Você está na página 1de 3

No País da Chuva

No País da Chuva não fazia vento, não havia sol.


No céu, muitas nuvens cinzentas e azuis escuras transbordavam mais de mil
gotinhas de água por minuto. Como estas nuvens estavam sempre muito
"gordinhas" passava o dia a chover.
Os habitantes do país da Chuva eram magrinhos e cinzentos como o tempo.
Eles não tinham culpa de serem pouco alegres, pois com um clima tão triste
era difícil as pessoas serem mais bem dispostas. Afinal, mal se podiam
mexer, por andarem sempre carregados de chapéus-de-chuva e vestidos
com camisolões, casacos, gabardines e outros fatos impermeáveis.
A chuva, que nunca parava, obrigava-os a ficar quase sempre em casa.
Não iam à praia nem ao jardim.
Não tinham esplanada nem campos de futebol ao ar livre.
Não andavam de bicicleta nem de mota.
Estavam condenados a não apreciarem as radiosas manhãs e as soalheiras
tardes de sol que nós tão bem conhecemos.
Constipavam-se muitas vezes por mês, de tal forma que, em certa altura,
deixou de haver um único lenço de papel no País da Chuva e os meninos e as
meninas traziam o nariz vermelho e entupido.
O País da Chuva era governado por um rei que tinha pelo menos dez crises
de amígdalas por ano. Chamava-se D. Gargantilha. Ora, D. Gargantilha era
casado com a rainha Dona Sininha , uma senhora que sofria de sinusite
crónica. Por sorte, os reis eram pais de três princesas muito bonitas e
saudáveis. As princesinhas já eram crescidas, estando em idade casadoira,
porém nenhum príncipe dos reinos mais próximos se mostrava interessado
em casar com qualquer uma delas. Nenhum deles queria um dia vir a ser rei
do País da Chuva. Orientar um povo tristonho, usar permanentemente
chapéu-de-chuva e galochas e passar dias enfadonhos a olhar as nuvens
"gordinhas" através das janelas do castelo não devia ser muito agradável...
Assim, as princesinhas, apesar de respirarem boa saúde, estavam cada vez
mais tristes.
Um dia, tudo mudou.
Era mais um dia chuvoso, quando apareceu no País da Chuva um belo e,
aparentemente, pobre rapaz.
O moço, igualmente em idade casadoira, estava muito sujo. Tão sujo que
chegava a cheirar mal. O seu cabelo loiro parecia cinzento. Usava umas
roupas velhas e desbotadas. Estava perdido.
Aproximou-se dos portões do castelo. Tocou na sineta e esperou. Logo
surgiu um guarda. Quando este já se preparava para o mandar embora,
devido ao seu aspecto de vagabundo, a princesa Laurinha (filha do meio dos
reis do país da Chuva) apareceu. Estava de saída, ia às compras - comprar
mais um guarda-chuva, porque os seus já estavam gastos de tantas gotinhas
de água caídas do céu. A princesa Laurinha assistiu à conversa do rapaz com
o seu guarda e decidiu interceder a favor do moço. O pobrezinho disse-lhe
que se tinha perdido e que estava muito cansado por andar há sete dias e
sete noites sem parar. Tinha fome, precisava de tomar banho e de lavar as
suas roupas. Contou-lhe também que já tinha pedido ajuda a outros reis e
rainhas de reinos por onde tinha passado e que ninguém o ajudou. A princesa
Laurinha ficou com pena do rapaz e levou-o para dentro do castelo.

Depois de o ter apresentado aos pais e às irmãs, mostrou-lhe a casa-de-


banho real e a cozinha real. O rapaz lavou-se e saciou a sua fome com uma
perna de perú
Quando voltou novamente à presença da família real parecia outro, estava
irreconhecível. Também vestia umas roupas limpas que um súbdito de D.
Gargantilha lhe havia arranjado. Era muito bonito e bem parecido. Alto,
louro, de olhos azuis. Finalmente, apresentou-se como sendo o filho
primogénito do rei do país do Sol. Confessou estar apaixonado pela bondade
e simplicidade da princesa Laurinha e pediu ao rei a sua mão em casamento.
A princesa Laurinha ficou muito contente e D. Gargantilha não encontrou
motivos para não deixar a sua filha casar com aquele príncipe. O único
receio que tinha era o de nunca mais voltar a ver a sua princesinha, já que
ela, certamente, ia preferir mudar-se para o País do Sol, uma vez que tinha
vivido sempre na chuva.
Mas o melhor ainda estava para vir...
O príncipe revelou que por ser o filho primogénito do rei do país do Sol
tinha sido abençoado por uma fada quando nasceu que lhe tinha concedido o
dom de levar o sol consigo. Assim, deu um bocadinho de sol ao País da Chuva.
Os príncipes casaram no mês seguinte, deram uma grande festa, viveram
felizes para sempre e tiveram muitos filhinhos. O príncipe, que abdicou de
reinar no País do Sol, ficou a viver com a princesa Laurinha no País da Chuva.
A partir dessa data não faltou sol a este reino e todos os seus habitantes
puderam deixar de usar chapéu-de-chuva e de trazer o nariz vermelho
entupido. Todos os meninos e meninas conheceram a felicidade de andar de
baloiço no jardim e de nadar na praia sem terem medo de se constiparem. D.
Gargantilha não teve mais amígdalas e Dona Sininha melhorou da sinusite.
Do País da Chuva apenas permaneceu o nome...

De Sara V. , in "Duas Mãos Cheias de Histórias" (Escrito e ilustrado por mim)

Você também pode gostar