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Início da Jornada

Mountain Tim e o maldito Buffalo Black


★★★
Em meados de 1981, com meus 16 anos fiz uma
das maiores loucuras da minha vida, a loucura
na qual
eu tenho um enorme orgulho toda vez ao pensar
que a cometi. Embarquei numa das missões
mais
desafiadoras da minha mísera vida, onde eu
iniciei totalmente por vontade própria. Tive o
prazer de sentir
o tão revigorante sentimento ardente e
arrepiante.
A adrenalina percorreu por todo o meu corpo
quando pisei no penúltimo degrau da escadaria
da cadeia e
então disse ao Xerife que ficasse tranquilo pois
eu traria as cabeças dos 7 bandidos que estavam
com os
rostos no quadro de procurados. Os moradores
de todo o vilarejo se reuniram quando me
escutaram soltar

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tamanha barbaridade um tanto audaciosa. Eu
senti que poderia fazer isso, poderia proteger os
meus.
O Xerife aceitou sem nem pensar muito, de
certa forma ele parecia bem interessado em ver
o que um
garoto de 16 anos era capaz de fazer diante a
essa várzea com 7 animais atormentando as
terras do Texas,
ou ele só não estava tão convencido de que esse
loirinho caipira conseguiria fazer algo
grandioso assim, e
enfim, aceitou apenas para me ver caminhar
lentamente até a minha morte. Eu estava
decidido de que
conseguiria fazer esse feito, e como recompensa
o Xerife me pagaria em dobro pela minha
audácia.
Vejamos, era uma recompensa extremamente
gorda, o que me fez querer mais ainda, o brilho
do ouro

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realmente me fascina. Eu tinha um prazo de 1
ano, parecia muito frugal, mas para caçar 7
homens que eu
nem sequer fazia ideia de onde estavam, seria
uma aventura um tanto complicada para mim.
★★★
Na tarde daquele mesmo dia, voltei para casa,
Willy estava deitado em sua cama, fumando um
charuto
enquanto lia um livro de bolso, história de
caçadores do velho oeste que era nomeada de
Jornada para o
Inferno.
Puxei o banquinho de ferro que ficava próximo
a cama e me sentei. Willy abaixou o livro e me
encarou
com um sorriso, se ajeitou na cama e se sentou
à minha frente.
—Você já sabe por onde começar?— Willy me
indagou, por alguns segundos eu fiquei em um
silêncio

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pensativo, algo me fez pensar que talvez esses
mesmos bandidos fossem os que mataram a
esposa de
Will.
—Ainda não, eu preciso pensar em como farei
isso— Willy continuou me encarando e ergueu
uma das
sobrancelhas, ele se levantou e caminhou até
sua cômoda que ficava do outro lado do quarto,
inclinou um
pouco e começou a revirar uma das gavetas.
Tampouco retirou delas uma caixa estreita, não
muito larga, aparentava ter no máximo 50
centímetros,
feita de uma madeira com um pigmento
extremamente forte, um marrom cegante
envernizado, haviam
detalhes cravados na madeira, desenhados em
ritmos como os das ondas, também carregava
uma trava de
1

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ouro com um cadeado. Em sua outra mão ele
me apresentava uma chave que aparentava
também ser de
ouro.
Willy se aproximou novamente, se sentando na
cama, colocando a caixa em seu colo, e então
olhou nos
fundos dos meus olhos e disse:
— Tim, preste bastante atenção no que eu vou
te dizer agora; exatamente há 8 anos atrás, no
outono, eu
estava no Saloon, acompanhado de alguém
naquele dia, uma pessoa que eu daria minha
vida para vê-la
novamente, a mulher da minha vida. Nós
estávamos aproveitando aquele dia como
qualquer outro. Ela
estava linda, apoiada na bancada enquanto
fumava um cigarro de palha e cantarolava a
música que tocava
na jukeBox, eu apenas admirava a bela dama e
aproveitava o momento, o momento que se eu
soubesse na

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hora o que iria acontecer mais tarde eu teria
desejado nunca ter acabado. Pouco foi a minha
felicidade e
meu lacônico momento foi interrompido por um
estalar da porta contra a borda da parede, eu
estava
completamente assustado Tim, quando eu vi
aqueles 7 homens trajados totalmente de vestes
pretas, era o
Buffalo Black e os seus capangas, um dos
maiores nomes do contrabando e tráfico de
humano do Texas.
Um dos capangas dele agarrou minha dama e
enfiou o cano do rifle em sua boca, eu entrei em
desespero
ao ver aquela cena. Buffalo queria que eu
passasse todos os meus bens, eu sabia muito
bem de quais bens
ele estava falando, infelizmente meu posto
como forjador de armas chegaram aos ouvidos
desses

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monstros e eles queriam se aproveitar disso. No
instante eu puxei o coldre que sempre deixo
preso a
bainha da calça para momentos como esse. Por
eu estar atrás do balcão foi impossível eles
terem
percebido, quando ameacei atirar no Buffalo, o
capanga que estava com minha amada apertou o
gatilho,
foi tudo tão rápido que eu mal tive tempo para
reagir. Após o disparo escutei o barulho dos
guardas do
Xerife, os bandidos foram embora rapidamente
deixando minha Thereza morta no chão do
Saloon. Por
muito tempo eu guardei um enorme ódio e
rancor no meu coração por esse acontecimento,
e durante esse
meu período de luto forjei dois Colts, que eu
jurei no fundo de minha alma que estouraria a
cabeça do

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Buffalo Black com eles, mas…vejamos, eu
estou velho demais para isso, e eu aprendi a
suportar essa dor,
mas nunca consegui me livrar dela, eu diria que
é impossível. Agora surgiu essa nova
oportunidade de
mandar esses monstros de volta para o inferno,
e quem fará isso por mim, será você.—
Após Will me dizer tudo isso ele ergueu a caixa
com a chave em cima para mim, me entregando
como
se no lugar dela estivesse seu coração, ele
estava apostando todas as suas esperanças em
mim e eu com
certeza não queria decepcioná-lo. Eu segurei a
caixa com uma expressão emocionada, encarei
ela com
toda a admiração e em seguida olhei para o Will
com o olhar baixo, ele me encarou de volta com
as
sobrancelhas inclinadas e um sorriso meigo.

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—Vamos, abra— Eu olhei a caixa novamente e
encaixei a chave no cadeado, quando ouvi o
barulho da
tranca levantei a tampa da caixa devagar e logo
fui completamente cegado pelo reflexo e brilho
de dois
colts, estavam um com o cano de frente para o
outro, a coronha completamente feita de prata
com
detalhes desenhados à mão por todo o material,
havia também incrustados pedras e jóias de
rubi, o cano
de um tom metálico negro que tinha uma
harmonia com o encaixe feito de madeira,
contrastava
juntamente com a coronha de prata. Willy me
olhou com um certo apreço, parecia estar
emocionado.
—As pedras de jóias que estão incrustadas
nestes colts eram do colar da minha Thereza,
são lindas, não

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é?— Olhei para ele surpreso e bastante
admirado, apenas assenti com a cabeça. Na
tampa havia 5 pentes
de balas de prata reluzentes, retirei o colt da
caixa e o encarei encantado.
—Essa é a chave que vai abrir a porta do
inferno para o vagabundo do Buffalo— Willy
me disse e deu
um tapa no meu ombro bastante animado, eu
apenas concordei com ele ainda admirado.
Logo quando coloquei o colt em sua caixa
novamente Willy se levantou e pegou um mapa
que estava na
gaveta também, aproximou-se e apontou em um
certo local.
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—Aqui, Leste do Texas, esses vagabundos tem
uma base neste local, por ser uma das áreas
mais desertas
do Texas eles resolveram se estabelecer lá, é
bem afastada e consequentemente sempre tem
alguns

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bandidos rondando por lá— Willy deu uma
tragada no charuto e me encarou com uma
expressão cansada,
totalmente diferente da que estrelava seu rosto
há alguns segundos atrás, fiquei um pouco
surpreso por ele
ter essas informações, mas é algo que eu não
duvido que alguém como ele não possa ter.
—Sabe, talvez você não acredite em mim, mas
eu não acho que o Buffalo seja apenas um
homem,
aqueles lixos de bandidos protegem ele até
demais, talvez eu só esteja alucinando por todos
esses anos—
Ele fechou os olhos, negando com a cabeça,
tirou o charuto dos lábios e o segurou entre os
dedos, soltou
um suspiro e apoiou a mão em sua testa.
—Tim, minutos antes do Buffalo deixar o
saloon após matar minha querida, eu o encarei
no fundo dos

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seus olhos, e em uma troca de olhares eu senti
uma aura ameaçadora, uma vontade enorme de
gritar e
chorar, ou até mesmo sair correndo de
desespero, você precisa estar bem preparado—
★★★
Nessa mesma noite, quando me deitei na cama,
fiquei encarando o teto atentamente, pensando
sobre o
que Willy havia me dito sobre Buffalo. Queria
entender o que ele quis dizer quando citou que
Buffalo não
poderia ser apenas um homem, eu não sou de
acreditar em coisas desse tipo, eu só acho que
ele é um
homem que carrega uma carga muito negativa,
tão negativa que é capaz de sentir ela quando se
está
próximo dele.
Eu me virei na cama de um lado para o outro
durante toda a madrugada, estava ansioso e mal
conseguia

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dormir, essa situação preenchia minha cabeça e
eu sentia que enquanto eu não resolvesse ela eu
não teria
uma boa noite de sono.
No amanhecer dia seguinte eu acordei, ainda
um pouco baqueado pela noite mal dormida,
estava
pensativo e um pouco preocupado, mas me
sentia determinado, será que isso realmente é
uma
preocupação que um garoto de 16 anos deveria
ter? Na verdade, eu não me importo, nunca me
importei.
Eu me sentei na cama e puxei a cortina azul
clara de seda fina que cobria a janela ao lado da
minha
cama, encarei o céu atento, ainda estava escuro,
mas no horizonte já apresentava a chegada do
grandioso
sol, fiquei por um lacônico momento admirando
o lado de fora.

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Logo me levantei e caminhei até a cozinha,
Willy estava sentado na mesa, lendo um jornal
enquanto
tomava um café, a cozinha estava
completamente aromatizada com o cheiro do
seu delicioso café, em
cima da mesa estava um prato com panquecas,
bacon e ovos, e um copo do café acompanhado,
era com
certeza minha refeição preferida. Willy assim
que me viu, me deu um bom dia acompanhado
de um
sorriso e pediu para eu me sentar, estava
faminto e aproveitei cada segundo desse café da
manhã.
—Dormiu bem, Tim?, Você precisa estar bem
descansado—
—O Suficiente Will, de qualquer forma só irei
ter uma boa noite de sono quando terminar isso

—Entendo… ainda não acredito que terei de me
despedir de você—

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—Eu irei voltar Willy, lembre-se disso, nada é
impossível para mim! Não precisa se preocupar
— Disse
isso firmemente, batendo no peito, mas a
verdade era que eu mal sabia se iria voltar vivo,
não queria que
Will ficasse preocupado, pelo contrário, queria
que ele confiasse em mim o suficiente para
acreditar que
isso não iria me derrubar, talvez acabe causando
uma queda drástica na saúde mental dele caso
eu não
sobreviva, mas não quero que ele fique
agoniado durante a minha jornada.
—Willy, cuide bem da Lucy, eu sei que você é
excelente quando se trata de cuidar, mas você
sabe…eu
vou estar distante dela—
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—Claro meu filho, não precisa se preocupar, eu
já estava ciente disso, ela vai ficar bem— Ele
deu

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algumas batidinhas em meu ombro e me olhou
com um sorriso preocupado.
★★★
Durante a tarde do mesmo dia eu me encontrava
bastante ansioso, meu estômago se revirava em
uma
várzea agonia sufocante, com certeza isso iria
se passar com o tempo assim que eu iniciasse a
viagem.
Eu estava preparando minha bolsa com tudo o
que eu precisaria, por um breve momento me
encontrei
encarando o colt dentro da caixa, não estava
pensando em absolutamente nada, minha mente
estava vazia.
Eu encarava o colt, mas olhava além, um além
de tudo aqui, perdido no branco da minha
mente. Logo me
assustei com algumas batidas leves na porta,
virei rapidamente em um movimento reflexivo,
surpreso, era

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Lucybell, estava apoiada na porta me
encarando, um pouco assustada por minha
reação, quando notei que
era ela, meu coração que estava disparado se
acalmou instantaneamente, dei um sorriso
preocupado de
sobrancelhas inclinadas.
— Oi querida, tudo bem?— Lucy apenas
assentiu com a cabeça e se aproximou de mim,
a loura agarrou
o meu braço o envolvendo em um amplexo
sufocante, evitando olhar em meu rosto com os
olhos baixo.
—Tim, o pai Willy me disse que você vai ficar
um tempão fora, é verdade? Para onde você
vai? Ele não
quis me falar…— Eu fiquei em silêncio por um
tempo, não queria dizer, não queria deixar Lucy
preocupada, mas não conseguiria mentir para
ela, sentiria um peso enorme em minha
consciência. Me

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sentei na cama, Lucy estava de pé em minha
frente, preocupada, segurei em suas mãos e
olhei bem para
seus olhos, nos encontramos em uma troca de
olhares.
—Lucy, eu preciso fazer uma viagem a
trabalho, eu prometo que vou voltar o mais
rápido que eu puder,
você confia em mim, não é?—
—Sim!, eu confio em você Tim! Eu apenas
achei que você estava indo embora de vez…
você não vai me
abandonar, não é?—
—Nunca! Nem pense nessas coisas cachinhos!
— Eu fiz algumas cosquinhas na cintura dela a
fim de
amenizar o clima, ela se contorceu em risadas e
me abraçou em seguida.
—Fica bem, Tim!— Lucy deu um beijo em
minha bochecha e se afastou, se retirando
rapidamente da
sala saltitante, dando alguns pulinhos.

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Evitei ficar pensando muito, por vezes me
achava louco por estar fazendo algo assim.
Peguei os colts e os encaixei no enorme
cinturão de prata, bordado com algumas pedras
de esmeralda e
rubi. Dobrei o mapa e o guardei no bolso da
minha jaqueta. Peguei minha bolsa cheia e
pesada, coloquei
nas costas e fui para o estábulo atrás do Saloon.
Ao chegar lá, Willy estava com Bigmouth,
acariciando a sua crina enquanto se alimentava,
ele já estava
com a cela posta e preparado.
—Adiantei as coisas para você, filho, tem
certeza que já está pronto?—
—A certeza eu vou ter quando eu estiver no
meio do caminho, estou evitando ficar
pensando muito
sobre—
—Entendo, você está certo…, aliás, combinou
com você — Willy disse enquanto encarava os
colts

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presos em meu cinturão. Ele estava com uma
expressão bastante orgulhosa, eu apenas o olhei
desentendido por alguns segundos, mas
agradeci quando notei sobre o que ele falava.
Eu estava meio
perdido da realidade por não ter tido uma noite
de sono agradável.
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Ainda estava bastante pensativo, mas me
encontrava bem ansioso e animado para essa
jornada. Amarrei
a bolsa no cavalo e respirei fundo, estava tudo
preparado, subi em cima do Big e olhei para
Willy com um
sorriso confiante.
—Me deseje sorte, pai— Ele afirmou com a
cabeça e fez um gesto com a mão, algo entre
nós, que
fazíamos apenas em ocasiões especiais.
Me despedi dele e dei partida no cavalo,
cavalgando em direção a cidade. As pessoas
que estavam nas

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ruas encaravam, algumas paravam de fazer o
que faziam apenas para ver o jovem
embarcando na sua
grande jornada, alguns não tinham tantas
esperanças e outros o olhavam com admiração e
apreço.
5
Estrada de Terra
O Estranho de Santa Anna
A amante dos foras-da-lei já batia na porta,
eram exatamente: 20:46 da noite, eu estava nas
longas e
desertas estradas de terra do Texas, as estradas
nas quais nunca parecem ter fim, apenas poeira
e mais
poeira, enormes postes com fios que assim
como as estradas, não pareciam ter fim, o único
som que eu
escutava durante essa viagem quase infinita era
o trotar de Bigmouth e a trilha de My Way que
tocava em

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meu radinho velho e enferrujado. Pelo incrível
que pareça eu não estava cansado, pelo
contrário, estava
eufórico e animado, toda aquela ansiedade e
preocupação que ocupavam minha cabeça antes
de haviam
desaparecido completamente junto a poeira da
estrada terrosa.
Nós viajamos a madrugada inteira na estrada,
apreciando as milhares estrelas que dançavam
no céu, um
sentimento de calmaria era claro, possível até
de se escutar os uivos dos coiotes, o gritar das
aves
noturnas, o vento que nos acompanhava pelo
caminho, o sereno que vinha para refrescar
nossas cabeças,
cavalgamos até o amanhecer.
Quando se aproximava das 9h da manhã eu
avistei uma cidade, aparentava ser pequena,
menor que San

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Angelo. Conforme fui me aproximando mais
com Bigmouth me deparei com uma enorme
placa na
entrada, que dizia: "Bem Vindo a Cidade de
Santa Anna".
Eu diminuí a intensidade do cavalgar de
Bigmouth, estava notando que meu cavalo
estava cansado da
longa viagem e decidi que seria melhor parar no
momento e descansarmos.
Desci do cavalo e caminhei pela cidade por um
tempo, puxando Big pela corda enquanto
procurava
algum hotel para descansar. Enquanto
andávamos, parei por um momento para
analisar o mapa, eu diria
que para chegar na base do Buffalo eu
demoraria mais uns 3 meses, seria uma viagem
bastante longa e
cansativa, mas tudo valeria a pena no final.
Parei em frente a um Saloon que estava
hospedando forasteiros, havia nele também um
estábulo onde

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eu poderia deixar Bigmouth descansando. Fui
me aproximando da entrada, havia um caipira
escorado na
porteira, estava lendo um jornal e fumando um
cigarro de palha.
—Bom dia senhor, gostaria de deixar meu
cavalo por aqui— disse isso já tirando duas
pratas do bolso e
jogando para o homem.
—Muito bom dia Senhô! Seja muito bem vindo,
forasteiro, num é? Fique à vontade!— Ele dizia
enquanto segurava o cigarro no canto da boca e
abria a porteira para eu passar com Big.
—Eu sou de San Angelo, fica bem próximo
daqui— O homem caminhava na frente, me
guiando para
um estábulo, ele me encarava de lado enquanto
caminhava e tragava o cigarro.
—Humm, entendo, ocê é caçador? Notei que
carrega um colt de caçador, está trabalhando?
Senhorito é

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muito jovem pra isso garoto!— Eu fiquei em
silêncio por um tempo, paramos em frente a um
estábulo e
encarei o moço.
—Sim, estou no meio de uma caça— Eu dei um
sorriso de canto para ele enquanto prendia
Bigmouth no
estábulo, dei um beijo próximo a sua crina.
Assim que me retirei do estábulo joguei mais
uma moeda para
o caipira
—Cuide bem dele, voltarei pela noite!—
★★★
6
Empurrei devagar a porta do Saloon, eu
precisava comer e reservar um local para
descansar. Na verdade
eu não queria perder nenhum minuto da minha
jornada, mas eu estava ciente de que teria que
abrir
exceções.

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Adentrei o Saloon e me deparei com alguns
rapazes de cabeça baixa sobre a mesa com
várias bebidas
em volta, alguns homens tomando seu café e
outros jogando um bom truco, algumas moças
conversando
próximas a jukeBox, estava bem cedo mas o
local já estava consideravelmente agitado. Fui
me
aproximando do balcão, um homem estava atrás
dele bebendo um bom grado de whiskey e
assistindo a
TV, dei algumas batidinhas no balcão para
chamar a atenção dele, se virou para mim
deixando o copo no
balcão.
—Bom dia Jovem forasteiro, o que deseja?—
Ele abaixou um pouco os óculos para me
analisar melhor,
apoiando o antebraço no balcão.
—Bom dia senhor, eu gostaria de algo para
comer, e uma chave para um quarto, de solteiro,
por favor—

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Disse para ele e caminhei com os olhos sobre a
grande estante de bebidas atrás do balcão,
minha atenção
logo foi tomada por uma reportagem que
passava na tv, sobre o desaparecimento de
pessoas no leste do
Texas, apoiei meu corpo no balcão enquanto
assistia.
—De onde o Jovem é?— O homem perguntou
enquanto preparava meu pedido, sem tirar a
atenção do
que estava fazendo.
—Eu sou de San Angelo—
—Oh, e o que faz tão longe de sua cidade?—
—Estou no meio de uma caçada—
—Ah, não me diga, você é o garoto que vai
capturar o grupo do Buffalo Black?—
—Já chegou aqui?— Eu perguntei bastante
surpreso
—Cidades pequenas meu jovem, informações
chegam mais rápido, você é o novo assunto do
momento,

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o jovem de 16 anos que está caçando Buffalo
Black— Ele me encara de cima a baixo, e dá
um sorriso de
canto.
—Realmente você não está para brincadeira,
esses colts devem fazer um belo estrago— O
homemem se
aproxima de mim e apoia o corpo no balcão,
olha para a tv e depois para mim.
—Olha, eu sei que tem muita gente que não
acredita no seu potencial, mas eu sei que você é
capaz, em
20 anos ninguém nunca levantou a bunda para
fazer algo contra esses vagabundos, nem
mesmo a galera
do Xerife foi capaz de algo, e agora aparece
você, muita gente duvida por conta da sua
idade, mas
deveriam confiar e apostar nossas esperanças
nesse tipo de coisa, não é sempre que acontece

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—A recompensa por eles deve ser muito boa,
não é?— O homem dizia enquanto colocava o
prato com
bacon e ovos em minha frente.
—Bastante, aliás, obrigado cavalheiro—
—É de se imaginar, parece que está rondando
alguns rumores de que você não é o único atrás
desses
vagabundos — Eu fiquei curioso ao escutar
isso, sabe, eu realmente achei que eu fosse o
único maluco.
—hmm, sério? Você sabe quem é?— O homem
ficou pensativo por alguns segundos e negou
com a
cabeça.
—Ainda não, aproveite seu café, jovem, vou
pegar as chaves do quarto para você— Afirmei
com a
cabeça e continuei comendo, realmente esse
fato de ter mais alguém caçando o Buffalo me
deixou

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bastante intrigado, será que é pelo mesmo
objetivo que eu? Milhares de questionamentos
curiosos sobre
esse assunto se criaram em minha cabeça, é
bem capaz de em algum momento eu descobrir,
por enquanto,
vou focar na minha causa.
7
Enquanto eu comia e assistia a TV um homem
entrou no Saloon, ele estava trajado de vestes
longas que
cobriam quase seu corpo inteiro, tinha uma aura
e energia bastante peculiar.
Ele caminhou em direção ao balcão e se sentou
ao meu lado, esperando o dono do Saloon
retornar,
evitei muitos olhares e apenas continuei
comendo, era perceptível que ele estava
armado, provavelmente
era algum caçador, dava um pouco de medo a
sua presença, mas nada que pudesse ser
tolerável. O dono
retornou e jogou as chaves para mim

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—Aí está garoto, qualquer problema pode me
chamar—
Eu afirmei com a cabeça, terminei de comer e
fui em direção ao corredor dos quartos para
descansar, a
chave tinha um pedaço pequeno de madeira
preso a ela, como um chaveiro, e nele estava
gravado o
número 6, procurei pelo quarto condizente e
abri a porta. A primeira vista subiu uma enorme
fumaça de
poeira em mim, mas era normal, afinal, estamos
praticamente no meio de um deserto, isso com
certeza
não me incomodaria, eu realmente estava
exausto, logo não pensei e me joguei na cama,
imediatamente
caí no sono.
★★★
Quando a noite caiu, eu me levantei da velha
cama de palha, um bocado empoeira, ainda
estava um

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pouco baqueado, tive um sono pesado, estava
tão cansado que nem sequer sonhei, o dia para
noite havia
literalmente se passado em um piscar de olhos
para mim. Olhei para a janela e o céu estava tão
escuro,
escuro como uma jabuticaba, estava agraciado
com apenas algumas estrelas, olhei em seguida
para o
relógio de ponteiro que ficava na parede, quase
dando seus últimos relances; os ponteiros
estavam
marcando exatamente às 22:36 da noite, logo
para não perder tempo, ajeitei as coisas e me
retirei do
quarto.
Estava caminhando pensativo pelo corredor,
sem prestar muita atenção, apenas escutando
uma várzea
de vozes próximas, meu cérebro ainda estava
ligando aos poucos e sem perceber eu me
choquei contra

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algo muito grande, imediatamente assustei com
o impacto e dei um pulo para trás, pedindo
desculpa para
o quer que seja que eu houvesse trombado.
Quando menos esperei, era o homem estranho
que eu havia
visto mais cedo, ele estava de costas
conversando com o dono do Saloon.
—Veja só, nosso herói já está indo?— O dono
do Saloon dizia em um tom bem animado
—Apenas estou de passagem senhor, aliás, me
desculpe— Encarei o homem estranho por
alguns
segundos.
Ele parecia ser um pouco mais velho que eu, era
extremamente alto. Não disse nada, apenas me
encarou
em silêncio. Em seguida eu entreguei as chaves
para o senhor e me retirei do Saloon. Caminhei
ainda um
pouco pensativo e vagante em direção ao
estábulo, o caipira estava cochilando na entrada
então me hesitei

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em acordá-lo e fui buscar o Bigmouth por conta
própria.
Eu estava me preparando para dar continuidade
a minha jornada, enquanto saía do estábulo com
Bigmouth, analisava mais uma vez o mapa.
Caminhamos por aquela deserta e serena
estrada no estrelar
da quase madrugada, trazendo meu cavalo com
a corda, íamos em direção a saída da cidade que
ficava
próxima à porteira do saloon. Inusitadamente,
acabei notando o homem misterioso que estava
parado na
entrada do estabelecimento, anotando algumas
coisas em uma espécie de caderno. Eu iria
passar por ele
naquele exato momento, então não hesitei em
tentar conversar, talvez o tal fosse realmente
algum caçador,
como deduzi mais cedo, e consequentemente, se
fosse de bom grado, eu poderia ganhar algumas
informações.
8

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Subi em cima de Bigmouth e fui cavalguei em
passos lentos próximo a ele, parei em frente ao
homem,
não parecia se importar muito com a minha
presença, estava focado.
—Boa noite, o jovem está de passagem
também?— Ele ficou em silêncio por um
tempo, não me
preocupei em continuar insistindo.
—Queria aproveitar para me desculpar melhor
por agora a pouco, acabei trombando com você
no
corredor, eu havia acabado de acordar, estava
sonolento ainda, não prestei muita atenção.—
Ele continuou escrevendo em seu caderno,
achei que eu estava fazendo algum papel de
bobo ali, mas
isso só me deixava ainda mais curioso. Quando
eu menos esperei havia cessado sua escrita no
caderno
que tanto assim como ele, me intrigava
também. Guardando o caderno, ele olhou para
mim por um tempo.

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O intrigante tinha um olhar alfinetado, que
parecia julgar e me condenar a mais sofrida
pena de morte, por
crimes que se ele me acusasse, eu não saberia
me defender.
—Não me perturbe, garoto— Disse apenas essa
frase e acendeu um cigarro. Estava um pouco
espantado,
mas ainda sim bastante curioso, será esse
homem que está a procura do Buffalo também?
—Você é um caçador? Está atrás do Buffalo
Black?—
—O que você sabe sobre Buffalo Black?—
—Eu estou caçando ele— Naquele instante,
senti que havia o fisgado, tocando em realmente
onde eu
deveria ter tocado desde o início.
—Então você é o idiota que está atrás dele, se
eu fosse você eu ficava bem longe disso,
menino—
—Bom, eu não vejo motivos para ficar longe,
ninguém se dá o trabalho de fazer algo diante a
essa

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situação—
—Você não sabe com o que está mexendo, se
eu fosse você eu voltava para casa e deixava
isso quieto—
—Agradeço pelo aviso, mas já estou ciente dos
perigos, prefiro continuar—
—Você com certeza não está— Ele dá uma
risada e joga o cigarro no meio fio.
—Faça o que quiser então— Enfiou as mãos no
bolso e virou de costas para mim.
Eu preferi não esquentar a cabeça, mesmo que
esse sujeito tenha despertado minha
curiosidade, eu
tenho outras prioridades para me preocupar no
momento.
Fechei os olhos e balancei a cabeça, tentando
deturpar em minha mente o que havia acabado
de
acontecer, soltei um suspiro e ajeitei a guia de
Bigmouth. Quando me preparei para dar início
a jornada

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novamente fui interrompido por um assobio,
olhei para trás rapidamente e era a figura com
quem havia
trocado algumas alfinetadas.
—Garoto, você sabe onde Buffalo está
escondido?—
—Talvez sim, Talvez não, então é você que está
atrás dele mesmo??—
—Não foi isso que eu perguntei, você sabe ou
não?—
—Para você, não sei—
O homem se aproximou mais. As dúvidas que
eu tinha sobre o outro caçador interessado em
Buffalo,
haviam naquele instante, se desaparecido em
meio a poeira do deserto. Ele segurou na cela de
Bigmouth e
subiu em cima do cavalo sem se importar e se
sentou de costas para mim. Tal ação audaciosa
me deixou
bastante surpreso.
—Ei, o que é isso??—

38
—Me leve até o local que eu posso te
recompensar por isso depois—
—Aha! — Eu levantei uma das sobrancelhas
convencido, olhei para ele pelo canto dos olhos.
—Por que você está atrás do Buffalo?—
Perguntei enquanto dava partida no cavalo,
dando algumas
cavalgadas tranquilas no momento.
—Nada que você precise saber garoto, eu tenho
coisas a tratar com ele—
9
—Problemas pessoais?—
Ele continuou em silêncio, o cavalo aumentou
um pouco mais o ritmo das cavalgadas, a noite
com o céu
limpo, o ar frio e o sereno, nunca esteve tão
perfeito para viajar durante longas horas pela
estrada, e tudo
estava apenas se iniciando.
—Como você se chama?— Perguntei a fim de
tentar quebrar o silêncio, mesmo que ele não
aparentava
ser um cara que conversava muito.

39
—Não acho que tenha necessidade de você
saber o meu nome—
—Mas que cara difícil você, hein! eu me chamo
Timothy, mas se preferir, Tim é mais prático—
Ele
ficou em silêncio por um tempo.
—Baltazar—
—Prazer, Senhor Baltazar!—
—Não me chame de senhor, garoto—
Não havia dito muitas palavras desde que
resolveu embarcar junto a mim, parecia estar
focado em seu
objetivo. Eu me pergunto o por que ele está
nessa, tenho total certeza agora de que não é
pelo mesmo
motivo que eu.
Nós estávamos na estrada a aproximadamente 2
horas, eu ainda estava tranquilo, sem muita
pressa, não
queria cansar o Bigmouth tão cedo. Baltazar
estava hiper atento ao redor, parecia que estava
olhando

40
profundamente cada pedaço, canto, vestígio e
poeira daquela estrada, fiquei um pouco
intrigado, mas
apenas me concentrei no caminho.
★★★
Estávamos nos aproximando de Comanche,
ainda faltava bastante chão pela frente mas já
havíamos
determinado um certo rumo, diferente de toda a
parte do velho Texas, a estrada de Comanche
tem uma
presença enorme de vegetação é uma grande
área florestal, chega a ser até interessante, pois
grande parte
do Texas é um enorme deserto terroso.
Já era por volta das 4 da manhã, e pelo incrível
que pareça eu ainda estava tranquilo, aguentaria
umas 2
noites talvez, sem exageros. A estrada ficava à
beira de um campo, com algumas árvores, havia
alguns

41
moradores ali, ainda poucos mas tinham. Um
pouco mais afastado havia uma parte mais
florestal e no
exato momento em que estávamos passando por
ela escutamos um barulho estrondoso,
identificável no
momento, mas ouvimos uivos consecutivos,
gritos desesperados e logo em seguida sons de
chamas, eu
fiquei completamente assustado e sem saber o
que fazer, Baltazar desceu do cavalo
rapidamente.
—Você ouviu isso?!—
—Ouvi gritos, uivos e sons de chamas—
Ele se agitou assim que reforcei a situação que
havia acabado de acontecer, não hesitou em ir
atrás e ver
o que estava acontecendo. Eu não entendi muito
bem, mas deixei Bigmouth a beira da estrada e
fui atrás
dele.

42
Baltazar corria sobre os matos e pulava sobre os
obstáculos como se aquilo para ele fosse nada,
eu
demorei um pouco para me acostumar com o
terreno, quase caí diversas vezes. Eu confesso
que estava
com medo mas estava bastante curioso também,
sem contar que ouvimos uivos e gritos então
provavelmente há pessoas em perigo.
Quando chegamos no local, havia uma cabana
de madeira pegando fogo, ficamos naquela cena
caótica
tentando entender, Baltazar parecia saber o que
fazia, parecia ter algum tipo de experiência e eu
observava
10
toda aquela situação com as mãos na cabeça.
Ouvimos gritos novamente, pareciam gritos de
criança e
viam de trás da casa, eu procurei alguma forma
de chegar lá, pois estava tudo tomado pelas
chamas.

43
Havia uma tábua se chocando com uma árvore,
ela estava barrando uma possível passagem para
os
fundos da casa, mas era impossível passar pois
estava tomada por chamas, relatei para Baltazar
e logo me
espantei ao ver ele quebrando a tábua
flamejante com o braço e abrindo o caminho,
naquele momento eu
pensei o quão louco ele era, mas havia sido
extremamente incrível. Ele tomou a frente e eu
fui logo atrás.
Chegamos nos fundos e vimos uma garotinha
que aparentava ter 10 anos, rapidamente corri
para
socorrer ela, estava tomada pelo desespero
enquanto chorava sem parar, Baltazar estava
limpando a
passagem, em um momento de ansiedade
agoniante, pedi rapidamente para que a garota
subisse em

44
minhas costas para sairmos o mais rápido de lá,
segurei ela firme, eu estava em uma completa
adrenalina
naquele momento, meu coração estava
disparado como nunca.
Quando vimos a beira da estrada que indicava a
saída da floresta, imediatamente subiu um
alívio
imenso e meu corpo começou a perder as
forças. Eu estava sufocado pela fumaça, éramos
incapazes de
apagarmos aquele fogo, mas pelo menos
conseguimos salvar a criança, talvez tivessem
outras pessoas no
local, dentro da cabana, mas provavelmente na
gravidade da situação, não valeria a pena tentar
procurar
por elas.
Baltazar estava tossindo bastante, batendo
diversas vezes no peito, tentando recuperar o
fôlego.

45
Coloquei a criança no chão e me abaixei
próximo a sua altura, olhava para o seu rosto
com uma expressão
de dó e desesperança, abracei a cabeça da
garotinha, trazendo ela para o meu peito,
tentando a acalmar,
estava desesperada e era totalmente
compreensível, a mente ingênua dela não era
capaz de processar
tamanho caos que acabou de acontecer.
Passei a mão em seus cabelos repetitivamente e
disse a ela que estava tudo bem, que ela estava
salva
agora, por sorte não estava com ferimentos
graves, apenas alguns arranhões, o que era de se
estranhar
bastante, pois a situação em que ela estava
quando a encontramos era impossível sair ileso,
devo
concordar que essa garota tem muita sorte.
Segurei na mão dela e caminhei próximo ao
Bigmouth.

46
—Querida, fique aqui, ok? está tudo bem,
respire um pouco e depois conte para o tio o
que aconteceu,
nós iremos ajudar você—
Olhei para a garotinha, bastante preocupado, ela
apenas concordou e limpou as lágrimas em seu
vestido
manchado de cinzas. Encarei o Baltazar e
perguntei se estava tudo bem, ele não me
respondeu de
imediato mas aparentemente ele também não
estava com ferimentos graves, apenas alguns
arranhões.
—A garota está bem?— Ele perguntou se
aproximando de mim, limpando o rosto com o
braço.
—Sim, está bem, vamos esperar ela se acalmar
um pouco e tentamos descobrir o que aconteceu
— Ele
não disse nada, apenas soltou um grunhido
enquanto caminhava em direção ao cavalo e a
garota.

47
De qualquer forma, nós precisávamos continuar
a jornada, estávamos bem próximos de
Comanche, e
estava beirando as 6 da manhã, resolvi revezar
o cavalo com Baltazar para que eu pudesse
tentar
conversar com a garota e também aproveitar
para descansar um pouco.
★★★
A garotinha estava sentada em minha frente,
tentava acalmá-la enquanto estávamos na
estrada, bastante
longe já de onde havia acontecido o desastre,
aproveitei para colocar em ação minha tentativa
de
conversar melhor com ela.
—Como você se chama, mocinha bonita?—
11
Ela ainda estava um pouco tímida, parecia que
estava processando tudo o que havia
acontecido, parecia

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que ela também estava bastante cansada e
sonolenta, isso era compreensível com o fato de
que sua noite
de sono infelizmente foi interrompida.
—Marina…— Ela soou baixo e tímida.
—Marina? Que nome lindo, eu me chamo
Timothy, e esse aqui atrás é o Baltazar, ainda
não descobri
que tipo de pessoa ele é, só sei que é bem
estranho, mas não vai te machucar, então não
precisa se
preocupar ou ficar com medo dele— Disse para
provocar ele e tentar quebrar um pouco o clima
tenso,
mas ele permaneceu calado como de costume.
—Marina, você estava com seus pais naquela
casa?—
Estava focado em tentar conseguir alguma
informação, nada direto pois, sei que não era o
momento
certo para um interrogatório, apenas queria
entender um pouco do que havia acontecido já
de início, mas

49
falhei miseravelmente ao notar que a garota
apenas ficou calada com o olhar baixo, eu
entendi a situação
então preferi cessar com as perguntas por
enquanto.
★★★
Estávamos nos aproximando ainda mais de
Comanche, beirando às 8 horas da manhã, o sol
estava no
seu melhor momento, radiante, tão forte que a
visão do distante se tornava turva e parecia que
se
contorcia, a poeira subia com o cavalgar de
Bigmouth e eu olhava para o céu apreciando as
gigantes
águias dando seus gritos e sobrevoando aquele
lindo mar de nuvens, era do tom mais lindo e
vibrante de
azul.
Após mais alguns metros de chão andado já era
possível notar uma enorme placa bem distante,

50
conforme fomos nos aproximando se tornava
mais nítido o que estava escrito: "Bem Vindo a
Comanche".
A garotinha estava deitada em meu peito,
parecia estar em um sono profundo, era
reconfortante ver ela
naquele estado tão tranquilo, mesmo que a
algumas horas atrás ela estava banhada em um
sentimento tão
desesperador quanto a morte.
Eu ainda estou confuso quanto a essa situação,
sobre o que aconteceu, quem é essa garota, e o
que
iremos fazer com ela, minha cabeça era
martelada por mil e uma perguntas que não
haviam nenhuma
resposta condizente. Assim que nos
estabelecermos em Comanche eu tentarei
conversar com ela
novamente.
12
Perigosa Comanche
Novas esperanças

51
Chegamos a famigerada cidade de Comanche,
diria que é uma das cidades mais antigas do
Velho Texas,
ela é bem pequena, com poucos moradores, mas
ainda sim o comércio é fortemente presente por
essas
bandas, por ser uma cidade pequena sempre tem
muitos forasteiros, peregrinos e viajantes por
aqui,
alguns só de passagem, outros apenas para
vender seu árduo trabalho ou outros apenas para
atazanar a
vida dos moradores e criar um completo caos,
típico de Comanche.
★★★
Desci do cavalo com Marina em meu colo,
coloquei-a no chão, ainda estava sonolenta mas
conseguia se
manter de pé. Querendo ou não, ela estava sob
minha responsabilidade no momento, eu não
me importava

52
com isso mas precisava ser mais cauteloso.
Baltazar ainda estava montado no cavalo,
parado observando,
caminhando seus olhos em cada canto e beco
daquele lugar.
Segurei firmemente na mão da garotinha e
Baltazar tomou a frente com o cavalo.
Caminhávamos pela cidade procurando por
algum local que pudéssemos descansar da longa
viagem.
Havia por ali uma lanchonete que alugava
quartos, paramos à frente do local e Baltazar me
disse algo sem
tirar os olhos do estabelecimento.
—Vá pegar um quarto, garoto, eu levo o cavalo
para o estábulo, precisamos manter essa garota
em
seguro, ainda não temos o que precisamos dela
— Eu olhei ele por um momento, receoso, mas
apenas
assenti com a cabeça.

53
Fui em direção à lanchonete trazendo a garota
comigo. Lanchonetes no Texas não eram muito
comuns,
apenas nas cidades mais desenvolvidas. Nas
cidades mais precárias haviam de grande
quantidade muitos
Saloons, O Santuário do Texas era um Saloon
muito conhecido por todo o Velho Oeste,
pessoas de outros
lugares viajavam infinitas e ardilosas estradas
de terra apenas para frequentarem o local,
diziam que
sempre acontece algo inédito lá, é um
verdadeiro campo de entretenimento, apesar de
que isso é meio
preocupante quando se trata de entretenimento
no Texas, os brinquedos mais famoso entre os
Texanos são
os rifles, Colt e espingardas.
Parei em frente ao balcão, caminhei com meus
olhos pelo local, havia algumas pessoas
tomando seus
cafés e assistindo à tv.

54
Dei algumas batidinhas para chamar atenção da
garçonete, uma moça muito bonita dos cabelos
caramelos
e olhos azuis, parecia ocupada e bastante
desajeitada, assustou-se um pouco quando
escutou as batidas
—Oh céus, Bom dia jovenzinho! Me desculpe,
as coisas estão bem agitadas por aqui hoje, o
que
deseja?—
—Bom dia, senhorita, eu gostaria de um quarto,
por favor, para três pessoas — A moça afirmou
com a
cabeça e fez um sinal com a mão, pedindo
alguns segundos, entrou em um corredor
próximo ao balcão e
não demorou muito para ela retornar com a
chave do quarto.
—Aqui senhor, é só seguir o corredor, quarto 8

13

55
Eu dei um sorriso e agradeci, peguei as chaves e
fui para o corredor junto da garotinha procurar
pelo
quarto, não demorou muito para acharmos, o
corredor não era tão longo, aparentava ser mais
organizado e
menos empoeirado que o quarto que fiquei em
Santa Anna.
Marina se sentou em cima da cama, aparentava
estar um pouco apreensiva, balançava os pés no
ar com o
olhar baixo, eu me sentei no chão em frente a
ela e encarei seu rostinho emaranhado.
— Marina, Como você está?—
Seria meio antipático da minha parte perguntar
se ela está bem, não acho que uma pessoa que
provavelmente acaba de perder os pais a casa e
não tem mais nenhum rumo na vida esteja bem.
— Você pode me contar o que aconteceu,
Marina?— Ela me olhou ainda um pouco
tristonha,
entrelaçava seus dedinhos, parecia estar ansiosa,
de um jeito terrível.

56
— Um homem…um homem mau e enorme,
atacou meu papai, ele levou tudo embora, ateou
fogo na
minha mamãe…ele levou meu irmãozinho —
As palavras de Marina soaram como uma
escopeta em meus ouvidos, que mal
suportavam, ameaçando
sangrar.
—Marina, você pode me falar melhor como era
o homem?—
—Todo preto..ele tinha uma barba enorme
preta, um chapéu gigante preto, ele me dava
medo, muito
medo— Ela disse com uma voz chorosa,
parecia que mal aguentava falar sobre isso.
—Tudo bem Marina, se acalme, vai ficar tudo
bem—
Eu fiquei bastante apreensivo naquele
momento, será o Buffalo Black que atacou a
família de Marina?
Essas informações só fizeram mais ainda da
minha mente uma completa confusão. Como eu
não pensei

57
que algo assim poderia acontecer, Buffalo
provavelmente sabe que há alguém atrás dele e
isso só o deixa
mais preparado ainda.
Eu andava de um lado para o outro no quarto, já
havia se passado algumas horas após a conversa
que
tive com Marina, estava tentando ligar os
pontos da situação, ela já havia adormecido
novamente,
enquanto eu me encontrava nessa situação onde
estava quase empalado por duas estacas em
meu
estômago escutei algumas batidas na porta e
uma voz familiar
—Ei garoto!Você está aí? Sou eu, Baltazar—
Eu me aproximei da porta e abri uma pequena
fresta antes de deixá-lo entrar, só para ter
certeza de que
era ele mesmo, parecia que eu estava sendo
caçado de tão apreensivo que me encontrava.

58
Baltazar entrou no quarto com a mesma
expressão séria de sempre, jogou algumas
coisas em cima da
mesa parou ao meu lado com os braços
cruzados e encarou a garota adormecida
—Você conseguiu?—
—Sim, consegui—
—E o que nós temos?—
—Ela disse que foi atacada, por um homem de
preto, Barba preta, chapéu preto, ela disse que
ele ateou
fogo na mãe dela, matou o pai e sequestrou o
irmão mais novo—
Eu dizia isso enquanto dava alguns passos
curtos pelo quarto
—O que acha?—
Parei atrás dele e perguntei, com um dos braços
cruzados e o rosto apoiado em uma das mãos.
Eu tinha
quase certeza de que o Buffalo e seus capangas
haviam atacado a família de Marina. Baltazar
me encarou

59
por um momento, parecia que ele estava
pensando em algo muito complexo, mas era
impossível de se
imaginar o que seria.
—Merda!— Ele grunhiu e bateu com o pé no
chão, parecia que ele havia captado a
mensagem também.
14
—Isso parece obra do Buffalo, não tem sinal
nenhum dele em sua base, mas tenho minhas
dúvidas, ouvi
de alguns caipiras, não faço a mínima ideia de
onde ele possa estar agora—
—Seria burrice da parte dele se estivesse lá—
Disse Baltazar, enquanto passava uma das suas
mãos na
testa, nós havíamos voltado a estaca zero, seria
em vão se continuássemos nossa rota,
precisávamos
pensar sobre o que fazer diante desse novo
problema.

60
— Agora a pouco escutei alguns homens
comentando sobre desaparecimentos de pessoas
na cidade de
Santa Anna, se tivéssemos ficado mais um
pouco lá teríamos batido de frente com Buffalo

Eu escutava aquilo bastante pensativo, abri o
meu mapa em cima da mesa, encarava-o com o
corpo
inclinado, estava segurando uma caneta com os
dentes enquanto traçava algumas opções de
rotas
imaginárias em cima do mapa com o dedo, tirei
a caneta da boca e soltei um suspiro.
—Precisamos coletar informações agora, se
continuarmos apenas presos a essa confusão ele
irá
continuar atacando e sequestrando mais pessoas

—Eu vou ao Santuário— Disse Baltazar
enquanto pegava suas coisas em cima da mesa,
se ajeitando.

61
—Eu vou com você— Dobrei o mapa e guardei
em minha jaqueta novamente, Baltazar me
encarou por
alguns segundos antes de abrir a porta.
—É melhor você ficar aqui, garoto, deixe isso
para lá — Eu franzi as sobrancelhas para baixo
e virei um
pouco o rosto para o lado, ainda olhando para
ele, uma expressão desconfortável se formou
em meu rosto.
—O que você está querendo dizer com isso?—
Me aproximei bem perto dele, a diferença de
altura era
grotesca, mas aquilo não me intimidava, olhei
bem em seus olhos.
—Não se esqueça que eu também estou atrás da
cabeça do Buffalo—
—Você só vai me trazer problemas, tente
entender que estamos em um momento delicado

—Não, você só está aqui graças a mim, eu não
vou simplesmente largar nessa altura só porque
você

62
quer— Ele soltou um grunhido, aparentemente
não estava afim de continuar me retrucando, iria
ser uma
perda de tempo para ele, apenas desviou o olhar
e franziu as sobrancelhas.
—Tsc, Seja assim então, só não atrapalhe as
coisas, menino—
Balthazar abriu a porta, estava parado
acendendo um cigarro enquanto esperava, me
aproximei de Marina
e a peguei no colo cuidadosamente, não tinha
intenção de acordá-la.
Antes de sair dei uma passeada de olhares por
todo o quarto para ter certeza de que não estava
deixando
nenhum rastro, não sabíamos o que Buffalo era
capaz de fazer agora que estava ciente de toda a
situação,
tínhamos que manter um cuidado a mais.
Assim, saímos do hotel e fomos em busca do
famoso Santuário Texano.

63
Lá era uma ótima fonte de informação do
Texas, como havia a presença de pessoas de
todo o canto do
estado, tínhamos a grande chance de conseguir
algo.
★★★
Era possível escutar sons de gritos, ossos
quebrando, algo sendo esmagado, e mais gritos
consecutivos,
gritos de desespero, de dor, era assim o som do
inferno de Buffalo Black.
Um homem de cabelos castanhos e olhos pretos
como a escuridão ameaçadora da madrugada,
trajado
como um forasteiro comum, caminhava em
direção a uma cabana de madeira que
aparentava ser grande,
haviam dois depósitos enormes ao lado.
15
Esse homem estava arrastando algo grande, era
impossível ver o que seria, pois estava cercado
por uma

64
escuridão absoluta, apenas a silhueta era
notável. Ele parecia fazer bastante força
enquanto puxava, era
possível perceber pelos gemidos e o estalar dos
esporões de sua bota que batiam pausadamente
no chão
juntamente ao cascalho sendo arrastado.
O homem se aproxima da porta e solta o objeto
no chão, a leve iluminação dada pelo lampião
pendurado a entrada tornou possível de se ver o
que ele arrastava, e era nada mais que um corpo
de outro
homem, ele parecia ser grande, tendo por volta
de 1'80 e 1'90, estava amarrado e com um pano
velho e
engordurado enfiado na boca, aparentemente
estava desacordado, haviam vários hematomas
pelo seu
corpo, os mais visíveis eram os de seus braços,
pescoço e principalmente no rosto. Em sua testa
tinha um

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grave machucado, como se algo pesado tivesse
acertado exatamente o local, um machucado
profundo que
sangrava consecutivamente.
Abriu-se a porta e agarrou novamente o corpo,
arrastando o pobre homem para dentro da casa,
usando
toda a sua força.
—Ahg! Você me deu um baita trabalhão Xerife

Ele para de arrastar o corpo e o deixa no chão
do que aparentava ser uma sala, o homem
acendia um
cigarro enquanto estava com um dos pés
apoiado sobre o corpo, encarava ele com
desprezo e sem
nenhum remorso.
—Eu não me importo com nada mais a não ser
a boa grana que vou ganhar quando eu entregar
você para
o nojento do Buffalo—

66
Tira o cigarro da boca e dá um sorriso
malicioso de canto, mas logo em seguida sua
expressão muda para
uma de ódio, cospe em cima do corpo e da um
chute na costela dele, o corpo não reage por
estar
desacordado, mas com certeza quando
acordasse a dor viria em dobro.
Ninguém sabia ao certo o que Buffalo fazia
com os corpos que capturavam, mas tinham a
total certeza
de que se descobrissem, precisariam de bons
anos em uma ala psiquiátrica para recuperar a
sanidade
mental. O sentimento ruim e a energia negativa
eram fortemente presentes no lugar, uma aura
esmagadora, não era qualquer um que
conseguiria ficar lá sem passar mal, o cheiro
podre de morte
rondava por todo o lugar, e os sons abafados de
gritos vindo de um dos depósitos do fundo era a
mais
comum trilha sonora.

67
★★★
A voz sedutora de uma bela moça agraciava
todos que estavam presentes no bar e soava a
mais bela
vocal por todo o local. De fora do Saloon era
possível escutar com clareza o som de diversas
pessoas
conversando, dançando, rindo e se divertindo, o
barulho dos copos de vidro batendo um nos
outros e
fazendo a bebida que estava dentro dançar de
um lado para o outro. Mesmo na noite mais fria
e escura o
local se mantém de pé, trazendo o calor e a
clareza para os forasteiros e andarilhos da lua.
Adentrei o Saloon junto de Baltazar e Marina, a
garotinha segurava forte a minha mão, parecia
estar
assustada, mas também estava encantada com a
energia do lugar, Baltazar andava na frente a
procura de

68
um local próximo aos grupos de forasteiros que
conversavam entre si, bebiam e jogavam um
bom truco,
aqueles sim, eram as antenas de informações do
Texas, se quisesse saber de algo de fora, era
perto deles
que você precisava ficar. Sentamos em uma
mesa próxima, para nossa sorte ela estava vazia,
apesar do
16
lugar estar completamente cheio, as pessoas
preferiam ficar perambulando para lá e pra cá
ao invés de
apenas ficarem sentadas.
Uma dama bonita, loura dos lábios rosados,
uma voz meiga e sedutora e com um olhar doce
e vulgar, se
aproximou de nossa mesa, ela segurava um
pequeno bloquinho em uma das mãos, e na
outra carregava
uma enorme bandeja com alguns copos de
cerveja vazios, ela se inclinou na mesa e nos
encarou com um

69
sorriso.
—Olá rapazes, o desejam nessa noite?— Não
respondi de imediato, olhei para Baltazar e ele
estava com
o olhar fixado na moça, parecia encantado.
—Me traga uma cerveja, bela dama— Após
dizer, notei que ele deu uma piscada de olho
bem rápida
para a moça, a loura apenas deu uma risadinha e
me encarou.
—E você, mocinho?— Sinalizei que estava
satisfeito, não queria nada no momento, estava
tão focado no
objetivo que não conseguiria aproveitar direito,
a moça apenas assentiu com a cabeça e se
retirou.
—Ela é uma gracinha, não é?— Perguntou
Baltazar enquanto me cutucava com o cotovelo.
Eu já vi
várias moças como ela, e posso dizer que são
verdadeiras sereias que te atraem para o abismo
mais fundo

70
do oceano, onde você se afunda numa pressão
tão forte que se torna incapaz de subir de volta
para a
superfície.
—Não faz o meu tipo— Ele levantou uma das
sobrancelhas e me encarou em silêncio por um
tempo, ele
deu um sorriso de canto e me cutucou com o
cotovelo mais uma vez.
—Você curte os louros, não é?—Ele disse com
uma voz risonha.
Encarei ele um pouco sem jeito, o que ele quis
dizer com isso? Evitei retrucar pois sabia que
ele apenas
estava brincando, apesar de que ver ele fazendo
isso era inédito para mim.
— Você está começando a se soltar, hein—
Disse para ele enquanto cruzava os braços em
cima da mesa
e apoiava o meu corpo, ele apenas sorriu para
mim e começou a beber.

71
Naquele curto momento, eu comecei a observar
o local, meus ouvidos estavam totalmente
focados nos
forasteiros que conversavam na mesa de trás,
não falavam sobre nada interessante, apenas o
típico papo
de homens caipiras: mulheres, bebidas e jogos
de azar.
Passaram se algumas horas, Baltazar já estava
no seu quinto copo de cerveja, eu
provavelmente teria
que levar ele embora arrastando, ou poderia
muito bem deixá lo e voltar para buscá-lo
durante a manhã,
ele estava falando várias coisas sem sentido, era
até engraçado, Marina estava se divertindo com
o estado
decadente de Baltazar.
Tampouco demorou para eu começar a escutar
algo interessante vindo dos homens da mesa de
trás, eles
estavam falando baixo, mas ainda sim, com
bastante concentração era possível escutar.

72
—Ficaram sabendo que o Xerife de
Stephenville está desaparecido?— Disse o
homem enquanto
embaralha as cartas para iniciar uma nova
rodada, intrigado um dos caipiras da roda que
mascava uma
folha de trigo disse:
—Desaparecido, aquele véio sabe é aproveitar a
vida, com certeza ele deve é ter ido embora pra
algum
canto mió—
—Na verdade, estão tendo bastante casos de
desaparecimento recentemente, em vários locais
do
Texas— Um cowboy retrucou, após dizer, deu
um gole confiante em sua garrafa de Whiskey.
—Será que o grupo do velho Buffalo Black está
de volta? Houve uma época em que ele era o
cabeça do
caso de desaparecimento de pessoas em 1975—
— Com certeza, eu diria que é ele— Afirmou
um outro homem, era intrigante, ele estava
totalmente

73
vestido de preto com um chapéu de aba larga
num tom marrom escuro tampando metade do
rosto, fumava
17
um charuto, isso me deixou com uma pulga
atrás da orelha, ele parecia ser alguém que
escondia alguma
coisa.
Havia esse novo grão no meio da minha horta,
ter a informação que o Xerife de Stephenville
estava
desaparecido era uma carta para um grande
passo, provavelmente essa informação é fresca,
de uns 2 dias
no máximo, o que me deixou mais intrigado foi
o forasteiro misterioso, ele parecia ter a exata
certeza do
que falava ou ele poderia apenas ser mais uma
peça desse enorme xadrez do Buffalo Black
para nos
atordoar.

74
Eu tinha que conversar com Baltazar sobre isso,
mas no momento seria impossível, ele não
estava em
um estado propício para a situação, pelo
contrário, depois de vários copos de cerveja já
estava cantando
pelos cotovelos.
Puxei-o pelo braço próximo a mim para que eu
pudesse sussurrar em seu ouvido, ele estava
leve como
uma pena, parecia uma gelatina, e no rosto um
sorriso bobo, segurava em uma das mãos uma
enorme
caneca de cerveja
—Ei Baltazar, você escutou o que os forasteiros
de trás estavam falando?— Ele não estava
olhando para
mim, nem prestando atenção, na verdade, eu
não sei exatamente para onde aqueles olhos
estavam
olhando, ele estava falando coisas
incompreensíveis, e até inaudíveis por conta da
grande poluição

75
auditiva do local.
Enquanto eu estava nessa tentativa de conversar
com Baltazar, percebi pelo canto dos olhos que
o
forasteiro misterioso havia se levantado,
ajustando o cinturão, parece que gesticulava
algo para os homens
da mesa e logo em seguida, se virou e caminhou
para a saída.
18
Desaparecido de Stephenville
Cinzas, armas e sangue
Estava em um momento de extremo decisivo,
eu tinha a total certeza que o homem de chapéu
marrom
sabia de algo, ele seria a pessoa que nós
deveríamos ir atrás, mas eu estava em uma
situação difícil,
Baltazar não iria sair dali tão cedo, e o homem
já estava saindo do Saloon. Por um breve
período eu decidi

76
aproveitar essa oportunidade e ir atrás dele para
tentar conversar, se eu apenas ignorasse poderia
estar
perdendo uma oportunidade de ouro.
Marina parecia estar entretida com Baltazar, o
momento era perfeito, então sem perda de
tempo eu me
levantei da mesa e fui atrás do homem. O local
estava extremamente cheio e consequentemente
a mesa
em que eu estava sentado era um bocado
distante da saída, haviam muitas pessoas em pé,
ocupando
espaço, eu diria que elas eram um verdadeiro
obstáculo árduo para se passar e chegar lá fora
antes do
homem desaparecer.
Quando cheguei na porteira, caminhei com
meus olhos pela fachada do local, estava vazio,
um sereno
forte e o zumbido do vento, não aparentava ter
ninguém, naquele momento eu achei que havia
chegado

77
tarde demais, mas quando menos esperei
escutei o destrancar a porta do banheiro que
ficava do lado de
fora, olhei imediatamente e para minhas graças,
era o homem. Ele saiu do banheiro e foi para a
beira da
estrada acender um cigarro. Estava parado
fumando um bom charuto, umas das mãos se
mantinham
apoiadas no cinturão, parecia que estava
admirando o céu, não hesitei em me aproximar
ao lado dele.
—O céu está lindo hoje, não acha?— Ele disse
assim que parei ao lado, de certa forma fiquei
espantado,
por um momento senti que ele já estava ciente
de minha presença, que sabia que isso iria
acontecer, e
apenas estava esperando por mim, o que me
deixou com um leve arrepio na espinha e um
medo árduo de

78
engolir, talvez isso seja apenas coisa da minha
cabeça, mas eu tinha que me manter atento ao
meu
objetivo.
—Sim— Fiquei em silêncio por um tempo e ele
também.
—O Senhor é daqui?— Afastou o charuto da
boca, deu um leve suspiro e sem me olhar ele
respondeu:
—Stephenville—
—Está um bocado distante da tua terra— Ele
tragou o charuto e deu uma risada curta.
—Ainda bem que estou— Fiquei um pouco
confuso com a resposta dele, talvez não era algo
que eu
esperava.
—Está sendo perseguido?—
—Garoto, há coisas no mundo que são difíceis
de compreender, e a minha vida é uma delas—
Ele me
olha pelo canto dos olhos, com certeza eu não
entendi o que ele quis dizer com isso, mas eu
precisava

79
engatilhar o assunto no qual eu estava
interessado.
—Isso tem haver com o desaparecimento do
seu Xerife?— Um silêncio ensurdecedor se fez
presente
após meu questionamento.
—Menino, Você é o garoto de San Angelo, não
é?—
—Por que a pergunta?— Ele virou o rosto para
mim, ainda com o charuto na boca, seus olhos
pretos e
profundos como um abismo, era agoniante
olhar para eles, fiquei intimidado e desviei o
olhar, ele
continuou me encarando por um tempo, como
uma cobra pronta para dar o bote em sua presa,
afastou o
charuto da boca e soltou um bafo de fumaça em
cima de mim.
19
—O Senhor Black vai arrancar as suas tripas e
se deliciar com cada uma em um enorme
banquete, se

80
deleitar de um grado de whiskey e sangue de
um jovenzinho que jurou mandá-lo para o
inferno— Fiquei
espantado com as palavras do homem, por um
momento parece que sua feição mudou de
repente, se
tornando um desalmado, o mais faminto dos
demônios, sedento por sangue. Dei um passo
para trás, ele
continuou me encarando, lendo cada palavra da
minha alma.
—Quem é você?— Perguntei para ele, estava
tentando manter minha mínima coragem
enquanto estava a
frente dele, mesmo que meu real desejo era sair
correndo e gritando, será esse sentimento que
Willy
queria descrever? Eu estava confuso e
desesperado, mas estava sentindo que aquele
não era o momento
certo para ir embora.

81
—Eu sou a última face que você verá antes de
pisar no submundo— No mesmo instante ele
puxou o
coldre preso a sua cintura, estava com o dedo
engatilhado, pronto para disparar em mim,
naquele
momento eu fiquei paralisado, não sabia o que
fazer, estava com os olhos arregalados e suando
frio, o
simples ato de puxar o meu colt seria riscado,
pois qualquer mínimo movimento que eu
fizesse ele
dispararia sem pensar.
—Vamos garoto! Por que não deixa isso para
lá? Sabe, eu não sou um homem mau, mas se
você quiser,
eu posso ser— Após dizer, ele deu um sorriso
ameaçador, ainda me encarava com os olhos
negros que
pareciam me engolir aos poucos, caiu a minha
ficha que aquele homem poderia ser um dos
homens do

82
Buffalo, mas mesmo diante isso eu não
conseguia soltar sequer um mínimo grunhido,
estava banhado no
medo.
—O rato mordeu sua língua??— Ele começou a
girar a arma, parecia que a cada volta o dedo
dele
esbarraria no gatilho estouraria minha cabeça,
ele com certeza estava brincando com minha
situação, eu
fiquei naquele frio gélido, uma sensação que eu
não desejaria nem para o meu pior inimigo.
Em um curto espaço tempo, no qual nenhum
olho humano conseguiria perceber, o homem
foi
atravessado por diversas balas que viera de uma
direção contrária, o choque foi enorme e o
estouro foi o
suficiente para agitar todos que estavam dentro
do Saloon, o impacto causado fez o homem cair
na

83
estrada, naquele tempo olhei rapidamente em
volta a procura de onde teria vindo aquela
quantidade
absurda de balas, e para minha surpresa, era de
dentro do Saloon.
Na porteira estava ele, um homem
extremamente alto de olhar peculiar e cabelos
claros. Após disparar
as balas, ele girou a arma no dedo e assoprou o
cano, a encaixou de volta no cinto, e me
encarou com uma
expressão levemente ranzinza. Se aproximou,
estava cambaleando e em uma das mãos
segurava uma
caneca de cerveja quase no fim.
—Ei garoto, o que eu disse para você quando
falei para não atrapalhar??— Disse ele com voz
trêmula e
grave.
—Baltazar! Foi você?!— Eu estava assustado,
espantado, mas também estava aliviado, em um
misto de

84
sentimentos, não consegui prestar atenção no
sermão que ele estava me dando.
—Foi só eu virar o rosto e você já se meteu em
problemas— Após ele dizer, virou a caneca
terminando
de beber o resquício de cerveja que havia,
jogou-a no chão e agarrou o meu braço.
—Vamos embora, menino,olha o que você fez

—Ei, Ei Baltazar!— Ele começou a me arrastar
pelo braço enquanto eu tentava me soltar, eu
precisava
voltar lá, o homem ainda estava vivo, se
contorcendo de dor no meio da estrada, Baltazar
parou de andar e
me encarou, com as sobrancelhas franzidas para
baixo.
—Baltazar, aquele forasteiro é um dos homens
do Buffalo! Nós precisamos voltar lá! Ele ainda
não está
morto— Baltazar parou por um momento,
pensativo, logo me soltou e olhou para o
homem que estava

85
20
jogado na estrada, soltou um grunhido e
caminhou em direção a dele. Eu soltei um
suspiro de alívio e fui
logo atrás.
Parei na frente do homem, ele estava incapaz de
se levantar, estava gemendo de dor e se
contorcendo no
chão, eu estava surpreso pois já deveria estar
morto, ele foi atingido por no mínimo 20 balas
de prata, na
região do tórax e rosto. Baltazar estava parado a
frente dele, o encarando com desprezo e
desgosto, deu
um chute na costela do homem, no qual urrou
de dor imediatamente.
—Qual o seu nome?!— Baltazar gritou para
ele, estava irritado e queria respostas imediatas.
—Ralph! Ralph Retster! Ahhhhg!!— O homem
disse entre gemidos.
—Miserável, não merece um pingo de
misericórdia, apontado a arma para um garoto,
você é um saco de

86
merda—
Baltazar deu mais um chute no homem, que
mais uma vez urrou de dor e aumentaram-se os
gemidos,
estava chorando e implorando para que ele
parasse, me agachei próximo a ele e encarei seu
rosto que
pedia por misericórdia, Baltazar se agachou do
meu lado, segurou o pescoço de Ralph e o
encarou bem no
fundo de sua mísera alma.
—Onde Buffalo Black está?—
—No inferno— O homem sorriu com os olhos,
seu nariz estava sangrando e estava quase se
afogando
em seu próprio sangue.
—Onde Buffalo Black está!?— Baltazar gritou
novamente para ele.
—Não se preocupem, Ele já está com vocês—
Se formou em seu rosto um sorriso cínico e em
seguida
cuspiu sangue no rosto de Baltazar.
—Ande! Me mate logo!—

87
Naquele momento eu vi Baltazar se encher de
ódio e se tornar uma besta que mal aparentava
ter alma,
estava envolto de uma energia ameaçadora.
Baltazar enfiou o punho na caixa torácica do
homem, fazendo
um enorme rombo. Ainda com os punhos
atravessando-o, Ralph soltou suas últimas
palavras, olhando
bem no fundo dos olhos de Baltazar, com
aquele olhar negro e perturbador.
—Quem muito encara o abismo, o abismo o
encara de volta— E com isso, ele caiu no sono
no qual ele
nunca mais acordaria.
Baltazar retirou o punho, estava coberto de
sangue, ainda estava irritado, encarei ele um
pouco
preocupado, pelo incrível que pareça, eu não
estava tão assustado com isso, minha cabeça
mal conseguia

88
formular o que meus olhos haviam acabado de
presenciar, olhei para a face do morto, era uma
face
tranquila, com um sorriso e os olhos pareciam
que ainda enxergavam, aproximei minha mão
de seu rosto
e abaixei as suas pálpebras, me levantei e
encarei Baltazar, que ainda estava agachado,
encarando o
próprio punho.
—Vamos, é melhor voltarmos para o hotel e
continuamos pela manhã — Baltazar continuou
em silêncio,
apenas se levantou e tirou o excesso de sangue
dos punhos.
Durante aquele caos que aconteceu, eu me
esqueci de Marina, rapidamente fui para dentro
do Saloon
procurando por ela, e para meu alívio, ela ainda
estava sentada na mesa, brincando com algumas
moças
mais velhas.

89
—Oh, Marina, você esta aí, eu já estava
preocupado— As moças me olharam, vendo eu
me aproximar
da garotinha.
—Você é irmão dessa princesinha?, Ela é um
gracinha, traga-a mais vezes aqui, adoraríamos
ter a
presença desse ser de luz tão contagiante!— As
outras moças ao redor concordaram, e
continuaram a
brincar com Marina. Segurei ela no colo e olhei
as moças com um sorriso.
21
—Não exatamente, estamos apenas de
passagem, garotas— Se formou uma expressão
de tristeza e
decepção no olhar delas, mas apenas aceitaram
e se despediram da gente.
—Passem aqui quando voltarem para
Comanche!— Afirmei com a cabeça e me
retirei do Saloon com
Marina em meu colo.

90
Encontrei com Baltazar do lado de fora, ele
aparentemente não estava mais irritado, pelo
contrário,
aparentava estar bem tranquilo, como se o que
tivesse acabado de acontecer fosse apenas uma
alucinação.
Algo no local me surpreendeu, o lugar onde o
corpo do homem deveria estar estava repleto de
cinzas, isso
me deixou bastante confuso, foi um tempo
muito curto para que o corpo virasse cinzas se
Baltazar tivesse
jogado fogo nele, seria algo perceptível, mesmo
com isso evitei ficar pensando demais, talvez eu

estivesse alucinando, minha cabeça precisava
de um bom e longo descanso, fomos embora de
volta para o
hotel.
★★★
Na manhã do dia seguinte acordei com um feixe
de luz em meu rosto, uma luz forte e quente,
com os

91
olhos semiabertos notei que estava sendo
despertado pelo sol, reluzente como sempre, me
sentei na cama
ainda um pouco atordoado, em minha mente
ainda se rondava algumas memórias do dia
anterior, mal
conseguia organizá-las para sequer fazer o
menor sentido em minha cabeça.
Baltazar estava ao lado, aparentava ainda estar
dormindo em um sono profundo, dormindo
como uma
pedra, Marina estava deitada do outro lado da
cama, e também aparentava estar dormindo. Me
levantei e
estiquei o corpo, aproveitei para apreciar o céu
da janela, estava lindo como sempre, bem azul e
naquele
exato momento estavam migrando um grupo de
aves, tampouco durou essa admiração, fui
interrompido
por um puxar em minha calça, quando olhei
para baixo era Marina, ela havia acabado de
acordar, estava

92
esfregando um dos olhos. Ela não falou muito
desde o dia em que a resgatamos, ver ela
fazendo esse tipo
de interação era no mínimo vitorioso, me
agachei e olhei para o seu rostinho sonolento.
—Bom dia Marina— Ela ficou em silêncio por
um tempo, mas logo deu um sorrisinho.
—Bom dia Tim!—
—Está preparada para voltar à estrada?— Ela
me olhou por um tempo, pensativa, apenas
afirmou com a
cabeça. O relógio estava marcando exatas
09:30, era o momento perfeito para pegarmos a
estrada.
Enquanto eu organizava as coisas, Baltazar se
despertou, estava sentado a beira da cama, de
cabeça
baixa, com uma das mãos apoiada sobre a nuca,
eu apenas o olhei pelo canto dos olhos enquanto
colocava
algumas coisas dentro da bolsa, tirei o mapa
para fora e o estendi sobre a mesa, peguei uma
caneta

93
vermelha e fiz um círculo sobre uma das
cidades, a intrigante cidade de Stephenville.
—Bom dia, grande homem, preparado para
voltar à estrada?— Disse com um sorriso sem
tirar os olhos
do mapa, ele não me respondeu de imediato,
apenas se levantou e esticou o corpo.
—Vamos terminar isso logo—
Ele disse se aproximando de mim enquanto
vestia sua jaqueta, parou ao meu lado,
encarando o mapa,
caminhando com os olhos por cada cidade do
Leste do Texas, ele estava de braços cruzados e
aparentava
estar um pouco apreensivo, pensativo, ou talvez
ele só estivesse perdido em meio aos
pensamentos.
Precisávamos partir agora caso não
quiséssemos perder nenhum minuto da viagem,
parece que naquele
instante, depois do que aconteceu ontem,
mesmo que eu não tivesse conseguido
exatamente o que queria

94
com Ralph Retster, ele criou uma nova
oportunidade para mim, de qualquer forma,
ainda estava um
22
pouco pensativo sobre o que ele disse pouco
antes de morrer, será que Buffalo realmente está
atrás da
gente? Isso era algo que poderia acontecer
facilmente, mas algo em mim dizia que o X do
tesouro estava
na cidade de Stephenville. Pegamos nossas
coisas e saímos do hotel em direção a saída da
cidade, tudo
aconteceu igual as vezes anteriores que
pegamos estradas.
★★★
Eu estava montado em Bigmouth, tomando o
caminho, o céu naquele instante estava perfeito,
não havia
nada a reclamar, mas algo me chamou atenção,
havia algumas nuvens escuras se juntando a
uma distância

95
considerável, era bem longe, mas dava para ver
com clareza, provavelmente para o lado de
Stephenville
estaria prestes a receber uma chuva, e não
parece que seria uma chuva tranquila, muito
pelo contrário,
com direito a tempestade, raios e trovões. Eu
me preocupei por um momento, não havíamos
proteção
então provavelmente pegaríamos uma parte da
chuva quando estivéssemos chegando.
—Acho melhor vocês se preparem, iremos
pegar uma chuva nada amigável— Disse para
Baltazar, que
estava sentado atrás junto de Marina, ele virou
o rosto, tentando avistar as nuvens, mas na
posição em que
ele estava era bastante difícil, apenas soltou um
grunhido e disse:
—É, parece que dessa vez a sorte não está do
nosso lado—
—Que nada!, é só uma chuvinha— Retruquei
ele e dei uma risada curta.

96
—Claro, realmente não há nada a se preocupar
— Ele sorriu e se apoiou em minha costas, com
os braços
na nuca.
Marina estava sentada na frente de Baltazar, ela
estava segurando um radinho velho, quase
caindo aos
pedaço, da cor vermelho cobre, na verdade, não
sabíamos ao certo se essa era a cor dele ou se
era
ferrugem, mas mesmo nessas condições, ainda
funcionava perfeitamente, estava tocando uma
trilha típica
texana.
Depois de bastante chão de terra andado, já era
possível avistar a placa de boas vindas de
Stephenville, e
como eu havia previsto, estava chovendo, não
muito forte ainda, mas o suficiente para
encharcar qualquer
um que ficasse mais de 10 minutos debaixo
dela.

97
Assim que chegamos na cidade, procurei um
local para saímos da chuva, e para minha sorte,
havia um
saloon na entrada da cidade, ele tinha uma
cobertura grande o suficiente para nos proteger
da chuva.
Prendi Bigmouth em uma estaca de madeira
debaixo da cobertura, Baltazar estava
resmungando e
reclamando enquanto retirava a jaqueta e
algumas peças a parte de sua roupa que se
encharcaram, Marina
estava abraçando os próprio braços por conta da
ventania fria, estava bastante molhada também,
mas não
tanto quanto eu e Baltazar.
—Tio Tim, eu estou com frio— Disse a
garotinha, enquanto se aproximava de mim, eu
a olhei com as
sobrancelhas franzidas, ela era muito fofa e ver
ela daquele jeito de certa forma me deixava
comovido, as

98
roupas que serviriam para aquecer-lá estavam
totalmente encharcadas, me agachei a frente
dela e torci a
barra de seu vestido para tirar o excesso de
água.
—O que acha de entrarmos? A chuva não
parece que vai cessar tão cedo— Olhei para
Baltazar,
esperando alguma resposta dele, mas ele ainda
estava resmungando.
Segurei na mão de Marina e entrei dentro do
Saloon. Estava vazio, com apenas alguns
homens jogados
nos cantos, servindo de alimento para as moscas
que os rodeavam, a cada passo que dávamos
dentro do
Saloon o chão rangia e tremia, dando a
sensação de que iria desabar a qualquer
momento. O único som
23
que o local transmitia era o volume meramente
baixo da TV que estava em um programa de
leilão, a

99
chuva lá fora, e alguns dos homens que estavam
por lá grunhido e reclamando da vida.
Me aproximei do balcão, atrás dele estava um
homem em sua mais velha idade, a morte
aparentava tê-lo
esquecido. O velho usava um chapéu de palha,
parecia estar totalmente focado e entretido com
o
programa, escorei meu corpo no balcão e dei
algumas batidas com a mão sobre, o velho se
virou para
mim e me encarou por alguns segundos, com as
sobrancelhas franzidas, ajeitou o chapéu e
cuspiu dentro
de um dos copos que estava em cima do balcão.
—O que ocê quer?—
—Boa tarde, senhor, teria alguma bebida quente
para essa jovem mocinha?—
O caipira encarou Marina e resmungando
atravessou uma porta que ficava atrás do
balcão, não demorou

100
muito para que ele voltasse com uma caneca de
madeira, com a boca prestes a transbordar de
um bom e
quente leite, colocou em cima do balcão e
voltou a assistir o leilão.
—Está bem quieto, costuma ser assim sempre?

O velho estava mastigando um palito roliço de
madeira, ainda concentrado no programa,
aparentava não
estar afim de conversar, e consequentemente
parecia que eu estava o incomodando. Não
esperava
encontrar uma energia boa de Stephenville, mas
não pensei que seria tão desconfortável assim,
apenas
desisti de tentar conversar e fiquei ali com
Marina.
Não demorou muito para escutarmos a porta
ranger novamente junto do chão que parecia
que abriria um

101
buraco a qualquer segundo. Baltazar havia
terminado de tirar o excesso de água de suas
roupas e resolvera
entrar para esperar a chuva passar. Ele ainda
parecia um pouco irritado, algo rotineiro.
Baltazar caminhou
em minha direção, parou ao lado e se apoiando
no balcão me encarou com seu olhar mais seco
e
intimidador.
—Que lugarzinho estranho esse— Ele disse
enquanto caminhava com os olhos por todo o
Saloon. O
caipira grunhiu e encarou Baltazar de cima a
baixo
—Ocês são forasteiros, num é? de ratos
imundos…— Ele abaixou o tom da voz e evitou
contato visual
—O quê?— Perguntei um pouco confuso, e
sem entender o que o velho havia dito. Ele
grunhiu e cuspiu
dentro do copo mais uma vez.

102
—O xerife bateu as botas, a cidade tem virado
um verdadeiro curral, as pessoas num sabem
mais o que
são regras, estão roubando e matando a rodo,
muitos moradores daqui migraram para outras
cidades do
texas, buscando proteção—
—É um bando de animais, vindo daqui não é de
se ficar surpreso— Disse Baltazar, enquanto
olhava
para os homens varridos pelo saloon.
—Eu já vou fechar as portas, vão embora—
Disse o caipira enquanto desligava a tv e tirava
o palito da
boca.
—Antes de irmos, você sabe dizer ao certo o
que aconteceu com o Xerife?—
—Ocês num precisam saber de nada, a melhor
coisa que poderiam fazer, é ir embora—
—Nós podemos ajudar, senhor, se você souber
de algo, nos diga— O caipira me encarou e
soltou uma
risada debochada.

103
—Não, ocês são só uma pedra no caminho de
Stephenville—
Naquele exato momento, numa fração de
segundos Baltazar agarrou a gola da camisa do
caipira com
toda sua força e o trouxe para bem perto de seu
rosto fazendo com que o caipira quase
atravessasse o
balcão, fiquei assustado pela ação imediata mas
apenas deixei que o fizesse.
24
—Escuta aqui, se você não vai fazer nada, deixe
para quem saiba o que fazer— Me aproximei do
caipira
e encarei seus olhos, seu rosto estava assustado
e bastante desesperado, mal conseguia falar, por
algum
motivo, parecia que estava sendo sufocado pela
gola da camisa que Baltazar repuxava.
—Vamos lá, é só você dizer o que sabe e nós
vamos embora—

104
Eu não queria resolver as coisas de forma
violenta, tivemos aventuras desse tipo até
demais. Marina
estava sentada no banco apenas observando
enquanto tomava o leite, mesmo que ela
estivesse nessa
jornada com a gente a um tempo e tivesse visto
um excesso de brutalidade massiva, eu não
queria piorar
as coisas para a cabeça dela, era melhor evitar.
Ela encarava com os seus olhos pretinhos, e
balançava os
pés, parecia achar graça do que estava
acontecendo. O caipira engoliu seco e disse:
—Eu num sei de nada!!, só escutei uns homens
conversando aqui no salão sobre um grupo de
bandidos
que estão fazendo temporada na cidade— Olhei
para Baltazar curioso, sua atenção estava
totalmente
voltada para o homem, escutando cada palavra.

105
—Provavelmente foram esses bandidos que
deram um jeito no xerife, é apenas uma
dedução, n-não é
certeza!!— Ele franziu as sobrancelhas com um
olhar preocupado, evitando encontrar com o
olhar
ameaçador de Baltazar.
—Obrigado senhor, isso já é o suficiente —
Deixei duas moedas de prata em cima do
balcão, olhei para
Baltazar e ele soltou o homem que
imediatamente se afastou para trás, se batendo
na estante de bebidas
que ficava atrás do balcão, quase a derrubando.
★★★
A chuva parecia intensa, uma ventania que
criava redemoinhos de poeira e cascalhos,
pareciam que os
telhados das casas iriam sair voando, era
impossível nós pisarmos para fora da cobertura
naquele estado.

106
O caipira já havia fechado o Saloon, e ao nosso
lado, na fachada debaixo da cobertura estavam
sentados
no chão alguns dos homens que estavam lá
dentro, outros resolveram se aventurar nessa
tempestade,
tenho minhas dúvidas de que ainda estejam
vivos.
Um dos homens que se encontrava sentado
debaixo da janela do Saloon estava
murmurando e
cantarolando algo, Marina parecia intrigada
com ele, ela não dizia nada mas o encarava
fascinadamente.
O curioso possuía o cabelo extremamente
longo, liso e negro como a escuridão absoluta,
usava um
chapéu de couro vinho, era pálido, branco como
leite, parecia jovem e estava deprimido, com o
olhar
baixo, parecia que algo o antigira, criando uma
enorme ferida; ele poderia ter acabado de
perder um

107
grande amor ou estar passando por um luto;
também poderia ter perdido tudo o que tinha em
uma aposta
ou jogo de azar; não dava para saber ao certo o
que o aflingia.
O homem estava em uma névoa de angústia,
cegado e incapaz de notar o que estava
acontecendo ao seu
redor.
Marina se aproximou dele, ela estava segurando
a barra do vestido, parecia curiosa e
preocupada, ela não
tinha o costume de chegar em estranhos, algo
que me fez ficar bastante curioso, não a impedi,
ele não
parecia ter uma aura ameaçadora, pelo
contrário, parecia ser tão indefeso quanto uma
formiga, implorava
por uma companhia ou um ombro para chorar.
Marina se inclinou à frente dele, que estava
sentado abraçando os joelhos e com a cabeça
baixa,

108
demorou para que ele notasse a presença da
garotinha, subiu devagar o olhar, dentre as
sombras que o
cercavam, entre os seus braços era possível ver
apenas seus olhos, que eram de um verde quase
sem vida,
como as cinzas do carvão. No momento em que
o homem percebera a presença de Marina, ele
gelou dos
pés a cabeça, se desfez do abraço das sombras e
se levantou assustado, sua expressão era de
desespero e
25
aflição, os olhos arregalados, ele tremia e não
conseguia soltar um murmúrio sequer, Marina
deu um
passo para trás, mas ainda o encarava, o homem
estava completamente congelado de medo,
queria fugir,
como o diabo foge da cruz.
O acontecido assustou todos que estavam ali,
Baltazar pegou Marina no colo imediatamente e
se

109
afastou, o homem dos cabelos negros perseguia
Marina com os olhos, seu estado o fazia incapaz
de mexer
um músculo sequer, ele estava agarrando as
repartições da janela com as enormes unhas
pontudas e
negras que tornava aquele homem mais
intrigante ainda, Baltazar o encarou com uma
expressão num
tanto ameaçadora, me aproximei dos dois que
estavam em uma completa confusão.
—O que é isso??— Perguntei enquanto olhava
para o homem preso à parede.
—B- Be- Besta!!!! Maldita!— Disse o homem
entre gaguejos, todos ao redor estavam
espantados e
assustados por causa de seu comportamento.
—O que você quer de mim, Maldita!!!— Ele
gritou desesperado, seus olhos se encheram de
lágrimas
que escorriam pelo seu pálido e traumatizado
rosto.

110
O homem se soltou da parede e avançou para a
frente, medo, desespero, angústia, raiva e ódio,
parecia
que até o momento estava oprimindo todos
esses sentimentos. Estendeu as unhas pontudas
para cima e
tentou atacar Marina, no momento em que
tentou esse feito, Baltazar o presentou com um
soco de mão
cheia em seu rosto, que o fez voar de volta a
parede, batendo a cabeça no vidro da janela e o
estilhaçando,
o homem escorregou da parede ao chão, o soco
foi o suficiente para o apagar, os homens que
estavam ao
redor saíram correndo debaixo da chuva, todos
assustados e espantados com o que havia
acabado de
acontecer.
Baltazar se afastou com Marina em seu colo,
ela ainda encarava o homem, que agora estava
desacordado

111
no chão, coberto por cacos de vidro, era quase
impossível de ver os cacos, eles não refletiam
nada, apenas
o cinzento céu e a chuva densa.
—É um doido qualquer, deveríamos estar
acostumados com gente assim—
—Sete…— Marina soou em um tom baixo,
quase silencioso, mas que fora perceptível,
ficamos em
silêncio olhando para ela.
—O que?— Ela me olhou pelo canto dos olhos
e apenas continuou em silêncio.
26
Melancólica Sombra
Velho número Sete
Tudo aquilo que havia acabado de acontecer foi
muito estranho, parando para pensar melhor,
encontrei
muitas coisas estranhas durante minha jornada
atrás do Buffalo Black, mas esse acontecimento
foi um
tanto intrigante.

112
Na noite do mesmo dia Baltazar havia arranjado
um pedaço quebrado para passarmos a noite e
voltar ao
trabalho durante a manhã, trouxemos junto o
misterioso homem dos cabelos negros, ele ainda
estava
desacordado, escorado na parede onde Baltazar
o deixou, Marina estava adormecida e Baltazar
aparentemente estava do lado de fora, vagando
em seus pensamentos.
Eu estava sentado a frente do homem, estava
curioso e tentando achar um motivo para aquela
confusão
que ele fez, eu não me lembro de ter visto
Marina tocar nele, ou vice versa, será que eles
são conhecidos?
Muitas perguntas para nenhuma resposta,
quanto mais eu o olhava, mais questionamentos
se criavam.
—Por que você o trouxe?— Perguntei para
Baltazar, que estava sentado na porta, ele ficou
em silêncio

113
por um tempo, soltou um suspiro e me olhou
pelo canto dos olhos.
—Você acha normal o que ele fez?— Fiquei
pensativo por um tempo, arqueei uma das
sobrancelhas e
disse sem tirar os olhos do homem.
—Não, mas poderia ter sido um cenário de
surto psicótico, ele parece ser bem estranhinho,
coitado, não
acha?— Ele escorou a cabeça na borda da porta
e deu um sorriso de canto.
—Pois é, sabe, Tim, tem coisas nesse mundo
que não tem explicações— No momento em
que ele me
disse isso, um gatilho despertou em mim, me
recordando de que Ralph havia me dito a
mesma coisa,
fiquei em silêncio por um tempo, Baltazar me
olhou estranhando um pouco.
—O que foi, garoto?—
—Que coisas são essas?, Ralph havia me dito
algo parecido— Disse para ele enquanto
abraçava os

114
joelhos e desviava o olhar, Baltazar arqueou as
duas sobrancelhas, um pouco surpreso e
desviou o olhar
de volta para a rua.
—Você vai descobrir, aliás, talvez a situação
desse jovem tenha ligação com os casos que
ocorrem
aqui— Afirmei com a cabeça, mas ainda estava
pensativo, perdido nos meus pensamentos. Num
instante
notei que o homem estava se mexendo, e
tampouco demorou para ele despertar, me virei
e fiquei o
encarando. Ele abriu os olhos devagar, mas
logo os fechou novamente em um reflexo de
dor, levou a mão
para a testa, sentindo um latejar.
—O senhor está bem?— Perguntei um pouco
preocupado, ele abriu um dos olhos e me olhou,
imediatamente tirou a mão da testa e levantou
as duas sobrancelhas em um espanto, tentou se
afastar, mas

115
a parede atrás o impediu. Continuei parado o
encarando, essa reação era esperada, ele ainda
parecia
assustado e abatido, tentei não invadir o espaço
dele naquele momento para não piorar as
coisas.
—Ei, se acalme, eu não vou te machucar— Ele
estava paralisado, e me encarava sem sequer
piscar os
olhos.
—Quem é você?? Onde eu estou?— Ele
perguntou bastante agitado e assustado.
27
—Eu sou o Tim, e você está em um quebrado
de Stephenville— Eu não queria deixar ele com
um
sentimento de desconfiança, queria ser o mais
transparente possível para tornar minha
comunicação com
ele fácil.
—Olha, não precisa ficar com medo, querido,
eu não vou tocar em você, podemos apenas
conversar?—

116
Ele continuou me encarando em silêncio, mas
logo se sentou no chão e cruzou as pernas.
—O que você quer de mim? Eu não consigo
acreditar onde eu me meti, eu devo estar em
uma onda de
azar terrível, não é possível — Ele tirou o
chapéu e ficou resmungando por um tempo. Em
seu chapéu eu
consegui notar um pingente de prata preso a
aba, com uma sequência de três números: 777.
—Você é daqui, jovem?—
—A única sorte que eu tenho no momento, é a
de não ser daqui, eu sou de Dallas— Fiquei um
pouco
espantado, era uma distância extremamente
grande de Dallas a Stephenville, e ele não
parecia estar aqui
por vontade própria.
—E o que você faz tão longe??— Ele abaixou o
olhar e ficou em silêncio por um tempo.
—Longa história—

117
—Eu tenho a noite toda— Dei um sorriso e me
sentei ao lado dele, ele me encarou enquanto
segurava o
chapéu pela aba e passava o dedo pelo pingente,
parecia ansioso.
—Antes de tudo, Como você se chama,
forasteiro?—
—Sete, eu me chamo Sete Zacarias — Fiquei
um pouco espantado, foi exatamente o que
Marina havia
dito mais cedo, isso me fez pensar novamente
na hipótese de ambos terem algum tipo de
ligação e eu
precisava saber o que seria.
Baltazar se levantou esticando o corpo e
caminhou na nossa direção, Sete se espantou no
momento que
o viu, se recordou do soco que havia levado
dele e se gelou dos pés a cabeça, fiquei
assustado com a
reação dele mas tentei o acalmar.
—O que ele faz aqui??!—

118
—Ei Sete, se acalme, ele está comigo, não vai
te machucar, a não ser que você peça — Dei um
sorriso
nervoso e olhei para Baltazar.
—Você quer mesmo que eu acredite nisso??—
Disse Sete bastante assustado, e com a mão
sobre um
enorme hematoma em seu rosto que ganhara
mais cedo.
—Isso é só um detalhe, e você pediu— Disse
Baltazar de pé a frente dele, com os braços
cruzados.
—Eu não teria feito se você não tivesse
avançado— Arqueou os ombros e levantou uma
das
sobrancelhas enquanto encarava Sete, Baltazar
se sentou do meu lado e cruzou as pernas,
continuando a
encarar o pálido.
—Vamos, nos diga o porquê você está aqui—
Sete o encarou com receio e estranheza, se
aproximou de
mim ainda um pouco na defensiva.

119
—Vocês são estranhos…— Baltazar o encarou
em silêncio com os punhos entre as pernas, no
momento
que Sete percebeu ele se estremeceu e me olhou
com as sobrancelhas franzidas e uma expressão
de
nervosismo.
—Sabe, eu morava em Dallas com minha
noiva, minha querida Isabelle— Ele abaixou o
olhar, parecia
que esse era o ponto de aflição e depressão que
amaldiçoava ele, apenas fiquei em silêncio o
encarando.
—Durante a noite do dia 13 eu acordei sem
minha Isabelle, eu estranhei de imediato, estava
sozinho em
casa e um silêncio ensurdecedor, sabe, eu senti
um arrepio descer por todo o meu corpo, eu
queria
procurar por ela, mas um medo ardente me
sufocava— Ele deu um suspiro e desviou o
olhar, parecia ter

120
dificuldade para contar, um nó sufocante em
sua garganta.
28
—Não demorou muito para que eu soubesse
que Isabelle havia sido raptada, eu procurei por
ela em todo
canto do Texas, eu varri cada beco e estrada, e
não encontrei nada, por um bom tempo eu não
aceitei que
havia perdido meu amor, estava cegado e
perdido em uma fúria e ódio, passou-se uma
eternidade e pela
glória de meu bom Deus, acabei a encontrando,
eu senti um alívio e orgulho imenso, por não ter
desistido,
pois finalmente eu pude estar com minha
querida— Ele deu uma risada curta, uma risada
cansada e
deprimida, olhou para mim e para Baltazar pelo
canto dos olhos.
—O mais engraçado, é que isso era apenas uma
ilusão da minha mente, Isabelle foi morta em
minha

121
frente, mas por algum motivo que eu
desconheço, meu cérebro se negou tanto ao
ponto de mascarar esse
acontecido, eu vi minha amada ser devorada por
uma besta enorme e sanguinária, e ao lado dela
havia
uma criança, uma garotinha de cabelos negros e
um olhar doce e inocente— As palavras dele
tinham um
peso enorme, um homem banhado a desgraça e
infelicidade. Percorreu em meu corpo um
arrepio ao ouvir
ele descrever, e um gatilho quando disse sobre a
garotinha, parecia com Marina, mas era
impossível que
ela tivesse algo a ver com esse ocorrido.
—E isso aconteceu aqui?Em Stephenville?—
Ele afirmou e encaixou o chapéu em sua
cabeça.
—Cidade amaldiçoada, provavelmente o Xerife
daqui deve ter passado pelo mesmo que minha
Isabelle— Baltazar o encarou, bastante
intrigado.

122
—E você se lembra onde aconteceu, jovem?—
Ele perguntou para Sete.
—Claro, infelizmente não tenho o prazer de
esquecer, mas eu diria que lá é um lugar que
nem mesmo o
homem menos sã do mundo desejaria estar—
Levantei o olhar para Baltazar, que devolvia em
uma troca
de olhares, em seguida olhamos para Sete.
—Onde seria?— Sete me encarou espantado,
surpreso com tamanha audácia.
—Oh, vocês não são doidos de irem lá, ou são?
— Ele virou o rosto, ainda nos encarando,
esperando
uma resposta sã.
—Claro que vamos, esse é o nosso trabalho —
Disse Baltazar enquanto me puxava para perto,
colocando seu braço em volta do meu pescoço,
olhei para Sete e ele estava incrédulo.
—Olha Sete, não precisa se preocupar, na pior
das hipóteses, poderemos dizer pessoalmente
para

123
Isabelle que você sente falta dela— Dei
algumas batidinha no ombro dele.
—Haha! Vocês são loucos, malucos!!— Ele
caiu em gargalhadas.
—Bom, eu posso fazer isso para vocês —
—Ótimo, vamos pela manhã—
—Não consigo acreditar nisso, não creio que
estou podendo presenciar tamanha comédia!—
Sete me encarou por um tempo, e apoiou uma
das mãos em meu ombro.
—A noite é o melhor momento para ir lá — Ele
deu um pequeno sorrisinho, estava espantado
com toda
essa situação mas dava para ver que havia uma
chama acesa em suas esperanças, ele parecia
estar
orgulhoso de ter encontrado alguém com a
coragem que ele não teve.
—Vamos então, quanto antes, melhor— Disse
Baltazar já se levantando.
Estávamos nos preparando para finalmente dar
início a verdadeira jornada, não fazíamos ideia
se o que

124
aconteceu com Sete era obra do Buffalo, mas
também, não saberíamos se não apostarmos na
sorte.
Enquanto Baltazar organizava as coisas, fui
para uma parte do sobrado onde Marina estava
dormindo,
acorda-lá para continuarmos a estrada.
Quando cheguei lá, para minha surpresa e
espanto, Marina não estava, fiquei por um
tempo parado
frente a porta, caminhando com meus olhos
pelo cômodo, procurando por ela, foi em vão,
não havia
nenhum sinal da garotinha, havia desaparecido,
sai imediatamente do cômodo e fui até onde
estava
Baltazar e Sete, estava assustado e desesperado,
os dois me encararam um tanto confusos e
perdidos.
29
—A Marina sumiu!— Baltazar levantou as
sobrancelhas e foi até o cômodo checar por si
próprio, mas o

125
mesmo aconteceu, não havia nenhum sinal. Sete
ainda estava perdido e bastante confuso.
—Marina?—
—Estávamos com uma garotinha, resgatamos
ela—
—Garotinha…?—
—Ela desapareceu— Disse Baltazar, se
aproximando com as mãos apoiadas no cinto.
—Precisamos ir logo, se essa não era a hora
certa, agora é— Peguei a bolsa e fui para fora
rapidamente,
Baltazar e Sete vieram logo atrás, prendi as
coisas em Bigmouth, desamarrei a corda que
prendia ele em
uma estaca de madeira pregada a fachada do
quebrado, estava ofegante e mil e um cenários
se passavam
em minha cabeça.
Andamos por horas debaixo do céu negro e
quase absoluto, não haviam estrelas, e muito
menos nuvens,
estava limpo, totalmente varrido, o sereno
estava forte, caindo do céu poucas gotas.

126
Sete estava tomando a frente, assobiava uma
melodia exótica que por conta do silêncio
gritava e ecoava
pelos becos e cantos da estrada, mesmo que
fosse baixa e suave, não incomodava, mas
causava um
sentimento peculiar, um arrepio na espinha.
Atravessamos vales obscuros onde mal
sabíamos o que as sombras guardavam, estrada
de terra
totalmente desertas, pareciam que havíamos
saído de Texas, mas toda aquela obscuridade
era a beleza
exótica de Stephenville. Depois de muito
caminho andado, nos aproximamos de uma
floresta, era pequena
e não rendia muitas árvores, estava cercada por
mato, haviam duas enormes cápsulas de aço se
estendendo, pareciam silos; também havia um
tipo de galpão e dois depósito. Isso era apenas o
que era
possível ver da distância em que estávamos.

127
Sete parecia pensativo, encarava a caravana
distante, parecia estar perdido entre as nuvens
negras e
desgastadas que rondavam aquele lugar.
—Chegamos?— Perguntei enquanto o olhava,
Baltazar parecia atento, encarando um ponto
fixo no
além, estava com uma expressão nada
agradável, Sete virou o rosto de lado e me olhou
pelo canto dos
olhos.
—É aqui que eu me despeço de vocês,
forasteiros— Se virou e olhou para mim e para
Baltazar.
—Tomem bastante cuidado, os demônios são
bastantes astuciosos— Engoli seco, não
consegui esconder
o fato de que estava com medo, o sentimento
que aquele lugar me causava era como um
desespero
agoniante, mas isso não me impedia de
continuar, Baltazar parecia estar decidido.
—Certo, muito obrigado, Sete—

128
—Espero que vocês consigam vingar minha
querida Isabelle— Ele sorriu com os olhos,
tirou o chapéu e
deu um tapinha no meu ombro.
—Até algum dia— Ele diz olhando para mim, e
em seguida subindo o olhar para Baltazar, que
apenas
afirma com a cabeça. Sete se afastou e seguiu
seu caminho de volta, me virei para vê-lo partir,
talvez essa
fosse a última vez que eu veria esse homem
peculiar, banhado na melancólica e discórdia, a
sorte de dois
extremos. Por alguns segundos, em uma
distância não muito grande, Sete parou de
caminhar, ainda
segurava o chapéu com as mãos, se virou em
direção a gente e ficou em silêncio por um
tempo.
—Antes, eu queria dizer algo—
—O que?— Perguntei, bastante curioso.

129
—Vão pela sombra— Ele sorriu e colocou o
chapéu de volta, retornando a estrada,
assobiando a mesma
melodia exótica e ensurdecedora de antes.
30
Escaramuça
Caravana da misericórdia
Senti novamente o arrepio passar por todo o
meu corpo da cabeça aos pés, como um choque,
levantei o
olhar para Baltazar, ele estava encarando Sete
caminhando devagar pela estrada, no além,
quase
desaparecendo entre a escuridão da madrugada.
—Será esse o fim da nossa jornada?—
Perguntei sem tirar os olhos das caravanas.
—Espero que sim— Disse Baltazar, voltando
sua mente para a realidade e olhando para a
mesma
direção.
—Vamos, não podemos ficar enrolando aqui—
Apenas assenti com a cabeça e tomamos partida
rumo às

130
caravanas.
★★★
O cheiro de morte ficava mais forte a cada vez
que nos aproximávamos, me causava náusea e
uma
vontade imensa de vomitar, o ar gélido me dava
calafrios, um zumbido agudo e aterrorizante
ameaçavam
ensurdecer meus ouvidos.
Escutamos alguns gritos abafados vindo de
muito distante, poucos segundos depois deixou
de ser
apenas um grito e se tornou vários, muitos
gritos de horror e desespero, implorando pelo
mísero sentido
de viver. Naquele momento eu estava
completamente horrorizado e pálido, estava em
um estado de
choque completo e por vezes me sentia
decepcionado por me sentir assim.
Baltazar tomava a minha frente como das outras
vezes.

131
Ainda me pergunto se eu estaria aqui se
estivesse sozinho, entretanto de qualquer jeito,
eu me esforçaria
ao máximo, pois eu cheguei tão longe por um
único objetivo, não desistiria nem que custasse
minha vida,
morreria com uma estaca de desespero e terror
cravada em mim, mas não fugiria.
Adentramos o meio da mata pelo ao redor das
caravanas, estávamos mais próximos do que
nunca, era
possível escutar algumas vozes, pareciam estar
tranquilas e apenas conversando. Baltazar
estava agachado
a minha frente, recarregando o rifle enquanto
forçava a visão para ver algo entre as folhagens.
—Temos companhia — Disse ele terminando
de recarregar o pente de balas, ajeitou o rifle em
suas
mãos e mirou em um ponto fixo. Eu estava
totalmente atento em suas ações, abaixei a
cabeça para

132
enxergar a área de uma maneira mais ampla e
melhor entre as folhagens. Baltazar estava
mirando em dois
caipiras que escoltavam a entrada principal da
caravana, pareciam ser guardas, ambos
seguravam uma
escopeta e não pareciam ter percebido a nossa
presença.
A entrada era um pouco distante das caravanas
em si, caso houvessem tiros ou gritos, mal
poderiam ser
escutados, apenas se estivesse com os ouvidos
totalmente concentrados aos sons do ambiente.
Após alguns segundos Baltazar disparou a bala
que foi em direção aos caipiras como um
foguete, mal
consegui notar quando foi disparada. A bala
atravessou o crânio de um dos guardas e em
seguida
atravessou a testa do outro guarda que estava ao
lado. Ambos caíram no chão imediatamente, foi
uma

133
morte instantânea, não houve gritos, apenas o
som do único disparo feito por Baltazar. Aquilo
me deixou
impressionado com tamanha habilidade.
—Isso foi incrível!— Disse olhando para
Baltazar com um enorme apreço, ele apenas me
olhou de volta
e sorriu de canto enquanto encaixava o rifle no
cinto.
31
—Vamos, garoto, hora de entrarmos no
território do inimigo —
Nos aproximamos da entrada, onde estavam os
corpos sem vida dos caipiras. Me pergunto
sobre o que
eles conversavam e qual teriam sido suas
últimas palavras antes de serem abraçados pela
morte. Baltazar
se aproximou dos corpos e os cutucou com o
bico da bota, apenas para ter certeza, estavam
molengos e
cobertos por sangue.

134
Por fim, estávamos nos confins do inferno, o
chão coberto por cascalhos e britas, havia
algumas árvores
e arbustos pelos cantos e num distante a frente
já era possível notar o galpão e as enormes
cápsulas, que
conforme íamos nos aproximando sentíamos
um forte cheiro podre vindo delas. Eu estava
com as mãos
encaixadas em ambas coronhas dos colts, atento
a qualquer barulho ao redor.
Enquanto caminhávamos, escutei um som vindo
de trás, um galho se quebrando, me virei
rapidamente e
vi uma sombra humana parada ao meio da
estrada de cascalho, Baltazar se virou
imediatamente também
já sacando o rifle.
Eu estava tentando enxergar qual seria a figura
que estava ali, pois provavelmente seria algum
inimigo.

135
A sombra levantou as mãos em um sinal de
redenção e se aproximou devagar. Era um
homem alto com
vestes pretas e longas, seu rosto era coberto
pela sombra do chapéu. Quando ele estava em
uma distância
considerável a luz dos postes de iluminação das
caravanas revelou seu rosto, que por surpresa eu
o
reconheci, era o vagabundo do Marshall, um
dos 7 capangas do Buffalo, quando parou de se
aproximar
ele nos encarou e disse:
—O que fazem aqui?? É uma propriedade
privada—
—Cale a boca, ninguém te perguntou— Disse
Baltazar enquanto mirava o cano do rifle na
cabeça de
Marshall.
Marshall o encarou com uma expressão ousada
e abaixou as mãos

136
—Me desculpem, mas eu tenho ordens a
cumprir— Em uma velocidade sobrehumana e
inimaginável,
no qual nem eu e nem Baltazar fomos capazes
de captar, Marshall apunhalou o coldre e mirou
em nossa
direção
—Eu não vou precisar usar isso se vocês se
oferecerem a se retirar— Disse ele enquanto
engatilhava o
coldre, Baltazar o olhou com um expressão
desagradável, parecia estressado
—Onde está o seu chefe!?— Baltazar gritou
para ele.
—De que adianta você saber se nem sequer vai
conseguir chegar até ele— Marshall deu um
sorriso de
orelha a orelha após dizer, se aproximava mais
ainda com o coldre apunhalado e apontado para
nossas
cabeças.

137
No instante em que ele se aproximava, puxei
rapidamente os dois colts e disparei numa
velocidade
espantosa em direção a Marshall, as balas
atravessaram seu estômago e em um
movimento de reflexo
Marshall soltou o coldre, que disparou uma bala
após esbarrar o dedo no gatilho, a bala acertou
em cheio
a perna de Baltazar, ele caiu no chão
imediatamente, urrando de dor.
—Seu Merda!—
—Baltazar?? Você está bem??—
—Atire nele, Tim! Mate esse vagabundo!—
Baltazar estava gritando para mim enquanto
estava com
uma das mãos em sua perna ferida, Marshall
estava caído de joelhos com uma das mãos no
estômago e
com a outra estava tentando alcançar o coldre
novamente. Aproveitei o momento para me
aproximar dele,

138
chutei o coldre para longe, Marshall me olhou
com uma expressão de dor e ódio.
—Seu porre! Meu chefe vai fazer picadinho de
vocês dois!!—
—Cala a porra da boca!— Gritou Baltazar.
32
Eu não me importei com nada que ele estava
dizendo, um sentimento de raiva se apossou
completamente de mim, mirei um dos colts em
seu rosto. Marshall estava caindo em
gargalhadas, não me
hesitei nem um pouco e disparei o colt em seu
crânio, que no instante que chocou com a bala
se partiu ao
meio, criando uma cachoeira de sangue. Por
conta do barulho, vários homens surgiram,
haviam
aproximadamente 8, todos estavam armados e
assim que nos viram próximo ao cadáver de
Marshall
começaram a atirar sem parar em nossa direção,
corri imediatamente para perto do Baltazar para
ajudá-lo

139
a levantar e sairmos dali.
Enquanto estava nessa situação, Baltazar e eu
fomos acertados por alguns dos disparos,
Baltazar gemeu
de dor e cuspiu sangue, soltou um grunhido e se
apoiou em mim, estávamos em uma situação
desagradável, em um momento em que me virei
em direção aos homens, fui concebido com uma
bala na
direção do meu rosto, havia atingido meu olho
direito, eu estava tão confuso que minha única
reação foi
um grito de dor, senti uma dor insuportável e
quase mortal, estava ofegante e gemendo, mas
mesmo
diante isso estava focado em apenas tirar
Baltazar de lá, tentamos correr em direção a
mata que ficava ao
redor das caravanas, por conta de nossa má
condição foi um verdadeiro desafio, os homens
estavam atrás

140
disparando sem parar, o que tornou tudo mais
complicado ainda. Corríamos freneticamente
pela mata até
que paramos de escutar os passos apressados e
escutamos alguém gritar.
—Eles desapareceram na mata! Recuar!
Fiquem atentos a partir de agora!!— a
escuridão quase absoluta
da madrugada foi o suficiente para nos
dispersar dos homens.
Após nos distanciarmos deles parei de correr
com Baltazar e me aproximei de uma enorme
árvore,
caímos no chão imediatamente, ambos
estávamos debilitados por conta dos tiros,
estava ofegante e mal
sentia meu corpo, meu rosto estava encharcado
de sangue, latejava por conta da dor, estava
tonto e com
náuseas, olhei com dificuldade para Baltazar
que estava caído ao meu lado soltando alguns
murmúrio e
xingamento.

141
—Merda! Chegamos tão perto— Eu apenas dei
uma risada curta.
—Nós quase morremos, Baltazar— Coloquei
uma das mãos no meu olho que foi ferido,
quando abri a
pálpebra notei que não estava enxergando, meu
coração disparou e eu senti uma pontada me
atravessar
por completo, estava banhado num desespero
interno e paralisado, Baltazar se sentou, estava
com a mão
na cabeça, eu mal conseguia me levantar, muito
menos me sentar, estava em um estado de
choque,
Baltazar desceu o olhar para mim e encarou
meu rosto, imediatamente se formou uma
expressão
assustada em seu rosto.
—Puta merda! Cadê o seu olho Tim???— Eu
mal consegui responder, estava aterrorizado e
paralisado,

142
encarando Baltazar com o único olho que me
funcionava, ele se virou para mim e me pegou
nos braços,
estava olhando para o meu rosto confuso,
parece que estava tentando adivinhar o que
havia acontecido,
como a bala poderia ter feito um estrago tão
feio sem me matar. Ele rasgou um pedaço da
roupa e passou
em meu rosto, limpando o excesso de sangue,
em seguida o amarrou em minha cabeça
tampando o
ferimento e me encarou por alguns segundos.
—Veja só, não está tão ruim— Meu olho se
encheu de lágrima, eu apenas dei um sorrisinho
e franzi as
sobrancelhas para cima.
—Uma das balas acertou o meu olho—
—Eu estou vendo, como você está se sentindo?
— Eu estava tremendo, segurando firme o
braço de
Baltazar, eu apenas respirei fundo e olhei para
ele.

143
—Se eu pudesse, eu morreria agora— Ele deu
um sorriso preocupado.
—Você não pode desistir agora, garoto—
33
—Você tem razão— Limpei minhas lágrimas
com as costas da minha mão, estava manchada
com uma
mistura de lágrimas e sangue, desci o olhar,
estava sentindo um tipo de sentimento no qual
era impossível
de se descrever, estava me sentindo injustiçado
e decepcionado.
—Baltazar, você acha que eu seria capaz de
matar o Buffalo sozinho?— Ele me olhou por
um tempo,
enquanto estava tirando as balas de sua perna.
—Para ser sincero, garoto, não — Olhei para
ele com uma expressão deprimida.
—Deus não me permitiria tal feito— Ele deu
um leve sorriso enquanto ainda tirava as balas.
—Bom, talvez ele não queria que você fizesse
isso sozinho—
—Qual o sentido disso?—

144
—Eu estou com você nessa situação, talvez
nem eu ele permitiria fazer tal coisa sozinho,
agh!— Disse
ele e logo em seguida retirou a bala de um dos
ferimentos, rasgou mais um pedaço da roupa e
amarrou em
volta.
—Sabe Tim, talvez haja algum motivo para não
estarmos nessa sozinhos—
—Talvez— Estava pensativo, vendo ele
amarrar o pano sobre o machucado.
—É bom você colocar algumas dessas folhas ao
redor antes de amarrar o pano— Disse enquanto
pegava
algumas folhas e colocava sobre o machucado
dele—
—Essas são especiais, vão ajudar na
cicatrização, aprendi isso com minha irmãzinha
— Ele me olhou
surpreso, mas não me impediu, logo em
seguida, peguei o pano e o amarrei.
—Você tem uma irmã?— O olhei um pouco
pensativo.

145
—Sim, Lucy, ela está esperando por mim lá em
San Angelo —
—Por que você está nessa, Tim?—
—Atrás do Buffalo?—
—Sim— Abaixei o olhar e fiquei em silêncio
por alguns segundos.
—Buffalo matou a esposa do meu pai, e ainda
continua matando e sequestrando milhares de
pessoas no
Texas— Soltei um suspiro e olhei para ele.
—Eu quero acabar com aquele vagabundo —
—Nós vamos acabar com aquele vagabundo —
Ele sorriu e deu alguns tapas em meu ombro, se
apoiou
em uma árvore e se levantou, estava esticando a
perna na qual havia sido atingida, esticando e
retraindo.
—Você consegue se levantar, garoto?—
Naquele momento eu estava mais tranquilo, a
vontade de
cumprir meu objetivo havia atordoado meus
sentidos, me levantei e olhei para Baltazar.
—Aparentemente, sim—

146
—Ótimo, vamos continuar — Apenas afirmei
com a cabeça.
★★★
Continuamos a procura, naquele momento
decidimos ir pela mata, seria menos perigoso e
nós
precisávamos estar preparados para o quer que
acontecesse daqui pra frente.
Pelos cantos era possível ver as cápsulas, o
galpão e um dos depósitos, os sons de tortura
aumentavam a
cada passo que davamos, Baltazar estava com o
rifle em mãos e obeservava o local. Quando
íamos
chegando mais perto da porta de um dos
depósitos era claramente perceptível o sons de
gritos, barulho de
algo pesado sendo arremessado e um grito
totalmente diferente de todos que já ouvi em
minha vida.
Estávamos encostados na parede de trás do
balcão, eu estava analisando a área enquanto
Baltazar focava

147
na frente, aparentemente não havia ninguém por
ali, eu me perguntava se era comum ter gente
ali, pois o
cheiro podre era sufocante.
34
—Ei, Tim, fique atento, eu vou arrombar a
porta e nós entramos de uma vez, certo?— Ele
me disse
enquanto me olhava pelo canto dos olhos,
apenas assenti com a cabeça.
—Prepare seu colt— Ele sorriu e caminhou
agachado em direção a porta do depósito, fui
atrás dele com
as mãos punhaladas na coronha dos colts.
★★★
Enquanto eu estava atento ao redor, servindo
como um reforço para Baltazar, escutei um
barulho
estrondoso vindo da porta, quando me virei para
olhar, Baltazar havia a arrebentado com apenas
um

148
chute, eu fiquei bastante assustado de imediato
mas corri imediatamente para perto dele.
Entramos dentro
do depósito de uma vez e nos deparamos com
uma das cenas mais aterrorizantes que eu já vi
em toda
minha mísera existência.
O lugar era enorme, gigantes paredes
manchadas a uma altura inimaginável por
sangue de uma
coloração cegante, um vermelho vibrante. O
teto respingando tripas e mais sangue, no meio
do depósito
havia uma pilha imensa de corpos, espalhados
por todo o chão, pernas e braços, cabeças e
troncos
decepados que cobriam o depósito inteiro, o
cheiro de morte que havia no local fazia o meu
nariz arder,
respirar lá dentro era de grande dificuldade.
A sensação de estar lá era a mesma de estar no
inferno, uma cena de carnificina. No topo da
enorme

149
montanha de corpos havia um ser que teria
saído diretamente do inferno, era a primeira vez
que eu estava
vendo algo do tipo. Era como um demônio, o
pior dos piores, o mais amaldiçoado e
confinado à loucura
eterna. Era um ser imenso, havia braços
gigantes, que no mínimo dariam cinco de mim,
olhos bestiais,
reluzentes de um brilho vermelho vivo, uma
face animalesca, dentes gigantes e afiados. Em
sua boca
estava a cabeça de uma mulher, ainda viva e
inteira, tomada pelo desespero e gritando pela
vida, parecia
que iria ser separada de seus membros no
instante em entramos, mas foi interrompido.
O monstro olhou no fundo das nossas almas e
arremessou a mulher na parede, que se chocou e
explodiu
por conta da força em que foi jogada, espirrou
carne e sangue para todos os lados. Naquele
instante,

150
Baltazar gritou para eu me afastar, mas eu
estava em um choque gélido, paralisado estava
apenas com os
colts empunhados, apontado para frente, em
uma direção na qual nem eu mesmo sabia para
onde
disparariam. Baltazar estava a minha frente com
o rifle apontado para a enorme besta. Quando
menos
esperamos, ela uivou e começou a arremessar
os corpos que estavam na enorme pilha em
nossa direção.
Um dos corpos veio a me acertar em um
momento no qual eu me encontrava totalmente
despreparado,
eu ainda processava tamanha informação. O
corpo me arremessou consideravelmente longe,
bati contra a
parede do depósito que ficava próxima a porta,
fez um barulho estrondoso, tudo aconteceu
muito rápido.

151
Baltazar gritou o meu nome e naquele momento
no qual não pude ver o que acontecera, ouvi
disparos,
muitos disparos e mais uivos e gritos da besta.
Eu estava coberto por sangue e restos do corpo
que foi arremessado em mim, Baltazar se
aproximou e
retirou o corpo de cima de mim, me olhou
enquanto segurava a arma
—Você está bem?? Fique esperto garoto,
encontramos o Buffalo Black— Ele sorriu para
mim, dava pra
ver em sua face um misto de sentimentos,
medo, raiva e felicidade.
No momento em que me caiu a ficha de que
aquela besta era o maldito do Buffalo um ódio
imenso e
uma alegria alarmadora se apossou de mim, me
levantei rapidamente e limpei o rosto com o
antebraço. A
besta estava atirando corpos na direção de
Baltazar, que por uma incrível sorte, desviou de
todos, ele

152
tentava se aproximar mas surgiam mais e mais
obstáculos. Aproveitei aquele breve momento
para mirar
os dois colts em direção ao Buffalo e começar a
atirar se parar.
35
Das balas que acertaram, fizeram um grande
estrago, a besta urrou de dor e mostrou-se os
dentes,
voltando sua atenção totalmente para mim.
Buffalo se aproximava cada vez mais, com
aquelas enormes
garras prontas para me agarrar, o medo me
tomava por completo, mas eu não conseguia
encerrar o
simples ato de atirar sem parar. Cada bala que
acertava, a besta tomava um impulso para trás.
Enquanto eu
estava naquela ação, notei que Baltazar estava
próximo a besta, com a arma na boca e mexia
em algo no

153
bolso da calça, o momento era perfeito para
fazer o quer que ele quisesse, a besta estava
totalmente
focada em mim.
Baltazar retirou uma lâmina reluzente do bolso,
aparentava ser de prata e a cravou com toda a
força na
perna do Buffalo, que naquele momento notou a
presença dele e por um descuido, agarrou
Baltazar
imediatamente. Eu entrei em um sentimento de
desespero enorme ao ver a besta o tomando, ele
estava
sendo comprimido, quase sufocado, Buffalo o
aproximou de seu medonho e pavoroso rosto, o
que me fez
ficar mais em choque, apenas continuei
disparando as balas em direção a ele. Em um
choque de tempo, a
besta arrancou uma parte do braço do Baltazar
com os dentes, o pobre coitado urrou de dor e
se remexeu
sem parar enquanto era agarrado pela besta.

154
Meu pente estava quase por acabar e haviam
apenas algumas balas, eu não poderia deixar
isso tudo ir
em vão. Corri em direção ao Buffalo, me
aproximei o suficiente para que meus últimos
disparos fossem
certeiros. Naquele instante eu ouvi uma voz me
chamar, era uma voz familiar, era Marina, ela
estava
parada a frente da porta do depósito, estava
gritando por mim, em um tom desesperador. No
momento em
que me virei para ver Marina, me descuidei e
fui agarrado pelas garras de Buffalo, a garota
começou a rir
e a comemorar.
—Isso papai!! Você o pegou em cheio!!— Ela
disse em gargalhadas, levei um choque de
realidade ao
perceber que Marina era nada mais nada menos
que o meio de informações que Buffalo Black
usava

155
contra nós, um sentimento de injustiça e ódio se
apossou do meu coração,
olhei para cima e vi o rosto da maldita besta,
Baltazar estava caído no chão, banhado a
sangue. Aquele
momento era mais do que perfeito para dar um
tiro em cheio no crânio de Buffalo.
Ele me aproximou de sua boca coberta por
imensos e afiado dentes, fui sufocado pelo bafo
podre de
carne, e no momento em que a abriu para
separar o meu troco da parte inferior do meu
corpo com seus
dentes, disparei três balas dentro de sua boca,
que atravessaram seu crânio num raio de luz, a
besta se
paralisou por um tempo e começou a despencar
no chão, suas mãos se amoleceram o suficiente
para me
soltarem, eu senti um alívio enorme, não pensei
duas vezes e corri até o Baltazar para ajudá-lo,
estava
vivo e se arrastava.

156
—Baltazar!! Eu matei ele Baltazar!!— Eu dizia
enquanto corria até ele, vendo a besta atrás de
mim cair
em meio aos milhares de corpos, me abaixei
próximo a ele e apoiei o seu único braço em
meu ombro,
focando em me afastar dali o mais rápido
possível. Enquanto eu estava me afastando com
Baltazar,
tentava pensar e organizar as coisas que
estavam acontecendo naquele instante, foi tudo
tão rápido, aquele
realmente era o tenebroso Buffalo Black?,
Como que isso poderia ser verdade, eu estava
tão assustado,
mas eu estava em uma grande felicidade
interna, impressionado pois eu o havia matado,
ainda
desacreditado e espantado com o fato de Marina
estar envolvida em tudo isso, e que
provavelmente a cena

157
que ocorreu quando a encontramos foi tudo
planejado, isso me deixava com um sentimento
enorme de
traição.
Quando eu me aproximava da porta de saída do
depósito, bati de frente com mais 6 homens,
todos
estavam armados e seus rostos eram familiares,
seriam o resto dos capangas do Buffalo. Eles
apontaram
as armas para nós enquanto barravam a saída,
meus colts estavam sem balas e não havia
momento para
36
recarregá-lo, Baltazar estava banhado a sangue,
apoiado em mim, eu não sabia se ele seria capaz
de fazer
algo no momento, para falar a verdade, eu mal
sabia se ele estava vivo.
—Fique parado aí!— Gritou um dos bandidos,
ele disse enquanto se aproximava, queria entrar
dentro do

158
depósito. Eu estava em choque, parado em meio
a eles. Quando entrou se espantou com a cena
de
tamanho caos, se debulhou ao ver Buffalo
Black caído em meio aos corpos, banhado por
sangue, se virou
para mim, com as mãos na barriga e uma
expressão furiosa ele deu ordem para os outros
bandidos
atirarem. Eu achei que iria morrer naquele exato
momento, eu aceitei isso, estava com a
consciência limpa
e não me importaria de morrer de tal jeito. Os
homens que estavam nos cercando começaram
a disparar
como se não houvesse amanhã.
Naquele instante tudo escureceu, estávamos
banhados a sombra e sangue. A única visão que
tive antes
de cair completamente num abismo profundo e
obscuro, foi uma forte, quase cegante luz,
cobrindo todo o

159
local, gritos de desespero no qual não pude
discernir de quem ou do que seriam. Um calor
cobriu o local,
e o ar se tornou impossível de se inalar. Após
isso, tudo ficou em um completo silêncio.
37
Estrada da Cobra
De volta a San Angelo
No breu do abismo, eu estava vagando.
Não ouvia absolutamente nada além de
murmúrios e alguns sons que eu não consegui
identificar. Minha
cabeça estava latejando de dor, e meu coração,
pelo incrível que parecia, estava calmo, leve
como uma
pena. Caminhando, sem rumo, não sabia por
onde andava naquela estrada deserta e escura,
não havia
nenhum sinal de outro ser vivo além de mim.
Eu estava tentando organizar os acontecimentos
em minha

160
cabeça novamente, mas nem sequer me
recordava do que havia acontecido, minha
cabeça estava vazia,
assim como o deserto e silencioso local em que
eu estava.
O chão começou a tremer, a pedras e cascalhos
começaram a pular, o extremor da terra tornava
impossível de me manter em pé, fiquei
completamente assustado, a ficha havia caído
naquele momento,
entrei em um profundo desespero interno,
gritando e pedindo por ajuda, mas nada
acontecia, ou respondia
minhas súplicas. Num distante, avistei algo na
estrada, parecia enorme e se rastejava em uma
velocidade
surreal, vinha em minha direção, não conseguia
identificar o que seria aquilo que se mesclava
com as
sombras. Numa ação imediata, comecei a correr
na direção contrária, corria pela minha vida
como se não

161
houvesse amanhã, a cada vez que virava meu
rosto para olhar para trás, estava mais próximo
e a terra
tremia muito mais.
Num espasmo de segundos, enquanto corria,
tropecei no chão e fui arrastado pela estrada, as
sombras
me engoliram e o tamanho ser que se rastejava
estava a minha frente. Era enorme, diria que
poderia ser
maior que a terra, tinha forma e aparência de
uma serpente, pele negra e grossa, olhos
vermelhos como o
fogo. A serpente estava com um charuto à boca,
que emanava uma grande quantidade de
fumaça, um
chapéu de couro e um lenço vermelho preso
onde deveria ser seu pescoço. Ela me encarava
de cima a
baixo por inteiro, com seus olhos pontudos e
esmagadores. Eu estava em choque, a
encarando de volta,
espantado.

162
Ela aproximou seu enorme rosto e baforou o
charuto, a fumaça me sufocou por alguns
segundos.
—Criança, o que tu fez?— A serpente disse,
com uma voz grave e rouca. Eu estava
espantado demais
para soltar qualquer palavra naquele momento,
apenas engoli seco e continuei encarando com
os olhos
arregalados.
—Você não deveria estar aqui—
—O-Onde estou?...— Disse entre gaguejos,
ainda muito assustado.
—Você está no tártaro, garoto tolo—
—Tártaro?— Ainda estava confuso sobre onde
diabos eu estava e o que estava acontecendo, o
que seria
aquilo que estava a minha frente, e sequer se
isso tudo era real.
—Você deturpou seu caminho, o que fizeste,
menino—
—Que monstro é você?! O que está dizendo?—

163
—Eu sou Vassago, e você, uma criança tola—
Me arrepiei por completo, mal conseguia
respirar, meu
corpo parecia estar se congelando lentamente,
atrofiando cada músculo.
—Eu não estou entendendo…eu estou morto?

A serpente continuou me encarando, como se
fosse me devorar por completo a qualquer
momento,
minha mente ainda estava em branco, sem
nenhum vestígio de qualquer memória. Num
choque de
38
segundos, a serpente começou a me rodear,
formando um redemoinho de areia e cascalhos,
mal conseguia
abrir meus olhos, ou até mesmo respirar em
meio a ele.
—Você não pode morrer agora, garoto, tens
sorte da morte ser amiga—
—Acorde, você não pode morrer—
—A morte ainda não precisa de você—

164
—Garoto tolo, você não pode morrer—
Vozes por todos os cantos soavam dizendo a
mesma coisa várias e várias vezes, diria que
isso é o ápice
da loucura. O redemoinho começou a me
remexer e revirar o meu corpo, alguns cascalhos
raspavam pela
minha pele, a ferindo diversas vezes. Num
momento em meio ao redemoinho, eu consegui
abrir meus
olhos, fui cegado por uma forte luz em meu
rosto, e um calor ardente.
—Ei Garoto!!— Uma voz familiar gritou ao
redor, estava próximo, e se repetia por mais
vezes.
—Garoto!, não me diga que você está morto—
Ainda me remexia sem parar, abri meu olho por
completo, enxergava o céu, um azul forte,
poucas nuvens e um sol escaldante. Alternei um
pouco meu
campo de visão para a esquerda, e vi um rosto
de um homem, estava me encarando com
preocupação,

165
parecia familiar.
—Tim??— Disse o homem, segurando em meu
ombro. No momento em que disse meu nome,
minha
cabeça parou de doer, e como mágica, várias
cenas de acontecimentos passados se passaram
em minha
mente, como se minha memória tivesse voltado.
Olhei novamente para o homem e o reconheci
imediatamente, era Baltazar.
Estávamos sentados em meio ao mato seco do
deserto, atrás de uma estrutura velha e
abandonada de um
Saloon que parecia ter falido. Baltazar parecia
bem, eu estava surpreso por o ver assim, pois
naquele
instante antes de eu apagar, ele parecia estar
morto em meus braços, achei que tudo que
houvesse
acontecido tivesse sido apenas um delírio da
minha cabeça. Desci o olhar para o seus braços
e logo notei a

166
falta de um, aquilo foi o suficiente para tirar a
hipótese de que fora tudo um delírio.
—Você parece bem, Baltazar, o que aconteceu?
Achei que você estivesse morto!— Ele me
encarou por
alguns segundos e deu um sorriso aliviado.
—Você achou mesmo que eu iria morrer tão
fácil assim?—
Eu sorri para ele. Tudo estava calmo, foi uma
transição de acontecimentos muito difícil de se
raciocinar,
me pergunto o que aconteceu naquele momento
em que eu apaguei, e como chegamos até aqui,
era um
mistério.
—O que aconteceu com os bandidos, Baltazar?
— Baltazar levantou uma da sobrancelhas e deu
um
sorriso de canto, apontou para uma carroça que
estava atrás dele com o polegar, indicando algo,
a carroça
estava presa a Bigmouth, levantei a cabeça e
olhei para onde ele apontava, bastante curioso,

167
imediatamente uma expressão de surpresa se
formou em meu rosto, havia 7 homens dentro
da carroça,
amarrados em uma corda bem grossa, todos eles
com panos amarrados a boca, e ao lado, algo
grande
envolto a um pano.
—Incrível!! O que seria aquele pano?—
—É a cabeça do Buffalo, para você levar,
garoto—
—Como você fez isso??— Baltazar me olhou
com um sorriso convencido, parecia estar mais
calmo, era
alguém completamente diferente de quando o
conheci, e isso de certa forma era algo bom.
—Você ainda precisa aprender bastante coisa,
menino— Ele disse e deu alguns tapinhas na
minha
cabeça.
—E agora?—
39
—O que faremos?—
—Sim— Baltazar levantou o olhar, pensativo.

168
—Você cumpriu seu objetivo, não é?— Assenti
com a cabeça, na verdade, eu estava tão
emocionado,
incapaz de acreditar que eu realmente havia
conseguido.
—Tem alguém te esperando lá em San Angelo,
e creio que ela está com muitas saudades —
Imediatamente me lembrei de Lucy, eu estava a
meses, muitos meses nessa missão, nem
imagino o que
deve ter passado na cabeça dela, e o quanto
deve estar preocupada, é certo que eu também
sinto muita
falta dela, e imagino a sua felicidade e de Will
quando me visse de volta. Eu estava orgulho
por isso tudo,
e bastante grato a Baltazar
—Sim, hora de voltar para casa— Baltazar
afirmou com a cabeça.
—E você? O que vai fazer agora?—
—Eu vou continuar —

169
—Continuar?— Ele me olhou pelo canto dos
olhos, fazendo uma espécie de bico, seu rosto
parecia
desconfortável.
—Buffalo Black não é o único assim que está
solto por aí —
—Você vai continuar atrás de coisas assim?—
—Sempre estive, garoto— Levantei as
sobrancelhas e continuei encarando ele,
surpreso.
—Você deveria continuar caçando, Tim—
—Você não acha que eu só atrapalharia?—
—Não, você é um ótimo caçador, eu deveria ter
acreditado no seu potencial — Dei um sorriso
sincero,
estava feliz por ouvir isso dele. Naquele
momento, dei um abraço em Baltazar, talvez
aquele fosse o ponto
onde nos separamos, mesmo que eu não
quisesse que isso acontecesse. Ele ficou
paralisado por alguns
segundos, mas retribuiu, dando alguns tapas
leves em minhas costas.

170
—Então, garoto, preparado para voltar para San
Angelo?—
Levantei o olhar para ele, ainda sorrindo.
—Com certeza!—
—Estamos esperando o que, então?— Ele
bagunçou meu cabelo e subiu em cima da
carroça, subi atrás
dele, me ajeitei no banco, segurando as cordas
da guia de Bigmouth, antes de dar partida olhei
para trás da
estrada, era possível ver as caravanas de longe,
estava em chamas, subindo uma enorme
quantidade de
fumaça, olhei para Baltazar que naquele
momento estava com um cigarro na boca
enquanto tentava fazer
o velho radinho de ferrugem funcionar,
xingando e murmurando, dei partida em
Bigmouth e tomamos
rumo a estrada de volta para San Angelo,
aproveitando o calor do sol radiante, a brisa e o
gritar das águias

171
que nos acompanhavam naquela tão esperada
despedida.
The End
★★★

172

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