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DO PARLAMENTO, NADA DE NOVO –

- A LUTA DOS PROFESSORES CONTINUA A SER NAS ESCOLAS,

NAS PRAÇAS E NAS RUAS

Sobre a discussão e votação, ontem terminada, dos projectos-lei dos


diversos partidos parlamentares sobre os temas da avaliação de professores e da
organização da respectiva carreira, entende a Organização de Professores do
PCTP/MRPP dever tomar a seguinte posição:

1. Ao contrário do que muitos pretendem fazer crer, a aprovação do


projecto-lei do PSD, concretizada através da abstenção do PS, não implicará o
estabelecimento de um novo clima nas escolas, propício a um são desenvolvimento
dos alunos e das respectivas aprendizagens e respeitador da profissão docente, mas
significa antes e pelo contrário o reinício de uma campanha sistemática, levada ao
paroxismo pelo Governo anterior, destinada a fazer das escolas simples empresas
produtoras de resultados sem relação com a qualidade das aprendizagens, e a fazer
da maioria dos professores uma classe de simples assalariados, tratados e
comandados como máquinas, sem autonomia, sem liberdade, sem democracia e sem
motivação.

Com efeito, ficou ontem restabelecida a aliança tácita entre o PS e


o PSD que vigorou, em matéria educativa, nos dois primeiros anos do governo
anterior. A partir daqui, é o mesmo projecto destruidor de uma escola pública
democrática e de qualidade, o qual foi paralisado mas não derrotado pela enorme
luta dos professores nos últimos dois anos, que está novamente no terreno.

2. Neste contexto, os temas concretos em que se baseou a discussão e


a aprovação parlamentar de ontem – a avaliação do desempenho e a organização da
carreira docente -, só são importantes na medida em que foi em torno dos mesmos
que se cristalizaram, no período recente, duas coisas essenciais e interligadas, a
saber: uma unidade sem precedentes na classe docente contra a política educativa
do Governo, e uma impossibilidade prática de esse mesmo Governo e as forças
sociais e económicas que o movem, prosseguirem o seu projecto de empresarialização
da actividade educativa, por ausência de um mínimo de apoio nas escolas para o
fazer.

Na verdade, o dito projecto protagonizado pelo Governo, de


transformação da educação pública num sector funcionando com as mesmas regras e a
mesma lógica dos demais sectores de actividade em que vigora uma lógica
capitalista de produção, ficou, como atrás se referiu, praticamente paralisado nos
dois últimos anos pela resistência e pela mobilização massiva dos professores
contra a política educativa da dupla Sócrates/Maria de Lurdes Rodrigues. O que
esteve verdadeiramente em questão no acontecimento parlamentar que ontem terminou,
foi assim, por parte dos partidários daquele projecto, a procura das condições
políticas para o levar por diante. E deve dizer-se que o parlamento, no seu
conjunto, se esforçou por contribuir para que assim acontecesse, tudo fazendo para
restabelecer a autoridade do Governo em matéria educativa e para criar a ilusão de
que algo de novo e de positivo poderia doravante acontecer nas escolas, por via de
uma suposta alteração na política educativa desse mesmo Governo.

3. Por detrás da retórica dos discursos, as posições assumidas pelos


partidos que, no parlamento, se opõem ao “bloco central”, tal como se contêm nos
projectos-lei por estes apresentados, consubstanciaram um claro serviço à
estratégia política do Governo nesta área. Com efeito, nos projectos do CDS, do
PCP e do BE estava bem presente o compromisso, por parte desses partidos, em
contribuir para levar até ao fim o chamado “primeiro ciclo avaliativo”,
legitimando (apenas com a excepção, prevista no projecto do PCP, no que diz
respeito ao efeito das classificações nos concursos) os resultados da farsa que o
mesmo representa, em termos de “consequências” para os professores avaliados
derivadas das classificações atribuídas e em termos de penalização automática para
os que mantiverem a posição de não participar na referida farsa, os quais, neste
momento, são cerca de 40.000.

Mas o mais extraordinário nesta posição dos partidos da oposição


parlamentar, é que a mesma foi assumida a troco de nada, ou seja, em troca da
simples abertura de uma ronda negocial com os sindicatos, a qual, iniciando-se nos
termos e no contexto atrás referidos, está já inexoravelmente marcada com o mesmo
ferrete da capitulação presente noutra ronda negocial de má memória, a que, na
sequência da grande manifestação de professores, realizada em 8 de Março de 2008,
haveria de conduzir ao acordo de traição, designado de “memorando de
entendimento”, entre o Governo e a Plataforma Sindical dos professores.

4. Uma das consequências da capitulação política, antes referida,


das forças que supostamente poderiam interpretar as aspirações, não apenas dos
professores, mas também dos alunos e da população trabalhadora em geral, a uma
escola pública democrática e de qualidade, é a previsível tentativa, por parte do
Governo e do “bloco central”, de incluir efectivamente, no modelo de avaliação dos
professores que irá ser aplicado já no ciclo avaliativo que agora se abre, aquilo
que, numa perspectiva de empresarialização das escolas, é um elemento central e
fundamental, a saber, a subordinação da classificação dos professores aos
resultados escolares obtidos pelos alunos (sejam os resultados globais da escola
como elemento de classificação de cada professor dessa escola, sejam os resultados
dos alunos de cada professor como elemento de classificação desse professor).

A peça que falta para se começar a introduzir no sistema escolar,


por esta via, o princípio do “pagamento por resultados”, é o que já se desenha
como sendo o eixo principal das medidas que virão a ser adoptadas pelo Governo e
pelo Ministério de Isabel Alçada, a saber, a padronização total dos objectivos de
aprendizagem e a mecanização da respectiva leccionação e da avaliação dos alunos,
através de uma panóplia de testes e exames elaborados por entidades externas às
turma e às escolas.

Neste quadro, tudo o que é representativo das condições degradantes,


indignas, burocráticas e desumanizantes no trabalho dos professores que foram
sendo impostas nos dois primeiros anos do Governo Sócrates/Maria de Lurdes
Rodrigues, não apenas se irá manter para a maioria desses mesmos professores, como
poderá até vir a ser agravado quando, à fabricação artificial e meramente
estatística de resultados escolares, realizada e imposta nas escolas por aquele
Governo, se vier a acrescentar a produção desses mesmos resultados por métodos
industriais, impessoais e também eles ilusórios quanto às reais necessidades dos
alunos, da sociedade e do país.

5. Não existem pois razões para celebrar seja o que for como
resultado do acontecimento parlamentar dos dois últimos dias. Há razões, sim, para
prosseguir, com redobrado vigor, a luta contra a política educativa do novo
Governo Sócrates. O que os professores continuam a exigir nas escolas é o
desmantelamento, uma por uma, de toda a série de medidas que, apresentadas com
pompa e circunstância, apenas serviram para piorar o que já estava mal na escola
pública e para introduzir novos factores de crise e de degradação nessa mesma
escola pública.

De facto, o que levou a maioria dos professores à rua em sucessivas


manifestações de protesto e desagrado não foi apenas o modelo de avaliação e a
divisão da carreira, mas foi uma situação geral insustentável no que diz respeito
à sua dignidade e às condições necessárias e indispensáveis à promoção das
aprendizagens e do desenvolvimento pessoal e cidadão dos seus alunos. Essa
situação geral, cujos malefícios só puderam ser atenuados através da mobilização
docente dos últimos dois anos, mantém-se hoje na sua plenitude, e qualquer
abrandamento na firme determinação de a combater, nem que seja sob os cantos de
sereia das direcções sindicais, apenas trará como resultado o seu inevitável
agravamento. Lutar é, pois, a única coisa que nos resta.

Lisboa, 21 de Novembro de 2009

A Organização de Professores

do PCTP/MRPP

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