobre ele.
— O que foi? Está rindo de que?
Penso em inventar alguma coisa, mas não há motivo para isso, ele
deve saber a fama que tem.
— Finalmente vou descobrir se o que tem aí é grande mesmo ou é
lenda.
Ele ri junto comigo e beija minha mão.
— Faz diferença para você?
— Não, é apenas curiosidade.
— Jura? Se eu for uma grande mentira, pequenininho, não vai se
importar?
— Pequenininho eu já percebi que não é, mas não me importo de
verdade. Nunca namorei um cara bem-dotado e eles conseguiram me
satisfazer. Você beija bem, a língua para mim é tão ou mais importante que o
pênis.
Ele cai na gargalhada e esconde o rosto no travesseiro para rir. Não
sei onde está a graça, mas acabo rindo também. Ele enxuga os olhos no
travesseiro e me encara.
— Então você gosta de sexo oral?
— Alguma mulher não gosta? Só a que não experimentou ainda.
— Vou satisfazer você das duas maneiras, com minha boca e com
meu pau. Vem cá.
Igor me puxa e volta a me devorar com sua boca, depois a desliza até
minha orelha e a chupa devagar, meu corpo inteiro volta a arrepiar. É apenas
o início, aquela boca e língua fazem o reconhecimento completo do meu
corpo dedicando uma atenção especial aos meus seios e minhas coxas. Ele
me vira de bruços e lambe minha nuca enquanto agarra meu cabelo. Eu grito
seu nome, estou quase no limite e ele ainda não chegou lá.
Ele desce aquela boca divina pelas minhas costas e beija minha bunda
com carinho. Quando penso em implorar, ele ergue meu quadril e sua língua
encontra meu centro de prazer. Afundo o rosto no travesseiro e gemo. Acho
que estou escorrendo para ele e não tenho mais vergonha alguma. Rebolo em
sua boca, buscando meu prazer que não demora a chegar. Começo a
estremecer e Igor penetra um dedo com cuidado em mim, é a gota que faltava
para eu transbordar de prazer. O orgasmo me toma e meus joelhos falham,
mas ele me segura e suga meu prazer até eu parar de tremer.
Caio na cama em seguida, sem palavras. Foi mais que sensacional, foi
quente, íntimo e intenso. Igor sorri observando meu rosto.
— Linda. Linda e gostosa.
— Me dê alguns minutos – peço quando consigo.
Ele me puxa em um abraço apertado e relaxo no seu peito. Igor
acaricia meu cabelo sem pressa. Depois de alguns minutos em um silêncio
confortável, toco sua calça novamente.
— Que tal tirar isso agora? Estou achando que está me escondendo a
verdade. Não me importo que seja pequeno, eu sou pequena e vai ser perfeito
de qualquer modo.
Igor me solta e fica de pé ao lado da cama. Abre o botão da calça e
desce o zíper. Quando ele desce a calça junto com a cueca me sento em um
pulo.
— Igor! Meu. Deus.
Ele ri e se acaricia lentamente.
— Não é lenda Bia, e sim, vai ser perfeito.
Agora eu já não tenho certeza. Aquilo não vai caber em mim. Aquilo
não cabe em nenhuma mulher. Sempre tive curiosidade de transar com um
homem grande, mas não imaginava tudo isso, nem em meu maior devaneio.
Acho que não sabia que existia algo assim.
— Bia? – Ele se ajoelha na minha frente e descubro que ainda estou
embasbacada encarando seu membro.
— Igor, não vai dar... olha isso...
— Claro que vai, não desespera, relaxa, apenas relaxa.
Como? Ao mesmo tempo que o quero, tenho receio, Jesus, isso não
foi justo com os outros homens, por que tanto para apenas um?
Antes que eu continue argumentando com o Cara lá de cima, Igor me
puxa e toma minha boca mais uma vez. Ele me deita e recomeça a desvendar
meu corpo com sua boca sem pressa. Tento relaxar como ele sugeriu e
aproveitar. Ele suga minha intimidade novamente e sinto meu prazer
renascer. Igor é perfeito, ele não tem pressa, acelera e recua até eu me sentir
pronta.
Ele me provoca com seu dedo e sua língua até que começo a
estremecer novamente, então ele sobe o corpo e se coloca na minha entrada.
Instintivamente, fico tensa. Ele segura meu rosto e encara meus olhos.
— Não vou machucar você, confia em mim?
Aceno em concordância. Eu realmente confio. Ele coloca um
preservativo rapidamente e começa a me penetrar devagar, lentamente. Igor
me abre com um carinho e um cuidado que me surpreende. Aos poucos ele
avança, centímetro por centímetro, e nunca me senti tão completa.
Vejo o suor em sua testa e ele fecha os olhos. É sofrido para ele se
conter e meu coração se aquece ainda mais com seu cuidado.
— Tudo bem? – Ele questiona ainda de olhos fechados.
— Sim — acaricio seu rosto e beijo seu queixo — Entrou tudo?
— Tudo que eu consigo. Vou me mexer devagar, se sentir algum
desconforto me avise.
Abro mais as pernas e relaxo. Quero que ele tenha prazer, tanto
quanto ele me proporcionou. Igor começa a se mover. Ele se sustenta nos
braços e consigo ver nossos corpos se unindo. É lindo o contraste entre
nossas peles. Aos poucos, ele começa a acelerar e é impossível ficar imune.
Igor me toca internamente em lugares que nunca fui tocada, gemo alto e o
agarro com minhas pernas, querendo mais, querendo tudo. Ele me dá mais
prazer do que imaginei ser possível. Não sei qual de nós dois goza primeiro,
mas se antes foi intenso, agora foi devastador, é esta a palavra que melhor
descreve o que senti.
Igor terminou de me ferrar para os outros homens. Ele elevou o nível
a um patamar tão alto, que não vejo como chegar próximo ao que senti com
ele. Ele me puxa novamente para seus braços com a respiração ofegante.
— Porra Bia, o que foi isso? O que fez comigo?
— Porra Bia, o que foi isso? O que fez comigo?
Como? O que eu fiz com ele? Estou destruída aqui, mal me lembro do
meu nome. Ignoro seu comentário porque me concentro em recuperar minhas
forças. Minha intimidade ainda pulsa e meu coração bate descontrolado.
Igor retira a camisinha e a coloca com cuidado na mesinha ao lado.
Olho seu membro semi-ereto e começo a rir. Ele me olha, curioso.
— Desculpe, mas por mais que tivesse escutado os boatos não
imaginava algo assim. Já mediu? Sabe o tamanho?
— Vinte e cinco centímetros e meio bem medidos, quando estou
muito excitado.
— Igor, isso não é normal. Não entra inteiro em nenhuma mulher.
— Não é comum, realmente não é, e tem razão, nunca entro inteiro
em uma vagina, apenas em sexo anal.
Arregalo os olhos e meu espanto o faz rir.
— Não se preocupe, não vou exigir isso de você, mas se quiser tentar,
estou mais que disposto.
— Não sou tão maluca assim, ou tão corajosa.
— Poucas mulheres são, é o lado ruim de ser bem-dotado.
— Não consigo imaginar como é carregar uma mamba negra entre as
pernas.
— Uma o que?
— Mamba negra, aquela serpente venenosa, é uma das espécies mais
mortais pelo que me lembro.
Ele cai na gargalhada e se vira de lado para mim.
— Minha mamba não é venenosa, pode provar sem medo.
Encaro seu membro mais uma vez e minha boca saliva, é tentador. Eu
o toco e Igor fecha os olhos ao meu lado. Exploro com carinho aquela cobra e
a sinto endurecer em minha mão. Decido encarar, talvez seja minha única
oportunidade.
Empurro seu corpo e me coloco entre suas pernas. Começo
acariciando com as duas mãos, porque com uma só é complicado. Desço meu
rosto e passo a língua devagar sobre a ponta. Igor geme e isso me dá
coragem. Dou meu melhor ali e sei que Igor se contém para ficar parado,
aprecio seu esforço para não me machucar. Minutos depois ele me puxa e
segura seu membro para que me sente nele.
— Igor, não sei se consigo...
— Vem devagar, toma o que conseguir.
Estou prontíssima para mais uma rodada e ele desliza fácil, mas
apenas a metade já parece me encher. Ele me puxa sobre seu peito e cola sua
boca na minha. Nessa posição ele consegue entrar mais alguns centímetros e
começamos a nos mexer lentamente. É muito bom, na verdade, é fantástico.
Ele desce a boca pelo meu pescoço, morde meu ombro e me
enlouquece com sua língua. Quando sua mão me pressiona contra ele,
explodo de prazer. Rapidamente ele inverte nossas posições e arremete sem
dó por alguns minutos. Sem que eu espere, ele se retira e derrama seu prazer
sobre meus seios. Nem reparei que ele estava sem camisinha, ainda bem que
ele foi responsável.
— Pai do céu, não vou conseguir andar amanhã! – Exclamo, sentindo
minha intimidade latejando.
Igor tem a respiração ofegante, mas sorri na minha direção.
— Vai andar sim e se lembrar de mim o dia inteiro – ele pisca e dou
um pequeno soco em seu abdômen. Igor não é saradíssimo, mas tem um
corpo bem cuidado. Tem as pernas grossas e firmes e um peitoral de respeito.
— Vem, vamos tomar um banho e limpar você.
Ele me ergue e me sinto dolorida, realmente amanhã vou me lembrar
dele. Ele liga a água morna e me coloca sobre ela. Tenho o cuidado de não
molhar o cabelo. Igor é carinhoso e passa o sabonete com cuidado em meus
seios e depois entre minhas pernas. Pego o sabonete da sua mão e retribuo
como consigo. Nosso banho é rápido e não estendemos muito as carícias.
Acho que ele entende que não aguento outra rodada.
Enquanto nos enxugamos, Igor me traz de volta à realidade.
— Adoraria passar a noite aqui com você, mas preciso trabalhar
amanhã cedo.
— Eu também trabalho, minha folga é apenas no domingo.
— Então nos vemos amanhã no hospital. Vamos? Ainda dá para
dormir algumas horas.
Nos vestimos rapidamente e ele paga a conta. O caminho até minha
casa é feito de mãos dadas, ao som de Vander Lee novamente. Ele para em
frente ao meu prédio e não sei o que dizer, não sei como vai ser daqui para
frente, mas imagino que vamos seguir como amigos. Me lembro
perfeitamente que ele disse que não se envolvia com ninguém no hospital e é
claro que não espero um pedido de namoro.
— Te vejo amanhã então – ele diz e se aproxima, me dando um
selinho na boca.
— Claro. Obrigada pela noite, foi... uma experiência e tanto – digo
em tom de brincadeira para aliviar o clima, mas seu sorriso morre no mesmo
instante.
— Uma experiência? – Ele repete e agarra o volante virando o rosto
para frente.
Fico sem graça e não sei o que responder, mas tento melhorar minha
resposta, ele quer elogios?
— Sim, foi sensacional, uma noite para guardar na memória.
Ele parece magoado e se despede me convidando a sair do carro com
delicadeza:
— Foi sim, boa noite, é melhor você ir e descansar um pouco.
Aceno e desço do carro com dificuldade. Ele aguarda que eu entre no
prédio e o escuto arrancar em velocidade. O que aconteceu? Eu disse algo de
errado? Subo para o meu apartamento com um aperto no peito. Não
imaginava que nossa noite terminasse tão secamente, é assim que ele age com
as mulheres? Me sinto magoada e usada, embora ele não tenha me prometido
nada e eu não esperasse algo além de uma noite com ele.
Coloco uma camisola e me deito, mas o sono custa a vir. Meu corpo
me lembra de Igor e do que vivemos cada vez que me mexo. É uma noite
horrível e acordo péssima.
Entro no hospital ansiosa por vê-lo, mas ele está em atendimento
clínico e vou fazer a ronda dos pacientes recém-operados. As horas custam a
passar e só o encontro no meio da tarde, quando ele é requisitado para
acompanhar minha cirurgia.
Ofereço um sorriso quando ele entra, mas ele apenas me cumprimenta
secamente, caminhando direto ao paciente que ainda está acordado.
— Boa tarde Dra. Beatriz, pessoal, desculpem o atraso, não estava
escalado para cirurgias hoje, fui chamado de última hora.
Ele pega a prancheta com os dados do paciente e a analisa
rapidamente, faz as perguntas de praxe e prepara a medicação anestésica.
Percebo que ainda o observo incrédula e desvio meus olhos para o paciente.
Preciso me concentrar, apesar de ser uma cirurgia simples, tenho
responsabilidade.
A missão não é fácil. O tempo todo tenho ciência de sua presença ao
meu lado. O observo com o canto dos olhos algumas vezes e ele parece
perdido em pensamentos. O silêncio na sala chega a ser incômodo, mas não
consigo puxar assuntos aleatórios. Quando o procedimento termina, estou
exausta mentalmente. Sigo com Igor para fazer a assepsia e resolvo tomar a
iniciativa de uma conversa, somos adultos e não consigo fingir que nada
aconteceu entre nós.
— Igor, o que houve? Por que está assim comigo?
Ele hesita alguns segundos e responde sem me encarar.
— Aqui não é o lugar nem a hora para conversarmos.
— Então marque o lugar e a hora porque não estou entendendo nada.
Uma enfermeira entra e ele enxuga as mãos rapidamente.
— Nos vemos por aí, preciso voltar ao consultório.
Ele sai e me sinto uma idiota. O que eu esperava? Claro que eu seria
apenas uma foda para um cara como ele. Isso não me surpreende, eu já sabia
que não passaria de uma noite, mas não esperava que ele me tratasse dessa
forma. Tivemos um momento íntimo, no mínimo esperava sermos amigos,
algum gesto de carinho ou de respeito pelo que vivemos. Me sinto pior que
uma puta barata. Já tive sexo casual e algumas aventuras, mas nunca fui
tratada assim depois de uma noite com alguém.
Fico dividida entre a vontade de chorar e a de gritar de raiva. Como
não posso fazer nenhum dos dois, respiro fundo várias vezes para me acalmar
e conto os minutos para ir para casa.
Na hora de ir embora, encontro com Nina no elevador. Apenas ver
minha melhor amiga reacende minha vontade de chorar. Ela sorri e a abraço
apertado.
— Bia, está tudo bem? – Minha amiga me conhece bem, apesar de
termos ficado anos separadas.
— Não, não está. Me sinto um lixo.
— Ah, vamos lá para casa. Faço alguma coisa para comermos e
conversamos um bocado.
— Eu aceito, porque a ideia de ir sozinha para casa é péssima.
O caminho até a casa de Nina é longo, aproveito que estamos
sozinhas no carro e conto a ela primeiro sobre meu passado com Igor na
Universidade e por último a noite que passamos juntos.
— Bia, por que nunca me contou que o conhecia? Nunca soube de
nada disso, nem quando moramos juntas.
— Eu sei, Igor me marcou profundamente naquela época. Eu o amei
de verdade, não foi uma paixãozinha. E quando o reencontro, penso que o
superei para descobrir que na verdade, ele ainda mexe comigo. Mexe muito.
Decido dar voz ao meu corpo e veja a merda que fiz! Ele conseguiu me
magoar novamente, me sinto muito estúpida, como um homem pode fazer
Beatriz Mairinque de idiota duas vezes?
— Tem algo errado nessa história, não acredito que ele seja tão
cretino assim. Igor é gentil com todo mundo. Aliás, diria que vocês
combinam bastante um com o outro.
— Ele mal me olhou nos olhos. Chega a ser ridículo, se eu ainda não
estivesse dolorida de ontem, acharia que tinha bebido além da conta e tudo
não passou de uma alucinação.
— Falar nisso, me conta os detalhes, ele é mesmo grande como
dizem?
Mesmo com todo aperto no coração, tenho que rir. Basta me lembrar
da mamba negra para rir por alguns segundos.
— Sim, ele é — respondo quando consigo parar de rir — Ao menos
realizei minha fantasia de transar com um cara bem-dotado.
— E foi bom? — Nina faz uma careta — Não é incômodo? Não
machuca?
— Ele foi cuidadoso e carinhoso, ainda assim me sinto um pouco
dolorida porque no auge do momento ele se empolgou um bocado. Um cara
com um membro assim tem que saber o que fazer ou realmente pode
machucar uma mulher. Mas se eu for analisar a noite de ontem, foi nota dez,
não posso reclamar de nada. Acho que nunca vivi um momento íntimo tão
bom com um homem, talvez pelo que sinto por ele, não sei, foi uma noite
especial, que eu não vou me esquecer nunca. Pena que ele estragou tudo,
poucas horas depois.
— Vocês precisam conversar, ele te deve uma explicação. Liga para
ele amanhã que é domingo. Ele tem razão quando diz que o hospital não é o
lugar certo para conversarem sobre isso.
— Ele não me deve nada Nina. Não temos um relacionamento.
Estaciono em frente à casa dela e descemos, dando o assunto por
encerrado. Passo a noite com Nina e sua família e até durmo lá com preguiça
de ir para casa. A presença da pequena Sofia e o bom humor do Felipe, me
fazem esquecer de Igor e da minha noite quase perfeita.
Assim que Beatriz sai do banheiro me toco para aliviar esse tesão
absurdo. Voltei aos meus anos de adolescente, quando me satisfazia
basicamente com punhetas. Em todas elas, penso na mesma mulher. Uma
mulher que está a alguns passos de distância, mas que não posso transar. Não
ainda.
Saio do banho e me enxugo. São quase cinco da manhã, mas hoje é
sábado e não trabalho, por isso pude esperar Beatriz até alta madrugada.
Penso se devo ir para casa ou se me deito ao seu lado. Estou tão cansado que
me rendo e ergo as cobertas me aconchegando ao seu corpo gostoso. Bia está
apagada e aproveito para observar seu rosto perfeito por cima do seu ombro.
Seus lábios cheios e bonitos, seus cachos que emolduram tão bem seu rosto.
Tudo nela é perfeito.
Beijo seus cabelos suavemente e digo um boa noite baixinho, mesmo
que ela não me escute. Puxo suas costas contra mim e relaxo no travesseiro.
Acordo antes de Beatriz. Levanto com cuidado, vou ao banheiro e me
visto. Estou indo até a padaria quando meu celular toca. É Davi. Tinha uma
sessão com ele ontem, mas enviei um recado pedindo que desmarcasse
porque queria aguardar Beatriz no Pronto Socorro. Atendo enquanto
caminho.
— Bom dia Davi.
— Bom dia. Tudo bem? Fiquei preocupado quando ouvi seu recado
ontem.
— Está tudo bem, só tive um compromisso. Quando nos
encontrarmos te conto tudo.
— Estou no meu consultório particular. O paciente das onze acabou
de desmarcar, quer vir?
Olho as horas na tela, faltam vinte minutos, não sei se consigo chegar,
mas seria ótimo conversar com ele.
— Quero, mas talvez atrase alguns minutos.
— Tudo bem, eu te aguardo aqui, vou te enviar o endereço, é perto do
BHMed.
Apresso meu passo até a padaria e compro algumas coisas que vejo
pela frente sem escolher muito. Peço um café e tomo com pressa, quase
queimando minha língua. Volto ao apartamento de Beatriz e por falta de
tempo deixo tudo sobre a bancada da cozinha. Pego seu bloquinho, que
descobri ontem sobre o móvel da televisão, e anoto um bilhete rápido.
“Bom dia! Precisei sair rápido, mas deixei algumas coisas na
cozinha para seu café. Mais tarde nos falamos. Beijos, Igor”
Deixo o bilhete no travesseiro ao seu lado e saio apressado conferindo
o endereço enviado por Davi, por sorte não é longe. Chego com dez minutos
de atraso.
— Bom dia, entre — ele me cumprimenta com um aperto de mão —
você parece cansado.
— Fui dormir às cinco, realmente estou cansado.
— Trabalhando?
— Não, ontem foi a cirurgia que a Bia fez com Saulo – Davi já sabia
sobre o procedimento — Fui aguardá-la no PS, queria estar lá quando ela
saísse.
— E como foi? Deu tudo certo?
— Segundo ela sim, foi um sucesso.
Davi sorri satisfeito. Como eu, ele sabia que não tinha como dar
errado. Não conheço o terceiro médico, mas Bia e Saulo são extraordinários,
era certeza de sucesso.
— Imagino que os dois devam estar aliviados e satisfeitos. E como foi
quando ela te viu, ficou surpresa?
— Sim, muito. Davi... eu vou para o céu, cara! Juro, estou fazendo
tudo certinho, mas não sei quanto tempo vou conseguir me segurar. Dormi
duas noites ao lado dela, sem transar, sequer sabia que isso era possível.
Davi ri baixinho, me analisando com seus olhos profundos.
— Você está se aproximando dela, reconquistando sua confiança, isso
é necessário, vai valer a pena.
— Eu sei, já está valendo. Eu disse que queria cuidar dela e ela
respondeu que estou fazendo isso com maestria. Sei que estamos nos
aproximando e construindo alguma coisa, mas é tão lento, gostaria que as
coisas andassem mais rápido.
— Não coloque o carro na frente dos bois, tudo a seu tempo. Já
conversamos sobre isso. Se quer um relacionamento com ela que não seja
casual, precisam construir um envolvimento além da cama.
— Eu sei, estou fazendo isso e confesso que estou gostando. Nem
lembro a última namorada que tive, mas faz muito tempo. Estou curtindo sair
com ela para jantar, conversar... Bia é excelente companhia e a cada dia me
convenço que ela é a mulher certa.
— Se tem essa certeza, ótimo. Fica mais fácil se controlar, você tem
um objetivo em mente, conquistar essa mulher.
— Até quando? Ontem eu a toquei — confesso a ele, contando a
seguir o que aconteceu depois que a busquei no Pronto Socorro.
— Nunca te disse para não a beijar ou não a acariciar, apenas disse
para apresentar a ela o homem que existe fora da cama. Não há um tempo
certo Igor, mas eu penso que deveriam transar apenas depois de conversarem
e se acertarem. Vocês têm assuntos pendentes e misturar sexo não vai dar um
bom resultado. Agora que essa cirurgia passou, talvez consigam conversar
novamente.
— Espero que sim, está difícil me manter na punheta, não sou mais
um adolescente.
— Vou te contar algo como amigo, algo pessoal. Lembra quando
Isabella foi para a Europa, antes de ficarmos juntos. Eu esperei por ela, fiquei
seis meses sem transar com ninguém e quer saber? Valeu muito a pena.
— Seis meses! Caralho!
— Seis meses, foi difícil? Sim, principalmente porque eu não sabia
sequer quando ela voltaria, se ela me queria, se ficaríamos juntos, mas eu não
queria nenhuma mulher. Meu corpo pedia por ela, eu o respeitei e aguardei.
— Também não quero outra mulher, não fiquei com ninguém depois
dela.
— Isso é um bom sinal, ficar com outra mulher pensando nela, vai te
dar uma ressaca moral que não é nada agradável. Aguente mais um pouco,
vai valer a pena.
Esfrego as mãos no rosto, sei que Davi tem razão, sei que preciso
esperar e que Bia vale a pena.
— Certo. Eu a chamei para viajarmos juntos. Queria um tempo com
ela para conversarmos sobre tudo sem brigas. Um lugar neutro, mas sem
ninguém por perto.
— É uma boa ideia, mas dormir juntos vai aumentar seu sofrimento.
Você está se testando além do necessário.
— Vou pedir dois quartos. Olha a que ponto me faz chegar, vou viajar
com a mulher que amo e pedir dois quartos! – Exclamo com o absurdo da
situação.
— A mulher que amo? – Davi questiona atento e reflito sobre o que
disse sem pensar. Eu a amo?
— Sim, eu a amo — assumo pela primeira vez — não estaria fazendo
tudo isso se não a amasse.
— Parabéns, estou quase te dando alta.
— Nem pensar, só vou liberar você depois que ela me perdoar.
— Ela vai e quero um convite para ir ao casamento.
— Você será um dos padrinhos.
Fico momentaneamente chocado refletindo sobre minhas palavras.
Acabei de assumir que amo uma mulher e que estou cogitando casamento,
algo que sempre fugi como o diabo foge da cruz. É Igor, Beatriz
definitivamente te abateu, mais um soldado perdido como dizem por aí.
Acordo sozinha novamente, mas ao contrário de ontem não tenho
pressa de levantar. Fico na cama e recordo sobre o dia anterior, primeiro
relembro a cirurgia e agradeço a Deus por tudo ter dado tão certo. Depois me
lembro de Igor. Meu coração fica quentinho quando penso que ele passou
tantas horas me aguardando.
E depois... foi delicioso quando me tocou no banho. Me sinto pulsar
só de me lembrar. Viro na cama e encontro um bilhete sobre o travesseiro ao
meu lado. Leio devagar e sorrio com suas palavras. Ele dormiu aqui. Me
lembro vagamente dele me puxando contra seu corpo, mas não tinha certeza
se era apenas um sonho. Esforço para me levantar, porque meu estômago
protesta ao saber que tem algo gostoso aguardando na cozinha.
Faço minha higiene e vou rapidamente até lá. Hoje Igor deixou pão de
queijo, broa e alguns biscoitinhos fritos. Faço um café solúvel, sim sou
preguiçosa, e me sento para comer conferindo as mensagens no celular.
Há um recado de Saulo pedindo que eu compareça ao Pronto Socorro
às 15 horas para uma reunião com o Diretor. Imaginei que isso aconteceria. O
homem deve estar ansioso para saber detalhes sobre a cirurgia. Envio um Ok
e a seguir ligo para meus pais para contar que deu tudo certo.
Igor bate na porta e já estou pronta. Dormi muito bem, talvez pelo
cansaço acumulado, pelo sol, pelo silêncio do local ou simplesmente por estar
em paz. Visto o biquíni por baixo de um short folgado e uma regata.
— Bom dia – eu o cumprimento com um beijo na boca por iniciativa
própria e o pego de surpresa.
— Bom dia, pelo jeito a noite foi boa?
— Muito. Desmaiei e descansei como há muito não fazia. E você?
— Eu... confesso que demorei um pouco para dormir.
Percebo nas entrelinhas seu motivo pela demora para adormecer e rio
enquanto belisco seu braço de leve.
— Culpa sua, suas escolhas.
— Estou descobrindo o peso de ser um cavalheiro. Minha vida de
galinha não era tão sofrida – ele faz uma careta e chego a ficar com pena.
Entramos na sala de café da manhã e nos servimos no buffet.
— O que vamos fazer hoje? Outra cachoeira?
— Tem um lugar que quero te mostrar. Para chegar lá fazemos uma
trilha, é uma boa caminhada, mas vale a pena, o local é lindo. Lá tem uma
cachoeira também, mas não é propícia a banhos. Podemos tirar umas fotos e
depois se quiser vamos até uma outra para nadar.
— Tudo bem, eu topo qualquer programa.
Terminamos de comer, pegamos nossas coisas e Igor dirige por cerca
de vinte minutos. Ele estaciona o carro em uma clareira e a partir dali
começamos a caminhar seguindo as placas da trilha.
Não sou uma esportista e me preocupo que seja uma caminhada
longa. Igor garante que é algo em torno de quarenta minutos e sossego. Isso
eu dou conta, o caminho é largo e não é muito íngreme. Ele me ajuda em
alguns trechos para que eu não escorregue nas pedras e a sombra das árvores
nos ajuda a não sofrer tanto com o calor.
Escuto o barulho da água e sei que estamos chegando. Alguns
minutos depois avisto o local. É deslumbrante. Uma queda d´água de cerca
de vinte metros, em um paredão de pedra, deságua em um espaço rodeado de
verde. O sol bate na umidade e forma um arco-íris que deixa a paisagem
como um lindo quadro. Fico estática por alguns minutos apreciando a beleza
na minha frente.
— É lindo, não é? – Ele questiona as minhas costas, colocando as
mãos em minha cintura.
— É maravilhoso! Acho que nunca vi nada tão bonito.
— Valeu a caminhada? – Ele me puxa contra si e relaxo em seus
braços. Apenas aceno em concordância e perdemos a noção do tempo
apreciando a paisagem. Uma criança grita em algum momento e só então
percebo que não estamos sozinhos.
Há algumas famílias e casais espalhados pelo local. O barulho da
água não nos deixa ouvir as conversas, o que nos dá a sensação de
privacidade. Alguns fazem piquenique, outros se deitam ao sol. Crianças
brincam felizes.
Igor me puxa até um espaço plano próximo da água e estende as
toalhas novamente. Nos sentamos e tiramos algumas fotos diante daquela
maravilha da natureza. Faço questão de tirar várias com meu próprio celular
para ter certeza que aqueles momentos ficarão guardados comigo.
— Já veio muito aqui? — Pergunto quando guardo meu celular e
arrependo no mesmo instante — Não responda — digo apressada — eu não
quero saber.
Igor ri e tira a camiseta, secando o suor de seu rosto.
— Nunca estive aqui com nenhuma mulher, ciumenta. Já vim aqui
com minha irmã e algumas vezes sozinho. É um bom lugar para pensar. A
última vez que estive aqui foi depois que meu pai faleceu.
— Me fale da sua irmã.
— Dara é três anos mais nova que eu. Crescemos juntos, sempre nos
damos bem e apoiamos um ao outro. Ela é formada em administração, se
casou há cinco anos e ainda não tem filhos. Seu marido é um cara legal, ele
tem uma loja de suplementos. É um cara bombado, boa-pinta, ele chama a
atenção das mulheres.
— Hum, então sua irmã se deu bem!
— Não sei, ele não faz o meu tipo — Igor brinca e caímos na risada
— ela me ajuda bastante com a minha véinha, nos dividimos em cuidar dela.
— Ela se recuperou mesmo? Talvez seja preciso fisioterapia.
— Ela está ótima, graças a Deus. É estranho ver a casa esvaziando,
primeiro Dara se casou, depois meu pai faleceu. Acho que por isso não tenho
coragem de ir morar sozinho. Me imagino no lugar da minha mãe ficando
sozinha.
— Tem razão, eu saí cedo de casa, então não sei o que é isso. É bonito
seu cuidado com ela.
— Por que saiu de casa?
— Meus pais aposentaram e se mudaram para o Recanto do Chalé. É
longe, não dava para morar lá e estudar em BH. Até dava, mas seria cansativo
demais. Meu avô faleceu e meu pai distribuiu a herança para nós. Leo
montou o bar e eu ganhei meu apê.
— Uau, que bom ter pais ricos!
— Não somos exatamente ricos, mas não posso reclamar de nada.
Desde que me formei, nunca deixei de trabalhar. Não sou uma patricinha
mimada – me defendo diante de seu comentário.
— Eu sei, desculpe. Confesso que tinha essa imagem de você na
Universidade, mas sei que sempre deu duro e hoje, não há o que discutir,
você é uma excelente profissional, por sua dedicação e seu esforço.
— Você fez a mesma Universidade que eu. O que seu pai fazia?
— Ele era engenheiro. Trabalhou em uma grande construtora na
maior parte da vida. Minha mãe nunca trabalhou.
Antes que eu responda alguma coisa um grito perto de nós chama
nossa atenção. Um garotinho de cerca de quatro anos corre em nossa direção
com uma bola na mão. A bola escapa de suas mãozinhas e vai em direção à
água. Ele muda o trajeto e corre atrás da bola.
É tudo muito rápido. Em menos de dois segundos o garotinho cai
dentro da água. Igor levanta ao meu lado e meu coração salta no peito ao ver
o menino ser levado pela correnteza. O que acontece a seguir é o maior
pesadelo da minha vida.
Antes que eu consiga pensar, vejo Igor correr e saltar na água. Me
levanto em pânico e escuto gritos ao meu redor. Gritos de todos os lados. Me
aproximo da borda com medo e não acredito quando vejo Igor desaparecer da
minha vista. Vejo sua cabeça reaparecer por um segundo alguns metros à
frente. Ele mergulha, sei que busca o menino, mas só consigo pensar que ele
não vai conseguir sair dali. A correnteza é forte demais e já ouvi tantos casos
de afogamentos em cachoeiras que sinto meu sangue congelar nas veias,
apesar do sol escaldante.
As pessoas se juntam cerca de vinte metros distante de mim e escuto
um grito desesperado. Não tenho coragem de me aproximar. Fico imóvel,
mal respiro, sem saber o que fazer. Até que vejo um grupo de homens se
abaixarem e retirarem o garoto da água. Forço minhas pernas a andarem até
lá. Vejo o menino ser colocado desacordado no chão e um homem o sacudir
desesperado, enquanto uma mulher chora ao seu lado. Devem ser os pais do
menino.
Minha mente raciocina rapidamente. Eu preciso reagir ou tudo será
em vão. Corro até eles e afasto os pais, gritando que sou médica. Confiro sua
respiração e faço uma massagem cardíaca intercalada com a respiração boca
a boca, até ele reagir, então o viro de lado e deixo expelir a água dos
pulmões. Quando ele chora, eu o entrego aos pais e me afasto. O alívio é
momentâneo, dura apenas um segundo porque meu coração ainda pulsa
agoniado.
Me levanto e busco por Igor entre os rostos alarmados ao meu redor e
não o encontro. Vou até a borda e não consigo vê-lo, não sei se é porque ele
não está ali ou porque minhas lágrimas tapam minha visão.
Alguém toca meu ombro e desabo sobre os joelhos. Grito seu nome
em uma voz que não parece a minha. O som que sai da minha garganta é feio,
é algo permeado de desespero e dor.
— IGOR!!!
Nunca sonhei em ser herói, bombeiro ou salva-vidas, nada que se
assemelhasse a isso. Apenas quis ser médico. Salvar vidas dentro de um
hospital, um ambiente seguro, com os recursos necessários à minha
disposição, mas quando vi aquele menino cair na água não pensei dois
segundos antes de pular atrás dele. Eu simplesmente não podia ficar parado
olhando uma criança morrer. Foi isso que pensei no último segundo antes de
pular atrás dele.
Quando a água gelada me envolve e sinto a força da correnteza, levo
outros dois segundos para me arrepender da minha decisão. Eu não vou
conseguir e nós dois vamos morrer. Essa constatação me gera um pânico e
uma força ao mesmo tempo, porque eu não quero morrer, não ainda. Não vivi
muito do que gostaria. O rosto da Beatriz vem em minha mente e penso que
não vivi nosso amor, não me casei, não tive filhos, não vi minha mãe chorar
no meu casamento ou com um filho meu nos braços, não posso ir ainda. Tudo
isso passa pela minha cabeça em poucos segundos, uns cinco no máximo, e é
o suficiente para que eu lute. Não vou morrer sem lutar, eu preciso conseguir.
Tento ver o garoto sobre a água e não consigo, encho o pulmão de ar
e mergulho o mais fundo que consigo. Tento ir abaixo da correnteza, mas ela
é forte. Consigo abrir os olhos e escanear ao meu redor, não o vejo. Subo
novamente e deixo a correnteza me levar, ela vai me levar ao mesmo lugar
que ele, eu espero.
Sou arremessado para uma lateral com algumas pedras e me preparo
para o impacto. Uso minhas mãos para amortecer o choque e tento me
segurar a elas. Quando me estabilizo, mergulho novamente e o vejo. Deus,
obrigado! Agradeço em um segundo precioso, antes de tentar resgatá-lo. Ele
está submerso, mas acredito que ainda há tempo de salvá-lo.
Deixo a correnteza me levar por mais alguns metros, tentando me
manter perto da borda, até onde o vi pela última vez. Não vou ter muitas
chances, preciso conseguir. Mergulho novamente e abro os olhos em busca
do menino. Seu corpo é lançado repetidas vezes contra a margem e isso me
ajuda, forço meus braços e pernas para chegar até ele e quando envolvo seu
pequeno corpo sei que valeu a pena. Procuro algo para me agarrar e encontro
um galho, frágil demais, mas é o que temos.
Respiro, ofegante e cansado. Não consigo examinar o menino, ele está
desacordado e sequer sei se respira, mas não consigo ajudá-lo nesse instante.
Deus é meu parceiro, descubro isso no instante que escuto os gritos e vejo
pessoas se aproximando. Eles retiram o garoto dos meus braços, mas quando
estendo minha mão para que me puxem, uma nova onda de água me afasta e
o galho se quebra. Sou levado para longe da borda, talvez Deus não seja meu
parceiro e sim do garoto.
Não posso desistir, repito para mim mesmo várias vezes, mas estou
tão cansado. Olho em volta buscando algo em que me agarrar novamente,
mas só existe água. Não há o que fazer, é impossível nada contra a correnteza
e só me deixo levar. Dois ou três minutos depois vejo que a correnteza se
divide e do lado direito há uma nova queda se aproximando. Sou arrastado
nessa direção e sei que é meu fim. É um lugar bonito para morrer, ao menos
isso.
Não sei o tamanho da queda e imagino que se desabar com força em
cima das pedras terei uma morte rápida. Obrigado Deus, por tudo, é o que
penso no último instante antes de cair.
Cair em queda livre é assustador pra caralho. Não sei se é assim que
sente quem pula de paraquedas, mas não é algo que faria de livre e
espontânea vontade. A respiração para e o coração acelera tanto que penso
que vou morrer de infarto se sobreviver à queda.
São poucos e assustadores segundos, muito assustadores. Então eu
afundo. Com força, por muitos metros. Meu corpo gira descontrolado
embaixo da água e sou jogado como um nada para os lados. Perco a noção da
superfície e de onde devo ir quando o impacto termina. O reflexo de buscar ar
me faz respirar e a água arde em meu nariz. Faço um esforço sobre-humano
para manter meus lábios fechados, ainda que meu pulmão exploda
implorando por ar. Tento estabilizar meu corpo e abrir os olhos. Para meu
alívio a correnteza agora é bem mais suave.
Busco por alguma luz e um leve brilho me conduz. Gasto o que me
resta de energia para chegar a ela. Os segundos são longos e forço meus
braços e pernas doloridos a trabalharem. Só mais um pouco.
A luz aumenta e minha energia também. A perspectiva de sobreviver
me faz tirar forças nem sei de onde. Quando emerjo e deixo o ar entrar em
meu pulmão, tenho vontade de rir e chorar ao mesmo tempo. Eu consegui. Eu
sobrevivi. Deus é meu parceiro também, valeu Brother!
As águas aqui são calmas e boio por alguns minutos recuperando meu
fôlego e descansando meus músculos. A sensação de estar vivo é sublime,
perfeita e grandiosa.
Quando me sinto em condições de me mexer, analiso ao meu redor.
Não sei onde estou, nunca estive aqui, mas parece uma clareira como tantas
em Macacos.
Preciso sair da água. O local é calmo, mas as águas são fundas, talvez
por isso não haja ninguém aqui. Nado devagar até uma das bordas e uso meus
braços para sair. Os mesmos protestam pelo esforço e tento buscar apoio com
os pés para ajudar. É difícil, mas consigo sair da água. Desabo entre pedras e
mato, sentindo o sol me aquecer. Fecho os olhos. Só preciso descansar e
respirar por alguns minutos.
Acordo mal. Tive uma péssima noite, custei a dormir e tive um sono
inquieto, incomodada pelo comportamento de Igor, fora que a proposta de
Gilvan tomou grande parte dos meus pensamentos.
É uma excelente oportunidade profissional. Repetir a cirurgia de
reconstrução de mandíbula me deixaria em uma posição diferenciada na
comunidade médica. Isso abriria portas, é um item e tanto para o meu
currículo.
Preciso que Igor deixe o ciúme de lado e me apoie nisso, não posso
escolher entre ele e meu trabalho, é uma escolha injusta.
Chego ao BHMed com um início de dor de cabeça. Passo na
lanchonete e peço um suco de laranja, visto que não tomei café em casa.
Enquanto bebo, engulo um analgésico e envio uma mensagem para Igor:
“Precisamos conversar, me avise quando chegar no hospital.”
A resposta vem imediatamente.
“Já estou aqui. Consultório 31.”
Termino meu suco e subo até o andar dos consultórios. Na recepção,
pergunto se Igor está atendendo alguém. A atendente confirma e aguardo que
a paciente saia. Entro antes que ele chame outra pessoa e fecho a porta atrás
de mim.
Seu semblante está fechado e desisto de o beijar, apenas me sento na
sua frente e cruzo os braços. Ficamos em uma guerra silenciosa por um
minuto inteiro, até que ele diz:
— Preciso trabalhar, vamos deixar para conversar durante o almoço.
— Não. Eu mal dormi essa noite, não vamos guardar nossos
sentimentos de novo. Nós prometemos que faríamos diferente dessa vez.
Diga o que está acontecendo.
Ele apoia o queixo nos punhos e fecha os olhos por alguns segundos.
— Tem razão. O que aconteceu ontem? – Ele pergunta, por fim.
— Dr. Guilherme me chamou em sua sala e quando cheguei o Gilvan
já estava lá. Fui pega de surpresa, não fazia ideia que ele estava aqui e muito
menos o que queria comigo. Ele me chamou para almoçar alegando que tinha
uma proposta a fazer. No restaurante ele me explicou sobre um paciente em
situação semelhante ao Jonas, mas decorrente de acidente de carro. Ele quer
que eu faça a cirurgia ao seu lado, apenas isso.
— E você aceitou?
— Ainda não, eu disse que ia pensar, mas estou propensa a aceitar. É
uma excelente oportunidade profissional. Fazer uma segunda cirurgia
inovadora, ao lado dele, em um dos melhores hospitais do país me colocaria
na frente. É um salto e tanto na minha carreira. Eu não seria uma aprendiz ao
lado dele dessa vez, pelo contrário, eu estaria mostrando a eles como fazer.
Ele se recosta na cadeira e me observa com os olhos tristes.
— Igor, nós não temos mais nada um com o outro, eu juro. Não senti
nada ao lado dele, pelo contrário, não sei como pude me apaixonar por ele.
— Por que não me apresentou a ele?
Fico espantada com sua pergunta.
— Eu apresentei, não se lembra?
— Sim eu me lembro. Dr. Igor, este é o Dr. Gilvan. É isso que sou
para você Beatriz, um colega?
Então entendo seu aborrecimento, eu não o apresentei como meu
namorado. De fato, não o fiz, não foi por mal, apenas não queria um clima
estranho ou uma cena por parte de algum deles.
— Eu fui pega de surpresa e sei lá, não pensei muito. Como
estávamos no hospital, quis manter um relacionamento profissional.
— Depois então você disse a ele que eu era seu namorado? Lá no
restaurante, você contou a ele?
— Sim, eu disse a ele que estava com outra pessoa.
— Disse que era eu, Beatriz? – Ele insiste.
— Não, ele não perguntou quem era, isso não faz diferença.
— Faz toda diferença, porra! Toda diferença — Igor sobe a voz
irritado — Tem vergonha de mim, Beatriz?
Fico chocada com sua pergunta e nego prontamente com a cabeça.
— Claro que não! Está maluco, por que eu teria vergonha de você?
— Não sei, também gostaria de saber essa resposta. Algum motivo
tem para você ter escondido nosso relacionamento. Se coloque no meu lugar,
se eu te apresentasse a uma ex-namorada como uma colega qualquer, como
se sentiria?
— Desculpa, eu não fiz por mal. Ok, assumo que fiquei com medo do
que poderia acontecer. Não sabia qual seria sua reação ou qual seria a dele...
— Qual seria minha reação? O que esperava que eu fizesse? Não sou
a Alex que distribui socos em quem abraça o Saulo, não sou um homem
ciumento, nunca fiz uma cena de ciúmes na vida.
— Eu sei, mas Gilvan é um cara arrogante e juro que não sei o que ele
pensaria sobre nós, tive medo que fizesse algum comentário que ofendesse
você.
— Um comentário que me ofendesse? Um comentário racista? Estou
me fodendo para o que ele pensa, eu sei me defender. Um comentário
preconceituoso não me ofenderia mais que a sua atitude. Me senti um lixo,
Beatriz, um segredinho sujo e não gostei de me sentir assim – ele retruca com
firmeza.
— Você tem razão, tem toda razão, eu errei, me desculpa.
Igor esfrega as mãos no rosto e posso ver o quanto está sentido. Meu
coração se aperta ao ver o quanto o magoei. Merda, não fiz de propósito, mas
acionei gatilhos. Ele está se sentindo diminuído novamente.
Me levanto e sento em seu colo o envolvendo em um abraço.
— Me perdoa, assumo que fiz merda. Prometo que não vai acontecer
novamente.
Igor acena e tira minhas mãos do seu pescoço.
— Tudo bem, agora preciso trabalhar, tenho pacientes aguardando.
— Vamos lá para casa hoje? Eu faço alguma coisa para jantarmos
juntos.
— Pode ser, agora vai.
Beijo sua boca rapidamente e me levanto. Sei que ele ainda está
chateado, mas é algo que só o tempo vai resolver.
Beatriz sai da minha sala e me sinto perdido, não pretendo terminar
com ela, mas foi algo que me magoou muito. Pego o celular e envio um
recado ao Davi.
“Bom dia brother, tem um horário vago hoje?”
Chamo a próxima paciente e quando ela sai encontro a resposta de
Davi:
“Estou no consultório hoje, posso te atender na hora do almoço se
precisar.”
“Aceito.”
Ele está on-line e dessa vez a resposta vem rápida:
“Chegue 12h30 e traga uma salada com atum. É o honorário de
hoje.”
Sorrio, Davi é um grande cara.
“Feito!”
Termino meus atendimentos até 12 horas, passo no restaurante,
compro sua salada e vou a pé até seu consultório.
Davi está me aguardando com a porta aberta, ainda assim, bato
levemente para chamar sua atenção.
— Opa, entra aí.
Fecho a porta, entrego sua salada e ele agradece.
— Obrigado, estava com fome. Senta aí, vou comendo enquanto
conversamos. Quer?
— Não, obrigado, na volta como alguma coisa, não estou com fome
agora.
— Então, aconteceu alguma coisa?
— Sim — conto a ele o que aconteceu ontem e minha conversa com
Bia — Porra Davi, eu fiquei muito chateado, ainda estou. Tenho feito tudo
certo, estou me comportando como um homem que nunca fui porque quero
fazer isso dar certo. Sonho um futuro com ela e juro que não esperava por
isso.
— Você agiu corretamente, o que mostra o resultado das nossas
sessões, parabéns. Você conseguiu dizer o não. Assumiu para ela que não
gostou da sua atitude, mostrou seus sentimentos, vocês conversaram como
adultos, isso é o mais importante.
— Mas não me fez sentir melhor, continuo me sentindo mal.
— Igor, as pessoas erram, você sabe disso, somos humanos. Já ouviu
aquele ditado: Quem nunca errou que atire a primeira pedra? Você já errou
com ela mais de uma vez. Não pense que tudo vai ser flores em um
relacionamento, não é assim que acontece. Pessoas discutem, discordam,
fazem merda, não vai deixar de acontecer, mas o importante é conversar,
esclarecer. Quem errou pede desculpas, como ela fez e bora seguir em frente.
Pelo que disse, ela reconheceu que agiu errado, sentiu sinceridade em suas
desculpas?
— Sim, mas não é tão simples, basta eu desculpar e voltamos a ficar
bem? Ainda me sinto magoado.
— Você acredita que ela sinta vergonha de você?
Penso por alguns segundos antes de responder.
— Acho que não. Ela me apresentou aos pais, não faria isso se
sentisse vergonha de mim.
— Também acho. Vocês interagem no hospital, viajaram juntos,
foram ao bar do irmão dela, ela não está o escondendo. Talvez o que ela disse
seja verdade, ela tenha ficado constrangida com medo de uma cena de
ciúmes.
— Nunca dei motivos para isso, não sou um cara ciumento. Eu confio
nela, tanto que não me importei dela almoçar com o sujeito e sim, com o fato
dela não ter me apresentado como seu namorado.
— Certo, mas e o cara? E se ele fizesse uma cena de ciúmes?
— Ele? – Porra, isso é algo que não passou pela minha cabeça —
Isso só aconteceria se ele ainda gostasse dela.
— Nós não sabemos os sentimentos dele, talvez ela tenha se freado
por conta dele.
— Davi, agora me deixou com a pulga atrás da orelha, que merda!
Em vez de me ajudar, complicou mais a minha cabeça.
Ele ri e finaliza a salada jogando a embalagem no lixo.
— Converse melhor com ela sobre tudo isso, esclareça suas dúvidas,
mas o importante você já fez, mostrou a ela que não gostou, você agiu
corretamente. E não se esqueça, quando desculpamos, é para seguir em
frente, não fique remoendo isso.
— Eu vou tentar. Obrigado por me ouvir, hoje não era meu dia.
— Tudo bem. Precisamos marcar alguma coisa juntos. Que tal um
almoço domingo, lá em casa?
— Vou ver com a Bia, ela anda cheia de compromissos, palestras...
ela está ficando famosa também.
— Isso incomoda você?
— De forma alguma. Tenho muito orgulho dela, sei o quanto estudou
e batalhou, ela merece tudo que está acontecendo.
— Muito bem. Amar alguém é torcer pelo seu sucesso, tem homens
que não lidam bem com isso.
— Esse não é um problema para mim, valeu Davi.
Nos despedimos e retorno ao hospital. Como apenas um salgado na
lanchonete porque meu horário de almoço já está vencendo e retorno ao
consultório.
Termino meu expediente e ligo para ela.
— Oi Igor!
— Terminei aqui. Onde está?
— Já estou indo para casa, te aguardo lá.
— Ok, chego em uns quinze minutos.
Beatriz
No domingo Igor me deixa no hospital e trabalho incansavelmente.
Faço a ronda dos pacientes operados pela manhã e depois desço para a
emergência. Wagner está de folga e assumo seu lugar, coordenando a
bagunça. Sim, tem dias que parece que a cidade inteira baixa aqui.
Saio de lá cansada. Gostaria de ligar para Gilvan, mas já está tarde e
deixo para o dia seguinte. Igor me aguarda no estacionamento.
— Como foi seu dia? — Ele indaga depois de me beijar e me ajudar a
entrar no seu carro.
—Exaustivo, não sei como você gosta da emergência, aquilo estava
um caos, um CAOS com letras maiúsculas e garrafais, não é à toa que o
Wagner vive estressado.
— Tem dias que o bicho pega, mas tem dias que é de boa. Eu gosto
da agitação, embora tenha dias que mal consigo tomar um café. Por falar em
café, vamos jantar?
— Nossa, não dou conta, só quero minha cama.
— Tem que comer alguma coisa, o que comeu hoje?
— Eu almocei, antes de entrar na emergência, depois, só água e olhe
lá.
— Vamos comer ao menos um sanduíche. Que tal um Subway? Não é
tão pesado.
— Tudo bem, é estranho você tomando conta de mim, parece minha
mãe: Já comeu filha?
Ele ri e pega minha mão.
— Nós nos preocupamos com você por que te amamos.
— Se saiu bem, vou relevar.
Lanchamos e Igor me deixa em casa, ele não quis subir e não insisti,
meu corpo está pedindo cama, apenas para dormir.
No dia seguinte estou um pouco melhor. Preciso repensar meus
compromissos fora da cidade, esta rotina vai me matar, duas semanas de
trabalho intercaladas com um plantão duplo é brincadeira, eu não tenho mais
os vinte anos de quando era residente.
Antes de sair para o BHMed, resolvo ligar para o Gilvan e resolver
essa questão de uma vez.
— Bom dia Beatriz, está com saudades?
Reviro os olhos e rio baixinho.
— Ainda não e você? – Devolvo a pergunta de imediato.
— Sempre. O que manda então?
— Eu tenho uma resposta para te dar. Te agradeço muito, muito
mesmo, mas não posso aceitar.
— A vaga? Tem certeza? É uma oportunidade e tanto.
— Não tenho dúvidas disso. É o emprego dos sonhos, mas é em São
Paulo e a minha vida é em BH agora. Aqui está a minha família e
principalmente o homem que eu amo. Hoje, ele é mais importante que
qualquer emprego, por melhor que seja.
— Não está se precipitando? Se quiser pode pensar mais tempo.
— Eu tenho certeza da minha decisão, mas fico honrada com seu
convite. E se precisar de mim, eventualmente, estou aqui.
— Está bem, é uma pena. De qualquer forma, amores vem e vão, se
algum dia mudar de ideia, pode me ligar. Para você eu sempre consigo uma
vaga.
Amores vem e vão na vida dele, aqui meu amor vai ficar eternamente
ao meu lado, mas não retruco e apenas me despeço, preciso trabalhar.
— Obrigada Gilvan, agora preciso ir.
— Espera, eu inscrevi você para concorrer ao prêmio da Área de
Cirurgia da ANM[14].
— O que? – Pergunto, surpresa, sem acreditar no que ouvi.
— A ANM premia anualmente em várias categorias, inscrevi você
com a cirurgia de reconstrução de mandíbula.
— Você é maluco, Gilvan? Deveria ter me perguntado antes.
— Por que? Você negaria? Não tem nada a perder e olha, acho que
tem grandes chances de ganhar.
— Você não tem nada a ver com essa votação, tem?
— Claro que não, mas eu acompanho a premiação, fico de olho nos
trabalhos apresentados, tem muita gente nova, com boas ideias, como você.
Deus, não sei o que pensar sobre isso, mas acho que é algo bom.
— Certo, obrigada novamente então, agora preciso ir, estou atrasada.
— Bom trabalho e não se esqueça, se mudar de ideia, basta me ligar.
Me despeço e corro para o elevador, disposta ou não, preciso encarar
mais uma semana de trabalho.
Hoje é um grande dia. O dia do nascimento do Daniel, nosso terceiro
filho. É tudo tão diferente da outra vez que chego a sentir medo de tanta
tranquilidade, como se algo fosse acontecer para quebrar nossa paz.
Planejamos tudo para que não houvesse imprevistos. Marcamos a data
do parto, afinal, Alex vai ligar as trompas após o nascimento do nosso filho.
Essa decisão ainda me deixa dividido, pois, ao mesmo tempo que me alivia,
me parece algo muito definitivo. Só que minha mulher parece finalmente
decidida a voltar ao hospital e ainda que demore alguns anos, se
continuarmos tendo bebês é algo que nunca iria acontecer.
Agendei minhas férias e tenho um mês inteiro para me dedicar a ela e
aos nossos filhos. Deixamos os gêmeos com Renata e meu avô Rodolfo e
seguimos para o BHMed.
Lá encontramos, para nossa surpresa, o pai dela. Meu sogro não
avisou que viria e Alex se desmancha em lágrimas ao vê-lo.
— Pai, o que está fazendo aqui?
— Precisava vir conhecer meu neto. Como está filha? Por que está
chorando?
Reviro os olhos, era só o que faltava. Alex ficou emotiva, embora não
tanto como na outra gestação e tomo a frente de responder, já que ela
continua fungando no peito do pai.
— Ela está bem, ficou emocionada, apenas isso. Precisamos fazer a
internação, querida.
Puxo minha mulher até o balcão e preenchemos a papelada
necessária. Retornamos ao saguão e encontramos minha família biológica ali.
Abraço minha mãe, Lucas e até meu pai. Com o tempo melhoramos nosso
relacionamento, ele é um ótimo avô para os meus filhos e com isso vem
ganhando meu coração.
— Posso ver o parto novamente? – Questiona Lucas, ansioso e nego
de imediato.
— Nada disso, hoje somos apenas nós. Tenha seus filhos se quiser.
Eles abraçam Alex e subimos para o bloco cirúrgico. Ali encontramos
Helena e Rafael. Helena será a pediatra a meu pedido e já está paramentada.
Ela abraça Alex e indaga:
— Como estás se sentindo, mamãe?
— Estou ótima, graças a Deus, sem gritos hoje – minha mulher
responde, surpreendentemente tranquila. Alex merecia uma gestação calma
depois dos gêmeos.
— Até que enfim chegaram, estou louco para conhecer meu afilhado!
– Exclama Rafael em seguida.
— Entre conosco então – convido sem sequer olhar para Alex. Rafael
é meu irmão mais velho, é quem me apoia em tudo e se Helena vai estar lá
dentro, é justo que ele esteja também.
— Você se importa? – Ele pergunta para Alex e ela sorri,
respondendo em seguida:
— Você participou do parto dos gêmeos, esse é seu afilhado, é justo
que esteja lá também.
— E o Lucas? Não vai entrar também? – Ele pergunta para mim.
— Não, Lucas não é médico, dessa ele vai sair fora, não deveria ter
entrado nem no outro parto.
Rafael sorri de lado e sei que ganhei alguns pontos com ele. Ele e
Lucas se dão bem, mas no fundo sei que ele sente ciúmes do meu irmão
gêmeo. Uma besteira, amo os dois, mas é um fato.
Hoje Rafa tem preferência, afinal, Daniel vai ser seu afilhado. Helena
segue com Alex e vou me trocar com Rafael. No caminho, ele questiona:
— Vão mesmo fechar a fábrica? Está tranquilo quanto a isso?
— Não muito, mas deixei a decisão com Alex e ela está segura disso.
Os feitos de Beatriz atiçaram sua vontade de voltar para a sala de cirurgia.
— Acho que três filhos estão de bom tamanho, não vão se arrepender.
— Também acho e Alex é uma excelente cirurgiã, ela merece voltar.
Nos trocamos e seguimos até a sala de parto. Cumprimento a Dra.
Selma, obstetra da minha mulher, e toda a equipe presente.
— Prontos para receber o Daniel? – Ela indaga, preparada para iniciar
a cesariana.
Acenamos e me aproximo de Alex, ela já recebeu a anestesia. Beijo
seus lábios e sussurro:
— Te amo, obrigado por me dar mais um filho.
Uma lágrima desce devagar pelo seu rosto e a limpo com mais um
beijo.
— Não acredito que está aqui comigo.
— Onde mais eu estaria?
Rafael se posiciona do outro lado e segura sua outra mão. Dra. Selma
inicia o procedimento e eu e Rafael tocamos nossos crucifixos ao mesmo
tempo. Um movimento que ele aprendeu comigo e sorrio. Fecho os olhos e
oro a Deus por Alex e pelo meu filho, que tudo corra bem.
Meu Pai nunca me decepciona e em poucos minutos escutamos o
choro alto do meu caçula. Tenho um vislumbre rápido dele quando Helena o
recebe nos braços.
Enquanto ela o examina, beijo Alex com todo amor do meu coração.
— Parabéns mamãe! Somos cinco agora.
As lágrimas descem por seu rosto sem controle, até que Helena me
entrega um pacotinho azul.
— Parabéns anjinho, ele é perfeito, parabéns Alex!
Ela se abaixa e deixa um beijo na testa da minha mulher. Analiso o
rostinho perfeito do meu filho por alguns instantes. Beijo sua cabecinha e
peço a Deus que o guarde e o proteja de qualquer mal.
— Seja bem-vindo filho, essa é a mamãe.
Coloco Daniel em seu colo e Alex o beija repetidamente. Rafael tira
algumas fotos e Helena nos chama para acompanhá-la ao berçário. Alex vai
continuar aqui para concluir a cirurgia. Pego meu filho de seus braços e o
entrego ao Rafael como um dia ele me entregou Paulinha.
— Leva meu filho ao berçário, vou ficar com ela.
Ele acena, emocionado e recebo um abraço de Helena antes que ela
saia. Então seguro a mão da minha mulher novamente e questiono pela última
vez:
— Está certa da sua decisão?
— Sim, não vai ficar chateado comigo?
— Nunca, como poderia? – Acenamos para a Dra. Selma e ela
continua seu trabalho.
Encontro Rafael e Helena em frente ao berçário quando o
procedimento termina. Ficamos lado a lado olhando Daniel. Ele se mexe,
inconformado por ter sido retirado de dentro da mãe. Seu jeitinho agitado me
lembra minha mulher.
— Como está Alex? – Helena pergunta.
— Tudo certo, foi para a recuperação.
— Mais um sobrinho, nossa família está gigante – comenta Rafael.
— Uma família que começou naquela sala de aula, há tantos anos
atrás – respondo com nostalgia e Rafael nos puxa em um abraço triplo.
— Dizem que Deus escreve certo por linhas tortas, que bom que
nossos nomes se cruzaram em algum momento da Sua escrita.
Finalizo a última cirurgia do dia. Retiro a touca, máscara, luvas e lavo
minhas mãos. Um dos residentes me para, a fim de tirar algumas dúvidas e
respondo com o resto de energia que me resta. Tudo que quero é me trocar e
ir para casa com meu diamante negro. Estou sonhando com os braços dele ao
meu redor.
Temos vivido uma rotina tranquila e acho que minha vida nunca
esteve tão boa. Nem quando vivia em São Paulo com Gilvan e na época
pensei que tinha encontrado meu caminho na vida.
A vida com Gilvan tinha glamour e ostentação. Não posso dizer que
era ruim, pois estaria mentindo. Trabalhava como aprendiz em um dos
maiores hospitais do país e vivia com um dos mais famosos cirurgiões
ortopédicos do Brasil. Só que isso tudo me deixava ansiosa e me sentia
sempre aquém.
Com Igor tudo é simples, não há qualquer tipo de complicação e nos
sentimos iguais. Apesar do reconhecimento da mídia após as cirurgias de
reconstrução de mandíbula, agora as coisas acalmaram e faço questão de me
colocar no mesmo patamar que ele. Nossa rotina é gostosa, fazemos o que
temos vontade, sem pressão de nenhum dos lados.
Esporadicamente ele dorme na minha casa, quando estamos a fim, e
não cobramos nada um do outro. Às vezes saímos apenas para jantar ou ir ao
bar do Leo. Passamos um ou outro fim de semana com meus pais e
almoçamos com sua mãe e Dara aos domingos, sempre que posso. Nunca tive
um relacionamento tão suave, tão bom em todos os sentidos e isso me alivia
porque não me arrependo, por um segundo que seja, da minha decisão.
Troco minha roupa, pego minha bolsa e caminho ao saguão enquanto
ligo para meu namorado.
— Onde você está? – Pergunto assim que ele atende.
— Bem atrás de você — Sinto seus braços em minha cintura antes
que eu possa responder. Desligo a ligação e sinto seu beijo em minha
bochecha — Fui tomar um café ou ia dormir naquele sofá.
— Desculpa a demora, um dos residentes me pegou quando estava
saindo.
— Quem foi? Me fala que vou atrás dele agora. — Igor brinca —
Como assim pegou você? Ele ainda não sabe que você é do Cobra?
— Bobo! — Viro em seus braços e beijo seu queixo — Que tal uma
pizza lá em casa?
— Com direito à sobremesa? – Indaga meu namorado safado com
segundas intenções.
— Quem sabe, tudo pode acontecer. Vamos.
Entramos no carro e já faço o pedido da pizza para adiantar, estou
com fome e quando chegarmos lá, ela estará quase pronta. Entro no
aplicativo de mensagens e vejo três recados do Gilvan. Clico, curiosa.
“Parabéns Beatriz, você ganhou! Eu sabia!”
“Vai ter que vir à São Paulo receber o prêmio.”
E em seguida um link que eu clico sem entender muito bem do que se
trata. E então eu leio algo inimaginável:
Academia Nacional de Medicina – ANM anuncia vencedores de
prêmios
Foram 65 candidatos que concorreram aos dez prêmios desta
edição. Considerada a mais antiga instituição na área da saúde em
funcionamento permanente, foi criada em 1829 pelo médico cirurgião
Joaquim Cândido Soares de Meirelles, sob o nome de Sociedade de Medicina
do Rio de Janeiro.
A reportagem segue contando um pouco sobre a Academia e em
seguida começa a citar os vencedores, desço meus olhos com o coração
palpitando forte no meu peito, até que encontro meu nome:
O Prêmio Raul David de Sanson, na área de Cirurgia, foi concedido
para a mineira Beatriz Mairinque com o trabalho “Reconstrução completa
de Mandíbula – Prótese de titânio oferece qualidade de vida”.
Eu. Não. Acredito. Nisso.
— Bia? Ei, estou falando sozinho aqui – Igor me chama sem fazer
ideia de nada. Sequer comentei com ele sobre o prêmio, achei tanta loucura
do Gilvan que deletei da minha mente, nem eu mesma me lembrava disso.
Abaixo o celular com as mãos trêmulas, não sei o que dizer a ele,
então digo a verdade.
— Eu ganhei um prêmio.
— O que? Que prêmio?
— Um prêmio da Academia Nacional de Medicina.
Igor me olha rapidamente, talvez para conferir se estou brincando,
mas minha cara de espanto deve mostrar a ele que é verdade. Ficamos em
silêncio por alguns instantes absorvendo a notícia e, por fim, ele pede mais
informações.
— Em casa eu te explico, ainda não estou acreditando. Me dê alguns
minutos.
Seguimos em silêncio até meu prédio, sinto uma vontade de rir, mas
temo parecer uma louca e aguardo até estarmos dentro do apartamento, então
entrego meu celular a ele.
— Leia, me diga se é meu nome mesmo que está aí.
Ele lê rapidamente e vejo seu sorriso se abrir quando encontra o meu
nome.
— Beatriz Mairinque, está aqui, com todas as letras. Como foi isso?
— O Gilvan me inscreveu logo depois que fiz aquela cirurgia com
ele.
— O Gilvan? – Seu sorriso morre com a mesma rapidez que surgiu.
— Sim. Ele me contou quando liguei para dar a resposta sobre a vaga.
Ele me inscreveu sem que eu soubesse, apresentou todo o projeto que
fizemos. Eu não cogitava ganhar e confesso que nem me lembrava mais
disso, estou tão surpresa quanto você.
— Bia, isso é grande, meu Deus! — Ele me puxa em um abraço e gira
comigo pela sala — parabéns meu amor, parabéns, você merece!
Solto o riso guardado em minha garganta e terminamos nosso abraço
em um beijo delicioso.
— Que orgulho de você, branquinha!
— É inacreditável! Preciso mandar isso para os meus pais.
O interfone toca e Igor recebe a pizza enquanto envio o link para
meus pais, Leo, Nina, Saulo e Renan. Lamento que o trabalho inscrito tenha
sido o de São Paulo, se eu tivesse me inscrito por iniciativa própria, teria
escolhido o trabalho de Jonas e colocaria os dois como meus coautores.
— Pizza ficou meio pobre — ele comenta — você merecia algo
melhor para comemorarmos um prêmio.
— Está ótimo, vou pegar um vinho.
Procuro em meu armário e encontro um vinho que ganhei de um
paciente, parece ser bom. Abro e pego duas taças.
Brindamos juntos e tomo um pequeno gole experimentando.
— Hum, é bom!
Igor concorda e me puxa em um abraço.
— Te amo, estou feliz demais por você.
— Você imaginava que um dia estaria aqui, com aquela peste da
faculdade que só te irritava, comemorando um prêmio com ela e o mais
importante, dizendo que a ama?
Ele cai na risada e se senta me puxando para seu colo.
— Nunca, não sei o que me surpreende mais: eu me apaixonar por
você ou você ganhar o prêmio. Vamos falar a verdade, você não era das
melhores alunas.
— Igor! – Belisco seu braço e ele ri ainda mais. Não posso brigar com
ele porque é verdade, eu não tirava as melhores notas, suava muito para não
ficar no prejuízo.
— O prêmio surpreende mais, porque sempre te achei gostosa,
mesmo com esse nariz empinado.
— Eu não tenho nariz empinado.
— Ah tem sim, mas você tem direito de ter, olha só o prêmio aí
mostrando seu valor.
— Sério? Você me acha metida? – Pergunto, surpresa com a firmeza
em sua voz.
— Metida não, confiante. Você é muito segura de si Beatriz, não só
como médica, como mulher também. E invejo um pouco sua autoconfiança.
— Achei que o Davi já tinha resolvido essa questão da sua
autoestima. Precisando de elogios?
— Não, precisando de amor, estou carente.
Ele me puxa em um beijo e suas mãos sobem em busca dos meus
seios e as afasto rapidamente.
— Espera, vamos comer primeiro, depois comemoramos devidamente
a dois.
— Está vendo a autoconfiança, é você quem manda aqui, peste!
Comemos, bebemos e terminamos a noite na minha cama,
comemorando em alto estilo. Uma noite inesquecível e perfeita, mais uma
que vou guardar para sempre na memória.
A sede da ANM é no Rio de Janeiro, mas este ano, excepcionalmente,
a entrega dos prêmios será em São Paulo. Recebo um e-mail, com os dados
da celebração e convoco meu namorado para me acompanhar. Igor fica
surpreso com o convite e não entendo o porquê.
— Você quer que eu vá com você?
— Claro que sim, é o meu namorado, quem mais iria comigo?
— Eu não sei. Bia, a mídia vai estar lá em peso. A cirurgia teve muita
repercussão e com certeza ela vai estar em cima de você novamente.
— E daí?
— Eles vão me fotografar ao seu lado.
Sua frase me irrita tanto, mais que qualquer outro argumento que ele
pudesse usar.
— Tem vergonha de mim Igor? De estar ao meu lado?
— Claro que não, não é isso, mas eu nunca vivi essa coisa de sair na
mídia, eu não sei me comportar em lugares assim, nem roupa eu tenho para
isso.
— Sem drama. Acredito que tenha um terno no seu armário. É o
suficiente.
Ele suspira e parece contrariado.
— O Gilvan vai estar lá?
— Provavelmente, não tenho certeza, mas eu gostaria que estivesse.
Não tenho mais raiva dele, não gosto mais dele como homem, ele é um
amigo e preciso agradecê-lo. Se não fosse sua iniciativa, eu não estaria
recebendo esse prêmio.
Ele parece receoso e, por fim, diz o que o incomoda de verdade.
— Bia, as pessoas vão comentar.
— Comentar o que?
— Que você namora um negro.
— E daí, não vão estar mentindo. Eu namoro um negro lindo e
delicioso, que me estragou para todos os homens do mundo. Deixe
comentarem o que quiserem, vamos mostrar a eles o quanto nos amamos e o
quanto somos lindos juntos.
— Certo, eu vou. Sei que estou pagando língua, zoei até o Davi
quando ele saía nos jornais com Isabella, agora é minha vez.
— Tudo tem sua primeira vez. Vai ser um momento importante da
minha vida, é o meu primeiro prêmio e quero você do meu lado.
— Eu vou estar lá. Sempre vou estar do seu lado, na entrega de
prêmios, na sala de cirurgia, no Bar do Leo, na casa dos seus pais, na sua
cama, onde você estiver e me quiser ao seu lado, é lá que eu vou estar.
— Obrigada! Prometo que também vou estar sempre com você, onde
me quiser e onde não quiser também, eu não costumo pedir autorização para
estar onde eu quero.
Igor me abraça e eu não fazia ideia que esta promessa feita por ele,
seria cobrada pelo destino apenas alguns dias depois.
Helena é uma jovem gaúcha que sonha em cursar Medicina. Filha de uma família classe média
do interior do RS, cresceu em um lar cheio de amor, junto aos pais e sua irmã. Na adolescência
conheceu Rodrigo e se apaixonou. Vivia feliz, estudando para conquistar seu objetivo, mas em um
piscar de olhos, seus sonhos viram pesadelos, pois, ela é traída da pior forma por todos que amava.
Decepcionada com sua família, Helena decide recomeçar sua vida na longínqua cidade de Belo
Horizonte e buscar a realização de seu sonho.
Na Universidade ela conhece Rafael e Saulo. Eles estão sozinhos, cada um enfrentando suas
dificuldades, mas com o mesmo objetivo de se formarem em Medicina. Eles se adotam como “irmãos
de coração”. Juntos se apoiam financeira e psicologicamente, e constroem uma nova família.
Durante a residência em Pediatria, Helena conhece Theo, um empresário que trabalha com
investimentos, viúvo e pai solo de duas crianças. Ela sofreu várias decepções amorosas e não acredita
mais no amor, mas Theo parece realmente disposto a conquistá-la. Dois seres magoados e traídos
conseguirão superar seus receios e se entregar ao amor?
Até onde há perdão? Até onde o amor supera tudo?
Você seria capaz de perdoar uma traição?
E se essa traição viesse daqueles que deveriam te amar acima de tudo?
Uma surpresa para Rafael
Saulo é um jovem mineiro que sonha em ter uma família e cursar Medicina. Abandonado na
porta de um convento, cresceu junto às Irmãs de Caridade e graças à generosidade de um médico que o
acompanhou, parte do seu sonho se torna possível.
Na Universidade ele conhece Rafael e Helena. Eles estão sozinhos, cada um enfrentando suas
dificuldades, mas com o mesmo objetivo de se formarem em Medicina. Eles se adotam como “irmãos
de coração”. Juntos se apoiam financeira e psicologicamente, e constroem uma nova família.
Durante a residência, Saulo conhece Alex. Ele é religioso, virgem e calmo. Ela é intensa,
agressiva e desbocada. Saulo se mantém distante, mas aos poucos descobre que eles têm mais
semelhanças do que podia supor. Resistir a ela se torna cada dia mais difícil.
Em meio às mudanças em sua vida, uma enorme surpresa: O passado que sempre esteve oculto
e o atormentou, desaba sobre ele.
Qualquer pecado pode ser perdoado? O quão misericordioso devemos ser?
Uma esposa para Davi