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Módulos 1 a3 Volume 1

Andrea Thompson Da Poian


Debora Foguel
Marílvia Dansa Petretski
Olga Lima Tavares Machado

Bioquímica II
Bioquímica II
Volume 1 - Módulos 1 a 3 Andrea Thompson Da Poian
Debora Foguel
Marílvia Dansa Petretski
Olga Lima Tavares Machado

Apoio:
Fundação Cecierj / Consórcio Cederj
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Vice-presidente
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UFRJ - Ricardo Iglesias Rios
UERJ - Cibele Schwanke

Material Didático
ELABORAÇÃO DE CONTEÚDO
Andrea Thompson Da Poian
Debora Foguel Departamento de Produção
Marílvia Dansa Petretski
Olga Lima Tavares Machado EDITORA PROGRAMAÇÃO VISUAL
COORDENAÇÃO DE DESENHO Tereza Queiroz Alexandre d´Oliveira
INSTRUCIONAL Bruno Gomes
COORDENAÇÃO EDITORIAL
Cristine Costa Barreto Jane Castellani Cristiane Matos Guimarães
DESENHO INSTRUCIONAL E REVISÃO REVISÃO TIPOGRÁFICA ILUSTRAÇÃO
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Carmen Irene Correia de Oliveira Salmo Dansa
COORDENAÇÃO DE
José Meyohas CAPA
PRODUÇÃO
COORDENAÇÃO DE REVISÃO Jorge Moura Eduardo Bordoni
Maria Angélica Alves PRODUÇÃO GRÁFICA
REVISÃO TÉCNICA Andréa Dias Fiães
Marta Abdala Fábio Rapello Alencar

Copyright © 2005, Fundação Cecierj / Consórcio Cederj


Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio
eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Fundação.

P749b
Poian, Andrea Thompson Da.
Bioquímica 2. v.1/ Andrea Thompson Da Poian. –
Rio de Janeiro : Fundação CECIERJ, 2009.
132p.; 19 x 26,5 cm.
ISBN: 85-89200-75-2
1. Bioquímica. 2. Metabolismo. 3. Bioenergética.
I. Foguel, Debora. II. Petretski, Marílvia Dansa.
III. Machado, Olga Lima Tavares. IV. Título.
2009/1 CDD: 572
Referências Bibliográficas e catalogação na fonte, de acordo com as normas da ABNT.
Governo do Estado do Rio de Janeiro

Governador
Sérgio Cabral Filho

Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia


Alexandre Cardoso

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NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO RIO DE JANEIRO
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UERJ - UNIVERSIDADE DO ESTADO DO UFRRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL


RIO DE JANEIRO DO RIO DE JANEIRO
Reitor: Ricardo Vieiralves Reitor: Ricardo Motta Miranda

UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE UNIRIO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO


Reitor: Roberto de Souza Salles DO RIO DE JANEIRO
Reitora: Malvina Tania Tuttman
Bioquímica II Volume 1

SUMÁRIO Módulo 1
Aula 1 – Bioenergética - parte I_________________________________ 11
Olga Lima Tavares Machado

Aula 2 – Bioenergética - parte II ________________________________ 15


Olga Lima Tavares Machado

Aula 3 – Conceitos fundamentais do metabolismo __________________ 31


Olga Lima Tavares Machado

Módulo 2
Aula 4 – Fotossíntese I - Princípios gerais _________________________ 41
Marílvia Dansa Petretski

Aula 5 – Fotossíntese II - O processo de fotossíntese _________________ 47


Marílvia Dansa Petretski

Aula 6 – A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese ____________ 57


Marílvia Dansa Petretski

Aula 7 – O ciclo de Calvin ou etapa química da fotossíntese ___________ 73


Marílvia Dansa Petretski

Aula 8 – Outros aspectos importantes da fotossíntese ________________ 83


Marílvia Dansa Petretski

Módulo 3
Aula 9 – A história da fermentação: do início aos dias de hoje ________ 95
Marílvia Dansa Petretski / Olga Lima Tavares Machado

Aula 10 – Glicólise: oxidação de glicose a piruvato I _______________ 107


Marílvia Dansa Petretski / Olga Lima Tavares Machado

Aula 11 – Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II _______________ 119


Marílvia Dansa Petretski / Olga Lima Tavares Machado
Introdução ao Metabolismo

Aulas
1 - Bioenergética - parte I.
2 - Bioenergética - parte II.

Módulo 1
3 - Conceitos fundamentais do metabolismo.
INTRODUÇÃO AO Metabolismo, cujo antepositivo grego metabol – significa
METABOLISMO “mudança”, pode ser definido como a totalidade dos processos químicos
do organismo. Conseqüentemente podemos admitir que a célula viva seja
uma indústria química em miniatura, onde milhares de reações ocorrem
em nível microscópico.
Você pode pensar no metabolismo celular como um elaborado
mapa rodoviário que representa as reações que ocorrem na célula. As
reações são arranjadas em vias metabólicas intrincadas e bifurcadas, que
transformam moléculas por uma série de etapas. As enzimas aceleram
seletivamente cada etapa no labirinto de reações. Em analogia aos sinais
de trânsito que controlam o fluxo do tráfego e previnem acidentes,
existem mecanismos que controlam o metabolismo por regulação de
enzimas e, conseqüentemente, mantêm o balanço metabólico, impedindo
deficiências e excessos de metabólitos.
Poderíamos então começar os nossos estudos apresentando
algumas questões:

1 - Como as enzimas controlam todas estas reações?

2 - Como os seres vivos produzem e armazenam energia?

3 - De onde vem esta energia?

4 - Como um sistema biológico realiza trabalho?

5 - Por que algumas reações químicas liberam e outras


absorvem calor?

6 - Para que servem as vias metabólicas?

Tais questões serão respondidas ao longo de toda a disciplina


Bioquímica II.
Como você pôde observar, energia é o tema central do metabolismo,
por isto é apropriado que comecemos o nosso estudo com uma introdução
à bioenergética, a análise quantitativa de como o organismo ganha e
utiliza energia. A bioenergética é uma parte especial de uma ciência que
estuda as transformações da energia, que é chamada termodinâmica.

8 CEDERJ
O módulo Introdução ao metabolismo é composto por três aulas:

Aula 1 – Bioenergética – parte I

Aula 2 – Bioenergética - parte II

Aula 3 – Conceitos fundamentais do metabolismo

Após cada uma das aulas, você verá um resumo da mesma; no


entanto os exercícios; referentes ao módulo serão apresentados após a
Aula 3.

CEDERJ 9
11
AULA
Bioenergética - parte I
objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


• Definir conceitos de energia, calor e trabalho.
• Conhecer a primeira lei da termodinâmica.
Bioquímica II | Bioenergética - parte I

INTRODUÇÃO Uma célula viva é um sistema dinâmico; ela cresce, move, sintetiza
macromoléculas complexas e, seletivamente, direciona substratos para um ou
outro compartimento. Todas estas atividades necessitam de energia; assim, a
célula deve obter energia do meio onde está e deve utilizar esta energia com
a maior eficiência possível. As plantas a obtêm da luz do sol; animais usam a
energia estocada nas plantas ou em outros animais que consomem.

ENERGIA, CALOR E TRABALHO

Uma palavra que usaremos com freqüência é sistema. Neste


contexto, sistema é uma porção definida do espaço que foi selecionada
para o nosso estudo. Pode ser uma simples bactéria, um tubo de ensaio
contendo milhões de células, a Terra ou o universo. Tudo o que estiver
em volta do sistema é o ambiente.
Qualquer sistema pode conter uma certa quantidade de
energia, que chamamos E. Os átomos e moléculas do sistema têm
energia cinética de movimento e energia de vibração e rotação. Além
destas, nós poderíamos incluir toda a energia preservada nas ligações
químicas entre os átomos e a energia de interação não covalente entre
as moléculas.
A menos que um sistema esteja isolado, ele pode, em princípio,
trocar energia com o ambiente e, assim, mudar a sua energia interna.
Esta mudança pode acontecer de duas maneiras. Em uma o calor pode
ser transferido de um sistema para outro. Na outra, o sistema pode
realizar trabalho no seu ambiente ou pode sofrer um trabalho realizado
pelo ambiente. O que denominamos trabalho, neste caso, pode ser, por
exemplo, a contração muscular ou o movimento de um flagelo de um
protozoário. Certas convenções foram adotadas para descrever estas
trocas de energia:

1 2 CEDERJ
MÓDULO 1
• Nós denotamos calor pelo símbolo q. Um valor positivo
de q indica que o calor do ambiente foi absorvido pelo

1
AULA
sistema. Um valor negativo de q indica que o sistema
perdeu calor para o ambiente.

• Nós denotamos trabalho pelo símbolo w. Um valor


positivo de w indica que o trabalho é realizado pelo
sistema no seu ambiente. Um valor negativo significa
que o ambiente realizou um trabalho sobre o sistema.

A PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA – LEI DA


CONSERVAÇÃO DE ENERGIA

Você já deve ter ouvido, em suas aulas de ciências, a seguinte


expressão: “Energia não se cria nem se perde, apenas se transforma”.
A queda d’água de uma cachoeira (energia mecânica) pode acionar
um dínamo (energia elétrica), que por sua vez pode movimentar um
ventilador (energia mecânica), ou acender uma lâmpada (energia
luminosa). Em todas essas transformações a energia não foi criada nem
perdida, apenas transformada.
De onde vem a energia dos reagentes?
A luz do sol é a fonte original de energia. No processo de
fotossíntese, as plantas assimilam a luz do sol através de pigmentos
especiais. Açúcares são sintetizados utilizando essa energia e passam a
ser fonte de energia química que poderá ser utilizada para formação de
outras moléculas. Observe esse processo na Figura 1.1.

Figura 1.1: Esquema geral da fotossíntese.

CEDERJ 1 3
Bioquímica II | Bioenergética - parte I

Veremos, mais adiante, que os seres vivos são transformadores


naturais de energia. Veja exemplos de transformação de energia na figura
1.2. Como mencionada anteriormente, a energia de um sistema pode
ser mudada somente na forma de calor ou de trabalho. Tal mudança
da energia interna de um sistema, a qual chamamos ΔE, pode ser
matematicamente representada por:
ΔE = q–w

Essa equação expressa a primeira lei da Termodinâmica. Considere,


por exemplo, alguns processos nos quais uma certa quantidade de calor
é absorvida por um sistema e este realize trabalho sobre o ambiente. No
caso onde q for igual a w, a ΔE será igual a zero.

Em (A) temos a energia cinética Em (B) parte da energia cinética é Em (C) a energia cinética estocada
transformada somente usada para retirar a água (trabalho), no balde d’água suspenso pode
em calor; e uma menor quantidade de energia é ser usada para dirigir uma
liberada como calor; máquina hidráulica ou para
qualquer outro trabalho.

Figura 1.2: Transformação de energia.

RESUMO

Nesta aula, você aprendeu que um sistema pode trocar energia com o
meio ambiente e assim mudar sua energia. Vimos que esta mudança
pode ocorrer na forma de calor ou trabalho. Você deve ter em mente o
seguinte conceito:

• a primeira lei da Termodinâmica é a lei da conservação da energia, ou


seja, energia não se cria, só se transforma.

1 4 CEDERJ
2
AULA
Bioenergética - parte II

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


objetivos

• Analisar as direções das reações químicas a partir do


entendimento dos conceitos de entropia, energia livre e da
segunda lei da Termodinâmica.
• Conhecer os compostos ricos em energia, ou seja, as fontes
de energia dos sistemas biológicos.
• Definir e entender a importância das reações acopladas.
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

INTRODUÇÃO Na aula anterior, definimos energia, calor e trabalho. Falamos ainda sobre a
primeira lei da Termodinâmica, ou seja, sobre a lei da conservação de energia.
Nesta aula, tentaremos explicar o porquê de algumas reações ocorrerem
espontaneamente e o de outras necessitarem de energia para acontecerem.
Veremos ainda como nosso organismo utiliza reações que liberam energia para
promover reações que necessitam de energia.

AS DIREÇÕES DAS REAÇÕES QUÍMICAS – A SEGUNDA LEI DA


TERMODINÂMICA – LEI DA TRANSFERÊNCIA DE ENERGIA

Conceito de entropia

A primeira lei da Termodinâmica não fornece nenhuma


informação sobre o sentido de uma reação química ou sobre o sentido
de transferência de energia. Considere o seguinte exemplo: se colocarmos
um cubo de gelo em um copo d’água à temperatura ambiente, ele derrete.
Por que o inverso não ocorre? Se queimarmos um pedaço de papel, ele
será transformado em CO2 mais água. Mas se misturarmos CO2 com
água não formaremos um pedaço de papel. O tema comum nestes dois
exemplos é este: processos favoráveis ocorrem espontaneamente em
certas direções. Por quê?
A primeira explicação seria a de que os sistemas sempre
caminham para o estado de energia mais baixa. Assim, objetos caem
espontaneamente em virtude do campo gravitacional. Mas tal explicação
não seria adequada para o caso do gelo que se derrete; de fato, energia é
absorvida neste processo. Nós podemos imaginar um outro experimento
muito simples que daria uma indicação clara do que deve estar ocorrendo.
Suponha que nós colocássemos, com muito cuidado, uma camada de
água pura sobre uma solução de sacarose. Depois de algum tempo, nós
verificaríamos que a solução estaria cada vez mais uniforme, ou seja,
as moléculas de sacarose iriam se distribuir pelo recipiente. Nesse tipo
de transformação nenhuma mudança energética ocorreu. Certamente
o inverso não aconteceria. O que procuramos deixar claro aqui é que
os sistemas formados por moléculas têm uma tendência natural a se
distribuir randomicamente.

16 CEDERJ
MÓDULO 1
O grau de distribuição randômica ou grau de desordem é chamado

2
entropia. Para demonstrarmos a mudança de entropia em um processo

AULA
simples, considere a facilidade para desorganizar um quarto e o esforço
para reorganizá-lo. Para isso, veja a Figura 2.1. Diremos então que a
variação de entropia ΔS será a diferença entre a entropia do estado final
(Sf) e a entropia do estado inicial (Si), ou seja,
ΔS = Sf – Si.

Reação espontânea (aumento do grau de


desordem, ou seja, aumento da entropia).

Reação não espontânea – requer energia.

Figura 2.1: Demonstração das reações espontâneas e não espontâneas.

Normalmente não medimos a entropia inicial ou final, mas sim


a ΔS. O aumento de entropia é representado por um sinal positivo, e a
redução de entropia por um sinal negativo. Com relação à entropia, dois
aspectos devem ser ressaltados:
a) A entropia total sempre aumenta. A entropia pode aumentar ou
diminuir no sistema ou no ambiente, mas, em todos os processos reais, a
soma entrópica sistema + ambiente é sempre crescente. Pode-se afirmar
que a entropia do Universo está aumentando continuamente.

CEDERJ 17
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

b) O significado da quantidade de entropia está associado à


quantidade de energia que não realiza trabalho. Esta representa a energia
inaproveitável em processos reais e é obtida pelo produto da variação da
entropia (ΔS) pela temperatura absoluta do processo. Assim, teremos:
Energia entrópica = TΔS
Esta é também a definição formal de entropia.
Para entendermos a segunda lei da Termodinâmica, precisamos
ainda conhecer dois conceitos: entalpia e energia livre.

Conceito de entalpia

A entalpia, que chamamos H, é o conteúdo de energia de um


sistema e pode ser percebido por sua variação, ΔH, que aparece em
qualquer processo. Eis alguns exemplos em Bioquímica:
– Entalpia de reação (ΔHr) – energia liberada ou absorvida quando
ocorre uma reação química.
– Entalpia de solução (ΔHs) – energia liberada ou absorvida
quando uma substância se dissolve.
– Entalpia de formação (ΔHf) – energia liberada ou absorvida
quando se forma um composto.
Conforme o comportamento da entalpia, as reações podem ser
exotérmicas ou endotérmicas. Nas reações exotérmicas, o sistema perde
calor; tal perda é indicada pelo sinal negativo do valor de ΔH. Por
exemplo, quando dissolvemos NaOH em água ocorre aquecimento da
solução em função do calor desprendido, fato que pode ser percebido
pelo tato. Este calor irradia, ou seja, se perde pelo ambiente. Nas reações
endotérmicas, o sistema ganha calor, o que é indicado pelo sinal positivo
de ΔH. Quando dissolvemos o sal NH4Cl em água, ocorre resfriamento
do sistema pelo calor absorvido na dissolução, o que também pode
ser percebido pelo tato. A liberação ou absorção de calor não está
diretamente ligada à realização de trabalho pelo sistema. Este aspecto
será visto ao falarmos de energia livre.

Conceito de energia livre – Energia de Gibbs “G”

As moléculas de uma célula viva possuem energia devido às suas


vibrações, rotações, translações e devido à energia que está estocada
entre as ligações de átomos individuais. Veja uma representação disto
na Figura 2.2.

18 CEDERJ
MÓDULO 1
Na realidade, a energia livre é medida pela sua variação ΔG, e é aquela

2
capaz de realizar trabalho em processos isotérmicos (processos que

AULA
ocorrem à temperatura constante) e isobáricos (processos que ocorrem à
pressão constante). Ela resulta da diferença entre a energia total (entalpia,
ΔH) e a energia ineficaz (quantidade de entropia, TΔS).
ΔG = ΔH - TΔS
Energia que produz trabalho = Energia total - Energia inaproveitável

A equação apresentada é a que rege a segunda lei da Termodinâmica.


Ou seja, um processo ocorrerá espontaneamente quando ΔG for negativo
e não será espontâneo quando ΔG for positivo.

Figura 2.2: Descrição da Energia Livre. A Energia Livre (G) mede a energia da
molécula que poderia em princípio ser usada para realizar trabalho à temperatura
constante, como ocorre nos seres vivos. G é medido em unidades de quilocalorias/
mol ou quilojoules/mol.

Conheça abaixo a definição de algumas unidades de medida de energia.

O QUE É UM KJ?

É uma unidade de energia. A unidade básica de energia é o Joule,


nome dado em homenagem a um físico famoso. Um quilojoule
(KJ) corresponde a 1.000 joules. A caloria é uma outra unidade de
energia. Uma caloria corresponde a 4,185 joules. Veja um resumo
destas informações na Figura 2.3.

Unidade básica de energia = joule (J)


1quilojoule (KJ) = 1.000 J
1 caloria (cal) = 4,185 J
1 caloria alimentar = 1.000 cal = 1kcal = 4.185 J

Figura 2.3: Unidades de energia.

CEDERJ 19
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

Quando os reagentes possuem uma energia livre menor do que o


produto, como tornar possível a realização da reação?
A solução é usar reagentes que tenham maior energia livre. Veja
alguns exemplos, acompanhando a seqüência de eventos representada
das Figuras 2.4.a a 2.4.d.

Reagentes
alternativos

U Produtos
Energia livre

DG
0

É
padrão

W Reagentes
positivo
Y A B C D

A+B C+D

Figura 2.4.a: Os reagentes apresentam energia livre menor do que os produtos.


O equilíbrio favorece a formação dos reagentes.

Reagentes
alternativos

Produtos
Energia livre

DG
0
Reagentes
É
padrão

W
positivo
U B
Y V D

U+B V+D

Figura 2.4.b: Os reagentes apresentam energia livre menor do que os produtos.


O equilíbrio favorece a formação dos reagentes.

20 CEDERJ
MÓDULO 1
Reagentes

2
alternativos

AULA
Produtos

Energia livre
Reagentes
DG
0

padrão
positivo
W B
Y X D

W+B X+D

Figura 2.4.c: Os reagentes apresentam energia livre menor do que os produtos. O


equilíbrio favorece a formação dos reagentes.

Reagentes
alternativos Reagentes
DG
0

É
Y B Produtos
Energia livre

positivo
padrão

Z D

Y+B Z+D

Figura 2.4.d: Os reagentes apresentam energia livre maior do que os produtos. O equilí-
brio favorece a formação dos produtos.

Responda você agora à seguinte questão: uma reação endergônica (ΔH positivo), ou seja,
uma reação que requer energia, pode ocorrer espontaneamente dentro de uma célula?
Se você respondeu que sim, desde que o valor em módulo para a entropia (TΔS) seja maior
do que ΔH, você está acompanhando o nosso raciocínio. Bem, podemos ir um pouco mais adiante,
mas antes precisamos entender como a energia livre de um sistema depende da quantidade dos
vários componentes da mistura de reação.

CEDERJ 21
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

Energia livre e concentração das substâncias

Se nós tivermos uma mistura contendo NA moles do componente A e


NB moles do componente B e assim sucessivamente, nós podemos escrever:
G = NAGA + NBGB + NCGC + .....
Ou seja, a energia total do sistema é um somatório das energias
parciais molares ou dos potenciais químicos dos vários componentes.
Para facilitar nossos estudos, químicos e bioquímicos determinaram a
energia livre de alguns componentes de interesse químico/bioquímico
quando a concentração dos mesmos era 1 molar. Denominaram-na
energia do estado fundamental, à qual chamaram G0. Em qualquer
outra situação, a energia desses componentes seria proporcional a essa
energia, conforme podemos expressar na seguinte equação:
GA = GA0 + RT ln[A]
GB = GB0 + RT ln[B],
onde R é a constante absoluta dos gases (8.314 J/mol), T é a
temperatura absoluta expressa em graus Kelvin.
A importância destas equações é que elas nos permitem aplicar
princípios termodinâmicos em problemas práticos. Em particular, elas
nos permitem predizer a direção favorável dos processos reais.
Considere a reação reversível; em equilíbrio:
A + B = C + D
A relação entre energia livre e energia padrão é dada pela equação:
ΔG = ΔG 0 + RT ln [C] x [D]
[A] x [B]
Em quaisquer concentrações de A, B, C e D quando a reação está
em equilíbrio ΔG = 0, e:

K = [C]eq x [D]eq
[A]eq x [B]eq

K é definida como a constante de equilíbrio. Este estado será


atingido quando a velocidade de formação dos produtos C e D for igual
à velocidade de formação (v) dos reagentes A e B.

22 CEDERJ
MÓDULO 1
V+

2
reagentes produtos

AULA
V-

No equilíbrio v+ = v- e ΔG = 0 , tem-se

ΔG0 = - RT lnK

Agora pense e responda! Será que podemos dizer que no equilíbrio químico a concentração
dos reagentes é igual à concentração dos produtos?

A resposta é não. No equilíbrio químico não é necessário que a concentração dos reagentes seja
igual à concentração do produto. O equilíbrio químico ocorre quando a velocidade da reação
nos dois sentidos é idêntica. No exemplo dado, o equilíbrio ocorre em uma situação em que
existem mais moléculas de produtos do que de reagentes. Veja a Figura 2.5:

4 pares de Equilíbrio atingido 8 pares de


reagentes produto

Figura 2.5: Representação de uma reação em equilíbrio na qual as concentrações


dos produtos e dos reagentes são diferentes.

CEDERJ 23
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

E a vida? Será que ela existe quando o equilíbrio químico entre ser vivo e meio ambiente
é atingido?

Não. Somente quando um ser morre é que o equilíbrio químico é atingido. Veja a Figura 2.6.

Figura 2.6: O equilíbrio entre sistema e meio é incompatível com a vida.

COMPOSTOS RICOS EM ENERGIA E REAÇÕES ACOPLADAS

O papel central das mudanças de energia em determinadas


direções favoráveis às reações químicas é de grande importância
para a Bioquímica. Para que uma via metabólica ocorra, ela deve ser
termodinamicamente favorável. Entretanto, reações individuais da via
podem ter um ΔG0 positivo e não serem, portanto, favoráveis. Como
então as reações poderiam ocorrer de maneira eficiente? Em alguns
casos, in vivo, a chave é encontrada no fato de as concentrações entre
os reagentes e produtos se encontrarem muito distantes do equilíbrio.
Assim, se os reagentes se encontram em concentrações muito elevadas
e se os produtos estiverem sendo continuamente removidos, o valor de
ΔG0 pode se tornar ligeiramente negativo, tornando possível a reação.
Outras vezes, poderemos acoplar reações para tornar possível outras
reações. Veja o tópico a seguir.

24 CEDERJ
MÓDULO 1
Reações acopladas

2
Embora muitas reações possam ser favorecidas pela remoção

AULA
eficiente dos produtos, existem muitos casos em que isto não é suficiente.
Há um outro modo muito importante no qual reações intrinsecamente
desfavoráveis podem acontecer. Suponha por exemplo que nós tenhamos
uma reação endergônica que seja parte essencial de uma via que, na sua
totalidade, poderia gerar energia. Busquemos uma situação do nosso
dia-a-dia para você entender melhor este processo: imagine que você
queira montar uma loja para vender um produto de larga aceitação no
mercado. Com certeza você espera ter lucros quando tudo estiver em
pleno funcionamento. Sem dúvida você deverá gastar alguns recursos
para iniciar seu projeto. Assim funcionam algumas vias metabólicas: você
gasta alguma energia para tornar possível uma das etapas da vias, que é
endergônica, para que outras etapas que forneçam energia cubram esse
“gasto” inicial e ainda liberem energia para outras funções metabólicas.
Vejamos como isto fica passo a passo:

A ΔG0 = + 10kJ/mol
C D ΔG0 = - 30kJ/mol

Para que a primeira reação aconteça é preciso energia (reação


endergônica), já a segunda reação libera energia. Dizer que as duas
reações ocorrem de maneira acoplada seria o mesmo que somarmos as
equações. Assim teríamos:

A+C B+D
ΔG0 = (+ 10kJ/mol) + (-30 kJ/mol)
ΔG0 = - 20kJ/mol

Acoplar reações endergônicas com reações exergônicas é um dos


princípios mais importantes em Bioquímica. Tais ligações de processos
favoráveis com processos desfavoráveis são usadas não somente para
inúmeras reações, mas também para o transporte de materiais através de
membranas, transmissão de impulsos nervosos e contração muscular.

CEDERJ 25
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

Compostos fosfatos de alta energia como estoque de energia

Como vimos, acoplar reações é muito importante nos processos


vitais; por isso existem diversas moléculas que conservam energia em
sua estrutura e, assim, quando clivadas, podem liberar essa energia para
permitir que uma reação endergônica possa acontecer. As moléculas
consideradas “estoque” de energia mais importantes no nosso organismo
são compostos fosforilados, que por hidrólise liberam seu grupo fosfato.
Alguns deles, como o foso-enol-piruvato (PEP), a creatina-fosfato (CP) e
a adenosina tri-fosfato (ATP), quando hidrolisados, liberam uma grande
quantidade de energia (ΔG0 muito negativo). Talvez o mais importante
destes compostos, e que você poderá encontrar com maior freqüência
nos livros, seja o ATP. Por isso a estrutura dessa molécula, bem como
as possíveis reações de hidrólises que ela pode sofrer, são apresentadas
na Figura 2.7.a, 2.7.b e 2.7.c. Como você pode observar, a hidrólise da
molécula de ATP pode proceder de duas maneiras:
1) o fosfato terminal pode ser clivado, formando uma molécula de
adenosina difosfato (ADP) e uma molécula de fosfato inorgânico
(Pi) (Figura 2.7.b);
2) a clivagem pode ocorrer na segunda ligação fosfo-di-éster para
formar uma molécula de adenosina mono-fosfato (AMP) e uma
molécula de pirofosfato inorgânico (PPi) (Figura 2.7.c). A primeira
reação ocorre com maior freqüência in vivo, mas a energia liberada
em ambas as clivagens é a mesma. A molécula de PPi também pode ser
clivada e, neste caso, uma outra parcela de energia pode ser liberada.

A razão pela qual a molécula de ATP é considerada uma das mais


importantes moléculas de transferência de energia é que ela fica bem
no meio da escala de potenciais de transferência de energia. Por isso,
quando reações altamente exergônicas acontecem no nosso organismo,
ou mesmo quando a luz incide sobre os organismos fotossintetizantes,
podemos guardar parte dessa energia formando uma molécula de ATP
e, quando necessitamos de energia para a realização de uma reação
exergônica ou para a realização de um trabalho, podemos utilizar a
energia armazenada nessa molécula.

26 CEDERJ
MÓDULO 1
NH2

2
AULA
C N
N C
O- O-
CH
HC C O-
N N
O H2C O P O-
Adenina O O O
H H Fosfato
H H
OH OH
Ribose

Figura 2.7.a: Estrutura da adenosina trifosfato (ATP).

Figura 2.7.b: Hidrólise do ATP com clivagem do fosfato terminal.


• Libera 31 a 55 kJ/mol como calor.
• Libera adenosina difosfato e fosfato inorgânico.

Figura 2.7.c: Hidrólise do ATP com clivagem na segunda ligação fosfo-di-éster.


• Libera 31 a 55 kJ/mol como calor.
• Libera adenosina monofosfato e pirofosfato inorgânico.

CEDERJ 27
Bioquímica II | Bioenergética - parte II

Resumindo, podemos dizer: a energia de acoplamento é usada para


permitir que uma reação desfavorável aconteça. O processo substitui a
reação desfavorável por duas reações favoráveis. Na primeira etapa, o
ATP reage para formar um intermediário rico em energia. Na segunda
etapa, o intermediário libera essa energia para formação do produto.

Como as células refazem as moléculas de ATPs gastas?


Elas usam reagentes que possuem mais energia do que o ATP.
Usam, por exemplo, a energia da luz, captada pelos cloroplastos. As
plantas e os animais oxidam açúcares com a ajuda das mitocôndrias,
liberando energia para a formação do ATP. Um detalhamento desses
processos será visto nas aulas de fotossíntese, de glicólise, ciclo de Krebs
e fosforilação oxidativa.
Na próxima aula, após definirmos alguns conceitos importantes
para o entendimento do metabolismo, voltaremos a falar da importância
do ATP como molécula transportadora de energia.

28 CEDERJ
MÓDULO 1
RESUMO

2
AULA
Nesta aula, você aprendeu os conceitos de entropia, entalpia e energia
livre de Gibbs. Você viu como essas grandezas se relacionam, ou seja, você
aprendeu a segunda lei da Termodinâmica. Você aprendeu a identificar o
sentido das reações químicas e a importância dos compostos ricos em energia
e das reações acopladas. Vamos resumir esses conceitos.

• O conteúdo de energia de um sistema é denominado entalpia; no entanto,


normalmente medimos sua variação durante uma transformação, ou seja, o
ΔH. Quando ΔH é positivo, a reação é endotérmica, e quando ΔH é negativo,
a reação é exotérmica.

• Entropia é o grau de desordem; normalmente medimos a sua variação


durante um processo, a uma determinada temperatura, ou seja, medimos o
TΔS; a entropia do universo é sempre crescente.

• A energia livre das moléculas é denominada G. Ela é a energia de rotação,


de translação e a energia contida entre as ligações químicas. Neste caso,
também, em Bioquímica, usualmente medimos a sua variação durante uma
reação química, ou seja, medimos o ΔG.

• A segunda lei da Termodinâmica dá informações sobre a espontaneidade de


uma reação química, a qual pode ser visualizada pelo sentido do ΔG. Vimos
que ΔG = ΔH - TΔS; para um ΔG negativo a reação é espontânea e para um
ΔG positivo a reação não é espontânea.

• Se acoplarmos uma reação exotérmica a uma reação endotérmica,


poderemos tornar possível a realização de uma reação termodinamicamente
desfavorável.

• O ATP é o composto rico em energia mais utilizado nos organismos vivos. A


energia contida em suas ligações é utilizada nas reações termodinamicamente
desfavoráveis. Ele é reconstituído às custas da energia solar ou da energia
contida em outras moléculas orgânicas.

CEDERJ 29
3
AULA
Conceitos fundamentais
do metabolismo
objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


• Conhecer as funções do metabolismo.
• Dividir o metabolismo em estágios ressaltando a importância
de cada um deles.
• Conhecer a organização das vias metabólicas.
• Conceituar catabolismo e anabolismo.
• Identificar os principais mecanismos de regulação metabólica.
Bioquímica II | Conceitos fundamentais do metabolismo

INTRODUÇÃO O destino dos componentes da dieta, após a digestão e absorção, constitui


o metabolismo intermediário. Assim, ele procura não somente descrever a
via metabólica percorrida individualmente pelas moléculas, mas também
compreender suas inter-relações e os mecanismos que regulam o fluxo de
metabólitos através das vias metabólicas, envolvendo um amplo domínio.

FUNÇÕES DO METABOLISMO

O metabolismo desempenha quatro funções básicas:


1 - Obter energia química do ambiente, por captura de energia solar ou
por degradação de nutrientes ricos em energia.

2 - Converter moléculas de nutrientes (exógenas) em moléculas


características do próprio organismo (endógenas).

3 - Polimerizar precursores monoméricos em produtos poliméricos,


como proteínas, ácidos nucléicos, lipídios, polissacarídeos e outros
componentes celulares.

4 - Sintetizar e degradar biomoléculas requeridas em funções celulares


especializadas.

ESTÁGIOS DO METABOLISMO

O metabolismo pode ser dividido em estágios que refletem o grau


de complexidade ou tamanho das moléculas geradas
No nível 1, temos as reações químicas de conversão de metabólitos
poliméricos, como polissacarídeos, lipídeos e proteínas, em seus
constituintes monoméricos, como monossacarídeos, ácidos graxos +
glicerol e aminoácidos, respectivamente.
No nível 2 do metabolismo, esses monômeros são quebrados em
intermediários simples, como por exemplo:

Glicose Piruvato
Ácidos graxos acetil-CoA

32 CEDERJ
MÓDULO 1
No nível 3, se tratarmos de organismos aeróbicos (aqueles que

3
necessitam de oxigênio para sobreviver), a principal via é o ciclo de

AULA
Krebs, onde os intermediários do nível 2 sofrem degradação completa
a CO2, H2O.
Por exemplo:

Acetil-CoA CO2 e H2O

Essas relações são esquematizadas na Figura 3.1.

Glicídeos Proteínas Gorduras

Estágio 1

Açúcares
Acúcares simples
simples
(principalmente glicose)
(principalmente glicose) Aminoácidos Ácidos graxos + glicerol

Carregadores
de elétrons
reduzidos e Piruvato
ATP
Estágio 2
Carregadores
de elétrons
reduzidos e
Acetil-Co A ATP

Carregadores de elétrons
reduzidos e ATP
Cíclo do
ácido
cítrico
Estágio 3
Figura 3.1: Esquema
geral dos três estágios
do metabolismo.

2CO2
H2O

As reações do metabolismo intermediário não envolvem um


templete de ácido nucléico. A informação necessária para especificar
cada reação vem da estrutura da enzima que catalisa aquela reação.
Um exemplo de reações metabólicas que dependem de um templete de
ácido nucléico e, portanto, não é considerado metabolismo intermediário,
é a síntese de proteínas.

CEDERJ 33
Bioquímica II | Conceitos fundamentais do metabolismo

ORGANIZAÇÃO DAS VIAS METABÓLICAS

O metabolismo é formado por vias metabólicas que podem ser


lineares ou cíclicas
As vias metabólicas lineares podem ser representadas da
seguinte forma:
A B C D E F

Seus metabólitos são formados seqüencialmente até o produto


final (F). Neste caso, o aumento da concentração do substrato (A), ou o
aumento de qualquer intermediário (B, C, D ou E) resulta no aumento
da concentração do produto (F). Um exemplo de via metabólica linear
é a glicólise, a via de degradação da glicose (veja Aulas 9 e 10). Nesta
via, a glicose é o substrato inicial e o piruvato é o produto final.
Nas vias metabólicas cíclicas, o produto final (F) pode regenerar
o substrato inicial (A). Um exemplo desta via é o ciclo de Krebs (veja
Aulas 12 e 13). Este tipo de via metabólica pode ser representada da
seguinte forma:
A

F B

E C

As vias cíclicas têm particularidades. Ao contrário das vias lineares, o aumento da


concentração do substrato (A) não resulta necessariamente no aumento da concentração do
produto (F). Na verdade, o aumento da concentração de qualquer um dos metabólitos desencadeia
ativação ou aumento da velocidade da via como um todo.
No metabolismo existem pontos de convergência de vias metabólicas diferentes. A molécula
acetil-CoA é um desses pontos de convergência. Isso significa que várias vias metabólicas têm como
produto final acetil-CoA, ou em alguns casos o produto final da via é convertido nessa molécula.
Chamamos então vias metabólicas convergentes aquelas que têm um produto comum.

A B C D E
H
A B C D E

34 CEDERJ
MÓDULO 1
Por outro lado, nas vias metabólicas divergentes, um mesmo

3
substrato pode sofrer reações distintas que vão determinar a rota

AULA
metabólica daquela molécula.

D E F G
A B C
H I J K

Qualquer participante de uma reação metabólica, seja ele substrato,


intermediário ou produto, é chamado metabólito, e as moléculas que
não podem mais ser utilizadas pelo organismo e, portanto, devem ser
eliminadas são denominadas catabólitos. Assim, no nosso organismo as
moléculas de CO2 que eliminamos pela respiração e a molécula de uréia
que eliminamos na urina são exemplos de catabólitos.

CATABOLISMO E ANABOLISMO

O metabolismo pode ainda ser dividido em duas principais


categorias:
Anabolismo – processos que envolvem primariamente a síntese de
moléculas orgânicas complexas. Esses processos necessitam de energia.
Catabolismo – processos relacionados à degradação de substâncias
complexas com concomitante geração de energia.
Veja um resumo destas informações na Figura 3.2.

Figura 3.2: Representação esquemática dos principais aspectos do catabolismo e do metabolismo.

CEDERJ 35
Bioquímica II | Conceitos fundamentais do metabolismo

Esta distinção é arbitrária, especialmente porque muitos substratos


das vias anabólicas são formados como intermediários nos processos
catabólicos e vice-versa. Durante o catabolismo, observamos a oxidação
das moléculas, e durante o anabolismo verificamos redução das moléculas.
Relembre que redução é um processo no qual ocorre ganho de elétrons
e oxidação envolve perda de elétrons. No nosso organismo existem
moléculas que auxiliam algumas enzimas nos processos de óxido-redução
e, portanto, são denominadas coenzimas. São exemplos de coenzimas a
nicotina adenina di-nucleotídeo (NAD), a flavino-adenino dinucleotídeo
(FAD). Veja a estrutura de algumas coenzimas, bem como o mecanismo
pelo qual elas transportam moléculas de hidrogênio, na Figura 3.3.
Quando essas coenzimas estão associadas ao hidrogênio, dizemos que
elas estão reduzidas; quando elas perdem esses hidrogênios, dizemos que
a coenzima está oxidada. Na Figura 3.2 você pode observar que durante
o catabolismo ocorre a redução das coenzimas, ou seja, transformação de
NAD e FAD em NADHH e FADH2, respectivamente. Por outro lado, no
anabolismo ocorre a oxidação de NADPHH em NADP. Em resumo, se
quisermos acompanhar os processos de óxido-redução podemos observar
o teor de hidrogênio de uma molécula. Durante a oxidação, a molécula
perde hidrogênios. Observe a Figura 3.3.

H
Metano
OXIDAÇÃO

H C H

H Metanol

H C OH
Figura 3.3: Processo de oxidação da
H
molécula de metano à molécula de
H Formaldeído dióxido de carbono.

C O
H
H Ácido fórmico

C O
HO

O C O

36 CEDERJ
MÓDULO 1
Ao contrário da primeira impressão, as vias de síntese e degradação

3
de uma dada molécula não são as mesmas.

AULA
Quase sempre os dois caminhos são bastante distintos um do
outro. Embora apresentem reações enzimáticas e intermediárias comuns,
são vias diferentes por possuírem diferentes enzimas catalisando pelo
menos parte de suas reações.
Essa é uma estratégia para evitar a redundância e o ciclo vicioso.
Enzimas chaves vão ditar a regulação simultânea das vias opostas.

PRINCIPAIS MECANISMOS DE REGULAÇÃO METABÓLICA

Controle dos níveis das enzimas

As concentrações das diversas enzimas intracelulares podem


ser diferentes; assim, enzimas das vias centrais de produção de energia,
como as da via glicolítica (Aula 10), devem ser mais abundantes do que
as que realizam funções limitadas ou especializadas dentro da célula.
Verificamos ainda que os níveis de uma mesma proteína podem variar
em função das necessidades de um determinado momento. Imagine, por
exemplo, o que ocorre durante a amamentação: durante este período, os
níveis das enzimas envolvidas na síntese da galactose (açúcar do leite)
e da caseína (proteína do leite) estão muito aumentados, retornando a
níveis basais quando a produção do leite não é mais necessária.

Controle da atividade da enzima

Basicamente, a atividade de uma enzima pode ser controlada de


duas maneiras: 1) pela interação com um ligante; 2) por modificação
covalente de uma molécula. Ligantes que controlam a atividade de uma
enzima podem ser poliméricos, como por exemplo, interações proteína-
proteína. No entanto, nós nos concentraremos nas interações com
moléculas de baixo peso molecular, principalmente substratos e efetores
alostéricos (veja a aula sobre enzimas na Bioquímica I). Assim, de um
modo geral, quando a concentração de um substrato estiver aumentada
dentro de uma célula, a atividade da enzima que utiliza este substrato
será aumentada e, uma vez formada a quantidade de produto desejado,
mecanismos de inibição desta enzima serão ativados. Muitas vezes, o
produto final de uma seqüência de reações poderá se associar à primeira
enzima da via, inibindo-a.

CEDERJ 37
Bioquímica II | Conceitos fundamentais do metabolismo

Modificações covalentes de uma enzima representam uma outra


forma efetiva de regulação da atividade de uma determinada enzima.
Você verá que a adição de um grupamento fosfato (fosforilação) a uma
enzima acarretará para algumas delas o aumento de sua atividade;
no entanto, para outras, a fosforilação poderá acarretar inibição da
atividade. Fique atento quando, mais adiante, você for estudar os
mecanismos de ativação das enzimas envolvidas na degradação e
biossíntese do glicogênio (Aulas 27 e 28 desta disciplina)!
Controles através de ligações covalentes normalmente estão
associados com regulações em cascata, ou seja, a modificação ativa
uma enzima, a qual ativa uma segunda enzima, que pode ativar uma
terceira enzima, que finalmente atua sobre um substrato. Na Figura 3.4,
observamos que cada molécula da primeira enzima ativada pode ativar
dez moléculas da segunda enzima, ou seja, uma amplificação do sinal em
dez vezes, e que cada uma dessas pode ativar dez moléculas da terceira
enzima, amplificação do sinal em cem vezes, e por fim cada uma destas
pode ativar dez moléculas da quarta enzima. Teremos no final deste
processo uma amplificação de mil vezes do sinal inicial.

Sinal
modificador

Enzima
inativa A
amplificação 10 X

Enzima
inativa A

Enzima
ativa B

amplificação 100 X
Enzima
ativa B
Figura 3.4: Reações de
ativação enzimática em
cascata.

Enzima
inativa C
amplificação 1000 X

Enzima
inativa C

Substrato Produto

38 CEDERJ
MÓDULO 1
Controle por compartimentalização

3
Outra estratégia eficiente é a compartimentalização. Em geral, a

AULA
via de síntese de uma dada molécula ocorre em um compartimento celular
distinto daquele onde ocorre a sua via de degradação. Por exemplo, a
via de degradação de ácidos graxos (Aula 24) ocorre nas mitocôndrias,
enquanto a via de síntese de ácidos graxos (Aula 26) ocorre no citoplasma
das mesmas células.

Regulação hormonal

Sobrepondo e permeando os mecanismos que operam dentro


de uma célula estão as mensagens disparadas de um outro tecido ou
órgão. Tais mensagens são transmitidas por hormônios. Um hormônio
é um mensageiro químico, uma substância sintetizada em uma célula
especializada que é transportada pela circulação até uma célula alvo, onde
interage com receptores, resultando em mudanças específicas na célula
alvo. Estas mudanças são efetivadas por mecanismos regulatórios, tais
como: mudanças na atividade de uma enzima em particular, mudanças na
concentração de uma enzima e mudanças na permeabilidade da membrana
para um substrato em particular. A ação dos hormônios será discutida
em maiores detalhes no último módulo desta disciplina.

CEDERJ 39
Bioquímica II | Conceitos fundamentais do metabolismo

RESUMO

Nesta aula, você aprendeu que o metabolismo é o conjunto de reações que


ocorre dentro da célula, tendo como funções obter energia química do ambiente;
converter moléculas de nutrientes (exógenas) em moléculas características do
próprio organismo (endógenas); sintetizar e degradar biomoléculas requeridas
em funções celulares especializadas.

O metabolismo pode ser dividido em três estágios; no nível 1 ocorrem as reações


de conversão de metabólitos poliméricos em seus constituintes monoméricos;
no nível 2 estes monômeros são quebrados em intermediários simples tais
como moléculas de acetil coA; no nível 3 essas moléculas são transformadas em
catabólitos para excreção.

As vias metabólicas podem ser lineares ou cíclicas, convergentes ou divergentes.

As reações de degradação, normalmente convergentes e associadas com liberação


de energia, e a formação de coenzimas reduzidas fazem parte do catabolismo,
enquanto as reações dependentes de energia e com utilização de coenzimas
reduzidas fazem parte do anabolismo.

O controle do metabolismo é feito por regulação dos níveis e das atividades das
enzimas. Este controle é norteado por regulações alostéricas, por modulações
covalentes, por compartimentalização e por regulação hormonal.

40 CEDERJ
4

AULA
Fotossíntese I - Princípios gerais
Bioquímica II | Fotossíntese I - Princípios gerais

INTRODUÇÃO Um ecossistema consiste do conjunto de organismos de uma determinada área,


mais os fatores abióticos com os quais eles interagem; em outras palavras, uma
comunidade e o seu ambiente físico. Podemos considerar como um ecossistema
um terrário ou um lago, uma floresta ou a biosfera inteira.
Um ecossistema mantém-se através de dois processos que serão discutidos
tomando-se a biosfera como ecossistema referência. São eles:

• Fluxo de energia e
• Ciclos biogeoquímicos.

A energia necessária para a manutenção da vida entra no


ecossistema na forma de luz solar ou energia luminosa. Esta energia é
convertida em energia química através da fotossíntese. Os organismos
capazes de realizar a fotossíntese são chamados autotróficos.

Fotossíntese:
Energia luminosa Energia química

Os autotróficos convertem parte da energia solar que chega à


superfície da Terra em energia química, e esta energia química pode ser
estocada nas células ou convertida em trabalho celular. Como vimos
anteriormente, este processo é baseado em transdução de energia.

Energia luminosa Energia química Trabalho celular

Normalmente, na natureza, os elementos químicos, como carbono,


nitrogênio etc. são reciclados entre os componentes abióticos e bióticos
do ecossistema.
Organismos fotossintéticos ou fotossintetizantes adquirem estes
elementos na forma inorgânica, do ar e solo, e os assimilam para a
construção de moléculas orgânicas, algumas das quais serão consumidas
por animais.
Figura 4.1: Um gafanhoto
Os elementos retornam na forma inorgânica ao solo e ar através
se alimentando de uma
folha. Esta imagem repre- do metabolismo de plantas e animais e por outros organismos (como
senta a relação de inter-
dependência metabólica bactérias e fungos) que degradam lixo orgânico e organismos mortos
entre os organismos.
(os decompositores).

4 2 CEDERJ
MÓDULO 2
4
AULA
+CO2+H2O f
r o
e t
s o
p s
i s
r í
a n
ç t
ã Glicose +O2 e
o s
e

Figura 4.2: O ciclo do carbono. Vegetais e outros organismos convertem CO2 e água em glicose e O2 através
do processo de fotossíntese. Animais e outros organismos heterotróficos utilizam glicose e O2 no processo de
respiração celular, devolvendo CO2 e H2O à atmosfera.

Fluxo de energia e reciclagem química estão relacionados porque


ambos ocorrem por transferência de substâncias através dos diferentes
níveis alimentares (tróficos) do ecossistema. Assim, o carbono que hoje
é parte do corpo de um animal amanhã poderá estar na forma de CO2.
Este gás será utilizado por vegetais e o carbono voltará à sua forma
orgânica como amido, por exemplo. Esta molécula (que você conhece
da Bioquímica I) é fonte de alimento para muitos animais e, assim, o
carbono voltará a fazer parte da constituição de algum consumidor de
amido. Não há desperdício. A matéria é reciclada.
Entretanto, a energia (diferente da matéria) não pode ser
reciclada, um ecossistema deve sobreviver graças a um contínuo influxo
de energia nova de uma fonte externa (o sol).
Nossas próximas aulas falam de como se dá esse fluxo de energia
que mantém a biosfera. Temos por objetivo mostrar a interdependência
entre os diferentes processos usados pelos organismos para obtenção de
energia e como essa interdependência é crucial para o equilíbrio biológico
no nosso planeta.

CEDERJ 4 3
Bioquímica II | Fotossíntese I - Princípios gerais

O CICLO DO CARBONO

Na natureza, CO2 e H2O são combinados para formar carboidratos


na fotossíntese.

LUZ

CO2 + H2O Carboidratos (fotossíntese)

Tanto nos próprios vegetais como nos herbívoros, estes


carboidratos são reoxidados para gerar CO2 e H2O, no processo
conhecido como respiração celular. Parte da energia é aprisionada na
forma de ATP.

ATP

Carboidratos CO2 + H2O (respiração celular)

Os vegetais adquirem CO2 da atmosfera, por difusão através dos


estômatos de suas folhas, e o incorporam à matéria orgânica que será
parte de sua biomassa. Parte desse material orgânico torna-se fonte de
carbono para os organismos heterotróficos (consumidores). A respiração
de autotróficos e heterotróficos retorna o CO2 para a atmosfera (veja
a Figura 4.2).
O ciclo do carbono é relativamente rápido porque as plantas
têm alta demanda de CO2, mas o gás está presente na atmosfera a
uma concentração relativamente baixa (~0,03%). A cada ano, plantas
removem 1/7 do CO2 da atmosfera, e isto é equilibrado pela respiração,
que devolve esse CO2 à atmosfera. Parte do carbono pode ser desviado
desse ciclo por um longo período de tempo. Isto acontece quando ele é
acumulado em madeira e outros materiais orgânicos duráveis. O processo
de decomposição desses materiais eventualmente recicla esse carbono
para a atmosfera na forma de CO2, mas o fogo pode oxidar o material
orgânico acumulado em madeira a CO2 mais rapidamente.

!
Pense na situação atual: o CO2 fixado na forma de combustíveis fósseis retorna à
atmosfera rapidamente, certo? Ao mesmo tempo, diminui a cobertura vegetal. O que
acontece com o nível de CO2 atmosférico? Você pode imaginar as conseqüências disso?

4 4 CEDERJ
MÓDULO 2
Alguns processos, entretanto, podem remover carbono por
milhões de anos. Em alguns ambientes, o material orgânico é acumulado

4
AULA
mais rapidamente do que os decompositores podem quebrar. Sob estas
condições, no passado, estes depósitos formaram carvão e petróleo, os
combustíveis fósseis.

FLUXO DE ENERGIA

A cada dia a Terra é bombardeada por 1022 joules de energia solar,


o equivalente à energia de 100 milhões de bombas atômicas do tamanho
da que foi lançada sobre Hiroshima na 2ª Guerra Mundial. A maior parte
dessa energia é absorvida, desviada ou refletida pela atmosfera ou pela
superfície da Terra. Da radiação (luz visível, que atinge folhas e algas),
somente 1% é convertido em energia química pela fotossíntese – a eficiência
varia com o tipo de planta, o nível de luz e outros fatores. Mesmo assim,
isto é suficiente para a produção de, aproximadamente, 170 bilhões de
toneladas de matéria orgânica por ano, globalmente. Vamos discutir aqui
como acontece essa conversão.

!
A fotossíntese, portanto, não somente fornece carboidratos para obtenção de energia
por plantas e animais, mas é também o principal caminho pelo qual o carbono retorna
à biosfera e é a principal fonte de O2 na atmosfera terrestre.

EVOLUÇÃO, OXIGÊNIO E FOTOSSÍNTESE

Acredita-se que, antes do surgimento dos organismos


fotossintéticos, a atmosfera terrestre era pobre em O2 e rica em CO2.
Organismos pré-fotossintéticos devem ter utilizado moléculas ricas
em energia, presentes no meio e sintetizadas abioticamente. Sem a
fotossíntese, estas fontes de energia teriam se esgotado e teria sido
impossível a sobrevivência de organismos vivos. Os registros fósseis
sugerem que fotossintetizantes apareceram há 3 bilhões de anos.
A conversão gradual, de atmosfera primitiva não oxidante a
uma atmosfera terrestre oxidante, permitiu o boom de organismos com
metabolismo aeróbico e a evolução de animais (veja a Figura 4.3).

CEDERJ 4 5
Bioquímica II | Fotossíntese I - Princípios gerais

Níveis de 20
oxigênio na
atmosfera 10 Rápido acúmulo de O2
(%) pela saturação do Fe12
nos oceanos

Bilhões
0 1 2 3 4
de anos
Origem das Hoje
células
Formação Primeiras Liberação de eucarióticas Primeiras
da terra células vivas O2 a partir da fotossintetizantes vertebrados
Formação fotólise da água
Primeiras
de oceanos Respiração plantas
Primeiras
e continentes celular e animais
células
fotossintetizante multicelula

Figura 4.3: Seqüência de eventos evolutivos e sua relação com os níveis de O2 atmosférico.

Hoje a fotossíntese representa a última e única fonte de energia


direta ou indireta para a maior parte dos organismos vivos (exceto
bactérias terosófilas, que usam H2S e H2 como fonte de energia).

Você viu nesta aula a importância da Fotossíntese para a manutenção da vida. Nas próximas
aulas você verá os detalhes deste processo.

4 6 CEDERJ
5

AULA
Fotossíntese II –
O processo de fotossíntese
Bioquímica II | Fotossíntese II - O processo de fotossíntese

INTRODUÇÃO Na aula passada, falamos da importância da fotossíntese para a vida no planeta


e já sabemos um pouco sobre os eventos evolutivos que culminaram na vida
como a conhecemos hoje. Agora falaremos dessa via metabólica, sua localização
celular, o que ocorre em cada uma das etapas e, é claro, um pouco da história.
Vamos destacar as enzimas chaves quando chegar a hora. Não se preocupe com
os nomes pontualmente, mas prefira sempre entender o processo e a lógica
metabólica e fisiológica. Os nomes virão como conseqüência.

LOCALIZAÇÃO

Cloroplastos

Em todas as plantas e algas, a fotossíntese está localizada em


estruturas especializadas chamadas cloroplastos. Em plantas, a maior
parte dos cloroplastos é encontrada em células mesófilas, logo abaixo da
superfície (cutícula) da folha (veja a Figura 5.1); cada célula contém entre
20 a 50 dessas organelas. As algas também têm cloroplastos, mas em
geral apresentam um único cloroplasto muito grande em cada célula.
Como as mitocôndrias, os
cloroplastos são organelas semi-
autônomas: carregam seu próprio DNA,
que codifica algumas de suas proteínas, e
os ribossomos necessários para a tradução
Cloroplastos
de seus RNAs mensageiros. Existem
evidências de que cloroplastos evoluíram
de organismos unicelulares similares a
cianobactérias. Como os procariontes
fotossintetizantes não possuem cloroplastos,
mas possuem membranas que desempenham
Figura 5.1: Microscopia óptica de campo claro de células
vegetais. Os cloroplastos aparecem como pequenos círculos o mesmo papel das membranas de
em tom mais escuro.
cloroplastos, as cianobactérias lembram
cloroplastos de vida livre.
!
Os cloroplastos são formados por uma membrana externa
Você conhece mito-
côndrias e cloroplastos livremente permeável e uma membrana interna seletivamente permeável
do ensino médio e
também das aulas de
(veja as Figuras 5.2 e 5.3). A membrana interna envolve um material
Biologia Celular. análogo à matriz mitocondrial – que é chamado estroma.

48 CEDERJ
MÓDULO 2
Mergulhados no estroma estão os tilacóides, estruturas formadas

5
por membranas que lembram sacos. Estes estão organizados empilhados Singular = granum

AULA
Plural = grana
como moedas, formando unidades chamadas grana.
Grana são irregularmente conectados por extensões dos tilacóides
chamadas lamela. A membrana dos tilacóides envolve um espaço interior
chamado lúmen do tilacóide.
Estroma
Tilacóide
Membrana Interna

Granum

Membrana Externa
Lamela

Figura 5.2: Estrutura de um cloroplasto.

A divisão de trabalho no cloroplasto é única. Absorção de luz


e todas as reações que dependem de luz ocorrem na membrana dos
tilacóides. As outras reações ocorrem no estroma.

a Membrana plasmática
b

Citoplasma Grana
Parede
Celular Membrana do
tilacóide

Estroma

Espaço Vacúolo
com ar
Membranas interna e
externa do cloroplasto

Cloroplasto

Núcleo

Grânulo
de amido

Figura 5.3: Microscopia eletrônica de transmissão de uma célula vegetal (A) e um cloroplasto em destaque (B).

CEDERJ 49
Bioquímica II | Fotossíntese II - O processo de fotossíntese

AS ETAPAS

A fotossíntese é descrita, de uma maneira bem geral, como:


luz

CO2 + H2O (CH2O)n + O2,

onde (CH2O)n representa um carboidrato qualquer.

CO2 + H2O + energia solar açúcar + CO2

Figura 5.4: Equação geral do processo de fotossíntese.

Entretanto, o processo pode ser dividido em duas etapas:

1) Reações do claro ou fase clara ou etapa fotoquímica.


2) Reações do escuro ou fase escura ou etapa química.

50 CEDERJ
MÓDULO 2
A etapa fotoquímica

5
Nesta etapa, a molécula de água é quebrada. O oxigênio de duas

AULA
moléculas de água se combinam e formam O2. Os hidrogênios restantes
se associam com moléculas chamadas aceptores de elétrons. Neste caso,
o aceptor é o NADP (Nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato), cuja
forma reduzida é representada por NADPH. (veja a Figura 5.5).

H O
C
NH2

O CH2 O N+
H H
O P O- H Figura 5.5: Nicotinamida Adenina
H
HO HO dinucleotideo fosfato (NADP).
O NH2
N+
O P O- N+

O CH2 O N N
H H
H H
2-
HO OPO3H2

Assim, já na primeira etapa, a célula libera oxigênio (pela quebra


da água) e forma um composto de alta energia (o NADPH). Na etapa
fotoquímica há também a síntese de outra molécula de alta energia,
conhecida como ATP (adenosina trifosfato). Essa etapa pode, então, ser
representada da seguinte maneira:
Dizemos então que, nesta fase, há conversão de energia solar em
energia química (NADPH e ATP).

luz

H2O + NADP + ADP + Pi ½ O2 + H+ + NADPH + ATP

RESUMINDO
Na etapa fotoquímica, a energia luminosa é utilizada para quebrar
a molécula de água e sintetizar NADPH e ATP.

CEDERJ 51
Bioquímica II | Fotossíntese II - O processo de fotossíntese

Etapa química ou Ciclo de Calvin

A etapa química não depende diretamente da energia solar.


Ela utiliza os produtos da etapa anterior para formar carboidratos.
Lembre-se sempre de que sintetizar moléculas custa caro. A etapa
química é uma fase de síntese de glicose e, portanto, precisa de energia.
Esta energia é transferida pelas moléculas de alta energia produzidas
na etapa fotoquímica (NADPH e ATP). Além de energia, é preciso
matéria-prima para a construção. A matéria-prima é o CO2, que fornece
os elementos necessários à construção do esqueleto carbonado. A seguir,
representamos um esquema da etapa química, no qual o carboidrato
construído é (CH2O)n (esquema 1) e um esquema em que este carboidrato
é a glicose (esquema 2). !
Lembre-se de que para
Esquema 1 ATP + NADPH + CO2 (CH2O)n + NADP + ADP + Pi somar as duas etapas
podemos cortar os
componentes que
aparecem nos dois
Esquema 2 ATP + NADPH + 6CO2 C6H12O6 + NADP + ADP+ Pi lados das reações.
Portanto, na soma,
NADP+, ADP, Pi, ATP
Dizemos que esta fase é a fase de fixação do CO2 em uma molécula e NADPH podem ser
orgânica. eliminados.

RESUMINDO

Na etapa química, O CO2 é assimilado e fixado, para sua posterior


conversão em uma molécula orgânica. Este processo de síntese
requer NADPH e ATP, sintetizados na etapa fotoquímica.

Assim, somando-se as duas etapas:


luz

Etapa fotoquímica H2O + NADP+ + ADP + Pi O2 + ATP + NADPH

Etapa química ATP + NADPH + CO2 NADP+ + ADP + Pi + glicose

Temos:
luz

6 H2O + 6 CO2 C6H12O6 + 6 O2

52 CEDERJ
MÓDULO 2
HISTÓRICO

5
Até 1930, o modelo da fotossíntese especulava que o dióxido

AULA
de carbono era quebrado e então a água era adicionada ao carbono
resultante.

1 - CO2 C + O2
2 - C + H2O CH2O Cornelis Bernardus
van Niel (1897-
1985) era um
Neste modelo, era proposto que o O 2 liberado durante a engenheiro químico
que trabalhava como
fotossíntese vinha como resultado da quebra do CO2. Este modelo caiu microbiologista
estudando taxonomia
por terra graças a Cornelis Bernardus van Niel, um estudante (na época) de bactérias.
que investigava a fotossíntese em bactérias que produziam carboidratos Trabalhou na estação
marinha Hopkins,
a partir de CO2 mas não liberavam oxigênio. da Universidade
de Stanford, na
Van Niel concluiu que, pelo menos em bactérias, o CO2 não é Califórnia, até 1962.
Retirado de http:
quebrado em carbono + O2.
//www.asmusa.org/
Esse grupo de bactérias requer H2S (sulfeto de H) e não H2O para mbrsrc/archive/pdfs/
530287p75.pdf
a fotossíntese, formando glóbulos amarelos de enxofre como produto
de excreção.

Assim:
CO2 + 2H2S CH2O + H2O + 2S

Van Niel ponderou que a bactéria deveria quebrar H2S e usar o


hidrogênio para produzir açúcar. Ele generalizou que todos os organismos
fotossintetizantes requerem uma fonte de hidrogênio, mas que essa fonte
pode variar:

Em sulfobactérias:
CO2 + 2H2 CH2O + H2O + 2S

Em plantas:
CO2 + 2H2O CH2O + H2O + O2

Esquema geral:
CO2 + H2X CH2O + H2O + 2X

CEDERJ 53
Bioquímica II | Fotossíntese II - O processo de fotossíntese

Desta forma, Van Niel levantou a hipótese de que as plantas


quebram água como fonte de hidrogênio, liberando O2 como um produto
desta quebra.
Nos vinte anos seguintes, a hipótese de Van Niel foi confirmada
graças ao uso de 18O – um isótopo pesado do oxigênio, utilizado como um
traçador para mostrar o destino dos átomos de oxigênio na fotossíntese.
18
Esses experimentos mostraram que o O2 gerado na fotossíntese é O
somente se a H2O é a fonte do traçador. Se o 18O foi introduzido na planta
na forma de CO2, a marcação não aparece no oxigênio produzido.

Experimento 1: CO2 + 2H2O CH2O + H2O + O2


Experimento 2: CO2 + 2H2O CH2O + H2O + O2

É importante lembrar que os elétrons associados ao hidrogênio


têm uma energia potencial muito maior em moléculas orgânicas do que
na água. A energia é estocada em açúcares e outras moléculas orgânicas
na forma de elétrons de alta energia.

54 CEDERJ
MÓDULO 2
RESUMO

5
AULA
Você viu nesta aula que a fotossíntese ocorre no cloroplasto das células
vegetais e que ela pode ser dividida em etapa fotoquímica e etapa
química. Na primeira etapa, a molécula de água é quebrada e os
hidrogênios associam-se a aceptores de elétrons. O oxigênio molecular
(O2), liberado na atmosfera, também é resultado desta etapa. Nesta fase
são sintetizados NADPH e ATP. Na etapa seguinte, estas moléculas serão
a fonte de energia para a síntese de glicose.

Nas próximas duas aulas, você verá cada uma dessas etapas
separadamente. Vamos discutir como cada uma acontece e qual a bateria
enzimática responsável pela catálise das reações. Na Aula 6, veremos a
etapa fotoquímica – aquela que depende de luz. Você conhecerá o papel
da clorofila e de outros pigmentos neste processo. Na aula seguinte (Aula
7), veremos como a célula vegetal utiliza o ATP e o NADPH, gerados na
primeira fase, para sintetizar glicose e outros compostos. Lembre que os
exercícios só virão no final do módulo. Então... estamos prontos?

CEDERJ 55
6
AULA
A etapa fotoquímica ou
fase clara da fotossíntese

Você já sabe o básico sobre fotossíntese. Agora vamos


objetivos

descrever a etapa fotoquímica – processo pelo qual a energia


solar é capturada pelo cloroplasto – as moléculas envolvidas
e a seqüência de reações. Na aula seguinte (Aula 7),
explicaremos como ocorre a etapa química.
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

COMO AS REAÇÕES DA FASE CLARA


CAPTURAM ENERGIA SOLAR?

Como vimos anteriormente, a primeira etapa da fotossíntese


transforma energia luminosa em energia química, como ATP e NADPH.
Isso acontece graças a um conjunto organizado de moléculas presentes
na membrana do tilacóide, presente nos cloroplastos. O evento mais
importante, que é a origem de todo o processo, é a fotólise da água.
A energia do sol é uma forma de energia conhecida como ENERGIA
ENERGIA
ELETROMAGNÉTICA ELETROMAGNÉTICA OU RADIAÇÃO. A energia eletromagnética viaja em ondas.
OU RADIAÇÃO O comprimento de onda varia de menos de um nanômetro (para raios
A luz do sol é uma
gama) até mais de 1km (para ondas de rádio). Essa variação é conhecida
forma de energia
eletromagnética como espectro eletromagnético. A radiação conhecida como luz visível
ou radiação.
(400 a 700nm de comprimento de onda) é o segmento mais importante
para a vida.

Figura 6.1: Espectro eletromagnético. O olho humano é capaz de perceber apenas os comprimentos
de onda correspondentes ao espectro visível. A maior parte do espectro eletromagnético é invisível.

58 CEDERJ
MÓDULO 2
A radiação também pode ser vista como partículas chamadas

6
quanta ou fótons. A quantidade de energia é inversamente relacionada

AULA
ao comprimento de onda da luz.
Assim, um fóton de luz violeta tem duas vezes mais energia que
o fóton de luz vermelha.
A mesma parte do espectro que pode ser vista – a luz visível – é
também a radiação que dirige a fotossíntese. Azul e vermelho são os dois
comprimentos de onda mais eficientemente absorvidos pela clorofila
(Figura 6.2) e, portanto, as cores mais usadas como energia para as
reações da fotossíntese.
!
Não esqueça!
CH2
A quantidade de energia é
CH R
inversamente relacionada
CH CH3 ao comprimento de onda
H3C CH2 da luz.
N N
HC Mg CH
N N
H3C CH3
H
H2C H
CH2 H C O CLOROFILA a R = CH3

O C O O H
O CH3
CLOROFILA b R = C
CH2
O
CH CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 CH3
C CH CH2 CH CH2 CH
CH3 CH3 CH3 CH3

Figura 6.2: A molécula de clorofila. Note o anel porfirínico semelhante ao heme da


hemoglobina (que você viu em Bioquímica I). No caso da clorofila, o átomo central
do anel é o magnésio. O grupo na posição representada por R diferencia as várias
clorofilas. Observe a longa cauda de hidrocarboneto. Como você classificaria essa
molécula? Fonte: fai.unne.edu.ar/biologia/planta/fotosint.htm

Substâncias que absorvem luz visível são chamadas pigmentos.


Diferentes pigmentos absorvem diferentes comprimentos de onda, e o
comprimento de onda absorvido desaparece, enquanto os outros são
refletidos. Se o pigmento absorve todos os comprimentos de ondas
ele aparece preto. A habilidade de um pigmento para absorver vários
comprimentos de onda de luz pode ser medida colocando-se uma solução
do pigmento em um instrumento chamado espectrofotômetro.
Então pense... por que a clorofila é verde?

CEDERJ 59
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

O pigmento chave quando se fala de fotossíntese é a clorofila


(Figura 6.2). Isso porque apenas a clorofila pode participar diretamente
das reações da fase clara que convertem energia solar em química. Mas
outros pigmentos podem absorver luz e transferir a energia para a
clorofila, que então iniciará as reações.
Alguns pigmentos encontrados nos cloroplastos:

• Clorofila a

• Clorofila b

• β- Caroteno

• Ficoeritrina

• Ficocianina

Clorofila b Ficoeritrina Ficocianina

Clorofila a
Absorção

- Caroteno

250 300 350 400 450 500 550 600 650 700
violeta azul verde amarelo vermelho

Comprimento de onda (nm)

Figura 6.3: O espectro de absorção de luz de diferentes pigmentos.

60 CEDERJ
MÓDULO 2
COMO OS PIGMENTOS ESTÃO ORGANIZADOS?

6
Os pigmentos estão organizados na membrana tilacóide em

AULA
conjuntos de poucas centenas (~300) de moléculas de pigmentos. Essas
membranas são ricas em glicolipídios e contêm grande quantidade
de proteína. Os pigmentos estão ligados a algumas dessas proteínas.
Clorofilas também interagem com lipídios de membrana por suas caudas
hidrofóbicas.
Estes conjuntos de pigmentos e proteínas estão organizados em
fotossistemas. Existem dois fotossistemas na membrana tilacóide:

• Fotossistema I

• Fotossistema II

COMO OS FOTOSSISTEMAS TRABALHAM?

Em cada um dos fotossistemas há uma única clorofila capaz de


iniciar a reação. A localização dessa clorofila no fotossistema é chamada
centro de reação (alguns autores sugerem a existência de um par de
moléculas de clorofilas a especializadas no centro de reação).
Robert Emerson e Willian Arnold, em 1930, mostraram que,
quando o sistema fotossintético da alga Chlorella operava na eficiência
máxima, somente uma molécula de O2 era produzida para cada 2.500
moléculas de clorofila.
A maior parte dessas moléculas não está diretamente engajada no
processo fotoquímico, mas atua como moléculas antenas ou clorofilas
antenas ou, ainda, complexo antena, absorvendo fótons e transferindo
energia para os centros de reação. Em outras palavras:
A energia de um fóton absorvido por qualquer molécula do
complexo antena viaja pelo sistema de uma forma randômica, aleatória.
Eventualmente (~10-10seg) a energia encontra o seu caminho para a
molécula de clorofila a no centro de reação.

CEDERJ 61
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

A clorofila do centro de reação difere das outras moléculas de


clorofila porque se encontra em um ambiente diferente, de forma que
o seu nível de energia (no estado excitado) é um pouco menor. Desta
forma, ela atua como uma armadilha para a energia absorvida pelos
outros pigmentos do fotossistema.

Energia luminosa

Energia
Complexo redutora
antena Centro de
reação
Figura 6.4: A organização das moléculas de clorofila nos fotossistemas. A maioria das
moléculas de clorofila absorve luz e transfere a energia para o complexo antena,
também chamado molécula antena ou proteína antena.

62 CEDERJ
MÓDULO 2
Cada complexo antena possui aproximadamente 300 moléculas

6
de clorofilas.

AULA
A energia é absorvida pelo centro de reação e os elétrons da clorofila
passam de um estado fundamental para um estado excitado. Estes elétrons
de alta energia são então transferidos dos centros de reação para uma
cadeia de tranportadores até o NADP para formar o NADPH.
energia

Fóton

e-
Estado
fundamental
ee- -

e-
energia

Estado
excitado
energia

Molécula
aceptora de
elétrons e-

Figura 6.5: Seqüência de excitação do elétron da molécula aceptora pela luz solar.

CEDERJ 63
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

AS REAÇÕES NOS FOTOSSISTEMAS

Os dois fotossistemas realizam diferentes reações e dependem


de luz de diferentes comprimentos de onda.
O fotossistema I pode ser excitado por luz de comprimentos
de onda mais curtos que 700nm e o fotossistema II requer luz de
comprimentos de onda mais curtos que 680nm para sua excitação.

Fotossistema I - 700nm

Fotossistema II - 680nm

Os dois fotossistemas operam no cloroplasto para produzir


NADPH (poder redutor), ATP e O2, porque estão interligados por uma
cadeia de transporte de elétrons. Os dois fotossistemas são estruturalmente
distintos no cloroplasto. No centro de reação do fotossistema I, uma
clorofila especializada é chamada P700; e no fotossistema II a clorofila
é chamada P680.
Ambas absorvem luz vermelha e são moléculas idênticas. Suas
poucas diferenças estão associadas com diferentes proteínas de membrana
que afetam sua distribuição de elétrons e, portanto, apresentam pequenas
diferenças no espectro de absorção.
A absorção de luz nos centros de reação dos fotossistemas I e II
produz um estado excitado de alta energia em suas clorofilas. Esse evento
dispara uma série de REAÇÕES REDOX.
REAÇOES REDOX

Reações redox ou reações de


oxidação e redução são reações de
transferência de elétrons. Lembre-
se: redução é ganho de elétrons
e oxidação é perda de elétrons.

64 CEDERJ
MÓDULO 2
Em ambos os fotossistemas, a primeira etapa é a transferência do

6
elétron excitado pela luz do centro de reação para a cadeia de transporte

AULA
de elétrons.
A fonte desse elétron é a água, e o destino final é a molécula de
NADP+, que será reduzida a NADPH.

NADPH No cloroplasto
+
fóton NADP
fóton Elétron de baixa energia + luz = elétron de alta
Redutase
Ferredoxina
Estroma
-
e– e
Membrana PSII e–
PSI Figura 6.6: As reações luminosas da fotossíntese
tilacóide P680 Citocromo
Quinone P700 produzem ATP e NADPH. A energia requerida nesta
bf etapa é derivada da oxidação da água (fotólise). Em
plantas esse processo envolve dois centros de rea-
2 H2O e– ção fotossintéticos ligados em série por uma cadeia
plastocianina
Tilacoide O2 4H
+
2H
+ transportadora de elétrons. O fotossistema II (FSII)
usa energia luminosa para oxidar a água a O2 e então
Gradiente de passa os elétrons para o fotossistema I (FSI). No fotos-
prótons usados
para gerar sistema I o elétron é excitado novamente pela luz e
ATP
é usado para reduzir a ferredoxina. A ferredoxina
reduzida então reduz NADP+ a NADPH.

Durante as reações luminosas, existem duas possíveis rotas para


o fluxo de elétrons.

Fluxo cíclico – produz apenas ATP

Fluxo não cíclico – produz ATP, NADPH, O2

Antes de falar dos tipos de fluxos de elétrons, vamos apresentar


os componentes do transporte de elétrons da fotossíntese na ordem em
que estão presentes na membrana interna do cloroplasto, que é a ordem
de funcionamento da cadeia transportadora:

1. Fotossistema II (P680) - conjunto de pigmentos ligados


a proteínas.

2. Plastoquinona (PQ) - Chamada plastoquinona pela


primeira vez em 1959 por Crane, por ser uma quinona
encontrada em grandes quantidades no cloroplasto de
vegetais superiores.

CEDERJ 65
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

Reação:

PQ PQH2

O OH
H3C H3C
CH3 H3C CH3
H3C
O CH3 CH3 CH3 OH CH3 CH3 CH3

Figura 6.7: Plastoquinona oxidada (A) e reduzida (B).

3. Citocromo bf - recebe os elétrons da plastoquinona.


O complexo protéico é formado por quatro subunidades:
um citocromo f de 33kDa, um citocromo b563 de 23kDa
(dois hemes), uma proteína ferro-enxofre (Fe-S) de 20kDa
e uma proteína de 17kDa.

4. Plastocianina (Pc) - também é uma proteína integral de


membrana que apresenta uma única cadeia polipeptídica
Figura 6.8: Plastocianina.
de 10 500 Da. Esta proteína tem um centro constituído Fonte: http://www.biologie.
uni-hamburg.de/b-online/
de um átomo de cobre envolvido por duas pontes de e17/plasto.htm
nitrogênio e duas pontes de enxofre, que lhe confere uma
geometria tetraédrica.

5. Fotossistema I (P700) - conjunto de pigmentos ligados


a proteínas.

6. Ferredoxina - é uma proteína ferro-enxofre solúvel,


presente no estroma do cloroplasto.

A Cys S B C

S Fe S
Cys S S Cys S Cys
S Fe
Fe Fe S Fe
Cys S S Cys S Cys
S Fe S

Cys S

Figura 6.9: Ferredoxina. (A) complexo ferro-enxofre de uma proteína Fe2S2 - presente em ferredoxinas vegetais;
(B) complexo ferro-enxofre de proteínas Fe4S4 - presentes em ferredoxinas de bactérias; (C) estrutura tridimensional
de uma ferredoxina.

66 CEDERJ
MÓDULO 2
7. NADP redutase - último componente da cadeia

6
transportadora de elétrons, a NADP redutase é a enzima

AULA
que catalisa a reação:

NADP+ NADPH + H+, usando 2 e- e 2 H+ da FdH2


(ferredoxina reduzida).

O fluxo cíclico de elétrons

O fluxo cíclico de elétrons é o mais simples. Envolve somente


o fotossistema I e gera ATP, mas não produz NADPH nem O2 . Ele é
chamado cíclico porque os elétrons excitados que saem da clorofila do
centro de reações retornam.

e-
(P700)
Figura 6.10: Ferredoxina Fe4S4.
Fonte:http://www.life.uiuc.edu/
crofts/bioph354/4fe4s.html
Poder redutor

ferredoxina

Citocromo
o bf

(P700) e-
pc
2H+
Para o lúmen do
tilacóide
fóton

Figura 6.11: Transporte cíclico. Quando os níveis de NADPH são altos, os níveis
de NADP+ são baixos, e os elétrons na ferredoxina reduzida não têm para onde
ir. Nessas condições, a ferredoxina transfere seus elétrons para o citocromo bf,
onde eles serão transferidos novamente para a clorofila do fotossistema I. Este
processo é chamado transporte de elétrons cíclico e permite o bombeamento
de prótons e a síntese de ATP, mas não fornece NADPH.

CEDERJ 67
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

Quando pigmentos do complexo antena do fotossistema I absorvem


luz, a energia atinge, no centro de reação, a clorofila P700. Isto excita dois
elétrons da P700. Os elétrons de alta energia são aprisionados por um aceptor
primário de elétrons para uma ferroproteína – ferredoxina (Fd).
A ferredoxina passa os elétrons para a plastoquinona (Pq). Daí os
elétrons vão para um complexo de dois citocromos. Estes citocromos doam
seus elétrons para outra proteína, plastocianina (Pc), que contém cobre.

Figura 6.12: Seqüência de transferência de elétrons na etapa fotoquímica


da fotossíntese. Fd = ferredoxina; PQ = plastoquinona; Pc = plastocianina.

A cada etapa da cadeia de transporte, os elétrons perdem energia


potencial. Esse caminho, energeticamente “morro abaixo”, é usado pela
cadeia de transporte para bombear prótons H+ através da membrana
tilacóide. O gradiente de prótons gerado ativa a ATP-sintase, a enzima
que catalisa a síntese de ATP, que veremos mais adiante.
Certos transportadores de elétrons somente transportam elétrons
na companhia de íons H+, que são levados de um lado da membrana
tilacóide para o lado oposto.
O processo é similar à fosforilação oxidativa da mitocôndria
(que veremos na Aula 16).
Nos cloroplastos, a síntese de ATP é um processo de fosforilação.
Ela é chamada fotofosforilação por ser dirigida por energia luminosa.
No caso da fotofosforilação cíclica há somente síntese de ATP.
Nenhum NADPH é gerado.

68 CEDERJ
MÓDULO 2
O fluxo não cíclico de elétrons

6
No caso do fluxo não cíclico de elétrons, os dois fotossistemas

AULA
cooperam. Elétrons passam da H2O para o NADP+ para formar
NADPH.
Como no fluxo cíclico, a luz excita um par de elétrons da clorofila
P700. Entretanto, os elétrons não retornam, mas são armazenados como
elétrons de alta energia na forma de NADPH. Este será utilizado na fase
escura como doador de elétrons para a síntese de carboidrato.

NADP+ NADPH

ADP + Pi ATP
1
H2O /2O2 + 1H+

Elétrons ejetados da clorofila P680 são repostos por elétrons


removidos da água. Os elétrons excitados fluem pela cadeia de transporte
de elétrons até a clorofila P700 do fotossistema I, fornecendo energia
para a síntese de ATP. A iluminação do fotossistema I leva os elétrons
novamente para um estado de alta energia. Os elétrons excitados passam
por uma aceptor primário – a ferrodoxina, e finalmente ao NADP+
redutase, que catalisa a formação de NADPH.

(P660) (P700)
Poder redutor

Citocromo Ferredoxina
2H2O o bf
Redutase
e-
O2+4H+ e-
NADP+
(P660) (P700)
NADPH

fóton fóton

Figura 6.13: Fluxo não cíclico de elétrons na etapa fotoquímica da fotossíntese. Neste caso, ATP
e NADPH são formados.

CEDERJ 69
Bioquímica II | A etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese

A SÍNTESE DE ATP

Tanto nas mitocôndrias quanto nos cloroplastos, o ATP é gerado


por um mecanismo básico chamado quimiosmótico.

VISTA PERSPECTIVADA VISTA LATERAL


SIMPLIFICADA
a
b b
Superfície voltada b
para a matriz a a F1 (80 A°)
F1 (80 A°)

Talo 50 A°

F0 (50 A°) F0 (50 A°)

Outras superfícies
+
Canal transportador de H

A membrana tilacóide bombeia H+ do estroma (onde ocorreu


a hidrólise da água) para dentro do tilacóide, que funciona como
reservatório de H+. Os prótons concentrados no lúmen do tilacóide geram
um gradiente de concentração de prótons (gradiente eletroquímico).
Esses prótons encontram uma única saída para voltar ao estroma: passar
através de uma ATP-sintase. A ATP-sintase usa a energia de retorno dos
prótons para sintetizar ATP. A ATP-sintase produz ATP no estroma e é
utilizada no ciclo de Calvin que ali acontece.

70 CEDERJ
MÓDULO 2
RESUMO

6
AULA
Você viu nesta aula que a primeira etapa da fotossíntese transforma energia
luminosa em energia química, como ATP e NADPH. O evento mais importante, que
é a origem de todo o processo, é a fotólise da água. O pigmento chave, quando
se fala de fotossíntese, é a clorofila. Mas outros pigmentos podem absorver luz e
transferir a energia para a clorofila, que então iniciará as reações.

Esses conjuntos de pigmentos e proteínas estão organizados em fotossistemas:


o fotossistema I e o fotossistema II, em plantas e cianobactérias. A fotólise
da água, promovida pela fotooxidação do fotossistema II, libera elétrons
que fluem através de um complexo citocromo bf, passam pelo fotossistema
I e finalmente para o NADP+. O fluxo dos elétrons pode ser não cíclico,
resultando na redução do NADP+, ou cíclico, no qual os prótons adicionais
são transferidos para o lúmen do tilacóide. Os prótons liberados pela
oxidação da água e aqueles transferidos para o lúmen do tilacóide geram
um gradiente transmembrana de prótons, que é usado pela ATP-sintase do
cloroplasto para realizar a fosforilação do ADP (síntese de ATP).

Na próxima aula você verá como ocorre a etapa química, ou ciclo de Calvin. É neste
ciclo que o CO2 será utilizado como matéria-prima para a síntese de moléculas
orgânicas, especialmente glicose. Lembre que os exercícios serão apresentados
no final do módulo. Portanto, não perca a visão geral da fotossíntese.

CEDERJ 71
7

AULA
O ciclo de Calvin ou
etapa química da fotossíntese
Bioquímica II | O ciclo de Calvin ou etapa química da fotossíntese

INTRODUÇÃO Na aula passada, nós falamos da etapa fotoquímica ou fase clara da fotossíntese.
Você viu como o oxigênio é produzido e ATP e NADPH são sintetizados e o
papel da luz do sol neste processo. Agora, vamos falar da etapa seguinte,
chamada etapa química ou ciclo de Calvin ou ainda fase escura da fotossíntese.
Antes, lembre-se de que você já viu, na aula 05, que na etapa química o CO2
atmosférico é fixado em carboidratos.
A estequiometria global do ciclo de Calvin é:

18 ATP 18 ADP + 18 Pi

6 CO2 + 12 NADPH C6H12O6 + 12 NADP+

UM POUCO DE HISTÓRIA

A etapa química da fotossíntese acontece através de uma série de


reações cíclicas que deram a Melvin Calvin, um bioquímico americano, o
Prêmio Nobel de Química em 1961. Tal etapa foi elucidada por Calvin,
James Bassham e Andrew Benson entre 1946 e 1953. Estes pesquisadores
14
descreveram o destino metabólico do CO2 marcado com C (14CO2)
em uma cultura de células de algas. Os primeiros experimentos em que
14
o CO2 era incubado com as células de algas por um minuto ou mais
indicaram que estas sintetizavam uma mistura complexa de metabólitos,
dentre eles açúcares e aminoácidos.

14
Açúcares, aminoácidos e
CO2 + células de algas em cultura
5 minutos outros compostos orgânicos

ou mais

14
Entretanto, se o tempo de incubação das algas com o CO2
era reduzido para cinco segundos, a análise do material sintetizado
mostrava que o primeiro composto radioativo estável formado era o
3-fosfoglicerato (3PG).

7 4 CEDERJ
MÓDULO 2
5 segundos 2 moléculas de
14
CO2 + células de algas em cultura

7
3-fosfoglicerato

AULA
CH2O P A análise do composto marcado com 14CO2 mostrava que ele era
C O inicialmente marcado no seu grupo carboxila. Calvin sugeriu que o 3PG
CHOH era formado pela carboxilação de um composto de dois carbonos. Este
CHOH composto foi, por muito tempo, procurado por vários pesquisadores, mas
CH2O P nunca encontrado. A reação de carboxilação que realmente ocorre envolve
Figura 7.1: Ribulose 1,5 uma pentose chamada ribulose 1,5-bisfosfato (RuBP).
- bisfosfato (RuBP).

O CICLO DE CALVIN
A molécula aceptora
de CO2 é a ribulose
A carboxilação de uma pentose tem como produto dois compostos
1,5-bisfosfato.
de três carbonos cada: as moléculas de 3-fosfogliceratos. A rota completa
envolve a carboxilação da pentose, a formação de carboidratos como
produto principal da via e a regeneração de RuBP. Para que isso ocorra,
existem várias reações catalisadas por diferentes enzimas.
Mas não esqueça, no ciclo...

1- O CO2 é aprisionado na forma de um carboxilato e


reduzido, o que resulta na síntese de carboidratos.
2- A molécula aceptora de CO2 (ribulose 1,5-fosfato) é
regenerada.

O CO2 difunde-se no estroma do cloroplasto, onde é adicionado ao


grupamento carbonil da ribulose 1,5-bisfosfato (RuBP), reação catalisada
pela enzima ribulose 1,5-Bisfosfato Carboxilase/Oxigenase – RuBisCO
(veja a Figura 7.2).

CEDERJ 7 5
Bioquímica II | O ciclo de Calvin ou etapa química da fotossíntese

Figura 7.2: Estrutura tridimensional da RuBisCO. A. Esta enzima é composta por oito grandes subunidades e
nove subunidades menores. Esta imagem mostra quatro subunidades de cada tipo. Ela fixa CO2 catalisando
a reação da ribulose 1,5-bisfosfato com o CO2, produzindo duas moléculas de 3-fosfoglicerato. RuBisCO é a
proteína mais abundante do mundo. Esta abundância, assim como a fixação de CO2, é fundamental para todas
as formas de vida; B. Detalhe de A mostrando as subunidades maiores da RuBisCO que ligam o substrato da
enzima e íons magnésio.

Esta enzima é uma das mais importantes enzimas conhecidas e


certamente a mais abundante – 40 milhões de toneladas de RuBisCO
no mundo. Como o seu nome diz, ela alterna a atividade carboxilase e
oxigenase. Mas isso nós discutiremos mais tarde, ainda nesta aula.
A incorporação de CO2 em 3-fosfoglicerato representa o processo
de fixação de CO2 em si; as reações subseqüentes convertem o 3-
fosfoglicerato em gliceraldeído 3-fosfato. Isto acontece de uma forma
similar à gliconeogênese (que você verá na aula 30), exceto por uma
única característica: as reações requerem NADPH e não NADH, como
na gliconeogênese.

CO2
2 moléculas de
Reação 1 Ribulose 1,5-bisfosfato 3-fosfoglicerato

CH2O P

CH2O P H C OH

C O CO2 COOH

OH C OH Rubisco
COOH
H C OH
H C OH
CH2O P
CH2O P

7 6 CEDERJ
MÓDULO 2
Após serem formadas, as duas moléculas de 3-fosfoglicerato são
convertidas a 1,3-bisfosfoglicerato (BPG), uma molécula duplamente

7
AULA
fosforilada. Esta reação é catalisada pela enzima fosfoglicerato quinase.
A reação de fosforilação requer a hidrólise de uma molécula de ATP para
cada BPG formado. Lembre que uma ribulose 1,5-bisfosfato, ao sofrer
carboxilação, foi capaz de gerar duas moléculas de 3-fosfoglicerato. Logo,
serão gastos 2 ATPs por ciclo.

Reação 2
ATP ADP

3 - fosfoglicerato 1,3 - bisfosfoglicerato

ATP ADP + Pi
O O
P O CH2 CH C P O CH2 CH C
O— O P
OH OH

Cada molécula de 1,3-bisfosfoglicerato formada pode ser convertida


a gliceraldeído 3-fosfato (GAP). A enzima que catalisa esta reação é a
gliceraldeído 3-fosfato desidrogenase.

!
Você lembra, das aulas de Bioquímica I, o que fazem as enzimas denominadas
desidrogenases?

Neste caso, a enzima reoxida o NADPH gerado durante a fase


clara da fotossíntese.

Reação 3
NADPH NADP+

1,3 - bisfosfoglicerato gliceraldeído 3-fosfato

O O
P O CH2 CH C O CH2 CH C
P
O P H
OH OH

CEDERJ 7 7
Bioquímica II | O ciclo de Calvin ou etapa química da fotossíntese

A conversão de 3-fosfoglicerato em gliceraldeído-3fosfato e, a


seguir, em glicose é a etapa da fotossíntese conhecida como ciclo de
Calvin, fase escura ou ainda etapa química. Neste ponto, uma molécula
de CO2 foi incorporada e duas moléculas de G3P foram produzidas às
custas de 2 ATPs e 2 NADPHs. Entretanto, seis moléculas de CO2 são
necessárias para produzir uma molécula de glicose (porque a glicose é
uma molécula de seis carbonos). Portanto, as seis moléculas de CO2 irão
formar doze moléculas de 3-fosfoglicerato que, então, serão convertidas
em doze moléculas de gliceraldeído 3P.
O gliceraldeído 3P pode ser drenado do ciclo para uso em vias
biossintéticas.
Quando gliceraldeído 3-P é formado, ele pode ter dois destinos:

1) Produção de açúcares de 6 carbonos (glicose).


2) Regeneração de ribulose 1,5-bisfosfato.

O resumo das reações pode ser visto na figura 7.3.

Regeneração Síntese de glicose


da ribulose 1,5-bisP 6
CO2
6
Ribulose 1,5-bisP 12
12
ATP
6
ATP 3-fosfoglicerato 12 x 1,3-bisPglicerato
6
12
Ribulose-5P
NADPH
Gliceraldeído 3P ou de
(ou DHAP)

2 6

Gliceraldeído 3P ou
Frutose-6P Frutose-6P (ou DHP)

Gicose 1P

Figura 7.3: Resumo das reações do ciclo de Calvin. O ciclo ocorre para cumprir duas funções: uma é a síntese
de glicose e outras moléculas orgânicas; a outra é a regeneração da ribulose 1,5-bisfosfato, molécula essencial
para reiniciar o ciclo.

7 8 CEDERJ
MÓDULO 2
PRODUÇÃO DE GLICOSE

7
Seis moléculas de CO2 podem gerar doze moléculas de gliceraldeído

AULA
3-fosfato (G3P). As doze moléculas de gliceraldeído-3-fosfato podem seguir
vários destinos diferentes e, portanto, ser substrato para a síntese de muitas
outras moléculas orgânicas ou regenerar o aceptor inicial de CO2 (ribulose
1,5-bisfosfato).
Duas dessas moléculas de G3P são utilizadas para produzir uma
Figura 7.4: Algas fotossin- glicose-fosfato (via gliconeogênese), e as outras dez são usadas para
tetizantes. Fonte: http: //
old.jccc.net/~pdecell/photosyn/ regenerar as seis moléculas iniciais de ribulose 1,5-bisfosfato. Estas são
photoframe.html
necessárias para ligar outras seis moléculas de CO2 e reiniciar o ciclo.
Das dez G3P envolvidas na regeneração da RBP, quatro formarão duas
moléculas de frutose 6-fosfato.
Muitas das reações do ciclo de Calvin são comuns à via das pentoses-
fosfato (Aula 20). As duas moléculas de frutose 6-fosfato reagem com 6
G3P. Gliceraldeído 3P pode ainda ser isomerizado a dihidroxiacetona-
fosfato (DHAP). As enzimas transcetolase, aldolase, fosfatase e outra
transcetolase geram intermediários combinando G3P e DHAP. Estes
intermediários incluem xilulose 5-fosfato e ribulose 5-fosfato. A ribulose
5P pode ser convertida a ribulose 1,5-bisfosfato, cuja reação requer um
ATP por molécula convertida. A conversão de seis moléculas de ribulose
1,5-bisfosfato, necessárias para fixar 6 CO2, requer seis moléculas de
ATP. A síntese de uma molécula de glicose requer dezoito ATPs e doze
NADPHs.
Assim, o gliceraldeído 3-P, um dos produtos mais importantes
da fotossíntese, é usado em uma grande variedade de rotas metabólicas,
tanto dentro como fora do cloroplasto. Como você viu, ele pode, por
! exemplo, ser convertido a frutose 6-fosfato. A frutose 6-fosfato pode ser
A síntese do
glicogênio convertida a glicose 1-fosfato pela ação da fosfoglicose isomerase e pela
você verá nas
Aulas 26 e 27.
fosfoglicomutase. A glicose 1-fosfato é uma molécula importante, pois é
precursora de carboidratos complexos característicos de vegetais. Entre eles
destaca-se a sacarose, o principal açúcar de transporte para fornecimento
de carboidratos para células não fotossintetizantes; o amido, o principal
polissacarídeo de reserva; e a celulose, o principal componente estrutural
O de paredes celulares. Na síntese de todas essas substâncias, a glicose 1-P é
P O CH2 CH C
H ativada pela formação de ADP-, CDP-, GDP- ou UDP-glicose, dependendo
OH
da espécie e da via metabólica. A unidade de glicose é, então, transferida
Gliceraldeído-3P
para o terminal não redutor de uma cadeia crescente de polissacarídeo,
Figura 7.5
como ocorre na síntese do glicogênio.

CEDERJ 7 9
Bioquímica II | O ciclo de Calvin ou etapa química da fotossíntese

REGENERAÇÃO DA RIBULOSE 1,5-BISFOSFATO

A seguir, temos as possíveis reações do ciclo de Calvin até a regeneração


de ribulose 1,5-bisfosfato. Note que esta seqüência possibilita a síntese de
várias moléculas orgânicas, com diferentes números de carbonos.

1) 2X Gliceraldeído 3P 2Dihidroxicetona P
2X 3C 2X 3C

2) Gliceraldeído 3P + Dihidroxicetona-P Frutose 1,6-bisfosfato


3C + 3C 6C

3)Frutose 1,6-bisfosfato Frutose 6P + Pi


6C 6C

4) Frutose 6P + Gliceraldeído 3P Eritrose 4P + Xilulose 5P


6C 3C 4C 5C

5) Eritrose 4P + Dihidroxicetona Sedoheptulose 1,7-bisfosfato


4C 3C 7C

6)Sedoheptulose 1,7-bisfosfato Sedoheptulose 7P + Pi


7C 7C

7) Sedoheptulose 7P + Gliceraldeído 3P Ribulose 5P + Vilulose 5P


7C + 3C 5C 5C

8) Ribulose 5P Ribulose 5P
5C 5C

9) 2 Xilulose 5P 2 Ribulose 5P
2X 5C 2X 5C

10) 3 Ribulose 5P + 3ATP 3 Ribulose 1,5-bisP + ADP


3X 5C 3X 5C

= 5 Gliceraldeído 3P + 3ATP 3Ribulose 1,5-bisP + 3ADP


5X 3C 3X 5C

8 0 CEDERJ
MÓDULO 2
TRANSPORTE DE TRIOSES FOSFATO

7
As trioses fosfato (3-fosfoglicerato, 1,3-bisfosfoglicerato, gliceraldeído

AULA
3-fosfato, dihidroxiacetona-fosfato) são críticas para o metabolismo de
açúcares em plantas. No estroma do cloroplasto, as trioses fosfato são
usadas como substrato para a gliconeogênese (síntese de glicose).

+
ATP ADP NADH NAD

Citoplasma 3-PG 1,3BPG G3P


Pi
Pi Sacarose

ATP
Pi
ADP
1,3BPG G3P DHAP
Estroma do
cloroplasto
NADPH NADP+

Figura 7.6: Transporte de trioses fosfato.

Trioses fosfato são também transportadas do estroma do cloroplasto


para o citoplasma da célula, por transportadores específicos. Estes
transportam Pi do citoplasma para o estroma, onde ele será necessário
para a síntese de ATP, enquanto transfere dihidroxiacetona fosfato (DHAP)
para o citoplasma, onde ele pode ser convertido a 3-PG (produzindo ATP
e NADPH). DHAP pode também ser usado no citoplasma para a síntese
de sacarose (veja a Figura 7.7).

!
Síntese de sacarose – a reação de UDP-glicose com frutose 6P é catalisada pela
enzima sacarose 6P sintase.

CEDERJ 8 1
Bioquímica II | O ciclo de Calvin ou etapa química da fotossíntese

HOCH2 HN
H O H
H O O N
UDP-Glicose HO
OH H
O O P O CH2
O

H OH O— O— O
H H
H H
OH OH
HOCH2
OH
Frutose 6-P H HO
HO CH2OPO32 —
OH H

Figura 7.7: ATP e NADPH podem ser transferidos do cloroplasto para o citoplasma da célula vegetal por trans-
portadores específicos. Estas moléculas são usadas no citoplasma como fonte de energia e equivalentes redutores
para converter as trioses fosfato em sacarose, que é transportada através do sistema circulatório do vegetal para
tecidos não fotossintéticos (como as raízes) onde será usada no metabolismo energético.

RESUMO

Nesta aula, você viu que as reações da fase escura usam ATP e NAPH produzidos
na fase clara para realizar a síntese de carboidratos a partir de CO2. O primeiro
evento do ciclo de Calvin é a fixação do CO2 através de sua reação com a ribulose
1,5-bisfosfato para formar, em última análise, duas moléculas de gliceraldeído
3P (GAP). As reações remanescentes do ciclo regeneram o aceptor inicial de
CO2, ribulose 1,5-bisfosfato. A próxima aula será a última do módulo, e nela
falaremos de fotorrespiração e regulação da fotossíntese. Finalmente, teremos
também os exercícios e auto-avaliação do módulo. Vamos então à Aula 8.

8 2 CEDERJ
8

AULA
Outros aspectos
importantes da fotossíntese
Bioquímica II | Outros aspectos importantes da fotossíntese

OUTROS ASPECTOS IMPORTANTES DA FOTOSSÍNTESE

Você viu na aula passada o ciclo de Calvin. Até aqui, as aulas


deste módulo concentraram-se em mostrar as etapas da fotossíntese, os
objetivos de cada etapa e as moléculas envolvidas como matéria-prima,
intermediários, enzimas, ou produtos. A Aula 8 é a última do módulo e
aqui discutiremos o papel da RuBisCO como oxigenase, participando do
FOTORRESPIRAÇÃO processo conhecido como FOTORRESPIRAÇÃO. Conheceremos ainda algumas
Uma série de reações plantas que apresentam desvios metabólicos para aumentar a eficiência da
que ocorrem nas
plantas quando a fotossíntese. Finalmente, discutiremos um pouco de como este processo,
RuBisCO funciona tão importante para a vida, é regulado.
como oxigenase.

Fotorrespiração

A RuBisCO é uma enzima peculiar. Ela pode comportar-se como


uma oxigenase quando a concentração de O2 na atmosfera é alta e a
concentração de CO2 baixa.

Neste caso, a ribulose 1,5-bisfosfato reage com o oxigênio e é


convertida em fosfoglicolato e 3-fosfoglicerato (figura 8.1).

Ch2 O P O O
C
Carboxilase HO C H + H C OH
Co2 C –
O O CH2 O P
CH2 O P
2-moléculas de fosfoglicerato
C O
H C OH RuBisCO(ribulose
H C OH bisfosfato carboxilase/
CH2 O P oxigenase)
Ribulose 1,5
bisfosfato 2-fosfoglicolato 3-fosfoglicerat
O2Oxigenase CH2 O P O– O
C
Figura 8.1: A dupla
atividade da RuBisCO. C +
H C OH
2– O– O
P = Grupo fosfato (Po 3 ) CH2 O P

Fosfoglicolato pode ser convertido a 3-fosfoglicerato por uma


série de reações que requerem ATP e O2. Como O2 é consumido e CO2
é produzido, este processo é chamado fotorrespiração. Esta reação
desperdiça 3-fosfoglicerato e ATP, porque o processo não resulta em
fixação de carbono.

84 CEDERJ
MÓDULO 2
RuBisCO Desta forma, a enzima inicia a via
O2 CO2

8
Ribulose conhecida como fotorrespiração, onde a
- -bisP
1,5

AULA
Ciclo de ribulose 1,5-fosfoglicerato é convertida a
Calvin Cloroplastos
fosfoglicolato 3 PG fosfoglicolato (Figura 8.2).
ADP
P1
ATP

Glicolato Glicerato
O2 Peroxissomas
H2O2 (microcorpos)
Glioxilato Serine
Glicina

Glicina Serine
Mitocôndrias

CO2+NH3

Figura 8.2: A localização de cada etapa da fotorrespiração.

O fosfoglicolato é então desfosforilado e passa para os pero-


xissomos, onde ele é oxidado, formando peróxido de hidrogênio e
glioxilato.

Fosfoglicolato H2O2 + Glioxilato

O H2O2 tóxico é quebrado pela catalase e o glioxilato é transa-


minado, produzindo glicina.

A glicina entra na mitocôndria e duas moléculas são convertidas


em uma serina. Neste processo há descarboxilação e desaminação: CO2
e amônia são liberados. A serina novamente é convertida a glicerato. No
cloroplasto, sofre fosforilação pelo ATP, formando 3-fosfoglicerato.

Assim, neste processo:

1. A ribulose 1,5-bisfosfato não pode ser usada no ciclo de Calvin.

2. A fixação de CO2 é revertida, pois o O2 é consumido e CO2


é liberado.

3. ATP é gasto desnecessariamente.

CEDERJ 85
Bioquímica II | Outros aspectos importantes da fotossíntese

Plantas C4

Portanto, até hoje se acredita que a fotorrespiração trabalha


contra a fotossíntese.

Isto acontece com a maior parte dos vegetais e tem-se trabalhado


no sentido de criar em laboratório, por engenharia genética, plantas que
não tenham esse comportamento.

Algumas plantas, entretanto, ao longo da evolução, conseguiram


uma solução para esse problema. Esta solução não é uma enzima modi-
ficada. Na verdade, as plantas chamadas plantas C4 desenvolveram uma
rota metabólica que ajuda a conservar o CO2. Esta rota é chamada Ciclo
C4 ou Hatch - Slack. Este ciclo, encontrado em plantas como o milho e
a cana-de-açúcar, é importante em plantas tropicais que são expostas a
intensa luz solar e altas temperaturas.

Embora fotorrespiração ocorra sempre, em maior ou menor grau,


em todas as plantas, é mais ativa sob condições de muita luminosidade,
altas temperaturas e baixa concentração de CO2.

Plantas C4 concentram sua fotossíntese em uma camada de células


que se localiza logo abaixo das células mesófilas, as células da bainha da
lâmina foliar. As células mesófilas, neste caso, mais diretamente expostas
!
ao CO2, contêm as enzimas do ciclo C4.
As células mesófilas
e as células da
A denominação C4 se deve à síntese de um composto de quatro bainha (vascular)
carbonos, o oxaloacetato. formam a camada
mediana ou mais
interna da folha.
A enzima chave, fosfoenol piruvato carboxilase, fixa CO2, con-
densando-o com o fosfoenol piruvato para formar oxalacetato.

!
Para plantas C4, ver também:
http://www.icb.ufmg.br/prodabi/grupo5/Photosynthesis/c4/c4.html
Explore a página: tem muita coisa legal sobre fotossíntese.

86 CEDERJ
MÓDULO 2
8
AULA
CO2

Co2
Pi COO
CH2
PEP
carboxilase C O

COO
Oxaloacetato
-
+ COO
NADPH+H
CH2 Células da bainha
+
CH2 H C OH Malate NADP
2 +
C O PO3 NADP COO
Malate
COO
fosfoenolpiruvato Ch3
NADPH Ciclo
C O piruvato + de
CO2 Calvin
AMP+PPi ATP+P
Pii COO-

Figura 8.3: Metabolismo de fixação de CO2 em plantas C4.

Plantas CAM

Outra modificação de fixação de carbono é encontrada em plan-


tas suculentas (armazenadoras de água), incluindo plantas de gelo,
cactos, que são adaptados para climas muito secos. Essas plantas abrem
seus estômatos durante a noite e fecham durante o dia, exatamente
o inverso de como outras plantas se comportam. Estômatos fechados
ajudam a preservar água durante o dia, mas também impedem a entrada
de CO2. Durante a noite, quando seus estômatos abrem, essas plantas
tomam CO2 e o incorporam em uma variedade de ácidos orgânicos.
Este modo de fixação de CO2 é chamado metabolismo do ácido cras-
suláceo (em inglês, CAM), por causa da família Crassulacea, onde foi
primeiro descrito.

Regulação da fotossíntese

Plantas possuem dois sistemas dependentes de luz para regular o


ciclo de Calvin. O primeiro sistema tem como alvo a RuBisCO, ativando
a enzima em resposta à luz.

CEDERJ 87
Bioquímica II | Outros aspectos importantes da fotossíntese

Fotofosforilação bombeia prótons do estroma para o lúmen do tilacóide


e Mg+2 do lúmen do tilacóide para o estroma. Este bombeamento causa
um aumento no pH e na concentração de Mg do estroma. Os dois efeitos
ativam a RuBisCO.

O segundo sistema responde ao estado redox do estroma


dependente de luz. Durante a fotofosforilação, os elétrons da água são
usados para reduzir a ferredoxina. Parte da ferredoxina reduzida é usada
para reduzir tiorredoxina. Tiorredoxina reduzida pode reduzir diversas
enzimas chaves do ciclo de Calvin, levando à ativação destas enzimas.

citoplasma

Elétrons gerados por


fotofosforilação

Ferredoxina Ferredoxina
Lúmen reduzida oxidada
– Figura 8.4: Regulação da
do 2e+
tilacóide 2H fotossíntese. Os níveis de
prótons e Magnésio no
+ 2+ Tioredoxina SH S Tiorredoxina estroma do cloroplasto
H Mg reduzida oxidada
SH S modulam a atividade da
+ –
Estroma do [H ] 2e+ RuBisCO. O estado redox
cloroplasto 2+ 2H das enzimas do ciclo de
[Mg ] Calvin é outro importante
Enzimas do ciclo
SH S Enzimas do ciclo
Ativação da de calvin reduzidas de calvin oxidadas mecanismo de regulação
(ativas) SH S
RuBisCO (inativas) das enzimas.

Destino dos produtos fotossintéticos

A fotossíntese é um processo onde a energia flui dos fótons às


moléculas orgânicas. As reações luminosas capturam a energia solar e
a usam para produzir ATP e transferir elétrons da água até o NADP+.
No ciclo de Calvin, ATP e NADPH são usados para sintetizar açúcar a
partir de CO2. A energia que entra no cloroplasto como luz solar torna-
se energia química estocada nas ligações das moléculas de açúcar.

O açúcar produzido nos cloroplastos sustenta a planta inteira


com energia química e esqueletos de carbono para sintetizar todas as
principais moléculas orgânicas das células. Aproximadamente 50%
do material orgânico produzido na fotossíntese, entretanto, são con-
sumidos como combustível para a respiração celular na mitocôndria
das células vegetais.

88 CEDERJ
MÓDULO 2
Tecnicamente, células verdes são a única parte autotrófica da

8
planta. O resto da planta depende de moléculas orgânicas exportadas

AULA
pelas folhas nos sistemas vasculares. Na maioria das plantas, carboidratos
são transportados das folhas na forma de sacarose, um dissacarídeo
(Figura 8.5). Quando chega às células não fotossintetizantes, a sacarose
é usada na respiração celular e em uma grande variedade de vias
anabólicas. Uma considerável parte da glicose é usada para produzir
celulose. Celulose é a molécula orgânica mais abundante na planta e
provavelmente na superfície do planeta.

CH2OH
O HOCH2
H H O H
H
OH H
1 + 2 H HO
HO O UDP HO CH2 O P

H OH OH H

UDP-glicose Frutose-6-fosfato

UDP Sacarose 6-
fosfato sintase
CH2OH
O HOCH2
H H O H
H
1 2
OH H H HO
HO CH2 O P
O
H OH OH H

Sacarose 6-fosfato
Sacarose 6-
Pi fosfato fosfatase
CH2OH
O HOCH2
H H O H
H
1 2
OH H H HO
HO CH2OH
O
H OH OH H
Figura 8.5: Síntese de sacarose
a partir de UDP-glicose. Sacarose

O excesso de glicose é usado na síntese de amido que é estocado em folhas (no próprio
cloroplasto) e em células de armazenagem como raízes, tubérculos e frutos. Isto tudo é substrato
oxidativo para heterotróficos, incluindo humanos.

Em uma escala global, a produtividade do cloroplasto é prodigiosa. Estima-se que a fotossín-


tese produza 160 bilhões de toneladas métricas de carboidratos por ano (ton métrica = 1000 Hg).

Nenhum outro processo químico na Terra tem essa produtividade e nenhum é mais impor-
tante para a manutenção da vida no planeta.

CEDERJ 89
Bioquímica II | Outros aspectos importantes da fotossíntese

RESUMO

Nessa aula falamos de fotorrespiração, um desvio metabólico da fotossíntese que


ocorre quando a RuBisCO passa a trabalhar como oxigenase. Geralmente isso
acontece em altas temperaturas e quando a concentração de O2 na atmosfera é
alta e a concentração de CO2 baixa. Mostramos que algumas plantas, como as
C4 e as CAM, apresentam adaptações metabólicas que otimizam a fotossíntese,
aumentando a concentração de CO2 nas células. Além disso, nesta aula discutimos
a regulação da fotossíntese. Lembre que a velocidade do ciclo de Calvin é regulada
por dois sistemas: um é a concentração de prótons e magnésio no estroma do
cloroplasto que ativa a RuBisCO; o outro são as reações de oxi-redução promovidas
pelos elétrons e prótons da cadeia transportadora. Falamos, finalmente, do destino
da glicose gerada na fotossíntese, mais especificamente da síntese de sacarose
e formação de amido.

Com isso terminamos o módulo Fotossíntese. Espero que você


tenha gostado, entendido e, acima de tudo, percebido a importância
deste processo bioquímico. Nas próximas aulas falaremos de
fermentação e de respiração celular. Esses dois processos formam, com
a fotossíntese, o pacote básico do metabolismo energético. Como você
já percebeu desde as primeiras aulas de fotossíntese, eles caminham
em paralelo e são interdependentes. Esta interdependência é a base do
fenômeno biológico.

Antes de continuar, faça os exercícios de fixação que estão a seguir.

90 CEDERJ
MÓDULO 2
EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

8
AULA
1. O que é fotossíntese?

2. Que afirmativa(s) sobre a fotossíntese não é correta?

a) As reações luminosas são dirigidas pela energia derivada da oxidação da água.


( )

b) Fotossistema II usa energia luminosa para oxidar água a O2 e então passa os


eletrons para o fotossistema I. ( )

c) No fotossistema I, o elétron é outra vez excitado pela luz e é usado para reduzir
a ferredoxina. ( )

d) A produção de ATP e NADPH é dirigida pela energia que é derivada da absorção


de luz. ( )

e) Ferredoxina reduzida reduz NADP+ a NADPH. ( )

3. Ao contrário da fosforilação oxidativa, a fotofosforilação não envolve complexos


protéicos ligados à membrana. Falso ou verdadeiro? Por quê?

4. Quando a cadeia transportadora de elétrons está em pleno funcionamento, o


pH do lúmen do tilacóide será (maior que, menor que
ou igual a) o pH do estroma.

5. Analisando as equações da fotossíntese e da quimiossíntese abaixo, o que se


pode concluir da origem do oxigênio molecular formado?

Fotossíntese: H2O + CO2 glicose + O2 + Energia

Quimiossíntese: H2S + CO2 glicose + 2S + Energia

6. O que não acontece na fosforilação cíclica?

a) produção de ATP;

b) atividade do centro de reação do FSI;

c) o transporte de elétrons na membrana fotossintética;

d) utilização de energia luminosa;

e) formação de NADPH.

CEDERJ 91
Bioquímica II | Outros aspectos importantes da fotossíntese

7. O reagente DCMU, 3-(3,4-diclorofenil)-1,1-dimetil urea, inibe a transferência de


elétrons para a plastoquinona no fotossistema II. Que efeito final você esperaria
encontrar, se fosse administrado DCMU a uma suspensão de cloroplastos iluminada?

8. Por que nossos olhos detectam como verde estruturas contendo clorofila?

9. Suponha um breve pulso de 14CO2 em uma planta verde.


14
a) Trace o caminho percorrido pelo C até a síntese de frutose 1,6-bisfosfato,
mostrando que os átomos de carbono em cada intermediário devem carregar a
marcação em cada ciclo.

b) Todas as moléculas de frutose 1,6-bisfosfato apresentarão dois átomos de


carbono marcados?

10. As plantas C3 e C4 são mantidas juntas numa caixa selada e iluminada, a planta
C4 viceja, enquanto a planta C3 adoece e, eventualmente, morre. Explique.

RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

1. O que é fotossíntese?

É a via metabólica de síntese de glicose a partir de CO2 e H2O que ocorre em células
especializadas com energia derivada do sol (energia luminosa).

2. Que afirmativa (s) sobre a fotossíntese não é correta?

a) As reações luminosas são dirigidas pela energia derivada da oxidação da água


( x ).

b) Fotossistema II usa energia luminosa para oxidar água a O2 e, então passa os


elétrons para o fotossistema I ( ).

c) No fotossistema I, o elétron é outra vez excitado pela luz e é usado para reduzir
a ferredoxina ( ).

d) A produção de ATP e NADPH é dirigida pela energia que é derivada da absorção


de luz ( ).

e) Ferredoxina reduzida reduz NADP+ a NADPH ( ).

3. Ao contrário da fosforilação oxidativa, a fotofosforilação não envolve complexos


protéicos ligados à membrana. Falso ou verdadeiro? Por quê?

Errado. Os fotossistemas, assim como os transportadores, são proteínas.

92 CEDERJ
MÓDULO 2
4. Quando a cadeia transportadora de elétrons está em pleno funcionamento, o

8
pH do lúmen do tilacóide será menor que (maior que, menor que ou igual a) o

AULA
pH do estroma.

5. Analisando as equações da fotossíntese e da quimiossíntese abaixo, o que se


pode concluir da origem do oxigênio molecular formado?

Fotossíntese: H2O + CO2 glicose + O2 + Energia

Quimiossíntese: H2S + CO2 glicose + 2S + Energia

O oxigênio liberado na fotossíntese se origina da molécula de água.

6. O que não acontece na fosforilação cíclica?

a) produção de ATP.

b) atividade do centro de reação do FSI.

c) o transporte de elétrons na membrana fotossintética.

d) utilização de energia luminosa.

e) formação de NADPH.

7. O reagente DCMU, 3-(3,4-diclorofenil)-1,1-dimetil urea, inibe a transferência


de elétrons para a plastoquinona no fotossistema II. Que efeito final você
esperaria encontrar, se fosse administrado DCMU a uma suspensão de
cloroplastos iluminada?

A inibição do transporte de elétrons da plastoquinona para o fotossistema II


interrompe o início do transporte de elétrons, não permitindo que ocorra a síntese
de ATP nem a redução de NADPH.

8. Por que nossos olhos detectam como verde estruturas contendo clorofila?

Porque a clorofila absorve os comprimentos de onda azul e vermelho. Nossos olhos


detectam os comprimentos de onda restantes. A percepção dos comprimentos de
onda transmitidos é verde.

9. Suponha um breve pulso de 14CO2 em uma planta verde.

a) Trace o caminho percorrido pelo 14C até a síntese de frutose 1,6-bisfosfato,


mostrando que átomos de carbono em cada intermediário devem carregar a
marcação em cada ciclo.

Para responder, veja a ordem dos intermediários do ciclo de Calvin e observe suas
estruturas. Nem todas são mostradas na aula. Pesquise nos livros de bioquímica
do pólo.

CEDERJ 93
Bioquímica II | Outros aspectos importantes da fotossíntese

b) Todas as moléculas de frutose 1,6-bisfosfato apresentarão dois átomos de


carbono marcados?

Discuta com seus colegas e seu tutor, procure nos livros, siga a pista dada para a
pergunta anterior.

10. As plantas C3 e C4 são mantidas juntas numa caixa selada e iluminada; a planta
C4 viceja, enquanto a planta C3 adoece e eventualmente morre. Explique.

Plantas C4 são mais eficientes na utilização do CO2.

94 CEDERJ
9

AULA
A história da fermentação:
do início aos dias de hoje
Bioquímica II | A história da fermentação: do início aos dias de hoje

Desde a Antigüidade, o processo de fermentação era conhecido


e muito utilizado na fabricação de vinhos, queijos e pães. Aristóteles
descreveu quatro etapas na formação do vinho: a infância, quando a uva
estava na parreira; a adolescência, com o suco de uva; a maturidade com
o vinho; e finalmente a velhice e morte, quando o vinho se transformava
em vinagre.
Uma das primeiras definições do processo fermentativo foi
elaborada em 1684, por Willis:

A fermentação é um movimento intestino de partículas ou


princípios de cada corpo, tendendo para a perfeição ou para a
transformação em outro. As partículas elementares postas em
movimento, devido à sua própria natureza ou ocasionalmente
vibrando maravilhosamente, são aprisionadas e transformam-se
em outras: as sutis e mais ativas esforçam-se na tentativa de escapar
suavemente, mas estando entrelaçadas com outras mais espessas
são impedidas de fazê-lo. Também as mais espessas são mantidas
unidas pelo intento e expansão das mais sutis e são enfraquecidas até
que cada uma alcance sua própria grandeza e exaltação. Elas fixam
em si a devida perfeição ou completam as alterações e mutações
designadas pela natureza.

Até o início do século XIX, a conservação dos alimentos era


feita utilizando-se basicamente a técnica da salmoura. Nessa época, o
Império Napoleônico estava em expansão. Entretanto, um dos maiores
empecilhos para a conquista de novos territórios era a alimentação de
seus soldados. Napoleão, ofereceu, então, um prêmio de 12000 francos
para quem inventasse uma maneira eficiente de conservar os alimentos
por um longo período de tempo.
Nesse contexto, destacou-se o francês Mr. Nicolas Appert, dono
de uma loja de secos e molhados, que exportava alimentos para diversas
localidades e pessoas, inclusive para o Czar da Rússia. Sua técnica de
Figura 9.1: Capa do livro
de Mr. Appert, A arte de
conservação de alimentos, herdada de seu pai, consistia em adicionar
preservar alimentos de grandes quantidades de açúcar às frutas e ferver os alimentos, que
origem animal e veg-
etal, 1810. deveriam imediatamente ser tampados e selados com parafina.

96 CEDERJ
MÓDULO 3
Suas receitas foram publicadas em um livro (Figura 9.1), considerado

9
por muitos como o primeiro livro de Bioquímica.

AULA
Hoje o processo fermentativo é amplamente
conhecido e mundialmente utilizado em escala !
industrial. A cerveja é um exemplo de produto obtido Acesse http://perso.magic
. f r / o r m e r r y /
a partir deste processo, onde o organismo fermentador newindex.html para
saber mais sobre Nicolas
é uma levedura. Appert e suas importantes
contribuições para a
indústria de alimentos.
A IMPORTÂNCIA DA HISTÓRIA DA FERMENTAÇÃO NA e http://members.nbci
.com/_XMCM/cervas/
HISTÓRIA DA BIOQUÍMICA fabricacao.htm) se você
quer saber mais sobre
Com base no livro de Mr. Appert, um físico-químico da época como se fabrica cerveja.

chamado Gay-Lussac fez a seguinte experiência (Figura 9.2):


Aqueceu duas vasilhas com caldo de carne e cobriu apenas uma
delas com uma camada de mercúrio. Pense
sobre isso!
Em qual das vasilhas você esperaria que ocorresse fermentação?
Por quê?
Na metade do século XIX a qualidade dos vinhos na França era
muito baixa. Já se tinha conhecimento, na época, de que a qualidade A B

do vinho dependia do tipo de uva utilizada, bem como do repique (uma


porção de um vinho de boa qualidade já fermentado). A adição do
repique acelerava o processo de fermentação e uniformizava o paladar
do vinho.
Figura 9.2: O experimento
Na tentativa de solucionar o problema da qualidade do vinho de Gay-Lussac. Em A a
vasilha com caldo de carne;
de paladar ruim, uma vinícola francesa contratou Louis Pasteur, um em B a vasilha com caldo
de carne coberta por uma
químico simples e muito religioso. camada de mercúrio.
Ao analisar o vinho ao microscópio, Pasteur observou a
existência de grande quantidade de “glóbulos castanhos”, alguns
inclusive se dividindo (Figura 9.3).

Figura 9.3: Glóbulos castanhos observados


por Pasteur ao analisar o vinho ao microscópio.

CEDERJ 97
Bioquímica II | A história da fermentação: do início aos dias de hoje

Pasteur lançou mão de suas experiências anteriores como cientista


para tentar desvendar os segredos da fermentação. Antes de ser contratado
pela fábrica de vinhos, Pasteur havia se dedicado ao estudo da polarização
da luz por ácidos orgânicos e observou, usando um polarímetro, que ácidos
orgânicos extraídos de tecidos de seres vivos eram capazes de desviar o
MISTURA
RACÊMICA plano da luz polarizada. Ao contrário, os ácidos orgânicos sintéticos não
Mistura racêmica eram capazes de desviar o plano da luz polarizada.
é uma mistura de
substâncias capazes Pasteur concluiu que os ácidos orgânicos eram constituídos de uma
de desviar o plano
MISTURA RACÊMICA e que somente os seres vivos eram capazes de transformá-los
de luz polarizado
para a esquerda em um grupo homogêneo de substâncias capazes de desviar o plano da luz.
(levrógiras) com
substâncias capazes Pense sobre isso!
de desviar o plano de
luz polarizado para a Isolando ácidos orgânicos de um repique e colocando-os em um
direita (dextrógiras). polarímetro, Pasteur observou que esses compostos eram capazes de
desviar a luz.
Pense O que você concluiria no lugar de Pasteur?
sobre isso!
Assim, Pasteur propõe que os glóbulos castanhos são organismos
vivos e que somente na presença destes pode haver fermentação. Pasteur
associou não só a fermentação, mas também outros processos à presença
de organismos vivos e formulou, assim, a Teoria Vitalista.
Surgem imediatamente críticas ferozes à sua teoria. A mais
contundente e irônica foi escrita por um renomado químico da época
chamado Liebig:

SOLUÇÃO DO SEGREDO DA
FERMENTAÇÃO ALCOÓLICA

O levedo de cerveja, quando disperso em água, quebra-se em um número


infinito de pequenas esferas. Se estas esferas são transferidas para uma
solução aquosa de açúcar, elas desenvolvem-se em pequenos animais.
Estes animais são dotados de uma espécie de trompa de sucção com a
qual eles devoram o açúcar da solução. A digestão é reconhecível clara
e imediatamente por causa da descarga de excrementos. Estes animais
evacuam álcool etílico dos seus intestinos e dióxido de carbono dos seus
órgãos urinários. Deste modo pode-se observar que um fluido especificamente mais claro é
exudado de seu ânus e ascende verticalmente, ao passo que um jato de dióxido de carbono
é ejetado em intervalos muito curtos dos seus genitais enormemente grandes.
(WOEHLER E LIEBIG,1893).

98 CEDERJ
MÓDULO 3
Essa passagem mostra que havia uma forte resistência à idéia s/O2

c/O2 produzido

9
de que a fermentação era um processo biológico que dependia do

AULA
metabolismo dos “glóbulos” observados por Pasteur. Ao contrário,
Liebig e boa parte da comunidade científica da época acreditavam
que a fermentação era, na verdade, um processo meramente químico,
c/O2

decorrente da reação entre substâncias albuminóides (nitrogenadas), Tempo (min)


presentes na superfície dos “glóbulos”, com o açúcar do meio, na
Figura 9.4: Resultado do
presença de ar. experimento de Pasteur. Foi
medido CO2 em função do
Para responder às críticas, Pasteur mostrou que os “glóbulos” tempo de fermentação na
presença (c/O2) ou na ausên-
presentes no meio contendo açúcar eram capazes de promover a cia (s/O2) de oxigênio.
fermentação, mesmo na ausência de ar (Figura 9.4).
Com os resultados obtidos a partir das experiências realizadas na
ausência de oxigênio, Pasteur afirma que a fermentação pode ocorrer
mesmo em condições de anaerobiose, descrevendo pela primeira vez
La vie sans l’air (“A vida sem ar”).
Foram necessários mais de cinqüenta anos para que fossem
acrescentados novos conhecimentos à área da fermentação.
Dois irmãos, Hans e Edward Büchner, após terem sido expulsos de
laboratórios de pesquisa por serem muito desastrados, resolveram abrir
em sociedade uma pequena fábrica para produzir um xarope contra a
tuberculose. Hans era microbiologista e Edward, botânico e químico; este
último tendo inclusive trabalhado com o renomado químico Adolf von
Bayer. Ambos decidiram investir em um negócio que lhes fosse rentável.
No início do século XIX, as principais doenças eram a sífilis e a
tuberculose. Por não haver tratamento efetivo para ambas as doenças,
possuí-las significava sentença de morte para o paciente. Era costume, na
época, internar os portadores de tuberculose em sanatórios localizados
nas montanhas, onde respiravam ar puro, repousavam e eram obrigados
a beber uma cerveja escura e amarga. Na opinião de muitos especialistas,
o levedo depositado no fundo da cerveja produzia antitoxinas capazes de
combater os microorganismos causadores da tuberculose. Entretanto, para
o total efeito terapêutico eram necessários vários litros dessa cerveja.
Valendo-se disto, os irmãos Büchner resolveram preparar um
xarope dessa levedura e poupar o sofrimento dos doentes, que poderiam
adquirir um xarope com extrato concentrado de antitoxinas, dispensando
assim a ingestão dos litros de cerveja amarga.

CEDERJ 99
Bioquímica II | A história da fermentação: do início aos dias de hoje

Para preparar o xarope, eles montaram uma estratégia que


consistia em:
1 – fazer crescer grandes quantidades de levedura em frascos contendo
caldo de açúcar (leveduras em cultura);
2 – isolar as leveduras do meio de cultura através de centrifugação
(leveduras íntegras isoladas);
3 – romper as leveduras (a ruptura das células era realizada através de
um processo trabalhoso que utilizava uma espécie de prensa, chamada
prensa francesa, com a capacidade de gerar até 300 atmosferas) (extrato
de levedura);
4 – e, por fim, filtrar o extrato de leveduras para obter um concentrado
livre de células (extrato livre de células).
Para conservar o xarope, recorreram ao clássico livro de Mr. Appert
sobre conservar os alimentos e adicionaram grandes quantidades de açúcar
Pense (xarope de levedura).
sobre isso!
Seria esse procedimento eficiente para conservar o xarope?
Para surpresa dos irmãos Büchner, o xarope continuou a fermentar.
Baseando-se nas experiências de Pasteur, eles pensaram prontamente
que se tratava de uma contaminação com células intactas. Para resolver
o problema, passaram o xarope pela prensa francesa diversas vezes e
certificaram-se, utilizando um microscópio, de que não havia mais células
Pense
sobre isso!
íntegras. No entanto, o xarope continuava a fermentar.
Por quê ?
Hans, o microbiologista, cansado de trabalhar sem obter
resultado, desfez a sociedade com o irmão. Edward, consciente de que
a fermentação obtida com o xarope não era por erro experimental,
continuou seu trabalho. Após repetir inúmeras vezes o processo de quebra
das leveduras, Edward teve certeza de que a presença de célula íntegra de
levedura não era necessária para que a fermentação ocorresse. E, assim,
submeteu sua descoberta à comunidade científica.
Figura 9.5: Edward Edward Büchner (Figura 9.5) recebeu, em 1907, o 1º Prêmio
Buchner. 1º Prêmio
Nobel de Química. Der
Nobel de Química por seu trabalho Der Einfluss des Sauerstoffs auf
Einfluss des Sauerst- Gärungen (A influência do oxigênio na fermentação), publicado em
offs auf Gärungen (A
influência do oxigênio 1885, e o seguinte comentário de Bayer, seu antigo chefe:
na fermentação), pub-
licado em 1885. “Esse rapaz, apesar de não ter nenhum talento para química, vai

Pense
ficar famoso.”
sobre isso!
Que conseqüências os resultados acima proporcionaram à teoria
Vitalista de Pasteur e à pesquisa bioquímica?

100 CEDERJ
MÓDULO 3
A FERMENTAÇÃO E A VIA GLICOLÍTICA

9
Paralelamente à descoberta dos irmãos Büchner, de

AULA
que a fermentação ocorria mesmo na ausência de vida,
Arthur Harden e William John Young, dois pesquisadores
ingleses, foram contratados por uma fábrica de cerveja para
estudar a fermentação.
Em 1903, eles estabeleceram a relação de 1:1 entre gás Figura 9.6: Uma placa de estrada
na Inglaterra anunciando Young e
carbônico e etanol produzidos pela fermentação do açúcar. Harden. Para onde esses dois levaram
a Bioquímica?
Utilizando o extrato de levedura na presença de glicose e
medindo a produção de CO2, eles observaram que a fermentação ocorria
durante algum tempo, sendo porém interrompida após certo período.
Eles observaram também que a fermentação alcoólica da glicose,
por suco de levedura (o extrato de levedura dos irmãos Büchner), era
muito aumentada pela adição de mais suco de levedura, o qual tinha sido
previamente fervido e filtrado. Este líquido fervido, por si só, era incapaz
de fermentar quando em presença de glicose. Observe o Gráfico 9.1. Ele
representa o andamento da fermentação ao longo do tempo.

1200 B
1100
Dióxido de carbono

1000
900
800
700
600
500
400
300 A
200
100
0 DIÁLISE
Diálise é um
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 procedimento através
do qual se separam
Tempo em horas moléculas grandes de
moléculas pequenas.
Gráfico 9.1: Medida de dióxido de carbono em função do tempo de fermentação. A diálise baseia-se na
Curva A: na presença de 25 mL de suco de levedura + 25 mL de água + 5g de glicose; capacidade de estas
Curva B: na presença de 25 mL do mesmo suco de levedura que na curva A + 25 mL moléculas atravessarem
de suco de levedura fervido + 5g de glicose. os poros de uma
Pense membrana.
sobre isso! O limitante, então, será
O que sugere esse resultado? o tamanho, ou seja,
Harden e Young submeteram o suco de levedura fervido à DIÁLISE moléculas pequenas
passam e moléculas
e assim separaram duas frações distintas (Tabela 9.1). Uma fração era grandes não passam
pelos poros. Para que
composta de moléculas pequenas que passaram pela membrana de diálise. esta seletividade seja
eficiente, você pode
Outra fração era composta de moléculas grandes, que não passaram na
imaginar o tamanho que
membrana de diálise e, portanto, foram chamadas resíduo. estes poros devem ter?

CEDERJ 101
Bioquímica II | A história da fermentação: do início aos dias de hoje

Tabela 9.1: Diálise do suco de levedura fervido:


25 mL de suco de levedura+ 5 gramas glicose

No Água Suco Resíduo Dialisado Tempo Dióxido


(mL) fervido (mL) (mL) (horas) de car-
(mL) bono
(grama)
1 25 0 0 0 48 0,253
0 25 0 0 48 0,561
0 0 25 0 48 0,264

2 25 0 0 0 48 0,154
0 0 0 25 48 0,251

Pense
sobre isso!
Levando-se em consideração os resultados, que característica
teria, então, o ativador da fermentação?

Como resultado de um grande número de tentativas de isolar o


constituinte do suco de levedura responsável pelo aumento da
fermentação, observou-se que quando ácido fosfórico na forma
de um fosfato solúvel estava presente era produzido um aumento
na taxa de fermentação. O efeito da adição de fosfatos solúveis ao
suco de levedura foi então examinado e encontrou-se uma evolução
inicial rápida bem marcada de dióxido de carbono produzido.
Além disso, os sucos de levedura usados invariavelmente contêm
fosfatos, precipitáveis por mistura magnésia; nesse ponto não
pode haver nenhuma dúvida de que o fenômeno inicial é devido à
presença destes (HARDEN e YOUNG, 1906).

Com estas descobertas, Harden e Young afirmaram que o processo


fermentativo necessitava tanto da fração residual da diálise do suco não
fervido, que chamaram zimazes (proteínas), quanto da fração dialisável
do suco de levedura, que eles chamaram cozimazes. A observação
de fosfatos durante o processo fermentativo levou–os a supor que as
cozimazes fossem compostas por fosfato.
Adicionando sucessivamente Pi (fosfato inorgânico) a um extrato
de leveduras, observaram que a retomada da fermentação ocorria até
certo ponto, e a partir daí tanto a adição de Pi como a adição de glicose
não mais ativavam o processo. Por outro lado, a adição de mais suco de
levedura fervido ainda era capaz de ativar a fermentação (Gráfico 9.2).

102 CEDERJ
MÓDULO 3
Gráfico 9.2: Efeito da adição de fosfato na
130 fermentação.

9
120 C Mistura da reação: 25 mL de suco de levedura

AULA
110 + 20 mL de água + 5 g de glicose.
Dióxido de carbono

100 Curva A: representa a fermentação na ausência


90
de fosfato adicionado;
Curva B e C: representam o efeito da adição
80
sucessiva de duas quantidades de 5 mL de
70
B fosfato de sódio (0,3 M).
60
50
40
30
A
20
10

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150

Tempo em minutos
Pense
sobre isso!
Qual seria então o destino do fosfato inorgânico?
Utilizando um sal de prata, Harden e Young foram capazes de
isolar, por precipitação, um composto fosforilado com seis carbonos
(6C) e dois fosfatos, e identificaram como sendo frutose-1,6-bisfosfato,
denominado Éster de Harden e Young, o primeiro intermediário da via
glicolítica identificado. Na época, os autores ficaram em dúvida se o
composto era uma hexose difosfatada ou duas trioses monofosfatadas. Pense
sobre isso!
Como você faria para provar que este composto realmente
participa do processo fermentativo?
A seguir, Otto Meyerhoff, um pesquisador alemão, trabalhando
com músculo de rã, peito de pombo e de coelho, mostrou que o músculo
se contraía na ausência de oxigênio e isso resultava na produção de
ácido lático.
Esse processo pode ser ativado por duas frações do extrato de
músculo, uma termossensível (fração sensível ao calor, também chamada
zimazes) e outra termorresistente (fração insensível ao calor, chamada
cozimazes). Mas este não foi o único paralelo entre a fermentação da
levedura e os músculos do pombo: Meyerhoff testou Pi nos músculos
e obteve os mesmos resultados de Harden e Young. Assim, sabendo
que a glicose é consumida pelo extrato de levedura na fermentação,
resultando em etanol e dióxido de carbono, e que a adição de glicose em
macerados de músculo de coelho resultava no aparecimento de lactato,
Otto Meyerhoff levantou a possibilidade de as proteínas envolvidas nos
dois processos serem também semelhantes. Pense
sobre isso!
Que experiência você faria para testar esta hipótese?

CEDERJ 103
Bioquímica II | A história da fermentação: do início aos dias de hoje

É uma fração termossensível, porque o aquecimento a 50º C por


somente um minuto resulta num considerável grau de inativação.
(...) O ativador tem as propriedades de uma enzima. Eu proponho,
portanto, designá-la “hexoquinase”, pois ela atua especificamente
Células lisadas em hexoses fermentáveis. (...) Com certas variações, a velocidade
são células cujas inicial de formação de ácido lático é proporcional à quantidade de
membranas foram
rompidas. Isso pode
hexoquinase. Levedura é o único material do qual foi possível isolar
ocorrer por uma o ativador. (...) A procura da “hexoquinase” em leveduras lisadas
grande variedade foi baseada na idéia de que extratos de levedura apresentam uma
de técnicas, como
congelamento/ esterificação rápida das hexoses fermentáveis, com subseqüente
descongelamento, fermentação. Extrato de músculos, ao contrário, não apresenta
pressão, choque
osmótico etc.
qualquer acumulação de ésteres. Esta diferença deve ser devida
ao fato de o fator essencial para a esterificação da glicose ser mais
concentrado em leveduras. A validade dessa hipótese é ilustrada por
observações simultâneas da formação de ácido lático e esterificação
de hexoses em extratos de músculo ativados (MEYERHOFF,
1930).
Já nessa época, se conhecia o efeito letal de alguns compostos,
seja em bactérias e leveduras, como também em mamíferos. Entretanto,
o mecanismo de ação de tais compostos ainda não era conhecido.
Nesse contexto, alguns pesquisadores decidiram testar o efeito
desses venenos durante o processo fermentativo e, após análise dos
produtos, obtiveram o seguinte resultado:

Tabela 9.2: Efeito de diferentes inibidores em reações da via glicolítica.

DROGA EFEITO
1. Fluoreto de sódio Acúmulo de 2-fosfoglicerato e a
seguir 3-fosfoglicerato.
2. Cloro-acetal-fosfato (CAP) Acúmulo de dihidroxicetona fosfato e
frutose 1,6-bisfosfato.
3. Iodoacetato Um súbito acúmulo de gliceraldeído
1,3-bisfosfato seguido do seu rápido
desaparecimento e de um grande
acúmulo de frutose 1,6- bisfosfato.

Pense
sobre isso!
A partir destes dados, deduza as possíveis etapas envolvidas na
degradação da glicose.

Pista 1: Uma via metabólica pode ser descrita como


A B C D
Onde A é o substrato ou matéria-prima da via, B e C são os

104 CEDERJ
MÓDULO 3
intermediários e D é o produto final.

9
AULA
Se um determinado inibidor interrompe a reação B D, qual
dos intermediários será acumulado? O que não será mais produzido?
Utilize esta lógica para cada uma das linhas da tabela e encontre
as reações isoladamente.

Pista 2: A glicólise é uma via de degradação ou quebra da glicose


e, portanto, os produtos são moléculas menores. Observe as reações
isoladamente. Consulte as fórmulas das moléculas, veja quais delas são
maiores e quais são menores. Observe também o grau de semelhança
entre elas.

Se você chegou até aqui, entendeu como uma via metabólica


pode ser desvendada. Na próxima aula mostraremos a glicólise na sua
totalidade. Agora, a maior parte da via você já conhece. Então vai ser
fácil compreender o que falta. Vamos lá?

Para saber mais, visite estes endereços:


Harden
H d eY Young: htt
http://ir2lcb.cnrs-mrs.fr/~athel/harden.htm
//i 2l b f / th l/h d ht
Edward Büchner: http://ir2lcb.cnrs-mrs.fr/~athel/buchner.htm#buch;
http://ir2lcb.cnrs-mrs.fr/~athel/buchner.htm
Louis Pasteur: http://www.woodrow.org/teachers/chemistry/institutes/1992/Pasteur.html
http://www.pasteur.net/louis/index.htm
Baseado no material organizado pelo departamento de Bioquímica Médica, CCS, UFRJ.

CEDERJ 105
10
AULA
Glicólise: oxidação
de glicose a piruvato I
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato I

INTRODUÇÃO Na aula anterior, você conheceu a história da Glicólise e soube como se chegou
ao conhecimento disponível sobre esta via metabólica. Agora podemos falar um
pouco mais sobre ela, suas funções, seus intermediários, enzimas, cofatores etc.
Essa é uma via importante, pois a glicose (que você já conhece da Bioquímica I)
é, quantitativamente, o principal substrato oxidável na maioria dos seres vivos:
dos microorganismos ao homem. A glicólise é a principal via para a utilização da
glicose e ocorre no citosol da maioria das células, sendo considerada, portanto,
uma via universal. Ela pode ocorrer se o oxigênio estiver disponível (aerobiose)
ou na total ausência dele (anaerobiose).

A GLICOSE COMO SUBSTRATO OXIDÁVEL

Quase todas as células são capazes de atender às suas demandas


energéticas apenas a partir de glicose. Esse açúcar é imprescindível para
algumas células e tecidos, como hemácias e tecido nervoso, por constituir
o único substrato que eles são capazes de utilizar para obter energia.
Você viu nas nossas aulas iniciais que a energia contida nas moléculas
oxidáveis, como a glicose, são derivadas em última análise da radiação
solar. Esse tipo de energia é transformado em energia química durante
a síntese de moléculas orgânicas (principalmente glicose) que ocorre na
fotossíntese. Os organismos chamados heterotróficos são capazes de
utilizar tal energia presente nas ligações químicas das moléculas orgânicas
para realizar suas atividades celulares. Mas essa utilização não ocorre de
forma direta: primeiro a energia precisa ser convertida em ATP.

Luz solar ADP + Pi ATP

CO2 + H2O (CH2O)n piruvato


fotossíntese glicólise

Esquema 10.1

Uma das vias metabólicas de extração de energia, acoplada à


síntese de ATP, é a glicólise, também chamada via glicolítica. Nela,
a glicose é oxidada (degradada, quebrada) e, durante esse processo
oxidativo, a célula é capaz de utilizar a energia liberada para sintetizar
duas moléculas de ATP.

108 CEDERJ
10 MÓDULO 3
A GLICOSE COMO INDICADOR METABÓLICO

O nível sangüíneo de glicose é chamado glicemia. Variações

AULA
na glicemia são indicadores do estado fisiológico do organismo.
Assim, quando a glicemia está baixa (hipoglicemia), as células têm
um comportamento metabólico distinto daquele que ocorre quando a
glicemia está alta (hiperglicemia).
Hiperglicemia indica um estado fisiológico de fartura e, portanto,
de armazenamento ou biossíntese (anabolismo – como você viu nas aulas
de introdução ao metabolismo).
Hipoglicemia indica um estado fisiológico de privação, mesmo
que momentânea, e as células respondem derivando seu metabolismo
para a degradação (catabolismo).
Os níveis sangüíneos de glicose são mantidos dentro de uma
faixa estreita, graças a diferentes vias metabólicas de síntese de glicose
(gliconeogênese) ou armazenamento de glicose na forma de glicogênio
(glicogenogênese), em contraposição a vias de oxidação de glicose
(glicólise). Esse processo, que procura manter os níveis de glicose no sangue
constantes, chama-se homeostase e é finamente regulado por hormônios.
Pequenas variações nesse nível indicam, para as células, o que fazer.

Glicogênio, amido Glossário:

Glicogênio – um
polímero de glicose.

Gliconeogênese ou neo-
glicogênese – síntese de
Glicose glicose a partir de precur-
sores não glicídicos.

Glicogenogênese – sín-
tese de glicogênio.
Glicólise e ciclo Via das
Fotossíntese Gliconeogênese Glicólise – quebra da
de Krebs pentoses-
glicose.
fosfato
Glicogenólise – quebra
do glicogênio.

Co2 e Piruvato ATP NADPH e


luz solar e ribose-5-P
Alanina

Figura 10.1: A homeostase de glicose é mantida pelas vias de síntese e de degradação.

CEDERJ 109
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato I

6CH GLICÓLISE – ASPECTOS GERAIS


2OH
5 O
H Na via glicolítica, uma molécula de glicose (seis carbonos
H H
4 1 – Figura 10.2) é quebrada, produzindo duas moléculas de três carbonos
HO OH H OH denominadas piruvato. É um processo oxidativo no qual duas moléculas
3 2 de NAD+ (Figura 10.3) são reduzidas a duas moléculas de NADH + H+.
H OH
H O H H O
Figura 10.2: Glicose ou
C C +H
α-D- glicopiranose (projeção 2e-
NH 2 NH 2
de Haworth).
+ 2H+ ..
N N
O CH2 O
R NADH
H H
O P O- H H
Reduzido

O OH OH
NH 2
N
O P O- N Adenina

N N
O CH2 O
H H
H H

OH OH -

NAD+
(oxidado)

Figura 10.3: Nicotinamida adenina dinucleotídeo – NAD. O NAD pode estar na sua
forma oxidada NAD+ ou na sua forma reduzida NADH.

Para que esta via ocorra, existem etapas que consomem energia
(através da hidrólise de ATP - Figura 10.4): etapas endergônicas, onde a
molécula de glicose é preparada para ser clivada; e etapas que sintetizam
ATP: etapas exergônicas, onde moléculas de ATP são formadas a partir
da energia liberada durante o processo oxidativo.

fosfoéster
NH 2
Ligações Figura 10.4: Adenosina
fosfoanidras N
N trifosfato – ATP. Em
destaque, a ligação
N
fosfoéster entre a
O O O N adenosina e o fosfato e
as ligações fosfoanidras,
O P O P O P O
g b a CH2 O entre fosfatos.
O O O H H
H H

OH OH -

Adenosina

AMP
ADP

ATP

110 CEDERJ
10 MÓDULO 3
No processo completo, associando-se consumo e formação de
ATP, temos um saldo líquido de duas dessas moléculas. Vale ressaltar

AULA
que, na realidade, conservamos parte da energia liberada nesse processo
oxidativo na formação de ligações éster–fosfato (ligações ricas em energia)
entre a molécula de ADP e fosfato inorgânico (Pi). Uma visão geral deste
processo é apresentada na Figura 10.5.
Como produtos desta via temos, além de ATP e NADH, duas
moléculas de piruvato. O destino deste piruvato depende da célula e da
presença ou ausência de oxigênio, como veremos mais adiante.

Figura 10.5: Resumo


da via glicolítica. Uma
Glicólise molécula de glicose (seis
carbonos) é quebrada
em duas moléculas de
piruvato (três carbonos).
Glicose Neste processo, a energia
2ADP +
2NAD liberada é utilizada para a
+ 2Pii síntese de duas moléculas
de ATP. O produto final
(piruvato) pode ter des-
Frutose - 1,6 -
tinos diferentes (lactato,
bisfosfato CO2 e H2O ou etanol e
CO 2 ), como veremos
mais adiante.
2ATP 2NADH

2 piruvato

Lactato CO2
2+ Etanol
H2
2O + CO2
2

CEDERJ 111
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato I

A VIA GLICOLÍTICA PASSO A PASSO

A glicólise pode ser dividida em dois estágios. O estágio 1 é chamado


estágio de investimento; e o estágio 2, o de pagamento ou de síntese de
ATP. Nesta aula, nós iremos mostrar o primeiro estágio apenas. Na aula
seguinte você verá a última fase, o estágio 2.
Estágio 1: Neste primeiro estágio da via glicolítica, são gastas duas
moléculas de ATP, sendo a molécula de glicose (seis carbonos) convertida
em duas moléculas de três carbonos (gliceraldeído 3-fosfato).

Resumo do estágio 1: Glicose 2 x gliceraldeído 3P

A glicose entra na via glicolítica por fosforilação, na hidroxila do


carbono 6, formando uma molécula de glicose 6-fosfato (G6P).

Reação 1: Glicose + ATP Glicose 6-fosfato + ADP

112 CEDERJ
10 MÓDULO 3
Esta reação é dependente de energia, sendo, portanto, acoplada à
clivagem de uma molécula de ATP e é catalisada pela enzima hexoquinase.

AULA
(Figura 10.6).

a b

Figura 10.6: Hexoquinase e seu mecanismo de ação. A seta indica o substrato (glicose)
em (a) se aproximando do sítio ativo. Em (b) a mudança conformacional induzida pela
ligação do substrato (fit induzido).

Entretanto, nas células do parênquima hepático e nas ilhotas


!
pancreáticas, tal reação é catalisada pela enzima glicoquinase, cuja Para relembrar
atividade é induzida e afetada por mudanças no estado nutricional. A os conceitos de
enzima alostérica
hexoquinase é inibida de maneira alostérica pelo produto de sua reação, e Km – ver as aulas
de enzimas da
a G6P. A hexoquinase está presente em baixas concentrações em todos Bioquímica I.

os tecidos extra-hepáticos e possui alta afinidade (baixo Km) por seu


substrato, a glicose. Sua função é permitir que a glicose seja utilizada pelos
tecidos, mesmo quando os níveis de glicose no sangue estejam baixos.
No momento em que uma molécula de glicose entra na célula e é
fosforilada, ela permanece dentro da célula mesmo contra um gradiente
de concentração. A hexoquinase pode catalisar a fosforilação dos
isômeros α (alfa) e β (beta) da glicose, bem como de outros açúcares de
seis carbonos. A função da glicoquinase é remover glicose do sangue após
a alimentação. Ao contrário da hexoquinase, a glicoquinase tem um alto
Km por glicose e opera em condições ótimas quando os níveis de glicose
do sangue são elevados, sendo específica para este tipo de açúcar.
A glicose 6-fosfato, além de ser a molécula utilizada nas próximas
etapas da via glicolítica, é um componente importante na junção de diversas
outras vias metabólicas, tais como gliconeogênese, via das pentoses,
glicogenogênese e glicogenólise, como estudaremos mais adiante.

CEDERJ 113
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato I

Além disso, essa primeira reação da glicólise tem conseqüências


importantes para a célula: ao ser fosforilada, a glicose não pode mais
sair da célula, pois os mecanismos de transporte dessa molécula não
servem para aquela que já foi fosforilada. Isto mantém o nível de glicose,
na célula, sempre baixo em relação à concentração extracelular. Como
o transporte de glicose é dependente da concentração (ver difusão
facilitada e glicose, em Biologia Celular I), a tendência da glicose é
sempre entrar na célula.
Outra conseqüência desta primeira reação é indicar o caminho
metabólico que a glicose vai seguir. A fosforilação no carbono 6 indica
que a glicose será degradada na via glicolítica. Como veremos mais
tarde, a glicose pode receber diferentes “etiquetas” que indicam outros
destinos metabólicos.
Na segunda reação da glicólise, a glicose 6P é convertida em
frutose 6P (Fru 6P). Essa é uma reação do tipo isomerização aldose-cetose
e é catalisada por uma fosfo-hexoisomerase (reação 2).

Reação 2: Glicose 6P Frutose 6P

Na etapa seguinte, também dependente da energia de clivagem de


ENZIMA INDUZÍVEL
ATP, a molécula de frutose 6P é fosforilada na hidroxila do carbono 1,
Uma enzima cuja
síntese pode ser formando uma molécula de Frutose 1-6-bisfosfato (Fru 1,6-bisP) (reação
aumentada (induzida)
em uma determinada 3). Tal reação é catalisada pela enzima fosfofrutoquinase (PFK). (Veja
situação metabólica.
Em contraposição,
reação 3 e Figura 10.7). A PFK é tanto uma enzima alostérica quanto
utilizamos o termo uma ENZIMA INDUZÍVEL, cuja atividade é considerada o principal ponto de
enzima constitutiva,
cujo nível é constante, regulação da velocidade da via glicolítica.
independente da
situação metabólica.

114 CEDERJ
10 MÓDULO 3
Reação 3: Frutose 6P Frutose 1,6-bisfosfato

O O O

AULA
6 6 1
- O P O CH 1 - O P O CH CH 2 O P O-
2 O ATP ADP 2 O
- CH 2 OH
O- O-
2+
O 5 Mg 5
H HO 2 H HO 2
H OH H OH
4 3 4 3
OH H OH H
frutose 1,6-bisfosfato
Frutose 6-fosfato
Gº = -14,2 kJ/mol

Figura 10.7: Fosfofrutoquinase (PFK). A PFK é uma enzima chave da glicólise. Preste atenção nas
características da enzima e da reação que ela catalisa. Esta reação é um importante ponto de
regulação da via, como veremos na próxima aula.

A seguir, a molécula de frutose 1-6-bisfosfato sofre uma clivagem !


pela ação da enzima aldolase, gerando duas moléculas isômeras, que Fique atento. Em alguns
livros você vai encontrar
possuem três carbonos: gliceraldeído 3P (G3P) e dihidroxiacetona notações diferentes para
fosfato (DHAP). Pela ação de uma triose-isomerase específica, a DHAP as moléculas. A frutose
1,6-bisfosfato pode
é convertida em G3P. Assim, iniciaremos os passos seguintes com duas ser encontrada como
frutose 1,6-bifosfato ou
moléculas de G3P. frutose 1,6-difosfato; a
fosfofrutoquinase pode
ser encontrada como
fosfo-frutose-quinase ou
ainda fosfofrutocinase,
junto ou separado.

Reação 4: Frutose 1,6-bisfosfato dihidroxiacetona-P + gliceraldeído 3P


ΔG10 = 23.8 kJ/mol

O O O H
6
O
O P O CH 2 CH 2 O P O- C
O CH 2 O P O-
O O- HCOH O
5
H HO 2 C O O- +
H OH aldolase CH 2 O P O-
4 3
C H2 OH
OH H O-
Dihidroxiacetona Gliceraldeído
Frutose 1,6-bisfosfato 3-fosfato 3-fosfato

CEDERJ 115
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato I

Reação 5: dihidroxiacetona-P gliceraldeído 3P


10
ΔG = 7,5 kJ/mol
O H
CH 2OH C

C O O HCOH O

CH 2 O P O-
Triose fosfato CH 2 O P O-
isomerase
O- O-
Dihidroxiacetona Gliceraldeído
fosfato 3-fosfato

Até aqui uma molécula de seis carbonos (a glicose) foi parcialmente


quebrada em duas moléculas de três carbonos (gliceraldeído 3-P). Note
que as duas moléculas geradas são fosforiladas e apresentam a metade
do número de carbonos que a molécula original de glicose.
Se você prestou atenção, provavelmente reparou que até aqui não
ocorreu síntese de ATP. Pelo contrário, a célula gastou duas moléculas
de ATP (reações 1 e 3). Por este motivo, essa primeira fase é chamada
etapa de investimento ou etapa preparatória. Tal etapa é fundamental,
pois nela a célula coloca à disposição do processo a energia já
existente, e esse investimento possibilita, em etapas posteriores, não
só a recuperação do investimento inicial, como também a síntese de
mais ATP. Isto acontece através de um conjunto de reações conhecido
por etapa de pagamento ou etapa de conversão de energia ou simplesmente
etapa de síntese de ATP.

116 CEDERJ
10 MÓDULO 3
AULA
Clivagem de um
açúcar-fosfato de seis
carbonos em dois
açúcares- fosfato de
três carbonos.

Figura 10.8: Resumo das reações da etapa de investimento ou etapa


preparatória da glicólise. Nessa fase, os eventos principais são a fosforilação
da glicose e sua conversão a gliceraldeído-3P.

Lembre-se de que esse assunto não acabou. Na próxima aula, você


verá o estágio 2 da glicólise, e como a célula usa a energia da quebra
da glicose, para sintetizar ATP. Não esqueça que, embora por motivos
didáticos os dois estágios estejam separados, o processo é um só.

CEDERJ 117
11
AULA
Glicólise: oxidação
de glicose a piruvato II
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

INTRODUÇÃO Nesta aula continuaremos a falar da glicólise. Dessa vez, exploraremos a etapa
de pagamento ou de síntese de ATP. Lembre-se de que:
• Na primeira fase, dois ATPs foram hidrolisados para fosforilar a molécula
de glicose.
• Os produtos da primeira fase são duas moléculas de gliceraldeído 3P, um
açúcar fosforilado de três carbonos.

É daí que partiremos agora. Recorde-se de que, com uma molécula de glicose,
duas moléculas de gliceraldeído 3P são geradas e, portanto, a partir delas, duas
moléculas de todos os intermediários são produzidas também.

Estágio 2: Nesse último estágio da glicólise, as duas moléculas de


três carbonos (G3P) são convertidas em duas moléculas de piruvato.

Resumo do estágio 2: 2 Gliceraldeído 3-fosfato 2 Piruvato

A molécula de G3P é oxidada e ao mesmo tempo fosforilada,


formando uma molécula de 1,3-bisfosfoglicerato. Observe que, nessa
etapa, uma molécula de fosfato inorgânico (Pi) é incorporada à molécula
de G3P no entanto não há consumo de qualquer molécula de ATP
(reação 6).

O

Reação 6: O H + + + O O P O
NAD NADH + H
C O C –
– O
HCOH + HO P O HCOH
2– – Gliceraldeído 2–
CH2OPO3 O 3-fosfato CH2OPO3
desidrogenase
Gliceraldeído Fosfato 1,3
3-fosfato inorgânico Bifosfoglicerato
bifosfoglicerato

DG´ = 6,3 kJ/mol


0

De onde vem então a energia para formar uma ligação covalente


entre o G3P e o Pi?

120 CEDERJ
11 MÓDULO 3
Parte da energia que foi liberada no processo oxidativo
(transformação de gliceraldeído em glicerato) foi conservada na formação

AULA
de uma molécula de 1,3-BISFOSFOGLICERATO, que possui, então, um potencial 1,3 - B I S F O S F O G L I -
CERATO
energético maior do que o G3P. Nesta reação, uma molécula de NAD+
É a primeira
é reduzida a NADH + H+. Esta é uma reação típica, catalisada por uma molécula de alta
classe de enzimas denominadas desidrogenases ligadas ao NAD+. energia formada
na glicólise.
Na etapa seguinte, a energia conservada na molécula de 1,3-
bisfosfoglicerato (BPG) será utilizada na formação de uma molécula de
ATP (ligação éster-fosfórica entre ADP + Pi), sendo o BPG convertido,
então, em 3-fosfoglicerato (3PG).

Reação 7:

O

O P 2+ – O P O
Mg O O

O O P O + P C + P
C –
O fosfoglicerato
P
O quinase HCOH
HCOH 2–
Rib Adenina CH2OPO3 O
2–
CH2OPO3 ADP 3–fosfoglicerato Rib Adenina
1,3 ATP
bifosfoglicerato DG´0 = –18,5 kJ/mol

Essa reação é catalisada pela enzima fosfoglicerato quinase. Uma


vez que duas moléculas de triose fosfato são formadas por molécula de
glicose, duas moléculas de ATP são geradas nesse estágio. Este processo de
formação de ATP é um exemplo de fosforilação em nível de substrato.
Pela ação de uma fosfoglicerato mutase, o 3PG será convertido
em 2-P-Glicerato (2PG).

CEDERJ 121
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

Reação 8:
— —
O O O O
C C O
Mg2+ —
HC OH O HC O P O
— fosfoglicerato —
CH2 O P O mutase CH2 OH O

O 2-fosfoglicerato
3-fosfoglicerato G´°= 4,4 kJ/mol

A etapa subseqüente é catalisada pela enolase e envolve a


desidratação e redistribuição da energia dentro da molécula. A
proximidade do grupamento funcional hidroxila com o íon fosfato
favorece a formação de um enol-fosfato, o fosfoenolpiruvato (PEP),
que é também considerado um composto de alta energia.

Reação 9: O O- O O-
H2O
C O C O
H C O P O- C O P O-
enolase
HO CH 2 O - CH 2 O-
2-fosfoglicerato Fosfoenolpiruvato
fosfoenolpiruvato
G´º= 7,5 kJ/mol

O passo seguinte é também uma fosforilação em nível do substrato.


FOSFOENOLPIRU- O fosfoenolpiruvato transfere seu grupo fosfato para o ADP, formando
VATO
ATP. O produto é o piruvato, e a reação é catalisada pela piruvato
É a segunda molécula
de alta energia formada quinase.
na glicólise.


– O
O O O O

C O P 2+ + C O P O
– Mg , K
C O P O + P C O + P
– Piruvato
Ch2 O O quinase Ch3 P
Fosfoenolpiruvato Rib Adenina Piruvato O
Rib Aden
ATP

DG´ = –31,4 kJ/mol


0

122 CEDERJ
11 MÓDULO 3
Devemos lembrar que, nesse segundo estágio, partimos de duas
moléculas de gliceraldeído 3P e, portanto, duas moléculas de piruvato,

AULA
duas de NADH + H+ e quatro moléculas de ATP foram formadas. Ao
calcularmos o rendimento energético em termos de formação de ATPs,
veremos que foram gastas duas moléculas no primeiro estágio da via e
que foram ressintetizadas quatro moléculas, ou seja ocorreu formação
líquida de duas moléculas de ATP (Figura 11.1).

!
Fase de pagamento
Conversão oxidativa de
gliceraldeído 3-fosfato
em piruvato e a formação
acoplada de ATP e NADH.

Figura 11.1: Fase de pagamento da glicólise. Também chamada etapa


de conservação de energia ou, simplesmente, etapa de síntese de ATP.

CEDERJ 123
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

UTILIZAÇÃO DO PIRUVATO E REOXIDAÇÃO DO NADH

Já vimos no início da aula que o piruvato pode ter vários destinos.


O estado redox do tecido e a presença ou ausência de O2 determinam
qual via deverá ser seguida.
1o destino – Quando em condições anaeróbicas, o piruvato é
reduzido pelo NADH, formando lactato (na fermentação lática) ou
etanol e CO2 (na fermentação alcoólica).

Fermentação lática

Na fermentação lática a reação é catalisada pelo complexo


enzimático piruvato desidrogenase. Nessas condições, a molécula de
NAD+ é regenerada, estando pronta para ser reutilizada em um outro
ciclo da via glicolítica.

Piruvato + NADH + H+ L(+)-Lactato + NAD+

A fermentação lática ocorre em alguns microorganismos e também


no músculo de vertebrados e invertebrados.

Fermentação alcoólica

Na fermentação alcoólica a conversão de piruvato em etanol e CO2


envolve duas reações sucessivas. A primeira reação é a conversão de
piruvato em acetaldeído, uma reação de descarboxilação, na qual o CO2
é liberado. Esta reação é catalisada pela piruvato descarboxilase.
CO2

piruvato acetaldeído
piruvato
descarboxilase

A segunda reação é a reoxidação do NADH a NAD+. Esta última


reação é catalisada pela enzima álcool desidrogenase. Os produtos finais
da fermentação alcoólica são, portanto, o etanol, uma molécula de dois
carbonos, CO2 e NAD+.
NADH NAD+

acetaldeído etanol
álcool
desidrogenase

124 CEDERJ
11 MÓDULO 3
2o destino – Quando em condições aeróbicas, o piruvato é
transferido para as mitocôndrias e, após conversão em acetil-Coenzima A

AULA
(Acetil-CoA), é oxidado em CO2 no ciclo do ácido cítrico. Os equivalentes
do NADH + H+ produzidos na via glicolítica são também levados para
as mitocôndrias, onde serão transferidos para aceptores específicos,
em um processo que veremos mais tarde e que é denominado cadeia
transportadora de elétrons.

Piruvato + NAD+ + CoA Acetil-CoA + NADH + H+ + CO2

REGULAÇÃO DA VIA GLICOLÍTICA

Embora a maioria das reações da via glicolítica


GLICOQUINASE E HEXOQUINASE
seja reversível, três delas são marcadamente
glicose + ATP glicose –6P + ADP + Pi
exergônicas e são consideradas irreversíveis do ponto
de vista fisiológico. Essas reações são catalisadas FOSFOFRUTOQUINASE
frutose 6-P + ATP frutose 1,6-bisfosfato + ADP
pela HEXOQUINASE E GLICOQUINASE, FOSFOFRUTOQUINASE
+ Pi
e PIRUVATO QUINASE e são consideradas os principais
PIR UVAT
UVATO QUINASE
sítios de regulação da glicólise.
fosfoenolpiruvato + ADP + Pi piruvato + ATP
A regulação da via ocorre segundo
o princípio da máxima economia. A via será
inibida se o organismo estiver em um estado fisiológico energeticamente
favorável, ou seja, quando o balanço ATP/ADP for positivo. Em outras
palavras, se a célula tem muito ATP, as vias metabólicas de síntese de
ATP serão inibidas. Em baixas concentrações de ATP (altas concentrações
de ADP), a via será ativada. Entretanto, não se engane... Não existe
nenhuma situação fisiológica em que a via esteja parada. Ela pode
funcionar a uma velocidade maior ou menor, mas qualquer inibidor
ou situação metabólica que paralise a via glicolítica certamente levará
o organismo à morte.

!
Enzimas chaves da via glicolítica:
HEXOQUINASE FOSFOFRUTO-
QUINASE PIRUVATO QUINASE

CEDERJ 125
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

Tabela 11.1: Reguladores das enzimas chaves da via glicolítica.

Enzima Inibidor (-) Ativador (+)


Hexoquinase Glicose 6-fosfato; ATP
Fosfofrutoquinase ATP; citrato AMP; ADP
Piruvato quinase

O detalhamento dessa regulação será visto após estudarmos outras


vias metabólicas, uma vez que os processos metabólicos ocorrem de
maneira integrada.

RESUMO

A glicólise é uma seqüência de dez reações catalisadas por enzimas e por


meio das quais uma molécula de glicose é convertida em duas moléculas de
piruvato, com a produção de duas moléculas de ATP e duas de NADH. A via
glicolítica pode ser dividida em uma etapa de investimento e uma etapa de
pagamento. Na primeira etapa, a célula investe dois ATPs e quebra a glicose em
duas moléculas de gliceraldeído 3P. Na segunda etapa, duas moléculas de alta
energia são produzidas: 1,3-bisfosfoglicerato e fosfenolpiruvato. A formação
dessas moléculas é fundamental para a síntese de quatro moléculas de ATP.
Além de ATP, dois NAD+ são reduzidos a NADH, para cada molécula de glicose
quebrada. A via glicolítica é regulada principalmente pela carga energética da
célula. O indicador da carga energética é a relação entre a concentração de
ATP e a concentração de ADP e/ou AMP. Os principais pontos de regulação são
as enzimas hexoquinase, fosfofrutoquinase e piruvato quinase, todas as três
metabolicamente irreversíveis. A via trabalha tanto em condições aeróbicas
quanto em condições anaeróbicas.

126 CEDERJ
11 MÓDULO 3
Nas três últimas aulas, você conheceu uma das vias metabólicas
mais importantes do metabolismo energético. Não perca de vista a

AULA
totalidade dessas aulas, pois, mais importante que saber detalhes da via
metabólica, é a compreensão do seu sentido fisiológico, ou seja, para
que ela serve. Isso vai orientar você quanto ao que precisar ser fixado
realmente. Não deixe de entender os conceitos de máxima economia, de
moléculas de alta energia, de acoplamento entre reações. Tais conceitos
são universais quando se trata de Bioquímica e entendê-los facilita a
compreensão dessa e de cada uma das outras vias metabólicas que você
verá na Bioquímica II.
O próximo módulo chama-se respiração celular. Ele fala das vias
complementares à glicólise que ocorrem na presença de oxigênio (ciclo
de Krebs ou ciclo do ácido cítrico e cadeia transportadora de elétrons).
Portanto, não esqueça que a glicólise também é parte desse processo.

EXERCÍCIOS

De 1 a 6, assinale a(s) afirmativa(s) correta(s):

1. Sobre os aspectos gerais da via glicolítica:

a) na via glicolítica são produzidas seis moléculas de ATP;

b) duas moléculas de piruvato são formadas por cada molécula de glicose que entra
na via;

c) ocorrem duas reações de condensação na via;

d) a regulação alostérica é importante para esta via;

e) a via glicolítica só ocorre em organismos anaeróbicos.

2. A glicólise apresenta duas etapas:

a) ambas requerem ATP para ativação;

b) somente uma é catalisada pela aldolase;

c) somente uma produz piruvato;

d) ambas são catalisadas por quinases.

CEDERJ 127
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

3. Qual enzima não é importante para a via glicolítica?

a) aldolase;

b) enolase;

c) piruvato carboxilase;

d) piruvato quinase.

4. A conversão de gliceraldeído 3P em 1,3-bisfosfoglicerato.

a) requer ATP;

b) é inibida por frutose 1,6 bi-P;

c) é catalisada por uma desidrogenase NAD+ dependente;

d) é uma reação de condensação.

5. A produção de frutose 1,6-bisP.

a) libera energia;

b) é uma etapa comprometida na via glicolítica;

c) é catalisada pela hexoquinase;

d) é inibida por ATP.

6. A produção de ATPs na glicólise.

a) ocorre em duas reações separadas;

b) ocorre na ausência de 2P-glicerato;

c) requer a produção de lactato;

d) requer a produção de piruvato.

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11 MÓDULO 3
7 . Com relação ao processo de fermentação alcoólica (etanólica), podemos dizer que:

a) as reações da glicólise são diferentes daquelas que ocorrem nos organismos que

AULA
produzem lactato;

b) o acetaldeído é um composto intermediário nesta transformação;

c) NAD+ é convertido em NADH;

d) grandes quantidades de oxigênio são necessárias para que tal processo ocorra.

8 . Estabeleça os aspectos comparativos entre as enzimas hexoquinase e glicoquinase.

9. Como você explicaria a existência de uma mesma via metabólica presente desde
os microorganismos até os seres mais complexos que conhecemos?

10. Você reparou que todos os compostos da via glicolítica, exceto a molécula
de piruvato, encontram-se fosforilados? Pense/especule sobre uma razão
para este fato.

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Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS AVALIATIVOS

Assinale a(s) afirmativa(s) correta(s)

1. Sobre os aspectos gerais da via glicolítica.

a) na via glicolítica são produzidas seis moléculas de ATP:

b) duas moléculas de piruvato são formadas por cada molécula de glicose que
entra na via; CORRETA

c) ocorrem duas reações de condensação na via;

d) a regulação alostérica é importante para esta via; CORRETA

e) a via glicolítica só ocorre em organismos anaeróbicos.

2. A glicólise apresenta duas etapas e:

a) ambas requerem ATP para ativação;

b) somente uma é catalisada pela aldolase;

c) somente uma produz piruvato; CORRETA

d) ambas apresentam reações catalisadas por quinases. CORRETA

3. Qual dessas enzimas não é importante para a via glicolítica?

a) enolase;

b) aldolase;

c) piruvato carboxilase; CORRETA

d) piruvato quinase.

130 CEDERJ
11 MÓDULO 3
4. A conversão de gliceraldeído 3P a 1,3-bisfosfoglicerato:

a) requer ATP; CORRETA

AULA
b) é inibida por frutose-1,6 bisP;

c) é catalisada por uma desidrogenase NAD+ dependente;

d) é uma reação de condensação.

5. A produção de frutose 1,6-bisP:

a) libera energia;

b) é a reação final na via glicolítica;

c) é catalisada pela hexoquinase;

d) é inibida por ATP. CORRETA

6. A produção de ATPs na glicólise:

a) ocorre em duas reações separadas; CORRETA

b) ocorre na ausência de 2P-glicerato;

c) requer a produção de lactato;

d) requer a produção de piruvato.

7 . Com relação ao processo de fermentação alcoólica (etanólica), podemos dizer que:

a) as reações da glicólise são diferentes daquelas que ocorrem nos organismos que
produzem lactato;

b) o acetaldeído é um composto intermediário nesta transformação; CORRETA

c) NAD+ é convertido em NADH;

d) grandes quantidades de oxigênio são necessárias para que este processo ocorra.

CEDERJ 131
Bioquímica II | Glicólise: oxidação de glicose a piruvato II

8 . Estabeleça os aspectos comparativos entre as enzimas hexoquinase e glicoquinase.

Ambas são enzimas que catalisam a reação de fosforilação de glicose em glicose


6-P. Ambas são inibidas pelo produto. Hexoquinase é a isoforma presente na
maior parte dos tecidos extra-hepáticos, enquanto a glicoquinase é a isoforma
encontrada no fígado. As isoformas têm diferentes afinidades pelo substrato
(glicose). Enquanto a hexoquinase é uma enzima generalista, que catalisa a
fosforilação de hexoses, como glicose, manose e frutose, a glicoquinase é bastante
específica para glicose. A hexoquinase possui alta afinidade (baixo Km) por seu
substrato glicose, enquanto a glicoquinase possui baixa afinidade.

9. Como você explicaria a existência de uma mesma via metabólica presente desde
os microorganismos até os seres mais complexos que conhecemos?

Falar de relações evolutivas entre os organismos.

10. Você reparou que todos os compostos da via glicolítica, exceto a molécula
de piruvato, encontram-se fosforilados? Pense/especule sobre uma razão
para este fato.

Falar de organização celular, fosfato como etiqueta de endereçamento.

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