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DAVID RICARDO

(1772-1823)

Prof. Ricardo Feijó


VIDA DE RICARDO
 David Ricardo (1772-1823) nasceu em Londres, filho de
imigrantes judeus.
 Homem de negócios, operador da bolsa, enriqueceu ainda
jovem.
 Vivendo em uma época bastante conturbada em meio a grandes
mudanças políticas, sociais e tecnológicas, ele era defensor de
idéias liberais.
 Em 1799, inicia-se no campo da Economia Política com a leitura
da obra de Smith.
 Em 1808, já participa do debate público em torno de
questões monetárias.
DISCUTINDO INFLAÇÃO...
 Em jornais da época, discute a suspensão, ocorrida na Inglaterra em
1797, da conversibilidade da moeda em ouro.
 Interpreta a causa da inflação da época nas emissões descontroladas de
moeda e não no aumento do preço dos cereais, como se supunha.
 Esboça uma versão da teoria quantitativa da moeda, na qual, dados os
hábitos de pagamento da comunidade, os preços guarda-riam
proporcionalidade com o volume de moeda vis-à-vis a quantidade de
bens e serviços transacionados.
 A inflação tinha sido criada pela guerras napoleônicas e não havia até
então um referencial teórico para uma análise monetária.
BULIONISTA
 Ricardo, ao lado de Thornton e Malthus, era rotulado de
bulionista e acreditava que a volta do padrão-ouro traria
a almejada estabilidade dos preços.
 Havia também o campo dos que pensavam de modo
diferente. Para banqueiros, ministros e antibulionistas
em geral, a moeda era gerada endogenamente no sistema
de crédito e, assim, não poderia ocorrer emissão em
excesso.
 Explicavam a inflação pelo lado real, localizando sua
causa nos gastos públicos desenfreados e na queda das
exportações.
O ALTO PREÇO DO OURO
 Um ano após o primeiro artigo versando sobre a queda
da libra no Morning Chronicle, em 1809, Ricardo
refuta os críticos em O alto preço do ouro, exposição
teórica abstrata que faz uma análise de longo prazo.
 Nomesmo ano, apresenta o ensaio Propostas para um
numerário seguro
PROPOSTAS PARA UM NUMERÁRIO
SEGURO
 Em 1810, Ricardo apresenta o ensaio Propostas para
um Numerário Seguro, de grande impacto na opinião
pública e que serviu de base para a criação de um co-
mitê de especialistas que decidiria pela volta da conver-
sibilidade uma década depois.
 O regime de padrão-ouro duraria até a Primeira Guerra
Mundial.
 Ricardo também se envolveu na discussão sobre a Lei
dos Cereais, que proibia a importação de trigo pela
Inglaterra.
EXPLICAÇÃO MONETARISTA
 Ricardo popularizou a explicação monetarista para o
problema da inflação, mas a análise de Thornton era
mais sutil sobre as relações entre a moeda e o lado real
da economia.
 As teses de Thornton deram origem à influente escola
monetária na qual variações da moeda bancária
deveriam acompanhar os estoques de ouro.
 Em 1844, a Lei Bancária estabelece o controle das
emissões monetárias com flexibilidade para acompanhar
os fluxos de ouro.
RICARDO TAMBÉM SE ENVOLVEU NA
DISCUSSÃO SOBRE A LEI DOS CEREAIS, QUE
PROIBIA A IMPORTAÇÃO DE TRIGO
PELA INGLATERRA
SOBRE A INFLUÊNCIA DO BAIXO
PREÇO DO TRIGO SOBRE OS LUCROS
DO CAPITAL

 Na exposição de suas idéias sobre a Lei dos Cereais,


Ricardo desenvolve em 1815 o ensaio analítico Sobre a
Influência..., em que mostra a inconveniência de
restrições à importação.
 O ensaio inspirou o livro Princípios de Economia
Política e Tributação, de 1817, a principal obra de
Ricardo.
 Ainda no ensaio, Ricardo argumenta que barreiras à
importação beneficiam produtores menos eficientes,
aumenta a proporção dos rendimentos destinada ao
pagamento de renda da terra e dos salários, neste
último caso porque cresce o preço da cesta básica.
 As transferências para os setores menos dinâmicos da
economia debilitam o crescimento econômico em prejuízo da
nação.
 Em suma, o aumento no preço do trigo e o consequente
aumento nos salários reduzem as taxas de lucros, retardando o
crescimento.
 As ideias contidas no ensaio não convenceram os opositores e
levaram Ricardo a debater com James Mill e Malthus, os
principais economistas da época.
 Já famoso, Ricardo foi eleito representante na Câmara dos
Comuns.
PRINCÍPIOS DE ECONOMIA POLÍTICA
E TRIBUTAÇÃO
O livro de 1817 conheceu três edições até 1823, ano da
morte de Ricardo.
 Nesta obra, Ricardo revela por completo o seu estilo: alto
nível de abstração, bom domínio da lógica e no uso de
raciocínio dedutivo, grande rigor científico e capacidade
de abstração; em que pese o pouco uso de material
empírico.
 Os Princípios de Ricardo representam uma reelaboração
dos ensaios anteriores.
O PROBLEMA CENTRAL DA ECONOMIA
POLÍTICA:
 Quais as leis que regulam a distribuição do
produto nacional entre renda, lucro e salários?
 Ao contrário do que se interpreta comumente,
Ricardo não despreza a questão smithiana do
crescimento, pelo contrário, tal questão continua
central, mas para ele o crescimento depende de
como os rendimentos são repartidos.
 No fundo, a questão que Ricardo coloca é
subsidiária ao problema do crescimento.
LUCRO COMO RESÍDUO
 Ricardo tem em mente que o lucro é a variável que regula o crescimento
econômico, mas não se contenta com a análise de Smith que analisa a
trajetória das taxas de lucro sendo determina pela distância relativa entre
oferta de capitais e possibilidades de investimentos. Para Smith, ao longo
do tempo os salários crescem mais que os preços finais e, no processo de
acumulação de capital, oportunidades de investimento lucrativo ficam
cada vez menores.
 Ricardo constata que a relação entre aumento de capitais e queda nos
lucros não vinha acontecendo.
 Propõe então uma interpretação do lucro como resíduo, após a dedução dos
demais custos de produção. Então é chave entender como se dá a
distribuição, ou seja, como são formados os salários e a renda da terra.
A TEORIA DO VALOR DE RICARDO
 O passo inicial é investigar a questão do valor.
 Na seção I do capítulo 1, Ricardo começa citando a
observação smithiana do paradoxo do valor. Conclui
dizendo que a utilidade não é a medida do valor de troca,
já que estão em relação inversa, mas ela é essencial
para que haja valor.
 Existindo utilidade, o valor de troca ou é derivado da
escassez, da disponibilidade em face da demanda, caso
de bens raros como estátuas e pintu-ras famosas, ou
advém da quantidade de trabalho incorporado na
mercadoria, caso da imensa maio- ria dos bens que são
reproduzíveis.
QUAL O FUNDAMENTO DO VALOR?
 Ricardo critica Smith quando este considera como
fundamento do valor ora a quantidade relativa de
trabalho incorporado, nas sociedades primitivas, ora a
quantidade de trabalho comandado ou encomendado, nas
sociedades avançadas.
 Trabalho incorporado e comandado não são a mesma
coisa.
VARIAÇÕES NA PRODUTIVIDADE...
 No exemplo smithiano, se um castor é trocado por
dois cervos é porque o castor requer, por exemplo,
um dia de trabalho e o cervo apenas a metade disto.
 Se houver mudanças na produtividade relativa, como
aumento na eficiência em que o cervo é apanhado,
então o mesmo castor é agora trocado por, digamos,
quatro cervos.
 Equiparando-se o trabalho, de lado a lado, a
antiga proporção 1:2 é agora 1:4.
 Quatro cervos são trocados por cada castor, e não mais apenas dois, a
despeito da quantidade de trabalho incorporada na obtenção do castor
ser a mesma.
 Antes era comandado o trabalho de dois castores, agora o de quatro.
Em unidades de mercadorias, e não de tempo, há mais trabalho
comandado no segundo caso, mesmo que o trabalho incorporado para
se obter o castor tenha permanecido o mesmo
 Se o aumento de produtividade tivesse sido o mesmo nas duas caças,
no tempo em que se obtém 4 cervos também se conseguiriam 2
castores e a proporção 1:2 permaneceria inalterada
 Então, na hipótese de que o impacto de variações na produtividade não
seja o mesmo em todos os setores, trabalho comandado e incorporado
não significam a mesma coisa.
O VERDADEIRO FUNDAMENTO DO
VALOR
 Ricardo assevera que o trabalho comandado
depende de uma medida ela mesma variável,
como unidades de trigo e ouro, cujos valores
flutuam com a oferta e a demanda.
 O montante de trabalho comandado depende de
tudo o que afeta os salários. Variações no preço
do trigo, por exemplo, podem provocar variações
no trabalho comandado. Já o trabalho
incorporado é um padrão invariável, ele sim o
verdadeiro fundamento do valor.
COMO COMPARAR TRABALHO?

 Na seção II do mesmo capítulo inicial, Ricardo discute como o


trabalho incorporado poderia ser quantificado numa unidade
comum diante da heterogeneidade do trabalho.
 Ele argumenta que os valores de diferentes categorias de
trabalho são “acertados no mercado” em função da destreza
relativa e das horas de trabalho.
 A teoria não precisa se preocupar em determinar esses valores,
pois as dificuldades em se comparar trabalho são
automaticamente resolvidas no mercado.
 O mesmo intervalo de tempo em trabalho pode conter
diferentes valores se levarmos em conta as habilidades
relativas e as intensidades de trabalho.
 Em tempo relativamente curto, entretanto, a posição
relativa nos valores entre os bens permanece
aproximadamente a mesma, e as desigualdades nos
trabalhos ficam invariáveis.
O TRABALHO INCORPORADO NO
CAPITAL
 Na seção III, Ricardo argumenta que mesmo na
sociedade primitiva é imprescindível o uso de algum
capital.
 Mesmo que um castor e dois cervos sejam
apanhados no mesmo tempo, a proporção que
iguala valores não será 1:2 se considerarmos o
trabalho passado de construção da arma, digamos,
maior no caso do castor.
 Então a teoria do valor-trabalho incorporado deve
ter em conta o trabalho incorporado no capital.
 Como o capital tem uma certa durabilidade, em cada
período em que é empregado ele transfere apenas uma
parcela do seu valor.
 Quanto menos durável o instrumento em questão
maior a parcela de seu valor transferida, no cômputo
do valor do bem produzido com ele.
 Ricardo, de início, argumenta que a relação entre
salários e lucros não afeta o valor relativo dos bens,
pois influencia de igual modo todas as atividades.
O QUE DETERMINA O VALOR
RELATIVO?
O valor relativo das mercadorias só dependeria das
proporções entre o trabalho total, incluindo
transporte e comercialização.
 Sempre que dado bem economiza na utilização de
trabalho cai o seu valor relativo.
 Ricardo nota ainda que redução de trabalho em
edifícios, máquinas e meios de transportes afeta não
somente um único bem. Uma parte se reflete no
valor dele, mas o restante é distribuído por todos os
bens para os quais igualmente contribuem aqueles
capitais.
 Os capitais têm diferentes durabilidades e utilizam
na sua fabricação distintas quantidades de trabalho.
 Além disso, certos capitais apoiam diretamente a
mão de obra envolvida na obtenção de um bem de
consumo final, enquanto outros são investidos na
fabricação de ferramentas, implementos,
edificações e maquinarias que somente em
período futuro irão contribuir para o produto final.
CAPITAL FIXO E CAPITAL CIRCULANTE
 Constatada a heterogeneidade do capital,
Ricardo define os conceitos de capital fixo e
capital circulante.
 A diferença entre eles leva em conta o tempo de
retorno financeiro do capital. O capital
circulante é rapidamente consumido e perece,
precisando ser reproduzido em intervalos
pequenos. Já o capital fixo é consumido
lentamente e atende a muitas rodadas de
fabricação.
EXCEÇÃO À LEI FUNDAMENTAL DO
VALOR
 Pode-se ter o mesmo montante de capital, em valor, mas
diferentes composições entre capital fixo e circulante.
 Quando se levam em conta as diferenças no grau de
duração do capital fixo e a variedade na proporção entre
esses dois tipos de capitais, o valor relativo dos bens finais
passa a depender não apenas da proporção entre os
trabalhos incorporados mas também do próprio salário ou,
como Ricardo refere, do valor do trabalho.
Onde se tem capitais com diferente composição...
“Uma subida de salários não pode deixar de
afetar desigualmente os bens produzidos em
tão diferentes circunstâncias.”
EXEMPLOS RICARDIANOS EM QUE
TAXA DE LUCRO AFETA VALORES
RELATIVOS
 Ricardo fornece um exemplo em que as taxas de lucros
podem afetar o valor relativo de dois bens.
 Cem trabalhadores estão envolvidos na produção de
trigo e outros cem na construção de máquinas, no
período de um ano.
 Ao final dele, ambos os produtos têm o mesmo valor,
por terem o mesmo número de trabalhadores
demandados.
 Pensa-se agora num período ampliado de dois anos, em
que as máquinas, no segundo ano, utilizam outros cem
trabalhadores na produção de tecido de lã ou artigo de
algodão.
 Considerando-se que as máquinas tenham se depreciado totalmente, o valor do
bem final seria o equivalente a cem trabalhadores por dois anos ou 200 por ano.
 O trigo, se produzido novamente no segundo ano, teria o mesmo valor, no
cômputo total dos dois anos, do bem manufaturado.
 No entanto, o valor do trigo no primeiro ano foi integralmente repartido entre os
agentes participantes que recebem rendimentos, e gasto por eles.
 As máquinas, por sua vez, não se dissiparam no final do primeiro período, mas
foram postas a serviço por todo o período seguinte. Com efeito, o proprietário
delas não desfrutara do lucro no primeiro ano, preferindo reinvesti-lo para o
segundo ano e recebe então um lucro pelo risco e espera no negócio.
 Ricardo conclui o exemplo dizendo que o valor do
bem manufaturado deve exceder o valor do trigo, ou
200 trabalhadores por ano...

“Para compensar o prazo maior que deve transcorrer


até que o produto de maior valor chegue ao
mercado.”

Já que o trigo é consumido em bases anuais e a


manufatura somente a cada dois anos.
 Então, os valores diferem também pela quantidade de
capital fixo, ou trabalho previamente acumulado.
 O valor do produto manufaturado deve incorporar os 200
trabalhadores/ano mais a parcela que corresponde ao lucro
sobre investimento em maquinaria.
 É claro que mudanças nas taxas de lucro afetariam
novamente os valores relativos entre manufatura e trigo.
A RELAÇÃO ENTRE SALÁRIO E LUCRO
 A relação entre salário e taxa de lucro no longo prazo
depende de uma série de suposições que ficarão
explicitadas no modelo de Ricardo.
 No curto prazo “não pode haver um aumento no valor
do trabalho sem uma diminuição nos lucro”.
 Assim, um aumento de salários deprime os lucros e
portanto a relação entre valores fica, no exemplo, menos
favorável à manufatura.
 O preço do bem com maior proporção de capital fixo
diminui em relação aos que contém menos dele.
CAPITAIS COM DIFERENTE DURAÇÃO...
 Na seção V, ao analisar o caso de bens com mesma
composição do capital, mas cujos capitais apresentam
diferente duração, Ricardo raciocina logicamente que o
bem com capital de menor duração se comporta como o
trigo, isto é, como um produto com pouco capital fixo.
 A conclusão imediata é que o valor de troca relativo de
bens produzidos com capital mais durável cai com
aumento de salários, ao mesmo tempo em que o valor de
troca de bens com capital mais perecível é favorecido.
 Viceja a hipótese subjacente de que as máquinas não
ficarão mais caras com aumento de salários, já que tal
aumento não poderia ser repassado a preços, uma vez
que, se isso ocorresse, o aumento no lucro atrairia
capitais de outros setores, com o efeito de reduzir preço
e lucro do maquinário.
DO QUE DEPENDE O VALOR?

 A teoria do valor de Ricardo revela-se, desta forma, mais


sofisticada do que parecia à primeira vista. O valor depende do
trabalho incorporado, da composição do capital e da duração.
 Por conseguinte, os valores de troca relativos passam a depender
de salário e lucro, em contradição com o que o próprio Ricardo
afirmara no começo do mesmo capítulo dos Princípios.
 Qualquer mercadoria, em comparação a outras, está sujeita a
oscilação em seu valor, mesmo que tenha empregado uma
quantidade fixa de trabalhadores em certo período.
COMO É POSSÍVEL UMA MEDIDA DE
VALOR INVARIÁVEL? (TEMA DA SEÇÃO VI)

 Ricardo escreve:
“Quando o valor relativo dos bens se altera, seria
interessante dispor de meios que indicassem quais os que
descem e quais os que sobem em valor real.”
RICARDO SE PERGUNTA:
 Se é possível comparação dos bens com um padrão de valor
invariável, o qual não estaria sujeito a nenhuma das flutuações
que afetam os outros bens.
 Para ele, não existe bem que possa oferecer esse padrão,
mesmo a moeda.
 Mesmo se a produção de moeda metálica consumisse sempre
a mesma quantidade de trabalho, a moeda ainda assim estaria
sujeita a variações derivadas de mudanças salariais devido às
diferentes proporções de capital fixo e circulante...
“Necessárias não só para produzir como para se obterem os
outros bens cuja alteração de valor desejamos calcular.”
POR UMA MEDIDA INVARIÁVEL
DO VALOR...
O ouro não é produzido com a mesma composição
de capital dos outros bens, nem utiliza capital fixo
de igual duração e nem leva o mesmo tempo para
ser colocado no mercado.
 Assim, a importante questão da necessidade de uma
régua inflexível para se mensurar valores,
independentemente da divisão do produto social,
fica em aberto. Ela só seria resolvida de modo
consistente muito tempo depois por Piero Sraffa, em
pleno século XX.
NOVAMENTE A RELAÇÃO ENTRE
SALÁRIO E
LUCRO
 A seção VII discute algo mais sobre a natureza do
dinheiro e argumenta que como o valor dele é variável
não se pode estabelecer uma relação mecânica direta e
inversa entre variações de salários e de lucros.
A DISTRIBUIÇÃO DOS RENDIMENTOS
 Estabelecida a teoria do valor, Ricardo se lança a
examinar diretamente a questão central de como os
rendimentos são distribuídos na sociedade, tema dos
capítulos seguintes.
 O lucro é determinado como resíduo, e assim o problema
da distribuição é atacado como um problema de
determinação de salários e renda da terra.
A TEORIA DE SALÁRIOS DE RICARDO
 Ricardo toma emprestado a teoria da população de Malthus
argumentando que o salário real de equilíbrio deve se manter
no nível mínimo de subsistência.
 Não há muito o que comentar desta hipótese. Ela foi muito
contestada na época e era uma ideia algo solta. Ricardo falava
que esse mínimo de subsistência não era o mínimo fisiológico
para a sobrevivência, mas correspondia a um certo padrão de
vida das classes subalternas estipulado pelas condições
históricas locais, dependente de fatores ligados ao hábito e ao
costume.
 Um aumento de salário acima deste mínimo
elevaria a população trabalhadora e reduziria os
lucros. O efeito seria duplamente perverso: ao
mesmo tempo em que cresce a oferta de trabalho
se reduz a demanda de mão de obra, o que só
pode resultar em queda de salário trazendo-o
para o nível inicial de subsistência.
A TEORIA DA RENDA DA TERRA
DE RICARDO
 A teoria da renda da terra é mais sofisticada e merece uma
consideração detalhada.
 Na hipótese de livre concorrência, onde a mesma taxa de lucro se
impõe em diferentes propriedades rurais, a renda da terra devia-se
à escassez de terras e à diferenciação das produtividades entre
elas. No capítulo 2 dos Princípios, Ricardo começa definindo a
renda da terra como
“A porção do produto da terra paga ao seu proprietário pelo uso
das forças originais e indestrutíveis do solo.”
Que não deve ser confundida com a parcela paga pela utilização
do capital empregado para melhorar a qualidade da terra.
 As leis da renda e do lucro são muito diferentes.
 Em um país dotado de terras disponíveis ricas e férteis não
seriam cobradas rendas da terra. A diferença de qualidades
das terras dá origem à renda, regulada pela intensidade
dessa diferença.
 Supondo-se a existência de três faixas de terras, em que o
emprego da mesma quantidade de fatores produtivos, dá
ensejo á produção de 100, 90 e 80 unidades de cereais.
100 90 80
 A renda da terra é o excedente acima dos custos básicos de
produção na terra de pior qualidade das que foram
ocupadas.
 O produtor da terra marginal que produziu apenas 80
unidades vende o cereal a um preço que deve cobrir
salários e lucros normais.
 Este mesmo preço regula o valor nas vendas do produto
das outras faixas mais internas.
 A idéia de homogeneidade de salários, lucros e preços,
entre as diferentes terras, assegurada pela hipótese de livre
concorrência e intensa arbitragem entre mercados, leva ao
aparecimento de um resíduo excedente nas terras de
qualidade superior.
 Tal resíduo dá origem ao pagamento da renda da terra,
que equivale exatamente ao seu valor in natura. Assim,
paga-se 20 de renda na faixa central e 10 na faixa
intermediária. A terra marginal não percebe renda.
RENDA POR DIFERENÇAS NA APLICAÇÃO
DO CAPITAL
 As diferenças entre as forças produtivas da terra também
regulam a renda no caso em que a mesma faixa de terra é
usada em quantidades cada vez maiores de capital.
 Indo-se de k a 2k unidades de capital aplicado, o produto
aumenta 85% (na primeira unidade de capital aumentara
100%); paga-se uma renda de 15% do produto associado ao
primeiro lote de capital.
 O retornos decrescentes nas aplicações de capital fazem com
que terras com cultivo menos intensivo, com maior retorno
por unidade de capital, paguem uma renda pelo critério
explicitado anteriormente.
A RENDA É COMPONENTE E NÃO
RESÍDUO
 Em qualquer caso, o fenômeno que se observa é
o de que com terras de pior qualidade ou de uso
mais intensivo o produto se torna mais caro, já
que a produtividade dos fatores diminui. É a
elevação de preço com a progressão no uso da
terra que resulta no pagamento da renda da terra.
“O trigo não encarece por causa do pagamento de
renda, mas, ao contrário, a renda é paga porque o trigo
torna-se mais caro.”
 O preço é fornecido pela produtividade da última porção
do capital. Depende, portanto, da produtividade do
capital.
 A renda não é componente do preços das mercadorias
como em Smith. Preços dependem apenas de salários e
lucros.
COMO EVOLUEM OS RENDIMENTOS?
 A distribuição da renda com o processo de acumulação de
capital pode ser vista na dimensão temporal a partir da
articulação das teorias básicas de salário e renda da terra. À
medida que novas inversões de capital são feitas, os preço
dos alimentos tende a crescer pela queda na produtividade
dos fatores.
 Com isso, os salários por unidade de capital crescem, mesmo
que os salários reais permaneçam constantes no nível de
subsistência. A renda, também medida em unidade de capital,
cresce acompanhando o volume ampliado de excedentes
nas condições inframarginais nas quais o capital é mais
produtivo.
 Jáque os lucros são obtidos como resíduo, dada
a diferença entre o produto total e os custos em
salários e renda da terra, os lucros por unidade
de capital decrescem não apenas porque parcelas
dos custos estão se ampliando, mas também
porque o produto por unidade de capital é
decrescente (pela fertilidade inferior das terras
marginais e pela lei da produtividade
marginal decrescente no cultivo intensivo).
O GRÁFICO ABAIXO ILUSTRA ESSA
IDÉIA

Produto/K
Variável/K .................................................
............................................................................
..............................................................................................
......................................................................................................
..................................................................................................
Lucros/K
.............................................................................
................
.......................................................................................
.............................................................................. (Salário + Renda)/K
......................................................................
........................................................
...........................................
Salário/K

Capital K
VISÃO PESSIMISTA:
 O lucro por unidade de capital tenderia a zero com o avanço
na acumulação de capital. A taxa de lucro agrícola
determinaria a taxa geral de lucro, por arbitragem, e sendo
assim, também haveria a queda na taxa de lucro na indústria.
A queda do lucro leva ao estado estacionário, no qual a
economia deixaria de crescer (K constante).
 Tal situação poderia ser adiada pelas inovações tecnológicas
na agricultura ou pela abertura ao comércio internacional que
baratearia os preços dos cereais, argumento teórico também
usado por Ricardo contra a Lei dos Cereais.
 Em suma, há uma visão pessimista no modelo de Ricardo, mas
o resultado final pode-se postergar.
MODELO:
 Passando ao largo das questões monetárias e interpretando
Ricardo como um modelo de um único pro- duto, suas
conclusões podem ser facilmente formalizadas.
 Começando pela teoria do valor. Sendo w o salário e T a
quantidade de trabalho incorporado, ambos em unidade de
tempo, e sendo r a taxa de lucros, o valor v de um bem é a
soma do custo da produção direta mais o custo do capital

v = [wT + r(wT)] + [wTc + r(wTc)] (1 + r) = w(1+r)T + w(1 + r)2Tc


 Dois bens com a mesma composição entre capital fixo e
circulante tal que T’=T e Tc’=Tc, teriam o mesmo valor v’=v.
 Se há diferenças na relação entre esses capitais

v/v’ = [(1+r)T + (1 + r)2Tc]/[(1+r)T’ + (1 + r)2Tc’.


Portanto, a relação entre valores depende da taxa de juros.
MODELO NA TEORIA DA RENDA
DA TERRA DE RICARDO :
 Sejam T e T’ quantidades de trabalho utilizadas
respectivamente na terra marginal e na terra mais
fértil.
 x e x’ são as quantidades de cereais produzidas
nestas mesmas terras. A produtividade a do
trabalho na terra marginal é a = x/T e na terra
mais fértil é a’=x’/T’.
 w é o salário em quantidade de cereais.
 O lucro é x – wT = (a – w)T e a taxa de lucro é r
=(x – wT)/wT=a/w – 1
 Pela hipótese de arbitragem, w = w’ e r = r’.
 Na terra mais fértil, os salários pagos são iguais a wT´,
o lucro r.wT’ = (a/w – 1)wT’ = (a – w)T’.
A renda é dada por x’ – lucro – salário total pago =
a’T’ – (a – w)T’ – wT’ = (a’ – a)T’.
À medida que ocorre a acumulação de capital cresce
o fator (a’ – a) e a renda paga na terra mais fértil.
Mesmo que os salários reais w permaneçam
constantes, a massa de salários wT cresce na medida
em que cresce o número de trabalhadores T ; e os
lucros totais declinam pela queda na produtividade do
trabalho a.
300 1,2
250 1
200 0,8 lucro
150 0,6 renda
100 0,4 taxa de lucro
50 0,2
0 0
100 95 90 85 80 75 70 65 60 55 50 45

produção na terra marginal


CONSIDERAÇÕES FINAIS
 Desta forma, relata-se a teoria básica de Ricardo do
crescimento econômico e da distribuição da renda.
 Como indica o título completo da obra, Princípios de
Economia Política e Tributação, questões de política
tributária são bastante discutidas ao longo do livro.
 Ele estava preocupado com o efeito da incidência de
impostos. Ricardo discute o que define a capacidade de
pagamento de impostos de um país. Diz que ela depende
do valor monetário do rendimento de cada cidadão e do
valor monetário das mercadorias que ele habitualmente
consome.
TEORIA DAS VANTAGENS
COMPARATIVAS
 Ricardo é autor da conhecida “Teoria das Vantagens
Comparativas” que demonstra serem vantajosas as trocas
internacionais mesmo numa situação em que determinado país
tivesse maior produtividade que o outro na produção de todas
as mercadorias.
 Esta teoria parte da premissa de que os valores nas trocas
internacionais não são determinados pela quantidade de
trabalho dos bens envolvidos, já que não há mobilidade de
mão de obra entre países. Assim, duas mercadorias
intercambiadas podem não representar a mesma quantidade de
trabalho.
 Ricardo supõe que, no comércio entre Inglaterra e
Portugal, uma certa quantidade de vinho é transferida
em troca de outro montante de tecido. Em cada caso, é
requerida determinada quantidade de mão de obra,
representada por horas de trabalho como na tabela a
seguir:
PAÍS HORAS DE TRABALHO HORAS DE TRABALHO
POR UNIDADE DE TECIDO POR UNIDADE DE
VINHO
INTERCAMBIÁVEL
Portugal 90 80
Inglaterr 100 120
a
 Mesmo que Portugal só empregue 90 horas de trabalho para
produzir uma unidade de tecido e 80 para a produção de
vinho, enquanto a Inglaterra produz as mesmas unidades
empregando 100 e 120 horas de trabalho respectivamente,
ainda assim é de interesse a Portugal especializar-se na
produção de vinho, pois esse país, ao fazê-lo, poupa 10 horas
de trabalho, só precisando de 80 das 90 horas de trabalho
anteriormente alocadas na produção de tecido, que são
transferidas para gerar uma unidade intercambiável de vinho
que poderá ser trocada pela produção de tecidos da
Inglaterra.
 Estas 10 horas de trabalho poupadas representam um
ganho de bem-estar para os portugueses. O outro país,
ao se especializar em tecidos, mantém a mesma oferta
interna de vinho, com as importações de Portugal, e
ainda poupa 20 horas de trabalho que é a diferença entre
120 e 100. Portanto, a Inglaterra também tem um ganho
de bem-estar.
OUTRAS TESES RICARDIANAS
 Ricardo discute outros pontos importantes do
comércio internacional, como as dificuldade de
transferência de capitais entre países, os problemas
do equilíbrio automático no padrão ouro e o efeito
da abertura ao comércio mundial sobre as taxas de
lucro de um país.
 Eleargumenta que o comércio exterior, de fato, não
afeta as taxas de lucro, mas beneficia o país pelo
aumento no volume de bens obtidos e também do
nível de emprego doméstico.

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