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Transposição Didática - Aula 2

PPGEPF
Profa. Dra. Rosemary Rodrigues de Oliveira

12/08/2019
Conceitos e
Modelos Teóricos
Transposição Didática
Noosfera
Transposição Didática Externa - TDE (Lato sensu)
Transposição Didática Interna - TDI (strictu sensu)
Prática Social de Referência
Tempo de Demora da Transposição Didática - DTD
Modelo KVP (conhecimentos/valores/práticas sociais)

Verret (1975); Chevallard (1985, 1992); Develay (1992);


Clément (2006); Carvalho e Clément (2007)

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Recursos Utilizados em aula

Para fins de exemplificação utilizaremos tecnologias sociais:


vídeos do Youtube; reportagem da Revista Fapesp; artigo
científico da Nature; capítulos de livros didáticos de Ensino
Fundamental e Ensino Médio.

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Transposição Didática (TD)

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Transposição Didática (TD)

 “Todo projeto social de ensino e aprendizagem se constitui


dialeticamente com a designação de conteúdos do saber como
conteúdos que são possíveis de ser ensinados” (CHEVALLARD,
1998, p. 45)

 Relação ternária

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Fonte da imagem: Carvalho (2009)
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Transposição Didática (TD)

 Esses conteúdos escolares em geral existem antes de


serem designados como tal, contudo, algumas vezes, são
verdadeiras “criações didáticas” que respondem às
necessidades do ensino.

 Um conteúdo do saber que foi designado como um saber a


ser ensinado/escolarizado sofrerá, a partir dessa
designação, um conjunto de transformações
adaptativas que irão torná-lo apto a tomar lugar entre os
objetos de ensino.

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Transposição Didática (TD)

 O “trabalho” que transforma esse conteúdo de saber em


um conteúdo/objeto de ensino possível de ser ensinado
é denominado Transposição Didática (TD).

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Verret (1975) quatro constantes que caracterizam o
trabalho da Transposição Didática:

i) A desincretização do saber: divisão do saber em campos do


saber delimitados, dando lugar a práticas de aprendizagem
especializadas;
ii) A despersonalização do saber: a pessoa/autor é separada/o da
sua atividade de descoberta, tornando público o saber que teve uma
origem privada;
iii) A programabilidade da aquisição do saber: resulta da
programação das aprendizagens e do controle das sequências de
ensino, permitindo a aquisição progressiva de conhecimentos e
competências;
iv) A publicitação do saber: consiste na definição explícita, em
amplitude e em profundidade, do saber a ser transmitido.

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Noosfera

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Noosfera

 Conjunto de dos processos intelectuais, de fontes e


influências que atuam na seleção dos conteúdos que deverão
compor os programas escolares e que determinam todo o
funcionamento do processo didático.

 Fazem parte da noosfera os cientistas, professores,


acadêmicos interessados nos problemas relacionados com o
ensino, políticos, autores de manuais e outros recursos
didáticos e outros agentes da educação.

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Noosfera

 É o lugar onde se pensa o funcionamento didático


segundo ideologias diferentes; “centro operacional do
processo de transposição” (CHEVALLARD, 1998, p. 34).

 É composta por tudo que está no extra muros da sala de


aula propriamente dita: Ministério da Educação; Diretrizes
ou Parâmetros Curriculares; Projetos Políticos
Pedagógicos; Programas que gerem a escolha de manuais
didáticos etc.

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Noosfera

 É composta por todos os membros daquilo que


Chevallard chama de “intelligentsia” do sistema de ensino
(CHEVALLARD, 2013, p. 4)

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Transposição Didática Externa - TDE
(Lato sensu)
Transposição Didática Interna - TDI
(Strictu sensu)
Prática Social de Referência

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 Na abordagem de Chevallard (1985; 1992) a Transposição
Didática (TD) possui duas fases:

 A Transposição Didática Externa - TDE (Lato sensu) e a


Transposição Didática Interna - TDI (Stricto sensu).

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 Carvalho (2009, p. 42) citando Verret (1975) e Chevallard
(1985, 1992) afirma que entre o primeiro e o segundo
nível da TD ocorre a TDE, e entre o segundo e o terceiro
ocorre a TDI

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Transposição Didática Externa (TED)

 Transposição Didática Externa (TDE) ou ainda lato sensu:

Acontece na noosfera. É onde o saber cientifico ganha


“roupagem” didática a partir de currículos e programas de
ensino. Tais programas, currículos, materiais didáticos aparecem
como instrumentos reguladores que normatizarão o que se
deve ensinar na escola, consolidando essa primeira etapa da TD,
a Transposição Didática Externa .

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Transposição Didática Externa (TED)

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Transposição Didática Externa (TED)

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Transposição Didática Interna (TDI)
Transposição Didática Interna (TDI) ou strictu sensu
(1) Transformação do saber sábio ao saber ensinado, ou
seja, de um conteúdo do saber a uma versão didática
desse saber
(2) Se trata daquela que atua na relação didática
professor-aluna-saber dentro da sala de aula
(intramuros)
(3) O professor é o responsável, nessa fase, pelo
processo de adaptação/deformação do saber a
ensinar descrito nos manuais e livros didáticos, a fim
de torna-lo saber ensinado.
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Transposição Didática Interna (TDI)
Transposição Didática Interna (TDI) ou strictu sensu
Também sofre pressões externas – interesses da
instituição escolar, dos pais etc.

“O que Chevallard quer propor, no nosso entendimento, é


que a transposição didática já vem sendo feita desde há
muito tempo quando a noosfera - esfera ‘pensante’ –
propõe um tratamento, uma ‘didatização’, uma
deformação do saber científico, para torná-lo apto a ser
ensinado. Mas se considerarmos que a Transposição
Didática Interna marca um novo momento, uma nova
etapa desse processo, talvez possamos dizer que o
professor não está na transposição didática , mas que
ele intimamente faz a transposição didática (BRITO
MENEZES, 2006, p. 86, grifos da autora)
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Transposição Didática Interna (TDI)

23 (Trabalho Lic. Bio. FCAV, 2008)


(Trabalho Lic. Bio.
FCAV, 2008)
Transposição Didática Interna (TDI)

(Trabalho Lic. Bio. FCAV, 2009)


Transposição Didática Interna (TDI)

(Trabalho Lic. Bio. FCAV, 2009)


(Trabalho Lic.
Bio. FCAV, 2015)
 “Cada imagem a seguir corresponde a um grupo de
alunos. É possível notar diferentes representações da
molécula de DNA, pois cada grupo evidenciou em seu
modelo determinada característica desta molécula, em
detrimento de outras características que não foram
representadas, as quais denominamos de limitações.
As limitações dos modelos demonstram que não é
possível evidenciar todas as características que
determinado objeto de estudo possui em uma única
representação, e também demonstram nossas
escolhas diante disto.” (Trabalho Lic. Bio. FCAV,
2015)
Aula
Aula
3

“É possível notar que todos os grupos utilizaram: o


alcaçuz como representante do “esqueleto” externo da
molécula de DNA, as jujubas como representantes das
bases nitrogenadas e os palitos de dente como sendo
as pontes de hidrogênios. Porém, houve grupos que
mudaram de estratégia ao longo da aula, como por
exemplo, o grupo da Imagem 4, que inicialmente estava
com muita dificuldade de compreender os conceitos
básicos e subsidiais para a construção da molécula,
referente a nucleotídeo, base nitrogenada, e a
complementariedade das mesmas. Uma explicação para
a transição de um pensamento confuso sobre os
conceitos para a construção de um ótimo modelo foi
encontrado ao ouvir a transcrição de um gravador
presente próximo ao grupo, que mostrou a cópia de
modelos de outros grupos, como o trecho abaixo
demonstra:” (Trabalho Lic. Bio. FCAV, 2015)
 “Cópia” do modelo do outro grupo: indica dificuldade em criar
seu próprio modelo e o medo de construir um modelo errado,
preferindo assim fazer uma “cópia” de um modelo que talvez o
grupo tenha considerado “mais certo” do que o deles. O fato
deste grupo ter apenas olhado os modelos de outros estudantes e
aderido às representações dos mesmos sem que houvesse um
diálogo entre os grupos, não favoreceu o intercâmbio de ideias
entre os mesmos, e nem ao conhecimento dos motivos pelos quais
determinado modelo foi feito de certa maneira e não de outra.”
 “Com relação à associação de erro ao fracasso, Carvalho (1997,
p.12) irá dizer que quando se associa erro e fracasso como causa
e consequência, podemos não notar que o erro é um dado,
detectável objetivamente e às vezes indiscutível, enquanto o
fracasso é “fruto de uma interpretação desse dado, uma
forma de o encaramos e não a consequência necessária do erro”.
Esta autora ainda enfatiza que o erro não é um indício
imediato de que não ocorreu a aprendizagem, e muito menos
que houve fracasso, tanto da aprendizagem quanto do ensino.”
(Trabalho Lic. Bio. FCAV, 2015)
Controvérsia a respeito da
Transposição Didática Interna (TDI)

 A Transposição Didática é uma teoria em


construção, fato que causa discussão acerca de suas
diferentes interpretações.

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Controvérsia a respeito da
Transposição Didática Interna (TDI)

 Existirão autores que não creem que o docente faça


efetivamente Transposição Didática e sim que participa de
uma etapa da mesma, sendo apenas um instrumento de
divulgação do saber, um simplificador, do saber através da
linguagem e de recursos utilizados, da sequência ordenada do
conteúdo e da forma de apresentação dos conceitos.

 Os professores não fazer Transposição Didática, fazem


simplificação.

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Argumento contrário à TDI

Para fazer a TDI o professor deveria ser conhecedor


da história da TD do saber, ser capaz de estudar e
transformar o saber a ensinar em saber ensinado,
ser capaz de textualizar coerentemente saberes
elaborando contextualizações cabíveis, se
interessar pela epistemologia dos saberes,
conhecer os estágios de compreensão dos
estudantes afim de produzir uma TD eficaz.

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Argumento contrário à TDI

Na maioria das vezes o docente ao tentar contextualizar o


saber em sala de aula acaba por “embaraçá-lo”. (NEVES;
BARROS, p. 149)

Precária formação (LUCCAS, 2004) impossibilita ao docente


a TDI

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Prática Social de Referência

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Prática Social de Referência
 A TD se faz na sociedade e as sociedades são
organismos vivos, logo, a TD está presa em uma
dimensão social e histórica;
 O status de saber sábio é outorgado pela cultura;
 A textualização de livro didáticos, por exemplo, sofrem
influencias de outras áreas e não só da ciência de
origem;
 O ensino exige o reconhecimento social e legitimação
do conhecimento ensinado;
 “Ensinar é uma batalha dúbia em que o conhecimento
e a relação ambígua da sociedade com ele estão em
jogo.” (CHEVALLARD, 2013, p. 13).
44
Prática Social de Referência
 Nas palavras de Chevallard (2013, p. 13) “alguns
segmentos da sociedade irão definir e proclamar visões
sobre o conhecimento a ser ensinado. Essas visões,
muitas vezes, estarão em desacordo - simplesmente
pela forma como o conhecimento em questão é utilizado
– ou mais geralmente, pela forma como as pessoas se
relacionam com ele, a qual se difere de um segmento
para outro, ou seja, de uma prática social para outra.
No cumprimento de sua missão, o sistema de ensino é,
portanto, obrigado a entrar em acordo com pontos
divergentes. E vai fazê-lo através da imposição sobre a
sociedade de uma versão comum autorizada do
conhecimento a ser ensinado.”

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Prática Social de Referência
 Develay (1992) são compostas pelo objeto de trabalho;
o problema que se pretende abordar e as atitudes e
papeis sociais que a disciplina conduzirá.
 Develay (1992) afirma que o saber a ensinar na maior
parte das disciplinas tem como ascendente não só os
saberes sábios (ou objetos de saber), mas também as
práticas sociais de referência.
 Carvalho (2009) afirma que na abordagem de diversos
temas de Biologia tais como a Genética, Educação
Ambiental, Saúde, Sexualidade, que frequentemente se
articulam a debates sociais e científicos são
encontradas diferenças nas transposições didáticas em
manuais de diversos países – a autora chama esses
temas de “questões vivas” da Biologia.
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Prática Social de Referência – O
exemplo da Sexualidade

 Escola ou família?
 Anatomofisiologia da reprodução ou questões
sócio culturais e afetos?
 Em que disciplina? Só na Biologia ou tema
transversal?
 Como proceder a sua didatização?

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Prática Social de Referência – O
exemplo da Sexualidade

Coleção
Ciência e
Sociedade -
Bertoldi &
Vasconcelos,
(2001)

48
Fonte: Ciência & Sociedade 7ª série, 8º ano – Bertoldi & Vasconcelos, 2001, p. 13.
49
Vianna; Ramires (2008) → ausência de famílias
homoparentais → expressão das relações de
poder que sustentam um modelo ainda patriarcal
e heterossexual de família.

Vianna; Ramires (2008) → Naturalização da


heterossexualidade sustenta a possibilidade de
homofobia e a legitima ao excluir outras formas
de família para além do núcleo hegemônico.

Lionço; Diniz (2008) → PNBE → dicionários


analisados veiculam afirmações expressamente
homofóbicas
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 Lionço; Diniz (2008) → relação sexual:
reprodução biológica.

 Lionço; Diniz (2008) → sexualidade → não há


referencias à dimensão social e simbólica da
sexualidade

 Lionço; Diniz (2008) → prazer sexual → nos livros


didáticos está restrito a enunciação das condições
fisiológicas de excitabilidade dos órgãos genitais

51
Questões de gênero → raros livros discutem o que é
ser menino ou menina fora do contexto biologizante.

Fonte: Ciência e Sociedade 7ª série, 8º ano – Bertoldi;Vasconcelos 2001, p. 14.

Fonte: Ciência & Sociedade 7ª série, 8º ano – Bertoldi & Vasconcelos, 2001, p. 14.
52
Projeto Apoema –
Ciências Pereira;
Waldhelm; Santana
(2013)

53
Caminho Suave (Lima, 1948) → 40 milhões de
exemplares vendidos → mais de um terço dos
brasileiros foram alfabetizados com essa cartilha

Tudo alinhavado
por um texto
aparentemente
inocente. Pueril.
54
Prática Social de Referência – O
exemplo da Sexualidade

“Tendo em conta o que é ensinado, para que


tipo de existência humana tenderemos? Ou
ainda: qual é o mundo que iremos
irreversivelmente construir ao ensinarmos o
que ensinamos?” (DEVELAY, 1992, p. 26,
grifos meus)

55
Prática Social de Referência – O exemplo
da Sexualidade

"Tolerar a existência do outro e permitir que


ele seja diferente ainda é muito pouco. Quando
se tolera, apenas se concede, e essa não é uma
relação de igualdade, mas de superioridade de
um sobre o outro. Deveríamos criar uma
relação entre as pessoas da qual estivessem
excluídas a tolerância e a intolerância."
(José Saramago)

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Modelo KVP
 KVP – As concepções (da ciência e do senso
comum) resultam geralmente da interação entre
valores (V), saber científico (K – do inglês
knowledge) e práticas sociais (P)

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 “É a utilização dos meus conhecimentos que
me permite assimilar, reter, reformular tudo
que é útil às minhas práticas (polo P). Por
outro lado, a atenção que cada um de nós dá
aos conhecimentos depende frequentemente
da interação entre esses conhecimentos e
seus próprios sistemas de valores (polo V)”
(CLÉMENT, 2004, p. 55)

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Demora na Transposição Didática DTD –
demora entre o saber sábio e o saber escolar

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 t1= emergência de um novo conceito científico A
 t2 = aparecimento do novo conceito científico A nos
programas escolares
 A Demora na Transposição Didática (DTDp) do
novo conceito científico A é dada por t2-t1.
 Uma vez presente nos programas os autores
podem fazer surgir esse do novo conceito científico
A em seus manuais, sendo a DTDm dada ela
diferença t3-t1.
 O tempo que separa o aparecimento nos
programas escolares e nos manuais é dada pela
diferença DTDm- DTDp
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Exemplo: O exemplo da tripla hélice

 A diferença de tempo entre a abordagem das


questões de gênero pela comunidade cientifica,
pelos PCN temas transversais e pelos livros
didáticos de Ciências e Biologia.

 A diferença de tempo entre a proposição da


estrutura do DNA como dupla hélice nos
manuais (está presente) e de tripla hélice
(ainda não chegou).

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https://youtu.be/zaSzjTkaM18 O documentário
aborda a descoberta da estrutura do DNA, levando em
consideração os fatores sociais que fizeram Watson e
Crick fossem contemplados com o prêmio Nobel, em
1962.

https://www.nature.com/articles/171737a0.pdf Artig
o original publicado na Nature, em 1953, por Watson
e Crick

https://revistapesquisa.fapesp.br/2013/05/16/brasil
eiro-desvenda-os-misterios-do-dna-com-tripla-
helice/ texto da revista Pesquisa FAPESP sobre a
estrutura de tripla hélice do DNA em moscas.

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Bibliografia Consultada
ASTOLFI, J.P.; DEVELAY, M. Os conceitos das didáticas da ciências. In:
ASTOLFI, J.P.; DEVELAY, M. A didática das ciências. São Paulo: Papirus
Editora. 1995. p. 47-63.

CARVALHO, G. S. A Transposição Didática e o Ensino da Biologia. In:


CALDEIRA, A. M. A.; ARAUJO, E. S. N. N. (Org.) Introdução à didática da
Biologia. São Paulo: Escrituras Editora, 2009. p. 34-57.

CHEVALLARD, Y. La transposición didáctica: del saber sábio al saber


enseñado. 3. ed. Argentina: Aique Grupo Editor, 1998.

CHEVALLARD, Y. Sobre a teoria da transposição didática: algumas


considerações introdutórias. Revista de Educação, Ciências e Matemática, v.3,
n.2, mai/ago, 2013.

NEVES, K. C. R.; BARROS; R. M. de O. Diferentes olhares acerca da transposição


didática. Investigações em Ensino de Ciências. v. 16, n.1, p. 103-115, 2011.

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