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Dossiê Geisel
Dossiê Geisel
ISBN — 978-85-225-1111-2
Copyright © Celso Castro e Maria Celina D’Araujo
Direitos desta edição reservados à
EDITORA FGV
Praia de Botafogo, 190 — 14º andar
22253-900 — Rio de Janeiro — Brasil
Tels.: 0800-21-7777 — 0-XX-21-2559-5543
Fax: 0-XX-21-2559-5532
e-mail: editora@ fgv.br
http://www.fgv.br/editora
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Todos os direitos reservados. A reprodução não autorizada desta publicação,
no todo ou em parte, constitui violação do copyright (Lei nº 5.988)
1ª edição — 2002
2ª edição — 2002
3ª edição — 2002
R EVISÃO DE O RIGINAIS: Luiz Alberto Monjardim
P ROJETO E DITORIAL: Editora FGV
R EVISÃO : Fatima Caroni e Mauro Pinto de Faria
C APA : Leonardo Carvalho
F OTO DA C APA : Arquivo Ernesto Geisel, Cpdoc/FGV
Inclui bibliografia.
CDD — 981.0644
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Sumário
Introdução 7
Celso Castro e Maria Celina D’Araujo
As apreciações do SNI 41
Celso Castro
Bibliografia 169
Anexos 175
Introdu•‹o.fm
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Introdução
C e l so C a s t r o e M a r i a C el i n a D ’ A r a u j o
Introdu•‹o.fm
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8 DO SSIÊ G E ISEL
2
Para a compreensão desse governo, ver D’Araujo & Castro, 1997; Góes, 1978; e Oliveira,
1994.
3 Essa linha de pesquisa desenvolvida no Cpdoc, em colaboração com Gláucio Soares, con-
tou desde o início com o apoio decisivo da Finep, através dos projetos “1964 e o regime mi-
litar” (1992-95) e “Democracia e Forças Armadas no Brasil e nos países do Cone Sul” (1997-
2000). A partir de 1997, passou também a integrar o projeto “Brasil em transição: um ba-
lanço do final do século XX”, apoiado pelo Programa de Apoio a Núcleos de Excelência
(Pronex). Especificamente para a organização do Arquivo Geisel, contamos com o apoio da
Copene, viabilizado por intermédio de Otto Perrone.
4
Ver Soares & D’Araujo, 1994a, 1994b, 1994c, 1995.
5
Ver D’Araujo & Castro, 1997.
Introdu•‹o.fm
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6
Ver Os presidentes da República: guia dos acervos privados. p. 84-6.
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7
Os dados estão no quadro “Despachos com os ministros de Estado”, reproduzido no
anexo 9.
Introdu•‹o.fm
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12 DO SSIÊ G E ISEL
14 DO SSIÊ G E ISEL
1907 Nasce em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul (3-8), filho do imi-
grante alemão Augusto Guilherme Geisel e de Lydia Beckmann Geisel. É o
mais moço de cinco irmãos: Amália, Bernardo, Henrique, Orlando e Ernesto.
1931 Escalado para levar uma bateria de artilharia à Paraíba, segue para
o Nordeste e, por indicação de Juarez Távora, é nomeado diretor-geral do
Departamento de Segurança Pública e secretário-geral do governo do Rio
Grande do Norte, na interventoria de Aluísio Moura (17-3). Retorna à sua
bateria de artilharia na Paraíba (19-6). Participa, em Recife, do combate ao
levante do 21o Batalhão de Caçadores, que visava a depor o interventor
federal em Pernambuco, Carlos de Lima Cavalcanti (29-10). Nomeado
membro do Conselho Consultivo do Estado da Paraíba na interventoria de
Antenor Navarro (dezembro).
1932 Segue com sua bateria para o vale do Paraíba, a fim de dar com-
bate aos revolucionários paulistas, e se integra ao destacamento coman-
dado pelo coronel Daltro Filho (julho). De volta à Paraíba, é nomeado
secretário da Fazenda, Agricultura e Obras Públicas do estado pelo novo
interventor Gratuliano de Brito.
1939 Conclui o curso da Escola das Armas, em primeiro lugar (3-2). Desig-
nado instrutor-chefe de artilharia e comandante da bateria dos cadetes que
faziam o curso da arma de artilharia na Escola Militar do Realengo (8-2).
1940 Casa-se com sua prima, Lucy Markus (10-1). O casal mora primeiro
numa pensão, na rua Conde de Bonfim, e depois aluga uma casa no Rea-
lengo. Nasce seu filho Orlando (novembro).
1944 Vai para os Estados Unidos (16-9), onde faz o curso de comando e
estado-maior em Fort Leavenworth e o curso de ligação com a força aérea
em Key Field, além de estágios em outras escolas militares.
1945 Nasce sua filha Amália Lucy (janeiro) em Estrela, no Rio Grande do
Sul, onde dona Lucy aguardava, junto dos pais, sua volta dos Estados Uni-
dos. Retorna dos Estados Unidos (maio). Designado chefe de gabinete do
general Álcio Souto na Diretoria de Motomecanização do Ministério da
Guerra (28-6). Auxilia o coronel Ulhoa Cintra nas operações militares feitas
no Rio de Janeiro por ocasião da deposição de Vargas (29-10).
16 DO SSIÊ G E ISEL
1964 Assim como seus irmãos Henrique (já na reserva) e Orlando, e seu
amigo Golbery, integra o grupo militar que se opõe a Goulart e tem como
líder o general Castelo Branco, então chefe do Estado-Maior do Exército.
Após o golpe militar e a eleição de Castelo Branco pelo Congresso (11-4), é
nomeado chefe do Gabinete Militar da Presidência da República, passando
automaticamente a chefiar também a Secretaria Geral do Conselho de
Segurança Nacional (15-4). Orlando Geisel exerce sucessivamente impor-
tantes comandos, e Golbery passa a chefiar o SNI quando este é criado (13-
6). João Batista Figueiredo dirige a Agência Central do SNI, no Rio de
Janeiro. Promovido a general-de-divisão (25-11).
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20 DO SSIÊ G E ISEL
M a r ia C e li n a D ’ A r a u j o
* Agradeço a leitura e os comentários de Celso Castro, Mauro Lopez Rego e Angela de Cas-
tro Gomes.
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1
Ver Hippólito, 1985.
2
Ver D’Araujo & Castro, 1997.
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5
Todos os documentos citados neste capítulo são do dossiê EG/pr 1974.04.24.
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6
O documento está reproduzido no anexo 3.
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7
Ver, no anexo 4, parecer da censura, de 20-8-1975, sobre o mesmo tema.
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governo a questões relativas à terra, aos índios ou mesmo aos padres es-
trangeiros que acabaram sendo expulsos do país não tem a dimensão que
o historiador gostaria de encontrar. Chamam a atenção, contudo, as con-
versas de Armando Falcão com d. Eugênio Sales, que elogia a sincerida-
de do governo ao admitir que existem presos políticos e tortura no país.
Nessas ocasiões, o cardeal posiciona-se contra o divórcio e a legalização
dos jogos, solicita mais respeito aos direitos humanos e sugere que o
combate à subversão seja feito pela polícia, e não pelos militares. Em se-
tembro de 1975, d. Eugênio, segundo o ministro, começou a promover
reuniões com empresários e políticos para discutir “problemas gerais do
Brasil”. Solicita a Armando Falcão permissão para convocar também mi-
litares para esses encontros. Geisel coloca um ponto de interrogação
nesse tópico, e Falcão se diz contra. Sobre d. Evaristo Arns, as referências
o qualificam como “inconveniente” por seu envolvimento com a anistia e
com iniciativas de “interesse dos inimigos do governo.”
O movimento estudantil, antigo estorvo para o governo, conti-
nuou merecendo atenção especial dos órgãos de informação. Recortes
de jornais mostram a retomada do movimento em vários estados, espe-
cialmente em São Paulo, o que é lido como a retomada da subversão. O
movimento estudantil fica associado também ao de intelectuais e aos de
grupos de defesa dos presos políticos. As denúncias de torturas e maus-
tratos nas prisões tornam-se uma questão que atinge diretamente a insti-
tuição militar, merecendo a atenção do governo, conforme se infere de
relatórios de consultores jurídicos. Ao mesmo tempo, Geisel decide não
responder, perante a ONU e a OEA, às denúncias da Anistia Internacio-
nal contra a situação dos direitos humanos no Brasil. Ou seja, seguindo
seu estilo de mando, esse seria um tema a ser tratado domesticamente.
As investidas policiais e militares contra o Partido Comunista do
Brasil, na clandestinidade, foram intensas durante o governo Geisel e cul-
minaram com o “cerco da Lapa” em dezembro de 1976, quando três
membros da direção do partido foram assassinados e outros seis presos.
Os preparativos para essa caçada estão parcialmente registrados no ar-
quivo. Por ele se vê que o diretor-geral do Departamento Federal de Jus-
tiça, Paulo Emílio Queiroz Barcelos, nomeado para cuidar do assunto,
atuaria em conformidade com as orientações do ministro do Exército, Síl-
vio Frota. Este, em várias ocasiões, transmite sua preocupação com o
tema. Em março de 1975, adverte que as informações sobre anistia, de-
saparecidos, prisões ilegais e tortura inquietam os militares em São Paulo,
conforme lhe relatava o comandante do então II Exército, general Ednar-
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do. Nessa mesma ocasião, Armando Falcão reúne-se com os chefes mili-
tares de São Paulo, que expressam seu descontentamento com a impren-
sa paulista. Ednardo pede mais controle da censura, além de cortes de
crédito e de publicidade. O general propõe ainda a criação de uma
Agência Brasileira de Notícias para atuar com a Agência Nacional, a edi-
ção de um livro branco da subversão e a cassação dos parlamentares do
MDB que tiverem apoio do PC (II-33).8
Nos meses seguintes, aparecem estudos sobre prisão perpétua e
pena de morte e sobre a Lei de Segurança Nacional, de modo a torná-la
mais rígida. Pelas sugestões apresentadas, qualquer seqüestro seria consi-
derado crime contra a segurança nacional, e ameaça de seqüestro seria
punida com pena de reclusão de dois a quatro anos. Na proposta alega-
se haver “recrudescimento de fatos criminosos, consistentes em seqües-
tros de adultos e crianças”. Ao lado dessa proposta, Geisel escreve “Não!”
(IV-8). Portanto, não admira que, nesse ímpeto de caça às bruxas, os fatos
em São Paulo tenham culminado com os dois assassinatos que levaram à
queda do comandante do II Exército no início de 1976.9
A necessidade de combate à subversão foi também o tema do
discurso de Armando Falcão na Conferência Nacional de Secretários de
Segurança dos Estados, realizada em março de 1975. Ali o ministro de-
clarava que a subversão não acabara, apenas mudara de tática, seguindo
orientações estrangeiras, com rearticulação na clandestinidade e “infiltra-
ção solerte e disfarçada”. Nesse mesmo mês são apresentados ao presi-
dente dados de investigações sobre a ação dos comunistas dentro do
MDB em vários estados, envolvendo a prisão de vários parlamentares. O
intuito do inquérito é mostrar que os comunistas estão usando o partido
como meio para chegar ao poder. Ali se afirma que o PCB seria o orien-
tador da linha política do MDB, e que este seria o meio para a “eminên-
cia vermelha” no Brasil.10
8
O documento está reproduzido no anexo 2.
9 Em outubro de 1975, o jornalista Wladimir Herzog foi morto nas dependências do DOI-
Codi em São Paulo. Em janeiro seguinte, no mesmo local, foi assassinado o operário Manoel
Fiel Filho. Essas duas mortes estão na origem da exoneração, pelo presidente da República,
do comandante do II Exército, Ednardo D’Ávila Melo.
10
O bipartidarismo tutelado imposto pela ditadura acabou fazendo do MDB o único canal
possível para a participação das oposições e da esquerda. Mas esse partido, aqui identifica-
do como expressão do comunismo, era formado principalmente pela oposição moderada e
por liberais sob a liderança de Ulisses Guimarães (1916-92), o político mais identificado com
a imagem combatente do partido.
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11
Após várias negociações, César Queiroz Benjamin deixou o país sob proteção oficial.
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Política externa
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13
O episódio é narrado pelo presidente em D’Araujo & Castro, 1997:342-3.
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Conclusão
Existem vários aspectos políticos do governo Geisel que em
princípio deveriam ser abordados pela pasta da Justiça, mas cujos regis-
tros não são ali encontrados. Não há, por exemplo, referências aos en-
tendimentos visando ao fim do AI-5, em dezembro de 1978, nem infor-
mações substantivas sobre a Missão Portela nem sobre a sucessão
presidencial. Sabemos que a escolha do sucessor, general João Batista Fi-
gueiredo, foi feita com antecedência de um ano e que suscitou sérias di-
vergências entre os militares.
A historiografia tem registrado o papel das conversações parla-
mentares e a importância que algumas figuras tiveram nesse governo,
como Petrônio Portela, Thales Ramalho e Golbery do Couto e Silva, for-
tes articuladores dos entendimentos para um retorno à “normalidade ins-
titucional”. Os documentos aqui focalizados e nosso conhecimento sobre
o período nos levam a enfatizar algumas mudanças que sinalizam um
novo perfil ou um revigoramento de algumas instituições políticas brasi-
leiras a partir desse momento. A primeira é que o Ministério da Justiça,
cujo desgaste político já vinha se verificando desde o início do regime mi-
litar, deixa de ser definitivamente o espaço das grandes negociações po-
líticas. O processo de abertura, marca maior desse governo, não foi ali
concebido nem articulado. Os ministérios que passam a ganhar notorie-
dade a partir de então são aqueles vinculados à área econômica.
A segunda mudança diz respeito a uma nova valorização do
papel do Congresso. A redemocratização foi amplamente negociada por
lideranças parlamentares em aliança com setores do Executivo, coman-
dados por Golbery. Esse fato reforça a tese defendida pela literatura de
que a ditadura brasileira, ao contrário das demais da América Latina,
sempre procurou ganhar legitimidade através de um Parlamento aberto,
ainda que esse fosse apenas um funcionamento formal. De toda forma, a
abertura que se fez através do Parlamento acabou valorizando certos lí-
deres e dando-lhes legitimidade política. Do Congresso saíram as lideran-
ças que iriam conduzir parte do processo político, quer do ponto de vista
da situação, quer da oposição, como Marco Maciel, José Sarney, Tancre-
do Neves e Ulisses Guimarães.
Finalmente, vale lembrar que a aridez dos temas do arquivo é
às vezes amenizada por situações patéticas à época ou mesmo até hoje.
Vamos relatar dois casos. O primeiro diz respeito a uma coincidência de
datas. No ano de 1975, a data religiosa de celebração do Dia Nacional de
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As apreciações do SNI
C e l s o C a s t ro
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CELSO CASTRO 43
1 Será freqüentemente utilizado, no texto a seguir, o termo “analista” para referir-se a um hi-
potético autor das apreciações. Trata-se de recurso utilizado apenas para facilitar a exposi-
ção. Não se deve perder de vista, no entanto, que as apreciações eram de autoria coletiva
(embora a responsabilidade final fosse do chefe do SNI) e que, durante o período, prova-
velmente mudaram os responsáveis pela elaboração desses documentos.
2
Todos os documentos citados neste capítulo estão no dossiê EG/pr 1974.03.03.
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previsão do SNI e o resultado final das eleições sugere quão forte deve
ter sido o susto:
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3
No documento II-9, de 29-9-1975, há um interessante quadro das facções da Arena em
cada estado.
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CELSO CASTRO 47
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vésperas das eleições, já havia indícios de que isso poderia ocorrer. Se-
gundo a apreciação de 8-11-1976 (IV-19), os levantamentos realizados
mês a mês pelas agências regionais do SNI indicavam que a situação da
Arena, em termos eleitorais, melhorava em todo o país. Conhecidos os
resultados, a maioria obtida pela Arena em número de prefeituras e ve-
readores era atribuída “à firmeza, determinação e empenho pessoal do
presidente Geisel”, que se envolvera pessoalmente na campanha.
Embora em tom bem mais aliviado, as análises seguintes discor-
rem longamente sobre os debates referentes a reformas políticas. O ana-
lista considera “difícil — talvez até impossível” o aperfeiçoamento político
a partir da sobrevivência dos dois partidos políticos legalmente existentes,
vistos como inautênticos e sem perspectivas de virem a ser autênticos:
“Os dois partidos já configuram uma experiência que parece esgotada na
dissonância com o processo revolucionário” (III-14).
Os esforços da direção da Arena para fazê-la porta-voz e instru-
mento da “Revolução” não são considerados efetivos a ponto de consegui-
rem “dominar ou relegar a segundo plano as contradições internas, provo-
cadas por forte tendência partidária de caráter liberalizante, ultrapassada e
desajustada dos rumos políticos que a Revolução já definiu como irrever-
síveis”. O MDB, por outro lado, “tanto já contemporizou com seus radicais
que dificilmente encontrará meios de compatibilizar-se com o processo re-
volucionário”. Com isso, cada vez mais seria generalizada a convicção da
necessidade de uma reforma partidária que extinguisse as atuais legendas.
O diagnóstico de que o bipartidarismo estava esgotado não se
modifica com os resultados das eleições de novembro de 1978, conside-
rados pelo analista “totalmente satisfatórios” (VIII-24).
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de reconhecer que prisões têm sido feitas sob a forma aparente de se-
qüestros, maus-tratos têm sido aplicados aos prisioneiros, prazos legais
não têm sido obedecidos, comunicações sobre as prisões não têm sido
feitas como recomenda a lei”.
Segundo o analista, era imperativo submeter o combate à sub-
versão “à estrita observância dos dispositivos legais”. Há também o claro
reconhecimento de que os Codis estavam falhando em sua missão de co-
ordenação, o que resultava em “distorções nas atividades dos DOI”.
Dessa forma, esses órgãos estariam vivendo uma “autonomia demasia-
da”, na qual “poderão, talvez, ser encontradas as razões de muitos exces-
sos cometidos”.
Documentos posteriores mostram alívio com o fato de que, após
ter atingido seu ápice no ato ecumênico liderado por d. Paulo Evaristo Arns,
a “crise Herzog”, como é chamado o episódio, arrefeceu. No entanto, o ce-
nário nacional aparece repleto de elementos negativos, entre eles uma afir-
mação lacônica que recebeu um sinal de interrogação de Geisel, à mar-
gem do documento: “Existem indícios de diluição do princípio de auto-
ridade” (II-21, de 22-12-1975).
O “enquadramento” dos órgãos de informação e repressão era,
sem dúvida, uma das maiores preocupações de Geisel à época. Há no
dossiê um documento de 1975, sem data precisa, intitulado “Estudo
sobre o problema da subversão no Brasil”, que foi preparado, a pedido
de Geisel, pela Agência Central do SNI. O documento também traz pro-
postas para a “Consolidação das medidas de segurança interna em tem-
pos de paz” (II-23). O documento reconhece explicitamente a ilegalidade
de ações dos órgãos de informações das Forças Armadas, que
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4
D’Araujo & Castro, 1997:374-5.
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sido compelido a adotar”. E mais adiante: “Por mais grave e difícil, cabe
reconhecer que inexistia outra medida capaz de ser adotada em nível
presidencial e que a intervenção, nesse nível, se impunha em face das
condições criadas”. No entanto, o analista levanta dúvidas sobre a opor-
tunidade (mas não o conteúdo) das declarações do novo comandante do
II Exército, general Dilermando, ao valorizar a dignidade da pessoa hu-
mana e o tratamento que todos merecem, amparados pelos dispositivos
legais. Essas declarações estariam sendo facilmente “exploradas” pela
oposição. O analista termina com uma avaliação (advertência?) do espí-
rito da “comunidade” de informações após o ato de Geisel:
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“Essa greve, da forma em que está sendo realizada, sem a ação direta
do sindicato para que não possa ser responsabilizado, com o apoio
(dentro da pregação de Luís Inácio da Silva) e inteiramente em obedi-
ência ao preconizado pelo boletim distribuído no dia 1º de maio pela
Arquidiocese de São Paulo, recomendando as paralisações e ‘opera-
ções-tartaruga’, revela a influência que este líder sindical e a Igreja
estão exercendo e que poderá gerar paralisações e greves, de conse-
qüências imprevisíveis para a economia do país.”
O Dossiê Ministério
da Fazenda do Arquivo Ernesto Geisel:
fontes sobre a gestão de Mario Henrique Simonsen
C a r lo s Ed u a r d o S a r m e n t o e Ver e n a A lb e r t i
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O titular da pasta
Antes de ocupar a pasta da Fazenda, Mario Henrique Simonsen
(1935-97) já tinha atuado algumas vezes na esfera pública, tanto formal
quanto informalmente. Em 1964 foi colaborador de Roberto Campos e
de Octavio Gouvêa de Bulhões, ministros do Planejamento e da Fazenda
do primeiro governo militar, na elaboração do Programa de Ação Eco-
nômica do Governo (Paeg), lançado em novembro. Nesse período tam-
bém colaborou com o recém-criado Escritório de Pesquisa Econômica e
Social Aplicada (Epea), atual Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada
(Ipea), subordinado ao Ministério do Planejamento. Com o jurista José
Luís Bulhões Pedreira, trabalhou na instituição do Sistema Financeiro de
Habitação (1964) e da Lei de Mercado de Capitais (1965). Ao mesmo
tempo, desde 1961 dava aulas de aperfeiçoamento a economistas no
curso que em 1966 viria a ser a Escola de Pós-Graduação em Economia
(EPGE) da Fundação Getulio Vargas. Ao ser convidado por Ernesto Gei-
sel para a pasta da Fazenda, ainda tinha no currículo, além de larga atua-
ção no setor privado, a presidência do Movimento Brasileiro de Alfabeti-
zação (Mobral), que exerceu de 1970 a 1974. Mario Henrique Simonsen
tinha 39 anos quando assumiu o Ministério da Fazenda.
As 17 pastas que contêm o conjunto de documentos relativo ao
Ministério da Fazenda do Arquivo Ernesto Geisel são compostas de des-
pachos do presidente com seu ministro e de documentos anexos.1 Os as-
suntos “típicos” dos despachos são: acompanhamento dos índices de
custo de vida e das taxas de inflação, execução do orçamento monetário
e balança comercial.2 Igualmente recorrentes são: política salarial,3 polí-
4
Por exemplo, I-2 (abril de 1974).
5 Reservas internacionais, imposto de renda e empréstimos são assunto de despacho de 20-
5-1974 (I-8), por exemplo.
6
Entre os documentos relativos a assuntos tributários estão, por exemplo, a nova tabela do
desconto do imposto de renda na fonte (VI-13) e a alteração de imposto de renda de pes-
soas físicas (XI-3, de 18-11-1976; e XVII-1, de 13-11-1978).
7
A política cambial é discutida, por exemplo, no despacho de 27-11-1978 (XVII-2), no qual
o ministro analisa as alternativas das minidesvalorizações e da maxidesvalorização com
compensações.
8
Não faltam, nesse conjunto, documentos altamente técnicos, recheados de fórmulas, como
é o caso de documento encontrado no despacho de 7-4-1975 (IV-8) sobre indicadores de in-
flação e a fórmula da política salarial. Alguns documentos podem ser vistos como verdadeiras
aulas sobre determinados assuntos, como por exemplo “Política monetária, juros e inflação” e
“Focos de pressão de demanda e dispêndios governamentais”, ambos no despacho de 27-9-
1976 (X-4), “Tautologias e modelos em economia” (X-7, de 18-10-1976) e “Aspectos atuais da
inflação brasileira” (XI-11, de 21-3-1977).
9 O documento intitulado “Perspectivas — 1974”, por exemplo, traça um retrospecto da
economia desde 1964, apontando as necessidades para o futuro próximo (II-10, dezembro
de 1974).
10 Em I-6 (maio de 1974) há impressões conjunturais colhidas em reuniões com empresá-
rios, por exemplo, e em V-7 e VI-3 encontra-se a conferência proferida por Mario Henrique
Simonsen na Escola Superior de Guerra (ESG), em julho de 1975, intitulada “A conjuntura
brasileira e o panorama econômico mundial”. Há também outras palestras proferidas na
ESG, como “Balanço de pagamentos e inflação” (XII-5, de 11-7-1977) e “O crescimento eco-
nômico e seus fatores limitativos” (XIV-13, de 19-5-1978).
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66 DO SSIÊ G E ISEL
11
Sobre viagens ao exterior, ver, por exemplo, I-6 (maio de 1974) e I-14 (junho). Às vezes
os relatórios de viagem são acompanhados de papers do ministro, como no despacho de
10-3-1975 (IV-6), de que faz parte o texto “Current aspects of the Brazilian economy”, e no
despacho de setembro de 1975, em que se encontra o trabalho “Remarks on today’s Brazil-
ian economic policy”, apresentado em reunião no FMI. Outro documento de interesse é o
paper “A política econômica do governo Geisel e os investimentos estrangeiros”, contendo
um apanhado da economia brasileira desde 1964 e que foi apresentado em seminário sobre
investimentos no Brasil, em Paris, em abril de 1975 (V-1). Destaque-se também “Balance of
payments, problems of developing countries”, de abril de 1976 (IX-3).
12
Em outubro de 1974, por exemplo, o ministro apresenta ao presidente documento (II-1)
sobre a situação econômica mundial, redigido a partir de reunião do FMI onde estavam mi-
nistros da Fazenda, presidentes de bancos centrais e muitos banqueiros e assessores. O con-
senso geral era de que “o mundo ocidental jamais enfrentou situação econômica tão crítica
desde a grande depressão da década de 1930”. O documento relata os debates na reunião
e os contatos feitos por Simonsen com outros ministros, representantes e banqueiros, além
de resumir a imagem da política econômica brasileira no exterior.
13
Ver Carneiro, 1990.
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14
“Nota sobre o problema inflacionário em 1974”, despacho sem data (I-4). Ver também
carta de Octavio Gouvêa de Bulhões a Mario Henrique Simonsen, discutindo a fórmula de
cálculo dos índices de inflação pela FGV, despacho de 6-5-74 (I-6).
15
Idem.
16 Em entrevista concedida ao Programa de História Oral do Cpdoc em junho de 2001, Delfim
Netto afirmou: “Essa história de inflação reprimida era uma das conversas moles do Mario Si-
monsen, o maior hedge que ele já fez na vida. Ele escreveu um documento para o Geisel, que
depois foi usado pelo Dieese e por outros, dizendo que havia uma ‘inflação reprimida’. Eu
disse a ele: ‘Procura nos jornais as filas!’ Nunca existiram! O problema todo foi que, como os
preços eram medidos no Rio — o índice era da Fundação Getulio Vargas —, sempre se man-
teve o abastecimento no Rio razoavelmente atendido. Não existia no Rio, nem em lugar ne-
nhum, fila para comprar carne. Então, como dizer que a carne estava com o preço controla-
do? O relatório do Mario foi um documento sigiloso que ele mandou para o Geisel e que
depois veio num rodapé, escrito em inglês, por alguém do Banco Mundial. E aí se transfor-
mou num grande issue, porque no Brasil tudo que é escrito em inglês é verdade. Eu e o Mario
sempre nos divertimos, ele nunca levou muito a sério aquele negócio. É claro que era desa-
gradável para ele e para o governo a inflação ter passado de 15 para 32, 33%, o que foi um
efeito, realmente, da crise do petróleo”.
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68 DO SSIÊ G E ISEL
que “Simonsen de vez em quando arrancava os cabelos e vinha a mim com o problema da
inflação. Pensávamos na inflação, procurávamos adotar medidas para reduzi-la, mas não
era o problema número um do governo. Nosso problema número um era desenvolver o
país, dar emprego, melhorar as condições de vida da população. Para tanto, tivemos que
recorrer ao crédito externo, que na época era muito favorável. Havia muito dinheiro dis-
ponível no exterior, proveniente da reciclagem da receita auferida pelos países da Opep, os
célebres petrodólares. E o Brasil tinha muito crédito” (D’Araujo & Castro, 1997).
18
Documentos sobre as negociações comerciais entre Brasil e EUA, de 11-5-1976, encon-
tram-se na pasta VIII.
19
Sobre o Banco Halles, ver, por exemplo, I-3 (abril de 1974) e I-9 (maio).
20
No despacho de 2-6-1975 (V-3), por exemplo, há o relatório da missão ao Irã chefiada
pelo presidente do Banco do Brasil, Ângelo Calmon de Sá, em maio de 1975.
21
No que tange às relações comerciais com o exterior, Simonsen contava com Francisco
Dornelles, então presidente da Comissão de Estudos Tributários Internacionais (Ceti) do Mi-
nistério da Fazenda. É de sua autoria, por exemplo, o documento “Código de subsídios e di-
reitos compensatórios”, relatando reuniões realizadas em Washington, em junho de 1978,
com delegação norte-americana no Gatt (XV-4, de 26-6-1978).
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22
Por exemplo, os despachos de 3-11-1975 (VI-7) e 20-12-1975 (VI-10). No primeiro há um
documento de Simonsen defendendo a propriedade da medida. Quase dois anos depois,
em despacho de 5-9-1977 (XIII-2), o ministro tornaria a defender o depósito prévio, julgan-
do que ainda não deveria ser extinto. A medida torna a ser objeto de comentários no des-
pacho de 30-10-1978 (XVI-2), ao lado da instituição do depósito prévio de Cr$22 mil para a
obtenção de visto de saída no passaporte. Os depósitos prévios sobre a importação e o tu-
rismo serão apontados, em documento redigido ao final do governo Geisel, como medidas
de emergência que introduziram distorções na economia brasileira (XVII-13).
23
Sobre as medidas para conter a inflação, podem ser consultados o despacho de 8-3-1976
(VII-4), momento em que a inflação teria chegado ao nível mais explosivo registrado desde o
início do governo Geisel, o despacho de 12-7-1976 (IX-4), em que são propostas medidas para
que a inflação anual não exceda os 40%, e o despacho de 27-9-1976 (X-4), em que o ministro
discorre sobre as reações psicológicas naturais a medidas antipáticas de desaquecimento.
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70 DO SSIÊ G E ISEL
24 Como os incluídos nos despachos de 9-2-1976 (VII-1) e 23-8-1976 (X-1), por exemplo.
25
Documento datado de 24-6-1976 (IX-1).
26
Documento “Objetivos de política econômica”, constante do despacho de 6-9-1976 (X-3).
27 Mais adiante, em documento intitulado “Problema da inflação brasileira: desempenho no
primeiro trimestre e perspectivas para 1977” (XI-12), Simonsen concluiria que o que temos
é “um tipo sui generis de inflação”.
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rável ao Brasil. Mas não é possível impedir que a comunidade financeira in-
ternacional participe das mesmas dúvidas e apreensões”.
A inflação mantém-se como tema predominante, levando o mi-
nistro a sugerir, em despacho de 16-5-1977 (XII-1), que qualquer aumen-
to de preços controlados pelo governo dependa de prévia homologação
do ministro da Fazenda. Segundo ele, a culpa pela inflação é sempre atri-
buída ao ministro da Fazenda, malgrado a divisão de atribuições entre os
órgãos — os ministérios da Fazenda, responsável pela supervisão da po-
lítica monetária, pela arrecadação de impostos e pelo CIP, da Agricultura
e do Planejamento e o Conselho Nacional do Petróleo — e a concentra-
ção do comando do combate à inflação nas mãos do presidente, com as-
sessoria do CDE.28
No último ano do governo Geisel, os salários voltam a ser con-
siderados por Simonsen fatores determinantes da inflação, agora diagnos-
ticada como predominantemente uma inflação de custos. Diz o ministro
no despacho de 20-3-1978: “Um combate mais rápido à inflação só se
conseguiria de uma forma: baixando substancialmente as taxas de reajus-
tamento salarial”. O cálculo do reajuste salarial poderia ser feito pela
ORTN, e não mais pelo índice de custo de vida, sendo possível, se neces-
sário, até mudar a fórmula das ORTNs. A esse respeito, porém, observa:
“Obviamente, a sugestão acima é tão correta do ponto de vista técnico
quanto inoportuna do ponto de vista político” (XIV-10).
Os despachos ao longo de 1978 mostram como a atuação do
ministro se pauta cada vez mais por uma inserção no quadro político. Em
junho, diante das primeiras greves de vulto desde 1964, realizadas pelos
metalúrgicos de São Bernardo do Campo e que projetaram o presidente
do sindicato, Luís Inácio da Silva, como nova liderança no cenário nacio-
nal, Simonsen não só defende a manutenção das fórmulas de política sa-
larial e a proibição do direito de greve,29 como dedica parte de seu des-
28
As queixas dirigidas a outros setores do governo não tão preocupados com a contenção
da inflação se repetem em outros despachos, em especial quando se trata do Ministério da
Agricultura, ocupado por Alysson Paulinelli. Ver, por exemplo, os despachos de 26-6-1978
(XV-4) e 21-8-1978 (XV-7).
29 “Como não é concebível uma greve contra a aritmética, o princípio da fórmula é incom-
72 DO SSIÊ G E ISEL
30
“Algumas diretrizes de política econômica para 1978”, reproduzido no anexo 7.
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gere que durante o recesso parlamentar sejam feitas também reformas po-
líticas, e não apenas as reformas no Poder Judiciário, principal objeto da
reunião. De seu lugar de ministro da Fazenda, parece transmitir uma preo-
cupação dos setores econômicos do país:
31 Outros documentos reforçam a importância desses temas para o governo que se iniciaria
em 1979, do ponto de vista de Simonsen: XVII-6, XVII-9 e XVII-13 (que trata também das
medidas de política cambial, como mini e maxidesvalorização).
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74 DO SSIÊ G E ISEL
L et í ci a P in h ei r o
* Para Gerson Moura, que me ensinou a olhar os arquivos para melhor ver adiante.
1 Anotação de Ernesto Geisel em documento de 4-10-1973 (XIV A-1), resumindo os princi-
pais assuntos de política externa que teriam lugar no seu governo. Todos os documentos ci-
tados neste capítulo são do dossiê EG/pr 1974.03.18.
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76 DO SSIÊ G E ISEL
2
Ver Pinheiro, 1995.
3 A mais importante é, sem dúvida, a realizada com o próprio presidente Ernesto Geisel (ver
D’Araujo & Castro, 1997). Na ocasião, tive a grata satisfação de poder contribuir com al-
guns dados e interrogações sobre a política externa do período, que foram posteriormente
elaborados pelos entrevistadores e encaminhados ao presidente.
4
Igualmente importantes são o arquivo do ministro Azeredo da Silveira e o do embaixador
Paulo Nogueira Batista, ambos depositados no Cpdoc.
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5
Heymann, 1997.
6
Ibid., p. 44-6.
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7
Gomes, 1998.
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8
Continuo referindo-me aqui às “Informações” que acompanham os “Roteiros”.
9
Ver Heymann, 1997:20.
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80 DO SSIÊ G E ISEL
presidente no formato das “Informações” não era muitas vezes aquilo que
a secretaria gostaria que ele lesse. A esse respeito, não custa lembrar um
velho político brasileiro que aconselhava nunca enviar uma carta sem
antes negociar a resposta.
Há, por outro lado, uma observação a ser feita a propósito des-
ses documentos que reafirma sua importância histórica e, sem dúvida, os
qualifica como preciosos: tendo em vista os atuais critérios de acesso aos
arquivos públicos brasileiros e, em particular, aos arquivos do Ministério
das Relações Exteriores, a possibilidade de consultar documentação clas-
sificada como secreta-exclusiva, ou seja, aquela de mais alto grau de si-
gilo, como é o caso dos documentos em questão,10 ganha em valor e se
torna um irrecusável convite a todo e qualquer pesquisador da política
externa brasileira.
Mas, como já foi dito, um arquivo privado tende a revelar mais
claramente o pensamento dos interlocutores do seu titular que o dele
próprio. A não ser que haja, implícita ou explicitamente, a intenção de
constituir um acervo como parte de um projeto autobiográfico, como tão
bem notado por Fraiz (1998) com relação ao arquivo de Gustavo Capa-
nema. Mas, no caso do arquivo Geisel, é bastante escassa a presença de
material expressando textualmente sua visão a respeito da política exter-
na. Ainda assim, deve-se sublinhar a existência dos resumos das reuniões
de Geisel e de seu chanceler Azeredo da Silveira com representantes de
diversos países em visita ao Brasil ou com autoridades dos países que o
presidente visitou, como Portugal, Inglaterra, França, Estados Unidos,
México, Venezuela, Alemanha etc. Embora também desigual na sua qua-
10 Embora muita coisa tenha mudado nos últimos anos e não mais ocorram casos seme-
lhantes ao do historiador Hélio Silva, que, após ver negado seu pedido de acesso à docu-
mentação referente à participação do Brasil na II Guerra, soube que poucos anos depois o
pesquisador norte-americano Stanley Hilton conseguiu autorização para examiná-la (ver
Penna Filho, 1999), o fato é que a documentação sigilosa datada de até 60 anos atrás en-
contra-se ainda hoje potencialmente inacessível ao público. Isso se deve ao fato de que, se-
gundo a Lei nº 8.159 de 1992, que implantou a política nacional de arquivos, “o acesso aos
documentos sigilosos referentes à segurança da sociedade e do Estado será restrito por um
prazo máximo de 30 anos, a contar da data de sua produção, podendo esse prazo ser pror-
rogado, por uma única vez, por igual período”. Pois bem, desde que o acervo do MRE en-
contra-se dividido em cinco categorias distintas, conforme a natureza e o grau de sigilo do
assunto tratado no documento, sendo os secretos-exclusivos justamente os restritos à con-
sulta por um período de 30 anos, renováveis por mais 30, os documentos dessa categoria
provenientes do Itamarati que compõem o Arquivo Geisel e que, portanto, se encontram
disponíveis à consulta escaparam dessa determinação.
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11 Por exemplo, o resumo do encontro entre Geisel e o presidente de Portugal, Ramalho Ea-
nes, quando se tratou das disputas políticas no interior de Angola e Moçambique, da ocu-
pação indonésia no Timor Leste — um fait accompli, nas palavras de Eanes —, da decisão
do Brasil de evitar as tentativas da Frente Timorense de Libertação Nacional de visitar o
país, da candidatura de Portugal à CEE etc. (X-9).
12
Como a seguinte nota a respeito da troca de farpas entre o ministro Silveira e o embaixador
Araújo Castro por causa do sistema de seleção do pessoal diplomático, no qual não fora in-
cluído nenhum dos funcionários então sob chefia deste último: “Que lambada!” (III-1).
13
Por exemplo, a recusa de Geisel a institucionalizar o Clacso (III-19).
14 À sugestão do Itamarati para que o ministro da Agricultura comparecesse à Conferência
82 DO SSIÊ G E ISEL
distintos, novos, por assim dizer, visto que neles se incluem notas, subli-
nham-se frases, enfim, manifesta-se espanto, endosso ou discordância por
meio de interrogações, exclamações, vistos, comentários. No caso da do-
cumentação aqui examinada, a intervenção manuscrita do próprio presi-
dente Geisel deu-lhe, portanto, o caráter de uma nova documentação, di-
ferente daquela que lhe chegou às mãos. Como resultado, grande parte
do dossiê pode ser lida como um diálogo entre o remetente do do-
cumento — em geral o ministro Azeredo da Silveira —, seu destinatário —
o atento leitor Ernesto Geisel — e, algumas vezes, também o membro de
seu governo a quem o presidente finalmente o encaminhava.
A propósito, a marginalia da documentação desse acervo tam-
bém revela muito do método de trabalho do presidente, podendo servir
ao pesquisador como guia na análise do processo decisório durante sua
gestão, já que nos “Roteiros” Geisel indica para quem deveriam ser reme-
tidas as “Informações”, ou seja, os anexos em formato de relatório. Assim
ficamos sabendo, por exemplo, que os temas de política externa não
eram examinados unicamente por Geisel e Azeredo: Heitor de Aquino,
seu secretário, Hugo de Abreu, chefe do Gabinete Civil, e principalmente
Golbery do Couto e Silva, chefe do Gabinete Militar, também participa-
vam de sua apreciação.
De fato, freqüentemente assuntos dessa área eram levados à
consideração do general Golbery do Couto e Silva. Geisel dá-lhe infor-
mações e pede-lhe opinião sobre quase todos os temas, pondo-o também
a par das instruções ou sugestões que porventura já tivesse encaminhado
ao Itamarati. Além disso, os documentos revelam uma enorme afinidade
de pontos de vista entre Geisel e Golbery. A propósito, um dos documen-
tos que melhor expressa essa convergência, embora nesse caso não
tenha sido possível deduzir o tema, é um bilhete de 27-10-1976 (VI-35)
em que Geisel diz a Golbery:
16
Vários autores já atestaram a presença de Golbery no processo de formulação de política
externa. Ver, por exemplo, Góes, 1978.
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17
Os documentos IV-35 e V-25, por exemplo, tratam do processo que levou a esse voto e
de sua repercussão internacional. O documento III-3, resumindo reunião entre assessores
do MRE e do Departamento de Estado, trata da divergência entre os dois países quanto à
questão palestina. Nele se diz que “no caso brasileiro, nem podemos aceitar o princípio da
conquista territorial pela força, nem podemos aceitar a desconsideração do aspecto político
da questão palestina, nem podemos apoiar que o conflito israelo-árabe possa ser causa de
uma guerra global”. A respeito do conjunto do documento, apenas um breve comentário
de Geisel para Golbery: “É grave!”
18
Apenas como ilustração, os documentos sobre a América Latina tratam da exportação de
equipamento militar para os países do continente; do aproveitamento dos rios da bacia do
Prata, do Tratado de Limites do Rio da Prata entre Argentina e Brasil e suas conseqüências
para o Brasil; da questão da Antártida (II-20, entre outros); da animosidade entre Montevi-
déu e Buenos Aires, por um lado, e da convergência entre Montevidéu e Brasília, por outro
(III-2); da colaboração argentino-brasileira no combate à subversão (VI-48); das negocia-
ções tripartites entre Brasil, Paraguai e Argentina sobre Itaipu e Corpus etc.
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19
Há a esse respeito um roteiro para a reunião com o presidente da República contendo in-
dicações sobre as conversas com a Alemanha e os Estados Unidos sobre a criação de uma
indústria nuclear no país (III-20). Outro documento muito interessante é o que fala do apoio
dos socialistas europeus, liderados por François Mitterrand, à manutenção dos termos do
acordo nuclear Brasil-Alemanha, inclusive como meio de demonstrar maioridade européia,
e também do interesse de Mitterrand em encontrar-se com um emissário do governo bra-
sileiro sob promessa de não tocar em assuntos ligados a direitos humanos (VII-13, reprodu-
zido no anexo 5).
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20
Ver Pinheiro, 1993.
21 Entrevista com Saraiva Guerreiro (Rio de Janeiro, 12-11-1991).
22
Ver Pinheiro, 1993:258-9.
23
Ibid.
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86 DO SSIÊ G E ISEL
24
Entrevista com Ítalo Zappa (Rio de Janeiro, 10-2-1992).
25
Entrevista com Ovídio Andrade Melo (Vassouras, 10-1-1992).
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LETÍCIA PINHEIRO 87
Conclusão
Isto posto, será que a abertura dos arquivos do presidente Er-
nesto Geisel provocará um debate de teor revisionista sobre a política ex-
terna do seu governo?
Com base no que mais detidamente pude examinar nos docu-
mentos, as informações que deles constam na realidade reafirmam uma
série de hipóteses e conclusões elaboradas por diversos autores acerca
do conteúdo do “pragmatismo responsável”, incluindo eu mesma. Ao res-
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H e le n a B o m e n y
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1
Todos os documentos citados neste capítulo referem-se ao dossiê EG/pr 1974.04.10/1.
2
O documento foi reproduzido no anexo 1.
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3
Entrevista concedida ao Cpdoc para o projeto História da Capes (Rio de Janeiro, novem-
bro de 2001).
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4
Sobre o Parecer nº 977-65 e a atuação de Sucupira no desenho do ensino superior no
Brasil, ver Bomeny, 2001.
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HELENA BOMENY 95
Fonte: Documento EG/pr 74.04.10 (V-20), Arquivo Ernesto Geisel, Cpdoc/ FGV.
96 DO SSIÊ G E ISEL
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98 DO SSIÊ G E ISEL
Movimento estudantil
Como titular do MEC, Ney Braga desempenhou papel político
importante no sentido de amortecer conflitos e neutralizar reações estu-
dantis que, embora em menor intensidade no governo Geisel, eram ainda
tributárias de políticas repressivas dos governos anteriores. Embora tenha
sido uma gestão em que a mobilização estudantil recuperou uma força que
não se via desde 1968, o tom da documentação do arquivo e os próprios
movimentos não traduzem a radicalidade do período mais duro do regime
militar.
Os despachos do ministro da Educação com o presidente Geisel
trazem alguns documentos sobre a mobilização política da juventude, cha-
mando sempre a atenção para o sucesso da desmobilização progressiva ve-
rificada ao longo do período. Os documentos, em sua maioria expressiva,
tratam o movimento estudantil pelo lado negativo de uma participação ra-
dicalizada que deve ser neutralizada. A mobilização foi tratada como rea-
ção contrária ao regime, identificada pelo radicalismo de lideranças e por
aspectos danosos à saúde da convivência estudantil. Nesse momento da
vida política brasileira, o ritmo da mobilização é ascendente e a documen-
tação reflete essa tendência.
Em seis documentos do dossiê é possível tomar contato com a
avaliação e o acompanhamento, por parte do governo, da mobilização dos
estudantes. Os títulos indicam o caráter de relatório que os documentos
têm: “Situação estudantil” (III-18), “Situação na área educacional” (III-23),
“Problema estudantil” (V-16), “Movimento estudantil” (V-08). Num dos do-
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HELENA BOMENY 99
A n g el a d e C a s t r o G om es
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Um pouco de história...
3
Durante a chamada República Velha, houve luta dos trabalhadores por leis que regulas-
sem o mercado de trabalho, resistências do patronato e debates no Congresso, com a apro-
vação de algumas importantes medidas legislativas, ainda que elas fossem desrespeitadas.
Cabe citar uma lei de acidentes de trabalho, a fundação de caixas de Aposentadorias e Pen-
sões para ferroviários, um Código de Menores, uma lei de férias e também a criação de um
Departamento Nacional do Trabalho. Todas essas iniciativas são sistematicamente obscure-
cidas pelos políticos do pós-1930, que formulam um discurso no qual somente após a Re-
volução de 1930 a “questão social” foi enfrentada no Brasil.
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4
Todos os documentos citados neste capítulo são do dossiê EG/pr 1974.03.26/1.
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5
Ver D’Araujo & Castro, 1997:267. Depoimento oral concedido a Angela de Castro Gomes
e Elina Pessanha por Arnaldo Sussekind (maio/jun. 2000).
Angela de Castro Gomes-abertura politica.fm Page 112 Tuesday, October 28, 2008 2:35 PM
Sendo assim, era preciso criar condições para que essas entidades voltas-
sem a se administrar, mesmo que se corresse alguns riscos calculados.
Caso contrário, ainda segundo o ministro, era melhor partir para outras
soluções, que podiam incluir desde a fusão com outro sindicato até a cas-
sação da carta sindical. O que o governo não devia mais desejar era
manter sine die interventores nesses sindicatos.
O acompanhamento dos despachos mostra que foram tomadas
medidas no sentido de diminuir as intervenções sindicais, exercendo-se
sempre uma cuidadosa vigilância. Um dos exemplos citados é o Sindicato
dos Estivadores de Santos, categoria considerada rica, forte e tradicional-
mente muito politizada, que precisava ser mantida sob observação. Não
obstante essa orientação de fundo, ainda se realizam intervenções, como a
ocorrida em setembro de 1975 no Sindicato dos Condutores de Veículos
Rodoviários e Anexos de São Paulo, por denúncia de envolvimento de seus
dirigentes com o Partido Comunista. Além desse fato mais incisivo, as agen-
das de despachos evidenciam uma ação de vigilância e fiscalização dos sin-
dicatos permanente, cuidadosa e com claro teor político-ideológico. Vê-se
que as delegacias regionais do Trabalho, como por exemplo a de São Pau-
lo, estavam entrosadas com os serviços de informação e segurança, ambos
sempre prontos a tomar as providências cabíveis no caso de envolvimento
de líderes sindicais com o comunismo. O comunismo e o Partido Comu-
nista são os inimigos identificados como ameaça visível, embora se possa
incluir aí um espectro mais amplo de entidades subversivas.
É nesse contexto que se pode entender o pedido de apoio en-
caminhado ao ministério pela Comissão de Rearmamento Moral, que
possuía um centro de treinamento de mão-de-obra em Petrópolis. Presi-
dida pelo general Calimeiro Santos, em março de 1975 ela é recomen-
dada a Prieto por Juarez Távora. Em sua carta, o ex-tenente dos anos
1930 e experimentado político esclarece que conhecia e ajudava tal co-
missão desde quando era ministro da Viação e Obras Públicas. Conside-
rava que, naquele momento, a realização de um simpósio sindical sobre
os princípios morais que deviam orientar o sindicalismo brasileiro era
algo extremamente oportuno, pois, como escreve: “Acompanhei a alguns
anos atrás, pessoalmente, as atividades do Rearmamento Moral na Suíça
e no Brasil e julgo-as um dos melhores antídotos contra a contaminação
das massas trabalhadoras pela infiltração comunista” (II-5, carta anexa ao
item 5 da Agenda de 3-4-1975).
Com o mesmo tipo de preocupação, em abril de 1975, o minis-
tro menciona o VIII Congresso da Liga Mundial Anticomunista, a se rea-
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6
Em 1979, após o fracasso das negociações, o Sindicato dos Metalúrgicos convocou nova
greve, que teve a duração de 15 dias, resultando, desta feita, na intervenção do Ministério
do Trabalho no sindicato.
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Observações finais
Primeiramente, cabe destacar que o Ministério do Trabalho do
governo Geisel foi concebido essencialmente como órgão normativo do
Poder Executivo, isto é, voltado para a elaboração e aplicação da legis-
lação trabalhista. Nisso deveria se distinguir de outros ministérios direta-
mente executivos, ou seja, cujo objetivo era a implementação de políti-
cas, e não a formulação de normas. Aliás, segundo o próprio presidente,
em entrevista concedida anos após o término de seu governo, essa era
uma característica também dos ministérios da Saúde e da Educação,
igualmente destinados a orientar e estimular ações.7
Outra observação refere-se ao que se pode intuir das relações
travadas entre presidente da República e ministro do Trabalho. Não são
muitas as indicações, mas verifica-se que Prieto é extremamente cuidadoso,
submetendo a Geisel o texto de seus discursos, sobretudo aqueles proferi-
dos em ocasiões como as conferências da OIT e o Dia do Trabalho. Assim,
é bem possível que aguardasse a leitura do presidente e incorporasse su-
gestões. Por outro lado, as poucas anotações feitas pelo próprio Geisel nos
papéis se restringem a uma negativa ou a um encaminhamento, por exem-
plo, a Golbery do Couto e Silva. Do mesmo modo, quase não há do-
cumentos confidenciais e, repetindo, tampouco anexos. Assim, a impressão
que tem o pesquisador é que essa documentação foi esvaziada, o que a
torna burocratizada e interessante apenas para usos pontuais.
Para concluir, pode-se mencionar também a presença de alguns
outros temas nas agendas. Por exemplo, o reaparelhamento das delegacias
regionais do Trabalho, a importância da formação de médicos do trabalho
ou as numerosas ações do Senai, Senac, Sesi e Sesc, cujos orçamentos pas-
saram a ser submetidos ao Ministério do Trabalho, o que não ocorreu sem
7
D’Araujo & Castro, 1997:317.
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A n g el a d e C a s t r o G om es
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1
É a Lei nº 4.540, de 30-11-1964, que dispunha sobre a reforma agrária a ser realizada pelo
regime militar. Antes dessa lei fora aprovada pelo Congresso, em 9-11-1964, a Emenda
nº 10, que tornava possível a desapropriação da propriedade territorial rural mediante pa-
gamento da prévia e justa indenização em títulos especiais da dívida pública, com cláusula
exata de correção monetária. Nascimento e Silva deu forma final ao texto do projeto de lei
que foi para o Congresso.
2
O desentendimento teria sido com os ministros Roberto Campos, do Planejamento, e Oc-
tavio Gouvêa de Bulhões, da Fazenda, em função de um projeto de Nascimento e Silva
que propunha a correção monetária para débitos trabalhistas. Ver Abreu, Beloch et alii,
2001:5.430-2.
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3
Todos os documentos citados neste capítulo são do dossiê EG/pr 1974.07.11.
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— à margem das quais Geisel anota: “será bom examinar bem a viabili-
dade econômica” —, Nascimento e Silva esclarece que “já é possível ago-
ra, mediante projeção dos dados do INPS, realizar a universalização da
previdência social, isto é, a sua extensão ao restante da população urba-
na e rural ainda carente de amparo, independente de qualquer correla-
ção com vínculos profissionais ou contribuições pagas, através de um
plano básico que atenda a qualquer pessoa em função exclusiva de suas
necessidades fundamentais nos casos de impossibilidade física ou mental
de angariar meios ao seu sustento” (grifos de Geisel).
Além desse, digamos, superobjetivo, o ministro tem uma pauta
de ação mais específica porém não menos significativa. Três questões aí
se destacam: questões que envolviam resistências antigas e questões que
provocariam novas resistências.
A primeira é a integração plena do seguro de acidentes do tra-
balho no âmbito da previdência. Debate antigo, que remontava aos inte-
resses de seguradoras privadas e que tinha como lastro uma prática que
datava da própria criação do seguro de acidentes, ainda na Primeira Re-
pública. Além dessa total integração, o ministro queria estender tal segu-
ro ao homem do campo, o que era algo novo. Acompanhando as agen-
das de despacho, vê-se que praticamente dois anos depois, em 8 de julho
de 1976, o projeto de lei sobre acidentes de trabalho recebera 21 emen-
das e estava sob ameaça. Anota o ministro para Geisel: “De modo geral,
[as emendas] visam restabelecer o esquema da lei anterior, principalmen-
te no que diz respeito à tarifação individual das empresas. (...) dado o
vulto dos interesses contrariados será conveniente uma articulação espe-
cial com as lideranças do partido do governo para enfrentarmos a defor-
mação que se pretende introduzir no projeto” (VI-1, Agenda de 8-7-1976,
item 2).
A segunda questão tinha um longo e difícil passado: a inclusão
do salário-maternidade no rol dos serviços prestados pela previdência.
Ou seja, no Brasil, até meados dos anos 1970, quem pagava o salário-ma-
ternidade previsto em lei desde os anos 1930 eram as empresas, os em-
pregadores. Isso gerava, como o ministro anota, grande e conhecida dis-
criminação contra a mulher, tanto no que dizia respeito a seu ingresso no
mercado de trabalho quanto à sua permanência nele.
Aliás, conforme depoimento de Arnaldo Sussekind — designa-
do por Geisel para, ao lado do ministro do Trabalho, gerenciar a partici-
pação do Brasil na Organização Internacional do Trabalho —, existia,
nesse exato momento, uma denúncia contra o Brasil justamente no que
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4
Entrevista concedida à autora (fita 19, lado A).
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5
O ministro dá como exemplos os surdos, mudos e deficientes, que deveriam ser conside-
rados “profissionais seletivos em potencial”.
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6
Ver, por exemplo, Oliveira & Teixeira, 1985; Delgado, 2001.
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Gráfico 3
População economicamente ativa
Gráfico 4
Crescimento de população, de urbanização e de
atendimento previdenciário no período 1963-77
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Gráfico 41
Amparo previdenciário — Lei nº 6.170/74
Maiores de 70 anos
Brasil
Concessão em 1977
18%
82%
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Gráfico 14
Setores de atividades
Brasil — 1976
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Gráfico 15
Participação no custo da previdência
Gráfico 36
Despesa corrente do INPS
(Cr$117.348 milhões)
Brasil — 1977
Outras
Despesa com 9%
assistência médica
(Cr$30.360 milhões)
26%
Despesa com
prestações pecuniárias
(Cr$76.024 milhões)
65%
Gráfico 37
Concessão de benefícios
Brasil
Auxílio-doença, auxílio-reclusão, aposentadorias e pensões — 1977
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Gráfico 67
Atendimentos ambulatoriais
Distribuição dos 240 milhões de atendimentos ambulatoriais
segundo o sistema de prestação
Brasil — 1977
Gráfico 68
Consultas médicas
Distribuição dos 122 milhões de consultas médicas
segundo o sistema de prestação
Brasil — 1977
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Gráfico 69
Internações por clínicas
Distribuição dos 7 milhões de internações por clínicas
segundo o sistema de prestação
Brasil — 1977
Gráfico 84
Índice de crescimento dos diversos tipos
de assistência médica
INPS — Brasil — 1977
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Conclusão
A documentação relativa ao Ministério da Previdência e Assis-
tência Social existente no Arquivo Geisel é numerosa e certamente per-
mite uma série de outras incursões além da aqui apresentada. Nosso ob-
jetivo era tão-somente acompanhar a montagem e a fixação dos principais
projetos do novo ministério, ocupado por um nome de grande experiên-
cia e, como se viu, de muita iniciativa e ambição políticas. Mesmo com
muitos cuidados, uma vez que o material foi examinado apenas seletiva-
mente e poucos documentos foram analisados, o que ressalta do percur-
so é uma ação expressiva diante de questões que se arrastavam, como a
absorção do auxílio-maternidade pela previdência e a inclusão dos segu-
ros de acidentes de trabalho pelo MPAS. É bom lembrar que, no mesmo
momento, o ministro Prieto, da pasta do Trabalho, lançava campanhas
para diminuir o número de acidentes, problema considerado crônico e
cujas causas eram francamente atribuídas ao descaso governamental.
Além disso, a grande proposta do ministro, a universalização da
previdência para os que não tinham laços com o mercado de trabalho,
como idosos, inválidos, crianças etc., demarca claramente um espaço po-
lítico de imenso potencial para a legitimação do regime que se conside-
rava revolucionário e pretendia, ao mesmo tempo, acabar com os resquí-
cios subversivos e conduzir a abertura política. Talvez se possa considerar
o ministro Nascimento e Silva um bom dublê de Geisel: um chefe ambi-
cioso e com indiscutível capacidade administrativa e política. Os papéis
da previdência e as realizações desse “ministério da revolução” consti-
tuem, pois, um campo fértil para se pensar a política social do regime mi-
litar.
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A l z i ra A l v e s d e A b re u
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Os militares e as telecomunicações
O governo do presidente Ernesto Geisel deu continuidade ao
processo de ampliação e modernização do setor de telecomunicações,
que vinha sofrendo profundas transformações desde a década de 1960,
em especial após a chegada ao poder dos militares. Explica-se: a doutrina
de segurança e desenvolvimento da Escola Superior de Guerra foi um
dos esteios para a montagem da estrutura e da base técnica das teleco-
municações no país.
No início dos anos 1960, as telecomunicações enfrentavam grave
crise, já que o setor era controlado basicamente por empresas privadas es-
trangeiras que não demonstravam interesse em investir na ampliação de
seus sistemas. Por outro lado, o desenvolvimento econômico e social exigia a
implantação de uma infra-estrutura mais eficiente e capaz de ajudar no apro-
fundamento das transformações em curso. O primeiro passo foi dado com a
aprovação, em 27-8-1962, da Lei no 4.117, que instituiu o Código Brasileiro
de Telecomunicações. O código determinou a formação do Conselho Nacio-
nal de Telecomunicações (Contel), instalado em 1963, e a criação de uma
empresa pública para explorar industrialmente os serviços de telecomunica-
ções. Essa empresa, submetida ao regime de exploração direta da União, foi
criada em 1965 sob a denominação de Empresa Brasileira de Telecomuni-
cações (Embratel) e tinha por finalidade a implantação de uma rede básica
de telecomunicações. Outro passo para a modernização do setor veio com a
Constituição de 1967, que transferiu dos estados para a União o poder con-
cedente dos serviços de telecomunicações. Também em 1967, a reforma ad-
ministrativa criou o Ministério das Comunicações. Em julho de 1972, após
intensos debates parlamentares, foi aprovado o projeto que criava a Te-
lecomunicações Brasileiras S.A. (Telebrás), empresa pública federal res-
ponsável pela coordenação dos serviços de telecomunicações em todo o
território nacional. Os debates refletiram as resistências por parte das
concessionárias estaduais e municipais e da própria Embratel, receosas
de perder sua autonomia.
Entre 1969 e 1972, a Embratel instalou a rede básica de tele-
comunicações no país com um sistema de microondas em visibilidade,
que interligou as regiões Sudeste, Sul e Nordeste, e um sistema de mi-
croondas em tropodifusão na Amazônia. Com exceção dos sinais de TV,
o sistema de tropodifusão possibilitou o tráfego de todos os serviços de
telecomunicações entre a região amazônica e as principais cidades do
país.
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1
Ver Araujo & Brandi, 2001.
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As concessões de rádio e TV
2
Ver Lamarão, 1997.
3
Todos os documentos citados neste capítulo são do dossiê EG/pr 1974.04.08.
Alzira Alves de Abreu.fm Page 153 Tuesday, October 28, 2008 2:44 PM
Outros temas
A política de nacionalização da indústria de telecomunicações
foi outro tema abordado em várias reuniões do ministro com o presiden-
te. Havia a preocupação de manter sob controle de empresários nacio-
nais as indústrias de equipamentos. A compra da Control por uma em-
presa norte-americana levou o Ministério da Indústria e Comércio, que
tinha à frente Severo Gomes, a não autorizar a venda e a determinar a in-
terferência do Ministério das Comunicações e do BNDE para que a em-
presa nacional Gradiente assumisse o seu controle (II-3).
Em despacho de 19-8-1975 (IV-4), o ministro Quandt informou
que, através de portaria, estabelecera que a política industrial para o setor
deveria apoiar indústrias controladas por capitais privados brasileiros para
fabricarem equipamentos para uso do sistema nacional de telecomunica-
ções. Ao mesmo tempo, indicou que a Telebrás deveria organizar um cen-
tro para pesquisar e desenvolver novos tipos de equipamentos a serem fa-
bricados pela indústria brasileira.
Noutro momento (VII-1), o ministro informou que essa política
vinha dando frutos e que já existiam várias empresas, embora o seu fatu-
ramento conjunto ainda atingisse apenas 10% do total do setor. Por sua
determinação, a Telebrás estava autorizada a só auxiliar empresas dando-
lhes garantia de mercado, não lhes oferecendo apoio financeiro, o que
deveria ficar a cargo do setor respectivo. Essa medida era uma forma de
manter a Telebrás dentro de sua atribuição principal, que estava ligada à
prestação de serviços de telecomunicações. No mesmo documento, o mi-
nistro falava das restrições financeiras que existiam no setor de telecomu-
nicações e que afetavam as empresas nacionais em maior profundidade
do que as multinacionais.
Em 1978 (IX-5), a situação financeira de outra empresa preocu-
pava o ministro. Ele dava conta das providências tomadas em relação à
Transit, fábrica de componentes eletrônicos que se encontrava em má si-
tuação financeira. Informava que o assunto deveria ser tratado tendo em
vista a atividade pioneira da empresa, que envolvia alta tecnologia, indis-
pensável para a consolidação da fabricação de computadores e equipa-
mentos de telecomunicações. Em seguida, o ministro informava ao pre-
sidente Geisel que entre outras medidas tomadas para solucionar a crise
da Transit estava a participação da Telebrás e da Digibrás no capital da
Transit (IX-6).
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4
Carta de Euclides Quandt de Oliveira a Heitor Ferreira Aquino. Brasília, 12-11-1973. Pasta
IX, anexos.
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Conclusão
Ao finalizar a leitura dos papéis sobre telecomunicações, no
dossiê referente ao Ministério das Comunicações do arquivo privado do
presidente Geisel, cabe fazer de imediato algumas observações: a docu-
mentação contém informações relativas a outros temas que não foram
aqui abordados, tais como gestão do setor, reajuste de tarifas, salários dos
funcionários das empresas do setor, planos de investimentos etc. Outra
observação pertinente diz respeito à preocupação demonstrada pelo mi-
nistro em não perder o controle político sobre os canais de rádio e tele-
visão. As críticas ao governo eram mal recebidas e punidas com a não
concessão ou não renovação das concessões. Vale lembrar que foi nesse
período do regime militar que teve início o processo de abertura política,
com a retirada “lenta e gradual” da censura aos meios de comunicação.
Uma última observação refere-se às características do arquivo.
Foram guardados somente os resumos dos temas de despacho. A docu-
mentação recebida e enviada sobre questões ligadas ao setor não consta
do arquivo.
Uma comparação entre os documentos dos vários ministérios,
durante o governo Geisel, pode ajudar a definir melhor características bá-
sicas desse fundo documental. Uma análise comparativa entre a docu-
mentação escrita e a visual viria também enriquecer um estudo sobre o
Arquivo Geisel.
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M a r i et a d e M or a e s F e r r ei r a
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Interpretações da fusão
Passados mais de 25 anos, a fusão do estado da Guanabara com
o estado do Rio de Janeiro permanece um tema ao mesmo tempo polê-
mico e tabu. Para muitos, é melhor não lembrar o assunto, fingir que ele
não existiu. Prova disso é que o 25o aniversário da constituição do atual
estado do Rio de Janeiro, em 2000, transcorreu em meio a um grande si-
lêncio. Alguns poucos pesquisadores acadêmicos procuraram ventilar o
tema, mas a mídia e grande parte das autoridades do estado preferiram
calar-se. Já para os que se dispõem a lembrar a fusão e a refletir sobre
ela, trata-se de questão que suscita polêmica.
Na versão oficial do governo Geisel, que decretou a fusão pela
Lei Complementar no 20, de 1-7-1974, e a implantou a partir de março de
1975, a fusão das duas unidades da Federação era justificada com argu-
mentos geoeconômicos e tinha o objetivo de criar um estado forte, tanto
do ponto de vista político quanto econômico, que permitisse um melhor
equilíbrio da Federação. A fusão era assim apresentada como medida de
caráter eminentemente técnico, inscrita num plano estratégico de desen-
volvimento nacional. A própria exposição de motivos da lei complementar
dizia que a “fusão traria progresso e bem-estar não apenas para as popu-
lações dos dois estados, mas também em nível nacional, através da criação
de um novo pólo dinâmico de desenvolvimento”. O melhor equilíbrio fe-
derativo assim produzido teria efeitos benéficos sobre a própria segurança
nacional.
Na visão das elites empresariais cariocas, a fusão também era
uma alternativa desejável. O depoimento de Arthur João Donato, empre-
sário do setor naval e membro da diretoria da Federação das Indústrias
da Guanabara (Fiega), que então passou a ser Firjan, fornece elementos
interessantes no tocante às razões da fusão. Diz ele:
1
História Oral/Cpdoc, 2001.
2
Ferreira, 1998:299.
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3
Ferreira & Grynszpan, 1994. Sobre o tema da fusão, ver também: Ferreira, 1998 e 2000;
Ferreira, Rocha & Freire, 2001; Sarmento & Motta, 2001; Motta, 2001; Rocha, 2002; Evan-
gelista, 1998.
4
Todos os documentos citados neste capítulo referem-se aos dossiês Justiça (EG/pr
1974.04.24/1) ou SNI (EG/pr 1974.03.00).
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5
Ver Abreu, Beloch et alii, 2001.
Marieta de Moraes Ferreira.fm Page 166 Tuesday, October 28, 2008 2:46 PM
teve como objetivo maior diluir a força do MDB carioca. A “Apreciação su-
mária” do SNI, datada de 17-6-1975 (II-3) e intitulada “O desmantelamento
das forças arenistas no estado do Rio de Janeiro”, chama a atenção para o
comportamento de Faria Lima, “que não propiciava qualquer alento às
hostes arenistas oriundas dos dois estados, Guanabara e Rio de Janeiro,
isoladas e sem rumo”. Nas páginas seguintes são relatadas manifestações
de desapontamento de diversas lideranças arenistas. A segunda parte do
relatório do SNI focaliza a ação do MDB, demonstrando que os “embates
entre chaguistas e amaralistas, antes de enfraquecer o MDB-RJ, parecem
lhe dar maior vigor”. Para finalizar, o relatório apresenta ainda um prog-
nóstico para o futuro: “Desgastado, sem motivação e sem comando, o par-
tido [a Arena] arrasta-se em direção às eleições de 1976”.
Ainda que se possa relativizar o valor dos relatórios de avalia-
ção política do SNI, é inegável que Faria Lima não deu maior atenção
aos aliados do governo. Percebe-se também que as indicações do SNI
não foram tomadas em consideração, nem antes nem depois da fusão.
Considerações finais
Bibliografia
Bibliografia.fm Page 170 Tuesday, October 28, 2008 3:00 PM
Abreu, Alzira Alves; Beloch, Israel et alii (orgs.). Dicionário histórico-biográfico bra-
sileiro pós-1930. Rio de Janeiro, FGV, 2001. 5v.
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Delgado, Ignácio Godinho. Previdência social e mercado no Brasil. São Paulo, LTr,
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Ferreira, Marieta de Moraes (org.). Crônica política do Rio de Janeiro. Rio de Ja-
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BIBLIOGRAFIA 171
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Sarmento, Carlos Eduardo & Motta, Marly Silva da (orgs.). A construção de um es-
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litar: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro, FGV, 1994a.
———. Visões do golpe: a memória militar sobre a abertura. Rio de Janeiro, Relu-
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———. A volta aos quartéis: a memória militar sobre a abertura. Rio de Janeiro, Re-
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Sobre os autores
Sobre os autores.fm Page 174 Tuesday, October 28, 2008 3:11 PM
Anexo 1
Anexo 2
Anexo 3
Anexo 4
Anexo 5
Anexo 6
Anexo 7
Anexo 8
Anexo 9