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Especial Florianópolis, outubro de 2009

Cenário favorável aponta destaque


Mais conflitos que soluções para Pequenas Centrais Hidrelétricas
As Pequenas Centrais Hidrelétricas por exemplo, aplicar o mínimo de 1% de
PCHs somarão 11% da energia no Brasil, mas vai ser difícil conciliar interesses VENDA DE ENERGIA 1
(PCH) são usinas de pequeno porte,
instaladas em rios, cuja capacidade de
sua receita líquida em pesquisa e desen-
volvimento do setor elétrico. Em Santa
As pequenas centrais podem se beneficiar do programa PCH-COM, da Ele- geração de energia é superior a um e in- Catarina, as facilidades para construir
trobrás, que garante o financiamento das obras pelo BNDES e a compra da ferior a 30 Megawatts (MW). A área de uma PCH são ainda maiores devido à
energia pela estatal, desde que passe por um controle de qualidade. O preço alagamento do reservatório deve ser in- configuração geográfica, que permite
pago também é definido pela empresa - obedecendo a um teto estabelecido ferior a 3 km² e os rios que a abastecem uma eficiente utilização das diversas
pela Aneel. são menores e têm relevo favorável. Para quedas d’água nos rios do estado.
Como medida de incentivo, o empreendedor é isento de pagar pelo uso se ter uma ideia, a Usina Hidrelétrica de Apesar de todos esses incentivos, o
dos recursos hídricos e das linhas de transmissão. Mas, em contrapartida, os Itaipu (PR), maior geradora hidráulica custo final da energia elétrica produzida
municípios têm seu cálculo de repasse de impostos alterado, recebendo mais de energia no mundo, tem uma capaci- pelas PCH é maior que o de uma hidre-
IMPASSE recursos do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). dade instalada de 14 mil MW e produziu létrica grande. Vieira explica que esse
As mudanças provocadas nos rios podem até alagamentos de mais de 1.000 Km². Mas aumento decorre da redução proporcio-
extinguir o meio de subsistência de diversas fa- à parte essa simplicidade aparente, o nal dos custos à medida que se expande
mílias. Carlos Kuhnen, que trabalha com rafting e Brasil tem hoje 352 PCHs em operação, a escala de produção. “Uma turbina de
turismo ecológico em Santo Amaro da Imperatriz, com capacidade de aproximadamente 3 100 MW, por exemplo, custa menos do
(Grande Florianópolis), prevê o fim do setor no Gigawatts, valor suficiente para abaste- que dez pequenas turbinas de 10 MW, e
rio Cubatão Sul, onde estão previstas duas PCHs. cer 32 cidades do tamanho de Florianó- a parcela deste custo refletida na tarifa
“Na região, 63% das terras são áreas de preserva- polis durante um mês. será maior para as usinas menores. O
ção ambiental, e o turismo ecológico é a principal Concebido como uma forma para mesmo acontece com os demais equipa-
atividade econômica. Basta olhar outras cidades melhor aproveitar o potencial hidráu- mentos, com os projetos e com as obras
ALTERAÇÕES AMBIENTAIS lico brasileiro – já que, de acordo com de implantação”, explica o gerente.
do país onde foram instaladas pequenas centrais: As barragens das PCH causam alagamentos de até 3 km² na
é impossível conciliá-las com o que fazemos”, a Aneel (Agência Nacional de Energia
parte superior, sendo que a Aneel pode autorizar áreas maiores em VENDA DE ENERGIA 2 Elétrica) apenas 25% dele está sen- Destino
alarma. A empresa que planeja a central alega, algumas exceções. Também podem ocorrer desvios no curso dos rios Já as usinas construídas com investimento privado
entretanto, que vai abrir o reservatório de água do utilizado – , o mercado das PCHs A energia produzida pelas PCH de-
através de tubulações, para aproveitar desníveis e aumentar a força podem vender a produção no chamado “mercado livre está crescendo em ritmo cada vez mais pende dos sistemas de transmissão e
durante algumas horas por dia para que a prática das águas antes de encontrarem as turbinas. Nesse caso, o rio segue de energia”, composto por consumidores que utilizam
de esportes radicais continue. acelerado. De acordo com José Renato distribuição do governo para chegar ao
com uma vazão reduzida, chamada de “vazão sanitária” - calculada pelo menos 5 MW, regularmente – como fábricas. Nes- Vieira, gerente da assessoria de enge- destino. Segundo Torres, “o acesso às re-
Moradores da região chegaram a organizar o para manter um nível mínimo de água que garanta sua sobrevivência se caso, para reduzir os custos de operação, o governo
“Movimento Rio Cubatão Vivo”, para fortalecer a nharia da Eletrosul - estatal que atua na des não é livre e, portanto, precisamos
abaixo da barragem - até reencontrar as águas desviadas. autoriza o empreendedor a negociar a compra de ener- transmissão e geração de energia em SC de permissão para nos ligarmos. No
oposição ao empreendimento. A entidade con- Ao contrário das grandes usinas, as pequenas centrais aproveitam gia não só com as concessionárias (como a Celesc),
seguiu, através de vitórias judiciais, suspender a -, os investimentos em usinas desse tipo nosso caso, a Celesc tem que autorizar
as quedas naturais no curso do rio e por isso não precisam de barra- mas também com geradores privados. estão se expandindo devido ao aumento a entrada na sua rede de distribuição,
emissão de licenças ambientais para PCHs na ci- gens com grandes estruturas.
dade e ganhou um prazo para que a população se do consumo energético. “A demanda no que, por sua vez, está conectada ao siste-
manifestasse. Diferentemente das grandes centrais Brasil está crescendo e, com isso, exigin- ma elétrico brasileiro”. Vieira acrescen-
hidrelétricas, as empresas que pretendem insta- do a constante expansão da matriz de ta que no caso das fontes alternativas,
lar PCHs não são obrigadas a realizar audiências geração. Além disso, os potenciais hidre- como nas PCHs, existe uma redução na
públicas. létricos de grande porte estão cada vez Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão
mais escassos, e as usinas menores estão (TUST) e na Tarifa de Uso do Sistema de
se tornando mais atrativas”, explica o Distribuição (TUSD) que chega a 50%,
engenheiro. uma medida criada pelo governo federal
Além disso, segundo a Aneel, as cons- para melhorar a atratividade econômi-
truções de PCHs representam uma alter- ca das centrais.
nativa rápida e eficiente para promover Depois de produzida, a energia
um aumento da oferta de eletricidade, oriunda das PCHs pode ser aprovei-
o que pode suprir a crescente demanda tada de duas formas, conforme relata
registrada no mercado nacional. Augusto de Seixas Vargas, engenheiro
eletricista e gerente do departamento
Custos e Benefícios de Geração da Celesc. Ele explica que
Atualmente, há 73 Pequenas Centrais o empreendedor pode comercializar
Hidrelétricas em construção no Bra- livremente a energia gerada, ou então
sil, sendo que 16 delas ficam em Santa consumi-la em uma empresa da qual
AMEAÇA Catarina. De acordo com Luiz Carlos também é proprietário e comercializar
As PCHs afetam a diversidade biológica, como outras hidrelétricas, Torres, diretor administrativo da cons- o excedente. Atualmente, o valor do
ao construirem barragens e desviarem o curso dos rios. Esses obstá- trutora Cerbranorte, do Município de MW/h da energia de uma pequena hi-
culos impedem que peixes subam o leito e se reproduzam. E a falta Braço do Norte (Sul de SC), o custo para drelétrica custa em torno de R$ 155.
de peixes afeta, por sua vez, animais que vivem nas margens. edificar uma PCH é de aproximadamen- O Brasil é um país que tradicional-
O maior entrave para essa questão, segundo os ambientalistas, é EFICIÊNCIA te R$ 70 milhões, investimento que pode mente prioriza as usinas hidrelétricas.
que os estudos para implantação das pequenas centrais são feitos As turbinas utilizadas nas PCHs são do tipo Bulbo. ser amortizado cerca de dez anos após a Hoje, 71,2% da matriz energética na-
individualmente. “Pequenos rios podem ter uma seqüência de cinco Nesse modelo, o gerador é posto na horizontal dentro execução da obra. Para construir uma cional é proveniente de fontes hidráu-
a dez PCH, como o Lava-Tudo, que tem sete”, analisa Ricardo Arcari, de uma cápsula vedada (bulbo) e tem pás similares usina, o empreendedor deve apenas licas, sendo que o potencial criado
engenheiro ambiental. “É uma ilusão pensar que o impacto delas é a uma hélice de navio. Assim, o dispositivo aproveita obter autorização da Aneel, dispensan- pelas PCHs representa 2,73% de toda
menor, 140 centrais de 10MW podem ter muito mais impacto que, tanto a energia da queda d’água quanto a força da do assim o processo de licitação para a energia produzida no País. Para os
por exemplo, a usina hidrelétrica de Itá (que produz 1450MW)”, correnteza, diminuindo a altura necessária de barragem ganhar uma concessão, como acontece próximos anos, já foram autorizados
completa. e a área de alagamento. com as demais hidrelétricas. pela Aneel 153 empreendimentos, que
As PCHs contam com várias vanta- gerarão uma potência de mais de 2
gens frente às grandes usinas, pois pro- milhões de kilowatts. Isso significa
Reportagem: Pedro Dellagnelo Arte: João Doliveira duzem um reduzido impacto ambiental que, em pouco tempo, 11% da energia
e aproveitam melhor as quedas naturais brasileira virá das pequenas centrais
dos rios. Além de serem isentas do pa- hidrelétricas.
gamento aos Estados e Municípios pela
utilização da água fluvial, não precisam, Angieli Maros

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