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ou apaixonado por bons livros desde a infância. Começo o meu dia de
trabalho às cinco horas da manhã. Diariamente, sem exceção, reservo em
média três horas para a leitura. Nos finais de semana, essa carga horária é
substancialmente maior: de seis a oito horas. Leio compulsivamente sobre
diferentes áreas do saber humano – direito, história, filosofia, teologia, ética,
antropologia, mitologia, política, religião, ciência, psicologia, administração geral,
marketing, recursos humanos, finanças, governança corporativa,
sustentabilidade do planeta, liderança, etiqueta social e empresarial, carreira
executiva, coaching mentoring, biografias etc. Faço isso porque, além de ser um
grande prazer me debruçar sobre essas fontes de conhecimento, o meu trabalho
exige que eu me mantenha bem informado e persiga novos saberes todos os
dias. Aprendi com o Mestre Salomão que “O conhecimento prolonga os anos de
vida” e que “Feliz é o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire
conhecimento; porque melhor é o lucro que ela dá do que o da prata, e melhor a
sua renda do que o ouro mais fino. Mais preciosa é do que pérolas” (Provérbios
3.13-15). E, ainda mais, como frisou Samuel P. Newman (1835) no seu trabalho,
Elements of Political Economy “O homem para conduzir alguns ramos de
negócio”, deve ter muito conhecimento, tanto do estado do mundo em geral
como dos detalhes de empregos e empreendimentos particulares”.
Aprendi muito cedo em minha vida que o homem que não lê não tem qualquer
vantagem sobre aquele que não sabe ler, e que “A crítica é o fenômeno do
pensamento criativo”, como ponderou o historiador Bert James Loewenberg.
Infelizmente, a arte de pensar de maneira inteligente, objetiva, profunda,
perspicaz e independente está morrendo cada vez mais rápido em nossos dias.
Em geral, muitos preferem a superficialidade. É um tipo de epidemia que assola
até mesmo renomados jornalistas, acadêmicos, cientistas, empresários,
executivos, consultores, professores e estudantes, entre outras pessoas. Muitos
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são acusados de plágio pela imprensa: Chris Anderson, autor do livro “Free”;
Suzana Doblinski, consultora e autora de “Será que pega bem” (Revista Exame);
William Swanson, executivo norte-americano autor de “Swanson”s Unwritten
Rules of Management. Recentemente, a Universidade de S.Paulo abriu uma
investigação para apurar um suposto plágio da reitora Suely Vilela Sampaio e
mais dez pessoas. (R7 notícias, 4 de novembro de 2009) e Terra.com 4 de
novembro de 2009).
No Brasil, essa realidade é mais crítica e preocupante: 74% dos brasileiros não
compreendem o que lêem. E se não compreendem o que leem, como podem
pensar com isenção e independência? Como podem se indignar diante das
verdadeiras aberrações do dia-a-dia da vida nacional e exercerem a sua
cidadania? É impossível. É mais provável que sejam influenciados pelos
espertalhões de plantão, sejam eles professores, consultores, líderes religiosos
ou políticos com objetivos distorcidos de seus verdadeiros papéis. É sabido que
onde homens e mulheres não verbalizam livremente suas posições, não há
democracia. A democracia não se faz apenas com o voto depositado na urna a
cada quatro anos, mas também com o direito de ir e vir, de falar livremente e
sem ter medo de mordaça.
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Cultivo ao longo dos últimos seis anos o hábito de preparar resenhas sobre
diferentes livros através de coluna na revista Você S.A. Movido pelo sentimento
de busca de novos saberes, adquiri recentemente o livro, “Inteligência
Mercadológica – A Inteligência que Gera Negócios e Oportunidades de Trabalho”,
do consultor empresarial José Augusto Minarelli. Infelizmente, ao lê-lo criteriosa e
criticamente, senti uma sensação de vazio intelectual.
Reconheço que não é nada fácil fazer uma crítica sobre uma obra, qualquer que
seja o seu autor. E quando o autor é um colega de profissão, essa missão se
torna ainda mais difícil. Tenho plena consciência de que muitos virarão as costas
em repúdio a minha posição ao escrever e publicar este trabalho. Isso não me
intimida ou me constrange. Pelo contrário, me desafia, visto que é muito fácil
nadar a favor da correnteza como um pedaço de madeira apodrecida ou uma
garrafa plástica vazia. Prefiro o caminho feito pelos salmões que sobem rio
acima. Prefiro os caminhos menos trilhados. “Prefiro os que me criticam
porque me corrigem aos que me bajulam porque me corrompem” como
apropriadamente escreveu Santo Agostinho. Com essa minha posição em mente,
quero propor ao leitor que acompanhe minha análise crítica do livro “Inteligência
Mercadológica” e julgue por si mesmo se elas são procedentes ou não. Começo
destacando algumas citações escritas pelo autor:
Uma leitura, mesmo que rápida e superficial do livro, revelará ao leitor que
o livro é calcado e estruturado com base nas seguintes obras: “Marketing
de Serviços: a Empresa com Foco no Cliente” de Valarie A. Zeithaml e Mary
Jô Bitner; “Princípios de Marketing” de Philip Kotler e Gary Armstrong;
“Administração de Marketing” de Philip Kotler, “Inteligência – Um Conceito
Reformulado” de Howard Gardner, renomado psicólogo da Universidade de
Harvard; “O Poder da Persuasão” de Robert B. Cialdine e “Você é a sua
melhor marca” de Jussier Ramalho. Não se trata, portanto, “da prática, do
contato e da observação de pessoas”, como afirma o autor.
No caso das histórias relatadas no livro, quase todas elas não têm qualquer
relação aparente com a sua vivência no assessoramento a diretores e
gerentes de empresas.
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mas sim uma transcrição Ipsis litteris do trabalho do renomado
psicólogo e autor consagrado (pág. 11).
Howard Gardner
“Num cenário empresarial, inteligente era quem previa
oportunidades comerciais, assumia riscos calculados, construía
uma organização, mantendo as contas equilibradas e os
acionistas satisfeitos” (Howard Gardner, “Inteligência – Um
Conceito Reformulado,” pág. 11).
J. A. Minarelli
“Já nas empresas, inteligente era quem previa oportunidades
comerciais e administrava uma organização”. (J. A. Minarelli,
“Inteligência Mercadológica” pág. 2). Qual é a diferença
entre os dois?
Howard Gardner
“Em escolas tradicionais, inteligente era quem dominava as
línguas clássicas e a matemática, particularmente a geometria”
(Howard Gardner, obra citada, pág. 11 e 12).
J. A. Minarelli
Na primeira página de Inteligência Mercadológica o autor escreve:
“Assim, nas escolas tradicionais, classificava-se como inteligente
a pessoa que dominava as línguas clássicas e geometria”. J. A.
Minarelli excluiu a palavra matemática, (J. A. Minarelli,
“Inteligência Mercadológica” pág. 1). Afinal, quem copiou
quem?
Howard Gardner
“Dois mil anos atrás, funcionários imperiais chineses aplicavam
exames difíceis para identificar quem estava apto para ingressar
na burocracia e dirigi-la”. (Howard Gardner, obra citada, pág.
12).
J. A. Minarelli
“Na China de dois mil anos atrás, aplicavam-se exames rigorosos
para classificar e contratar funcionários para a burocracial
imperial” (J. A. Minarelli, obra citada, pág. 2).
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Howard Gardner
“Na Idade Média, líderes da Igreja procuravam estudantes que
fossem ao mesmo tempo estudiosos, sagazes e devotos”
(Howard Gardner, obra citada, pág. 12).
Howard Gardner
“No início do Século XX, inteligente era a pessoa capaz de ser
mandada para os confins de um império e executar ordens com
eficiência” (Howard Gardner, obra citada, pág. 11).
J. A. Minarelli
“No início do Século XX, inteligente era quem executava com
eficiência nos recantos mais distantes as ordens das metrópoles.
(J. A. Minarelli, obra citada pág. 2).
Howard Gardner
“Ao aproximar-se a virada do milênio, porém, dois novos
virtuosos intelectuais passaram a ser altamente valorizados: o
analista de símbolos e o mestre de mudanças” (Howard
Gardner, obra citada, pág. 12).
J. A. Minarelli
“No final do milênio, destacavam-se os analistas de sistemas e os
líderes de mudanças”. Minarelli sumariza o parágrafo escrito por
Howard Gardner. (J. A. Minarelli, obra citada pág. 23).
Howard Gardner
“Influenciados por Confúcio, os chineses valorizavam
tradicionalmente quem tinha dons para a poesia, a música, a
caligrafia, a arte de manejar o arco e o desenho” (Howard
Gardner, obra citada pág. 11).
J. A. Minarelli
“Chineses Imperiais – poesia, música, caligrafia, arte de manejar
o arco, desenho, (J. A. Minarelli, obra citada, 1).
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acima mencionados. É só estudá-los, como eu fiz. A única semelhança é a
utilização do vocábulo “Inteligência” na capa. Portanto, J. A. Minarelli não
cunhou ou produziu uma extensão das teorias dos renomados autores e
pesquisadores como afirma.
As palavras dos autores falam por si mesmas: Diz Howard Gardner: “Não
existe nada de mágica na palavra Inteligência. Eu a escolhi
intencionalmente para entrar em controvérsia com aqueles psicólogos que
consideram o raciocínio lógico ou a competência linguística como estando
num plano diferente do da solução de problemas musicais ou da aptidão
“corporal-cinestésica”. E, mais adiante, acrescentou: “Quando escrevi
Estruturas da Mente, fui muito promíscuo no uso do termo inteligência, e o
apliquei em áreas em que teria sido preferível empregar outra terminologia”
(Howard Gardner, Inteligências Múltiplas – capítulo 3 “Perguntas e
Respostas sobre a Teoria das Inteligências Múltiplas, pág. 37).
Reconheço que todo profissional (não na minha definição) não importa sua
área de trabalho, necessita de visibilidade mercadológica e uma marca
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pessoal forte – “Personal Branding” –, a fim de ser visto pelo mercado ou
vender seus serviços e produtos.
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do perfil, do aprendizado permanente, da autoconfiança e da
responsabilidade”, (obra citada, pág. 95).
Uma consulta a obra de Joyce Ajuz Coelho revela que não há nenhuma
adaptação, mas sim uma transcrição ipsis litteris de algumas palavras
usadas pela autora.
• Joyce Ajuz Coelho, escreveu: “Os anos 80 e 90..., cuja única constante
foi a incerteza. A evolução de uma sociedade industrial para uma
sociedade da informação e da alta tecnologia; a globalização da
economia; a visão de longo prazo substituindo a de curto prazo; os
movimentos de descentralização em diversas esferas; a substituição
das estruturas hierárquicas das organizações por estruturas mais
flexíveis e em rede; a acentuação do individualismo”. E, mais adiante,
a autora escreveu: “Surgiu uma multiplicação de programas de
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planejamento estratégico, reengenharia, qualidade total, capacitação
profissional, entre outros”. (obra citada, pág. 98 e 99)
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Essa é uma afirmação sem nenhum fundamento científico ou histórico.
Aparentemente, o autor não pesquisou e, muito menos, se atualizou sobre o
avanço do empreendedorismo no Brasil nas últimas décadas. O Brasil ocupa
atualmente uma posição excepcional e invejável em termos de
empreendedorismo quando comparado a outros paises, segundo o Global
Entrepreneurship Monitor (GEM). A revista Época, em sua matéria “As
Histórias Inspiradoras de Quem Constrói um Novo Brasil”, assinada por
Thiago Cid, diz que o Brasil tem hoje “4 milhões de microempreendedores
com até cinco funcionários e outros 18 milhões que trabalham sozinhos. É
um número mais de duas vezes maior que os 10 milhões de 2003”. A
reportagem vai além: “15 milhões de empresas foram abertas nos últimos
dois anos”. Uma simples consulta ao SEBRAE ou ao IBGE o teria livrado de
fazer uma afirmação tão descabida.
10
dos autores citados. (Vide o livro, Marketing de Serviços de Valarie
Zeithaml, pág., 186 e o do autor, J. A. Minarelli, página 85).
11
Fonte: Marketing de Serviços, Valarie A. Zeithaml e Mary Jô Bitner, 2003, pág. 105.
12
Livro – Marketing de relacionamento, extraída do livro Marketing de
Serviços, obra citada, pág. 140.
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A figura 16.3 – abaixo transcritos, não é uma adaptação. É uma transcrição
literal.
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pessoas altamente instruídas.... Pensamento ilegítimo, de segunda mão, é
pensamento politicamente correto. É a voz nas colunas e reportagens
comoventes e enternecedoras dos jornais diários. Ela pede, exige, que
interrompamos o questionamento e pensamento critico em favor de atitude
e opiniões pré-aprovadas e seguras” (obra citada, pág. 119).
Caro leitor, quero que você reflita sobre as palavras do sociólogo e economista
político, William Graham Summer, citadas por Legault, “a averiguação e
verificação de proposições de toda sorte, apresentadas para comprovar se
correspondem ou não à realidade [...] É a nossa única garantia contra a
decepção, fraude, superstição e interpretação equivocadas sobre nós mesmos e
a nossa existência na terra”. (Obra citada, pág. 45).
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