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Saberes escolares

Cultura

Organização:
Profª. Janeslei Aparecida Albuquerque
Mestre em Educação - UFPR
Secretaria Educacional da APP-Sindicato
 Necessidade de romper com a visão dominante de que
o significado dos termos é imutável e aistórico:as
palavras são historicamente construídas.
 A primazia de um termo sobre outro é resultado da
prevalência d uma ideologia em relação a outra.
 Muito da mudança qualitativa das sociedades dos países
centrais que entravam com todo dinamismo na era dos
meios de comunicação de massa aparecia registrado nas
modulações do sentido da palavra “cultura”. No âmbito
da universidade britânica era uma expressão reservada.
 O ideário do mais importante de seus professores,
F.R.LEAVIS, atualiza para os dias de hoje os
parâmetros que definem a longa tradição idealista da
crítica: Desse ponto de vista, “cultura” é uma esfera
autônoma, o âmbito da doçura e da luz, dos bens
espirituais a salvo dos interesses das relações entre
pessoas.
 É ainda, segundo essa concepção: o espaço de
atuação de uma minoria, capaz de compreender e
promulgar os mais altos valores da humanidade,
enfeixados nas obras dos grandes autores.
 R.WILLIAMS:percebe o elitismo, o conservadorismo
e a enorme dose de ilusão que fundamentam a
prática dessa tradição, que:
 Desconsidera as relações que constituem a cultura e
a sociedade;
 Vê o rico processo de criação e circulação de
significados e valores específicos de uma formação
social como procedimento estático de mera
confirmação de valores, tão vagos quanto a
expressão “humanidade” pode ter em uma sociedade
tão dividida.
Essa divisão :
Considera que somente uma minoria tem a
possibilidade de apreciação da arte;
Essa minoria tem, desse ponto de vista, a missão de

julgar quais obras efetivamente encerram os ditos


valores humanos e perpetuá-las.
Com esses movimentos, a tradição:

Situa a cultura num plano elevado, porém inócuo, dos

ideais dissociados da prática real;


Condena a cultura a um papel secundário,

de adorno do espírito, desprezando seu potencial como


instrumento de conhecimento e de intervenção na
realidade.
Isso tinha o propósito de resistir è civilização de
massa, à avalanche da indústria cultural que, com o
jornal, o rádio e o cinema, e pela expansão desses
meios, mensagens, imagens e espetáculo passam a
permear todas as esferas da vida social.
Transformam a palavra “cultura” na designação de algo
“abstrato e absoluto”, uma maneira de avaliar de cima
o modo de vida da sociedade sem se imiscuir na disputa
real de interesses e valores.
R. WILLIAMS: aborda o termo desde uma perspectiva

histórica:
Demonstra que o desenvolvimento de um tipo de

pensamento, se forma e varia com um claro


propósito social.
A tradição idealista afirma que a cultura seria
uma esfera diáfana do bem-estar espiritual,
desvinculada do interesse e, crucialmente, da
luta de classes.
WILLIAMS demonstra que:

Essa concepção é funcional para o tipo de


sociedade que está se tornando hegemônica
(1950)

Esta hegemonia se consolida nos anos 90 com a


vitória do pensamento e das políticas
neoliberais no campo da economia, da produção
industrial, da cultura e da arte, da educação
(PCNs, Faxinal e suas imersões) e o espantoso
avanço e legitimação da violência como forma
de solução dos conflitos gerados pelo
capitalismo neoliberal..
Numa visão idealista: trata-se de instituir a
cultura como um modo de criticar a vida
social do ponto de vista de uma proclamada
neutralidade:
A cultura seria a esfera do valor humano,

portanto de todos, embora a vida real seja


feita de desigualdade e dominação.
Para os que estão interessados em mudar:

“A conceituação de uma idéia de cultura é

um gesto lento de reapropriação e de


controle”.
WILLIAMS entendeu que a cultura é
fundamental ao funcionamento e à manutenção
do sistema.
“Pudemos então afirmar que a dominação essencial de
determinada classe na sociedade mantém-se não
somente, ainda que certamente se for necessário, pelo
poder, e não apenas, ainda que sempre, pela
propriedade. Ela se mantém, inevitavelmente, pela
cultura do vivido: aquela saturação do hábito, da
experiência, dos modos de ver, que é continuamente
renovada em todas as etapas da vida, desde a infância,
sob pressões definidas e no interior de significados
definidos, de tal forma que o que as pessoas vêm a
pensar e a sentir é, em larga medida, uma reprodução
de uma ordem social profundamente arraigada à qual as
pessoas podem até pensar que de algum modo se opõem,
e a que muitas vezes se opõem de fato”.

(WILLIAMS, 2007, p.13-14)


Essa percepção demanda uma forma diferente de
fazer crítica cultural, de fazer política e de fazer
educação. Deve, necessariamente ser uma forma que
leve em conta a função social da cultura elevada a
sua mais alta potência histórica na era dos meios de
comunicação de massa.
O que vale considerar o que deve ser a crítica
militante em nossos dias:
“(..)Acredito que o sistema de significados e valores

que a sociedade capitalista gera tem de ser


derrotado no geral e no detalhe por meio de um
trabalho intelectual e educacional contínuo. Esse é
um processo cultural a que denominei a revolução
longa e, ao fazê-lo, eu queria assinalar que era uma
luta genuína, parte das batalhas necessárias da
democracia e da vitória econômica da classe
trabalhadora organizada(...)”.
“(...) a tarefa de um movimento socialista vitorioso
envolverá a imaginação e o sentimento, tanto quanto
fatos e organização. Imaginação e sentimentos não
no sentido fraco – “imaginar o futuro” (o que é uma
perda de tempo) ou o “lado emocional das coisas”.
Ao contrário, temos de aprender e ensinar uns aos
outros as conexões que existem entre formação
política e econômica e, talvez o mais difícil,
formação educacional e formação de sentimentos e
de relações, que são os nossos recursos mais
imediatos em qualquer forma de luta”.
(p. 15)
WILLIAMS demonstra o potencial cognitivo da crítica
cultural. Parte do princípio de que formações sociais
e formas culturais são interconstitutivas, são
expressões diferentes da mesma maneira
historicamente específica de fazer sentido da
experiência do vivido,
Ele pratica a análise dessas formas como um instrumento
de descrição e de interpretação da sociedade que as molda.

Numa sociedade baseada na dominação o conflito é


permanente.

Essas formas, portanto, só podem apresentar (...) as


contradições que estruturam esse modo de vida. Essa
descrição apoiada na forma dos produtos culturais revela
aspectos que as formações sociais mascaram.

Ao compreender isso, entendemos porque os estudos do


currículo, como expressão da cultura, este não é um campo
neutro, nem desinteressado. É um campo minado pelas
disputas de poder: o poder de selecionar os saberes a
serem ensinados – e aprendidos – na escola, como o saber
legitimado.
AS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO
CURRÍCULO E O
MULTICULTURALISMO

Saberes escolares e cultura

Organização:
Profª. Ms.Janeslei Aparecida Albuquerque
Secretaria Educacional da APP-Sindicato
Pensar a pluralidade cultural, racismo e educação,
relações de gênero e educação, exige que
busquemos refletir: sobre o caminho que estes
temas percorreram até se tornarem objeto de
estudo dos teóricos da educação, refletir sobre
como as questões relativas à cultura num país
multirracial passa a fazer parte das teorias do
currículo. Conforme Tomaz Tadeu da Silva,
“todas as teorias pedagógicas e educacionais, são
também teorias sobre o currículo”.
Pensar sobre quais são as teorias pedagógicas que se
preocupam com esta temática desde uma perspectiva
crítica, de transformação.

As primeiras discussões sobre currículo são dos anos


vinte do século passado nos Estados Unidos. Neste
momento o currículo é tomado como um processo de
“racionalização de resultados educacionais, cuidadosa
e rigorosamente especificados e medidos”. O modelo
inspirador desse modelo de currículo é a fábrica.
Teoricamente se espelha na “administração científica”
do taylorismo que se inicia.
No livro The Curriculum (1918), de
Bobbit, se constitui um discurso onde se
a idéia de currículo é apresentada como
“a especificação precisa de objetivos,
procedimentos e métodos para a
obtenção de resultados que possam ser
precisamente mensurados”.
Portanto, em Bobbit, não há dúvidas
sobre “o quê” deve ser ensinado, o
conteúdo é algo que está dado pelo
saber legitimado.
Legitimado por quem? Para quem?
O que subjaz a qualquer teoria do currículo é a questão de
qual conhecimento deve ser ensinado. Ou seja, “o quê”
ensinar. Tendo decidido isto, as teorias tradicionais tratam
de justificar por que esses conhecimentos e nem consideram
outros. A decisão que atravessa a seleção curricular é
precedida da reflexão de qual pessoa queremos formar, o
que nossas crianças e jovens devem se tornar.
Quais são os tipos de homens e mulheres ideais para a
sociedade que se pretende ter?
Solidárias? Competitivas? Fraternas? Desconfiadas?
Pacifistas? Belicistas? Conservadora? Revolucionárias?
Crítica? Adaptada? Transformadora? Conformada?
Etnocêntrica e racista? Ou multirracial e multicultural?
Responder a estas perguntas, definir estas questões é
parte da tarefa de definição dos currículos e das práticas
pedagógicas.
 Portanto, é em torno dessas questões que giram as
teorias pedagógicas, a partir dos objetivos que são
postos no caminho que a escola, a educação, as práticas
cotidianas da escola se organizam e definem parte
daquilo que nos tornamos. O Professor Tomaz Tadeu da
silva afirma que “além de uma questão de conhecimento,
o currículo é também uma questão de identidade. (...) E
da perspectiva pós-estruturalista, podemos dizer que o
currículo é também uma questão de poder. (...)
Selecionar é uma operação de poder. Privilegiar um tipo
de conhecimento é uma operação de poder. Destacar,
entre as múltiplas possibilidades, uma identidade ou
subjetividade como sendo a ideal é uma operação de
poder”.
 É justamente a questão do poder que separa as
teorias tradicionais das teorias críticas e pós-
críticas do currículo. As tradicionais se
pretendem teorias “neutras”, científicas,
desinteressadas, ou seja, apresentam-se como
um saber desvinculado das relações de poder e
coloca-se como o saber legítimo, universal, do
interesse de toda a humanidade indistintamente.
No contraponto a elas, estão as teorias críticas
e as teorias pós-críticas, que vão sustentar que
nenhum conhecimento é neutro, científico ou
desinteressado, mas que está, “inevitavelmente,
implicada em relações de poder”.
 Mais ou menos o que acontece na forma como a imprensa
conduz a discussão sobre as sementes transgênicas: não
se põe em discussão as relações de poder e os bilhões de
dólares que estão em jogo no monopólio das sementes e
no interesse econômico que marca profundamente esta
discussão. A questão da segurança alimentar e da
soberania na produção de alimentos, de comida para
garantir a sobrevivência da espécie humana no Brasil, é
tratada em termos de uma pretensa neutralidade
científica como se os cientistas não fossem eles também
influenciados pelos lobbies ao terem suas pesquisas
financiadas por estas empresas.
 No que se refere ao currículo e às teorias pedagógicas,
as teorias críticas vão afirmar que acontece processo
semelhante: ao definir para onde queremos ir, definimos
o caminho, definimos o currículo.
 Neste sentido, “as teorias tradicionais são teorias de
aceitação, ajuste e adaptação. As teorias críticas são
teorias de desconfiança, questionamento e transformação
radical.
 Para as teorias críticas, o importante não é desenvolver
técnicas de como fazer o currículo, mas desenvolver
conceitos que nos permitam compreender o que o
currículo faz”.
 No interior da cultura, que é o conteúdo básico da
educação, a escola faz uma seleção daquilo que considera
digno de memória, digno de ser transmitido às novas
gerações. Afinal, todo empreendimento educativo é a
responsabilidade de transmitir a experiência humana às
novas gerações.
 A cultura é o conteúdo da educação, sua fonte e sua
justificação, e currículo é a seleção realizada dentro
dessa cultura.
 As teorias críticas nos ensinam que a escola tem sido um
lugar de condicionamento e reprodução da cultura da classe
dominante, das elites, da burguesia.
 Luis Althusser analisa a escola como um Aparelho
Ideológico do Estado, ou seja, como instrumento
de reprodução da sociedade de classes e que
atua no sentido de sustentar a manutenção do
status quo sem criticar e sem ver a desigualdade
inerente à estrutura do capitalismo. Desde esse
ponto de vista, a escola faria enfatizar os
conteúdos escolares de maneira a nos levar a
aceitar as estruturas do capitalismo como coisas
boas e desejáveis.
 Bowles e Gintis vão destacar as relações sociais no
interior da escola como produtoras de atitudes que são
necessárias para se qualificar um bom trabalhador
capitalista. Aprendizados de obediência à ordens,
pontualidade, assiduidade, confiabilidade, subordinação –
quando se trata de uma educação para os/as
trabalhadores/as; capacidade de comando, iniciativa,
criatividade, liderança, autonomia, crítica – quando se
trata de uma educação para os que estão destinados a
ocupar os mais altos escalões do mundo do trabalho ou do
capital
Bourdieu e Passeron identificam no currículo escolar os
elementos simbólicos da classe dominante: sua linguagem,
valores, expressão de arte e cultura, sua identidade.
Crianças e jovens das camadas médias e altas mais
facilmente entendem estes códigos e respondem a eles,
uma vez que na sua formação familiar, pré-escolar, foram
introduzidas neste universo de símbolos e códigos que mais
facilmente identificam e dominam. As crianças das classes
populares têm sua cultura nativa desvalorizada, sua
linguagem desqualificada, sua origem diminuída. Um grupo
tem sua origem, seu capital cultural fortalecido e
reconhecido, outro sofre exatamente o contrário. Através
destas reproduções estrutura social e econômica das
sociedades capitalistas se mantêm, e as classes se
reproduzem garantindo o processo de reprodução social.
 Michael Apple em suas pesquisas, nos anos setenta, vai
também explicitar que “há uma clara conexão entre a
forma como a economia está organizada e a forma como
o currículo está organizado”. Mesmo assim, Apple
percebe que não é apenas isso. Não é assim,
mecanicamente que se dá esta relação, mas
dialeticamente. E vai buscar em A. GRAMSCI, o conceito
de hegemonia, que vai permitir que se veja o mundo
social como um campo contestado, de disputas de poder.
O que obriga os grupos dominantes a recorrerem a um
processo permanente de convencimento ideológico que os
leva a uma construção e reconstrução permanente do
consenso para manter sua dominação.
 E o campo cultural não é apenas o reflexo da economia,
ele tem sua própria dinâmica e atua no campo da
consciência dos indivíduos, e esta precisa ser conquistada
no seu próprio campo: o da cultura. Nesse sentido Apple
aponta que “a seleção que constitui o currículo é o
resultado de um processo que reflete os interesses
particulares das classes e grupos dominantes”. Isto
podemos ver no currículo oficial definido para o Paraná e
Curitiba. O recorte eurocêntrico que permeia o discurso
da História regional do Paraná e de Curitiba deixam à
mostra as preocupações raciais das elites brasileiras e do
movimento de eugenia nas decisões políticas dos governos
tanto em nível nacional como regional. Apple destaca que
temos “de um lado a produção, distribuição e consumo dos
recursos materiais, econômicos e, de outro, a produção,
distribuição e consumo de recursos simbólicos como a
cultura, o conhecimento, a educação e o currículo ”.
 No entanto, como se dá uma luta em torno dos valores,
símbolos, significados e propósitos sociais, o campo social
não é feito só de domínio e subordinação, mas também
de resistência e oposição.
 A pluralidade cultural, ou “multiculturalismo” tal como
aparecem nas teorizações pedagógicas, é um movimento
de reivindicação dos grupos culturais dominados que lutam
para ter suas formas culturais reconhecidas e
representadas na cultura nacional. Também pode
aparecer como a solução para os problemas étnicos
enfrentados por países onde, declaradamente ou não,
subsistem inúmeras formas de apartação e segregação
social, sobretudo nos países do hemisfério norte.
 Uma forma de entender o multiculturalismo faz a apologia
da nossa condição humana que por si só nos torna iguais.
Uma visão antropológica que dissolve as assimetrias de
valores das diversas culturas, pois estas seriam o
resultado das diferentes formas pelas quais os diversos
grupos humanos em diferentes situações geográficas,
econômicas, históricas, se organizaram e buscaram
respostas a suas necessidades. Desta perspectiva, os
diferentes grupos culturais são iguais na sua humanidade.
Em nome dessa humanidade comum, este multiculturalismo
prega a tolerância, o respeito, a convivência pacífica e
harmônica entre as diferentes culturas. Seríamos apenas
aparentemente diferentes, porque por trás das nossas
aparentes diferenças, há a mesma humanidade. Do ponto
de vista biológico é verdade que há apenas uma raça: a
raça, a espécie humana. Mas nós somos determinados,
condicionados não apenas biologicamente, mas também,
politicamente. Na perspectiva crítica, política, as
diferenças culturais são concebidas juntamente desde as
relações de poder. Não é apenas a diferença que é
resultado de relações de poder, mas a própria definição
do que é diferente e do que é “humano” é dado dentro de
relações sociais que são marcadas por relações de poder.
 “São as relações de poder que fazem com que a
‘diferença’ adquira um sinal, que o ‘diferente’ seja
avaliado negativamente relativamente ao ‘não-
diferente’”. Os grupos subordinados culturalmente – as
mulheres, os negros, e os homossexuais – vão fazer uma
forte crítica ao conjunto daquilo que vão considerar como
os “cânones” literários, estéticos e científicos do
currículo universitário tradicional. Vão apontar que este
currículo é expressão do privilégio da cultura branca,
masculina, européia, heterossexual. Denunciam o que
identificam como “heterossexualidade compulsória”. Estes
cânones faziam crer que se tratava de uma “cultura
comum”, uma cultura de “todos” o que era de fato a
cultura de um grupo particular, ou seja, a cultura dos
grupos cultural, social – e economicamente – dominantes.
 A teorização feminista vai forçar a compreensão de que
há uma dimensão de gênero na produção das
desigualdades. O feminismo vai mostrar, cada vez com
mais força, que o poder na sociedade se estrutura não
apenas nas bases e estruturas econômicas do capitalismo,
mas são definidas também pela dimensão patriarcal dessa
sociedade que, desde seus primórdios se afirma nas
representações masculinas de poder. As teorizações mais
recentes do feminismo, enfatizam de forma cada vez
mais crescente, “que o mundo social está feito de acordo
com os interesses e as formas masculinas de pensamento
e conhecimento”.
 Não basta garantir o acesso das mulheres à
educação, é necessário que os conteúdos e as
formas de pensamento na escola contemplem a
perspectiva feminina. “A perspectiva feminista
implica uma verdadeira reviravolta
epistemológica” ao considerarmos que a
epistemologia é sempre uma questão de posição:
“dependendo de onde estou socialmente situado,
conheço certas coisas e não outras. (...) A
epistemologia não é nunca neutra, mas reflete
sempre a experiência de quem conhece”. Na
medida em que reflete a epistemologia
dominante, o currículo existente é também
claramente masculino”.
É a expressão da cosmovisão masculina. E podemos
perguntar: “como se forma a masculinidade, como
se faz de um homem um homem? (...) Como a
formação da masculinidade está ligada à posição
privilegiada de poder que os homens detêm na
sociedade? Ou ainda: como certas características
sociais, que podem ser vistas como indesejáveis do
ponto de vista de uma sociedade justa e
igualitária, como a violência e os impulsos de
domínio e controle estão ligados à formação da
masculinidade? Que conexões existem entre as
formas como o currículo produz e reproduz essa
masculinidade e as formas de violência, controle e
domínio que caracterizam o mundo social mais
amplo? Será apenas por acaso que nos índices de
homicídio, morrem mais rapazes que meninas?
 A teoria crítica aponta para o fato de que as relações de
desigualdade e de poder na educação e no currículo não
estavam restritas à classe social, mas tinha que levar em
conta também as desigualdades educacionais centradas
nas relações de gênero, raça e etnia. A identidade
étnica é uma questão de saber e poder, estreitamente
ligadas às relações de poder que opõem o homem branco
colonizador aos povos africanos, asiáticos e americanos
por ele colonizados. Nesse sentido, o currículo, além de
um texto de classe, é também um texto de gênero e um
texto racial. A temática da “raça” ou etnia, não é um
tema “transversal”: ela é, sim, um tema que está no
centro da questão do conhecimento, do poder e da
identidade.
 “O conhecimento sobre raça e etnia incorporado no
currículo não pode ser separado daquilo que as crianças e
jovens se tornarão como seres sociais”. Não se trata
apenas de celebrar as diferenças, mas de questionarmos
criticamente: como estas diferenças se constroem? Como
a identidade branca se tornou a norma a partir da qual
todas as demais foram subordinadas? Quais são os
mecanismos que mantém determinados grupos raciais
subordinados? Este enfoque do multiculturalismo deixa de
ser folclórico para ser político. Esse currículo não
concebe o racismo como preconceito individual: entende
o racismo a partir de causas institucionais, históricas,
econômicas e discursivas.
 . Pensando nossa história, podemos visualizar o conjunto
das estruturas de poder organizam nossa sociedade e
como elas refletem na escola. Mas a escola, ainda que
seja um espaço de reprodução, é também espaço de
resistência e oposição, é também espaço de produção
cultural, de cultura escolar, e de possibilidade de
ressignificação da cultura que entra na escola. Apesar
dos aspectos colonialistas presentes em nossas
representações históricas, sociais e étnicas, podemos
construir uma perspectiva pós-colonialista do currículo e
levar em consideração todas as conseqüências do
colonialismo europeu na América Latina.
 Afinal, o saber e o conhecimento estiveram
estreitamente ligados aos objetivos de poder das
potências coloniais européias desde o seu início.
 A colonização, como processo de dominação, ia além da
fase de extermínio e subjugação física, também
precisava afirmar-se culturalmente. Nesse sentido, “a
cosmovisão ‘primitiva’ dos povos nativos precisava ser
convertida à visão européia e ‘civilizada’ de mundo,
expressa através da religião, da ciência, das artes e da
linguagem. (...) O projeto colonial teve, desde o início,
uma importante dimensão educacional e pedagógica.
Todas as empreitadas de dominação, de colonização, de
invasão vieram e vêm acompanhadas de projetos
pedagógicos: pretendem formar subjetividades,
transformar comportamentos, criar novos valores e novas
representações. E para isso não é suficiente o uso da
força, é necessário construir hegemonia- e a cultura e a
educação sempre tiveram importância estratégica nessas
empreitadas colonialistas. Também dessa forma o
conhecimento e saber se liga ao conjunto das relações
de poder.
 As teorias críticas e pós-críticas do currículo estão
atentas a estes movimentos e incorporam nas suas
reflexões as lutas dos movimentos sociais nas suas mais
variadas expressões: movimentos negros, movimentos
feministas, movimentos homossexuais, movimento sem-
terra, movimento indígena etc. São estas teorias que
estão preocupadas em incorporar as diferentes dimensões
das relações de poder em nossa sociedade para o campo
contestado e contraditório do currículo, para que as
práticas pedagógicas reflitam as práticas sociais em
movimento na história contemporânea. Portanto, não
serão as teorias tradicionais que darão conta destas
temáticas, nem é de um ponto de vista da conservação
que estes temas entraram na educação. É para que estas
relações sejam questionadas, é para que este saber
instituído seja criticado, é para que a gente pergunte
“por quê” este conhecimento e não “aquele”?
 Por exemplo, por que se definiu pelo ensino de língua
inglesa e não do espanhol? Por que literatura portuguesa
e não latino-americana? Por que História da Europa e não
história da África e/ populações indígenas? Por quê uma
história de homens e não de homens e mulheres? Por que
uma história de escravos e não de resistentes? Por que
este padrão de beleza e não aquele? Por que não uma
aquarela de belezas? Por que o diferente é a mulher, o
negro, o índio, o árabe, o muçulmano? A partir de que
lugar se estabeleceram estes padrões e os respectivos
diferentes? Quais as relações de poder que definiram
estas diferenças? E para finalizar: onde queremos chegar
com a Educação e com os saberes que operamos na
escola? E, repetindo o gato de Alice: qual caminho
devemos escolher? E ainda: onde queremos chegar?
 Referências Bibliográficas:

 WILLIAMS, R. Palavras-chave: um vocabulário de


cultura e sociedade. São Paulo: Boitempo, 2007.

 SILVA, T.T.da. Documentos de identidade:uma


introdução às teorias do curículo.

Profª. Janeslei Aparecida Albuquerque


 Mestre em Educação – UFPR
 Secretaria Educacional da APP-Sindicato
 janesro@msn.com / educacional@app.com.br

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