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DOI: 10.1590/1413-812320172210.

17532017 3403

Vigilância em Saúde do Trabalhador na Atenção Básica:

ARTIGO ARTICLE
aprendizagens com as equipes de Saúde da Família de João
Pessoa, Paraíba, Brasil

Worker’s Surveillance in the Primary Care:


learning with Family Health team of João Pessoa, Paraíba, Brazil

Luciana de Assis Amorim 1


Thais Lacerda e Silva 2
Horácio Pereira de Faria 3
Jorge Mesquita Huet Machado 4
Elizabeth Costa Dias 3

Abstract This study analyzed the Worker’s Sur- Resumo O estudo analisa ações de Vigilância em
veillance activities of Family Health teams, based Saúde do Trabalhador desenvolvidas por equipes
on the perceptions of physicians and nurses in de Saúde da Família, a partir da percepção de mé-
the city of João Pessoa. We used a 30-question dicos e enfermeiros no município de João Pessoa.
questionnaire split into four blocks: data on the Utilizou-se questionário com 30 questões organi-
professional, occupational healthcare practices zadas em quatro blocos: identificação do profissio-
focusing on the production and epidemiological nal; práticas de atenção à saúde dos trabalhadores
profile, and matrix and institutional support to com ênfase no perfil produtivo e epidemiológico e
the teams. A total of 179 professionals participat- apoio matricial e institucional às equipes. Partici-
ed, 82% of them were female, and 46% aged 50 param 179 profissionais; 82% mulheres; 46% com
or more; 60% had worked in the area for more 50 anos ou mais e 60% com atuação há mais de
than 10 years. Results show that Worker’s Surveil- 10 anos na atividade. Os resultados evidenciam
lance activities are not part of team day-to-day que ações de Vigilância em Saúde do Trabalhador
activities: 53% mapped productive activities and não estão incorporadas no cotidiano de trabalho
30% related them to health hazards. Twenty-four das equipes: 53% realizam mapeamento das ati-
percent mentioned activities to eliminate/mitigate vidades produtivas e 30% correlacionam-nas com
exposure to risk and vulnerabilities. The support situações de riscos para a saúde. Referem ações
1
Escola Nacional de
Saúde Pública, Fiocruz. R. of Family Health teams by the Reference Center para eliminar/mitigar a exposição a situações de
Leopoldo Bulhões 1480, for Occupational Health was mentioned by 45% riscos e vulnerabilidade, 24%. O apoio às equipes
Manguinhos. 21041-210 of the participants, less than the number reported de Saúde da Família pelo Centro de Referência
Rio de Janeiro RJ Brasil.
cianaassis.amorim@ for Worker’s Surveillance. Involvement in occu- em Saúde do Trabalhador foi referido por 45%
gmail.com pational health training was mentioned by 24% dos participantes, menor que pela Vigilância em
2
Escola de Saúde Pública of the professionals. Results suggest the need to Saúde do Trabalhador (32%). A participação em
do Estado de Minas Gerais.
Belo Horizonte MG Brasil. expand and strengthen continued education and processos de qualificação em saúde do trabalhador
3
Departamento de Medicina team support. foi mencionada por 24% dos profissionais. Os re-
Preventiva e Social, Key words Health Surveillance, Worker’s sultados sugerem necessidade de ampliar e forta-
Faculdade de Medicina,
Universidade Federal Surveillance, Primary care lecer os processos de educação permanente e apoio
de Minas Gerais. Belo técnico às equipes.
Horizonte MG Brasil. Palavras-chave Vigilância em Saúde, Vigilância
4
Diretoria Regional de
Brasília, Fiocruz. Brasília em Saúde do Trabalhador, Atenção Básica
DF Brasil.
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Amorim LA et al.

Introdução Entre as características da Atenção Básica


que favorecem a atenção à saúde dos trabalha-
A Vigilância em Saúde do Trabalhador (VISAT) dores destacam-se: a capilaridade da rede de ser-
é considerada eixo estruturante do cuidado à viços e a organização das ações, incluindo as de
saúde dos trabalhadores pela Política Nacional Vigilância em Saúde, a partir do território sob
de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora responsabilidade sanitária de uma equipe multi-
(PNSTT)1. Na perspectiva da integralidade do profissional, que permite levar o cuidado o mais
cuidado em saúde, ela se organiza em dois com- próximo de onde as pessoas vivem e trabalham.
ponentes básicos: a vigilância dos agravos à saúde O planejamento das ações a partir do território e
relacionados ao trabalho, que tem interfaces com do perfil da população adscrita permite contem-
a Vigilância Epidemiológica e a dos ambientes e plar a situação de saúde e as suas condições de
condições de trabalho, que se articula às práticas vida e construir vínculos entre os profissionais de
da Vigilância Sanitária e da Ambiental, uma vez saúde e os usuários e, desse modo, definir práti-
que na origem de muitos problemas ambientais cas de atenção à saúde em sintonia com as reais
estão os mesmos processos produtivos responsá- necessidades do usuário e da coletividade3.
veis por doenças ou agravos à saúde dos trabalha- No entanto, embora a integração das ações
dores. Nessa compreensão, a VISAT é uma ação de Vigilância em Saúde na atenção básica seja
transversal, articulada aos três componentes da reconhecida como condição obrigatória para
Vigilância em Saúde (VS) e à assistência. a construção da integralidade do cuidado, no
O cuidado à saúde dos trabalhadores nos ser- cotidiano de trabalho das equipes da Saúde da
viços de saúde deve considerar a inserção destes Família (eSF), grande parte das atividades ainda
nos processos produtivos, considerando que o se concentra nas ações assistenciais. Com frequ-
trabalho é determinante importante do processo ência, as práticas de vigilância, baseadas na análi-
saúde-doença. Assim, é essencial que as equipes se da situação de saúde da população adscrita ao
de saúde conheçam o trabalho ou a ocupação do território, por meio de intervenções articuladas
usuário-trabalhador e incorporem esse conheci- sobre os principais determinantes e controle de
mento às ações de promoção, proteção e vigilân- situações de risco e danos à saúde, permanecem
cia, assistência e reabilitação, na rede de atenção pontuais e, muitas vezes, atreladas a episódios de
do Sistema Único de Saúde (SUS). emergências sanitárias, como no caso recente da
A prescrição constitucional de 1988, regu- tríplice epidemia (dengue, zika, chikungunya).
lamentada pela Lei Orgânica da Saúde, atribuiu Na literatura técnico-científica, é possível
ao SUS a responsabilidade pela atenção integral identificar experiências e inciativas de atuação das
à saúde dos trabalhadores. Desde então, esta eSF na perspectiva da Vigilância em Saúde, articu-
tem sido implementada por meio de diferentes lando Vigilância Epidemiológica e Ambiental4. As
arranjos organizacionais, estratégias e práticas práticas de Vigilância em Saúde do Trabalhador
no âmbito da gestão, atenção e controle social. (VISAT) no âmbito da Atenção Básica são ainda
Inicialmente, essas ações foram nucleadas pelos mais escassas e pontuais5. Os registros na litera-
Programas e ou Centros de Referência em Saúde tura técnico-científica sobre o tema mostram au-
do Trabalhador (Cerest), processo que foi am- mento da produção a partir de 2009, traduzida
pliado e ganhou visibilidade social a partir da em artigos, capítulos de livros, dissertações e te-
criação da Rede Nacional de Atenção Integral ses, assim como relatos de experiências em Anais
à Saúde dos Trabalhadores (Renast), em 2002, de mostras nacionais, congressos e reuniões téc-
definida enquanto política estratégica pelo nicas de Saúde Pública/Saúde Coletiva.
Ministério da Saúde2. Intervenções sobre os agravos e seus deter-
A PNSTT, publicada em 2012, reforçou a minantes relacionados aos processos produtivos
Renast, no contexto da Rede de Atenção à Saúde e ao modelo de desenvolvimento pressupõem
(RAS), e apontou para a importância do cuidado ações articuladas e/ou integradas com outros
aos trabalhadores no âmbito da Atenção Básica pontos de atenção do SUS, em especial com as
(AB), considerada coordenadora do cuidado e vigilâncias sanitária, epidemiológica e ambiental
ordenadora da rede. Nesse sentido, também re- e necessitam contar com o apoio do Cerest, dos
forçou a necessidade da integração entre setores movimentos sociais e representações de traba-
e ações de Vigilância em Saúde com a Atenção lhadores, e de instâncias como setores da fiscali-
Básica, de modo a garantir a integralidade do zação do Ministério do Trabalho e do Ministério
cuidado, referenciado às necessidades de saúde Público do Trabalho, entre outros, configurando
da população trabalhadora. ações intersetoriais.
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Neste sentido, reconhecendo a centralidade agravos relacionados ao trabalho, em 5 municí-
da Atenção Básica no cuidado à saúde dos traba- pios, de acordo com o Plano Municipal de Saúde
lhadores e a necessidade de se definir estratégias de João Pessoa11.
de suporte técnico-pedagógico e institucional às A realização do estudo foi pactuada com os
eSF para o desenvolvimento da atenção integral gestores de saúde, com apoio do Cerest Regional.
à saúde dos trabalhadores, este estudo buscou Foi aplicado questionário semiestruturado, em
conhecer as ações de Vigilância em Saúde do amostra constituída por 50% das eSF de cada
Trabalhador desenvolvidas pelas equipes no mu- um dos cinco Distritos Sanitários do município,
nicípio de João Pessoa-Paraíba, visando identifi- à época do estudo com 175 equipes em funcio-
car dificuldades, oportunidade e apoios. O estudo namento. Utilizando-se o programa Microsoft
integra a linha de pesquisa “Organização de ações Excel foi realizado um sorteio aleatório das eSF
de Saúde do Trabalhador na Atenção Básica”, de- de cada Distrito resultando em 89 eSF partici-
senvolvida por pesquisadores da Universidade pantes do estudo. O questionário, autoaplicável,
Federal de Minas Gerais, em colaboração e foi respondido pelos médicos e enfermeiros das
com apoio financeiro da Coordenação Geral eSF que concordaram em participar do estudo
de Saúde do Trabalhador (CGST) da Secretaria e assinaram o Termo de Consentimento Livre e
de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde Esclarecido.
(SVS-MS). O questionário, composto por 30 questões,
abrange quatro blocos: a) identificação geral do
profissional de saúde; b) práticas de atenção à
Metodologia saúde dos trabalhadores; c) características do ter-
ritório (ênfase no perfil produtivo e epidemioló-
Trata-se de estudo descritivo, de natureza quali- gico da população trabalhadora) e d) apoio ma-
quantitativa, que tem como principal unidade de tricial/institucional para o desenvolvimento das
análise a atuação de médicos e enfermeiros das ações de Vigilância em Saúde do Trabalhador.
equipes de Saúde da Família na atenção à saú- Utilizou-se escala likert, com seis opções de
de do trabalhador, no município de João Pessoa. respostas para as categorias relacionadas à inves-
A escolha de João Pessoa atendeu aos critérios: tigação das ações de saúde do trabalhador de-
ser município de grande porte, com população senvolvidas pelas equipes (nunca, raramente, às
acima de 300.000 habitantes; sediar Cerest; apre- vezes, quase sempre, sempre, não sei) e com qua-
sentar cobertura de estratégia saúde da família tro opções para a categoria relativa ao apoio de
maior que 70% e possuir atores-chave e facilita- instâncias e dos atores no desenvolvimento das
dores para a realização da investigação. ações (discordo fortemente, discordo, concordo,
João Pessoa, capital do estado da Paraíba, concordo fortemente).
possui uma população de 723.515 pessoas, sendo As informações obtidas a partir dos questio-
53,31% mulheres e 46,68 homens6 A População nários foram tabuladas no software Microsoft
Economicamente Ativa Ocupada (PEAO) é de Excel, consolidadas e analisadas a partir de cate-
326.765 trabalhadores, 45% da população. A gorias previamente estabelecidas.
economia do município está baseada em ativi- O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética
dades industriais, de comércio, pesca e extração em Pesquisa da Universidade Federal de Minas
de caju e coco, com destaque para o turismo. O Gerais e da Escola Nacional de Saúde Pública da
maior número de empregados se encontra na Fundação Oswaldo Cruz.
Administração Pública (114.259) e no setor de
serviços (95.509)7 A cobertura da estratégia de
Saúde da Família no município é de 90,14%8, com Resultados e discussão
194 equipes de Saúde da Família, distribuídas em
126 unidades, em cinco Distritos Sanitários9. Participaram do estudo 179 profissionais inte-
O Centro de Referência em Saúde do grantes de 89 eSF do município de João Pessoa,
Trabalhador de João Pessoa (Cerest-JP) integra sendo 89 médicos e 90 enfermeiros. São do sexo
a rede de atenção especializada, sendo respon- feminino 82%, evidenciando a feminização da
sável pelo território da macrorregional I, abran- força de trabalho na estratégia SF; 45% com 50
gendo 65 (29,14%) municípios, uma população anos ou mais e cerca de 60% atuam há mais de
de 1.906.595 habitantes (48,34%), do Estado da 10 anos na atividade. A Tabela 1 apresenta carac-
Paraíba10. São 32 Unidades de Saúde conside- terísticas dos médicos e enfermeiros das equipes.
radas Sentinela para notificação de acidentes e Observa-se que um percentual significativo des-
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ses profissionais (59% dos médicos e 80% dos cesso de mapeamento das atividades produti-
enfermeiros) atuam há mais de quatro anos na vas no território de atuação da equipe. Além de
estratégia SF. ser prescrita como atribuição comum a todos
As ações de saúde do trabalhador desenvolvi- os profissionais da eSF, é considerada atividade
das pelas eSF são apresentadas, a seguir, organiza- fundamental para apreender as relações entre o
das a partir das seguintes categorias: mapeamen- trabalho desenvolvido nos processos produtivos
to dos processos produtivos desenvolvidos no instalados, em especial das atividades desenvol-
território; diagnóstico da situação de saúde dos vidas nos espaços domiciliar e peridomiciliar e o
trabalhadores e apoio técnico especializado, pe- processo saúde-doença das pessoas que ali vivem
dagógico e institucional para o desenvolvimento e trabalham e os possíveis impactos sobre o am-
de ações de saúde do trabalhador. Salienta-se que biente3.
a proposta do estudo foi conhecer as ações de A identificação de riscos ou situações de vul-
saúde do trabalhador desenvolvidas pelas equi- nerabilidade para a saúde das pessoas provenien-
pes de SF, a partir da percepção dos profissionais tes de atividades produtivas foi referida por cer-
de nível superior (médicos e enfermeiros). ca de 50% das equipes (quase sempre/sempre).
No entanto, apenas 32% desenvolvem iniciativas
Mapeamento dos processos produtivos para informar e/ou dialogar com a comunidade
do território sobre esses riscos. Salienta-se que 43% das equi-
pes informaram que nunca ou raramente reali-
Entre os profissionais que participaram do zam iniciativas de comunicação dos riscos ou das
estudo, 94 (52,5%) referiram que a equipe realiza situações de vulnerabilidade a que estão expostos
quase sempre ou sempre o mapeamento das ati- à população que vive nos territórios em que atu-
vidades produtivas no território, 48 (27%) infor- am.
maram que nunca ou raramente realizaram essa Sobre o desenvolvimento de iniciativas desti-
atividade e 19 (11%) profissionais não souberam nadas a eliminar ou mitigar a exposição a fatores
informar sobre a realização do mapeamento das de risco e situações de vulnerabilidade decorren-
atividades produtivas, dos quais 16 médicos e tes das atividades produtivas, observou-se baixa
três enfermeiros. atuação das equipes, pois apenas 23% referiram
Quando perguntados sobre a última vez que desenvolvê-las (sempre/quase sempre); 21%
participaram da realização do mapeamento das nunca as realizaram; 22% informaram que o fa-
atividades produtivas, 18% informaram que há 6 zem raramente e 24%, às vezes.
meses; 20% entre 6 meses e 1 ano e 24% há mais A Tabela 2 apresenta a distribuição das ações
de um ano; 39% não souberam informar. desenvolvidas pelas equipes relacionadas à cate-
Chama atenção o número de profissionais goria “Mapeamento dos processos produtivos
que desconhecem ou não participam do pro- nos territórios de atuação das equipes”.

Tabela 1. Características dos médicos e enfermeiros das equipes de Saúde da Família participantes do estudo.
Enfermeiro Médico
Variáveis % Total geral*
% %
Sexo
Homens 3 33 18
Mulheres 97 67 82
Idade (anos)
Até 29 anos 13 22 17,4
De 30 a 39 anos 24 14 19,1
De 40 a 49 anos 24 13 18,5
De 50 a 59 anos 28 13 20,2
60 anos ou mais 10 40 24,7
Tempo de atuação na ESF
Até 04 anos 30 42 31
De 05 a 09 anos 10 15 12
10 anos ou mais 70 44 57
*Percentual relativo ao total de participantes no estudo n = 179.
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Tabela 2. Distribuição das respostas por itens da categoria “Mapeamento dos processos produtivos”, pelas
equipes de Saúde da Família da Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa – 2015.
Nunca/raramente Às vezes Sempre/quase sempre Não sabe
Categoria
Freq. Relat Freq. Relat Freq. Relat Freq. Relat
Mapeia atividades produtivas 26,8% 9,5% 52,5% 10,6%
Identifica riscos relacionados às 20% 13% 47% 19%
atividades produtivas
Discute com a comunidade os 43% 18% 32% 6%
riscos
Realiza ação para eliminar riscos 43% 24% 23% 9%
Realiza negociação de medidas 49% 23% 18% 9%
prevenção de riscos provenientes
das atividades produtivas

Observa-se menor envolvimento das equipes tes de Vigilância Ambiental à equipe do CEREST
em ações de Vigilância em Saúde do Trabalhador de João Pessoa, sobre a ocorrência de aumento
à medida que a complexidade destas aumenta. da frequência de problemas respiratórios em
Embora a realização do mapeamento das ativi- crianças e idosos, possivelmente decorrentes da
dades produtivas e a identificação dos riscos para exposição à poeira originada de uma fábrica de
a saúde das pessoas e o ambiente tenham sido re- cimento no território. Em resposta à denúncia,
feridas por mais da metade das eSF (52,5%), ape- o Cerest articulou intervenção multidiscipli-
nas 23% dos profissionais relataram desenvolver nar, por equipe composta por assistente social,
sempre/quase sempre alguma ação para eliminar enfermeiro, médico do trabalho, fisioterapeu-
ou minimizar os fatores de risco e as situações de ta, com apoio do Cerest Estadual, da Secretaria
vulnerabilidade associadas ou identificados. de Meio Ambiente, e das Vigilâncias Sanitária e
É importante observar o percentual de profis- Ambiental em conjunto com a eSF responsável
sionais que referiram desconhecer se a equipe em pelo território. Entre os desdobramentos, iden-
que atua desenvolve essas ações (10,6%). Embora tificou-se que a empresa estava em situação irre-
o mapeamento do território e o reconhecimento gular, com trabalhadores e moradores expostos
de suas características ambientais, epidemiológi- a poeira e apresentando quadros de doenças res-
cas e produtivas sejam, na prática, uma ativida- piratórias. Foram realizadas intervenções junto à
de realizada pelo Agente Comunitário de Saúde empresa visando a correção da situação, e assis-
(ACS), a participação nesse processo e a identifi- tência à saúde dos trabalhadores e da população
cação de grupos, famílias e indivíduos expostos a exposta12. Esse relato reforça a importância do
riscos e vulnerabilidades são atribuições de todos trabalho do ACS na escuta sobre as queixas e os
os profissionais da equipe. problemas apresentados pela população e de seu
Em relação a denúncias ou solicitação de conhecimento sobre o território, para o desen-
intervenção sobre problemas de saúde relacio- volvimento de ações articuladas de assistência e
nados ao trabalho e ou às atividades produtivas de Vigilâncias (Sanitária, Epidemiológica, Saúde
no território, apenas 9% das equipes relataram do Trabalhador e Ambiental), para a proteção da
recebê-las quase sempre e sempre; 54,2% dos saúde dos trabalhadores e da população sob res-
respondentes apontaram que as equipes nunca ponsabilidade sanitária da equipe13.
receberam denúncia e ou não sabem informar Sobre a integração das eSF com as Vigilâncias
sobre o assunto. Este resultado sugere que a aten- em Saúde observou-se maior articulação destas
ção básica, embora seja porta de entrada priori- com a Vigilância Sanitária e Vigilância Ambiental,
tária do usuário no SUS, não é reconhecida pela relatada por 47% dos participantes. A articulação
comunidade como um canal de denúncias para com a Vigilância em Saúde do Trabalhador foi
problemas relacionados ao trabalho e tampouco referida por apenas 10% dos profissionais parti-
como potencialmente responsável por interven- cipantes do estudo.
ções e pelo controle dessas situações12 . Constata-se, assim, que a Vigilância em Saúde
Por outro lado, é interessante destacar o rela- do Trabalhador é um processo frágil e em constru-
to sobre denúncia encaminhada por ACS e agen- ção na macrorregião, como aponta o Relatório de
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Gestão 2014 do Cerest-JP10, observando-se avan- domiciliares, contribuindo para compor o perfil
ços nas práticas de promoção e proteção da saúde demográfico, ocupacional e da situação de saú-
dos trabalhadores e ampliação da coleta de dados de dos usuários trabalhadores que pertencem
e análise das informações destinadas a subsidiar à população sob sua responsabilidade. Outros
essas ações, como por exemplo a consolidação de momentos do processo de trabalho que podem
dados do Instituto Nacional de Seguridade Social aportar informações sobre a situação de saúde
(INSS) sobre ocorrência de acidentes e agravos das pessoas que residem e ou que trabalham no
relacionados ao trabalho10. Segundo o Relatório, território são: acolhimento, atendimentos reali-
foram realizadas 14 ações de Vigilância em Saúde zados pelos médicos, enfermeiros, fisioterapeu-
do Trabalhador, no período, envolvendo a ins- tas, e outros profissionais da equipe e atividades
peção em ambientes e processos de trabalho no em grupo14. Esse entendimento é importante,
município de João Pessoa. Sobre as ações de ca- pois, significa que a rigor não se trata de uma
ráter interinstitucional destacam-se atividades nova atividade atribuída à equipe, mas da requa-
conjuntas com o Ministério Público do Trabalho, lificação de ações prescritas pela PNAB e desen-
Sindicatos de trabalhadores da Construção Civil, volvidas no cotidiano de trabalho.
do Comércio, e Telecomunicações. A PNSTT destaca a importância da análise da
Além da articulação com a Vigilância em situação de saúde dos trabalhadores para a iden-
Saúde, também buscou-se conhecer a articula- tificação dos usuários e grupos mais vulneráveis,
ção das eSF com setores considerados essenciais como, por exemplo, os desempregados e aqueles
para a integralidade do cuidado aos trabalhado- inseridos em atividades produtivas domiciliares,
res, entre eles, o Centro de Referência em Saúde e ou em relações informais e precárias de tra-
do Trabalhador, o Conselho Municipal de Saúde, balho ou expostos a atividades perigosas para a
Associações Comunitárias e organizações de tra- saúde1.
balhadores. Dos participantes, 13% referiram Os resultados apontam que a identificação
articulação com organizações de trabalhadores; de riscos e situações de vulnerabilidades rela-
24% das equipes trabalham articuladas com o cionadas às atividades produtivas desenvolvidas
Conselho Municipal de Saúde e 35% com asso- no território e o desenvolvimento de iniciativas
ciações comunitárias. A articulação com o Cerest, capazes de minimizar a exposição e seus efeitos
apontado como apoiador das eSF pela PNSTT, não constitui prática rotineira das equipes. Essas
foi mencionada por 22% dos participantes. observações reforçam a necessidade e a impor-
Considerando a importância da participação tância do apoio técnico e pedagógico para o de-
social, prescrita tanto pela Política da Atenção senvolvimento de ações de Saúde do Trabalhador
Básica quanto pela PNSTT, os resultados apon- pelas eSF.
tam para a necessidade de fortalecer a participa-
ção de usuários e da comunidade na produção Reconhecimento do usuário trabalhador e
do autocuidado, nas ações coletivas e em ações estabelecimento da relação entre o trabalho
orientadas para a melhoria das condições de vida e a condição de saúde-doença
e trabalho.
O reconhecimento do usuário enquanto tra-
Diagnóstico da situação de saúde balhador e a investigação sobre sua situação de
dos trabalhadores trabalho ou de não trabalho ou de desemprego
e as relações com o processo saúde-doença e so-
Entre os participantes do estudo, 43% re- frimento das pessoas são essenciais para a produ-
feriram que as equipes realizam diagnóstico de ção do cuidado aos trabalhadores, no âmbito da
situação de saúde dos trabalhadores que vivem Atenção Básica. Das equipes, 79% informaram
em sua área de atuação e consideram essas infor- que sempre ou quase sempre procuram saber
mações essenciais para o planejamento e o desen- a ocupação do usuário e 68% referiram buscar
volvimento das ações de promoção, vigilância e compreender melhor as características desse
assistência à saúde. trabalho e das atividades desenvolvidas. É inte-
O diagnóstico da situação de saúde da popu- ressante salientar que esse achado é distinto da
lação adscrita em um dado território perpassa observação realizada sobre as práticas das eAB
vários momentos do processo de trabalho das do município de Chapecó por Silva et al.15, que
equipes: começam a ser colhidas no cadastra- apontam a falta de reconhecimento do usuário
mento individual das famílias realizado pelos enquanto trabalhador como uma das maiores di-
ACS, utilizando as fichas do e-SUS, nas visitas ficuldades para a incorporação de ações de saú-
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de do trabalhador no cotidiano de trabalho das doenças relacionadas ao trabalho são de notifica-
equipes. ção obrigatória no Sistema, algumas delas com-
Apesar de grande parte dos profissionais par- pulsoriamente. Observou-se que a notificação
ticipantes relatarem que identificam o usuário de agravos relacionados ao trabalho não é uma
como trabalhador em seu cotidiano de trabalho prática usual das equipes que participaram do
(78,2%), apenas 26% referiram que sempre ou estudo. Referiram que sempre ou quase sempre
quase sempre perguntam ao usuário sobre o tra- estabelecem a relação entre o trabalho e a quei-
balho pregresso. xa, doença ou condição de saúde, 64%, porém,
Outro achado que chama a atenção é que somente 29% notificam, sempre/quase sempre,
74% dos profissionais relataram que investigam, uma doença relacionada ao trabalho no Sinan.
sempre ou quase sempre, a relação entre a queixa Um percentual expressivo (57%) informou que
trazida pelo usuário-trabalhador e o seu traba- a equipe nunca ou raramente notifica doenças
lho/ocupação, e 64% referiram que conseguem relacionadas ao trabalho no SINAN.
estabelecer e/ou confirmar essa relação. Apenas Em relação aos acidentes de trabalho 52%
7% informaram que nunca ou raramente conse- nunca ou raramente notificam, 13% notificam
guiram estabelecer essa relação causal. às vezes e 33% dos profissionais informaram que
O estabelecimento da relação entre o traba- notificam sempre ou quase sempre (Tabela 3). O
lho e as queixas/adoecimento apresentados pelo baixo percentual de notificação dos acidentes de
trabalhador possibilita desvelar a contribuição trabalho, cuja relação com a atividades é mais fa-
do trabalho no processo saúde-doença e orientar cilmente estabelecida, pode estar relacionado ao
as condutas a serem tomadas. Para isto, o Nasf fato do atendimento dessas ocorrências aconte-
e os Cerest devem estar capacitados a prover su- cer nos serviços de urgência. Apenas nos casos de
porte técnico especializado às eSF16. acidentes de trabalho considerados leves o usuá-
A notificação ao Sistema Nacional de Agravos rio procura a unidade básica de saúde.
de Notificação (SINAN) é uma decorrência ne- A sistematização e análise das informações a
cessária da investigação e ou do diagnóstico de partir das notificações de agravos relacionados
um agravo ou doença relacionado ao traba- ao trabalho foram referidas por 48% dos pro-
lho. No grupo estudado, quase a totalidade dos fissionais das eSF. Este achado sugere que apesar
profissionais das equipes relataram conhecer o dessa atividade ser fundamental para se conhe-
SINAN, porém 13% informaram não saber que cer os eventos mais frequentes e os grupos mais

Tabela 3. Distribuição das respostas por itens da categoria “Diagnóstico da situação de saúde dos trabalhadores”,
pelas equipes de Saúde da Família da Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa – 2015.
Nunca/raramente Às vezes Sempre/quase sempre Não respondeu
Categoria
Freq. Relat Freq. Relat Freq. Relat Freq. Relat
Pergunta sobre o trabalho atual 1,1% 20,1% 78,2% 0,56%
Pergunta sobre as atividades 5% 27% 68% 0
desenvolvidas no trabalho
Pergunta sobre o trabalho 34% 40% 26% 1%
anterior
Identifica riscos no trabalho 6% 25% 70% 0
atual
Identifica riscos relacionados ao 23% 30% 46% 1%
trabalho pregresso
Busca relação entre queixa e 4% 21% 74% 1%
trabalho atual ou pregresso
Consegue estabelecer relação 7% 30% 64% 0
entre queixa e trabalho atual/
pregresso
Notifica acidente de trabalho no 52% 13% 33% 2%
SINAN
Notifica doenças relacionadas 57% 13% 29% 1%
ao trabalho no SINAN
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vulneráveis da população, a serem considerados e tes sobre a importância do papel de apoiador das
priorizados no planejamento das ações de saúde Vigilâncias e em especial dos Cerest às eSF.
e intervenções intersetoriais, existe um longo ca- A experiência acumulada e os registros na
minho a ser percorrido, no qual a educação per- literatura mostram que durante muitos anos, a
manente é muito importante. atuação dos Cerest junto à Atenção Básica pri-
A subnotificação no Sinan dos casos atendi- vilegiou a realização de cursos de capacitação
dos nas UBS também foi evidenciada por Lopes pautados em uma lógica de transmissão de co-
dos Santos e Lacaz17 que atribuem a dificuldade nhecimento técnico e informações sobre temas
para a definição da relação causal entre o agravo de saúde do trabalhador. Os resultados do estudo
e o trabalho à evolução silenciosa e demorada das apontam para a necessidade de ressignificação
doenças relacionadas ao trabalho, situação agra- das práticas de apoio oferecidas pelos Cerest, vi-
vada pelas falhas nos registros médicos e pelo ex- sando a apropriação de conceitos e de novos mo-
cesso de burocracia. Os profissionais de SF consi- dos de operar o apoio matricial, tal qual proposto
deraram a ficha de notificação extensa, demorada por Campos e Domitti18.
e complicada. A proposta de apoio técnico e pedagógi-
A Tabela 3 apresenta os percentuais relativos co, na perspectiva do matriciamento, abre no-
às ações desenvolvidas pelas equipes de Saúde da vas possiblidades para o campo da Saúde do
Família, na perspectiva dos médicos e enfermei- Trabalhador5,17,19. A discussão de casos clínicos e
ros, referente à categoria “Diagnóstico da situa- a disponibilidade permanente de apoio facilitam
ção de saúde dos trabalhadores”. a incorporação de conceitos e práticas pelas equi-
pes da rede básica. Além disso, o vínculo que se
Apoio especializado, pedagógico e estabelece entre os profissionais das equipes de
institucional às equipes de Saúde da Família referência e os apoiadores facilita a articulação
no desenvolvimento de ações de saúde intrassetorial e a constituição de espaços de inter-
do trabalhador locução visando a melhor solução possível para
as questões de saúde relacionadas ao trabalho17.
O apoio técnico especializado, pedagógico e Sobre o apoio institucional, merece desta-
institucional às eSF é essencial para a efetivação que o papel desempenhado pela coordenação
da atenção integral à saúde dos trabalhadores, no da Atenção Básica do município, e dos gerentes
âmbito do SUS, e de modo especial, na Atenção das unidades básicas de saúde para o desenvol-
Básica, seja para o desenvolvimento de ações as- vimento de ações de saúde do trabalhador. Dos
sistenciais, seja para a promoção e a Vigilância participantes do estudo, 61% concordam que a
em Saúde17. coordenação da AB municipal apoia o desenvol-
A PNST1 reafirma o papel das equipes de vi- vimento dessas ações e 71% com o apoio dos ge-
gilância e, de modo especial do Cerest, no apoio rentes das UBS.
matricial, ou seja, de retaguarda assistencial e su- Sobre as ações de qualificação e/ou educação
porte técnico-pedagógico para o desenvolvimen- permanente para o desenvolvimento de ações de
to das ações de saúde do trabalhador na atenção saúde do trabalhador, apenas 24% dos profissio-
básica, e outros pontos de atenção da Rede de nais das equipes de saúde da família registraram
Atenção à Saúde (RAS). sua ocorrência, sugerindo baixo investimento
De acordo com os resultados do estudo, 45% do município na formação de profissionais da
dos profissionais das equipes entrevistadas con- Atenção Básica para o cuidado aos trabalhadores20.
cordam com a afirmação de que “o Cerest oferece A PNAB21 explicita que a Educação
apoio e retaguarda técnica às equipes de SF”. Esse Permanente em Saúde (EPS) abrange um pro-
dado chama a atenção, pois representa o dobro cesso pedagógico que começa com a aquisição/
do percentual de equipes que referiram articula- atualização de conhecimentos e habilidades, en-
ção com o Cerest (22%). Esta contradição neces- volvendo o aprendizado construído a partir dos
sita ser investigada de modo a fortalecer a atua- problemas e desafios enfrentados no cotidiano
ção do Cerest. do processo de trabalho. Afirma ainda que a EPS
Ao serem perguntados sobre o apoio oferecido deve ser assumida enquanto uma estratégia de
pelo setor de Vigilância em Saúde do Trabalhador, gestão, com grande potencial de transformação
32% dos entrevistados concordaram que esta das práticas de saúde e dos processos de trabalho
apoia o desenvolvimento de ações de saúde do das equipes, que resulta na melhoria das condi-
trabalhador na Atenção Básica. Esse achado colo- ções de trabalho e de satisfação dos trabalhadores
ca em xeque a concepção e as orientações vigen- de saúde.
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Sobre a EPS no âmbito da Atenção Básica, da- Considerações finais
dos do Programa Nacional de Melhoria do Acesso
e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) Os resultados do estudo reforçam a necessidade
apontam para a importância da implementação de fortalecer a implementação dos princípios,
dessa política. Entretanto, 81,1% dos participan- diretrizes e ações da PNSTT pelas equipes da
tes do estudo responderam afirmativamente so- Atenção Básica, enquanto porta de entrada pre-
bre a existência de ações de EPS envolvendo tra- ferencial do usuário na rede de atenção à saúde
balhadores da Atenção Básica; 18,3%, negaram e do SUS. Essa questão é especialmente importante
0,5% não souberam responder ou não respon- no atual contexto em que um grande contingente
deram essa questão. De acordo com os autores, da população trabalhadora se encontra no setor
houve variação entre as regiões brasileiras, sendo informal e ou precarizado de trabalho, ou desem-
que os extremos foram a região Sudeste e a região pregada e em situação de vulnerabilidade social,
Nordeste, com 87,1% e 75,3% das equipes com em muitos casos desenvolvendo atividades pro-
respostas afirmativas, respectivamente. Quando dutivas no domicílio e peridomicílio,
instigadas se as atividades de EPS suprem suas Nesse sentido, o reconhecimento dos traba-
demandas e necessidades, 75,7% das equipes ava- lhadores na população adscrita e o acesso aos
liaram-nas como suficientes22. ambientes de trabalho domiciliados, que per-
Nesta perspectiva, as discussões e a pro- manecem invisíveis e inacessíveis a outras ins-
blematização sobre o processo de trabalho e as tituições responsáveis pela saúde e segurança
atividades rotineiras desenvolvidas, como o aco- dos trabalhadores, na esfera do Trabalho e da
lhimento, o atendimento clínico, a discussão de Previdência Social, fazem com que as equipes
caso, visitas domiciliares ou grupos operativos tenham condições de lidar com as questões de
podem ensejar que os profissionais incorporem o saúde-doença relacionadas ao trabalho e mesmo
olhar sobre o trabalho, transformado suas ações com alguns problemas ambientais que têm ori-
na perspectiva da Saúde do Trabalhador. gem nos mesmos processos produtivos do terri-
Em relação às dificuldades e limitações das tório em que atuam.
equipes para o desenvolvimento do cuidado qua- As características e a organização das práticas
lificado aos trabalhadores é importante destacar a de saúde das equipes da atenção básica favore-
sobrecarga de trabalho vivenciada pelos profissio- cem o acesso dos trabalhadores e trabalhadoras
nais, traduzida na responsabilização por um nú- ao cuidado da saúde, com qualidade e resoluti-
mero grande de famílias; agravada pela rotativi- vidade e potencialmente capaz de apreender os
dade e a fragilidade e/ou precariedade dos víncu- mecanismos pelos quais o trabalho influencia
los nos contratos de trabalho; a preponderância suas condições de vida e saúde.
de interesses políticos locais sobre as reais neces- Entretanto, os resultados demonstram que o
sidades de saúde da população e mesmo a fragi- cuidado à saúde dos trabalhadores, consideran-
lidade da rede de atenção à saúde do trabalhador, do sua inserção nos processos de trabalho par-
para a garantia da integralidade do cuidado. ticulares, requer a institucionalização do apoio,
Entre as limitações do estudo, destaca-se a técnico e pedagógico, sistemático e de qualidade,
participação apenas de médicos e enfermeiros, de modo a qualificar as ações e assegurar a conti-
em detrimento de outros profissionais que com- nuidade do cuidado de modo articulado com os
põem a equipe, o que necessariamente implica no pontos de maior complexidade e ou incorpora-
reducionismo e em um viés de percepção quanto ção tecnológica.
às práticas desenvolvidas. Outra questão impor- Nesse cenário, cabe aos Cerest um papel im-
tante refere-se ao fato de não terem sido ouvidos portante enquanto matriciador das ações, atu-
os profissionais dos Núcleos de Apoio a Saúde ando junto aos Núcleos de Apoio à Saúde da
da Família (NASF), que conformam uma rede Família (Nasf) e a outros setores da Vigilância
de suporte às eSF. Entretanto, as experiências e em Saúde, tendo por referência o processo de
os registros na literatura apontam que são ainda trabalho das equipes da atenção básica, buscando
incipientes as iniciativas no campo da Saúde do identificar momentos e estratégias mais adequa-
Trabalhador. das e oportunas.
Neste sentido, a Vigilância em Saúde do
Trabalhador deve considerar o território como
base operacional para o planejamento das ações
e incorporar os problemas advindos das relações
produção-trabalho, ambiente e saúde em uma
3412
Amorim LA et al.

atuação integrada entre a Atenção Básica e a


Vigilância em Saúde. Requer ainda a configura-
ção de redes intersetoriais a partir do objeto de
intervenção, ampliando o desafio de se desenvol-
ver ações dessa natureza nos territórios de res-
ponsabilidade das equipes de Atenção Básica.
Porém, é necessário considerar a necessida-
de de que todo esse processo seja acompanhado
da discussão e implementação de intervenções
visando a melhoria das condições de trabalho e
de saúde das próprias equipes da Atenção Básica,
sem o que, por mais motivadas e pressionadas
pelas demandas da realidade, que elas estejam,
muito pouco se conseguirá fazer.

Colaboradores

LA Amorim foi responsável pela realização do


trabalho de campo e trabalhou na concepção do
estudo, desenho da metodologia, elaboração e
revisão do manuscrito. TL Silva, JMH Machado
e EC Dias trabalharam na concepção do estudo,
desenho da metodologia, elaboração e revisão do
manuscrito. HP Faria participou da concepção
da metodologia, tabulação e análise dos dados e
revisão final do texto.

Agradecimento

Os autores agradecem aos colegas do Cerest-João


Pessoa, em especial ao Kleber José da Silva e à
Lyssandra da Costa Silva pelo suporte técnico e
operacional à realização do estudo, assim como
aos gestores e às equipes de Saúde Família dos
Distritos Sanitários que acolheram e muito con-
tribuíram para sua viabilização.
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