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AGRO+AP – O Sentinel-2 e a

Agricultura de Precisão
 Publicado em 30 de junho de 2017

Ricardo Braga
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Professor ISA / UL

Ricardo Braga Instituto Superior de Agronomia


ricardobraga@isa.ulisboa.pt

Publicado na revista da Agrotejo de 2016


http://www.agrotejo.pt/pagina.asp?ID=18

A Agricultura de precisão é um processo de melhoria continua da gestão


das explorações agrícolas que visa aumentar o seu retorno económico,
otimizando a gestão de recursos e fatores de produção. As diversas
tecnologias associadas (GPS, SIG, DR, VRT, etc.) são aliadas de peso na
implementação prática da Agricultura de Precisão. Entre elas, a deteção
remota assume lugar de destaque particular logo na primeira fase do ciclo
de implementação, a fase de obtenção de dados georreferenciados das
parcelas, solos e culturas.

De facto, o combustível que faz funcionar a Agricultura de Precisão é uma


mescla de dados com conhecimento agronómico. Na primeira fase do ciclo
de implementação várias podem ser as fontes de dados: cartas de
produtividade, cartas de índices de vegetação, sensores meteorológicos,
etc.

A cartas de produtividade continuam a ter particular destaque no a fontes


de dados para a Agricultura de Precisão diz respeito. A razão é óbvia já
que a produção é o culminar de todo o calendário cultural e a sua venda
conduz a encaixe financeiro da exploração.

Contudo as cartas de índices de vegetação (NDVI entre outros) também


são importantes no processo por duas razões principais. Em primeiro
lugar, neste momento não é possível elaborar cartas de produtividade para
todas as culturas. Ainda temos limitação de tecnologia para monitorizar de
forma georreferenciada a produtividade de culturas como a vinha ou o
olival. Nestas culturas, as cartas de índices de vegetação ganham destaque
acrescido. Em segundo lugar, mesmo nas culturas em que é possível contar
com cartas de produtividade, as cartas de índices de vegetação, sendo
obtidas durante a campanha, e portanto, ainda a tempo de atuar no próprio
ano, revestem-se de um interesse muito particular.

De facto, a possibilidade de, a meio de um ciclo cultural, dispor de uma


forma de conhecer o estado de conforto da uma cultura em termos médios
e em cada zona de uma parcela em particular constitui uma ferramenta de
gestão muito importante. Na maioria das vezes, o índice de vegetação
utilizado é o NDVI – Índice vegetativo de diferença normalizada.

O NDVI é um índice clássico, simples e eficaz numa primeira avaliação do


conforto vegetativo de um coberto vegetal. Toma valores entre zero e a
unidade conforme estamos em presença de culturas ou zonas de parcelas
com baixo ou elevado conforto vegetativo, respetivamente. O conforto
vegetativo resulta da ausência de stress de qualquer ordem, o que por sua
vez conduz a maiores quantidades de biomassa ou vigor.
Dependendo da cultura, um valor elevado de NDVI pode ou não ser
desejável. O que é importante é que o gestor agrícola saiba que valores são
apropriados, para, em pose das cartas perceber a performance da cultura no
seu todo e em cada zona de uma dada parcela em particular. Em presença
de desvios, o gestor pode atuar no sentido de os corrigir tomando as
medidas necessárias. A natureza destas medidas e a sua magnitude
dependem quer do fator limitante em cada momento e local quer da
severidade com que incide. A sucessão temporal de cartas de NDVI
permite ainda conhecer a taxa de crescimento de uma cultura em cada zona
de uma parcela. Por uma diversidade de aspetos, a interpretação das cartas
de NDVI deve ser feita com enorme cuidado carecendo quase sempre de
apropriada validação no campo.

Existem já neste momento em Portugal diversos prestadores de serviços


que fornecem cartas NDVI. A principal diferença entre eles resulta de
diferentes resoluções temporais e espaciais e que se reflete no custo. Há,
no entanto, outros aspetos igualmente importantes como, por exemplo, a
qualidade do pós-processamento ou o formato em que são fornecidas as
cartas. As considerações são extensas e não compatíveis com o objetivo
deste artigo em particular.

A resolução temporal está relacionada com a frequência com que as


imagens de base são obtidas. A resolução espacial, por outro lado, está
relacionada com a tamanho do pixel da imagem no terreno. Assim,
podemos ter baixa resolução temporal com apenas uma imagem na
campanha ou elevada com uma imagem a cada 10 dias, por exemplo. Da
mesma forma, podemos ter uma resolução espacial de 10 metros ou de 10
cm. O custo das cartas é tanto mais caro quanto mais elevada for qualquer
uma das resoluções.
Em termos práticos é interessante ter uma combinação de ambas as
resoluções, mas acabamos sempre por encontrar uma solução de
compromisso entre ambas. Há valores ótimos para ambas não sendo
necessário obter a máxima resolução espacial (e.g. 1 cm) e temporal (e.g.
todos os 3 dias). Pode até nalguns casos ser contraproducente excessivo
tamanha e custo computacional que a análise das imagens acarreta. Em
cada cultura ou grupos de culturas, há uma combinação ideal de resolução
temporal e espacial das cartas NDVI.

Desde 15 de Julho de 2015, data da primeira imagem operacional


disponível, começou a ser possível disfrutar do Sentinel-2 uma missão de
observação terrestre por satélite da Agencia Espacial Europeia, parte
integrante do programa Copernicus. O Sentinel-2 consiste numa
constelação de dois satélites idênticos, o Sentinel-2A e o Sentinel-2B (um
já lançado e outro por lançar), para fornecer dados multiespectrais com
resoluções entre os 10 e os 60 metros dependendo das bandas.

Para as bandas do visível e NIR (infra-vermelho próximo), utilizadas no


cálculo do NDVI e outros índices de vegetação importantes, a resolução
espacial é de 10 m, o que é muito interessante sobretudo para áreas acima
dos 20 - 30 ha (200 a 300 pixels) com culturas de cobertura continua do
solo (arvenses, horto-industrias e floresta).

Quando os dois satélites estiverem ativos prevê-se uma resolução temporal


de 5 dias, o que será mais do que suficiente para as utilizações agrícolas
mais comuns da Agricultura de Precisão. Durante o Verão de 2016, ainda
só com um satélite e em fase de testes, ficaram disponíveis para uma
exploração agrícola na zona da Golegã 1 imagem em maio, 2 em junho,
julho e agosto.

Um aspeto extremamente atrativo do Sentinel-2 é que o acesso aos dados é


gratuito para qualquer um que aceda à plataforma online. Existem até
Apps para telemóvel quer permitem conhecer o NDVI de determinado
local em que o utilizador se encontre ou portais semelhantes ao gmaps ou
bingmaps para visualização das imagens compósitos e índices de
vegetação do Sentinel-2 para qualquer local ou data. Isto é possível
também porque o programa se rege pela politica de “open data”.

A entrada em funcionamento do Sentinel-2 é sem dúvida uma ótima


noticia para a Agricultura de Precisão e sua adoção no terreno. Trata-se de
uma ferramenta de grande valor para quem se preocupa com a otimização
da gestão agronómica das culturas. Mais uma razão para estarmos
confiantes quanto ao futuro da Agricultura de Precisão e o seu papel na
intensificação sustentável!

Fig. 1 – Carta do NDVI da zona sul da Golegã obtida para imagem do


Sentinel-2 de 29/6/2016 com 10 m de resolução espacial.
Fig. 2 – Carta do NDVI de pivots com áreas entre os 20 e 30 ha para
imagem do Sentinel-2 de 29/6/2016 com 10 m de resolução espacial.
Fig. 3 – Carta da diferença temporal do NDVI de pivots com áreas entre os
20 e 30 ha para imagens do Sentinel-2 de 29/6/2016 e 19/7/2016 com 10 m
de resolução espacial.
Fig. 4 – Carta do NDVI da região T29SND (vê-se o Tejo e as albufeiras de
Castelo do Bode, Montargil e Maranhão) para imagem do Sentinel-2 de
29/6/2016 com 10 m de resolução espacial.

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