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O Romance no domínio maior da narrativa

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Epopeia
Fábula
Apólogo
Crônica
Conto
Novela
Romance
Poema narrativo
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“Como uma grande música que se pode reescutar
infinitamente, também os grandes romances são feitos
para repetidas leituras.”
KUNDERA, Milan. Os Testamentos traídos:
ensaios. Tradução Teresa Bulhões Carvalho da
Fonseca, Maria Luiza Newlands Silveira. São
Paulo: Companhia das Letras, 2017.

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“A virtude paradoxal da leitura é a de nos
abstrair do mundo para achar-lhe um
sentido.”
PENNAC, Daniel. Como um romance.
Tradução Leny Werneck. Rio de Janeiro:
Rocco, 1993.

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DIREITOS DO LEITOR

1. O direito de não ler.


2. O direito de pular páginas.
3. O direito de não terminar um livro.
4. O direito de reler.
5. O direito de ler qualquer coisa.
6. O direito ao bovarismo (doença textualmente
transmissível).
7. O direito de ler em qualquer lugar.
8. O direito de ler uma frase aqui e outra ali.
9. O direito de ler em voz alta.
10. O direito de se calar.
PENNAC, Daniel. Como um romance.
6 Tradução
Leny Werneck. Rio de Janeiro: Rocco, 1993
“Um livro é apenas
um pequeno
amontoado de folhas
secas, ou então, uma
grande forma em
movimento: a
leitura.”
Jean-Paul Sartre
Situações
7
“Nada é humano se não aspirar ao imaginário.”
Romain Gary

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“Pois, sem andar mascarada, como é o caso de
milhares de outras ficções que nos cercam, nos
invadem e nos definem, a literatura diz o que deve ser
dito: “Sou uma ficção”, ela anuncia, amem-me pelo
que sou. Usem-me para experimentar sua liberdade,
para repelir os seus limites, para descobrir e animar
sua própria criatividade. Sigam os meandros dos meus
personagens e façam deles os seus, deixem que eles
expandam o seu universo. Sonhem-me, sonhem
comigo, nunca se esqueçam de sonhar.” HUSTON,
Nancy. A Espécie fabuladora. Tradução Ilana
Heineberg. Porto Alegre: L&PM9 Editores, 2012.
“A vida e o romancista”
“O romancista – tal é seu mérito e seu risco – está tremendamente
exposto à vida. Outros artistas se recolhem, pelo menos em parte;
fecham-se sozinhos por semanas a fio com uma travessa de maçãs e
uma caixa de tintas, ou com um rolo de pautas musicais e um piano.
Quando saem, é para esquecer e se distrair. Mas o romancista nunca
esquece e raramente se distrai. Enche o copo e acende o cigarro,
provavelmente goza de todos os prazeres da conversa e da mesa, mas
sempre com a sensação de que está sendo estimulado e manipulado
pelo tema de sua arte. Sabores, sons, movimentos, algumas palavras
aqui, um gesto ali, um homem entrando, uma mulher saindo, mesmo o
automóvel que passa na rua ou o mendigo que se arrasta pela calçada,
e todos os vermelhos, azuis, luzes e sombras da cena pedem sua
atenção e despertam sua curiosidade.”
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“É-lhe impossível deixar de receber impressões, assim como é
impossível a um peixe no oceano deixar de ter a água
passando pelas guelras. Mas, se essa sensibilidade é uma das
condições da vida do romancista, é evidente que todos os
escritores de livros duradouros sabiam controlá-la e usá-la
para seus fins. Terminavam o vinho, pagavam a conta e iam
embora sozinhos, para algum quarto solitário onde, com
esforço e hesitação, em agonia (como Flaubert), com luta e
precipitação, em tumulto (como Dostoiévski), dominavam,
fortaleciam e convertiam suas percepções no tecido artístico
que elaboravam.”

Woolf, Virginia. A arte do romance.


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Porto Alegre: L&PM
Editores Pocket. Edição do Kindle.
A fortuna de uma palavra

“A simples palavra “romance” evoca uma realidade


familiar carregada de conotações agradáveis: o
Simenon ou o James Bond que faz esquecer a
duração de uma viagem, a sequencia de raptos, de
conluios, de amores tempestuosos cujo fio
retomamos todas as noites na intimidade dum quarto
ou na praia, ao sol, o mundo pululante de Guerra e
Paz, heróis fictícios, figuras históricas, intrigas
fabricadas, batalhas verdadeiramente travadas,
aspirações confusas, ambições, filosofias da vida...
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“Romance”, portanto, identifica-se de imediato, a “lazeres”,
a “férias” do corpo e da imaginação, a “diversão”, no
sentido de que nos afasta da vida real para nos imergir num
mundo fictício. Na realidade, talvez o romance permite
atingir melhor a realidade e conhecê-la profundamente, mas
para o leitor vulgar o romance é, em primeiro lugar, uma
história complexa e inverossímil, encontros miraculosos,
heróis demasiado perfeitos e heroínas demasiado belas para
serem verdadeiros. (...) Assim, a palavra “romance”, como
as de “poesia”, (os poetas, esses sonhadores...) ou de
“teatro” (um gesto teatral...), deslizou com frequência para
um sentido pejorativo que testemunha indiretamente o
sucesso desses gêneros literários.” BOURNEUF, Roland e
OUELLET, Réal. O Universo do romance. Tradução de José
Carlos Seabra Pereira. Coimbra:13Almedina, 1976. p. 5-6.
“Um romance pode começar com a descrição estática do
cenário ou da cidade que servirá de pano de fundo para a
história – o mise-en-scène, como se diz no jargão de
cinema: como exemplos, temos a descrição sombria de
Egdon Heath no início de O regresso, de Thomas Hardy,
ou o retrato de Chandrapore, em prosa elegante e urbana,
com jeito de guia de viagem, na abertura de Passagem
para a Índia, de E. M. Forster. Um romance pode muito
bem começar no meio de uma conversa, como Um
punhado de pó, de Evelyn Waugh, ou as obras
idiossincráticas de Ivy Compton-Burnett. Pode começar
com uma apresentação cativante do narrador, “Me chame
de Ishmael” (Moby Dick de Herman Melville), ou com um
gesto rebelde contra a tradição literária da autobiografia:

LODGE, David. A arte da ficção. Porto


14 Alegre: L&PM
Editores Pocket. Edição do Kindle.
“Muitos romances começam com uma “história dentro
da história”, que explica como a história principal foi
descoberta ou descreve-a enquanto é contada a uma
plateia ficcional. Em O coração das trevas, o narrador
anônimo de Conrad descreve Marlow contando suas
experiências no Congo para um círculo de amigos
sentados no convés de um iole no estuário do Tâmisa
(“E esse também é um dos lugares escuros da terra”,
começa Marlow). A volta do parafuso, de Henry James,
é o diário de uma mulher já falecida, lido em voz alta
para os convidados de uma festa na casa de campo onde
se divertem com histórias de fantasmas e acabam se
surpreendendo talvez um pouco mais do que
esperavam.” LODGE, David. A arte da ficção. Porto
Alegre: L&PM Editores Pocket.15Edição do Kindle.
“...a primeira coisa que você deve querer saber é onde
eu nasci, e como foi a droga da minha infância, e o que
meus pais faziam e tudo mais antes de eu nascer, essas
merdas estilo David Copperfield, mas eu não estou a
fim de falar a respeito” (O apanhador no campo de
centeio, J. D. Salinger). O romancista pode começar
com uma reflexão filosófica – “O passado é uma terra
estrangeira: lá as coisas são de outro jeito” (L. P.
Hartley, O mensageiro) –, ou precipitar um
personagem ao perigo extremo já na primeira frase:
“Hale estava em Brighton havia menos de três horas,
quando soube que pretendiam matá-lo” (Graham
Greene, O condenado).

LODGE, David. A arte da ficção


16 . L&PM Editores
Pocket. Edição do Kindle.
“Se um viajante numa noite de inverno, de Italo
Calvino, começa assim: “Você está prestes a começar
o novo romance de Italo Calvino, Se um viajante
numa noite de inverno”. O Finnegans Wake de James
Joyce começa no meio de uma frase: “corridorrio,
passando Eva e Adão, da costa curva à beira da baía,
nos leva graças a um commodius vicus recirculador de
volta a Howth Castle e Arredores”. O trecho faltante
conclui o livro: “Ao longe ao largo ao léu amor ao
longo do” – e assim de volta ao início, como a água
que volta a circular no ambiente, do rio ao mar ao céu
à chuva e ao rio, como a incansável produção de
sentido na leitura da ficção.”

LODGE, David. A arte da ficção. Porto Alegre:


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L&PM Editores Pocket. Edição do Kindle.
Tem o romance uma história?

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E, assim, começou o
romance:
Na Idade Média:
a) Língua vulgar
b) Composições em língua
vulgar
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Os germes do romance como
fabulação:
c) Composições literárias de
cunho narrativo,
primitivamente em verso, com
fabulação intrincada e
envolvente
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1)Experiências romanescas da Idade Média tardia
I)Romance sentimental - fabulação acerca
do sentimento amoroso, reflexão sobre a
condição amorosa, número limitado de sequências
narrativas, final trágico, matriz da vertente psicológica
do romance.
Exs.: 1) Elegia de Madona Fiametta, 1343-1344
(Giovanni Boccaccio, 1313-1375)

21 Dante Gabriel Rossetti, 1878


Capítulo I – O NASCIMENTO DA PAIXÃO
 discurso da ama: persuadir Fiammetta da loucura do amor.
      discurso de Vênus: persuadir Fiammetta a se submeter ao amor.
Capítulo II – O AMANTE ANUNCIA SUA PARTIDA
       discurso de Fiammetta: persuadir seu amante a não abandoná-la.
Capítulo III. A ESPERA.
       solilóquio de Fiammetta: consideração da infidelidade de Pânfilo.
Capítulo IV. A ESPERA.
        solilóquio de Fiammetta: ciúme nascente.
Capítulo V. NOTÍCIA (FALSA) DO CASAMENTO DE PÂNFILO.
   solilóquio de Fiammetta: ela fala consigo mesma, em tom de lamentação.
          solilóquio de Fiammetta: dirigido a Pânfilo ausente para convencê-lo a
voltar.
          solilóquio de Fiammetta: dirigido à Fortuna, responsável por seus
infortúnios.
          solilóquio de Fiammetta: sobre a felicidade de uma vida em conformidade
com a Natureza: denunciar as paixões criminais da sociedade civilizada.
         solilóquio de Fiammetta: sobre a beleza, fonte de seus sofrimentos.
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Capítulo VI. NOTÍCIA (FALSA) DO AMOR DE PÂNFILO POR UMA
OUTRA MULHER.
solilóquio de Fiammetta: ao amante pérfido.
discurso da ama: persuadir Fiammetta a esquecer Pânfilo.
solilóquio de Fiametta: persuadir-se ao suicídio.
Capítulo VII. NOTÍCIA (FALSA)DO RETORNO DE PÂNFILO.
solilóquio de Fiammetta: persuadir-se da inocência de seu amante.

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2) História de dois amores (1488) - Enéas Sílvio Picolomini, futuro
Papa Pio II (1405-1464)

"A agradável história da nobilíssima e bela


senhora Lucrécia, da nobreza da Toscana, e de
seu amante Euríalo, muito agradável e deleitável
ao seu leitor". Título em Inglês, de 1553, já na
casa das 37 edições.

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2) Romance de cavalaria – enredo abordando
questões amorosas e aventuras, número expressivo de
sequências narrativas, final satisfatório para os heróis.
Exs.: Lancelot, ou o cavaleiro da carreta (romance cortês
em verso, (c. 1176-1181). escrito a pedido de Marie de
France, Condessa de Champagne.
Perceval, ou a história do Santo Graal (c. 1181-1191) -
Chrétien de Troyes (1130-1191), a partir de escrituras de
Filipe da Alsácia, conde de Flandres.

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“O conde ama justiça reta e lealdade e santa Igreja. Detesta toda vilania. É mais dadivoso do
que pensam. Dá segundo o Evangelho, sem hipocrisia nem artifício, dizendo: “Não saiba tua mão
esquerda o bem que fará a mão direita! Saiba-o apenas quem receber, e Deus, que vê todos os
segredos e conhece tão bem todos os mistérios que estão no coração e nas entranhas.”
Por que o Evangelho diz: “Que tua mão esquerda não saiba o que faz tua mão direita”? Porque
a mão esquerda significa glória falsa que vem de hipocrisia enganadora. Já a direita representa
caridade que não se vangloria de suas boas obras; ao contrário, dissimula-os tão que ninguém fica
sabendo, exceto aquele que tem por nome Deus e caridade. Deus é caridade. Deus é caridade; e
quem vive em caridade, segundo escreve São Paulo (em quem vi e li isso), em Deus e Deus nele.
Portanto, sabei em verdade que as dádivas do conde Filipe são de caridade. Porém jamais fala
disso a alguém, exceto o seu coração generoso que o incita a fazer o bem. Não vale então mais que
Alexandre, que nunca se ocupou de caridade nem de qualquer outro bem? Naturalmente não podeis
ter dúvida. E Chrétien não se empenhará em vão, ele que, por ordem do conde, ocupa-se em rimar a
melhor história jamais escrita em corte real. É o CONTO DO GRAAL, cujo livro o conde lhe
patrocinou. Vede agora como se desincumbe da tarefa.”
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“Quem pouco semeia colhe pouco. Quem quiser bela
messe lance o grão em terra tão boa que Deus lhe devolva
duzentas vezes, pois em terra que nada vale a boa semente
seca e definha.
Chrétien faz aqui semeadura de um romance a que dá
começo; e o semeia em tão bom lugar que sem proveito não
pode ficar. Pois trabalha para o mais nobre que já existiu no
império de Roma: o conde Filipe de Flandres, que vale mais
do que Alexandre, de quem cantam louvores por toda parte.
Mas Alexandre nem sequer se compara ao conde, que está
livre de todas as fraquezas e de todos os vícios que existiam
reunidos naquele rei.
Tal é o conde, qual nunca dá ouvidos a vil zombaria
ou tolice, sentindo pesar quando ouve falarem mal de
outrem, não importa quem seja.

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“Foi no tempo em que as árvores florescem, as folhas,
matas e prados enverdecem, os pássaros cantam
docemente seu latim pela manhã e todos os entes
inflamam-se de júbilo. Então, na Gasta Floresta
solitária, o filho da viúva levantou-se. Vivamente selou
seu cavalo de caça, pegou três dardos e saiu do solar
materno. Dizia consigo mesmo que iria ver os
gradadores que estavam semeando a aveia com doze
bois e seis grades.”
TROYES, Chrétien de. Perceval ou o romance do
Graal. Tradução de Rosemary Costhek Abílio. São
Paulo: Martins Fontes, 1992. p. 25-26.

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II) Renascimento
Ex: Diana (1558 -1559) -
Jorge de Montemor

III) Séculos XVI e XVII


1)Romance barroco – aproximado à
narrativa romanesca medieval, trama
acidentada, narrativas heroico-galantes

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Exs.: Astrée (1607-1616) - romance pastoril, em cinco partes, Honoré d’Urfé
(1568-1625)

Dom Quixote (1605 - 1616) (Cervantes,


1547-1616) Céladon e Astrée
Sátira do mundo romanesco de cavalaria.

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c.2 romance picaresco - descrição realista da sociedade e dos
costumes da época
Protagonista – pícaro, representação do anti-herói, indivíduo
rebelde, ao padrão de comportamento vigente em seu tempo.
Romance autobiográfico, efeito de palco giratório (MUIR, 1975, p.
), com o protagonista analisando a cena social.
Exs.: Vida de Lazarillo de Tormes (1554, anônimo)
Vida de Guzmán de Alfarache (1599, 1604) Mateo Alemán)

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c.3. A Princesa de Clèves (1678) (Madame de Lafayette)

Obra antecipatória do romance moderno.

Reescritas cinematográficas: Portugal, A Carta (Manoel de


Oliveira, 2000; Polônia, A Fidelidade (Andrzev Zulawiski,
2000)

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“Pois bem – disse ela, caindo de joelhos – vou fazer uma confissão
que nunca se fez a um marido. Mas a inocência de meu
comportamento e de minhas intenções me dá força. É verdade que
tenho motivos para me afastar da corte e desejo evitar os perigos que
às vezes rondam as pessoas da minha idade. Jamais dei provas de
fraqueza. Nem as aparentaria se ganhasse a liberdade de me afastar da
corte ou se ainda tivesse minha mãe para me valer. Por mais arriscada
que seja esta minha resolução, tomo-a com alegria para me conservar
digna de meu marido. Peço-lhe mil perdões se tenho sentimentos que
o desagradam. Ao menos nunca o desagradarei pelos meus atos. Penso
que para fazer o que faço é preciso muita amizade e estima por um
marido como jamais se teve. Tenha piedade de mim, ame-me ainda, se
puder.” LAFAYETTE, Madame de. A Princesa de Clèves. Tradução
de Léo Schlafman. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 122.
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d.1. Inglaterra
a) Daniel Defoe
Vida e extraordinárias e portentosas aventuras
de Robinson Crusoé de Yorque (1719)
Moll Flanders (1722)

b) Samuel Richardson
Pamela, ou a virtude recompensada (1740)
Clarissa Harlowe (1748)
c) Tobias Smolett
As Aventuras de Roderick Randon (1748)

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d.2. França
Abade Prévost
Manon Lescaux (1733)
b) Marivaux
Vida de Mariana (1741)
c) Jean-Jacques Rousseau
Júlia ou a Nova Heloísa (1774)

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d) Choderlos de Laclos
As Ligações perigosas (1782)
e) Bernardin de Saint-Pierre
Paulo e Virgínia (1788)
d. 3. Alemanha
Goethe
Werther (1774)

e) Final séc. XVIII e XIX


e. 1. romance negro, de terror ou gótico.
Horace Walpole
O Castelo de Otranto (1764)
Ann Radcliffe
Os Mistérios de Udolfo (1794)
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Mathew Lewis
O Monge (1796)
Mary Shelley
Frankenstein, ou o Prometeu moderno (1818)
Charles Maturin
Melmoth, o vagabundo (1820)

e.2. romance histórico (Walter Scott, Victor Hugo)


Romance de personagem - Benjamin Constant, Alexandre
Dumas
e.4. romance poético e simbólico - Novalis e Gérard de Nerval
e.5. romance de análise e crítica social - Balzac, Dickens

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f) Segunda metade do séc. XIX

Romance realista/naturalista

Autores expressivos: Flaubert, Maupassant, Zola, Dostoiévski,


Machado de Assis

“Sinto-me estéril como um cadáver, completamente


entorpecido. Minha maldita Bovary me atormenta e
desconcerta... Há momentos em que isso tudo me faz
querer morrer como um cachorro.”

PROSE, Francine. Para ler como um escritor. Tradução


Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar,
2008. Edição do Kindle. 38
g)Século XX
g.1. romance de análise psicológica - Marcel Proust,
Virgínia Woolf
g.2. romance simbólico e alegórico - Novalis, Gérard de
Nerval
g.3. romance de dimensões míticas – James Joyce
g.4. Romance neo-realista - Alves Redol, Graciliano
Ramos
g.5. romance existencialista – Jean-Paul Sartre, Albert
Camus
g.6. “nouveau roman” - Nathalie Sarraute, Alain Robbe-
Grillet
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CALVINO, Italo. “As Odisséias na Odisséia. “ In: Por que
ler os clássicos. Tradução de Nilson Moulin. São Paulo:
Companhia das Letras, 1993.
“Se examinarmos as fábulas populares, verificaremos que elas
apresentam dois tipos de transformação social, sempre com
final feliz: primeiro de cima para baixo e depois de novo para
cima; ou então simplesmente de baixo para cima. No primeiro
tipo existe um príncipe que por alguma circunstância
desastrosa se vê reduzido a guardador de porcos ou alguma
outra condição miserável, para depois reconquistar sua
condição real; no segundo tipo, existe um jovem que não
possui nada desde o nascimento, pastor ou camponês e talvez
também pobre de espírito, que por virtude própria ou ajudado
por seres mágicos consegue se casar com a princesa e tornar-
se rei. (...) 40
Poderíamos pensar que as fábulas do segundo tipo são as que exprimem
mais diretamente o desejo popular de uma reviravolta dos papéis sociais
e dos destinos individuais, ao passo que as do primeiro tipo deixam
aparecer
tal desejo de forma mais atenuada, como restauração de uma hipotética
ordem precedente. Mas, pensando bem, os destinos extraordinários do
pastorzinho e da pastorzinha representam apenas uma ilusão miraculosa
e consoladora que será depois largamente continuada pelo romance
popular e sentimental. Todavia, os infortúnios do príncipe ou da rainha
desventurada associam a imagem da pobreza com a ideia de um direito
subtraído,
de uma justiça a ser reivindicada, isto é, estabelecem no plano da
fantasia, onde as ideias podem deitar raízes sob a forma de figuras
elementares) um ponto que será fundamental para a tomada de
41
consciência social da época moderna, da Revolução Francesa em diante.
“Um por um, o romance descobriu à sua própria maneira, por sua própria lógica, os diferentes aspectos da
existência: com os contemporâneos de Cervantes, ele se pergunta o que é a aventura; com Samuel
Richardson, começa a examinar o que se passa no interior”, a desvendar a vida secreta dos sentimentos; com
Balzac, descobre o enraizamento do homem na História; com Flaubert, explora a terra até então incógnita do
cotidiano; com Tolstói, inclina-se sobre a intervenção do irracional nas decisões e no comportamento
humanos. Ele sonda o tempo: o inapreensível momento passado com Marcel Proust; o inapreensível
momento presente com James Joyce. Interroga, com Thomas Mann, o papel dos mitos que, vindos dos fundo
dos tempos, teleguiam nossos passos. Et caetera, et caetera.” (Kundera, 1988, p. 10-11)

“O romance não examina a realidade, mas sim a existência. A existência não é o que aconteceu, a existência é
o campo das possibilidades humanas, tudo aquilo que o homem pode tornar-se, tudo aquilo de que é capaz.
(Kundera, 1988, p. 42)
O romancista não é nem historiador nem profeta: ele é explorador da existência. (Kundera, 1988, p. 43)
KUNDERA, Milan. A Arte do Romance. Tradução de Teresa Bulhões C. da Fonseca e Vera Mourão. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1988.
42
43
▪ BARTHES, Roland et al. Análise Estrutural da Narrativa. Tradução Maria
Zélia Barbosa Pinto. Petrópolis: Vozes, 1971.
▪ BERNARDO, Gustavo. O livro da metaficção. Ilustrações Carolina
Kaastrup. Rio de Janeiro: Tinta Negra Bazar Editorial, 2010.
▪ BORGES FILHO, Osires; BARBOSA, Sidney (Org.). Poéticas do espaço
literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz, 2009.
▪ BRADBURY, Malcolm & McFARLANE, James. Modernismo: guia geral.
Tradução Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
▪ BRADBURY, Malcolm. O Mundo moderno: dez grandes escritores.
Tradução Paulo Henriques Britto. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
▪ BRANDAO. Luís Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo:
Perspectiva; Belo Horizonte, FAPEMIG, 2013.
▪ DOURADO, Autran. Poética de romance, matéria de carpintaria. São Paulo:
DIFEL, 1976.

44
FORSTER, E. M. Aspectos do romance. Tradução Maria Helena Martins. Porto
Alegre: Globo, 1974.

GEREMEK, Bronislaw. Os Filhos de Caim: Vagabundos e miseráveis na


literatura européia (1400-1700). Tradução Henryk Siewierski. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.

GOLDMANN, Lucien. Sociologia do Romance. Tradução Álvaro Cabral. Rio de


Janeiro: Paz e Terra, 1976.

JAMES, P.D. Segredos do romance policial: Histórias das histórias de detetives.


Tradução José Rubens Siqueira. São Paulo: Três Estrelas, 2012.

KUNDERA, Milan. A Arte do Romance. Tradução Teresa Bulhões C. da


Fonseca e Vera Mourão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.

MATTOS, Franklin. A Cadeia secreta: Diderot e o romance filosófico. São


Paulo: Cosac Naify, 2004.

MAZZARI, Marcus Vinicius. Labirintos da aprendizagem. Pacto faústico,


romance de formação e outros temas de Literatura Comparada. São Paulo: Ed.
34, 2010.

______ . Romance de formação em perspectiva histórica: O Tambor de lata de 45


▪ MENDILOW, Adam Abraham. O Tempo e o romance.
Tradução Flávio Wolf. Porto Alegre, 1972.
▪ MEYER, Marlyse. Folhetim: uma História. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
▪ MEYERHOFF, Hans. O Tempo na Literatura. Tradução
Myriam Campello. São Paulo: McGraw-Hill, 1976.
▪ MORETTI, Franco (Org.). O Romance: a cultura do
romance. Tradução Nise Bottmann. São Paulo: Cosac Naify,
2009.
▪ MUIR, Edwin. A Estrutura do Romance. Tradução Maria da
Glória Bordini. Porto Alegre: Globo, 1975.
▪ NUNES, Benedito. O Tempo na Narrativa. São Paulo, Ática,
1988.
46
MORETTI, Franco (Org.). O Romance: a cultura do romance. Tradução Nise
Bottmann. São Paulo: Cosac Naify, 2009.
MUIR, Edwin. A Estrutura do Romance. Tradução Maria da Glória Bordini. Porto
Alegre: Globo, 1975.
NUNES, Benedito. O Tempo na Narrativa. São Paulo, Ática, 1988.
POUILLON, Jean. O Tempo no Romance. Tradução Heloysa de Lima Dantas. São
Paulo: Cultrix, 1974.
ROBERT, Marthe. Romance das origens, origens do romance. Tradução André
Telles. São Paulo: Cosac Naify, 2007.
WATT, Ian. Mitos do Individualismo Moderno: Fausto, Dom Quixote, Dom Juan,
Robinson Crusoé. Tradução Mário Pontes. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
 
47
 

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