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Etno poesia da escravidão

Estamos em pleno mar


Eu amante sobre a cama
A escuridão, a boca preta
Eu mamando em sua teta
Como… como… esta morena
Mulata… negra é escrava
Do sexo qual eu sou dono
É ela a minha senhoria
Dela sou cão ou cavalheiro
No tronco ou na alforria
Os grilhões nos prendem sobre o leito
E quando o calor do corpo
Do corpo esquentar-me inteiro
Adentrarei até o infinito
Para gritar, liberdade!
Sobre ela o meu corpo aflito
E ela a segurar-me a vara
E se açoitar em seu castigo
Inhozinha de fome no umbigo
No umbigo a fome da barriga
E quebrar o cetro do papa
Que quiser nos tirar o jugo
Dos desejos da fome este amor
Do qual o mundo inteiro nos é senhor…
XXX

Sair pelas praças vou


Procurar onde está o feitor
E desfazer todos quilombos
No desejo de se sentir escravo
Onde andam… oh inhozinhas!
Donas de mim… dos meus carinhos…
Correram o mundo em quais caminhos…

Quais partes do meu corpo


Querem castigar a todo tempo
Por me ver nu despido
No casarão e na lavoura
Ou preso à sua cama
Por todos anseios e sonhos
Ver crescer seus seios e assanhos…

Do ventre não sou livre


Desde minha pobre geração
Das mulheres sou cativo
Pequenas, grandes ou velhas
Nos céus ou no inferno
E dos grilhões ser abençoado
Bênção de deus: o ser agriçoado
(afeiçoado)
(agrilhoado)
XXX

Senhora minha
Sou escravo de suas mãos
De seus beijos, olhares
E te perseguir nos lugares
Onde frequentas, onde vives
Suas roupas e lembranças
Deitado em minha cama
Dormir todos os dias
Sentindo a pele sua
De tão longe acorrentado
Ao sentir do leito quente
Em suores noturno na mente
Em loucuras diurna tórridas
Nós nos atamos à vida
Nossas vidas amarradas
Uma nau que afunda e fraga
No fundo do oceano imenso
E não ter vergonha moral
Não ter certo ou errado
Pois lá no fundo do mar
A âncora jamais usada
Estar preso a ti oh flor!
Como amante, esposa, namorada…
XXX

Estou livre nos céus


É para mim a morte voando
Como posso libertar-me
Entre as nuvens e cúmulos
Até estes nos céus agarram
Por terra escorrem, precipitam
Em gotas de uma emoção
De ser seu escravo e ter o chão…
Lugar vasto é o ar
Onde os pássaros amam
Os finitos… terra e vento se beijam
Escravos do azul horizonte
E nos verdes por trás dos montes
O aeroporto aguarda lento
Girando como o firmamento…
Escravizado no sistema solar
Gira a lua em volta da terra
A terra ao sol cativa erra
Como puderam me libertar
Donzela, olhes para mim de novo
Como um trem sempre vago
Preso aos trilhos do amor
Se ainda queres ser minha
Serás então a rainha
E eu seu eterno senhor
XXX

A mulher queres a separação


Amada minha perdi-te
Quero morrer mil vezes
Matar-me aos poucos
O suicídio meu caminho…
Nos braços da morte
Receber os seus carinhos
Sou escravo deste seu zelo
Quebre o cetro do papa
Dele se faça um cercado
Que até jesus amado
Por amor foi escravizado
Deu por ele sua vida
Nos seus braços querida
Aguardo seus anelos
Ou serás como judith
Matar-me a traição no leito
Tal coisa que eu aceito
Pois morrer sorrindo feliz
De poder ao menos lha ter
E no derradeiro momento lha ver
Quando a morte me trás o cálix
O orgasmo ainda chegando
Seus olhos negros fitando
Minha face de eterno gozo
Desfaleço e a imagem levo
Cineasta da alma gravo
Do meu viver o último adeus…
XXX

Stamos em pleno mar


Quero ser cativo teu
Estou preso ao luar
E desaguar em prantos
Em seus caminhos lentos
E nos porões já presos
São negros, brancos, amarelos
Sedentos, famintos de anelos
São crianças, são adultos
Analfabetos… homens cultos…
Nos ventos dos oceanos vão
Divagando na sandice da paixão

Oh criaturas! Oh criador!
Porque nos colocastes senhor!…
Famélicos retirados no oceano!…
Em tanto verde e desumano!…
Por essa nau ser dominado
Do lar retirado arrancado
Agradecemos aqui a tudo
Em silêncio escravo e mudo
Essa inseparável nossa senhoria
Senhora na noite e no dia…
E lá de cima o condor
A voar nos céus do amor
Escravo de seu próprio ninho
Com a fêmea pequenino passarinho
E saber que de voo tão alto…
Quebrar do papa o cetro falto
Como quem assina sua lei
Nos tempos inteiros escravo sei
Que enquanto aqui houver vida
O viver há de escravizar nossa partida…
XXX

Estava eu em vida simples


Solto pelas ruas e estradas
Quando arrebatado pelo laço
Fui arrastado paço a paço
De mãos amarradas e erguidas
Puxado escravo pela vida
Com a corda atado ao braço
No peito o grilhão amor tão moço
Sem saber de ti… mulher, senhoria…
Que domina… escravagista desumana
Em qualquer peito o sentimento vão
E eu vítima de nossa própria escravidão
E lutarei dos meus dias até o fim
E matarei quem quiser separar de mim
Este jugo ao qual me acho preso
Cativo nas senzalas da paixão
Tendo o amor como corrente… ouvirão…
O cárdio órgão bater ensandecido
Para ir ao tronco e muito ser punido
Com os açoites de seus carinhos lentos
Dona de mim… e todos pensamentos
E vender ao diabo até minh’alma
Alma divina nos céus estar em calma…
XXX

Eu sou escravo
Em meu amargo doentio
Escravo da doença
Do bironismo tardio
Mulher loira louca
Mulher morena arrependida
Qual das duas dei a vida
Ainda escravo dos seus andares
Escravo dos seus amores
E escravo de seus lares
Etno poema

O azul e a cor neutra


Toda pele é azul no planeta
Azul o alemão…
Azul o judeu…
Azul o muçulmano…
Azul o americano…
Chinês é azul…
Azul é todo russo…
E é tão negro que chega a ser azul…
O ódio me encobre com o amor…
Está tudo azul…
Toda natureza pulsa…
E a atmosfera é azul…
Homens e mulheres são azuis!
As crianças são as mais azuis!
E todo mundo tem olho branco
Todos seres são azuis
Anjos são azuis
E a luz azulada de deus
Nos ilumine…

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