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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

LUÁN KRISTOFFER AMARAL


luankamaral@usp.br
N°USP 14034950

Ensaio para a disciplina 0808000 – Aspectos da Cultura Brasileira I


Baseado na aula; ”Interpretações do Brasil, ontem e hoje”
do professor; Dr. Bernardo Ricupero

E também baseado no texto do; *Faoro, Raymundo (1994), Existe um pensamento político
brasileiro em Existe um pensamento político brasileiro, São Paulo, Editora Ática.

”O Pensamento Político Brasileiro”

São Paulo
2023
O ensaio Os donos do poder, publicado pela primeira vez em 1958, de Raymundo Faoro é
reconhecido como um dos grandes “intérpretes do Brasil”. Assim, o pensamento político-social
brasileiro é revitalizado na atual era. Isso rompe com conceitos antigos que o consideravam uma
pré-história das ciências sociais institucionalizadas, e oferece novas perspectivas sobre um vasto
repertório teórico. O campo não é mais visto como uma coleção de clássicos limitados a uma
nacionalidade específica, como uma versão nacional de grandes nomes da teoria social ou política.
Em vez disso, é visto como uma maneira de refletir sobre a história da construção de ideias
políticas na periferia, analisando criticamente a própria produção das ciências sociais brasileiras,
tudo isso com uma forte atenção às relações entre história e conjuntura (Chaloub, Lima, 2018).

A ideia está diretamente ligada a um processo de institucionalização das ciências sociais, que é
marcado pela Universidade como um local produtor de conhecimento “legítimo” e por certa
“americanização” das agendas de pesquisa em termos de temas, métodos e mesmo estilos de
pensamento (Vianna, 2004).

No entanto, o aspecto mais significativo da extemporaneidade do ensaio faoriano reside na tese


que sustenta ao longo do período nacional-desenvolvimentista, que consistia em processos
econômicos e sociais que utilizavam o Estado como propulsor do desenvolvimento nacional e o
populismo como partido político, o jurista gaúcho buscava as causas dos problemas nacionais na
conduta do Estado, baseado em uma lógica de dominação patrimonialista. É provável que esta tese
tenha sido a chave para o baixo impacto do livro de Faoro, entre outros fatores (Ricupero, 2007).

O cenário da Ciência Política brasileira mudou nos últimos anos. Depois de décadas marcadas por
uma forte influência de uma certa tradição neo-institucionalista nos Estados Unidos, não apenas
as críticas a este paradigma teórico, mas também a busca por novas reflexões e formas de expressão
são cada vez mais comuns. Há, portanto, uma correlação direta entre a crise da ordem política
resultante da redemocratização e a diminuição do respeito das explicações que tentavam defender
a viabilidade dessa ordem política, mesmo sem identificar sua natureza normativa (Chaloub,
Lynch, 2018).

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O ensaio como meio de expressão política, reflete que o pensamento político-social brasileiro é
uma área privilegiada. Como resultado, pode ser interessante discutir, mesmo que de forma breve,
os significados de termos como “ensaio de interpretação do Brasil” e mesmo “pensamento político-
social brasileiro”. A época do pensamento político brasileiro pode ser definida como a história
intelectual da ciência política brasileira, incluindo os trabalhos científicos, ideológicos, discursos
e doutrinários do país. Essa área temática abordaria estudos sobre o pensamento que foi escrito por
políticos, jornalistas e intelectuais no Brasil ao longo da história, bem como a parte da teoria
desenvolvida por cientistas políticos das gerações anteriores, que foram consideradas importantes
para o desenvolvimento desta ciência. A área dialoga com as manifestações mais amplas do
pensamento social no Brasil e com a teoria política, que pode ser considerada a expressão nacional,
devido à sua vocação interdisciplinar (Chaloub, Lima, 2018).

A ampla análise de Faoro sobre o Brasil começou com a ”inteligência da forma” de uma explicação
de matriz liberal sobre o país, de acordo com Renato Lessa (2009). Em outras palavras, é uma
análise que tenta descobrir as razões pelas quais as mesmas estruturas de poder, desafios e soluções
continuam a se repetir. As aspirações políticas e a história não se encaixam bem, e investigar esse
desencontro pode ser vantajoso intelectualmente. Assim, é mais fácil compreender a coerência e a
tensão do pensamento faoriano quando se considera que o pensamento liberal-iluminista tem
dificuldade em examinar os desdobramentos históricos luso-brasileiros. Faoro era um liberal que
reconheceu o fato de que o liberalismo havia perdido alguma parte de seu valor (Schwarz, 2012).

O lugar privilegiado da prática, an urgência da intervenção no tempo e a dificuldade de determinar


seus limites constituem as três dimensões que tornam o ensaio uma abordagem privilegiada para
a reflexão no campo da política. No entanto, nenhum deles torna o ensaio indispensável ao
pensamento político, mas todos indicam uma conexão que permite que o estilo alcance aspectos
que outros gêneros não têm. Por outro lado, uma conexão mimética entre a forma do ensaio e a
forma política permitiria que elementos importantes da experiência política fossem expressos por
algumas características do ensaio.

Isso não o obriga a abandonar o liberalismo iluminista. A prova da negatividade faoriana vem de
suas próprias crenças. É importante enfatizar que Faoro se concentra na crítica da ordem social

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brasileira em vez de Souza (2015). Isso porque, se o autor fosse um político, a posição de Faoro
conteria algum princípio que poderia ser rejeitado. Ainda que a história faoriana não seja precisa,
é difícil negar que ele chegou a um ponto em que os brasileiros ficavam irritados com a política.
No que diz respeito às possibilidades, é possível que ao longo desse período o termo
”patrimonialismo” tenha começado a ganhar popularidade no pensamento sobre a cultura política
brasileira. As ”percepções” faorianos são consideradas ”atualizadas” pela palavra (Carmo, 2011).

É importante lembrar que é possível supor que tanto os problemas de integração social quanto os
problemas agrários dos negros e índios são parte de um poder político autocrático que permaneceu
ativo ao longo dos anos, apesar de suas formas mudarem. A narrativa faoriana é vista como
faltando de tema. Pode-se dizer que Faoro ficou muito preso à política e não avançou em seus
impactos sociológicos, como afirma Werneck Vianna (1997 & 2009).

O ensaio não é necessariamente um gênero fácil de definir devido à sua natureza. A vagueza e
porosidade que o caracterizam facilmente o vendem como uma opção mais “fácil” ou pouco
rigorosa. No entanto, na verdade estamos diante do exato oposto: a tarefa difícil de construir textos
em terrenos instáveis e movediços. A oposição entre ensaio e ciência costuma piorar essa imagem
e impedir a compreensão de outras formas de pensamento político, que são essenciais para sua
própria formação.

A rejeição do ensaio como meio de expressão política leva a um movimento de fechamento dos
indivíduos capazes de desenvolver conhecimento político. Assim, não apenas se perde a palavra
“político”, mas também se perde a possibilidade de criar significados heterodoxos no mundo
político. A naturalização de uma forma de expressão do pensamento político também significa que
outras vozes políticas não podem se expressar. Com suas limitações e dificuldades, a tradição
brasileira do ensaio político pode servir como um meio de renovação de questões, sistemas,
métodos e formas de expressão.

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Literatura

Carmo, Andréia Reis (2011), Patrimonialismo: o retorno ao conceito como possibilidade de


compreensão do sistema político brasileiro por meio da abordagem da Cultura Política,
Dissertação de Mestrado em Ciência Política, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,
Universidade de São Paulo, São Paulo.

Chaloub, Jorge; Lima, Pedro (2018), Interpretações do Brasil contemporâneo, Mediações: Revista
de Ciências Sociais, vol. 23, núm. 2, p. 14-39.

Chaloub, Jorge; Lynch, Christian (2018), O pensamento político-constitucional da República de


1988: um balanço preliminar (1988-2017), Em: A Constituição de 1988 trinta anos depois.
(Cristina Buarque de Hollanda e outros, orgs.) Curitiba: Ed. UFPR, p. 251-280.

Lessa, Renato (2009), O longínquo pesadelo brasileiro, Em: GUIMARÃES, Juarez. (org.).
Raymundo Faoro e o Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo.pp. 63-76.

Ricupero, Bernardo (2007), Sete lições sobre as interpretações do Brasil, São Paulo: Alameda.

Schwarz, Roberto (2012), Ao vencedor, as batatas, São Paulo: Editora 34.

Souza, Jessé (2015), A tolice da inteligência brasileira: ou como o país se deixa manipular pela
elite, São Paulo: Leya.

Vianna, Luiz Werneck (2004), A institucionalização das ciências sociais e a reforma social: do
pensamento social à agenda americana de pesquisa, Em: Revolução Passiva no Brasil. Rio de
Janeiro: Revan.

Werneck Vianna, Luiz (1997) A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil, Rio de
Janeiro: Revan.

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Werneck Vianna, Luiz (2009) Raymundo Faoro e a difícil busca do moderno no país da
modernização, Em: BOTELHO, André; SCHWARCZ, Lilia. (orgs.). Um enigma chamado Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras. pp.364-377.

Instruções para o trabalho individual:

Os alunos podem fazer um trabalho (de até 4 páginas) baseado num dos textos (ou em todos
eles) da seguinte bibliografia:

BOTELHO, André. “Passado e futuro das interpretações do país” in Tempo Social, n. 1, 2010.
*FAORO, Raymundo. “Existe um pensamento político brasileiro” in Existe um pensamento
político brasileiro, São Paulo, Editora Ática, 1994.
SANTOS, Wanderley Guilherme dos. "Paradigma e história: a ordem burguesa na imaginação
social brasileira" in Ordem burguesa e liberalismo político, São Paulo, Livraria Duas Cidades,
1978.
RICUPERO, Bernardo. Sete lições sobre as interpretações do Brasil (introdução). São Paulo:
Alameda, 2007.
SCHWARZ, Roberto. “As idéias fora do lugar” in Ao vencedor as batatas, São Paulo, Livraria
Duas Cidades, 1992.

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