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6 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

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VIGILÂNCIA EM SAÚDE DO
TRABALHADOR DA SAÚDE
Simone Santos Oliveira
Jorge Mesquita Huet Machado
Luciana de Assis Amorim
Roberta Alamonica de Oliveira
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
7

A perspectiva do Panorama da Saúde mez & Thedim-Costa, 1997; Laurell


dos Trabalhadores da Saúde é con- & Noriega, 1989; Lacaz, 1996).
tribuir para a formulação de um
Entre as características do campo
modelo de vigilância em saúde do
de saberes e práticas da saúde do
trabalhador da saúde. Tal modelo
trabalhador destacam-se: a busca
busca subsidiar as ações de implan-
pela compreensão das relações
tação de processos de intervenção
entre trabalho, saúde e doença,
visando à transformação das condi-
visando à promoção, proteção, pre-
ções de trabalho no setor sanitário,
venção, assistência e reabilitação;
considerando os riscos e as situações
a necessidade de transformação
críticas identificadas tanto na esfera
dos ambientes e dos processos de
pública quanto na privada.
trabalho; a incorporação da huma-
No Brasil, a saúde do trabalhador nização do trabalho; a abordagem
surge no processo histórico de lutas multiprofissional, interdisciplinar e
sociais da década de 1970, no mo- intersetorial, para que a relação saú-
vimento pela redemocratização do de-trabalho seja entendida em toda
país. Este novo campo de práticas a sua complexidade; a participação
e saberes originou-se na luta dos dos trabalhadores como sujeitos no
trabalhadores pelo direito à saú- planejamento e na implementação
de, no bojo da Reforma Sanitária do trabalho; e a articulação com o
Brasileira, com inspiração no Mo- componente ambiental, já que os
vimento Operário Italiano, tendo riscos dos processos de trabalho afe-
como premissa a valorização da tam o meio ambiente e a população
experiência e do conhecimento do geral (Lacaz, 1996; Machado, 1996,
trabalhador por melhores condições 2005; Minayo-Gomez & Thedim-
de trabalho (Oddone et al., 1986; Costa, 1997).
Brito, 1997).

Baseada também no conceito am-


pliado de saúde oriundo da medici-
Baseada também no conceito ampliado de saúde
na social latino-americana, a saúde
oriundo da medicina social latino-americana, a saú-
do trabalhador busca romper com
de do trabalhador busca romper com as concepções
as concepções hegemônicas, uni ou hegemônicas, uni ou multicausais, que desconside-
multicausais, que desconsideram a ram a dimensão social e histórica do trabalho e da
dimensão social e histórica do traba- saúde/doença.
lho e da saúde/doença (Minayo-Go-
8 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

1. ASPECTOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS DA VIGILÂNCIA


EM SAÚDE DO TRABALHADOR

A vigilância em saúde do trabalha- que tenham envolvimento com a


dor (Visat), devido a seu potencial questão, extrapolando o setor saúde
transformador, busca a superação (Balista, Santiago & Corrêa-Filho,
da dicotomia existente entre a as- 2011). Portanto, a vigilância em
sistência individual e coletiva, entre saúde do trabalhador é um processo
as ações preventivas e curativas e a social contínuo que engloba vários
falta de articulação das vigilâncias. atores em níveis distintos de ação
Como campo de atuação, distingue- (Machado, 2005).
se da vigilância em saúde em geral
A regionalização tem sido apontada,
e de outras disciplinas por delimitar
por diversos autores, como a possibi-
seu objeto específico na relação do
lidade de se avançar na consolidação
processo de trabalho com a saúde, e
da vigilância em saúde do trabalha-
tem como pressuposto de atuação a
dor de acordo com as experiências
articulação entre os controles de ex-
locorregionais advindas de diversos
posição e efeito (Machado, 1997).
pontos do país (Santos & Rigotto,
A concepção de vigilância da saúde 2011; Machado, 1996, 1997; Vas-
do trabalhador surge com a perspec- concellos & Ribeiro, 1997).
tiva de combinar os componentes
No âmbito municipal e microrre-
das vigilâncias sanitária e epidemio-
gional, o maior desafio, de acordo
lógica e das inspeções em ambientes
com o estudo de Teixeira (2002),
de trabalho, de forma a facilitar
seria envolver os diversos atores
uma abordagem interdisciplinar
(secretários de saúde, prefeitos mu-
da relação processo de trabalho e
nicipais, gestores e a sociedade civil
saúde, ressaltando aspectos como
organizada) em um movimento de
tecnologias utilizadas nos processos
reorientação do modelo de atenção
de produção; epidemiologia para
à saúde que se desdobre em ações
a avaliação de risco; elementos
intersetoriais de promoção e de
sociais, por exemplo, as condições
melhorias das condições de vida, ao
econômicas e de organização dos
lado da reorganização da atenção
trabalhadores. Essa concepção re-
básica e da regulação da assistência
quer abordagem ampliada e deve
de média e de alta complexidade.
ser exercida pelos diferentes atores
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
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O controle social é outra premissa são relatadas como desintegradas e


básica para a discussão das ações de por vezes conflituosas, com práticas
vigilância em saúde do trabalhador. diferenciadas e choques de compe-
De acordo com Vasconcellos, Almeida tências em diversas ações.
e Guedes (2010), a participação do
Vasconcellos, Almeida e Guedes
trabalhador adiciona um ingrediente
(2010), ao considerar a falta de
facilitador na institucionalização da
capacitação técnica dos agentes
vigilância justamente por legitimar a
públicos como um dos fatores que
inclusão dos sujeitos, no caso os tra-
tornam a vigilância em saúde do
balhadores, como atores do processo
trabalhador ainda ‘inusual’, elabo-
metodológico para atuar na vigilân-
raram uma proposta metodológica
cia em saúde do trabalhador.
para a capacitação na área. Para
Portanto, na prática, essas questões isso, as bases teóricas conceituais
ainda não estão incorporadas em seu que norteiam a construção da saúde
sentido amplo, explicitando o peque- do trabalhador, assim como a peda-
no grau de articulação existente entre gogia problematizadora utilizada no
os atores diretamente envolvidos. processo de educação permanente
do SUS, são discutidas. O ponto
Nessa conjuntura, a atuação do
chave dessa proposta é a capacita-
setor saúde ainda é enfraquecida
ção conjunta dos agentes públicos
em virtude das ações dos outros
com os trabalhadores, harmoniza-
poderes responsáveis pela fiscali-
da tanto ao princípio do controle
zação dos ambientes de trabalho.
social do SUS quanto à ideia do
Para Machado (1997), há uma
campo da saúde do trabalhador,
dualidade no modelo brasileiro de
que tem no trabalhador o sujeito
vigilância em saúde do trabalhador
ativo e central das ações.
referente à ampliação das ações
institucionais, aliada, de um lado, A capacitação das equipes também
ao movimento sindical e às ações é sinalizada por Ramos (2008), que
implantadas no SUS, e, de outro, identifica a necessidade de o campo
às ações das Delegacias Regio- da saúde do trabalhador contar com
nais do Trabalho (DRTs) e à visão profissionais qualificados e com
tecnicista de análise do processo conhecimento crítico e reflexivo
(Vasconcellos & Ribeiro, 1997). sobre a relação saúde-trabalho e o
Algumas ações do setor saúde em processo saúde-doença, de modo a
vigilância em saúde do trabalhador contribuir com práticas inovadoras
10 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

voltadas para uma perspectiva da grande dificuldade de obter infor-


integralidade, vigilância e huma- mações que não sejam em prol de
nização da atenção. pagamentos previdenciários (Vas-
concellos & Ribeiro, 1997).
A informação é outro ponto de
grande relevância para consolidar O Sinan-NET, ferramenta de notifi-
subsídios às ações de planejamento cação utilizada pelo Ministério da
de vigilância em saúde do traba- Saúde, embora implantado para
lhador. Facchini e colaboradores o recebimento de informações re-
(2005) ressaltam a necessidade de ferentes aos agravos em saúde do
organizar as informações em saúde trabalhador desde 2006, está ainda
do trabalhador, para que as ações em um processo de construção e de
de vigilância possam ser orientadas consolidação, devido à falta de ins-
e otimizadas. Reportam ainda sobre trumentos e à incapacidade técnica
a não valorização da informação dos estados no manuseio do progra-
sobre o trabalho no SUS, a não ma e à dificuldade dos profissionais
existência de um setor que efetiva- de ponta para preencher os campos
mente colete, analise e interprete necessários. Estudos realizados no
sistematicamente as condições de estado do Paraná, segundo Scherer
saúde e de trabalho. Verificam-se e colaboradores (2007), com dados
problemas de qualidade advindos do Sinan-NET, sobre agravos rela-
do sistema de informação existente, cionados à saúde do trabalhador,
como a inconsistência dos dados, a mostram pontos negativos, como a
não padronização de variáveis, a restrição ao acesso, a morosidade,
diferenciação existente sobre os da- a segmentação, a parcialização de
dos reais e a notificação. Ressaltam- informações e a falta de informação
se também a escassez de recursos entre os dados do prontuário e as in-
existentes – sejam eles tecnológicos, formações solicitadas nesse banco de
sejam de recursos humanos e or- dados, o que dificulta a visualização
ganizacionais –, além da crescente dos problemas relacionados à saúde
necessidade de capacitação para a do trabalhador. Porém, a utilização
otimização do sistema. correta dos dados disponíveis no
Sinan-NET a respeito da vigilância
A subnotificação representa um
epidemiológica em saúde do traba-
problema a ser transposto, tendo
lhador oferece condições para arti-
em vista a impossibilidade de gerar
culações, respaldo para planejamen-
inspeções sanitárias preventivas e a
tos, avaliações de ações de impacto
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
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à saúde, controle e monitoramento, As ações de vigilância em saúde do


ações de vigilância sanitária entre trabalhador acontecem de forma
outras, para intervir e melhorar as localizada de acordo com o compro-
condições de trabalho e saúde dos metimento da equipe e dos gestores
trabalhadores. Segundo estes auto- locais. Machado e Porto (2003:
res, o planejamento de estratégias 127) caracterizam a prática da vi-
para a implantação da vigilância gilância em saúde do trabalhador
epidemiológica é o primeiro passo como sendo de
para a estruturação da atenção em
“caráter híbrido e, calcado em
saúde do trabalhador. Destacamos experiências institucionalizadas
também necessidade de interação e generalizadas de múltiplas
facetas, repletas de ações volun-
com a mídia, veiculadora de infor- taristas e de personalismos, em
mações e formadora de opiniões, contexto institucional desesta-
bilizado”.
tendo os trabalhadores da saúde
importante papel na publicização Os balanços realizados pela Rede
dos dados e no acompanhamento Nacional de Atenção Integral à Saú-
dos eventos junto à população (Ma- de do Trabalhador (Renast), de 2009
chado & Porto, 2003). e 2011, mostram que a vigilância em
saúde do trabalhador vem se qualifi-
cando e se estruturando no cenário
...a utilização correta dos dados brasileiro, apesar de tal cenário
disponíveis no Sinan-NET a estar cerceado pela crise política e
respeito da vigilância epide-
financeira existente nos municípios.
miológica em saúde do traba-
Há um choque de competências, re-
lhador oferece condições para
articulações, respaldo para lacionado tanto aos órgãos fiscaliza-
planejamentos, avaliações de dores quanto aos interesses políticos
ações de impacto à saúde, con- regionais, na realização de algumas
trole e monitoramento, ações ações, visto que o cenário não se
de vigilância sanitária entre diferencia do quadro da vigilância
outras, para intervir e melho- em saúde do trabalhador apresenta-
rar as condições de trabalho e
do em 2003 e presente no relatório
saúde dos trabalhadores.
da oficina de trabalho “Políticas de
saúde do trabalhador no SUS”, do
12 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

grupo de saúde do trabalhador da necessidade de transcender as ações


Associação Brasileira de Saúde Co- curativas para as de prevenção e
letiva (Abrasco). promoção da saúde; as experiências
que puderam ser observadas por Ma-
Portanto, as ações ainda se encon-
chado e Porto (2003), referentes ao
tram fragmentadas e focadas na as-
estudo da situação e tendências da
sistência à saúde dos trabalhadores
vigilância em saúde do trabalhador
(Lourenço & Bertani, 2007). Há a
no Brasil, revelam um rico potencial

2. INSTRUMENTOS LEGAIS E NORMATIVOS QUE


REFERENCIAM AS AÇÕES DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE DO
TRABALHADOR

A discussão sobre saúde e trabalho de doença e de outros agravos e


encontra, no Movimento de Reforma o acesso universal e igualitário às
Sanitária, um momento privilegiado ações e serviços que devem integrar
de enfrentamento, em 1986, na Oi- estratégias para a promoção, pro-
tava Conferência Nacional de Saúde, teção e recuperação da saúde, com
que culmina na realização da Primei- articulação interna ao próprio setor
ra Conferência Nacional de Saúde do saúde, assim como da previdência e
Trabalhador. Com a promulgação da assistência social.
Constituição Federal de 1988 e a for-
mulação da Lei Orgânica da Saúde, Em 1990, a Lei Orgânica da Saúde

as ações de saúde do trabalhador n. 8.080/90 (Brasil, 2005a) prevê

passam a ser reconhecidas por lei a saúde do trabalhador como “um

como responsabilidade do Estado. conjunto de atividades que se des-


tina, através das ações de vigilância
Então, pela Constituição Federal de epidemiológica e vigilância sani-
1988, a saúde passa a ser inscrita tária, à promoção e à proteção da
como direito de todos e dever do saúde dos trabalhadores submetidos
Estado, e adota-se o conceito am- aos riscos e agravos advindos das
pliado do processo saúde-doença. condições de trabalho”; além disso,
A regulamentação dos deveres do estabelece que os municípios, coor-
Estado em relação à saúde garante denando suas atuações com a União,
a integração de políticas sociais e com os estados e com as entidades
econômicas para redução do risco representativas dos trabalhadores,
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
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desenvolverão ações, visando à e provocar o desencadeamento de


promoção, proteção, recuperação e ações concretas no âmbito do SUS
reabilitação dos trabalhadores. (Vasconcellos, 2007).

Desse modo, é a partir da implan-


tação do SUS que a fiscalização ...é a partir da implantação do SUS que a scalização
das condições e dos ambientes de das condições e dos ambientes de trabalho dá ao setor
trabalho dá ao setor saúde a prer- saúde a prerrogativa de exercer a vigilância em saúde
rogativa de exercer a vigilância em do trabalhador nos locais de trabalho de forma multi-
disciplinar e interinstitucional, com objetivo de atingir
saúde do trabalhador nos locais de
a integralidade e a e ciência nas ações.
trabalho de forma multidisciplinar
e interinstitucional, com objetivo
de atingir a integralidade e a efi- Na Terceira Conferência Nacional
ciência nas ações. de Saúde do Trabalhador, realizada
em novembro de 2005, reportou-se
No entanto, conforme destaca Vas-
novamente à estruturação de uma
concellos (2007), o campo da saúde
política de Estado e à necessidade
do trabalhador não foi plenamente
de sua incorporação nas questões
acolhido pela saúde pública e vive
do desenvolvimento sustentável,
um permanente desafio para o seu
condizente com os rumos das po-
desenvolvimento técnico opera-
líticas globalizantes. Contudo, as
cional por dentro das práticas de
recomendações da conferência
saúde em geral. Dessa forma, um
permanecem sem receber acolhida
dos principais desafios consiste em
no próprio Ministério da Saúde
considerar a centralidade da cate-
como pauta de agenda política. A
goria trabalho nos determinantes
possibilidade de efetivação de uma
sociais dos agravos da população
Política Nacional de Saúde do Tra-
Em março de 1994, foi realizada balhador (PNST) depende de uma
a Segunda Conferência Nacional profunda revisão do significado
de Saúde do Trabalhador com o político estrutural do SUS como
tema: “Construindo uma política instância articuladora e sistêmica
de saúde do trabalhador”. Esse do Estado brasileiro no interior da
momento foi marcado por uma saúde pública. Para a construção de
grande mobilização de represen- uma PNST no SUS, uma concepção
tantes institucionais e sindicais, no sistêmica que transponha os limites
esforço suprassetorial de consolidar da setorialidade, é necessário criar
novos objetos estruturais, pautados
14 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

na transetorialidade e na transver- sídios básicos para o desenvolvi-


salidade, para a implementação mento de ações de vigilância em
de uma política que rompa com a saúde do trabalhador no âmbito
cultura de fragmentos em direção a do SUS, apesar de trabalhar com o
uma transição para o ‘trans’. conceito de plurinstitucionalidade e
intersetorialidade, avança ao propor
A perspectiva de transição para o
‘trans’, especialmente no caso da também, como princípios básicos na
transetorialidade, com base na orientação das ações de vigilância, a
transposição da gestão, implica a
compreensão de que as políticas, integralidade das ações, o controle
os planos e as ações decorrentes social, a hierarquização, a descen-
da saúde como estrutura sistêmi-
ca do Estado tornem-se capazes
tralização, a pesquisa-intervenção
de serem introjetadas em todas as e o caráter transformador, na pers-
esferas de decisão das políticas,
pectiva da melhoria da qualidade
com a condução (ao menos com-
partilhada) do SUS e utilizando de vida no trabalho, bem como um
a capilaridade estrutural do sis- movimento em direção à mudan-
tema como instâncias efetoras.
Em última instância, a transição ça do modelo assistencial para a
para o ‘trans’ culmina com a atenção integral, articulando ações
transformação do SUS em sistema
individuais e coletivas de vigilância
(Vasconcellos, 2007: 37).
(Brasil, 1998).
Entretanto, o desenho da atual
De acordo com esta portaria, as
PNST mantém como características
estratégias de ação pressupõem
a formulação normativa plurinstitu-
uma rede de articulação que passa
cional e desarticulada; a execução
pelos trabalhadores e suas orga-
de ações também plurinstitucional
nizações, pela área de pesquisa e
e desarticulada; a exclusão de gran-
formação de recursos humanos e
des contingentes de trabalhadores
pelas áreas de assistência e reabi-
do alcance da política tradicional;
litação. Sua abordagem calca-se
a manutenção de informações ofi-
no modelo epidemiológico de
ciais sem caráter epidemiológico; a
pesquisa dos agravos e na avalia-
formação de quadros com base no
ção de riscos no planejamento e
modelo médico-centrado; e, entre
avaliação das ações, visando ao
outras variáveis, a manutenção do
estabelecimento de prioridades
sujeito trabalhador como corpo-
no desenvolvimento de ações de
objeto (Vasconcellos, 2007).
vigilância e assistência à saúde dos
A portaria n. 3.120/MS de 1998 trabalhadores (Brasil, 1998).
(Brasil, 2005b), que fornece sub-
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
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Partindo do olhar da epidemiologia, poderão ser estabelecidos a partir da


Machado (1997) propõe matriz articulação a outras formas de abor-
para priorização e planejamento das dagem da relação entre processo de
estratégias de vigilância em saúde trabalho e saúde (Machado, 1997).
do trabalhador por tipo de efeito,
A abordagem por território está
agravos; por tipo de exposição, ris-
em consonância com o modelo de
cos ou atividades; e por delimitação
distritos sanitários, ou seja, em
espacial / território.
consonância com a atuação local,
A busca ativa de casos e a criação com o planejamento de ações e
de um programa de vigilância per- com a avaliação de prioridades e
mitem a identificação dos determi- efeitos das ações sanitárias em uma
nantes dos agravos à saúde, uma determinada região, contribuindo
das formas de abordar os objetos ao planejamento de ações mais
da vigilância, através da análise adequadas, voltadas para a atuação
da história ocupacional e da de- intersetorial e para intervenções
limitação de novas estratégias de particulares e integradas de promo-
controle de riscos. Essa estratégia ção, prevenção e recuperação, que
pode vir a direcionar os programas superem os paradigmas médico-
de saúde do trabalhador de acordo assistencial e sanitários vigentes no
com a prioridade diagnóstica (Ma- SUS (Machado & Porto, 2003).
chado, 1997).
A atuação da vigilância por ramo de
Complementarmente, a abordagem atividade econômica segue a lógica
de riscos à saúde permite o contro- da organização dos trabalhadores,
le de acidentes (agentes químicos, o que viabiliza a participação sin-
físicos e biológicos) causadores de dical nas ações de vigilância. Essa
agravos à saúde dos trabalhadores. abordagem tem como característica
Para isso, prevê a identificação de mais marcante um potencial de in-
indicadores que possibilitem o acom- tervenção sistêmica e participativa,
panhamento permanente dos riscos. levando à eficácia da prevenção.
Essa estratégia tem como desvanta- Machado (1997) ainda propõe
gem a redução do contexto de riscos uma abordagem por pontos cruza-
a uma cadeia de eventos preestabe- dos – agravos, riscos, território e
lecidos. Desse modo, as possíveis atividade –, entendendo que uma
interações com outros riscos e os atividade pode estar associada a
contornos sociais da exposição só vários tipos de danos, ou, ao con-
16 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

trário, distintas atividades podem no. Demonstra também consonância


produzir o mesmo agravo. com a proposta de regionalização
contida na Norma Operacional da
Por sua vez, trabalhadores realizan-
Assistência à Saúde (Noas), adotada
do procedimentos distintos podem
pelo Ministério da Saúde em 2001,
vivenciar o mesmo tipo de exposição,
que representa uma oportunidade
e grupos, realizando o mesmo proce-
de se avançar na construção de sis-
dimento, podem estar expostos a si-
temas microrregionais que garantam
tuações nocivas de natureza diversa.
a integralidade da atenção à saúde
Na perspectiva da visualização da re-
(Teixeira, 2002).
lação entre o processo de trabalho e a
saúde dos trabalhadores, o território
permite identificar as dimensões das A abordagem por pontos cru-
vulnerabilidades, dos riscos e das zados entre os riscos, agravos
exposições e desse modo reconhecer e atividade, representa uma
as singularidades e multiplicidades possibilidade de estabelecer
das atividades e tarefas. ações de vigilância mais inte-
gradas, que levem em consi-
A abordagem por pontos cruzados deração as necessidades de
entre os riscos, agravos e atividade saúde de um dado território.

representa uma possibilidade de


estabelecer ações de vigilância mais Esse processo de regionalização
integradas, que levem em considera- influenciou a criação de Centros
ção as necessidades de saúde de um Regionais de Saúde do Trabalhador
dado território. Dessa forma, prio- (CRSTs), serviços específicos e espe-
ridades podem ser constituídas de cializados, de nível secundário, que
acordo com a realidade do locus em buscam incorporar maior densidade
questão, estando assim em conso- tecnológica, de apoio diagnóstico
nância com a Norma Operacional de e de vigilância, em seu quadro de
Saúde do Trabalhador n. 3.908/98 profissionais (Lacaz, 1996). Esses
(Nost) que tem como pressuposto, serviços foram criados inicialmente
entre outros, a regionalização. Essa em importantes municípios do país,
proposta pode contribuir para uma como São Paulo, Campinas, San-
participação mais efetiva dos traba- tos, Porto Alegre, Belo Horizonte
lhadores pela maior probabilidade e Volta Redonda (Lacaz, Machado
de reconhecimento das questões & Porto, 2002; Minayo-Gomez &
sanitárias envolvidas em seu cotidia- Lacaz, 2005).
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
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No ano de 2002, o Ministério da aos Cerests e à rede assistencial de


Saúde, a partir da Secretaria de média e alta complexidade (Brasil,
Assistência à Saúde, cria a Renast 2002). Destaca-se a necessidade de
por meio da portaria n. 1.679/GM construir “um corpo técnico capaz
de 2002 (Brasil, 2002), considerada de formular e apoiar a efetivação de
principal estratégia do SUS para ações programáticas para consolidar o
a promoção da atenção integral à campo de saúde do trabalhador,” além
saúde dos trabalhadores. Em 2005, da necessidade de promover uma efe-
esta portaria é revisada por meio da tiva articulação transetorial (Minayo-
portaria n. 2.437/GM, que dispõe Gomez & Lacaz, 2005: 798).
sobre a ampliação e o fortalecimen-
Nesse sentido, Minayo-Gomez & La-
to da Renast no SUS (Brasil, 2005).
caz (2005) acenam para a ausência
As principais medidas estabelecidas
efetiva de uma Política Nacional,
por essa portaria foram a criação e a
com princípios norteadores, dire-
expansão dos Centros de Referência
trizes, estratégias e metas capazes
em Saúde do Trabalhador, que pas-
de garantir a efetividade das ações
saram a ser conhecidos pela sigla
para prevenir e promover a saúde
Cerests (Santos & Lacaz, 2011). Ape-
dos trabalhadores.
sar dessas mudanças, os Cerests, na
prática, vêm funcionando como porta A PNST visa à redução dos aciden-
de entrada, e as suas ações carecem tes e das doenças relacionadas ao
de articulação intra e intersetorial trabalho, mediante a execução de
(Machado, 2011). É preciso encarar o ações de promoção, reabilitação e
desafio da intrasetorialidade, redefi- vigilância na área de saúde. Suas
nindo a porta de entrada por meio da diretrizes, descritas na portaria n.
articulação com a Atenção Primária à 1.125, 2 compreendem a atenção
Saúde (APS), em especial a Estraté- integral à saúde, a articulação intra
gia de Saúde da Família (ESF), cujas e intersetorial, a estruturação da
ações se organizam com referência rede de informações em saúde do
em uma base territorial e em critérios trabalhador, o apoio a estudos e
epidemiológicos, priorizando os pro- pesquisas, a capacitação de recursos
blemas mais comuns em uma dada humanos e a participação da comu-
comunidade e visando a maximizar nidade na gestão dessas ações.
2
a saúde e o bem-estar das pessoas Disponível em: <http://
dtr2001.saude.gov.br/sas/
(Dias et al., 2010). A partir da APS se Com vistas a superar a lacuna
PORTARIAS/Port2005/GM/
organizariam os encaminhamentos anteriormente apontada é que se GM-1125.htm>.
18 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

vem construindo a reformulação Uma importante medida, seguindo


da PNST. Esta política, que tem esse mesmo rumo, voltada a promo-
abrangência e define diretrizes, res- ver melhorias do trabalho no setor
ponsabilidades institucionais e me- saúde, adotada pelo Ministério da
canismos de financiamento, gestão, Saúde em maio de 2011, foi a as-
acompanhamento e controle social, sinatura das Diretrizes da Política
tem o objetivo de propiciar Nacional de Promoção da Saúde do
Trabalhador do SUS – Protocolo da
“promoção da saúde e a melhoria
da qualidade de vida do trabalha- Mesa de Negociação Permanente
dor e a prevenção de acidentes do Sistema Único de Saúde – SUS
e de danos à saúde advindos,
relacionados ao trabalho ou que n. 08/2011. Esta política tem como
ocorram no curso dele, por meio objetivo promover a melhoria das
de eliminação ou redução dos
riscos nos ambientes de trabalho”
condições de saúde do trabalhador
(Brasil, 2011). do setor de saúde, por meio do
controle dos fatores de risco e da
A Política Nacional de Promoção da
facilitação do acesso, por parte des-
Saúde (PNPS), instituída em 2006,
ses trabalhadores, aos serviços de
também caminha na direção da asse-
atenção integral à saúde.
gurar o acesso universal e igualitário
dos cidadãos aos serviços de saúde, Considera-se também relevante a
bem como à formulação de políticas Política Nacional de Humanização
sociais e econômicas que operem na (PNH), voltada à produção da saú-
redução dos riscos de adoecer: de, que, a partir de 2004, preconiza
a construção de redes cooperativas,
A promoção da saúde é uma
estratégia de articulação transver- estimulando o protagonismo e a
sal, na qual se confere visibilidade autonomia de sujeitos e coletivos
às situações de risco, aos diferen-
tes grupos sociais e às diferenças e sua corresponsabilidade nos pro-
entre necessidades, territórios cessos de gestão e atenção (Brasil/
e culturas presentes em nosso
país, com objetivo de estabelecer
MS, 2004).
mecanismos para reduzir as situ-
ações de vulnerabilidade, que de- Ressalta-se a necessidade de mu-
fendam a equidade e incorporem danças no modelo de gestão e
a participação e o controle sociais
na gestão das políticas públicas. atenção à saúde que valorizem o
(Brasil/MS, 2010: 12) protagonismo dos trabalhadores da
saúde, importante para que o direito
constitucional à saúde para todos
seja garantido e urgente porque tal
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
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debate é uma condição para viabi- saúde, de forma, que os profissio-


lizar uma saúde digna para todos nais efetuem seu trabalho de modo
(Brasil/MS, 2004). digno, com capacidade de criar
novas ações e de poder participar
Dessa forma, considera-se que hu-
como cogestores de seu processo de
manizar é ofertar atendimento de
trabalho. Humanizar a atenção em
qualidade articulando os avanços
saúde contribui para a qualificação
tecnológicos com acolhimento,
da atenção e da gestão: é prover uma
melhoria dos ambientes de cuidado
atenção integral, equânime, com
e das condições de trabalho dos
responsabilização e vínculo, para a
profissionais, ou seja, é a tarefa da
valorização dos trabalhadores e para
produção de saúde e da produção de
o avanço da democratização da ges-
sujeitos (Brasil/MS, 2004).
tão e do controle social participativo
A humanização estabelece-se, (Brasil/MS, 2004).
portanto, como a construção/
ativação de atitudes ético-estéti- A preocupação com a saúde dos
co-políticas em sintonia com um
projeto de corresponsabilidade e trabalhadores se amplia e, em 2010,
qualificação dos vínculos inter- por meio da portaria normativa
profissionais e entre estes e os
usuários na produção de saúde.
n. 3 (Brasil, 2010) foram estabele-
Éticas porque tomam a defesa cidas as orientações básicas sobre
da vida como eixo de suas ações.
a Noss com o objetivo de definir as
Estéticas porque estão voltadas
para a invenção das normas que diretrizes gerais para implemen-
regulam a vida, para os processos tação das ações de vigilância nos
de criação que constituem o mais
específico do homem em relação ambientes e processo de trabalho e
aos demais seres vivos. Políticas promoção à saúde do servidor. Entre
porque é na pólis, na relação
tais diretrizes, temos: participação
entre os homens, que as relações
sociais e de poder se operam, dos servidores em todas as etapas
que o mundo se faz. (Brasil/MS, do processo de atenção à saúde;
2004: 8)
cogestão pelo compartilhamento do
Adotar a PNH como uma política poder entre os diferentes atores so-
transversal – entendida como um ciais que participam e/ou integram
conjunto de princípios e diretrizes o processo; formação e capacitação,
que se traduzem em ações nos diver- mantendo uma política de formação
sos serviços, nas práticas de saúde permanente e capacitação nas áreas
e nas instâncias do sistema, carac- de vigilância e promoção à saúde
terizando uma construção coletiva do servidor; acesso à informação,
– é imperativo para a produção da sobretudo aquelas referentes aos
20 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

riscos e aos resultados de pesquisas relacionados à saúde no trabalho


a respeito da saúde. A portaria n. 3 (Andrade, 2009).
propõe ainda como diretrizes a inte-
Nos últimos sete anos, esforços vêm
gralidade das ações; a regionalização
sendo empreendidos no sentido re-
e a descentralização; a transversali-
solver antigas questões relacionadas
dade; a intra e a intersetorialidade;
à saúde e à segurança no trabalho
o embasamento epidemiológico; a
no serviço público. Assim, em 2003,
transdisciplinaridade; e a pesquisa-
foi criada a Coordenação-Geral de
intervenção como metodologia que
Seguridade Social e Benefícios do
permite a integração do saber cien-
Servidor e, em 2006, o Sistema In-
tífico com o saber prático.
tegrado de Saúde Ocupacional do
A Noss integra a Política de Atenção Servidor Público Federal (Sisosp)
à Saúde e Segurança do Trabalho (Brasil, 2010). Mas foi a partir do
do Servidor nos aspectos referentes ano de 2007 que se estabeleceu
à vigilância e à promoção da saúde, o compromisso de construir e de
sustentando-se na interrelação entre implantar, de forma compartilhada,
os eixos de vigilância e promoção, uma Política de Atenção à Saúde e
perícia médica e assistência à saúde Segurança do Trabalho do Servidor
do Subsistema Integrado de Atenção Público Federal (Pass), sustentada
à Saúde do Servidor (Siass) e no por um sistema de informação em
trabalho em equipe multiprofissio- saúde do servidor, uma sólida base
nal com abordagem transdisciplinar legal, uma rede de unidades e servi-
(Brasil, 2010). ços e recursos financeiros específicos
para a implementação de ações e
A saúde e a segurança do trabalho
projetos. Esse movimento resultou
do servidor público federal represen-
na criação, por meio do decreto
tam demandas a mais por políticas
n. 6.833, do Siass, no ano de 2009,
em função das particularidades
através da reformulação do Sisosp
desse grupo. Ao longo da história
(Brasil, 2010).
da administração pública, observa-
se que sua conduta se restringia a Os avanços foram consequência de
normas de aposentadoria, remune- um processo de decisão coletiva, e
ração de licenças para tratamento de a mudança da sigla buscou desta-
saúde e instituição de adicional de car o caráter de atenção integral
salubridade e periculosidade, no que à saúde do trabalhador. Desde
se refere aos direitos dos servidores então, o principal desafio tem sido
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
21

implementar uma política de aten- Entretanto, apesar de ser um avan-


ção à saúde baseada na equidade ço na perspectiva da saúde do
e na universalidade de direitos e trabalhador, o Siass ainda não foi
benefícios, na uniformização de incorporado integralmente pelos
procedimentos, na otimização de gestores institucionais e também
recursos e na implementação de pelo corpo funcional, o que con-
medidas que produzam melhorias tribui para não inclusão dessa
na saúde dos servidores públicos temática na agenda de prioridades
federais (Brasil, 2010). gerenciais (Andrade, 2009).

Na perspectiva de viabilizar possibi- Por sua vez, os trabalhadores,


lidades e de dimensionar as questões cujos contratos de trabalho são
relacionadas à saúde dos servidores regidos pela CLT, têm como marco
públicos, está em desenvolvimento e regulatório de suas relações, no
em uso parcial um sistema de infor- campo da segurança e medicina do
mação com o objetivo de consolidar trabalho, as normas regulamenta-
os registros sobre a saúde desses doras (NRs) criadas pela portaria
trabalhadores, para que se possa n. 3.214 do Ministério de Trabalho
ter as informações com estrutura de em 1978, inicialmente com 28 NRs
análise da visão epidemiológica, a fim (Brasil, 1978).
de produzir informação para ação. O
A NR 32 (Brasil, 2005), criada no
sistema representa uma ferramenta
final da década de 1990, tem por
adequada para estruturar um pro-
finalidade estabelecer as diretrizes
grama de capacitação e educação
básicas para a implementação de
continuada para os atores relaciona-
medidas de proteção à segurança e à
dos à atenção a saúde dos servidores
saúde dos trabalhadores dos serviços
(Andrade, 2009). Trata-se, portanto,
de saúde, bem como daqueles que
da construção e da consolidação de
exercem atividades de promoção e
uma política transversal de gestão de
assistência à saúde em geral. Para
pessoas, a ser sustentada a partir da
fins de aplicação desta NR, entende-
vigilância, promoção à saúde, assis-
se por serviços de saúde qualquer
tência à saúde do servidor e perícia
edificação destinada à prestação de
em saúde e fundamentada na aborda-
assistência à saúde da população,
gem biopsicossocial, em informação
e todas as ações de promoção, re-
epidemiológica, no trabalho interdis-
cuperação, assistência, pesquisa e
ciplinar e na avaliação dos locais de
ensino em saúde em qualquer nível
trabalho (Brasil/MS, 2010).
22 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

de complexidade. Ao incorporar o Programa de Controle Médico de


conceito de edificação, todos os tra- Saúde Ocupacional (PCMSO).
balhadores que exercem atividades
Considera-se, para fins de aplicação
nestas edificações, relacionadas ou
desta NR, como risco biológico, a
não com a promoção e a assistência
probabilidade da exposição ocupa-
à saúde, são abrangidos pela norma.
cional a agentes biológicos, ou seja,
Por exemplo, atividades de limpeza,
a micro-organismos, geneticamente
lavanderia, reforma e manutenção.
modificados ou não; às culturas de
Esta norma tem por objetivo prevenir células; aos parasitas; às toxinas e aos
os acidentes e o adoecimento causa- príons. Como risco químico, agentes
do pelo trabalho nos profissionais da químicos, substâncias, compostos ou
saúde. Assim, recomenda, para cada produtos químicos em suas diversas
situação de risco, a adoção de medi- formas de apresentação – líquida,
das preventivas e a capacitação dos sólida, plasma, vapor, poeira, névoa,
trabalhadores. Abrange as situações neblina, gasosa e fumo.
de exposição aos diversos agentes
presentes no ambiente de trabalho,
como os agentes de risco biológico;
A NR 32 abrange ainda a
agentes de risco químico; agentes
obrigatoriedade da vacinação
de risco físico, com destaque para a todo trabalhador dos ser-
as radiações ionizantes. Trata ainda viços de saúde, que deverá
dos resíduos (descarte), lavanderia, ser fornecida gratuitamente,
limpeza, conservação do ambiente contra tétano, difteria, hepatite
e capacitação profissional. Também B e as demais vacinas especi -
cadas no Programa de Controle
cuida de orientar os profissionais
Médico de Saúde Ocupacional
sobre os riscos diários e a prevenção
(PCMSO).
de acidentes, através da capacitação
inicial, contínua e em face de mu-
dança do local de trabalho.
No caso do gerenciamento de resídu-
A NR 32 abrange ainda a obrigato- os, a NR 32 dedicou especial atenção
riedade da vacinação a todo traba- ao seu tratamento, por suas implica-
lhador dos serviços de saúde, que ções na biossegurança pessoal e no
deverá ser fornecida gratuitamente, meio ambiente. Importante ressaltar
contra tétano, difteria, hepatite B e que a NR não desobriga o cumpri-
as demais vacinas especificadas no mento da Resolução Anvisa RDC
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
23

n. 306, de 7 de dezembro de 2004, e Esta portaria aprova ainda o Anexo


da Resolução Conama n. 358, de 29 III da NR 32, Plano de Prevenção de
de abril de 2005, que dispõem sobre Riscos de Acidentes com Materiais
o Plano de Gerenciamento de Resí- Perfurocortantes, e ao empregador
duos de Serviços de Saúde (PGRSS) confere a responsabilidade de ela-
e sobre a necessidade da designação borar e implantar este plano. Dessa
de profissional, com registro ativo forma, visa à proteção, segurança e
junto ao seu conselho de classe, saúde dos trabalhadores dos serviços
com apresentação de Anotação de de saúde, bem como daqueles que
Responsabilidade Técnica (ART), exercem atividades de promoção e
Certificado de Responsabilidade assistência à saúde em geral. Para
Técnica ou documento similar, quan- isso, o empregador deve constituir
do couber, para exercer a função de uma comissão gestora multidisci-
responsável pela elaboração e pela plinar responsável por elaborar,
implantação do PGRSS. implementar e atualizar o plano de
prevenção de riscos com materiais
Recentemente, o Ministério do Traba-
perfurocoratntes. A esta comissão
lho e do Emprego publicou a portaria n.
cabe ainda analisar as informações
1.748, de 30 de agosto de 2011 (Brasil,
existentes no Plano de Prevenção
2011). De acordo com essa portaria, o
de Riscos Ambientais (PPRA) e no
subitem 32.2.4.16 da NR 32 passa a
PCMSO, além das referentes aos
vigorar com a seguinte redação:
acidentes ocorridos com materiais
32.2.4.16. O empregador deve perfurocortantes, bem como esta-
elaborar e implementar Plano de
belecer prioridades em relação à
Prevenção de Riscos de Acidentes
com Materiais Perfurocortantes, adoção de medidas de controle para
conforme as diretrizes estabele- a prevenção de acidentes com ma-
cidas no Anexo III desta Norma
Regulamentadora. teriais perfurocortantes, à seleção
de materiais perfurocortantes com
32.2.4.16.1. As empresas que
produzem ou comercializam dispositivo de segurança e à capaci-
materiais perfurocortantes devem tação dos trabalhadores.
disponibilizar, para os trabalha-
dores dos serviços de saúde, capa-
citação sobre a correta utilização
do dispositivo de segurança.

32.2.4.16.2. O empregador deve


assegurar, aos trabalhadores dos
serviços de saúde, a capacitação
prevista no subitem 32.2.4.16.1.
24 Vigilância em saúde do trabalhador da saúde

3. IDENTIFICANDO OS DESAFIOS

Apesar de todo esse arcabouço regula- de articulação intra e interinstitu-


tório, existe um profundo desconheci- cional, de ações interdisciplinares
mento do dimensionamento do impacto e transversais, de participação dos
do trabalho na saúde dos trabalhadores. trabalhadores, de um sistema de in-
Podemos considerar a ponta desse formação capaz de nortear as ações
iceberg os dados do Ministério da Previ- de vigilância e de uma consolidação
dência e Assistência Social, que, no ano institucional, com um concomitante
de 2010, divulgaram a ocorrência de aprofundamento das ações com base
701.496 acidentes de trabalho em tra- em problemas originados das reais
balhadores vinculados ao seu sistema, o condições de trabalho (Machado,
que representa uma base populacional 2011; Santos & Lacaz, 2011).
de cerca de 28 milhões de trabalhadores
(Brasil/MPAS, 2011).
Apesar dos avanços signi cati-
Essa situação indica a necessidade vos tanto no campo conceitual
de investimentos em capacitação quanto na ampliação de recursos
de recursos humanos, articulação e legais na saúde do trabalhador, a
harmonização das bases de dados vigilância em saúde do trabalha-
dor da saúde necessita de arti-
de interesse à saúde do trabalhador,
culação intra e interinstitucional,
implantação de infraestrutura de in-
de ações interdisciplinares e
formática nos níveis locais e de coleta transversais, de participação dos
das informações na rede de serviços do trabalhadores, de um sistema
SUS e integração e articulação intermi- de informação capaz de nortear
nisterial (Facchini et al., 2005). Reflete as ações de vigilância e de uma
ainda a fragilidade da aplicação da le- consolidação institucional.

gislação e de regulação das condições


relativas à saúde dos trabalhadores.
Nos capítulos a seguir serão apresenta-
Diante desse quadro, destacamos dos o arcabouço teórico, as abordagens
que apesar dos avanços significativos metodológicas e os efeitos estudados
tanto no campo conceitual quanto na no setor saúde. No capítulo 5 é desen-
ampliação de recursos legais na saúde volvida uma proposta de organização
do trabalhador, a vigilância em saúde das ações de Visat, que se fundamenta
do trabalhador da saúde necessita nos elementos citados anteriormente.
Panorama da Saúde dos Trabalhadores da Saúde
25

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