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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS TEÓRICOS

METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL III

Aula 1:O contexto sócio-econômico político em que


ocorre o Movimento de Reconceituação do Serviço
Social no Brasil.
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS TEÓRICOS METODOLÓGICOS DO
SERVIÇO SOCIAL III

Nesta aula analisaremos o período da década de 60 e 70 no


Brasil, quando vivemos sob uma ditadura militar, que José
Paulo Netto denomina de “autocracia burguesa”. A
emergência da ditadura brasileira inscreve-se num panorama
internacional, no qual uma sucessão de golpes de Estado
constituía-se como cenário para uma alteração na divisão
internacional capitalista, sob a hegemonia norte-americana,
patrocinando uma contra-revolução que visava a manutenção
do sistema capitalista em escala planetária, numa disputa
com os países socialistas.
Essa contra-revolução tinha como finalidades:

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•Adequar os padrões de desenvolvimento nacionais e de


grupos de países ao novo quadro do inter-relacionamento
econômico capitalista, marcado por uma internacionalização
do capital ( globalização);
•Golpear e imobilizar os protagonistas sociopolíticos
habilitados a resistir a esta reinserção mais subalterna no
sistema capitalista ( países opositores, de viés comunista e
socialista);
•Dinamizar em todos os continentes forças aliadas contra a
revolução e o socialismo.

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Como consequência dessa estratégia, verifica-se a partir da


segunda metade da década de 60, os seguintes resultados :
•a afirmação de um padrão de desenvolvimento econômico
associado subalternamente aos interesses imperialistas, com
uma integração mais dependente ao sistema capitalista;
•a articulação de estruturas políticas garantidoras da exclusão
dos protagonistas comprometidos com o projetos nacional-
populares e democráticos;
•um discurso oficial com uma prática policial-militar anti-
comunista.
No Brasil, o desenvolvimento capitalista foi implantado e se
desenvolveu sem desvencilhar-se de formas tradicionais
( oligarquia rural), modernizando-a e a integrava em sua
dinâmica em patamares mais complexos, funcionais e
integrados ( modernização e industrialização da agropecuária,
através de maquinários, insumos industrializados : fertilizantes,
inseticidas, etc).
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Um outro aspecto a considerar é que as forças populares foram


recorrentemente excluídas dos processos de decisão política,
por dispositivos sinuosos ou de coerção aberta. O Estado
brasileiro desde 1930 consegue desestruturá-la Destaca-se
nesse sentido as estratégias de relacionamento de Getúlio
Vargas com as organizações dos trabalhadores ( sindicatos e
associações), que o consagram como populista. O surgimento
de amplas camadas trabalhadoras urbanas e rurais no cenário
político, galvanizando segmentos pequeno-burgueses (camadas
intelectuais) e parcelas da Igreja Católica e das Forças Armadas
era um fato novo no país, que poderiam ter como
desdobramentos um reordenamento político-social capaz de
gerar uma situação pré-revolucionária, a partir das
articulações do movimento operário e sindical.

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No Brasil, verifica-se um desenvolvimento tardio do


capitalismo em relação aos países europeus e norte-
americanos. A industrialização pesada passa a acontecer
somente a partir de 1956, implicando em num novo padrão
de acumulação capitalista. As lutas contra a exploração
imperialista e latifundiária, acrescidas das reivindicações
de participação cívico-política ampliada, apontavam para
uma ampla reestruturação do padrão de desenvolvimento
econômico e uma profunda democratização da sociedade e
do Estado, que poderia criar uma nova hegemonia e a
implementação de políticas democráticas e populares,
compondo um novo bloco de forças político-sociais, capaz
de assumir e redimensionar o Estado.

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Estava em jogo não só a luta pelo capitalismo ou


socialismo, mas a reprodução do desenvolvimento
associado, dependente e excludente, ou um processo
profundo de reformas democráticas e nacionais,
antiimperialistas e antilatifundiaristas, numa perspectiva
de revolução social. Nesse sentido, o movimento cívico-
militar de abril de 64 configurou-se como um pacto contra-
revolucionário, portanto reacionário, conservador da ordem
burguesa vigente. A resultante é um Estado que estrutura
um sistema de poder muito definido, no qual se unem os
monopólios imperialistas e a oligarquia financeira nacional.

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Analisando o período ditatorial, que Netto chama de
modernização conservadora, a ordenação da economia
brasileira, caracteriza-se por:
- benefícios ao capital estrangeiro e aos grandes grupos nativos;
- concentração e centralização em todos os níveis, através de
conselhos e coletivos diretamente atrelados ao grande capital;
- a internacionalização e a territorialização do imperialismo
norte-americano;
- uma concentração tal da propriedade e da renda que
engendrou uma oligarquia financeira.
- um padrão de industrialização na retaguarda tecnológica e
vocacionado para estimular e atender demandas elitizadas no
mercado interno e direcionado para o exterior.
- a constituição de uma estrutura de classes fortemente
polarizada, apesar de muito complexa;
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- um processo de pauperização relativa sem precedentes no


mundo contemporâneo;
- a acentuação da concentração geopolítica das riquezas
sociais, aprofundando brutais desigualdades regionais;
- a cristalização de uma estrutura estatal-burocrática e
administrativa para gerir este modelo, baseada num
referencial político-ideológico específico, cuja matriz foi a
doutrina de segurança nacional.

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Quando o projeto da modernização conservadora, baseado na


política desenvolvimentista, perde a legitimação política,
ocorre o aumento do processo da resistência democrática, que
se alarga e se aprofunda vinculados ao movimento golpista,
levando o regime à defensiva, à concessões e, no limite, a
negociar as vias de transição a outras formas de dominação.

Nas condições brasileiras, a supressão da democracia política


haveria de responder por um lado à necessidade de reverter o
processo de democratização que estava em curso no país antes
de 64, e neutralizar seus protagonistas, e por outro, atender às
exigências de adequar ou criar as instâncias estatais e os
dispositivos institucionais requeridos pelas novo padrão de
desenvolvimento.

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O ciclo autocrático burguês se desenvolveu em três


períodos:

•de abril de 1964 a dezembro de 1968, cobrindo o governo


Castelo Branco e parte do governo Costa e Silva, cuja
tarefa inicial foi depor o governo de João Goulart
(considerado progressista, de esquerda, sensível às
demandas do movimento operário e camponês, e as forças
populares de esquerda).

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A implementação do Plano de Ação Econômica do governo-


PAEG, para o período de 1964-1966 com medidas
racionalizadoras face à desaceleração do crescimento, atingiu
a pequena burguesia urbana, além dos trabalhadores, que
tiveram a liquidação da estabilidade no emprego e uma
política salarial depressiva, com perdas muito visíveis a partir
de 1967, alargaram a distância entre a classe trabalhadora e
o governo, criando um clima de enfraquecimento do pacto
contra-revolucionário, com a emersão de partidos de
oposição. A Frente Ampla, composta pelo movimento operário
e sindical retomou ações significativas, e o movimento
estudantil, expressão privilegiada da pequena burguesia,
assumiu ruidosamente nas ruas a constestação à nova ordem .

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b) de dezembro de 1968 a 1974, envolvendo basicamente o


fim do governo Costa e Silva, o intemezzo da Junta Militar
e todo o governo Médici. Esta nova fase é marcada pelo
Ato institucional nº 5. Se entre 1964 e 1968 os militares
assumiram o Estado numa ditadura reacionária, com
discurso contraditório, fazendo alusões à democracia, a
nova fase caracteriza-se por um regime político de
características fascistas, de componente mais autoritário e
reacionário, que corporifica os interesses do grande capital
monopolista imperialista e nativo.

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A estrutura do Estado é inteiramente redimensionada e


refuncionalizada para servir e induzir à concentração e
centralização, a partir do monopólio do aparato estatal. A
repressão à oposição torna-se intensa e vai ser operacionalizada
de forma policial-militar: o terrorismo de estado é a contraface
da racionalização e modernização conservadora. A legitimação
do Estado se dará com base no discurso sobre a eficácia do
regime do governo na promoção do desenvolvimento econômico:
é o tempo de crescimento acelerado, batizado de “ milagre
brasileiro”, conferindo um enorme poder de definição
macroscópica de políticas sociais abrangentes, e um poder para
efetivamente implementá-las. Estas políticas sociais tornam-se
não apenas repressivas, mas positivas, com a intenção de obter
o consenso da população, cujo marco é o I Plano Nacional de
Desenvolvimento.
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O terrorismo de Estado conduziu as forças democráticas a uma


residual política de resistência, à clandestinidade. É somente a
partir de 1973 que o “milagre” começa a se esgotar, que
ressurge a resistência do movimento popular. Num período em
que as lutas do proletariado industrial são duramente
reprimidas, a ditadura militar fascista utiliza num processo
eleitoral com um caráter plebiscitário em relação ao regime.

A massa do povo com acesso ao voto surpreende em 1974, não


legitimando o autocratismo burguês em sua forma militar-
fascista, abrindo a fase derradeira da ditadura, com o processo
que denominou-se “processo de distensão” e auto-reforma do
Estado, implementado no governo do general Figueiredo.

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c ) de 1974 a 1979, o período Geisel e Figueiredo. O


objetivo inicial foi uma liberalização controlada e limitada,
numa combinação estável de formas parlamentares limitadas
com mecanismos decisórios ditatoriais, através do
enquadramento do vasto aparelho policial-militar repressivo,
impedindo seu acionamento por segmentos corporativos
localizados ( facções do partido militar), subordinando-o a
um comando único e inquestionável. Por outro lado,
aniquilou todas as forças político-organizativas que poderiam
se insurgir no processo de manutenção da ordem
estabelecida, como a reinserção da classe operária a partir
das greves do ABC paulista, entrando na cena política.

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Em seu último momento, a autocracia burguesa é obrigada


a combinar concessões e gestos tendentes à negociação
com medidas repressivas, por força da ação do movimento
operário e popular, que passa à ofensiva. Em todo o ciclo
autocrático-burguês, o referencial político ideológico da
doutrina de segurança nacional foi o parâmetro criado
pela autocracia burguesa para sua legitimação, tornando
esse Estado incompatível com um processo de
democratização.

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Não é por acaso que a crise da ditadura alonga-se por mais de


uma década, e configurou um processo de transição singular e
atípico: uma situação política democrática nos primeiros anos da
década de 80, coexistindo com um aparato estatal inteiramente
incompatível com sua manutenção, ampliação e consolidação,
gerando um impasse entre estado e regime político.

Na sociedade contemporânea de base urbano-industrial, a


dinâmica do mundo da cultura tem como força motriz o confronto
livre de posições, concepções, e tendências, a tensão entre sua
manifestações e expressões intelectuais distintas. Um
dinamismo inerente à vida cultural re-produz e re-constrói, por
seus meios específicos, as tensões que percorrem a vida social.
Consequentemente, o mundo da cultura não é um todo ou bloco
homogêneo, mas traduz os diversos aspectos da totalidade social

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A ditadura não contentou-se com o viés elitista do processo da


cultura brasileira A primeira face da política cultural necessária
à autocracia burguesa foi a face repressiva, das tendências
críticas que emergiam através de escritores, críticos, artistas,
cientistas e pedagogos, que se expandiu dos anos cinquenta aos
anos setenta. Diante dela, a autocracia burguesa tinha uma
ação duramente repressiva.

A segunda face da política cultural deste período foi a


promocional, indutora, positiva, que consistia em buscar uma
legitimação, com aportes de quadros técnicos e científicos,
assépticas no debate político-social. Na sistemática busca do
controle do mundo da cultura, a autocracia burguesa procurou
integrar a sua política cultural ao sentido global de suas políticas
sociais, especialmente as de educação e de comunicação social.

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A RENOVAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL SOB A AUTOCRACIA


BURGUESA
Do ponto de vista profissional, alteram-se muitas demandas
práticas e sua inserção nas estruturas organizacional-
institucional, que alteram as condições do exercício
profissional. A reprodução da categoria profissional, a
formação de seus quadros técnicos viu-se profundamente
redimensionada, bem como os padrões de organização da
categoria. Seus referenciais teórico-culturais e ideológicos
sofreram alterações significativas.

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A renovação do Serviço Social no Brasil, mesmo que não se


possa reduzir os seus múltiplos condicionantes às constrições
do ciclo ditatorial, é impensável tal como se realizou, sem a
referência à sua dinâmica e crise. Até o final da década de
60, e entrando pelos anos 70, no discurso e na ação
governamental há um claro componente de valorização e
reforço do que caracterizamos como Serviço Social
tradicional, entendido como prática empirista, paliativa e
burocratizada dos profissionais, orientada por uma ética
liberal-burguesa, que consiste na correção de resultados
psicossociais considerados negativos ou indesejáveis à
ordenação capitalista.

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O desenvolvimento das forças produtivas é acompanhado do


aumento e complexificação das expressões da questão social,
e sua administração crescentemente centralizada pelas
políticas sociais do Estado ditatorial, a partir da criação de
cargos na estrutura sócio-ocupacional a serem preenchidos
por assistentes sociais, quer nos aparelhos burocráticos-
administrativos do Estado, quer no âmbito das empresas.

A criação de um mercado nacional de trabalho para os


assistentes sociais tem início em meados dos anos quarenta,
quase uma década depois da fundação das primeiras escolas
de Serviço Social, no bojo do processo de desenvolvimento de
grandes instituições sociais implementadas pelo Estado Novo.

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Nos anos 50 e na entrada dos anos 60 esse mercado se


expande com a industrialização pesada. Trata-se porém de
um mercado de trabalho emergente e ainda em processo de
consolidação, só residualmente estendendo-se por todo o
território nacional e com relações trabalhistas carentes de
uma institucionalização plena, exceto nas organizações
governamentais, onde elas se desenvolveram primeiramente.

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A produção teórica do Serviço Social brasileiro recebe


inicialmente forte influência do pensamento católico, das
escolas europeias de formação de profissionais, vinculadas à
Igreja Católica. Num segundo período vincula-se à
perspectiva norte americana, baseada no Positivismo e no
Funcionalismo, adequando-se às novas exigências
profissionais decorrentes de sua inserção nos órgãos estatais
e nas empresas. O Estado, tradicional grande empregador
dos assistentes sociais, reformula a partir de 1966-1967, as
estruturas onde se inseriam aqueles profissionais, através de
uma série de reformas que, atingindo primeiramente o
sistema previdenciário, haveria de alterar posteriormente
todo o conjunto de instituições e aparatos governamentais,
através dos quais se interfere na questão social.

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Esta reformulação foi tanto organizacional quanto funcional,


acarretando numa diferenciação e especialização das próprias
atividades dos assistentes sociais, decorrentes do elenco mais amplo
das políticas sociais, quer das próprias sequelas do modelo econômico,
promovida aquela reformulação em escala nacional e sob a ótica
centralizadora do Estado de Segurança Nacional. Sua nova inserção
nos chamados serviços públicos viu-se universalizada no espaço
nacional, provocando uma extensão quantitativa da demanda de
quadros técnicos de Serviço Social.

Até meados da década de sessenta, o mercado para os assistentes


sociais, era complementado efetivamente no setor privado pelas obras
sociais filantrópicas que, embora girando na órbita estatal , não
estavam diretamente ligados às agências oficiais. Mas o mercado
nacional de trabalho para os assistentes sociais foi dinamizado nos
anos sessenta pelas médias e grandes empresas monopolistas e
estatais.

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Os anos do milagre econômico ampliam as oportunidades de
trabalho para o Serviço Social de Empresa, não apenas em
razão do crescimento industrial, mas determinado também
pelo pano de fundo sociopolítico em que ele ocorre, que
requer a vigilância e controle da força de trabalho no âmbito
da produção.

Por outro lado, os fenômenos de pauperização, as sequelas


do desenvolvimento orientado para privilegiar o grande
capital, levaram as organizações de filantropia privada a
requisitar a contratação de profissionais que antes não
ocorria. Mesmo que o conteúdo geral das práticas
profissionais não tenha sido deslocado da execução terminal
de políticas sociais setoriais, alterou em escala significativa o
relacionamento dos profissionais com as instâncias
hierárquicas das organizações empregadoras.
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A prática dos profissionais teve que revestir-se de


características formais e processuais segundo critérios
burocráticos-administrativos modernos, implicando num
redimensionamento técnico-racional, que superou e
questionou os comportamentos profissionais fundados em
supostos humanistas. Mudou o perfil do profissional
demandado pelo mercado de trabalho.

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Simultaneamente verifica-se a inserção do Serviço Social no


espaço universitário. Trata-se da efetiva incorporação da
formação profissional pela universidade, introduzindo os
cursos na academia e subvertendo as condições de ensino.
As escolas isoladas mantidas por organizações confessionais
ou leigas, passam a se localizar nos complexos
universitários. Num curto espaço de tempo, a formação
profissional viu-se penetrada pelas exigências da
refuncionalização global da universidade pelo regime
autocrático burguês, propiciando a interação com as
disciplinas vinculadas às ciências sociais, recebendo as
influências da Sociologia, da Psicologia Social e da
Antropologia.

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Mas o conjunto de sequelas que o ciclo ditatorial imprimiu ao


quadro educacional e cultural do país, rebateu com imensa força
sobre a formação dos assistentes sociais. Entretanto, o
recrutamento do novo pessoal docente agregou elementos que
vinham da formação em momentos imediatamente anteriores ou
posteriores à implantação da ditadura, puderam introduzir no
Serviço Social uma massa crítica inexistente anteriormente,
apoiadas em novos referenciais teóricos, ideológicos e políticos.

É nesse contexto que se desenvolve a renovação do Serviço


Social, fornecendo as balizas histórico-sociais e ideoculturais no
interior das quais a profissão experimentará o processo de
renovação, via movimento de reconceituação profissional, a
partir do qual surgem novas produções teórico-metodológicas no
país.
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Já na segunda metade dos anos setenta, em visível relação


com a consolidação do mercado nacional de trabalho e a
cristalização da condição assalariada do profissional,
emergem formas de organização da categoria, cada vez mais
próximas dos instrumentos sindicais de representação e luta
tradicionais: o Conselho Federal de Assistentes Sociais – CFAS
e seus Conselhos Regionais- CRAS .
Nos anos oitenta verifica-se a revitalização de inúmeros
sindicatos e a criação da Associação Nacional de Assistentes
Sociais- ANAS de 1983, que vem no desdobramento da
Comissão Executiva Nacional das Entidades Sindicais de
Assistentes sociais – CENEAS, articulada em 1979.

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A ruptura com o Serviço Social tradicional tem suas bases


na laicização do Serviço Social, que as novas condições
postas à formação e ao exercício profissional pela
autocracia burguesa conduziram a um ponto culminante.
São constitutivas desta laicização ( afastamento das
organizações e diretrizes católicas), a diferenciação da
categoria profissional em todos os seus níveis, e a
consequente disputa pela hegemonia do processo
profissional em todas as instâncias ( projetos de formação,
paradigmas de intervenção, órgãos de representação,
etc) . Segundo José Paulo Netto, tal laicização é um dos
elementos caracterizadores da renovação do Serviço Social
sob a autocracia burguesa.

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A EROSÃO DO SERVIÇO SOCIAL TRADICIONAL NO BRASIL

Segundo NETTO, “ a autocracia burguesa exerceu uma função


precipitadora de um processo de erosão do Serviço Social
“Tradicional” que lhe é anterior, e a ela conferiu uma
direção particular, colocando demandas de intervenção sobre
a questão social, que se desdobravam amplamente as
práticas profissionais, com a assunção da abordagem
comunitária como outro processo profissional, além das
abordagens individual e grupal.

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Ainda que o universo teórico-ideológico do Desenvolvimento


de Comunidades fosse candidamente acrítico e
profundamente mistificador dos processos sociais reais e não
supusesse uma ruptura com os pressupostos gerais do
tradicionalismo, ele abria uma fenda nas preocupações
basicamente microssociais.

Outra consequência, igualmente expressiva, era a inserção do


assistente social em equipes multiprofissionais nas quais ,
dado o caráter relativamente novo destas experiências entre
nós, o seu estatuto não estava definido previamente como
subalterno, relacionando o assistente social com aparelhos
administrativos e decisórios do Estado, situando-o ao mesmo
tempo em face das novas exigências de alocação e gestão de
recursos e de circuitos explicitamente políticos.”
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O II Congresso Brasileiro de Serviço Social realizado no Rio


de Janeiro em 1961, significou não apenas a descoberta do
desenvolvimentismo, mas efetivamente a intervenção
profissional inscrita no Desenvolvimento de Comunidade
como a área do Serviço Social a receber dinamização
preferencial e mais compatível com o conjunto de
demandas da sociedade brasileira.
São elementos determinantes para detectar a erosão do
Serviço Social tradicional:

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- o reconhecimento de que a profissão ou se sintoniza com as


solicitações de uma sociedade em mudança e em
crescimento ou se arrisca a ver seu exercício relegado a um
segundo plano;
- levanta-se a necessidade de aperfeiçoar o aparelhamento
conceitual do Serviço Social e de elevar o padrão técnico,
científico e cultural de profissionais desse campo de
atividades, com o reconhecimento da insuficiência da
formação profissional;
- a reivindicação de funções não apenas executivas na
programação e implementação de projetos de
desenvolvimento.

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- o amadurecimento de setores da categoria profissional


na sua relação com outros protagonistas ( equipes
multiprofissionais, grupos da população politicamente
organizados, núcleos administrativos e políticos do
estado).
- o desgarramento de segmentos da Igreja católica em
face de seu conservantismo tradicional e a emersão de
católicos progressistas, e mesmo de uma esquerda
católica, com ativa militância cívica e política.
- o espraiar do movimento estudantil que faz seu ingresso
nas escolas de Serviço Social .
- o referencial próprio de parte significativa das ciências
sociais do período, imantada por dimensões críticas e
nacional-populares.

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Ocorre no início dos anos 60, um duplo movimento de


desprestígio do Serviço Social tradicional e a crescente
valorização da intervenção no plano comunitário, nos quais
era possível identificar três vertentes:
- uma corrente que extrapola para o Desenvolvimento de
Comunidades os procedimentos e as representações
tradicionais, apenas alterando o âmbito da sua intervenção;
- outra que pensa o Desenvolvimento de Comunidade numa
perspectiva macrossocietária, supondo mudanças
socioeconômicas estruturais, no bojo da sociedade capitalista;
- e por último uma vertente que pensa o Desenvolvimento de
Comunidade como um instrumento de transformação social
substantiva, conectado à libertação social das classes e
camadas subalternas.

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A EROSÃO DO SERVIÇO SOCIAL TRADICIONAL NA AMÉRICA


LATINA

A crise do Serviço Social tradicional foi um fenômeno


internacional em praticamente todos os países Latino
Americanos, onde a profissão encontrou um nível de
significativo de inserção na estrutura sócio-ocupacional e
articulara sua legitimação social. O pano de fundo de tais
núcleos é dado pelo esgotamento de um padrão de
desenvolvimento capitalista- o das ondas longas de
crescimento, na década de 60.

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O tensionamento das estruturas sociais do mundo capitalista


gestou um quadro favorável para a mobilização das classes
sociais subalternas em defesa dos seus interesses imediatos.
Registram-se amplos movimentos para direcionar as cargas
de desaceleração do crescimento econômico , mediante as
lutas dos trabalhadores e as táticas de reordenamento dos
recursos das políticas sociais dos Estados burgueses. Em tais
movimentos, o conteúdo das demandas econômicas
entrecuza-se com demandas sociais e culturais: começam a
emergir reivindicações diferenciadas por categorias
específicas( negros, mulheres, jovens), à ambiência social e
natural ( a cidade, o equipamento coletivo, a defesa dos
ecossistemas), a direitos emergentes ( ao lazer, à educação
permanente, ao prazer), etc.

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Esses movimentos põem em questão a racionalidade do


Estado burguês e suas instituições, e nas suas expressões
mais radicais, negam a ordem burguesa e seu estilo de vida.
Recolocam em pauta as ambivalências da cidadania fundada
na propriedade ( lógica capitalista) e redimensionam a
atividade política , multiplicando seus sujeitos e suas
arenas.
As instituições e organizações governamentais e o elenco de
políticas do Welfare State, vêem-se em xeque; seu universo
ideal, centralizado nos valores da integração na sociedade
aberta, sua aparente assepsia política formalizada
tecnicamente é recusada, sua eficácia enquanto
intervenção estatal é negada.

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Esta efervescente contestação surge no meio profissional


com base na convergência de três vetores:
•A revisão crítica que se processa na fronteira das ciências
sociais, levando à impugnação do funcionalismo, do
quantitivismo e da superficialidade que impregnavam as
ciências sociais e as instituições de Serviço Social;
•O segundo vetor era o deslocamento sociopolítico de
outras instituições cujas vinculações com o Serviço Social
eram notórias: as Igrejas, a católica em especial nas
discussões operadas na América Latina, com novas
interpretações teológicas ( Teologia da Libertação), que
justificavam posturas anticapitalistas e antiburguesas,
provocando um reposicionamento político-social, durante
o pontificado de João XXIII.

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•O movimento estudantil, que dinamiza, no molde


particular da contestação global, na reprodução da
categoria profissional, nas escolas de formação.
O chamado movimento de reconceituação do Serviço Social
é parte do processo de erosão do Serviço Social tradicional.
É no marco da reconceituação que pela primeira vez, de
forma aberta, o Serviço Social vai recorrer à tradição
marxista.

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