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A QUEM SERVEM OS CURRÍCULOS?

A EDUCAÇÃO E A
HISTÓRIA RELEGADAS AO TECNICISMO E À
MERCANTILIZAÇÃO
EDUCAÇÃO PARA O MERCADO E O
MERCADO PARA A VIDA – OS
CURRÍCULOS E SEUS PROJETOS
■ A Educação convertida em Mercadoria (Parte 1;
■ As relações entre setores empresariais e a
formulação dos novos currículos (Parte 2);

■ O que os documentos nos dizem? (Parte 3)


PARTE 1
A promessa de inovação aos novos tempos –
As críticas à escola
■ A primeira diz respeito à noção de que a escola não atende mais
as expectativas dos jovens, que a escola precisa modernizar-se
para atender uma geração hiperconectada. A escola, assim,
perde seu caráter de espaço da reflexão e dá lugar às lógicas das
informações cruas. Em segundo lugar, a escola é acusada de ter
um sistema avesso ao mundo do trabalho, pelo qual os jovens
não aprendem uma “profissão” e, assim, não encontram boas
colocações no mercado de trabalho, querendo-se converter as
escolas em centros de profissionalização. (SEPÚLVEDA, 2021. Pág.
197)
A questão tecnicista no currículo

■ “Habilidades e competências” têm sido as palavras que


acompanharam os professores não apenas do Mato
Grosso. No nosso caso particular, uma espécie de tabela
ocupou os espaços dos objetivos e métodos dos planos
de ensino e de aula. Sem um debate real, que
mobilizasse efetivamente a categoria dos trabalhadores
da educação, os projetos político-pedagógicos (PPP)
foram sendo alterados pelas direções escolares sem um
amplo debate nas comunidades escolares.
(SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 198-199)
■ As discussões que englobam a inserção do currículo de História
nos DRCs e na própria BNCC trazem nossa ciência como mero
auxiliador dos componentes curriculares que se querem
obrigatórios, a saber, Língua Portuguesa e Matemática. Tal
desmerecimento com as outras áreas de conhecimento pode ser
visto à luz do projeto econômico ligado à Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o seu
Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), que
consideram como matérias cruciais Língua Portuguesa,
Matemática, Ciências e inovação tecnológica. (SEPÚLVEDA,
2021. Pág. 200)
Habilidades para o mercado
■ Ao apontarmos para tais questões sobre a reforma do currículo e
para o espaço das disciplinas que seriam básicas, ao lado das
“optativas”, e se observarmos a ligação, por exemplo, apenas do
Instituto Ayrton Sena com o setor empresarial voltado à educação,
constatamos que, não sem interesses, é feita a defesa dessa
hierarquia entre as disciplinas do currículo escolar, tendo em vista que
as competências e habilidades postas na BNCC vão ao encontro do
Pisa, da OCDE. Os itens de avaliação do Pisa têm o propósito de
verificar a leitura, habilidades matemáticas, de ciências e tópicos
inovadores. No site do Inep há um vídeo explicativo, no qual se diz que
o Pisa objetiva “avalia(r) se estudantes de 15 anos estão adquirindo as
habilidades sociais e emocionais para que sejam bem-sucedidos”.
(SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 201)
O efeito dessa monetarização da vida
e da educação
■ Tanto professores quanto estudantes estão à mercê deste projeto que
quer inculcar que o necessário é um saber-fazer, o domínio das
técnicas e a colheita de resultados. A educação trabalha em outro
tempo, no qual os “resultados” não são imediatos, mas construídos, e
demandam tempo. [...] Os professores, por sua vez, encontram-se
num limbo entre a pedagogização de suas formações e a cobrança
exacerbada do cumprimento da burocracia. Deixam de ser intelectuais
(SAID, 2005). Eles não dominam sua ciência e, por isso, passam a ser
meros aplicadores. Destituídos do papel de professor, ou seja,
intelectual, preocupado em apresentar o mundo velho aos novos e
construir uma possibilidade de renovação do mundo (ARENDT, 2000),
eles são responsabilizados e ao mesmo tempo “des”responsabilizados
pela formação dos nossos jovens. (SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 203)
A CONSTRUÇÃO DOS CURRÍCULOS
(BNCC E DRC) (Parte 2)
Os conselheiros do CNE e a primeira
versão da BNCC
■ Maria Izabel Azevedo Noronha (Não empossada) foi indicada pela Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), pela União Nacional
dos Estudantes (Une) e pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes).

■ Após revogar escolhas de Dilma, Temer nomeia 12 conselheiros de educação | Agência


Brasil (ebc.com.br)
BNCC, 2016. Pág. 8-9
Os conselheiros do CNE em 2016

■ Nilma Santos Fontanive (Coordenadora do projeto Jovem de Futuro (Unibanco)


■ Suely Melo de Castro Menezes (Confederação Nacional de Escolas Particulares de
Ensino)
■ Antônio Araújo Freitas (Palestras para o Congresso Brasileiro da Educação Superior
Particular)
■ Antônio Carbonari Netto (Fundador da Anhanguera)

Temer revoga indicações e nomeia 12 conselheiros na educação | Exame


BNCC, 2017. Pág. 13
A proposta dos DRC’s – Concepções
para a educação básica (Vídeo)
■ 1) O documento traz, de forma equivocada, o entendimento sobre
identidade de gênero. Identidade de gênero é a forma como
alguém se identifica (BUTLER; RIOS, 2009), mas o documento
traz identidade de gênero como orientação sexual: “Todas as
pessoas possuem identidades de gênero, seja ela heterossexual,
homossexual, travestis ou transexual” (DRC, 2019, p. 64). Tal
definição equivocada aparece no DRC (DRC, 2019a) e nos
permite perceber como o direito de alguns sujeitos são negados a
partir da condição mesma de torná-los excepcionais.
(SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 204)
■ 2) Ao trazer a noção de “adaptação dos currículos às realidades
escolares”, o documento confunde modalidade (rural, indígena,
etc.) com adaptação, trazendo a educação quilombola, do campo,
indígena e especial como “adaptação”. O tópico “As diversidades
educacionais na Educação Básica”, mescla diversidade e
modalidades de ensino. Coloca, na mesma ordem, educação do
campo e questões de gênero; educação especial e educação
ambiental. Onde se entende que o DCR trataria das múltiplas
diversidades encontradas na escola (classe, racial, subjetividades
etc.), encontra-se tudo aquilo que socialmente está fora de uma
certa lógica. Ao juntar temas tão complexos num mesmo balaio, o
documento nos diz de forma veemente que determinados grupos
se encontram alocados na excepcionalidade e não dentro do
projeto (DRC, 2019a, p. 54-98). (SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 204)
■ 3) O tópico “Princípios norteadores para a ação didática”
(DRC, 2019a, p. 23- 53) elenca uma série de
procedimentos do que se deve fazer em sala de aula e
na escola. Entre eles, encontramos:
■ a) Práticas de resolução de conflitos pelo método dos
círculos restaurativos ― amplamente usada na justiça
com o nome de “justiça restaurativa” (PIEDADE; SILVA,
2015), pretendendo-se mediar o conflito entre
ofendido/agressor, criminoso/vítima ―, apresentando a
ideia de que o protagonismo do estudante deve ser
impulsionado pelo professor, considerando o estudante
responsável pela sua formação (DRC, 2019a, p. 26-27);
(SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 205)
■b) Orienta o professor a como organizar a sala de aula (DRC,
2019a, p. 29);

■c) Misturadas ao imbróglio anterior sobre como atuar em sala


de aula, há duas páginas voltadas aos direitos humanos, que
finalizam em considerações sobre as “Competências
intrapessoais”, “Competências híbridas” e “Competências
interpessoais”, considerando tais conceitos como basilares para o
desenvolvimento das ações pedagógicas (DRC, 2019a, p. 32- 34);
(SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 205)
■d) Traz uma concepção de aprendizagem ativa, na qual o professor passa
a ser um mediador, não do conhecimento, mas do aprender-fazer do estudante
(DRC, 2019a, p. 25; DRC, 2019a, p. 35-36);

■e) Traz as Atividades Orientadoras de Ensino (AOE), utilizando-se das


teorias do desenvolvimento para criar uma técnica de aplicabilidade do como
aprender;
■ f) Nesse último tópico que elencamos, o texto do DRC (2019a) traz questões
acerca da funcionalidade da avaliação pedagógica e, ao final, propõe a
Taxonomia Bloom (DRC, 2019, p. 10; DRC, 2019a, p. 12; DCR, 2019a, p. 44;
DRC, 2019a, p. 51-53), apresentado como método para organizar as formas de
avaliar e ensinar (DRC, 2019a, p. 39); (SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 205)
■ Se o documento quer se vender como moderno e progressista em
alguns momentos, o projeto de exclusão posto as entrelinhas,
enterra tal falácia. Ao definir uma única forma de aprender e
ensinar, o DRC quer mesmo sujeitos passivos e doceis. Para tal,
condição fundamental é quebrar o professor, destituindo-o de sua
condição de cientista. Ao misturar as modalidades de ensino com
eixos temáticos, inclusive já previstos nos PCN’s; ao “instruir”
técnicas de como ensinar, reafirma, que nem estudante, nem
professor poderão ser autônomos. Autonomia no seu sentido
Freiriano é uma afronta para esse projeto, pois sabem que, se o
professor não for autônomo, os estudantes também não poderão
ser. Essa é a aposta deles.
PARTE 3
Entre a primeira versão da BNCC e o documento
que temos hoje:

■ Sobre o objetivo da ciência histórica: (2016, Pág. 241)


Sobre o objetivo da ciência histórica -
BNCC, 2017. Pág. 398
Sobre o objetivo da ciência histórica -
DRC, 2019. Pág. 249
Sobre o currículo em História (DRC,
2019)

UNIDADE TEMÁTICAS

TÓPICOS ISOLADOS

INSERÇÃO DA HISTÓRIA REGIONAL


■ Assim, estudar o local e o regional passa a ser considerado fundamental na
compreensão do processo histórico, pois possibilita ao estudante entender a história a
partir do seu cotidiano, das suas relações sociais, dos seus hábitos, costumes e das
memórias construídas culturalmente e na diversidade social e cultural presentes na
sociedade (DRC, 2019. Pág. 247)
■ O ensino da História, no século XXI, requer novos objetos, problemas e abordagens
sobre os fatos históricos e sociais. E ainda serve como ferramenta, que instrumentaliza o
indivíduo a participar do processo de construção do conhecimento histórico e ao pleno
exercício da cidadania. (DRC, 2019. Pág. 248)
■ Ensinar história local e regional permite ao aluno possibilidades de conhecer o seu
entorno, pois trata das especificidades, consolidando sua referência de um mundo em
constante movimento, indo do micro para o macro e também do macro para o micro,
situando-o numa visão ampla, crítica e reflexiva que objetiva constituir uma identidade
do local para o global. (DRC, 2019. Pág. 251)
6º ano do Ensino Fundamental (Anos finais)
UNIDADES TEMÁTICAS OBJETO DE CONHECIMENTO

História: tempo, espaço e formas de registros A questão do tempo, sincronias e diacronias: reflexões
sobre o sentido das cronologias.
A periodização do processo histórico do Estado de
Mato Grosso.
Formas de registro da história e da produção do
conhecimento histórico.
As origens da humanidade, seus deslocamentos e os
processos de sedentarização.

A invenção do mundo clássico e o contraponto com outras Povos da Antiguidade na África (egípcios), no Oriente
sociedades Médio (mesopotâmicos) e nas Américas (pré-
colombianos) Os povos indígenas originários do atual
território brasileiro e seus hábitos culturais e sociais.
Registros e fontes regionais como instrumentos no
processo de formação da cultura material e imaterial
mato-grossense.
Espaços territoriais e aportes culturais, científicos,
sociais e econômicos das diferentes culturas
indígenas que compõe o Estado de Mato Grosso.
HABILIDADES (Justificativa do vídeo)

HABILIDADES

OBJETOS DO CONHECIMENTO
7º ano do Ensino Fundamental (Anos finais)

UNIDADES TEMÁTICAS OBJETO DE CONHECIMENTO


O mundo moderno e a conexão entre sociedades Organização cosmológica, política, econômica, social e
africanas, americanas e europeias cultural dos povos indígenas de Mato Grosso antes da
chegada dos europeus.

A organização do poder e as dinâmicas do mundo colonial A resistência indígena em Mato Grosso no processo de
americano expansão territorial da américa portuguesa.

A expansão portuguesa na América (EF07HI12.1MT) O movimento


Compreender a constituição bandeirantista.
territorial de Mato Grosso a Os conflitos entre os
partir da expansão da bandeirantes e indígenas
américa portuguesa. em Mato Grosso na
expansão do território.
O ciclo da mineração e a
constituição da capitania de
Mato Grosso
OBJETOS DO CONHECIMENTO

■ O que se espera de um tópico chamado “Objetos do Conhecimento” é a noção de que se


utilizaria do saber científico da ciência Histórica para, junto com os estudantes, por
exemplo, analisar fontes orais, registros arqueológicos, entre outros e, a partir desses
objetos, articular conhecimentos e concepções que preconizassem o debate, ao invés de
tratar de forma separada, por exemplo, o que é uma fonte histórica e o que foi a
ocupação indígena da América. (SEPÚLVEDA, 2021. Pág. 210)
8º ano do Ensino Fundamental (Anos finais)
UNIDADES TEMÁTICAS OBJETO DE CONHECIMENTO

Os processos de independência nas Américas A independência do Brasil e sua influência em Mato


Grosso, seus desdobramentos e impactos para a
cultura local.
O Brasil no século XIX A questão da terra em Mato Grosso.

Mato Grosso no século (EF08HI23.1MT) A transferência da Capital de Vila Bela de


XIX Compreender o Santíssima Trindade para Cuiabá.
contexto político, Os impactos da independência do Brasil para
econômico e cultural de Mato Grosso.
Mato Grosso no século A Rusga e sua articulação com outros
XIX e seus movimentos regenciais.
desdobramentos Mato Grosso no contexto da Guerra do
sociais e culturais. Paraguai.
A economia mato-grossense pós-guerra do
Paraguai.
A resistência dos quilombos e comunidades
tradicionais
9º ano do Ensino Fundamental (Anos finais)
UNIDADES TEMÁTICAS OBJETO DE CONHECIMENTO

O nascimento da República no Brasil e os processos históricos O coronelismo em Mato Grosso.


até metade do século XX A modernização e transformação da paisagem urbana na
capital mato-grossense.
A questão afro-brasileira durante a República (até 1964).
Protagonismo negro em Mato Grosso durante a República.
As mudanças conceituais de diversidades étnico-raciais e a
ideia de gênero no Brasil do século XX.
Os movimentos sociais no Brasil do século XX.

Modernização, ditadura civil-militar e redemocratização: o Brasil Constituição de Mato Grosso e os impactos políticos na
após 1946 região.
A Marcha para o Oeste e o desenvolvimento das regiões de
Mato Grosso.
Colonização do norte de Mato Grosso após a década de
1970.
Conflitos agrários e indígenas em Mato Grosso. A divisão
geopolítica do estado de Mato Grosso
Mato Grosso no contexto da globalização: a questão da
violência contra população.

História Recente Os conflitos do século XXI e a questão do terrorismo.


Pluralidades e diversidades identitárias na atualidade.
As pautas dos povos indígenas no século XXI e suas formas de
inserção no debate local, regional, nacional e internacional.
CONSIDERAÇÕES

■ HISTÓRIA COMO CONHECIMENTO AUXILIAR

■ SIMPLIFICAÇÃO DAS ESPECIFICIDADES CIENTÍFICAS

■ NOVO X VELHO – A IMPOSSIBILIDADE DA DRC EM INCORPORAR AS


DISCUSSÕES TEÓRICAS DA HISTÓRIA

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