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Leibniz-Clarke: Correspondências
Tradução Bernardo Santos
Índice
Introdução de Clarke
Primeira Carta de Leibniz
Primeira resposta de Clarke (26 de novembro de 1715)
Segunda carta de Leibniz, sendo uma resposta à primeira réplica de
Clarke (Final de Dezembro, 1715)
Segunda resposta de Clarke (10 de janeiro de 1716)
Terceira carta de Leibniz, sendo uma resposta à segunda réplica de Clarke
(25 de fevereiro de 1716)
Terceira resposta de Clarke (15 de maio de 1716)
Quarta carta de Leibniz, sendo uma resposta à terceira réplica de Clarke
(2 de junho de 1716)
Quarta resposta de Clarke (26 de junho de 1716)
Quinta carta de Leibniz, sendo uma réplica à quarta resposta de Clarke
(18 de agosto de 1716)
Quinta resposta de Clarke (29 de outubro de 1716)
Introdução de Clarke
Senhora,
O sábio Sr. Leibniz entendeu bem como seria uma grande honra para ele e
para a sua reputação ter seus argumentos aprovados por uma pessoa do
caráter de Vossa Alteza Real. Todavia, a mesma imparcialidade constante e
o amor inalterável à verdade, a mesma disponibilidade constante para ouvir
e se submeter à razão, sempre tão visível, sempre brilhando tão
intensamente na conduta de Vossa Alteza Real - o que justamente o fez
desejar exercer nestes documentos sua máxima habilidade na defesa de suas
opiniões - foi, ao mesmo tempo, um igual incentivo para que aqueles que o
julgavam equivocado se esforçassem para provar que não era possível a
defesa de tais opiniões.
3. Sir Isaac Newton diz que o espaço é um órgão que Deus faz uso
como meio para perceber as coisas. Mas, se Deus precisa de
qualquer órgão para perceber as coisas, isso significa que elas
não dependem totalmente dEle, nem que foram produzidas por
Ele.
3. Sir Isaac Newton não diz que o espaço é o órgão que Deus usa
como meio para perceber as coisas, nem que Ele tem necessidade
de qualquer meio para perceber as coisas, mas, pelo contrário,
que Ele, sendo onipresente, percebe todas as coisas por sua
presença imediata a elas em todo o espaço, onde quer que
estejam, sem a intervenção ou assistência de qualquer órgão ou
meio. A fim de tornar isso mais inteligível, ele o ilustra por uma
similitude: como a mente do homem – por sua presença imediata
às figuras ou às imagens das coisas formadas no cérebro por
meio dos órgãos da sensação – vê essas figuras como se fossem
as próprias coisas, assim Deus vê todas as coisas por sua
presença imediata às coisas em si, dado que Ele está realmente
presente às coisas em si, a todas as coisas no universo, como a
mente do homem está presente a todas as figuras das coisas
formadas em seu cérebro. Sir Isaac Newton considera o cérebro e
os órgãos da sensação como o meio pelo qual essas imagens são
formadas, mas não como o meio pelo qual a mente vê ou percebe
essas imagens quando elas são assim formadas. E ele não
considera as coisas no universo como se fossem imagens
formadas por certos meios ou órgãos, mas como coisas reais
formadas pelo próprio Deus e vistas por Ele em todos os lugares
onde estão, sem a intervenção de nenhum meio. E esta similitude
é tudo o que ele quer dizer quando supõe que o espaço infinito é
(por assim dizer) o sensorium do Ser onipresente.[4]
10. Acho que não posso ser justamente censurado por dizer
que Deus é inteligentia supramundana. Dirão eles que Ele é
intelligentia mundana, que é, a alma do mundo? Espero que não.
No entanto, eles farão bem em tomar cuidado para não cair nessa
noção inadvertidamente.
É bem verdade que nada é sem uma razão suficiente para tal, e, por
isso, é assim e não de outra forma. Portanto, onde não há nenhuma
causa, não pode haver nenhum efeito. Mas essa razão suficiente
muitas vezes não é outra senão a mera vontade de Deus. Não pode
haver outra razão senão a mera vontade de Deus, por exemplo, para
que este sistema particular de matéria devesse ser criado em um
determinado lugar, e aquele fosse feito em outro lugar em particular,
quando (todo lugar sendo absolutamente indiferente a toda matéria)
teria sido exatamente a mesma coisa se fosse vice versa, supondo que
os dois sistemas (ou as partículas) de matéria fossem iguais. E se em
nenhum caso se pudesse agir sem uma causa predeterminadora, assim
como uma balança não pode se mover sem um peso predominante,
isso tenderia a tirar todo o poder de escolha e a introduzir a fatalidade.
12. Deus não está presente às coisas pela situação, mas pela
essência; sua presença é manifestada por sua operação imediata.
A presença da alma é de uma natureza bem diferente. Dizer que
ela se difunde por todo o corpo é torná-la estendida e divisível.
Dizer que ela está, toda ela, em cada parte do corpo, é torná-la
divisível por si mesma. Fixá-la a um ponto, difundi-la em muitos
pontos, são apenas expressões abusivas, idola tribus.[10]
2. Sem dúvida, nada é sem uma razão suficiente para ser em vez de
não ser, e para ser assim e não de outra forma. Mas, nas coisas
indiferentes segundo sua própria natureza, a mera vontade, sem
nada externo para influenciá-la, é essa razão suficiente – como no
exemplo da criação de Deus ou da colocação de qualquer
partícula de matéria em um lugar e não em outro, quando todos
os lugares são originalmente semelhantes. E o caso é o mesmo,
ainda que o espaço não fosse algo real mas somente a mera
ordem dos corpos; porque, ainda assim, seria absolutamente
indiferente, e não poderia haver outra razão a não ser a mera
vontade pela qual três partículas iguais deveriam ser colocadas
ou agrupadas na ordem a, b, c, em vez de na ordem contrária. E,
portanto, nenhum argumento pode ser retirado dessa indiferença
entre todos os lugares para provar que nenhum espaço é real.
Porque espaços diferentes são realmente diferentes ou distintos
entre si, embora sejam perfeitamente parecidos. E há esse
absurdo evidente em supor que o espaço não seja real, mas que
seja simplesmente a ordem dos corpos, porque, de acordo com
essa noção, se a terra, o sol e a lua tivessem sido colocados onde
as estrelas fixas mais remotas estão agora (desde que fossem
colocados na mesma ordem e distância que estão agora em
relação uns aos outros), isso apenas não teria sido (como diz com
razão esse sábio autor) Ia même chose, a mesma coisa em efeito
– o que é muito verdadeiro – mas também se seguiria que eles
também estariam no mesmo lugar, do mesmo modo que estão
agora – o que é uma expressa contradição.
11. Dizer que o espaço infinito não tem partes é dizer que ele
não consiste em espaços finitos e que o espaço infinito pode
subsistir, embora todo o espaço finito deva ser reduzido a nada.
Seria como se se devesse dizer, de acordo com a suposição
cartesiana de um mundo material estendido ilimitadamente, que
tal mundo poderia subsistir, embora todos os corpos que o
compõem devam ser reduzidos a nada.
13. Dizer que Deus pode fazer com que todo o universo
avance em uma linha reta ou em qualquer outra linha, sem fazer
qualquer alteração nele, é outra suposição quimérica. Pois dois
estados indiscerníveis um do outro são o mesmo estado, e,
consequentemente, isso é uma mudança sem nenhuma alteração.
Além disso, não há nem rima nem razão nisso. Todavia, Deus
não faz nada sem razão, e é impossível que haja alguma aqui.
Além disso, isso seria um agendo nihil agere, como acabo de
dizer, por causa da indiscernibilidade.
32. Mas aqueles que imaginam que a alma pode dar uma nova
força ao corpo, e que Deus faz o mesmo com o mundo para
consertar as imperfeições de sua máquina, tornam Deus muito
parecido com a alma, atribuindo muito à alma e muito pouco a
Deus.
33. Porque ninguém além de Deus pode dar uma nova força à
natureza, e Ele só o faz de forma sobrenatural. Se houvesse
necessidade de que Ele o fizesse no curso natural das coisas, Ele
teria feito um trabalho muito imperfeito. Nesse ritmo, Ele seria,
em relação ao mundo, o que a alma, na noção vulgar, é em
relação ao corpo.
15. Não seria impossível para Deus criar o mundo mais cedo
ou mais tarde do que o fez, nem é de todo impossível para Ele
destruí-lo mais cedo ou mais tarde do que ele será realmente
destruído. Quanto à noção de eternidade do mundo, aqueles que
supõem que a matéria e o espaço são a mesma coisa devem, de
fato, supor que o mundo não seja apenas infinito e eterno, mas
que ele é assim necessariamente, tão necessariamente quanto o
espaço e a duração, que não dependem da vontade, mas da
existência de Deus. Todavia aqueles que acreditam que Deus
criou a matéria na quantidade, no momento e no espaço que Ele
desejou não têm aqui nenhuma dificuldade. Porque a sabedoria
de Deus pode ter muitas boas razões para criar este mundo
naquele tempo particular em que Ele o criou, pode ter feito outros
tipos de coisas antes deste mundo material ter começado e
também pode fazer outros tipos de coisas depois que este mundo
for destruído.
17. Que o espaço e o tempo não são a mera ordem das coisas,
mas quantidades reais (o que ordem e situação não são) foi
provado acima (Ver Terceira Resposta, seção 4, e neste
documento, seção 13), e ainda nenhuma resposta foi dada a essas
provas. Até que uma resposta seja dada a essas provas, a
afirmação desse sábio autor é (por sua própria confissão nessa
seção) uma contradição.
18. A uniformidade de todas as partes do espaço não é
argumento contra a ação de Deus em qualquer parte, da maneira
que Ele quiser. Deus pode ter boas razões para criar seres finitos,
e os seres finitos só podem estar em lugares particulares. E,
sendo todos os lugares originalmente semelhantes (ainda que o
lugar não seja nada mais que a situação dos corpos), o fato de
Deus colocar um cubo de matéria atrás de outro cubo de matéria
igual, ao invés do outro por trás daquele, é uma escolha que não é
de forma alguma indigna das perfeições de Deus, ainda que
ambas as situações sejam perfeitamente iguais, porque pode
haver muitas boas razões para que ambos os cubos possam
existir, e eles não podem existir senão em uma ou outra situação
igualmente razoável. O acaso epicuriano não é uma escolha da
vontade, mas uma necessidade cega do destino.
20. Não entendo o que isso tende a provar no que diz respeito
ao argumento perante nós.
16. Afirmar também que a mente pode ter boas razões para
agir quando não tem motivos e quando as coisas são
absolutamente indiferentes, como o autor expõe aqui, isso, digo
eu, é uma evidente contradição. Pois se a mente tem boas razões
para tomar parte, então as coisas não são indiferentes à mente.
17. E afirmar que a mente agirá quando tiver razões para agir,
embora as formas de agir sejam absolutamente indiferentes, isso,
digo eu, é falar novamente de forma muito superficial e de uma
maneira que não pode ser defendida. Pois um homem nunca tem
uma razão suficiente para agir quando também não tem uma
razão suficiente para agir de uma certa maneira particular, cada
ação sendo individual e não geral, nem se abstraindo de suas
circunstâncias, mas sempre precisando de alguma maneira
particular de ser posta em execução. Por isso, quando há uma
razão suficiente para fazer qualquer coisa em particular, há
também uma razão suficiente para fazê-lo de uma certa maneira
particular; e, consequentemente, várias maneiras de fazê-lo não
são indiferentes. Tão frequentemente quanto um homem tem
razões suficientes para uma única ação, ele também tem razões
suficientes para todas as suas exigências. Veja também o que vou
dizer abaixo, na seção 66.
Para as Seções 3 e 4
21. Deve-se confessar que, embora esse grande princípio
tenha sido reconhecido, ainda não foi suficientemente utilizado.
Essa é em grande medida a razão pela qual a filosofia
primeira[17] não tem sido até agora tão frutífera e demonstrativa
como deveria ser. Eu inferi desse princípio, entre outras
consequências, que não há, na natureza, dois seres reais,
absolutos, indiscerníveis um do outro, porque, se houvesse, Deus
e a natureza agiriam sem razão ao tratar um de forma diferente do
outro, e que, portanto, Deus não produz dois pedaços de matéria
perfeitamente iguais e semelhantes. O autor responde a essa
conclusão sem refutar sua razão, e ele responde com uma objeção
muito fraca. “Esse argumento”, diz ele, “se fosse verdade,
provaria que seria impossível a Deus criar qualquer matéria. Pois
as partes perfeitamente sólidas da matéria, se as considerarmos
de igual figura e dimensões (o que é sempre possível em
suposição), seriam exatamente idênticas.” Mas trata-se,
manifestamente, de uma petitio principii supor que há uma
semelhança perfeita, a qual, de acordo comigo, não pode ser
admitida. Essa suposição de dois indiscerníveis, como a de dois
pedaços de matéria perfeitamente semelhantes, parece realmente
possível em termos abstratos, mas não é consistente com a ordem
das coisas, nem com a sabedoria divina pela qual nada é admitido
sem razão. As pessoas vulgares fantasiam tais coisas porque se
contentam com noções incompletas. E essa é uma das falhas dos
atomistas.
Para as Seções 5 e 6
Para a Seção 7
Para as Seções 8 e 9
Para a Seção 10
49. Não se pode dizer que [uma certa] duração é eterna, mas
[pode-se dizer] que as coisas que se continuam são sempre
eternas [ganhando sempre uma nova duração]. O que quer que
exista de tempo e de duração [sendo sucessivo], perece
continuamente, e como pode existir eternamente uma coisa que
(para falar exatamente) nunca existe de todo? Como pode existir
uma coisa da qual nenhuma parte jamais existe? Nada do tempo
jamais existe a não ser instantes, e um instante nem mesmo é em
si próprio uma parte do tempo. Quem considerar essas
observações facilmente apreenderá que o tempo só pode ser uma
coisa ideal. E a analogia entre tempo e espaço facilmente fará
parecer que um é tão meramente ideal quanto o outro. [Mas,
quando se diz que a duração de uma coisa é eterna, pretende-se
apenas significar que a coisa perdura eternamente, eu não tenho
nada a dizer contra isso.]
Para as Seções 11 e 12
Para a Seção 13
Para a seção 14
Para a Seção 15
58. Portanto, não se pode dizer, como o autor faz aqui, que a
sabedoria de Deus pode ter boas razões para criar este mundo
neste ou naquele momento em particular, já que aquele tempo em
particular, considerado sem as coisas, é uma ficção impossível, e
boas razões para uma escolha não podem ser encontradas onde
tudo é indiscernível.
60. E, portanto, não se deve dizer, como faz o autor aqui, que
Deus criou as coisas em um espaço em particular e em um
momento particular que lhe agradou. Pois todos os tempos e
todos os espaços sendo em si mesmos perfeitamente uniformes e
indiscerníveis uns dos outros, um deles não pode ser mais
agradável do que o outro.
Para as Seções 16 e 17
Para a Seção 18
Para a Seção 19
Para a Seção 20
Para a Seção 21
Para as Seções 22 e 23
Para a Seção 29
Para a Seção 30
Para a Seção 31
Para a Seção 32
Para a Seção 33
Para as Seções 34 e 35
96. Refiro-me aqui ao que foi ou será dito nesta carta, nº 82,
86 e 111, a respeito da comparação entre Deus e uma alma do
mundo, e como a opinião contrária à minha aproxima os dois
demasiadamente.
Para a Seção 36
Para a Seção 37
98. O autor nos diz que a alma não está no cérebro, mas
no sensorium, sem dizer o que é esse sensorium. Mas supondo
que o sensorium seja extendido, como acredito que o autor o
entende, a mesma dificuldade ainda permanece, e a questão
retorna: se a alma é difundida através de toda aquela extensão,
grande ou pequena. Porque maior ou menor em tamanho não tem
nada a ver com o propósito aqui.
Para a Seção 38
99. Não me comprometo a estabelecer aqui
minha Dinâmica ou minha doutrina das forças; este não seria um
lugar adequado para isso. Entretanto, posso muito bem responder
à objeção aqui apresentada contra mim. Afirmei que as forças
ativas são preservadas no mundo [sem diminuições]. O autor
objetou que dois corpos moles ou inelásticos que se encontram
entre si perdem parte de sua força. Eu respondo que não. É
verdade que seus corpos perdem em relação ao seu movimento
total, mas suas partes o recebem, sendo abaladas pela força do
concurso ou choque. E, portanto, essa perda de força é apenas na
aparência. As forças não são destruídas, mas espalhadas entre as
pequenas partes. Os corpos não perdem suas forças, mas o caso
aqui é o mesmo que acontece quando os homens trocam grande
quantia em dinheiro em menor quantia em dinheiro. Entretanto,
concordo que a quantidade de movimento não permanece a
mesma, e nisso aprovo o que diz Sir Isaac Newton, p. 341 de sua
Óptica, que o autor aqui cita. Mas mostrei em outro lugar que há
uma diferença entre a quantidade de movimento e a quantidade
de força.
Para a Seção 39
Para a Seção 40
Para a Seção 41
105. O autor se opõe aqui que o tempo não pode ser uma ordem
de coisas sucessivas porque a quantidade de tempo pode se tornar
maior ou menor, e ainda assim a ordem de sucessões continua a
mesma. Eu respondo que não é assim. Pois se o tempo for maior,
haverá mais estados semelhantes sucessivos e interpostos, e se
for menor, haverá menos, visto que não há vácuo, nem
condensação, nem penetração (se assim se pode dizer), em
tempos mais do que em lugares.
Para a Seção 42
107. Defendi que uma operação de Deus, pela qual Ele deveria
consertar a máquina do mundo material, tendendo em sua
natureza (como o autor afirma) a perder todo o seu movimento,
seria um milagre. Sua resposta foi que essa não seria uma
operação milagrosa porque seria usual e deve acontecer com
frequência. Eu disse que não é a normalidade ou a inusualidade
que faz um milagre propriamente dito, ou um milagre da mais
alta espécie, mas que ele é o superar dos poderes das criaturas, e
essa é a opinião [geral] dos teólogos e filósofos; e que, portanto,
o autor reconhece pelo menos que o que ele introduz e eu rejeito
é, segundo a noção recebida, um milagre da mais alta espécie, ou
seja, um milagre que ultrapassa todos os poderes criados, e que
isso é exatamente o que todos os homens se esforçam para evitar
em filosofia. Ele responde agora que isso é apelar da razão para
a opinião vulgar. Mas eu respondo novamente que essa opinião
vulgar, segundo a qual, em filosofia, devemos evitar ao máximo
apelar ao que supera a natureza das criaturas, é uma opinião
muito razoável. Caso contrário, nada seria mais fácil do que
prestar contas de qualquer coisa introduzindo a divindade, Deum
ex machina, sem se importar com a natureza das coisas.
108. Além disso, a opinião comum dos teólogos não deve ser
vista meramente como uma opinião vulgar. Um homem deve ter
razões de peso antes de se aventurar a contradizê-la, e não vejo
aqui nenhuma razão desse tipo.
Para a Seção 43
Para a Seção 44
Para a Seção 45
Para a Seção 46
125. Devo concluir com aquilo que o autor objetou contra mim
no início desta Quarta Resposta, à qual eu já dei uma resposta
acima (nº 18, 19, 20). Mas adiei a minha intervenção mais
completa sobre esse assunto para a conclusão deste documento.
Ele alegou que eu era culpado de uma petição de princípio. Mas
de que princípio, eu lhe pergunto? Para Deus, princípios menos
claros nunca foram estabelecidos. O princípio em questão é o
princípio da necessidade de uma razão suficiente para que
qualquer coisa exista, para que qualquer evento aconteça, para
que qualquer verdade ocorra. É esse um princípio que precisa ser
provado? O autor o reconheceu ou fingiu reconhecê-lo, nº 2 de
sua Terceira Resposta; possivelmente porque a negação do
princípio pareceria muito injustificada. Mas ou ele o fez apenas
com palavras, ou ele se contradiz ou retrai sua concessão.
126. Ouso dizer que sem este grande princípio não se pode
provar a existência de Deus nem dar conta de muitas outras
verdades importantes.
Uma vez que inúmeras palavras não são nem um argumento de idéias claras
do escritor, nem um meio adequado para transmitir noções claras ao leitor,
esforçar-me-ei para dar uma resposta distinta a essa Quinta Carta, tão breve
quanto possível.
A propósito, pode-se observar que esse sábio autor contradiz sua própria
hipótese quando diz que (seção 11) a vontade nem sempre segue com
precisão o entendimento prático, pois às vezes pode encontrar razões para
suspender sua resolução. Pois não são essas mesmas razões o último
julgamento do entendimento prático?
21-25 Se é possível que Deus faça ou que tenha feito dois pedaços de
matéria exatamente iguais, de modo que transpô-los em situação fosse
perfeitamente indiferente, a noção desse sábio autor sobre a razão suficiente
cai por terra. A isso ele responde que não é impossível para Deus fazer duas
peças exatamente iguais (como seu argumento exige), mas que não é
razoável que Ele o faça. Mas como ele sabe que não seria razoável que
Deus o fizesse? Ele pode provar que não é possível que Deus possa ter
razões sábias para criar muitas partes da matéria exatamente iguais em
diferentes partes do universo? O único argumento que ele apresenta é que
não haveria uma razão suficiente para determinar a vontade de Deus quanto
a qual peça deveria ser colocada em qual situação. Mas se, no caso em que
nada mais apareça em contrário, Deus pode possivelmente ter muitas razões
sábias para criar muitas peças exatamente iguais, será que a indiferença da
situação de tais peças, por si só, tornará impossível que Ele crie ou
impossível que seja razoável que Ele as crie? Eu humildemente concebo
que isso é uma (seção 20) petição de princípio explícita. Ao argumento
semelhante por mim extraído da absoluta indiferença da determinação
particular original do movimento, nenhuma resposta foi dada.
Para evitar a resposta, ele afirma que (seção 34) a resistência não decorre da
quantidade de matéria, mas de sua dificuldade de dar lugar. Mas essa
alegação é totalmente ampla, pois a pergunta se referia apenas a tais corpos
fluidos que têm pouca ou nenhuma tenacidade, como a água e o mercúrio,
cujas partes não têm qualquer dificuldade de dar lugar senão ao que resulta
da quantidade da matéria que eles contêm. O exemplo de um (ibid.) pedaço
de madeira flutuante contendo menos matéria pesada do que um volume
igual de água, e ainda fazendo maior resistência, é maravilhosamente anti-
filosófico, porque um volume igual de água fechada em uma embarcação,
ou congelada em gelo e flutuante, produz uma resistência maior do que a
madeira flutuante, a resistência então surge de todo o volume de água; mas,
quando a água está solta e em liberdade em seu estado de fluidez, a
resistência então não é feita pelo todo, mas apenas por parte do volume
igual de água, e então não é de se admirar que ela pareça fazer menos
resistência do que a madeira.
36-48. Esses parágrafos não parecem conter argumentos sérios, mas apenas
representam, sob uma perspectiva equivocada, a noção da imensidão ou
onipresença de Deus, que não é uma mera intelligentia supramundana
(semota a nostris rebus sejunctaque Ionge)[33]e que “não está longe de todos
nós, pois nEle nós” (e todas as coisas) "vivemos e nos movemos e temos
nosso ser”.[34]
O espaço ocupado por um corpo não é a (seção 36, 37) extensão do corpo,
mas o corpo estendido existe nesse espaço.
Na realidade, não existe algo como (seção 38) um espaço delimitado, mas
ocorre apenas que nós, em nossa imaginação, fixamos nossa atenção na
parte ou na quantidade que nos agrada daquilo que em si mesmo é sempre e
necessariamente ilimitado.
Os espaços finitos não são de forma alguma os (seção 40) afectos das
substâncias finitas, mas eles são apenas aquelas partes do espaço infinito
nas quais as substâncias finitas existem.
Se a matéria fosse infinita, ainda assim o espaço infinito não seria mais uma
(seção 41) afecção desse corpo infinito do que os espaços finitos são as
afecções dos corpos finitos, mas, nesse caso, a matéria infinita estaria, como
os corpos finitos agora estão, no espaço infinito.
A imensidade, assim como a eternidade, é (seção 42) essencial para Deus.
As partes da imensidade (sendo totalmente de um tipo diferente das partes
corpóreas, parciais, separáveis, divisíveis, móveis, que estão no terreno da
corruptibilidade) não impedem a imensidão de ser essencialmente uma, mas
as partes da duração impedem a eternidade de ser essencialmente uma.
O próprio Deus não sofre nenhuma mudança (seção 43) pela variedade e
mudança das coisas que vivem e se movem e têm seu ser nEle.
Deus não existe (seção 45) no espaço e no tempo, mas sua existência causa
o espaço e o tempo. E quando, segundo a analogia do discurso vulgar,
dizemos que Ele existe em todo o espaço e em todo o tempo, as palavras
significam apenas que Ele é onipresente e eterno, ou seja, que espaço e
tempo sem limites são consequências necessárias de sua existência, e não
que espaço e tempo são seres distintos dEle e nos quais Ele existe.
Como[35] (seção 46) o espaço finito não é a extensão dos corpos, mostrei
logo acima, na seção. 40. E as duas seções seguintes também (seções 47 e
48) só precisam ser comparadas com o que já foi dito (ver também abaixo,
seções 53 e 54).
49-51. Isto me parece ser apenas um gracejo com palavras. Com relação à
questão sobre o espaço ter peças, ver acima, Terceira Resposta, seção 3, e
Quarta Resposta, seção 11.
54. Eu havia aduzido que tempo e espaço eram quantidades, e que situação
e ordem não eram. A isso se responde que a ordem tem sua quantidade, há
aquilo que vai antes e aquilo que se segue, há distância ou intervalo.
Respondo que ir antes e se seguir constitui situação ou ordem, mas a
distância, intervalo ou quantidade de tempo ou espaço, em que uma coisa
segue outra, é algo totalmente distinto da situação ou ordem e não constitui
qualquer quantidade de situação ou ordem; a situação ou ordem pode ser a
mesma quando a quantidade de tempo ou espaço que intervém é muito
diferente. O sábio autor responde ainda que as razões ou proporções (seção
54) têm sua quantidade e, portanto, também o tempo e o espaço, embora
não sejam mais do que relações. Respondo, primeiro, que, se fosse verdade
que alguns tipos particulares de relações, tais como razões ou proporções,
fossem quantidades, ainda assim não se seguiria que situação e ordem, que
são relações de um tipo bem diferente, também fossem quantidades.
Contudo, em segundo lugar, as proporções não são quantidades, mas
proporções de quantidades. Se elas fossem quantidades, seriam as
quantidades de quantidades, o que é um absurdo. Além disso, se fossem
quantidades, elas (como todas as outras quantidades) sempre aumentariam
por adição, mas a adição da proporção de 1 para 1 à proporção de 1 para 1
ainda não faz mais que a proporção de 1 para 1, e a adição da proporção de
metade para 1 à proporção de 1 para 1 não resulta na proporção de 1 e meio
para 1, mas na proporção de apenas metade para 1. Aquilo que os
matemáticos às vezes chamam, de forma imprecisa, de quantidade de
proporção é (precisa e estritamente falando) apenas a quantidade da
magnitude relativa ou comparativa de uma coisa em relação a outra, e a
proporção não é a magnitude comparativa em si, mas a comparação ou
relação da magnitude com outra. A proporção de 6 para 1, com relação à de
3 para 1, não é uma quantidade dobrada de proporção, mas a proporção de
uma quantidade dobrada. E, de modo geral, o que eles chamam de ter uma
proporção maior ou menor não é ter uma quantidade maior ou menor de
proporção ou relação, mas ter a proporção ou relação de uma quantidade
maior ou menor em relação a outra; não é uma quantidade maior ou menor
de comparação, mas a comparação de uma quantidade maior ou menor. A
(seção 54) expressão logarítmica de uma proporção não é (como chama o
sábio autor) uma medida, mas apenas um índice, ou sinal, artificial de
proporção; não é a expressão de uma quantidade de proporção, mas apenas
um indicativo do número de vezes que qualquer proporção é repetida ou
complicada. O logaritmo da proporção de igualdade é 0 e ainda assim ele é
tão real e tão proporcional quanto qualquer outro, e quando o logaritmo é
negativo, como1, mesmo assim a proporção da qual ele é o próprio sinal ou
índice é afirmativa. A proporção duplicada ou triplicada não denota uma
quantidade dupla ou tripla de proporção, mas o número de vezes que a
proporção é repetida. A triplicação de qualquer magnitude ou quantidade
uma vez produz uma magnitude ou quantidade, que para a primeira produz
a proporção de 3 para 1. A triplicação uma segunda vez produz (não uma
quantidade dobrada de proporção, mas) uma magnitude ou quantidade, que
para a primeira produz a proporção (chamada duplicata) de 9 para 1. A
triplicação uma terceira vez produz (não uma quantidade tripla de
proporção, mas) uma magnitude ou quantidade, que para a primeira leva a
proporção (chamada triplicata) de 27 para 1, e assim por diante. Em terceiro
lugar, o tempo e o espaço não são da natureza das proporções, mas da
natureza das quantidades absolutas às quais pertencem as proporções.
Como, por exemplo, a proporção de 12 para 1 é uma proporção muito maior
(ou seja, como observei agora, não uma quantidade maior de proporção,
mas a proporção de uma quantidade comparativa maior) do que a de 2 para
1, e ainda assim uma e a mesma quantidade não-variada pode, para uma
coisa, assumir a proporção de 12 para 1 e para outra, ao mesmo tempo, a
proporção de 2 para 1. Assim, o espaço de um dia assume uma proporção
muito maior em relação a uma hora do que em relação a meio dia, e ainda
assim permanece, não obstante as duas proporções, a mesma quantidade
não-variada de tempo. Portanto, o tempo (e o espaço também, pelo mesmo
argumento) não é da natureza de uma proporção, mas de uma quantidade
absoluta e não-variada à qual pertencem proporções diferentes. A menos
que esse raciocínio possa ser demonstrado como falso, a opinião de nosso
sábio autor ainda permanece, por sua própria confissão, uma contradição.
55-63. Tudo isso me parece ser uma simples contradição, e estou disposto a
deixar isso para o julgamento dos instruídos. Em um parágrafo (seção 56)
há uma clara e distinta suposição de que o universo pode ser criado tão cedo
ou tão tarde quanto Deus quiser. No restante (seções 55, 57-63) os próprios
termos (mais cedo ou mais tarde) são tratados como termos ininteligíveis e
suposições impossíveis. Coisas similares ocorrem em relação ao espaço no
qual a matéria subsiste; ver acima, nas seções 26-32.
76 e 77. Veja acima, seções 73-75, e nas seções 1-20, e abaixo, na seção
103.
79-82. Tudo o que é contestado nos (seção 79, 80) dois primeiros desses
parágrafos é um mero jogo de palavras. A existência de Deus (como já foi
observado muitas vezes) causa o espaço, e nesse espaço todas as outras
coisas existem. É portanto (seção 80) o lugar das idéias do mesmo modo,
porque é o lugar das próprias substâncias em cujos entendimentos as idéias
existem.
A alma do homem ser (seção 81) a alma das imagens das coisas que ela
percebe, foi proposta por mim, em forma de comparação, como um
exemplo de uma noção ridícula, e esse sábio autor argumenta
agradavelmente contra ela, como se eu a tivesse afirmado como sendo
minha própria opinião.
Deus percebe tudo, não (seção 82) por meio de qualquer órgão, mas por
estar realmente presente em todos os lugares. Esse, portanto, em toda parte,
ou espaço universal, é o lugar de sua percepção. A noção de sensorium e da
alma do mundo já foi abundantemente explicada antes. É demais desejar
que a conclusão seja cedida sem trazer mais nenhuma objeção contra as
premissas.
Com relação à (seções 83, 87, 89, 90) harmonia praestabilita, pela qual os
afectos da alma e os movimentos mecânicos do corpo são ditos
concordantes sem que um influencie o outro, 151 ver abaixo, nas seções
110-116.
Com relação à (seção 84) substância imaterial que afeta ou está sendo
afetada por uma substância material, ver abaixo, na seção 110-116.
Que Deus (seção 85) percebe e conhece todas as coisas, não estando
presente a elas, mas produzindo-as continuamente e de novo, é uma mera
ficção dos educadores, sem nenhuma prova.
A objeção relativa ao ser de Deus (seções 86, 87, 88, 82) a alma do mundo
foi abundantemente respondida acima, Segunda Resposta, seção 12, e
Quarta Resposta, seção 32.
93-95. Eu acrescentei que cada ação é a doação de uma nova força para a
coisa sobre a qual se atuou. A isso, objeta-se que dois corpos duros iguais
que batem um no outro retornam com a mesma força, e que, portanto, sua
ação um sobre o outro não confere uma nova força. Talvez seja suficiente
responder que nenhum dos corpos retorna com sua própria força, mas cada
um deles perde sua própria força e cada um retorna com uma nova força
impressionada pela elasticidade do outro, porque se não são elásticos, eles
não retornam de forma alguma. Mas, de fato, todas as meras comunicações
mecânicas de movimento não são ação propriamente dita, mas mera
passividade, tanto nos corpos que impelem quanto nos que são impelidos. A
ação é o início de um movimento onde antes não havia nenhum princípio de
vida ou atividade, e se Deus, ou o homem, ou qualquer poder vivo ou ativo
alguma vez influencia qualquer coisa no mundo material, e tudo não é mero
mecanismo absoluto, deve haver um contínuo aumento e diminuição de
toda a quantidade de movimento no universo – o que esse sábio cavalheiro
frequentemente nega.[36]
96 e 97. Aqui, esse sábio autor se refere apenas ao que ele disse em outro
lugar, e eu também estou disposto a fazer o mesmo.
99. A fim de mostrar que as forças ativas no mundo (ou seja, a quantidade
de movimento ou força impulsiva dada aos corpos) não diminuem
naturalmente, esse sábio autor insiste que dois corpos inelásticos macios,
que se encontram com forças iguais e contrárias, perdem cada um deles o
movimento de seu todo, porque ele é comunicado e disperso em um
movimento de suas pequenas partes. Mas a questão é, quando dois corpos
inelásticos perfeitamente duros perdem o movimento inteiro ao se
depararem juntos, o que será então do movimento ou da força impulsiva
ativa? Ele não pode ser disperso entre as partes, porque as partes não são
capazes de um movimento tremulento por falta de elasticidade. E se for
negado que os corpos perderiam o movimento de sua totalidade, eu
respondo, então seguiria que os corpos rígidos elásticos refletiriam com
uma força dupla, ou seja, a força resultante da elasticidade, e além disso
toda (ou pelo menos parte da) força direta original - o que é contrário à
experiência.
100- 102. Que essa força ativa, no sentido definido acima, naturalmente
diminui continuamente no universo material foi mostrado no último
parágrafo. Isso não é um evidente defeito porque é apenas uma
consequência da matéria ser sem vida, sem motividade, inativa e inerte.
Pois a inércia da matéria causa não só (como observa esse sábio autor) que
a velocidade diminui proporcionalmente à medida que a quantidade de
matéria aumenta (o que de fato não é uma diminuição da quantidade de
movimento), mas também que corpos sólidos e perfeitamente duros, vazios
de elasticidade, reunidos com forças iguais e contrárias, perdem todo o seu
movimento e força ativa (como foi demonstrado acima), e devem depender
de alguma outra causa para um novo movimento.
103. Que nenhuma das coisas aqui mencionadas são defeitos, eu mostrei em
grande parte em meus documentos anteriores. Por que Deus não teve a
liberdade de criar um mundo que deveria continuar em sua forma atual por
tanto mais ou menos tempo quanto Ele pensasse ser adequado, e que
deveria então ser alterado (por tais mudanças que podem ser muito sábias e
adequadas e, ainda assim, impossíveis de serem realizadas por meio de
mecanismo) em qualquer outra forma que Ele mesmo quisesse? Se minha
dedução a partir da afirmação desse sábio autor de que o universo não pode
diminuir em perfeição, que não há nenhuma razão possível que possa
limitar a quantidade de matéria, que as perfeições de Deus o obrigam a
produzir sempre tanta matéria quanto Ele pode, e que um universo material
finito é uma ficção impraticável, se (eu digo) minha inferência que (de
acordo com essas noções) o mundo deve necessariamente ter sido ao
mesmo tempo infinito e eterno é uma inferência justa ou não, estou disposto
a deixar ao instruído, que comparará os documentos, o julgamento.
104-106. Agora nos dizem que (seção 104) o espaço não é uma ordem ou
situação, mas uma ordem de situações. Mas ainda há a objeção de que uma
ordem de situações não é uma quantidade como é o espaço. Ele se refere,
portanto, à seção 54, onde ele pensa ter provado que a ordem é uma
quantidade, e eu me refiro ao que eu disse acima neste documento, naquela
seção onde eu penso ter provado que não é uma quantidade. O que ele
acrescenta em relação ao (seção 105) tempo também se resume claramente
ao seguinte absurdo: esse tempo é apenas a ordem das coisas sucessivas e
ainda assim é realmente uma quantidade, porque não é apenas a ordem das
coisas sucessivas, mas também a quantidade de duração que intervém entre
cada uma das particularidades que sucedem nessa ordem. Esta é uma
contradição expressa.
Dizer que (seção 106) imensidão não significa espaço sem limites, e que a
eternidade não significa duração ou tempo sem começo e fim, é (creio)
afirmar que as palavras não têm significado. Em vez de raciocinar sobre
esse ponto, somos referidos ao que certos teólogos e filósofos (ou seja,
como foi a opinião desse sábio autor) reconheceram, o que não é o assunto
em questão.
107-109. Afirmei que, com relação a Deus, nenhuma coisa possível é mais
milagrosa do que outra, e que, portanto, um milagre não consiste em
qualquer dificuldade na natureza da coisa a ser feita, mas meramente na
inusualidade de Deus fazê-lo. Os termos natureza, e poderes da natureza,
curso da natureza, e afins, não passam de palavras vazias e significam
apenas que uma coisa geralmente ou frequentemente acontece. A ascensão
de um corpo humano do pó da terra chamamos de milagre, a geração de um
corpo humano da maneira comum chamamos de natural, não por nenhuma
outra razão senão porque o poder de Deus afeta um normalmente e o outro
de forma incomum. A parada repentina do sol (ou da terra) chamamos de
milagre, o movimento contínuo do sol (ou da terra) chamamos de natural,
pela mesma razão apenas de um ser habitual e o outro incomum. Se o
homem normalmente se levantasse do túmulo à medida que o milho crescia
da semente semeada, certamente deveríamos chamar isso também de
natural, e se o sol (ou a terra) ficasse constantemente parado, deveríamos
então pensar isso como natural e seu movimento a qualquer momento seria
milagroso. Contra essas razões evidentes (ces (seção 108) grandes raisons)
esse sábio autor nada oferece, mas continua a nos referir apenas às formas
vulgares de falar de certos filósofos e teólogos, o que (como observei antes)
não é o assunto em questão.
110-116. É, aqui, muito surpreendente que, por uma questão de razão e não
de autoridade, sejamos novamente (seção 110) remetidos às opiniões de
certos filósofos e teólogos. Mas omitindo isso, o que quer dizer esse sábio
autor com uma (seção 110) diferença interna real entre o que é milagroso e
não milagroso, ou entre (seção 111) operações naturais e não naturais,
absolutamente e em relação a Deus? Ele pensa que existem em Deus dois
princípios ou poderes de ação diferentes e realmente distintos e que uma
coisa é mais difícil para Deus do que outra? Se não, então, tanto uma ação
natural e uma ação sobrenatural de Deus são termos cujo significado é
apenas relativo a nós, que chamamos um efeito habitual do poder de Deus
de natural e um sobrenatural de incomum, sendo (seção 112) a força da
natureza, na verdade, nada mais que uma palavra vazia, ou, então, por uma
deve entender-se aquilo que Deus mesmo faz imediatamente, e pela outra
aquilo que Ele faz mediatamente pela instrumentalidade das segundas
causas. A primeira destas distinções é o que esse sábio autor aqui se opõe
declaradamente, a segunda é a que ele expressamente renuncia (seção 117),
onde ele admite que os anjos possam fazer verdadeiros milagres. E, no
entanto, além dessas duas, acho que nenhuma outra distinção pode ser
imaginada.
117. Esse sábio autor admite aqui que há milagres maiores e menores em
verdade, e que os anjos são capazes de fazer verdadeiros milagres, sendo
perfeitamente contraditório com aquela noção da natureza de um milagre, a
qual ele sempre defendeu nestes documentos.
Quanto ao grande princípio de uma (seção 125, etc.) razão suficiente, tudo o
que esse sábio autor aqui acrescenta a respeito é apenas uma forma de
afirmar e não provar sua conclusão, e, por isso, não precisa de resposta.
Devo apenas observar que a frase é de significação equívoca e pode ser
entendida apenas como uma necessidade ou também como uma vontade e
uma escolha. Isso, em geral (seção 125), é uma razão suficiente para que
tudo seja, o que é, sem dúvida, verdade e está de acordo em todos os
sentidos. Mas a questão é se, em alguns casos, quando pode ser altamente
razoável agir, embora diferentes maneiras possíveis de agir possam não ser
igualmente razoáveis, e se, em tais casos, a vontade nua de Deus não é em
si mesma uma razão suficiente para agir desta ou de outra maneira
particular, e também nos casos em que existem as razões mais fortes
possíveis em conjunto.
N.B. O Sr. Leibniz foi impedido pela morte de devolver qualquer resposta
a este último documento.
[1] Trechos extraídos de uma carta enviada em novembro de 1715 a Caroline, Princesa de Gales
[2]
Ver o Ensaio Acerca do Entendimento Humano, IV, 3.6, e a Primeira Carta de Locke a
Stillingfleet; ver também o Prefácio de Leibniz aos Novos Ensaios.
[3]
Ver final da Pesquisa 31, em Óptica, de Isaac Newton.
[4]
Clarke se refere à uma passagem em Óptica, Pesquisa 28.
[5]
“Deus, segundo minha opinião, é uma inteligência extramundana, como Martianus Capelli o
chama, ou melhor, uma inteligência supramundana”. Leibniz, Theodicéia, seção 217.
[6]
Ver Arquimedes, Sobre o Equilíbrio dos Planos, Livro I, Postulado I.
[7]
Ver Leibniz, Theodicéia.
[8]
Clarke faz referência ao Principia de Newton, Escólio para a Definição 8.
[9]
Rudolph Goclenius, Lexicon Philosophicum – Frankfurt, 1613; ed. reimpressa, Hildesheim: Georg
O lrns, 1980, p. 1024. Goclenius foi uma obra de referência padrão para filósofos do século XVII, um
compêndio alfabético de definições e distinções padrão. A passagem se traduz como: [Sensiterium é]
um barbarismo devido aos escolásticos, que às vezes imitavam os gregos. Os gregos diziam
aitheterion, do qual os escolásticos formaram o sensiterium, no lugar do sensorium, ou seja, o órgão
da sensação”.
[10]
“Ídolo da tribo”, ver Bacon, Novo Órganon, Aforismo 41.
[11]
Acréscimo feito por Clarke; Leibniz disse “não há escolha alguma.”
[12]
Adição feita por Clarke.
[13]
Essa passagem foi omitida por Clarke.
[14]
O mais alto ponto, a última perfeição, o apogeu.
[15]
“Fora de Deus”.
[16]
Clarke faz referência ao Escólio Geral do Principia.
[17]
A metafísica.
[18]
“O Imperador da Lua”. Comédia inglesa escrita por Aphra Behn em 1687.
[19]
Apenas no número.
[20]
Agindo sem nada fazer.
[21]
Otto von Guericke (1602-1686) foi um experimentalista e o inventor da bomba de ar.
[22]
Evangelista Torricelli (1608-1647) foi aluno de Galileu e o inventor do o barômetro.
[23]
Esta é uma referência a Horácio, Da Arte Poetica, 1.5: “Spectatum admissi risum teneatis amici.” [“Se vocês vissem tal coisa,
poderiam abster-se de rir, amigos?”].
[24]
Ou seja, expressões bárbaras ou estranhas.
[25]
“Se um pintor quisesse unir o pescoço de um cavalo a uma cabeça humana …” Horácio, Da Arte Poética. A frase termina
com o verso citado no nº 42: “Se vocês vissem tal coisa, poderiam abster-se de rir, amigos”?
[26]
“A conclusão não é válida”.
[27]
Na doutrina escolástica, espécies intencionais ou inteligíveis (espécies intencionais, como Clarke diz.
[28]
Isaac Jaquelot, Conformite de Ia Poi avec Ia Raison (Amsterdam, 1705).
[29]
Adição de Clarke.
[30]
“Comer bolotas depois de ter colhido milho”.
[31]
Força centrífuga
[32]
“Acho que implica em contradição o fato de que o mundo seja finito.”
[33]
Distante de nós e muito separado das coisas.
[34]
Atos 17.27-28.
[35]
Nota de Clarke: A principal ocasião ou razão da confusão e inconsistências, que aparecem no que a maioria dos escritores
tem apresentado em relação à natureza do espaço, parece ser que (a menos que atentem cuidadosamente) os homens estão muito
aptos a negligenciar aquela distinção necessária (sem a qual não pode haver um raciocínio claro) que sempre deve ser feita entre
abstratos e concretos, tais como são immensitas e imensum, e também entre idéias e coisas, tais como são a noção (que está
dentro de nossa própria mente) de imensidão e a imensidão real realmente existente fora de nós.
Todas as concepções (penso eu) que já foram ou podem ser enquadradas em relação ao espaço são estas que se seguem: que ele ou
é absolutamente o nada ou uma mera idéia ou é apenas uma relação de uma coisa com outra, ou ele é corpo ou alguma outra
substância, ou então é uma propriedade de uma substância.
Que ele não é absolutamente nada é o mais evidente. Porque do nada não há quantidade, não há dimensões, não há propriedades.
Esse princípio é o primeiro fundamento de toda ciência, expressando a única diferença entre o que existe e o que não existe.
Que ele não é uma mera idéia é igualmente muito evidente. Porque nenhuma idéia de espaço pode possivelmente enquadrar-se
como maior do que finito, e ainda assim a razão demonstra que é uma contradição que o espaço em si não seja de fato infinito.
Que ele não é uma mera relação de uma coisa com outra, decorrente de sua situação ou ordem entre si, não é menos aparente, pois
o espaço é uma quantidade, o que as relações (como a situação e a ordem) não são, como mostrei em grande parte abaixo, na
seção 54. Também porque, se o universo material é ou pode ser finito, não pode deixar de haver espaço extramundano real ou
possível; veja nas seções 54. 31, 52, e 73.
Que o espaço não é um corpo também é muito claro. Pois então o corpo seria necessariamente infinito e nenhum espaço poderia
ser vazio de resistência ao movimento. Isto é contrário à experiência.
Que o espaço não é nenhum tipo de substância não é menos claro, porque espaço infinito é immensitas, não immensum, enquanto
substância infinita é immensum e não immensitas assim como a duração infinita não é uma substância, porque duração infinita é
aeternitas e não aeternum, mas substância infinita é aeternum e não aeternitas.
Resta, portanto, por consequência necessária, que o espaço é uma propriedade, da mesma forma como a duração o é. lmmensitas é
τον immensi, assim como aeternitas é τον aeterni.
[36]
Nota de Clarke: Parece haver uma grande confusão e inconsistência em toda a noção do Sr. Leibniz sobre esse assunto.
Porque a palavra força, e força ativa, significa, na presente questão, o impulso ou força relativamente impulsiva dos corpos em
movimento; ver minha Terceira Resposta, seção 13. O Sr. Leibniz usa constantemente a palavra nesse sentido, como quando ele
fala (seções 93, 94, 99 e 107 da última resposta) de corpos que não mudam sua força após a reflexão porque retornam com a
mesma velocidade; de um corpo que recebe uma nova força de outro corpo que perde tanto da sua própria força; da
impossibilidade de que um corpo adquira qualquer nova força sem a perda de tanto pelo outro; da nova força que todo o universo
material receberia, se a alma do homem comunicasse qualquer força ao corpo; e das forças ativas que continuam sempre as
mesmas no universo porque a força que os corpos inelásticos perdem em seu todo é comunicada e dispersa entre suas pequenas
partes. Agora, esse impulso, ou força ativa relativamente impulsiva dos corpos em movimento, é evidentemente, tanto na razão
como na experiência, sempre proporcional à quantidade de movimento. Portanto, de acordo com os princípios do Sr. Leibniz,
como essa força ativa impulsiva é sempre a mesma em quantidade, a quantidade de movimento também deve ser necessariamente
sempre a mesma no universo. Ainda assim, em outros lugares ele reconhece (seção 99) que a quantidade de movimento nem
sempre é a mesma, e na Acta Eruditorum de 1686, p.161 [GM VI, 117-9], ele se empenha em provar que a quantidade de
movimento no universo nem sempre é a mesma, a partir desse mesmo argumento, e apenas desse único argumento (de que a
quantidade de força impulsiva é sempre a mesma) que, se fosse verdade, inferiria necessariamente, ao contrário, que a quantidade
de movimento não poderia ser de outro modo senão sempre a mesma. A razão de sua inconsistência em relação a essa questão foi
seu cômputo, por um maravilhoso erro pouco filosófico, da quantidade de força impulsiva em um corpo ascendente a partir da
quantidade de sua matéria e do espaço descrito por ele na ascensão, sem considerar o tempo de sua ascensão.
Ele diz (Acta Eruditorum, 1686, p. 162): “Suponho que a mesma força é necessária para elevar um corpo A de uma libra de peso
até a altura de quatro jardas, o que elevará o corpo B de quatro libras de peso até a altura de uma jarda. Isso é concedido tanto
pelos cartesianos quanto por outros filósofos e matemáticos de nosso tempo. E daí decorre que o corpo A, ao cair da altura de
quatro jardas, adquire exatamente a mesma força que o corpo B, ao cair da altura de uma jarda”.
Mas, nessa suposição, o Sr. Leibniz está muito enganado. Nem os cartesianos nem nenhum outro filósofo ou matemático o
concedem, exceto somente em tais casos em que os tempos de subida ou descida são iguais. Se um pêndulo oscila em um ciclóide,
o arco do ciclóide descrito na ascensão será como a força com a qual o corpo pendular começa a subir do ponto mais baixo,
porque os tempos de ascensão são iguais. E se corpos iguais oscilarem sobre o braço de uma balança a várias distâncias do eixo da
balança, as forças dos corpos serão proporcionais como os arcos descritos por eles na oscilação, pois eles oscilam ao mesmo
tempo. E se dois globos iguais deitados sobre um plano horizontal forem impelidos por forças desiguais, eles descreverão em
tempos iguais espaços proporcionais às forças que os impelem. Ou se globos desiguais forem impelidos por forças iguais, eles
descreverão, em tempos iguais, espaços mutuamente proporcionais a suas massas. E, em todos esses casos, se corpos iguais forem
impelidos por forças desiguais, as forças impressionadas, as velocidades geradas e os espaços descritos em tempos iguais serão
proporcionais uns aos outros. E se os corpos forem desiguais, a velocidade dos corpos maiores será tanto menor quanto os corpos
são maiores e, portanto, o movimento (decorrente da massa e velocidade juntos) será em todos estes casos, e em todos os outros
casos consequentemente, proporcional à força impressionada. (A propósito, a partir disso, é evidente que, se há sempre a mesma
força impulsiva no mundo, como afirma o Sr. Leibniz, deve haver sempre o mesmo movimento no mundo, ao contrário do que ele
afirma).
Mas o Sr. Leibniz confunde os casos em que os tempos são iguais com os casos em que os tempos são desiguais, e especialmente
aquele dos corpos que sobem e descem nas extremidades dos braços desiguais de um equilíbrio (Acta Eruditorum, 1686, p. 162;
1690, p. 234; 1691, p. 439; 1695, p. 155 [GM VI, 117-9; 193-203.204-11, 234]) é confundido por ele com o dos corpos que caem
para baixo e que são jogados para cima sem levar em conta a desigualdade do tempo. Pois um corpo com uma mesma força e uma
mesma velocidade descreverá em um tempo maior um espaço maior, e portanto o tempo deve ser considerado e as forças não
devem ser consideradas proporcionais aos espaços, a menos que os tempos sejam iguais. Onde os tempos são desiguais, as forças
de corpos iguais correspondem aos espaços aplicados aos tempos. E nisso os cartesianos e outros filósofos e matemáticos
concordam, todos eles considerando as forças impulsivas dos corpos proporcionais aos seus movimentos, e medindo seus
movimentos pelas suas massas e velocidades juntas, e suas velocidades pelos espaços que descrevem, aplicados aos tempos em
que os descrevem. Se um corpo lançado para cima, ao dobrar sua velocidade, subir quatro vezes mais no dobro do tempo, sua
força impulsiva será aumentada, não na proporção do espaço descrito por sua subida, mas na proporção desse espaço aplicada ao
tempo, ou seja, na proporção de 4/2 a 1/1 ou 2 para 1. Porque se, nesse caso, a força aumentasse na proporção de 4 para 1 e, ao
oscilar em um ciclóide, o mesmo corpo com a mesma velocidade dobrada descrevesse apenas um arco dobrado e, portanto, sua
força fosse apenas dobrada, esse corpo, com um e o mesmo grau de velocidade, teria o dobro da força quando jogado para cima do
que quando jogado horizontalmente - o que é uma clara contradição. E há a mesma contradição em afirmar que, embora um corpo
no final de braços desiguais de um equilíbrio, ao dobrar sua velocidade, adquire apenas uma força impulsiva dobrada, porém, ao
ser lançado para cima com a mesma velocidade dobrada, adquire uma força impulsiva quádrupla - nessa afirmação, eu digo, há a
mesma contradição, pois corpos iguais com velocidades iguais não podem ter forças impulsivas desiguais.
Supondo que a gravidade é uniforme, Galileu demonstrou o movimento dos projéteis em meios sem resistência, e suas
proposições são admitidas por todos os matemáticos, não excetuando o próprio Sr. Leibniz. Agora, supondo que o tempo de queda
de um corpo seja dividido em partes iguais, uma vez que a gravidade é uniforme e, assim sendo, age igualmente em partes iguais
do tempo, ela deve por sua ação impressionar e comunicar ao corpo em queda forças impulsivas, velocidades e movimentos
iguais, em tempos iguais. E, portanto, a força impulsiva, a velocidade e o movimento do corpo em queda aumentará na proporção
do tempo de queda. Mas o espaço descrito pelo corpo em queda surge em parte da velocidade do corpo e em parte do tempo de
sua queda, e assim está em uma relação composta de ambos, ou como o quadrado de qualquer um deles, e consequentemente
como o quadrado da força impulsiva. E, pela mesma forma de argumentar, pode ser provado que, quando um corpo é jogado para
cima com qualquer força impulsiva, a altura a que ele subirá será como o quadrado dessa força, e que a força necessária para fazer
com que o corpo B de quatro libras de peso suba uma jarda fará com que o corpo A de uma libra de peso suba (não quatro jardas,
como o Sr. Leibniz representa, mas) dezesseis jardas, em quatro vezes o tempo. Pois a gravidade de quatro libras de peso em uma
parte do tempo atua tanto quanto a gravidade de uma libra de peso em quatro partes do tempo.
Ademais, o Sr. Herman, em sua Phoronomia [Amsterdã, 1716], p. 113 (argumentando a favor do Sr. Leibniz contra aqueles que
sustentam que as forças adquiridas pela queda de corpos são proporcionais aos tempos de queda, ou às velocidades adquiridas)
afirma que isso se baseia em uma falsa suposição: que os corpos lançados para cima recebem da gravidade que lhes resiste um
número igual de impulsos em tempos iguais. Isso equivale a dizer que a gravidade não é uniforme e, por consequência, a derrubar
a teoria de Galileu sobre os projéteis, admitida por todos os geômetras. Suponho que ele quer dizer que quanto mais rápido o
movimento dos corpos é para cima, mais numerosos são os impulsos, porque os corpos se encontram com as partículas gravitantes
(imaginárias). E assim, o peso dos corpos será maior quando eles se movem para cima e menor quando se movem para baixo. No
entanto, o Sr. Leibniz e o próprio Sr. Herman admitem que a gravidade em tempos iguais gera velocidades iguais em corpos
descendentes e retira velocidades iguais em corpos ascendentes, sendo, portanto, uniforme. Em sua ação sobre os corpos para
gerar velocidade, eles admitem que ela seja uniforme, em sua ação sobre eles para gerar força impulsiva, eles negam que ela seja
uniforme, e assim são inconsistentes com eles próprios.
Se a força adquirida por um corpo em queda é conforme o espaço descrito, que o tempo seja dividido em partes iguais, e se na
primeira parte do tempo ganha uma parte da força, nas duas primeiras partes do tempo ganhará quatro partes da força, nas três
primeiras partes do tempo ganhará nove partes da força, e assim por diante. E, por consequência, na segunda parte do tempo,
ganhará três partes de força, na terceira parte do tempo ganhará cinco partes de força, na quarta parte do tempo ganhará sete partes
de força, e assim por diante. E, portanto, se a ação da gravidade para gerar estas forças for suposta, no meio da primeira parte do
tempo, ser de um grau, será, no meio da segunda, terceira e quarta partes do tempo, de três, cinco e sete graus, e assim por diante;
isto é, será proporcional ao tempo e à velocidade adquirida, e, por consequência, no início do tempo não será nenhuma, e assim o
corpo, por falta de gravidade, não cairá. E, pela mesma forma de argumentar, quando um corpo é jogado para cima, sua gravidade
diminuirá conforme sua velocidade diminui e cessará quando o corpo deixar de subir, e então, por falta de gravidade, ele
descansará no ar e não cairá mais. A noção desse sábio autor está repleta de absurdos, neste particular.
Para decidir essa questão de forma demonstrativa, deixe dois globos pendulares de aço temperado serem suspensos por raios ou
fios de comprimento igual, de modo que, quando pendurados e tocados um no outro, os raios ou fios possam ser paralelos. Que
um dos globos seja constantemente o mesmo e seja colocado ao lado um do outro a mesma distância em todas as etapas
subsequentes. Deixe que o outro seja de qualquer tamanho e seja afastado de forma contrária a uma distância reciprocamente
proporcional a seu peso. Que ambos sejam então deixados de lado no mesmo momento, para que possam se encontrar no lugar
mais baixo de sua descida, onde penduraram antes de serem afastados; e o primeiro globo sempre se recuperará da mesma forma
do outro. Por esta razão, a força do outro é sempre a mesma quando sua velocidade é reciprocamente proporcional ao seu peso. E,
por consequência, se seu peso permanecer o mesmo, sua força será proporcional à sua velocidade. C. Q. D.
[37]
Nota de Clarke: A vis inertiae da matéria é aquela força passiva pela qual a matéria continua sempre no estado em que se
encontra e nunca muda esse estado, senão na proporção de um poder contrário agindo sobre ela. Trata-se daquela força passiva
não pela qual (como o Sr. Leibniz entende da Kepler) a matéria resiste ao movimento, mas pela qual resiste igualmente a qualquer
mudança do estado em que se encontra, seja de repouso ou de movimento, de modo que a mesma força, que é necessária para dar
qualquer certa velocidade a qualquer certa quantidade de matéria em repouso, é sempre exatamente necessária para reduzir a
mesma quantidade de matéria do mesmo grau de velocidade para um estado de repouso novamente. Essa vis inertiae é sempre
proporcional à quantidade de matéria e, portanto, continua invariavelmente a mesma em todos os estados possíveis da matéria, em
repouso ou em movimento, e nunca é transferida de um corpo para outro. Sem essa vis, a menor força daria qualquer velocidade à
maior quantidade de matéria em repouso, e a maior quantidade de matéria em qualquer velocidade de movimento seria
interrompida pela menor força sem o menor choque. Assim, toda a força na matéria, seja em repouso ou em movimento, toda sua
ação e reação, todo impulso e toda resistência, nada mais é do que essa vis inertiae em diferentes circunstâncias.
[38]
Nota de Clarke: Ou seja, proporcional à quantidade de matéria e à velocidade, não (como afirma o Sr. Leibniz, Acta
Eruditorum 1695, p. 156) à quantidade de matéria e ao quadrado da velocidade. Veja acima, a nota de rodapé da seção. 93-5.