Você está na página 1de 1
 
DEVER
 266
DEVERo são de D., outras contrárias ao D., algumasnão estão ligadas a ele nem dele desligadas. Dedever são as ações que a razão aconselha acumprir, como honrar os pais, os irmãos, apátria e estar de acordo com os amigos. Contrao D. são as que a razão aconselha a não fazer,como negligenciar os pais, não cuidar dos ir-mãos, não estar de acordo com os amigosetc. Não são de dever nem a ele contrárias asações que a razão não aconselha nem proíbe,como levantar um graveto, segurar uma pena,uma escova, etc." A conformidade com a or-dem racional (que é, de resto, o destino, a pro-vidência ou Deus) é aquilo que, segundo osestéticos, constituí o caráter próprio do dever.Os estóicos distinguiam, como relata Cícero, oD. "reto", que é perfeito e absoluto, e não podeencontrar-se em ninguém senão no sábio, e osD. "intermediários", que são comus a todos emuitas vezes realizados graças apenas à boaíndole e a certa instrução
 (De off.,
 III, 14).A doutrina do D., como se vê, na origempertence a uma ética fundada na norma do "vi-ver segundo a natureza", que é, de resto, a nor-ma de conformar-se à ordem racional do todo.Portanto, não surgiu da ética aristotélica, que éinteiramente fundada no desejo natural de fe-licidade e faz referência à ordem racional dotodo. A ética medieval, que, por sua vez, tomacomo modelo a ética aristotélica, também igno-ra a teoria do D. e concentra-se na teoria dasvirtudes, dos hábitos racionais adequados àconsecução da felicidade e da bem-aven-turança ultraterrena. O conceito de D. volta apredominar só na ética kantiana, que é umaética da normatividade. Ela modifica o conceitoestóico de D. como conformidade à ordem ra-cional do todo, transformando-o em conformi-dade com a lei da razão. Para Kant, D. é a açãocumprida unicamente em vista da lei e por res-peito à lei: por isso, é a única ação racional au-têntica, determinada exclusivamente pela for-ma universal da razão. Diz Kant: "Uma açãorealizada por D. tem seu valor moral não nofim que deve ser alcançado por ela, mas namáxima que a determina; ela não depende,portanto, da realidade do objeto da ação, massomente do princípio da vontade segundo oqual essa ação foi determinada, sem relaçãocom nenhum objeto da faculdade de desejar."Em outros termos, "o D. é a necessidade de rea-lizar uma ação unicamente por respeito à lei",indicando a palavra "respeito" a atitude quenão leva em conta quaisquer inclinações natu-rais
 (Grundlegung zurMet. derSitten,
 2). Nes-se sentido, Kant chama de D. a ação "objetiva-mente prática", ou seja, a ação na qual coinci-dem a
 máxima
 segundo a qual a vontade sedetermina e a
 lei
 moral. "Nisso consiste a dife-rença entre a consciência de ter agido em con-formidade com o D. e a de ter agido por D., ouseja, por respeito à lei." A ação conforme à leimas não realizada por respeito à lei é a ação
 le-gal;
 a realizada por respeito à lei é a ação
 mo-ral
 Portanto, moralidade e D. coincidem
 (Crít. R. Prática,
 I, 1, cap. 3). A doutrina kantiana doD. foi transformada por Fichte numa verdadei-ra metafísica. "A única base sólida de todo omeu conhecimento", disse ele, "é o meu de-ver. É ele o inteligível
 em si
 que, mediante asleis da representação sensível, transforma-seem mundo sensível"
 (Síttenlebre,
 § 15, em
 Werke,
IV, p. 172). Isso no sentido de que o própriomuncio sensível outra função não teria que a defornecer à atividade moral os limites ou os obstá-culos, na luta contra os quais tal atividadeteria meios de desempenhar sua função de li-bertação.Na ética contemporânea, a doutrina do D.continua ligada à da ordem racional necessária,ou norma (ou conjunto de normas) apta a diri-gir o comportamento humano. Isso significa quesempre que o fundamento da ética for a feli-cidade, individual ou coletiva, a perfeição ou oprogresso da vida individual ou coletiva, nãohaverá lugar para a noção de D. No século pas-sado Bentham opunha-se ao D. em nome deuma ética fundada exclusivamente no interes-se, julgando inútil e sem sentido o apelo ao D.
(Deontology,
 1834,1,1). No nosso século, Bergsontambém se opôs ao D. em nome de uma éticado amor. Para Bergson, o D., ou "obrigaçãomoral", não passa de hábito de comportamen-to dos membros de um grupo social. Esseshábitos podem variar, mas seu conjunto, ouseja, o hábito de adquirir hábitos, tem a mesmaintensidade e regularidade de um instinto
 (Deuxsources,
 p. 21). Essa é a ética da sociedadefechada, mas também há a ética "absoluta" dasociedade aberta, que diz respeito a toda a hu-manidade e é a que dá continuidade e faz pro-gredir o esforço criador da vida, tendendo auma forma de sociedade aperfeiçoada peloamor. — Entre a persistência com novas rou-pagens da ética clássica da felicidade, o ressur-gimento de éticas misticizantes como a de Berg-son, e as tentativas de reduzir a ética a umconjunto de desejos não elaborados ou de pre-

Recompense a sua curiosidade

Tudo o que você quer ler.
A qualquer hora. Em qualquer lugar. Em qualquer dispositivo.
Sem compromisso. Cancele quando quiser.
576648e32a3d8b82ca71961b7a986505