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POESIA
BARROCA
ANTOLOGIA DO SÉCULO XVII
EM LÍNGUA PORTUGUESA
EDITORA
ÁGORA DA ILHA
1
NADIÁ PAULO FERREIRA
Ficha catalográfica
FERREIRA, Nadiá Paulo
Poesia Barroca - Antologia do século XVII em
língua portuguesa/ Nadiá Paulo Ferreira
CONSELHO EDITORIAL
ANDRÉA C. FRAZÃO DA SILVA (UFRJ)
CARLOS PAULO MARTÍNES PEREIRO (UNIVERSIDADE DA CORUNHA)
FERNANDO OSÓRIO RODRIGUES (UFF)
LEILA RODRIGUES ROEDEL (UFRJ)
LÊNIA MÁRCIA DE MEDEIROS MONGELLI (USP)
DIETER KREMER (UNIVERSIDADE DE TRIER)
NADIÁ PAULO FERREIRA (UERJ)
SUELY REIS PINHEIRO (UFF)
YARA FRATESCHI VIEIRA (UNICAMP)
2
POESIA BARROCA
Sumário
O BARROCO NA POESIA..............................................11
Contexto histórico.............................................................13
Movimento artístico-literário..............................................21
Poesia lírica.....................................................................26
Poesia satírica..................................................................27
Cancioneiros....................................................................28
Formas poéticas................................................................30
Amor e sublimação...........................................................31
Quadro sinótico..................................................................39
ANTOLOGIA.....................................................................41
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NADIÁ PAULO FERREIRA
D. FRANCISCO DE PORTUGAL......................................67
Só contra vós pequei, Senhor divino (salmo)..........................67
D. TOMÁS DE NORONHA..............................................71
Amor me tem por vós negro ferrado (soneto)........................71
A um casamento que fez em Lisboa um fulano de Mello com uma
fulana de Mello, ambos velhos.............................................72
A uma freira que lhe mandou pedir meias e sapatos para entrar em
uma comédia, e um vestido (canção)....................................72
A uma mulher que sendo velha se enfeitava (canção)..............75
A uns noivos, que se foram receber, levando ele os vestidos
emprestados, e indo ela muito doente, e chagada...........................77
A uma mulher acautelada em fechar a porta, mas diziam que andava
com o cura........................................................................78
Às poesias que se fizeram a uma queimadura da mão de uma senhora
(soneto)...........................................................................78
Figura do Entrudo (soneto).....................................................78
O sofrimento meu cordeiro mudo (soneto).............................79
Pragas se chorar mais por uma dama cruel (soneto)................80
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POESIA BARROCA
EUSÉBIO DE MATOS......................................................81
Retrato de uma Dama (oitavas)............................................81
5
NADIÁ PAULO FERREIRA
é a Bahia (epílogos)..........................................................105
À cidade da Bahia (soneto)................................................107
Ao padre Lourenço Ribeiro, homem pardo que foi vigário da
freguesia do Passé (sátira)..................................................108
Define a sua cidade (mote/glosa)..........................................110
Conselhos a qualquer tolo para parecer fidalgo, rico e discreto
(soneto)..........................................................................112
Ao mesmo com presunções de sábio, e engenhoso (soneto)....112
Segunda impaciência do poeta (soneto)...................................113
A uma saudade (soneto)....................................................113
Admirável expressão de amor mandando-se-lhe perguntar como
passava (soneto)................................................................114
Solitário em seu mesmo quarto à vista da luz do candeeiro porfia o
poeta pensamentear exemplos de seu amor na borboleta (soneto)...115
Definição do amor (romance)..............................................115
A N. Senhor Jesus Cristo com atos de arrependido e suspiros de
amor (soneto)..................................................................122
Achando-se um braço perdido do menino Deus de N. S. das
Maravilhas, que desacataram infiéis na Sé da Bahia (soneto)....123
No sermão que pregou na Madre de Deus D. João Franco de Oliveira
pondera o poeta a fragilidade humana (soneto)......................123
Desenganos da vida humana metaforicamente (soneto)..........124
Pretende o poeta moderar o excessivo sentimento de Vasco de
Souza de Paredes na morte da dita sua filha (soneto)..............124
Perguntou-se a um discreto (mote/glosa)..............................125
Responde a um amigo com as novidades que vieram de Lisboa no
ano de 1658 (soneto)........................................................126
Ao casamento de Pedro Álvares da Neiva (soneto)................127
JERÓNIMO BAÍA...........................................................129
A uma crueldade formosa (madrigal)......................................129
A uma formosa cruel (madrigal).............................................130
A uma trança de cabelos negros (soneto).................................130
Ao menino Deus em metáfora de doce (romance)..................131
Achando alívio nas suas penas (soneto)................................133
Dando-lhe uma rosa (madrigal)...........................................133
A uma rosa (soneto)..........................................................134
A umas beatas (romance satírico burlesco)...........................135
JORGE DA CÂMARA......................................................147
Ao tempo (soneto)............................................................147
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GLOSSÁRIO...................................................................183
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................199
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APRESENTAÇÃO
Psicanálise e Literatura -
caminhos cruzados
SÉRGIO NAZAR DAVID
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O barroco
na poesia
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Contexto histórico
Absolutismo
O século XVI já é marcado pela tendência ao regime absolutista,
que atingirá seu apogeu no século XVII, coincidindo, portanto, com
o barroco. O declínio desse regime político começa em 1789,
estendendo-se, a partir daí, até o século XIX, com exceção da
Inglaterra, onde entra em decadência anteriormente.
O que entendemos por Absolutismo? Vou responder a essa
questão, recorrendo à definição de Jacques Bénigne Bossuet (1624-
1704), em Política tirada das próprias palavras das Sagradas
Escrituras, quando define as quatro características ou qualidades
essenciais da autoridade real: é sagrada, é paternal, é absoluta e está
sujeita à razão.
A riqueza, advinda do comércio marítimo, permitindo a
expansão da máquina burocrática, a criação de órgãos destinados à
organização militar e à política exterior, as guerras internacionais,
fortalecendo o poder do estado, e a Revolução Protestante, rom-
pendo com a unidade do catolicismo, foram as principais causas do
fortalecimento do poder real (Absolutismo).
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Movimento artístico-literário
Para a maioria dos historiadores, a Reforma não faz parte do
Renascimento. Os humanistas estão para o Renascimento assim
como os reformadores estão para o Barroco.
O protestantismo não teria se difundido tanto, no norte da Europa,
se não estivesse associado ao desenvolvimento do comércio, à
formação de uma consciência nacional e ao fortalecimento do poder
do Estado.
É nesse contexto de profundas mudanças, contestações e reações
que nasce a arte barroca. Entre os católicos e os insurrectos ao
poder eclesiástico de Roma não há lugar para temperança. A religião
se torna o palco de guerras fratricidas, que se tecem em um cenário
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Poesia lírica
Os principais temas são o amor divino, o amor profano e a dor
de existir num mundo em desencanto.
Amor profano
O objeto amado é dado como perdido para sempre. Sem
esperanças, este objeto só pode ser recordado como um bem passado
que anula o sentido de existir no mundo. O presente sem futuro,
vivido sob a forma de um esvaziamento do ser (destituição de todos
os significantes, o que é impossível), leva o sujeito a conviver com
um vazio, que é imaginado como a experiência da própria morte. A
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POESIA BARROCA
Amor divino
A matriz deste amor é a paixão de Cristo. O homem, por ser
pecador, divido entre a carne e o espírito, clama pela misericórdia
divina. Cristo flagelado e crucificado representa o padecimento de
um corpo até a morte. Em nome do amor ao Pai, o sofrimento de
Cristo é a prova cabal da misericórdia divina. Reviver o sofrimento
de Cristo é imaginado como um despojamento absoluto do ser
(anulação dos significantes), onde o vazio, como metáfora da própria
morte, conduz a uma experiência de gozo místico, ou seja, um
gozo não sexual. Religiosidade e erotismo se mesclam, fazendo com
que todos os sentidos se tornem fonte de deleite e volúpia. A Virgem,
cultuada pelos devotos da Idade Média, é substituída por Madalena,
símbolo do pecado e do arrependimento humanos. O profano
(erotismo) e o sacro contracenam, rompendo, assim, os limites entre
o sublime e o mundano.
Poesia satírica
A ironia e o deboche são os tons que predominam nas poesias
satíricas. Critica-se não só a moral hipócrita da sociedade, a
devassidão, o clero, a nobreza e as frivolidades mundanas da
aristocracia mas também o gosto pelo excesso do estilo barroco e o
modo pelo qual o amor é abordado na poesia. A tradição satírica
27
NADIÁ PAULO FERREIRA
Cancioneiros
As antologias impressas mais conhecidas da poesia seiscentista
portuguesa são Fênix29 renascida e Postilhão de Apolo30 .
Fênix renascida ou Obras poéticas dos melhores engenhos
portugueses compõe-se de cinco volumes, organizados por Matias
Pereira da Silva. O primeiro volume é publicado em 1715 e os
outros quatros são publicados, espaçadamente, até 1728. Em 1746,
sai uma nova publicação com acréscimos. Além dos poetas
seiscentistas, Vítor Manuel faz questão de ressaltar que “figuram
também, embora em pequeno número, obras de poetas
quinhentistas”31 .
Vítor Manuel comenta
que a principal dificuldade com que
se defrontou Matias Pereira da Silva
consistiu na averiguação da autoria das
composições poéticas incluídas na sua
coletânea. Por um lado, havia a conside-
rar o problema das obras que corriam
anônimas; por outro, o das obras com
diferentes atribuições de autoria ou com
atribuição inexata.32
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Formas poéticas
Vamos encontrar, além do soneto38 , que é a forma culta
predominante; as seguintes formas poéticas:
1 - formas cultas do Renascimento italiano: canção clássica39 ,
elegia40 , égloga41 , madrigal42 e ode43 ;
2 - formas poéticas tradicionais de origem popular: romance44 ,
décimas45 e redondilhas46 ;
3 - formas com mote e glosa, herdadas da tradição medieval e
cultivadas pelos poetas do Cancioneiro geral de Garcia de Resende47 ;
4 - formas com mote e glosa, inovadas pelos maneiristas - um
soneto é considerado como mote e geralmente glosado em quatorze
oitavas (soneto de Francisco Rodrigues Lobo glosado por Antônio
Barbosa Bacelar em “Fermoso Tejo meu, quão diferente”) -, a própria
oitava48 em verso decassílabo pode constituir um mote glosado em
oitavas, como é o caso da glosa de Bacelar (Fênix renascida, v. I) à
oitava camoniana “Estavas, linda Inês, posta em sossego”.
30
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32
POESIA BARROCA
___________________
1
AGUIAR E SILVA, 1973, p. 364.
2
AGUIAR E SILVA, 1973, p. 368.
3
v. WÖLFFIN, 1952.
4
v. HAUSER, 1965.
5
v. SILVA, 1971.
6
Principais obras de Luis de Góngora y Argote: Fábula de Polifemo e
Galatéia, Panegírico ao Duque de Lerma e o livro inacabado As soledades.
7
v. SILVA, Vitor Manuel Pires de Aguiar. Maneirismo e barroco na poesia
lírica portuguesa. Op. cit. id. ibid.
8
Silogismo: Grego, syllogismós, conjunto, pelo latim sillogismu (m), a forma
mais perfeita do raciocínio. O silogismo é um dos preceitos do discurso oratório,
desenvolvidos, principalmente, pelo filósofo grego Aristóteles, pelo orador latino
Quintiliano e pelo poeta latino Horácio, na antigüidade clássica. O discurso oratório,
apesar de algumas diferenças entre os autores citados, deveria apresentar três
partes:
1a) Exórdio (ou proêmio ou princípio), que se subdivide em duas partes: a
proposição, que se caracteriza pela apresentação do assunto, e a divisão, que
consiste na enumeração do que será seguido pelo orador.
2a) Desenvolvimento, que se divide em narração, a exposição minuciosa do
que foi apresentado de forma sintética na proposição, e em argumentação, a parte
mais importante do discurso. Esta parte, que já devia vir sendo preparada pelo
exórdio e pela narração, se fundamenta no silogismo, podendo lançar mão do
exemplo (prova trazida de fora, da história – exemplo histórico – e da fábula –
exemplo poético).
3a) Peroração (ou conclusão ou epílogo) que, apesar da discordância entre os
autores, tem como função essencial o convencimento e como virtude a brevidade.
9
LACAN, 1982, p. 158.
10
LACAN, 1982, p. 158.
11
Cantiga de mestria, em oposição à cantiga de refrão, não tinha estribilho.
12
LAPA, 1964, p. 137.
13
LAPA, 1964, p. 137.
14
GONÇALVES, RAMOS, 1985, p. 257.
15
PESSOA, 1977, p.164.
16
PESSOA, 1977, p.165.
17
Nas artes plásticas, a serpentinata é a figura de estilo que melhor representa
o gosto pela virtuose e pelo excesso do Maneirismo quinhentista. Essa figura tem
a forma de uma chama ondulante, assemelhando-se à letra S. Miguel Angelo, que
descreve esta figura como sendo a contorção de uma cobra viva em movimento,
multiplicou-a por três, retomando o contraposto do clássico da antigüidade (as
partes do corpo são representadas assimetricamente de modo que a rotação da
cabeça se opõe à rotação dos quadris).
33
NADIÁ PAULO FERREIRA
18
Paradoxo: Grego parádoxon, contra opinião. É um dos recursos lógicos
usado para a argumentação de um discurso oratório.
19
Antítese: Grego antí, contra, thésis, afirmação. Figura de estilo na qual se
aproximam dois sentidos opostos.
20
Hipérbole: Grego hyperbolê, excesso. Figura de linguagem que visa outorgar
ao objeto uma ênfase exagerada, que no sentido positivo, quer no sentido negativo.
21
Oxímoro: Grego oxymoros, agudamente néscio. Figura de linguagem que
consiste na fusão, em um só enunciado, de duas afirmações antagônicas, portanto,
duas declarações que se excluem.
22
Alusão: Latim allusione (m), alludere, jogar com. Toda referência, direta
ou indireta, a uma obra, a uma situação, a um personagem, a um episódio, etc.
23
Homonímia: Homônimo vem do grego, homónymos pelo latim homonymus.
Refere-se a uma palavra que se pronuncia da mesma forma que outra, mas cujo
sentido e escrita são diferentes (laço = laçada, lasso = cansado), ou uma palavra
que se pronuncia e se escreve do mesmo modo, mas cujo sentido é diferente
(falácia = qualidade de falaz, e falácia = falatório).
24
Paronímia: Parônimo vem do grego parónymos, pelo latim paronymu.
Refere-se às palavras que têm som semelhante ao de outras (descrição e discrição;
onicolor e unicolor; vultoso e vultuoso).
25
Hipérbato: Grego hyperbatón, que ultrapassa. Figura de linguagem que se
caracteriza pela inversão dos elementos constituintes da frase.
26
Perífrase: Grego perífrasis, em torno da frase. Figura de estilo que consiste
na substituição de uma palavra por uma série de outras, visando dizer, através de
um rodeio frásico, o que possibilita a criação de várias metáforas. É também no-
meado de circunlóquio.
27
Ícaro era filho de Dédalo e de Náucrates. Dédalo foi o artista ateniense mais
famoso da época arcaica. Além de arquiteto, era escultor e inventor. Exilado na ilha
de Creta, construiu o famoso Labirinto, a pedido do rei Minos: o palácio de Cnossos,
com um emaranhado de quartos, salas e corredores. Náucrates era uma escrava do
palácio do rei Minos. Dédalos, a pedido de Ariadne, filha do rei Minos que se apaixonou
por Teseu, ajudou este a matar o Minotauro (monstro antropófago, metade homem
e metade touro) e sair do Labirinto. Teseu, depois de matar o Minotauro, fugiu com
a princesa Ariadne. Minos, enfurecido, prende Dédalo e seu filho, Ícaro, no Labirin-
to. Dédalo inventa para si e para seu filho umas asas de penas, presas aos ombros
com cera. Os dois fogem, voando pelo céu. Dédalo aconselha o filho a não voar
muito alto, porque o sol derreteria a cera, nem muito baixo, porque a umidade tornaria
as penas pesadas demais. Ícaro, fascinado com o céu, esquece o conselho do pai e
chega muito perto do sol. A cera derreteu-se e ele ficou sem as asas, caindo no mar
Egeu que, a partir daí, passou a se chamar mar de Ícaro. O livro de Ovídio (43 a. C.-
18 p. C.), Metamorfoses, narra esse episódio. Junito Brandão considera que Dédalo
representa a “engenhosidade, o talento, a sutileza. Construiu tanto o labirinto, onde
a pessoa se perde, quanto as asas artificiais de Ícaro, que lhe permitiram escapar,
voar, mas que lhe causaram a ruína e a morte” (BRANDÃO, 1997, p. 590, v.1).
28
Paródia: Grego paroidía, canto ao lado de outro. Caracteriza-se pelo seguinte
procedimento: incorporação de partes do objeto a ser criticado, usando como instrumento a
ironia.
29
A palavra fênix não tem até agora uma etimologia incontestada. Como
nome de ave, sua origem remete ao Egito (culto de Ra-Herakheti, isto é, Sol vivo)
para designar uma espécie de garça real. Segundo a versão do escritor Heródoto,
tratava-se de uma ave originária da Etiópia, de cor vermelho intenso, com as asas
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POESIA BARROCA
cor de ouro, que visitava o Egito a cada quinhentos anos. Com porte semelhante ao
de uma águia, posteriormente é descrita com plumagem de cores vermelha, azul-
claro, púrpura e ouro. Todas as versões míticas partem de sua morte e do seu
renascimento, porque é a única ave de sua espécie. É comum a todas estas versões
o fato de que a fênix reuniu plantas aromáticas e incenso para fazer seu ninho.
Algumas versões contam que põe fogo em seu ninho ou o incendeia com seu próprio
calor, para renascer das cinzas. Outras versões contam que, a cada quinhentos anos,
deita-se em seu ninho, solta sobre ele seu sêmen e morre. Do sêmen nasce a nova
fênix, que pega o corpo da fênix morta e o coloca num tronco oco de mirra e o leva
para Heliópolis. Chega a essa cidade, cercada por um bando de aves, que lhe prestavam
homenagem, e fica sobrevoando o altar do deus Ra, até a chegada de um sacerdote,
quando o tronco de mirra é queimado. Depois, retorna à Etiópia e fica se alimentando
de pérolas de incenso até chegar a hora da morte e do renascimento.
30
Apolo faz parte da segunda geração do Olimpo. É filho de Zeus e da deusa
oriental Leto e tem uma irmã gêmea, Ártemis. Hera, com ciúmes do marido,
proibiu a terra de acolher Leto, na hora do parto. Os filhos de Leto nasceram na
ilha flutuante Ortígia que, por não pertencer à terra, não tinha que temer a ira de
Hera. À luz da noite, nasceu Ártemis, a Lua. E à luz do dia, nasceu Apolo, o Sol.
Ártemis, nascendo primeiro, assistiu ao parto do irmão e ficou tão horrorizada com
o sofrimento de sua mãe que pediu ao pai para ficar eternamente virgem. Conta-
se, também, que Leto, para escapar do ódio de Hera, se transformou em Loba,
indo se esconder no país dos Hiperbóreos, onde teve seus filhos. Daí um dos
epítetos de Apolo, Licógenes, “nascido da Loba”. As consultas ao Oráculo de
Delfos eram feitas, inicialmente, no dia sete do mês Bísio, a data do aniversário de
Apolo (início da primavera). Sua lira tinha sete cordas. Sua doutrina era constituída
de sete máximas, atribuídas aos sete sábios. Justamente por isso, Ésquilo o chamou
“augusto deus sétimo, o deus da sétima porta”. Este deus oriental, através de
vários sincretismos, se torna o detentor do Oráculo de Delfos, o deus da cultura e
da sabedoria. Aliás, é justamente em função desses sincretismos que esse deus
recebe mais de duzentos epítetos e atributos, que vão desde o deus da vegetação,
dos pastores, dos rebanhos, da família, dos lares, dos marinheiros, da luz até se
transformar no deus da medicina, das artes, da música e da poesia.
31
SILVA, 1971, p. 76.
32
SILVA, 1971, p. 87.
33
SILVA, 1971, p. 78.
34
SILVA, 1971, p. 95.
35
SILVA, 1971, p. 96.
36
SILVA, 1971, p. 102.
37
SILVA, 1971, p. 103.
38
Soneto: Italiano sonetto, do Provençal sonet, som, melodia, canção.
Composição poética, inventada, aproximadamente, entre os séculos XII e XIII. É
controvertida a atribuição de quem inventou essa forma poética. Pier della Vigna,
1197-1249, ou Giacomo da Lentino, 1180-1190?, ambos poetas sicilianos da corte
de Frederico II, imperador germânico da dinastia sueca dos Hohenstaufen e rei da
Sicília. Caracteriza-se por ser forma poética constituída de quatorze versos, distri-
buídos em dois quartetos e dois tercetos. Dante, 1265-1321, e Petrarca, 1304-
1374, foram, sem dúvida, os poetas que imortalizaram essa forma, espalhando-a
por toda a Europa. Em relação à estrutura, temos o soneto estrambótico (ou de
estrambote ou de cauda), o soneto petrarqueano, o soneto inglês ou shakespeariano
35
NADIÁ PAULO FERREIRA
36
POESIA BARROCA
dores da guerra e dos jogos olímpicos. A lira é substituída pela flauta e a ode
adquire uma forma mais ou menos definida. Divide-se em três partes: o encômio
inicial e final (que visa à louvação de alguém que realizou um ato heróico, principal-
mente, na guerra e nos esportes olímpico) e a narração de episódios míticos.
Esquecida, durante a Idade Média, essa composição poética é redescoberta pelos
humanistas do século XIV. A partir daí, ode é classificada em relação ao tema e
à forma. Quanto ao tema, é classificada em: heróica ou pindárica; filosófica e
moral ou sáfica; amorosa, pastoril, báquica ou anacreôntica. Quanto à forma é
classificada em: ode tripartite ou pindárica, em que a estrofe e a antístrofe (a
segunda parte) apresentam versos organizados em um padrão único (isto é, em
estâncias, termo que se emprega para nomear as estrofes regulares, que se
organizam com unidades métricas uniformes, ou seja, são estrofes isométricas) e a
épode ou epodo em um padrão diferente; ode homostrófica ou horaciana em que
as estrofes se organizam em um mesmo modelo; e a ode irregular ou livre.
44
Romance: Provençal romans, do latim romanice, em língua românica, isto é,
em oposição à língua latina. Aqui empregada com o sentido de composição poética
popular, tipicamente espanhola, na maioria das vezes constituída em redondilhas
maiores (versos de sete sílabas).
45
Décima: Latim decima (m), dez partes. Designa a estrofe ou poema em dez
versos. Da lírica trovadoresca até o Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, a
décima era constituída de duas quintilhas (estrofes de cinco versos) independentes
pela rima e separadas por uma pausa. A partir do século XVI, surge a décima
clássica ou espinela (em homenagem a Vicente Espinel, a quem se atribui a invenção),
constituída de uma quadra (estrofe em quatro versos) e de uma sextilha (estrofe em
seis versos) em versos de sete sílabas (redondilha maior), separados por uma pausa,
apresentando, na maioria das vezes, os seguintes esquemas de rima: abba/accddc.
Na décima clássica ou espinela, a quadra constitui uma espécie de mote e a sextilha
corresponde a uma espécie de glosa.
46
Redondilha: Os versos de redondilha estão ligado à tradição popular. Os
versos de cinco sílabas são classificados de redondilha menor e os de sete sílabas
de redondilha maior.
47
Formas com mote e glosa do Cancioneiro Geral: a cantiga ou glosa e o
vilancete. Essas formas populares se caracterizam por uma estrofe inicial, chamada
de mote ou cabeça, que apresenta o tema a ser desenvolvido pelas voltas ou glosas.
A glosa ou cantiga apresenta um mote de quatro ou mais versos, seguidos de glosas
ou voltas. O vilancete tem por étimo o espanhol villancete, villano, vilão, habitante
de vila, daí cantiga de vilão ou de vilã. Esta forma é constituída de uma estrofe,
chamada de mote ou cabeça, constituída de dois ou três versos, seguida de um
número variado de estrofes, chamadas de voltas ou glosas de cinco a oito versos,
predominantemente de sete sílabas (redondilha maior).
48
Oitava: Latim octavu (m), oitavo. Designa a estrofe ou poema em oito
versos. Existem dois tipos: a oitava rima (ottava rima em italiano), também
denominada de oitava real, oitava heróica ou oitava italiana, que é constituída de
versos decassílabos com um esquema fixo de rimas (abababcc); e a oitava ro-
mântica ou oitava moderna, que apresenta uma variedade de metros e de rimas,
podendo, inclusive, usar versos soltos.
49
LACAN, 1982, p. 158.
50
Castração não é usada no sentido corrente, isto é, dicionarizado, onde significa
ato ou efeito de se castrar. O verbo castrar (do latim castrare) faz parte do código
de nossa língua com os seguintes significados, segundo a versão de Aurélio Buarque
37
NADIÁ PAULO FERREIRA
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POESIA BARROCA
Barroco
Absolutismo
Declínio das cidades italianas
Político Em França, supremacia de Richelieu (1624-1642)
C
Domínio dos Habsburgo e poderio espanhol
O
N
T A Reforma (Revolução Protestante)
A Contra-Reforma tridentina (Concílio de Trento,
E Religioso
1545- 1653)
X A fundação da Companhia de Jesus (1534)
T
O Apogeu do mercantilismo
Econômico Afirmação do comércio
Criação de indústrias
L Cultismo
I Estilos
Conceptismo
T
E
R
amor divino
A
lírico amor profano
T a dor de existir
U Gêneros
R
A satírico
Postilhão de Apolo
Cancioneiros
Fênix Renascida
39
POESIA BARROCA
Antologia
41
POESIA BARROCA
Anastácio Ayres
de Penhafiel (?)
Segundo os Códices da Academia dos Esquecidos, trata-se de
um poeta brasileiro. O poema escolhido se encontra na antologia Po-
esia barroca, organizada por Péricles Eugênio da Silva Ramos.
LABIRINTO CÚBICO
INUTROQUECESAR
NINUTROQUECESA
UNINUTROQUECES
TUNINUTROQUECE
RTUNINUTROQUEC
ORTUNINUTROQUE
QORTUNINUTROQU
UQORTUNINUTROQ
EUQORTUNINUTRO
CEUQORTUNINUTR
ECEUQORTUNINUT
SECEUQORTUNINU
ASECEUQORTUNIN
RASECEUQORTUNI
43
POESIA BARROCA
(HATHERLY, 1997)
45
NADIÁ PAULO FERREIRA
A UM BEM PERDIDO
(Fênix renascida)
A UM PEITO CRUEL
(Fênix renascida)
46
POESIA BARROCA
A UM SONHO
A UMA AUSÊNCIA
Sinto-me, sem sentir, todo abrasado
No rigoroso fogo que me alenta.
O mal, que me consome, me sustenta,
O bem, que me entretém, me dá cuidado;
(Fênix renascida)
47
NADIÁ PAULO FERREIRA
A UMA DESPEDIDA
(Fênix renascida)
A UMAS SAUDADES
(Fênix renascida)
48
POESIA BARROCA
(Fênix renascida)
DE CONSOANTES FORÇADOS
(Fênix renascida)
49
NADIÁ PAULO FERREIRA
QUEIXANDO-SE
(Fênix renascida)
50
POESIA BARROCA
(Fonte Jocosa)
51
NADIÁ PAULO FERREIRA
MOTE
GLOSA
Se desmaias de me ver,
eu também de ver-te a ti,
pois qual tu te vês me vi,
e qual me vês hás-de ser;
esta caveira hás-de ter,
se te imaginas divina,
que eu também quando menina
fui um sol, fui uma aurora,
e se sou caveira agora,
já fui flor, já fui bonina.
Se me viras Primavera,
sendo uma inveja de flores,
então mais te dera horrores,
então alento te dera;
secou esta verde hera
um cruel sopro da morte,
porque com seu braço forte
tudo prosta, tudo humilha,
que eu ontem fui maravilha,
agora estou desta sorte.
52
POESIA BARROCA
53
POESIA BARROCA
55
NADIÁ PAULO FERREIRA
56
POESIA BARROCA
(HATHERLY, 1997)
1
Segundo Ana Hatherly, o retrato pintado por Bernardo Vieira baseia-
se no poema atribuído a Eusébio de Matos (“Retrato de uma Dama”,
que se encontra nessa antologia), de que faz uma glosa em negativo, e
não é de se excluir a possibilidade de que ambos os poemas tenham
por base outros modelos semelhantes de outros autores. De qual-
quer modo, trata-se provavelmente de um exercício poético entre
colegas (amigos ou rivais), educados pelos mesmos mestres, vivendo
ao mesmo tempo e na mesma cidade uma experiência cultural idênti-
ca (HATHERLY, 1997. p. 113).
57
POESIA BARROCA
D. Francisco
Manuel de Melo
(1608 ou 11 - 1666)
ANTES DA CONFISSÃO
(Obras métricas)
59
NADIÁ PAULO FERREIRA
APÓLOGO DA MORTE
(Obras métricas)
(Obras métricas)
60
POESIA BARROCA
(Obras métricas)
61
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Obras métricas)
(Obras métricas)
MEMÓRIAS E QUEIXAS
62
POESIA BARROCA
(Obras métricas)
MUNDO É COMÉDIA
(Obras métricas)
MUNDO INCERTO
63
NADIÁ PAULO FERREIRA
AO DESCUIDO DA VIDA
ODE
64
POESIA BARROCA
(Obras métricas)
1
V. soneto de Camões, “Sete anos de pastor Jacob servia”. V. Velho
Testamento, “Gênesis, capítulo 29, Jacob e Labão (v. glossário).
65
POESIA BARROCA
D. Francisco de Portugal
(1585 - 1632)
SALMO
67
NADIÁ PAULO FERREIRA
68
POESIA BARROCA
69
POESIA BARROCA
D. Tomás de Noronha
(? - 1651)
(HATHERLY, 1997)
71
NADIÁ PAULO FERREIRA
(REMÉDIOS, 1899)
À fé de poeta honrado,
Que ficareis desta vez,
Despida de todo o ponto,
De cabeça, perna e pés.
72
POESIA BARROCA
73
NADIÁ PAULO FERREIRA
(REMÉDIOS, 1899)
74
POESIA BARROCA
75
NADIÁ PAULO FERREIRA
76
POESIA BARROCA
(Fênix renascida)
(Fênix renascida)
77
NADIÁ PAULO FERREIRA
(REMÉDIOS, 1899)
FIGURA DO ENTRUDO
78
POESIA BARROCA
(HATHERLY, 1997)
(Fênix renascida)
79
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Fênix renascida)
80
POESIA BARROCA
Eusébio de Matos 1
(1629 - 1692)
81
NADIÁ PAULO FERREIRA
82
POESIA BARROCA
(Postilhão de Apolo)
___________________
1
Brasileiro, nascido na Bahia, irmão de Gregório de Matos.
2
V. o comentário feito ao poema de Bernardo Vieira (“Pelos
mesmos consoantes aplicando-as a um cadáver”) que, segundo Ana
Hatherly (1997), é uma glosa a este poema de Eusébio de Matos.
83
POESIA BARROCA
85
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Rimas)
DELÍRIOS DA NATUREZA
86
POESIA BARROCA
Francisco de Vasconcelos
(Coutinho)
(1665 - 1723)
87
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Fênix renascida)
A UMA SUSPEITA
(Fênix renascida)
88
POESIA BARROCA
(Fênix renascida)
(Hecatombe métrico)
89
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Fênix renascida)
(Hecatombe métrico)
90
POESIA BARROCA
(Fênix renascida)
MARIA, A MÃE-VIRGEM
(Hecatombe métrico)
91
POESIA BARROCA
93
NADIÁ PAULO FERREIRA
Esmoreceu-se a muchacha,
Mas que muito, se adverti
Que anima a um peito de alcorça
Um coração de alfenim.
94
POESIA BARROCA
Borrifaram-na as amigas,
E assim teve graças mil
Com os orvalhos da Aurora
Um rostinho tão gentil.
(Fênix renascida)
A UMA CAVEIRA
À VAIDADE DO MUNDO
95
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Fênix renascida)
96
POESIA BARROCA
Já do lascivo emendado,
já de pecador contrito,
de perverso, penitente,
de soberbo compungido;
97
NADIÁ PAULO FERREIRA
98
POESIA BARROCA
( ... )
99
NADIÁ PAULO FERREIRA
100
POESIA BARROCA
Gregório de
Matos Guerra 1
A CRISTO CRUCIFICADO
101
NADIÁ PAULO FERREIRA
102
POESIA BARROCA
AGRADECIMENTO DE UNS
DOCES A SUA FREIRA
103
NADIÁ PAULO FERREIRA
AO DESEMBARGADOR BELCHIOR
DA CUNHA BROCHADO
(WISNIK, 1976)
104
POESIA BARROCA
105
NADIÁ PAULO FERREIRA
4
Quem faz os círios mesquinhos? ...........Meirinhos.
Quem faz as farinhas tardas? ................Guardas.
Quem as tem nos aposentos? ................Sargentos.
Os círios lá vêm aos centos,
E a terra fica esfaimando,
Porque os vão atravessando
Meirinhos, guardas, sargentos.
5
E que justiça a resguarda? ....................Bastarda.
É grátis distribuída? .............................Vendida.
Que tem, que a todos assusta? .............Injusta.
Valha-nos Deus, o que custa
O que El-Rei nos dá de graça,
Que anda a justiça na praça
Bastarda, vendida, injusta.
6
Que vai pela cleresia? ...........................Simonia.
E pelos membros da Igreja? ..................Inveja.
Cuidei que mais se lhe punha?.. .............Unha.
Sazonada caramunha
Enfim, que na Santa Sé
O que mais se pratica é
Simonia, inveja, unha.
7
E nos Frades há manqueiras? ..................Freiras.
Em que ocupam os serões? . ...................Sermões.
Não se ocupam em disputas? ..................Putas.
Com palavras dissolutas
106
POESIA BARROCA
Me concluís, na verdade,
Que as lidas todas de um Frade
São freiras, sermões, e putas.
8
O açúcar já se acabou? ...........................Baixou.
E o dinheiro se extinguiu? .......................Subiu.
Logo já convalesceu? ..............................Morreu.
À Bahia aconteceu
O que a um doente acontece,
Cai na cama, o mal lhe cresce,
Baixou, subiu, e morreu.
9
A Câmara não acode? ..........................Não pode.
Pois não tem todo o poder? ..................Não quer.
É que o governo a convence? ...............Não vence.
Quem haverá que tal pense,
Que uma Câmara tão nobre,
Por ver-se mísera e pobre,
Não pode, não quer, não vence.
(WISNIK, 1976)
À CIDADE DA BAHIA
107
NADIÁ PAULO FERREIRA
(WISNIK, 1976)
1
Um branco muito encolhido,
um mulato muito ousado,
um branco todo coitado,
um canaz todo atrevido;
o saber muito abatido,
a ignorância e ignorante
mui ufana e mui farfante,
sem pena ou contradição:
milagres do Brasil são.
2
Que um cão revestido em padre,
por culpa da Santa Sé,
seja tão ousado que
contra um branco ousado ladre;
e que esta ousadia quadre
ao bispo, ao governador,
ao cortesão, ao senhor,
tendo naus no Maranhão:
milagres do Brasil são.
3
Se a este tal podengo asneiro
o pai o esvanece já,
a mãe lhe lembre que está
roendo em um tamoeiro:6
que importa um branco cueiro,
se o cu é tão denegrido;
mas se no misto sentido
se lhe esconde a negridão,
milagres do Brasil são.
108
POESIA BARROCA
4
Prega o perro frandulário,7
e como a licença o cega,
cuida que em púlpito prega,
e ladra num campanário:
vão ouvi-lo de ordinário
Tios e tias do Congo,
e se, suando o mondongo,
eles só gabos lhe dão,
milagres do Brasil são.
5
Que há de pregar o cachorro,
sendo uma vil criatura,
se não sabe de escritura
mais que aquela que o pôs forro?
Quem lhe dá ajuda e socorro
são quatro sermões antigos,
que lhe vão dando os amigos;
e se amigos tem um cão,
milagres do Brasil são.
6
Um cão é o timbre maior
da ordem predicatória,
mas não acho em toda história
que o cão fosse pregador,
se nunca falta um senhor,
que lhe alcance esta licença
de Lourenço por Lourença,
que as pardas tudo farão,
milagres do Brasil são.
7
Té em versos quer dar penada,
e porque o gênio desbroche,
como cão, a troche-moche
mete unha e dá dentada:
o perro não sabe nada,
e se com pouca vergonha
tudo abate, porque sonha
que sabe alguma questão,
milagres do Brasil são.
109
NADIÁ PAULO FERREIRA
8
Do perro afirmam doutores
que fez uma apologia
ao Mestre da teologia,
outra ao sol dos pregadores:
se da lua aos resplendores
late um cão a noite inteira,
e ela seguindo a carreira,
luz sem mais ostentação,
milagres do Brasil são.
9
Que vos direi do mulato,
que vos não tenha já dito,
se será amanhã delito
falar dele sem recato?
Não faltará um mentecapto,
que como vilão de encerro
sinta que dêem no seu perro,
e se porta como um cão:
milagres do Brasil são.
10
Imaginais que o insensato
do canzarrão fala tanto
porque sabe tanto ou quanto?
Não, senão por ser mulato;
ter sangue de carrapato,
ter estoraque de congo,
cheirar-lhe a roupa a mondongo8
é cifra de perfeição:
milagres do Brasil são.
(WISNIK, 1976)
MOTE
De dous ff se compõe
esta cidade a meu ver
um furtar, outro foder.
110
POESIA BARROCA
GLOSA
1
Recopilou-se o direito,
e quem o recopilou
com dous ff o explicou
por estar feito, e bem feito:
por bem digesto, e colheito,
só com dous ff o expõe,
e assim quem os olhos põe
no trato, que aqui se encerra,
há de dizer que esta terra
De dous ff se compõe.
2
Se de dous ff composta
está a nossa Bahia,
errada a ortografia
a grande dano está posta:
eu quero fazer aposta,
e quero um tostão perder,
que isso a há de perverter,
se o furtar e o foder bem
não são os ff que tem
Esta cidade a meu ver.
3
Provo a conjetura já
prontamente com um brinco:
Bahia tem letras cinco
que são BAHIA,
logo ninguém me dirá
que dous ff chega a ter,
pois nenhum contém sequer,
salvo se em boa verdade
são os ff da cidade
um furtar, outro foder.
(WISNIK, 1976)
111
NADIÁ PAULO FERREIRA
(WISNIK, 1976)
112
POESIA BARROCA
(WISNIK, 1976)
(WISNIK, 1976)
A UMA SAUDADE
113
NADIÁ PAULO FERREIRA
(WISNIK, 1976)
ADMIRÁVEL EXPRESSÃO DE
AMOR MANDANDO-SE-LHE
PERGUNTAR COMO PASSAVA
(WISNIK, 1976)
114
POESIA BARROCA
(WISNIK, 1976)
DEFINIÇÃO DO AMOR
ROMANCE
115
NADIÁ PAULO FERREIRA
Um maltrapilho, um ninguém,
que anda hoje nestas eras
com o cu à mostra, jogando
com todos a cabra-cega.
116
POESIA BARROCA
117
NADIÁ PAULO FERREIRA
118
POESIA BARROCA
119
NADIÁ PAULO FERREIRA
Um queixar de mentirinha,
um folgar muito deveras,
um embasbacar na vista,
um ai, quando a mão se aperta.
120
POESIA BARROCA
121
NADIÁ PAULO FERREIRA
O Amor é finalmente
um embaraço de pernas,
uma união de barrigas,
um breve tremor de artérias.
(WISNIK, 1976)
(WISNIK, 1976)
122
POESIA BARROCA
(WISNIK, 1976)
123
NADIÁ PAULO FERREIRA
(WISNIK, 1976)
DESENGANOS DA VIDA
HUMANA METAFORICAMENTE
(WISNIK, 1976)
124
POESIA BARROCA
(WISNIK, 1976)
MOTE
Perguntou-se a um discreto
Qual era a morte tirana.
Respondeu, que estar ausente
Daquilo, que mais se ama.
GLOSA
1.
Numa ilustre Academia,
Que, com ciências infusas,
Fizeram as nove Musas,
Onde Apolo presidia:
Depois que toda a poesia
Leu o secretário Admeto
Um problema mui seleto
Propôs, para argumentar-se,
E havendo de perguntar-se
Perguntou-se a um discreto.
2.
Ele que estava distante
E não ouviu a proposta,
Não deu por então resposta
De surdo, não de ignorante:
Mas sendo no seu semblante
125
NADIÁ PAULO FERREIRA
A Academia soberana,
Que tinha a desculpa lhana,
Lhe advertiam com agrado,
Que lhe haviam perguntado:
Qual era a morte tirana.
3.
Ele entonces como um raio,
Prontamente, e sem detença,
Tomada a vênia, e licença,
Fez consigo um breve ensaio:
O mais horrível desmaio,
Que um peito amoroso sente
É a falta do bem presente,
Ficou-lhe a resposta lhana,
E qual é morte tirana?
Respondeu, que estar ausente.
4.
Deixou a resposta absorto
Aquele douto Congresso,
Porque é já provérbio impresso,
Que ausente é o mesmo que morto:
Eu me persuado, e exorto,
Que quem se abrasa, e inflama
De amor na constante chama,
Inda que sinta abrasar-lhe,
É menor mal, que ausentar-se
Daquilo, que mais se ama.
126
POESIA BARROCA
(WISNIK, 1976)
(WISNIK, 1976)
127
NADIÁ PAULO FERREIRA
___________________
1
Brasileiro, nascido na Bahia.
2
Muchíssimas: muitíssimas, castelhanismo, o que é muito freqüente
nos poetas dessa época, já que alguns escreviam poemas tanto em
castelhano quanto em português.
3
Há divergência quanto à grafia: socrócio ou rocrócio. Socrócio: furtar,
rapinar. Rocrócio: retrocesso.
4
Trocar: com duplo sentido, de comercializar e modificar. Máquina
mercante: as naus que aportam para comerciar.
5
Lourenço Ribeiro: padre e pregador, nascido na Bahia, compositor
de trovas, ironizou publicamente o autor, levando-o a fazer este soneto.
6
Tamoeiro: correia que prende a carga. José Miguel Wisnik, faz o
seguinte comentário: o pai é motivo de orgulho, a mãe é escrava
(GUERRA,1976, p. 46).
7
Frandulário: forasteiro, estrangeiro. Segundo José Miguel Wisnik,
“frandulário” está por “franduleiro”; é, pois, uma palavra criada
pela rima, recurso muito comum usado pelos poetas. Acrescenta,
ainda, que, por se tratar de um padre mulato, costumavam ouvi-lo
pregar no púlpito os seus parentes da África - tios e tias do Congo
(GUERRA,1976, p. 46).
8
Cheirar-lhe a roupa a mondongo: cheirar a tripas de porco.
9
James Amado registra abelhudo em vez de cornudo (GUERRA,1976,
p. 103).
10
James Amado registra locução em vez de solução (GUERRA,1976,
p. 103).
11
Musa, musae: palavra latina, primeira declinação: se não sabe nem a
primeira declinação, logo não sabe latim e, também, não sabe nada de
poesia e arte.
12
Trocadilho: salacega/Salamanca. O padre Frisão doutorou-se
“naquela Salamanca”(“Catervas de asnos”) e floresceu “nesta
salacega”(“corjas de bestas”) (GUERRA, 1976, p. 133)
13
Há manuscritos que atribuem esse poema a Diogo Gomes de
Figueiredo (GUERRA,1976, p. 207).
14
Afrânio Peixoto registra gosto em vez de gesto (v. GUERRA,1976,
p. 207).
15
Não sei parte: não tenho notícia, não o conheço.
16
Segundo José Miguel Wisnik, James Amado registra aterra (MATOS,
1976. p. 308).
17
V. redondilhas de Camões “Babel e Sião” e o salmo 137(Velho
Testamento).
18
V. soneto de Camões, “Sete anos de pastor Jacó servia”. V. Velho
Testamento, “Gênesis, episódio no 29, Jacó e Labão (v. glossário).
128
POESIA BARROCA
Jerónimo Baía
(1620 ? – 1688)
(Fênix renascida)
129
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Fênix renascida)
(Fênix renascida)
130
POESIA BARROCA
Vejamos o doce
E depois que o virmos,
Compraremos todo,
Se for todo rico.
131
NADIÁ PAULO FERREIRA
132
POESIA BARROCA
(Fênix renascida)
(Fênix renascida)
133
NADIÁ PAULO FERREIRA
A UMA ROSA
ROMANCE
(Fênix renascida)
134
POESIA BARROCA
A UMAS BEATAS
ROMANCE SATÍRICO BURLESCO
Beatíferas Senhoras,
Em cujas venturosas casas
Como em adegas mosquitos
Andam bandos de Beatas.
Meditarei eu agora
Até que daqui me saia
A jantar com uma devota,
Deus me aceite estas passadas.
E perdoe, se me atrevo
Com bom zelo a encaminhá-la,
Que este hábito me desculpa,
Pois somos Irmãs em armas.
135
NADIÁ PAULO FERREIRA
136
POESIA BARROCA
Os graves Religiosos,
E Pregadores de fama,
O sobrenome ao menos
É necessário que saiba.
137
NADIÁ PAULO FERREIRA
Às viúvas dê meninas,
Dê serafins às casadas,
A umas chame Rainhas,
A outras mal empregadas.
138
POESIA BARROCA
139
NADIÁ PAULO FERREIRA
A ganhar o Jubileu,
Que nenhum deles me escapa,
Lá lhe prometo rezar
Um terço pela sua alma;
E à Madre espiritual
Direi que tenha lembrança
De a encomendar a Deus,
Porque é pessoa mui santa.
140
POESIA BARROCA
Se estiver à Pregação,
Tire da manga a cabaça,
E por debaixo do manto
Vá chupando precatada.
141
NADIÁ PAULO FERREIRA
E se escapar um ventinho,
Que a nossa carne é mui fraca,
Tussa logo, que com este
O outro som se disfarça.
142
POESIA BARROCA
143
NADIÁ PAULO FERREIRA
144
POESIA BARROCA
E é juramento devido
Ao jantar não fazer falta,
Antes eu por ele espere,
Que a panela requentada.
145
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Fênix renascida)
146
POESIA BARROCA
Jorge da Câmara
(? – 1647 ou 49)
AO TEMPO
(HATHERLY, 1997)
147
NADIÁ PAULO FERREIRA
DE UM ENGENHO A UM CAVALEIRO
EM RESPOSTA DE LHE PERGUNTAR
DE QUE COR ERA O SEU AMOR1
(HATHERLY, 1997)
1
Ana Hatherly indica a leitura dos seguintes poemas: “Voyelles” de
Rimbaud, “Correspondances” de Baudelaire, “Branco e Vermelho”
de Camilo Pessanha e “A uma Crueldade Formosa” de Jerónimo
Bahia, o qual se encontra nessa antologia (HATHERLY, 1997. p.
328, 329 e 330).
148
POESIA BARROCA
Manuel Botelho
de Oliveira
(1636 ou 37 – 1711)
Sua obra poética foi publicada no livro Música do Parnaso (1705),
contendo poemas em português, castelhano, italiano e latim.
(CORREIA, 1982)
149
NADIÁ PAULO FERREIRA
Fermosamente aguilenho
(ai, que nele me perdi!),
bem feita lasca de alcorça
parece o branco nariz.
150
POESIA BARROCA
(Música do Parnaso)
ROSA E ANARDA
(Música do Parnaso)
151
POESIA BARROCA
Sóror
Madalena da Glória
(1672 ? – 1759 ?)
DÉCIMA
153
NADIÁ PAULO FERREIRA
(Orbe celeste)
A UMA SAUDADE
154
POESIA BARROCA
MOTE E GLOSA
155
NADIÁ PAULO FERREIRA
MOTE E GLOSA
QUEIXAS DA SORTE
156
POESIA BARROCA
(Orbe celeste)
DÉCIMA
157
POESIA BARROCA
Sóror
Maria do Céu
(1658 ? – 1752 ou 53)
(HATHERLY, 1997)
159
NADIÁ PAULO FERREIRA
AMORAS AMORES
(HATHERLY, 1997)
Ao Senhor louvemos,
Pelas frutas belas
Que criou regalo
Sendo Providência.
Ao Senhor louvemos
Nas frutas primeiras
Que são frutas novas
De esperanças velhas.
Ao Senhor louvemos
Na maçã, e entra,
A que nasceu culpa
E acabou fineza.
Ao Senhor louvemos
Pelas romãs régias,
Que por dar-nos coroa
As criou com ela.
160
POESIA BARROCA
Ao Senhor louvemos
Do figo no néctar
E a melhor Mercúrio
Dedicado seja.
Ao Senhor louvemos
Na fruta das pêras
Que dão esperanças
Porque são esperas.
Ao Senhor louvemos
E a louvá-lo venha,
Pelo amo, amora,
Pelo amei, ameixa.
Ao Senhor louvemos,
Na ginja, e cereja
Para o gosto paz,
Para os olhos guerra.
Ao Senhor louvemos
Nas uvas, que emblemas
Mostram nos altares
E escondem nas cepas.
Ao Senhor louvemos
Na laranja isenta,
Que a criou esquiva
Porque a criou bela.
Ao Senhor louvemos
Na tâmara excelsa
Que por dar-se a Paulo
Se escondeu a Eva.
Ao Senhor louvemos
No limão que encerra
A vontade fina,
Em fruta grosseira.
161
NADIÁ PAULO FERREIRA
Ao Senhor louvemos
Do melão nas letras
Que até pelas frutas
Reparte ciências.
Ao Senhor louvemos
Na avelã, que encerra,
Em pouco miolo
Muita providência.
Ao Senhor louvemos
Pelas frutas belas,
Que criou regalo
Sendo providência.
(HATHERLY, 1997)
(HATHERLY, 1997)
162
POESIA BARROCA
MORTAL DOENÇA
163
NADIÁ PAULO FERREIRA
Vistamos a camisinha
E bem podeis, presumido,
Porque com ser de cambraia
Vós sois do que ela mais fino.
164
POESIA BARROCA
O paninho da coifinha
Escolhi, dos mais branquinhos,
Para encastoar em prata
A pérola do rostinho.
1
V. o trabalho com as frutas e as flores do pintor Arcimboldo (1527?-
1593) e o livro de Ana Hatherly, O ladrão cristalino. Aspectos do
imaginário barrroco, onde a relação entre o barroco e a pintura é
desenvolvida, enfatizando os temas das frutas e das flores para louvar o
Divino.
165
POESIA BARROCA
Sóror
Violante do Céu
(1601 ou 02 – 1693)
CANÇÃO
(Rimas várias)
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DÉCIMAS
(Rimas várias)
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MADRIGAL
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E se bem o referi-las
É para vós escusado,
Pois como lince divino
Vedes o interior humano.
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E porque os intercessores
Me valham multiplicados,
Saia também a pedir-vos
Quem também pode obrigar-vos.
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Já o espírito me deixa,
Já chega o último prazo,
Favor, Esposo divino,
Piedade, Rei soberano.
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Ai de ti pobre Cupido,
ao rigor de um Lente exposto!
Sempre a ruínas assunto,
sempre a Poetas destroço!
Ei-lo uma estátua de pedra;
ei-lo uma figura de ouro;
ei-lo de cristal buído;
ei-lo de pau carunchoso;
ei-lo logo arruinado;
ei-lo derretido logo;
ei-lo quebrado, de parte,
ei-lo queimado, de todo;
ei-lo quente, ei-lo fiambre;
ei-lo seco, ei-lo de molho;
ei-lo de osso sem tutano,
ei-lo de carne sem osso;
ei-lo nu, ei-lo coberto;
ei-lo vestido, ei-lo roto;
ei-lo pobre, e ei-lo rico;
ei-lo cego, e ei-lo torto;
em mil visages o vejo,
só à abatina o não topo;
que eu bem quisera capá-lo;
a ver se lhe punham olhos:
tudo isto por ele passa;
agora temos de novo,
depois de fome abrasado,
mostrar-se de sede morto:
vendo pois, que a correnteza
era exercício ocioso,
suspendeu-a, por ser pouca
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GLOSSÁRIO
A troche-moche: confusamente, desordenadamente.
Abrolhos dificuldade, pena, desgosto, mágoa, mortificação.
Açafate: cesto pequeno de junco.
Adrede: de propósito, de caso pensado, intencionalmente.
Aguilenho: planta natural da Índia, muita cheirosa, empregada em
farmácia e em perfumaria.
Airoso: esbelto, elegante, garboso.
Alabastrino: da cor do alabastro, que apresenta as propriedades dessa
rocha.
Alabastro: rocha pouco dura e muito branca, translúcida, finamente,
granulada. Sentido Figurado: Alvura, brancura.
Albardada: iguaria coberta com ovos e frita (albardada de bacalhau).
Alcorça: variante alcorce, massa de açúcar com a qual se fazem e se
cobrem doces.
Aletria: massa de farinha disposta em fios.
Alfenim: massa de açúcar muito branca a que se dá um ponto e com a
qual se formam diferentes figuras, cobertura feita com claras de ovos e
açúcar em ponto para cobrir bolos. Sentido figurado: pessoa delicada,
melindrosa.
Alforge: duplo saco, fechado nas extremidades e aberto no meio,
formando uma espécie de dois bornais, que se enchem equilibradamente.
Assim é feito para colocar a carga transportada no lombo de cavalgaduras
ou no ombro de pessoas. Grafia atual alforje.
Algália: licor que se extrai de várias glândulas do almiscareiro
(mamífero ruminante da Ásia, o qual se caracteriza pela forte secreção
odorífera, produzida por uma glândula abdominal, a algália).
Algibeira: bolso que faz parte integrante da roupa. Pequena bolsa em
forma de saquinho que as mulheres prendiam à cintura, em geral, por
baixo dos vestidos ou aventais.
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veneno, serpente.
Assolação: devastação, destruição.
Atalanta: variante de Atalante, significa sofredora. A origem desta
heroína é muito contraditória. Em algumas versões aparece como filha
de Íaso ou Iásio, filho de Licurgo, rei da Arcádia, e de Clímene, filha de
Mínias, rei de Orcômeno. Em outras, aparece como filha de Esqueneu
e de Temisto. Esqueneu só queria filhos homens, por isto quando
Atalanta nasceu, mandou-a para o monte Partênion, na Arcádia.
Alimentada por uma ursa, foi depois criada por caçadores. O “Orgulho
dos Bosques da Arcádia”, como era conhecida, participou da caçada ao
javali Cálidon, que havia sido enviado por Ártemis como castigo ao rei
Eneu, por ter esquecido de homenageá-la na época das colheitas. Por
fidelidade a Ártemis, recusava-se a casar, porque um oráculo predissera
que, se ela se casasse, seria transformada em animal. Por ser muito bela
e ter muitos pretendentes, decidiu que só se casaria com aquele que
conseguisse vencê-la numa corrida, porque sabia que isto seria impossível.
Os pretendentes derrotados pagariam com a vida. Depois da morte de
muitos pretendentes, apareceu-lhe Hipómenes (ou Melanion, segundo
outras variantes), que recebeu ajuda de Afrodite. Esta deusa lhe deu três
maçãs de ouro do Jardim das Hespérides, porque quem quer que as visse
ficava alucinado por possui-las. Quando Hipómenes percebeu que ia
perder a corrida, lançou cada uma das maçãs. Embora Atalanta as colhesse
rapidamente, terminou perdendo a corrida. Uma vez casados, entregaram-
se à paixão no santuário de Zeus ou Cibele. Como castigo foram
transformados pelo chefe do Olimpo em leões.
Azambuja: quantidade mais ou menos considerável de azambujeiros
(espécie de oliveira brava, de madeira rija) dispostos proximamente
entre si.
Baco: deus romano que corresponde ao deus Dioniso para os gregos.
A partir do século VI a.C., se tornou, essencialmente, o deus do vinho,
das festas e do teatro. Há dois dionisos. O primeiro, filho de Zeus e de
Perséfone, comumente chamado Zagreu, foi morto pelos Titãs por
ordem de Hera. Os Titãs, cortaram-no em pedaços, cozinharam-lhe as
carnes num caldeirão e as comeram. Zeus fulminou os Titãs e de suas
cinzas nasceram os homens. O segundo é filho de Zeus e de Sêmele.
Hera, enraivecida de ciúmes, planeja um ardil e o palácio de Sêmele
pega fogo. Sêmele morre carbonizada e Zeus retira o feto do seu ventre
e o coloca em sua coxa, para que seja completado o período de gestação.
Com medo de outra vingança de Hera, Zeus transformou Dioniso em
um bode, mandou Hermes levá-lo para o monte Nisa e entregá-lo aos
cuidados das Ninfas (v. verbete) e dos Sátiros (v. verbete). No monte
Nisa, havia videiras em abundância. Um dia, Dioniso colheu as uvas,
espremeu-as e bebeu o suco em sua taça de ouro, em companhia dos
Sátiros e das Ninfas. Assim nasceu o vinho. Por ocasião da colheita
das uvas, celebrava-se, em Atenas e por toda a Ática, a festa do vinho,
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é o mais belo entre os deuses. Para este poeta, Eros nasceu do Caos,
junto com Géia (Terra) e Tártaro (lugar mais profundo da terra,
localizado abaixo do reino de Hades (Inferno). Uma variante da versão
de Hesíodo apresenta Caos e Nix (Noite) na origem do mundo. Nix
põe um ovo, do qual nasce Eros. Com o tempo, surgem várias genealo-
gias sobre o deus do Amor. Segundo Diotima, em O Banquete de Platão,
Eros foi concebido da união de Póros (Expediente) e de Penía
(Pobreza), no Jardim dos Deuses, depois de um banquete, em que se
comemorava o nascimento de Afrodite. Uma das genealogias mais
difundidas apresenta Eros como filho de Ártemis (Diana), a deusa da
natureza, a senhoras dos animais, e de Hermes (Mercúrio), protetor
dos viajantes, deus das estradas, cuja principal característica é a astúcia.
Nesta genealogia, Eros é descrito como um menino louro, que jamais
cresce e com asas. É considerado um deus muito perigoso. Sob a
máscara de um menino inocente e travesso, trespassa com suas flechas
envenenadas de amor o fígado e o coração dos deuses e dos homens,
tirando-lhes o juízo.
Debalde: em vão, inutilmente.
Deidade: divindade, nume, deus ou deusa. Sentido Figurado: pessoa ou
coisa que se admira e venera, mulher formosíssima.
Desbaratar: arruinar, destruir, destroçar.
Descorçoar: descoroçoar, tirar o ânimo ou a coragem a, perder a
coragem; desanimar.
Desdouro: derivado de desdourar (desdoirar), fazer perder o brilho,
tirar a douradura.
Diagargante: talhadas de açúcar em ponto.
Domínico: relativo à dominicano, pertencente ou relativo à Ordem de
S. Domingos.
Elias: profeta que, segundo o relato do Velho Testamento, em “O
Segundo Livro dos Reis”, capítulo 2, foi arrebatado por Deus aos céus,
num carro de fogo, com cavalos de fogo.
Elmo: capacete de guerra com proteção para os olhos.
Embuçado: coberto, dissimulado, disfarçado.
Empavesar: enfeitar-se, adornar-se, ataviar-se, pavonear-se.
Empavesado: ornado, enfeitado.
Empola: bolha.
Emulação: sentimento que nos incita a igualar ou superar outrem,
competição, rivalidade, concorrência, estímulo.
Enágua: variante de anágua, saia usada sob o vestido, de feitios e
materiais diversos, curta ou longa, estreita ou larga, saia de baixo.
Enardecer: inflamar-se, arder.
Enchouriçado: variante de enchoiriçado, enfatuado, inchado.
Engaço: ramificação dos cachos de uva, haste do fruto.
Enleio: ato ou efeito de enlear(-se). Confusão, perplexidade. Embaraço.
Encanto, deleite, êxtase.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
O Barroco na Poesia
AZEVEDO FILHO, Leodegário A. de. A técnica do verso em
português. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1971.
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Antologia
BRANDÃO, Tomás Pinto. Pinto renascido empenado e
desempenado. Lisboa: Oficina de Pedro Ferreira, 1753 (a primeira
edição é de 732).
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Glossário
BÍBLIA SAGRADA. O velho e o novo testamento. Ed. revista e
corrigida pelo padre João Ferreira D’Almeida. Rio de Janeiro:
Sociedade Bíblicas Unidas, /s.d./.
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