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SESSÃO DE GT

Grupo Temático 10: Trajetórias e Disposições Sociais em meio às


Reconfigurações do Mundo do Trabalho
 
 APRESENTAÇÃO
Estratégias empresariais, redes relacionais e as articulações entre
formalidade e informalidade do trabalho: o caso das atividades
extrativas minerais na Paraíba
 
 
Expositor: José Aderivaldo Silva da Nóbrega (TDEPP/UFCG)
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INTRODUÇÃO
• O artigo discute as conexões entre formalidade e informalidade do trabalho nas atividades
de extração e beneficiamento mineral na Paraíba.

• Para tanto, tem foco na análise das estratégias empresariais que envolvem controle
territorial, com monopólio de títulos minerários, e a cooptação das redes de relações
pessoais para controle dos trabalhadores e para acessar recursos que viabilizem o
funcionamento da atividade mineral.

• Nossa hipótese é a de que os empreendimentos de extração e beneficiamento mineral


obtém mais vantagens nas regiões onde as trajetórias de vida são marcadas por laços
de dependência pessoal, fragilidade no acesso ao direito à exploração da terra e suas
riquezas, além de um ambiente político facilmente cooptado pelos agentes
econômicos. Isso torna mais fácil a intensificação da exploração do trabalho e menos
custoso o fornecimento de matérias primas.
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A metodologia envolveu consulta a dados secundários nos bancos públicos de informação sobre
o setor mineral (ANM). Além disso, utilizamos dados primários que coletamos durante a nossa
pesquisa de doutoramento ocorrida entre 2015-2019.

Recorremos ao debate sobre informalidade, particularmente, mencionando as abordagens que


consideram este fenômeno como expressão das transformações do capitalismo sem, no entanto,
apontá-lo como disfunção ou falha. Analisamos a construção sócio-política da informalidade
segundo um quadro social e econômico no qual coexistem estratégias (Bourdieu) de
sobrevivência, da parte dos trabalhadores garimpeiros, com a busca por ampliar o lucro em um
ambiente mais estabilizado de concorrência e de riscos atenuados (Filglstein), o que
favorece as empresas de beneficiamento mineral e, na ponta da cadeia, a industrias da
construção civil, sobretudo. Além da sobrevivência política daqueles que querem manter uma
rede de apoiadores com penetração entre garimpeiros e suas famílias.
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UMA CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE O SETOR MINERAL NO


BRASIL
• Processos geológicos deram origem a rochas compostas de substâncias muito
variadas e o seu aproveitamento econômico depende da dimensão da jazida, do tipo de
substância do mercado internacional.

• Essa distribuição natural das jazidas é muito desigual de modo que, em algumas
regiões, é mais abundante a ocorrência de minerais metálicos, especialmente, ferro,
enquanto que em outras, são os não metálicos, como caulim.

• Além disso, as quantidades de minério justificam a exploração em larga escala, em


processos mecanizados e, portanto, implicam investimentos de capital.
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Os Estados do Pará
e de Minas Gerais
são os líderes da
Participação das principais substâncias no valor produção mineral
da Produção Mineral Comercializada (2019). brasileira. Neles se
concentram a
exploração de
caulim (Belém-PA),
Ferro (Conceição de
Mato Dentro,
Alvorada,
Brumadinho,
Mariana etc.)

Na PB, a mineração está concentrada nos não-metálicos,


particularmente, rochas ornamentais, feldspato e caulim. Tais
substâncias, à exceção das rochas ornamentais, são vendidas na
própria região havendo algumas vendas para o Sul e o Sudeste.
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• No território paraibano, das minas de caulim e de feldspato, são extraídos, em média 10 mil toneladas
de minério bruto por mês, o que as enquadra como minas de pequeno porte, segundo classificação da
ANM.

• Os processos extrativos, no caso do feldspato, a lavra é a céu abeto e são usadas algumas máquinas
escavadeiras, rompedores de pedra;

• No caso do caulim, prepondera o trabalho manual, com uso de explosivos, seguido da fragmentação
da rocha com picaretas seguida do transporte do minério para a superfície;

• As rochas ornamentais ainda são extraídas majoritariamente de forma manual com auxílio de
maquinas para realizar o acesso ao fundo da mina, usa-se explosivos para o desmonte da rocha e,
desta fase em diante, o trabalho é manual com auxílio de um guincho puxado por um motor à diesel.

• A localização desta atividade na PB ocorreu em razão dos investimentos estatais não só na


estruturação a referida atividade, como também da atração de uma indústria que demandava o tipo de
minério localmente existente.
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Tão importante como o tipo de minério existente foi a mão de obra disponível para extrair
minério cujos corpos, talhados pela atividade agrícola, estavam adaptados ao esforço
extremo de curvar a coluna centenas de vezes para escavar e carregar caixas de ferro que
içam o minério para a superfície. Além do mais, são pessoas imersas numa estrutura de
relações de dependência pessoal, de poder de controle exercido por proprietários de terra,
de pobreza, baixa escolaridade e economia de subsistência.

A combinação das vantagens do minério, do trabalhador disponível para ser explorado, da


“tolerância” à precariedade extrema, da busca por valorização das propriedades rurais e da
oferta de estímulos estatais criou o ambiente ideal para que empresas de beneficiamento se
instalassem na região.
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• O MME reconheceu a região paraibana como área garimpeira e, como tal, ao menos em
teoria, os processos de regularização de área deveriam ser mais simples e objeto de apoio do
Estado para garantir que as populações locais pudessem ter a formalização do seu direito de
explorar a área.

• Os trabalhadores da extração se denominam garimpeiros. O fazem, sobretudo, quando se


veem compelidos a justificarem o modo como realizam a sua atividade extrativa. Mas, na
prática, temos uma trajetória laboral que oscila entre o trabalho agrícola e a extração mineral.

• São trajetórias marcadas pelos laços de dependência pessoal, sobretudo, para conseguir
trabalho (um roçado para plantar na meação, uma banqueta ou galeria para extrair minério, um
serviço na prefeitura). A instabilidade, a desproteção e a precariedade é uma característica
vivida por estes trabalhadores. Despossuídos da terra e dos direitos de minerar, estão à mercê
de quem lhes possa oferecê-los.
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Esse fato introduz de organização do trabalho composto de fatores novos e de características


históricas do trabalho. Assim, os fatores novos são:
 Um novo significado da terra como espaço produtivo, não mais apenas atrelado à agricultura e
pecuária, mas à mineração;
 O monopólio dos recursos da terra, não pelo proprietário do sítio, mas, pelo detentor do direito
de extração mineral. Os donos de sítio passam a ter dependência desta renda da terra para
complementarem os recursos que mantém funcionando a propriedade rural.
 A criação do assalariamento de trabalhadores especializados nas tarefas de beneficiamento
primário do minério.
 A mineração deixa de ser uma atividade sazonal (períodos de seca) e os trabalhadores da
extração mineral, os garimpeiros, (agricultores, desempregados urbanos) passam a se dedicar
permanentemente ao trabalho extrativo.
 Os políticos locais visualizam vantagens econômicas e eleitorais com a mineração. Empresários
locais se tornam políticos...
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Os fatores históricos são a dependência pessoal, a falta de acesso à terra e de participação


na riqueza por ela gerada, já que há uma monopolização de recursos naturais, uma relação
de trabalho absolutamente desprotegida e com remuneração que permite apenas a
subsistência das famílias. Acrescente-se que os proprietários da terra acumulam algum
benefício da exploração de suas áreas, não obstante, tenha que arcar com o passivo
ambiental gerado.

A estabilidade destes mecanismos de apropriação dos recursos naturais e de


exploração do trabalho depende de estratégias empresariais que consolidam o monopólio
da extração, a capacidade de formação de turmas de garimpeiros e a gerência política junto
aos órgãos estatais (ANM, CDRM, SUDEMA) e prefeituras para facilitarem o exercício
extrativo.
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FORMAS DE MONOPÓLIO DO DIREITO SOBRE AS ÁREAS MINERALIZADAS

Tipos de interessados
Municípios Pessoas Jurídicas Pessoas Jurídicas
Pessoas físicas
(Empresas) (Cooperativas)
Junco do Seridó 24 54 3
Pedra Lavrada 11 68 1
Santa Luzia 21 85 0
Várzea 6 18 2
Total por interessado 62 225 6
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PERFIS:
PESSOAS FÍSICAS: Atravessadores, funcionários de empresas de beneficiamento, membros
das famílias de donos de empresas de beneficiamento;

EMPRESAS: unidades de beneficiamento mineral instalada no município; indústria da


transformação (fábricas de cimento, de pisos) instalada nas capitais nordestinas ou em cidades
maiores; empresas exportadoras de rochas ornamentais; escritórios especializados em
regularização de áreas e repasse oneroso da licença para terceiros ou escritórios contratados
pelas empresas de beneficiamento ou indústria da transformação para conseguirem
monopolizar o direitos sobre os minérios.

COOPERATIVAS: Cooperativas de garimpeiros criadas pelo Estado da Paraíba.


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FORMAS DE CONTROLE TERRITORIAL

• A empresa tem funcionários que controlam quem trabalha na extração em dada área;
• É negociado com o proprietário da terra o pagamento da CONGA, tipo de compensação pelo
uso da propriedade para extrair minério, às vezes, faz o arrendamento de parte da
propriedade.
• A via da judicialização pode ser buscada em caso de extração por terceiros e indesejados.
• Há uma intimidação, sob a forma de ameaças verbais de denúncia à PF, ANM, Sudema.
• No caso das empresas de beneficiamento mineral do município, é prática corrente que seus
proprietários sejam também detentores de licenças para exploração mineral nas áreas.
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• A empresa que quer monopolizar o minério, mas, não está


fisicamente instalada na região do título (há casos de empresas do
ES na PB) contrata uma consultoria para realizar os trâmites para
regularização das áreas, controlar as atividade;

• O atravessador é figura fundamental e seu papel consiste não


apenas na arregimentação da força de trabalho, mas na própria
gestão da área que pertence à empresa que lhe contrata.
Diferentemente da empresa, o atravessador tem um enraizamento
social no município bastante consolidado. Isso lhe facilita o trabalho
de negociar a CONGA, formar turmas, viabilizar explosivos etc.
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CONTROLE DO TRABALHO:

- Pelo atravessador, alguém contratado pela empresa para arregimentar a força de trabalho
e gerenciar o processo extrativo.
- Pela priorização de turmas formadas seguindo a lógica das relações parentesco e de
vizinhança, atrelada à preferência por pessoas com elevado grau de vulnerabilidade social e
insegurança alimentar.
- Pelo uso da licença da área para manter os trabalhadores sob controle.
- Pelo pagamento por produção (quantidade de toneladas, quantidade de caminhões)
- Pelas negociações informais tentando descaracterizar a relação de trabalho. Discurso do
comprador de minério e não do patrão dos garimpeiros.
- Pela disposição de equipamentos fundamentais (guinchos, explosivos, transporte, pás,
picaretas).
- Pela intermediação de favores políticos junto a prefeitos etc.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A viabilidade dos empreendimentos mineradores, sobretudo em cadeias das quais eles sejam apenas
uma substância complementar/acessória, depende da minimização dos custos com o trabalho e com o
processo de regularização, extração e transporte do minério. Este rebaixamento de custo é possível
em contextos de extrema dependência de atividades primárias, serviços públicos ou programas de
transferência de renda para sobrevivência e onde, historicamente, as relações de trabalho sejam
pautadas pela dependência pessoal.

A relação entre formalidade e informalidade na mineração resulta, então, de uma combinação de


estratégias empresariais de controle dos territórios, facilitada pela capacidade dos agentes
econômicos de lidarem com a burocracia e de influenciarem a agenda estatal, com o controle do
trabalhador por meio de redes de turmas de garimpeiros espalhadas pelos rincões do Seridó, onde a
fiscalização tem dificuldade de acessar, mas que são muito familiares a estes trabalhadores e aos
atravessadores que os arregimentou.
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