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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Tecnologia e Ciências


Instituto de Geografia

Thiago Silvestre da Silva

O dinheiro e as geografias imaginadas da nação: um estudo sobre a


(re)produção visual de paisagens, personagens e tipos étnico-regionais
em cédulas do Brasil (1986-1993)

Rio de Janeiro
2019
Thiago Silvestre da Silva

O dinheiro e as geografias imaginadas da nação: um estudo sobre a


(re)produção visual de paisagens, personagens e tipos étnico-regionais
em cédulas do Brasil (1986-1993)

Qualificação de mestrado apresentada ao


Programa de Pós-Graduação em Geografia
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
para aprovação na disciplina Exame de
Qualificação de Mestrado. Área de
concentração: Cultura e Natureza.

Aprovado em 13 de agosto de 2019.

Banca examinadora:

___________________________________
Prof. Dr. André Reyes Novaes (Orientador)
Instituto de Geografia - UERJ

___________________________________
Prof. Dra. Mariana Araújo Lamego
Instituto de Geografia – UERJ

___________________________________
Prof. Dr. Gustavo Soares Iorio
Universidade Federal de Viçosa

Rio de Janeiro
2019
SUMÁRIO

Introdução .............................................................................................pág. 01

1. O dinheiro como reflexo, meio e condição da nação .................. pág. 08


1.1. O dinheiro como reflexo e meio de promoção da nação: construção dos
Estados-nação europeus e dos espaços monetários nacionais no século
XIX......................................................................................................... pág. 09
1.2. O dinheiro como condição de legitimação da nação: uma análise de duas
discussões em torno da criação de novas moedas nacionais no período pós-
Guerra Fria ........................................................................................... pág. 15

2. Fundamentação teórico-metodológica ............................................ pág. 18


2.1. Geografia, imagem visual e cultura material: entre história disciplinar e
metodologias “rematerialistas” ................................................................ pág. 18

2.2. Geografia, metodologias visuais e abordagem “interpretativa-


textualista”............................................................................................... pág. 23

3. Cronograma ....................................................................................... pág. 38

Bibliografia ............................................................................................ pág. 40

Anexo 1 ................................................................................................... pág. 44

Anexo 2 ................................................................................................... pág. 55


Introdução

O trabalho de qualificação de mestrado que ora se apresenta tem como


título: “O dinheiro e as geografias imaginadas da nação: um estudo sobre a
(re)produção visual de paisagens, personagens e tipos étnico-regionais em
cédulas do Brasil (1986-1993)”. A partir da observação de alguns termos do
título, é possível perceber que o tema desta dissertação de mestrado consiste
no estudo de estampas de papel-moeda produzidas durante o processo de
redemocratização do Brasil. Portanto, imagem e processo político compõem um
dos eixos analíticos do estudo proposto, de modo que visa investigar as formas
pelas quais a redemocratização brasileira é representada nas cédulas desse
período da história nacional.

O universo de cédulas analisadas na pesquisa não contempla todo o


conjunto de numerário produzido pelo Banco Central do Brasil e pela Casa da
Moeda do Brasil no recorte temporal escolhido. Dentre os dezenove modelos de
estampa fabricados entre a redemocratização do Brasil (1986) e o Plano Real
(1994), foram selecionadas treze cédulas para este estudo. Os treze modelos de
papel-moeda escolhidos destacam em sua composição visual desenhos de
paisagens, personagens e tipos étnico-regionais do Brasil.

Ao propor uma análise das imagens visuais produzidas para cédulas


brasileiras, pretendemos ressaltar, em primeiro lugar, a relação de
ressignificação construída ao longo da Idade Contemporânea entre moeda e
Estado-Nação. Relação que persiste de certo modo até a atualidade, pois,
apesar da rápida diversificação dos meios de pagamento promovida atualmente,
o dinheiro – seja de papel ou metálico – ainda é revestido de relativa importância
na efetivação cotidiana da economia, constituindo um instrumento que legitima
um imaginário de unidade territorial a partir de escalas geográficas múltiplas.
Desse modo, uma abordagem política em perspectiva histórica do signo
monetário pode revelar, tal como vemos em Gilbert e Helleiner (1999) e outros,
as relações estreitas entre moeda e unidades geopolíticas, como os Estados-
nação e os blocos econômicos regionais.

1
Em relação à sua forma econômica, o dinheiro tal como o conhecemos
atualmente, isto é, a moeda fiduciária1 demonstra, desde a etimologia da palavra
“fidúcia” até o reconhecimento de sua legitimidade, a necessidade de se garantir
que haja confiança suficiente entre a população a qual deve usar e aceitar
determinado papel-moeda ou moeda produzida com metal não precioso. A
utilização de uma única moeda fiduciária como moeda internacional é recente –
haja vista que data de 1971 – e, além disso, trouxe à tona o principal agente
atuante nesse processo de concessão de confiança ao dinheiro sem lastro em
metal: o Estado. Através da criação de uma série de leis regulatórias, o Estado
garante o grau de confiança necessário e caro às trocas monetárias2.

Dentre os autores contemporâneos que analisam o signo monetário


buscando relacioná-lo com a construção dos Estados-nação, destacaremos
inicialmente aquele que parece ter avançado mais em termos teórico-
metodológicos, chegando a propor um estudo da “geografia do dinheiro”, a
saber, Benjamin Cohen.

Cohen (1998) recorda que a relação de ressignificação estabelecida entre


moeda e Estado-nação toma sua forma contemporânea no século XIX com a
formação dos últimos. Para o autor citado, a construção dos Estados-nação
europeus teve como uma de suas condições de efetivação a criação de uma
moeda nacional. Assim posto, o dinheiro aparece como condição instauradora
da ideia de nação.

Benjamin Cohen (1998) argumenta que há nesse processo de construção


do Estado-nação e de seu espaço monetário uma representação geográfica que
reflete a configuração política dos Estados-nação contemporâneos isto é, um
ideal de exclusividade na ação econômica sobre o território nacional. O autor
acredita que a relação contemporânea entre Estado-nação e moeda são
tributárias do que ele chama de “modelo vestfaliano de geografia política”, o qual
estaria fundamentado na ideia de soberania estatal sobre o território nacional.

1 O termo “moeda fiduciária” compreende as moedas em papel ou metálicas que não possuem lastro em
nenhum metal precioso, tal como acontecia com o ouro desde o século XIX através do chamado “padrão-
ouro”. Como demonstra Arrighi (1994), este sistema monetário internacional possui dois períodos que se
diferem pela ascensão de duas hegemonias mundiais, isto é, o Reino Unido (1870-1914) e os Estados
Unidos (1944-1971). Após o fim do acordo de Bretton Woods em 1971, tem-se o início do sistema de
câmbio flutuante e a ascensão do dólar como moeda para transações internacionais.
2 Consultar Samuels (1984) para a relação geral entre moeda e lei e, para o caso brasileiro, Franco

(2017).

2
Conforme afirma Cohen, a Paz de Vestfália (1648) teria contribuído para formar
um imaginário específico que conjugaria Estado, território e economia monetária
sob uma ótica exclusivista, o qual ele chama de mito do “uma moeda-uma
nação”. Neste sentido, o dinheiro se apresenta como uma representação ou
reflexo da nação.

Apesar de toda a carga simbólica nacionalista que as moedas metálicas


ou de papel possuem na Idade Contemporânea, é através da sua materialidade
que os símbolos da nação podem ser constantemente transportados. Alguns
cientistas sociais, historiadores e geógrafos já reconheceram o uso do dinheiro
como meio de comunicação de massa e propaganda política, destacando a
construção da iconografia de estampas de diversos papel-moeda e de moedas
metálicas (Hobsbawm, 1983; Gilbert, 1998; Helleiner, 1998; Hymans, 2004;
Lauer, 2008; Penrose, 2011a, 2011b). Para esses autores, conceber a
iconografia da moeda nacional é projetar uma imagem específica da nação a
qual representa. Essas imagens da nação que o dinheiro propaga se expressam
através de diferentes padrões de design, texturas, dimensões, cores e símbolos
visuais. Dessa forma, o dinheiro se revela um meio tangível de difusão da nação.

Nesse sentido, o dinheiro – bem como outros símbolos nacionais – pode


ser entendido como reflexo, meio e condição para a materialização da ideia de
nação. Através da circulação monetária, a população de um país é exposta a
ideias e imagens que se apresentam como porta-vozes da nacionalidade.
Portanto, conforme o signo monetário circula pelo território ele comunica
mensagens dos poderes de emissão monetária (Kornis, 2003).

Essa vocação comunicativa do dinheiro nos permite vislumbrá-lo como um


objeto econômico-cultural intimamente ligado à constituição e distribuição do
poder social, corroborando a tese de que “o mundo monetário é discursivamente
constituído através de práticas socioculturais particulares” (Leyshon; Thrift, 1997,
p. X). Assim, o dinheiro assume uma dupla face que faz dele um objeto
igualmente material e imaterial, pois, além de uma materialidade à qual se atribui
um valor econômico (hoje não mais intrínseco à moeda), possui uma
imaterialidade dada pelo valor simbólico formado por percepções e práticas
socioculturais específicas.

3
Por ser um objeto constitutivo e representativo do poder social, o dinheiro
é desde os pré-socráticos, mais especificamente desde os cínicos, alvo de
estudos diversos. Ao longo da história, estudiosos de diferentes campos do
saber se dedicaram ao estudo do dinheiro entendendo-o ora como um objeto
econômico ora como um objeto cultural ou artefato, tal qual ocorre em uma das
mais antigas ciências auxiliares da história: a numismática. Esse fato demonstra
que o estudo do dinheiro foi e precisa ser interdisciplinar, podendo sua
abordagem variar de acordo com os objetivos estabelecidos por cada
pesquisador.

A moeda tem sido objeto de estudo de disciplinas como a filosofia, a


economia política, a sociologia e a história. Ainda na Antiguidade, alguns
filósofos gregos vão dedicar parte de suas reflexões às funções da moeda, tais
como Aristóteles que, nos escritos de A Política, ressalta a função econômica da
moeda em detrimento de outras funções que desempenha (Costilhes, 1985, p.
20). Na economia política do século XIX, Karl Marx se coloca como ponto de
inflexão para qualquer estudo sobre economia monetária após a publicação da
sua obra intitulada Manuscritos econômico-filosóficos (1844). Na sociologia,
alguns autores e obras são tidos como clássicos no estudo do signo monetário
como, por exemplo, George Simmel e seu livro The Philosophy of Money (1900)
e Marcel Mauss com sua conferência Les origines de la notion de monnaie
(1914). Por fim, dentre os historiadores que se detiveram sobre o estudo da
moeda podemos destacar René Sedillot com seu livro Histoire morale et
immorale de la monnaie (1989), em que o autor destaca o contexto de circulação
dos assignats – espécie de papel-moeda – durante a Revolução Francesa.

A presente pesquisa estabelece diálogos mais aproximados com a


sociologia e a história do dinheiro. As perspectivas fornecidas por essas
disciplinas nos permitem definir o dinheiro, respectivamente, como relação social
e como elemento central no processo de formação e construção dos Estados-
nação. Para além de uma função econômica, o signo monetário possui papéis
relacionados à construção dos sujeitos em sociedade e à reprodução cotidiana
de traços histórico-geográficos específicos de uma nação.

No caso da geografia, o dinheiro tem sido contemporaneamente


estudado sob três denominações principais, a saber, capital (Harvey, 2011),
4
finança (Contel, 2006) e relação social (Leyshon; Thrift, 1997). Enquanto David
Harvey e Fabio Contel estão preocupados com o papel exercido pelo dinheiro no
desenvolvimento da economia capitalista nas escalas global e nacional, Andrew
Leyshon e Nigel Thrift intencionam destacar como o mundo monetário e
financeiro é socialmente constituído por meio de discursos e de uma
determinada geografia.

Dessa forma, a abordagem geográfica do signo monetário proposta por


Leyshon e Thrift (1997) parece mais apropriada para a presente pesquisa, uma
vez que o dinheiro é entendido por esses autores como relação social e objeto
discursivo. A partir dessa perspectiva ao mesmo tempo social e geográfica,
podemos compreender o dinheiro como um objeto que possui, além de uma “vida
social” (Appadurai, 2008[1986]; Dodd, 2014), a capacidade de formar
subjetividades que influenciam ações e comportamentos humanos. É preciso
ressaltar, portanto, que não são apenas os sujeitos que fazem os objetos, mas
são igualmente os objetos que constroem os sujeitos (Olsen, 2003).

Nesse sentido, enfatizamos a visualidade das cédulas como aspecto


central na construção da identidade nacional. Por meio de sua iconografia, o
papel-moeda reproduz cotidianamente imagens da nação que representa. O
enfoque do presente estudo recai, portanto, sobre a produção de imagens
visuais para o papel-moeda brasileiro no período de redemocratização do país.
O recorte temporal escolhido se justifica por três razões concretas e
contingentes: 1) embora o dinheiro nessa época já concorresse com muitas
outras formas de representação visual da nacionalidade, ele continuava sendo
um instrumento que dispunha de espaço privilegiado para a difusão de
identidades políticas; 2) a redemocratização do Brasil marcou um período de
tentativa de reformulação da identidade nacional que, no caso da iconografia do
dinheiro brasileiro, é expressada através da mudança dos temas e personagens
que compõem as estampas. A escolha praticamente exclusiva de nomes do
campo político dá lugar a figuras célebres no domínio das artes, da cultura e das
ciências; 3) devido à hiperinflação que se desenrola ao longo da década de 1980,
há uma alta dinamicidade nos padrões monetários e, por conseguinte, às
cédulas produzidas durante esse período. Este fato aponta para uma iconografia

5
monetária que se transforma mais rapidamente quando comparada ao que
ocorre em tempos de estabilidade política e econômica.

Diante disso, algumas questões gerais e específicas se colocam para a


pesquisa, a saber: Como o dinheiro, através de sua materialidade e
imaterialidade, articula a nacionalidade e contribui para a circulação de símbolos
em diferentes contextos históricos e nacionais? Quem são os agentes de
produção monetária e quais os critérios de inclusão e exclusão de imagens
simbólicas durante a fabricação da cédula? Em que medida e de que forma o
espaço plástico das cédulas pode servir de subsídio à análise de processos
políticos como a redemocratização brasileira e a reformulação da identidade
nacional?

A estrutura da dissertação foi elaborada com vistas a responder às


questões supracitadas. Desse modo, o primeiro capítulo propõe uma revisão
bibliográfica a respeito das formas pelas quais o dinheiro articula a nacionalidade
em diferentes contextos históricos. No segundo capítulo, buscando identificar os
agentes sociais envolvidos na produção monetária, empreende-se uma
investigação sobre as instituições e práticas nas quais os agentes
institucionalizados estão engendrados. O terceiro capítulo, por sua vez,
concentra-se no caso específico de produção visual das cédulas brasileiras no
contexto de redemocratização do país (1986-1993), objetivando avaliar em que
medida a iconografia do papel-moeda articula a identidade nacional.

Alinhado a esses três momentos de discussão da dissertação, o


objetivo geral deste trabalho de mestrado é evidenciar os critérios e as
seletividades na produção de imagens nas cédulas brasileiras do período de
redemocratização do país (1986 –1993). Parte-se da hipótese que esse período
de redemocratização é acompanhado por um processo de reformulação da
identidade nacional brasileira expresso na iconografia das notas. Através da
iconografia do papel-moeda brasileiro é possível visualizar essa tentativa de
construção de uma nova identidade nacional, ao passo que se percebe a
mudança de padrão de representação nas efígies selecionadas para figurarem
nas estampas das cédulas.

6
Em anexo há uma tabela elaborada pelo autor em que se propõe uma
lista de temas das cédulas do Brasil desde 1873, trazendo uma identificação dos
elementos visuais destacados nas estampas. A partir da observação da tabela
em anexo, é possível perceber essa reorientação dos símbolos nas cédulas
brasileiras que ocorre, segundo Amaury Fernandes da Silva Junior, em dois
momentos, isto é, em 1979 e em 1984 quando “há uma nova reformulação
visual” que “determinará um padrão de organização gráfica das cédulas que
perdurará até 1993” (Junior, 2008, p. 228).

O presente trabalho tem como objetivos específicos: 1) Propor


ferramentas para o estudo das relações históricas entre dinheiro, imagem e
nacionalidade; 2) Escrutinar abordagens que possibilitem explorar o dinheiro
considerando os atores e técnicas envolvidos em sua produção; 3) Identificar as
imagens selecionadas para ilustrar as notas brasileiras e explorar os significados
veiculados por sua circulação.

Devido aos diferentes momentos de discussão propostos, a


fundamentação-teórico metodológica possui uma variação claramente definida
entre o segundo e o terceiro capítulo. O segundo capítulo, na medida em que
visa destacar os agentes e práticas que determinam a produção material do
dinheiro, segue uma metodologia mais “materialista” influenciada por estudos de
cultura material (Miller, 1985), antropologia dos objetos (Appadurai, 2008[1986]),
história da geografia e geografia do livro (Mayhew, 2007; Withers; Ogborn, 2008).

No terceiro capítulo, são explorados os critérios de seleção dos símbolos


que compõem as estampas das cédulas brasileiras, bem como os significados
mobilizados na circulação monetária que contribuem para a formação de uma
iconologia específica acerca das brasilidades. Para tanto, utilizamos teorias da
imagem que auxiliarão na interpretação iconológica das estampas das notas,
das quais são importantes para este trabalho os estudos de Erwin Panofsky
(1955), Ernst Gombrich (1984[1960], 2012), Roland Barthes (1964a, 1964b),
W.J. Thomas Mitchell (1994), Rose (2001) e Manghani at al (2006). Todos esses
autores fornecem subsídios teórico-metodológicos para uma hermenêutica
imaterialista da imagem, isto é, uma interpretação textualista da mesma.
Portanto, o segundo capítulo está carregado de uma abordagem materialista do
dinheiro e sua produção visual, enquanto o terceiro capítulo visa a empreender
7
uma análise dos significados dispostos no espaço plástico das cédulas e, por
este motivo, possui uma abordagem mais interpretativa-textualista.

Ao longo da metodologia de análise das cédulas, identificaremos casos


de composição intertextual nas estampas do papel-moeda brasileiro.
Observando os elementos visuais escolhidos para compor as cédulas do período
pós-regime militar, percebemos o uso de imagens de modalidades diferentes –
esculturas, pinturas, fotografias – adaptadas pelo desenho técnico e sigiloso em
papel-moeda. Apresentaremos no capítulo metodológico desta qualificação de
mestrado alguns desses casos de composição intertextual das cédulas,
identificando as imagens visuais originais e discorrendo brevemente sobre
possíveis significados sociais associados a elas.

1. O dinheiro como reflexo, meio e condição da nação

Um dos objetivos desse capítulo é propor uma interrelação entre


algumas abordagens históricas que discutem a formação dos Estados-nação e
a criação de moedas nacionais durante o século XIX na Europa (Cohen, 1998;
Gilbert, Helleiner, 1999; Helleiner, 2003). Embora tenham um recorte espaço-
temporal específico, todos esses autores desenvolvem uma análise comparativa
com contextos históricos mais recentes. Uma vez preocupados com a
construção simbólica e material das nações e da moeda nacional, os autores se
aproximam da noção de “comunidade imaginada” (Anderson, 1983), de modo
que veem no dinheiro e sua representação simbólica uma das fontes do
imaginário nacional.

Outro objetivo desse capítulo apresentar alguns estudos que se


debruçam sobre a iconografia do dinheiro em diferentes contextos históricos e
nacionais. Por serem trabalhos empíricos que visam relacionar a visualidade do
papel-moeda com a construção da nacionalidade, aproximam-se mais
contundentemente do caminho metodológico que pretendemos seguir nesse
projeto de mestrado. Assim, serão apresentados trabalhos de geógrafas (Emily
Gilbert e Helleiner, 1999; e Jan Penrose, 2011), cientistas sociais (Jacques

8
Hymans, 2005), cientistas políticos (Eric Helleiner, 2003), comunicadores sociais
(Josh Lauer, 2008) e biblioteconomistas (Karakaş; Anameriç; Rukancı, 2008).

O terceiro e último objetivo desse capítulo é discutir o papel central que


a moeda nacional exerceu em diferentes contextos sobre a construção de novos
nacionalismos no período pós-Guerra Fria, apresentando os casos de
negociação acerca de uma nova moeda entre Palestina e Israel, de um lado, e
Croácia e Sérvia, de outro. As duas matérias publicadas em 1994 pelo jornal The
New York Times ilustram o papel central que o dinheiro assume na formação da
“comunidade imaginada” de que nos fala Benedict Anderson (2008 [1983]) e,
além disso, demonstram que tanto a moeda nacional quanto o Estado-nação
devem ser entendidos como “tradições inventadas” (Hobsbawm, 1984).

1.1 O dinheiro como reflexo e meio de promoção da nação: construção dos


Estados-nação europeus e dos espaços monetários nacionais no século XIX

Dentre os autores que argumentam que a criação de um dinheiro ou


moeda nacional foi crucial para o processo de consolidação dos Estados-nação
europeus no século XIX, podemos destacar Benjamin Cohen e Eric Helleiner.
Ambos autores defendem a tese de que a construção dos Estados-nação
dependeu, em certa medida, da formação de um espaço monetário nacional e
que este foi garantido através de uma “moeda territorial”.

Analisaremos algumas noções e conceitos de Cohen e Helleiner


extraídos, respectivamente, dos livros The geography of money (1998) e The
making of national money (2003). É importante saber que Helleiner escreve seu
livro baseado na obra de Cohen, além de ser curioso notar que ambos livros
foram publicados em curto intervalo de tempo pela mesma editora: a The Cornell
University Press.

A obra de Benjamin Cohen visa propor um estudo da “geografia do


dinheiro”, definido por “uma nova compreensão da organização espacial das
relações monetárias” (Cohen, 1998, p.3). Segundo Cohen (1998), essa nova
abordagem da geografia monetária está ligada ao conceito de imaginações

9
geográficas, na medida em que a “geografia do dinheiro” constituiria um estudo
das relações monetárias e das representações geográficas embutidas no
processo de circulação do dinheiro.

O argumento central de Cohen (1998) gira em torno daquilo que ele


chama de “mito de uma moeda-uma nação”, isto é, uma representação do
modelo de geografia política exclusivista originado no Tratado de Vestfália
(1648) que teria entrado em decadência nos 1970 com o advento do dólar
inconversível ou o dinheiro “sem pátria”, momento marcado pelo “aumento da
mobilidade geográfica do capital” (Arrighi, 1995, p.1).

Benjamin Cohen (1998) estrutura, assim, sua tese central:

Uma Moeda/Uma Nação deriva de convenções da geografia


política padrão que, desde a Paz de Vestfália no século XVII,
celebrou o Estado-Nação, absolutamente soberano em seu
território, como a unidade básica de governo na política
mundial. Assim que o espaço político foi concebido nos
termos daquelas entidades mutuamente exclusivas e fixas
que chamamos de Estados, logo os espaços monetários
passaram a ser vistos a partir dos territórios separados e
soberanos onde cada moeda se originou. Chamo isso de
modelo vestfaliano de geografia monetária. (Cohen, 1998, p.
4) 3 – Tradução livre do autor.

Na passagem acima, Cohen (1998) afirma que a geografia monetária do


modelo de Vestfália é definida por espaços monetários contidos dentro de
territórios soberanos onde o dinheiro nacional circula. O autor reafirma a
necessidade de se entender o dinheiro para além de suas fronteiras políticas,
destacando a relevância da abordagem no fato de que atualmente há uma
crescente interpenetração entre diferentes moedas e territórios nacionais e, por

3
Citação original: “One Nation/One Money is derived from the conventions of standard political geography which, ever since the
seventeenth-century Peace of Westphalia, has celebrated the nation-state, absolutely sovereign within its own territory, as the basic
unit of governance in world politics. Just as political space was conceived in terms of those fixed and mutually exclusive entities we
call states, so currency spaces came to be visualized in terms of separate sovereign territories where each money originated. I call this
Westphalian model of monetary geography.” (Cohen, 1998, p. 4)

10
isso, seria preciso compreender o dinheiro pelo seu “alcance de uso efetivo e de
autoridade” (Ibid., p. 5).

Segundo Benjamin Cohen (1998), o modelo de geografia monetária


vestfaliano influenciou análises baseadas em termos exclusivamente territoriais,
dando menos atenção aos aspectos ligados à hegemonia tal como conceituada
por Gramsci. Para Arrighi (1995), Gramsci não considera em sua conceituação
de hegemonia social o instrumento que seria o mais característico do poder
capitalista: o controle dos meios de pagamento.

Seguindo o conceito de “moeda territorial” cunhado por Benjamin Cohen


(1998), Eric Helleiner constrói sua argumentação no livro The making of national
money (2003). Esse conceito foi utilizado por Cohen (1998) para sintetizar as
representações geográficas subjacentes à formação da soberania monetária dos
Estados-nação na Europa oitocentista. Todo segundo capítulo da obra The
geography of money de Cohen é dedicado ao assunto.

Desse modo, ao resgatar o conceito de “moeda territorial” de Cohen


(1998), Helleiner (2003) está interessado em investigar o desenvolvimento
histórico do dinheiro territorial paralelamente à consolidação da soberania
territorial dos Estados-nação durante os séculos XIX e XX. Assim, Eric Helleiner
tem como objetivo principal construir marcos teóricos para a consolidação de um
campo que o autor chama de “história das moedas territoriais”.

Helleiner (2003) cita três aspectos que justificariam a importância do


campo: 1) evidenciar que “as transformações monetárias atuais não são tão
novidade quanto parecem” (Helleiner, 2003, p. 2); 2) possibilitar o estudo da
“relação entre espaço política e organização do dinheiro de uma forma muito
mais ampla” (Idem); 3) propiciar “insights úteis dentro de algumas causas
específicas de mudança para os dinheiros territoriais no período atual” (Idem).

Nesse sentido, tanto a abordagem de Cohen (1998) como a de Helleiner


(2003) corroboram a ideia de que o dinheiro nacional é peça-chave no processo
de formação dos Estados-nação entre os séculos XIX e XX e deve ser entendido
como produto e reflexo de um modelo de geografia monetária exclusivista que
tem origem no Tratado de Vestfália (1648) e que estava fundamentado em uma

11
soberania dos Estados nacionais legitimada pelo monopólio sobre a moeda
dentro do território nacional.

Apesar de não constituir o corpus de suas pesquisas, Cohen (1998) e


Helleiner (2003) apontam para a importância central da iconografia monetária
para a legitimação do dinheiro nacional. O primeiro autor recorda que “à medida
que o papel-moeda ganhou popularidade, as notas foram decoradas de diversas
formas com imagens e emblemas nacionalistas” (Cohen, 1998, p. 36).

Nesse sentido, há autores que investigam diretamente as relações da


iconografia monetária com a geopolítica. Na geografia, destaca-se a geógrafa
britânica Jan Penrose, professora do Instituto de Geografia da Universidade de
Edimburgo, na Escócia. Penrose publicou uma série de artigos científicos em
periódicos como Political Geography e Nations and Nationalism a respeito do
tema da iconografia monetária e sua relação com os nacionalismos.

Dentre os trabalhos de Jan Penrose, destacaremos aqui um artigo


intitulado “Designing the nation” (2011), no qual a geógrafa relaciona a
iconografia monetária com o conceito de “nacionalismo banal”, anteriormente
discutido por Michael Billig (1994) em livro de mesmo nome. Para Penrose
(2011), notas e moedas reforçariam um tipo de nacionalismo banal ao
divulgarem de modo corriqueiro imagens do Estado-nação.

Penrose (2011) sintetiza assim o objetivo de seu artigo:

Este trabalho mostra como o dinheiro – e seu uso – está


ligado à reprodução diária de unidades geopolíticas mundiais
como os Estados-Nação e sua cidadania como nações.
Tanto moedas como notas de banco têm sido chamados a
trabalhar discretamente como portadores e transmissores da
iconografia do Estado-Nação no qual são emitidos e o qual
eles, por sua vez, representam e ajudam a construir.
(Penrose, 2011, p. 429)4 – Tradução livre do autor.

4
Citação original: “This work shows how money e and – its use – is bound up with the daily reproduction of the world’s geopolitical
units as nation-states and of their citizenry as nations. Both coins and banknotes have been shown to work unobtrusively as bearers
and transmitters of the iconography of the nation-state in which they are issued and which they, in turn, represent and help to
construct”. (Penrose, 2011, p. 429)

12
Dessa forma, a geógrafa Jan Penrose focaliza seu trabalho na relação da
iconografia monetária com a formação de representações geográficas do
Estado-nação. Seu trabalho está preocupado em ressaltar “a natureza dos
processos de design” das cédulas da Escócia, de modo que em alguns casos o
tipo de design das notas é mais importante para compreender os conteúdos e
temas do que os processos de decisão política sobre a produção da nota.

Para Penrose (2011), portanto, o dinheiro e as imagens visuais que ele


mobiliza evidenciam um processo específico de projetar (design) a nação
através de nacionalismos banais que, por sua vez, garantem a eficácia da
transmissão de ideologias nacionalistas. Segundo Penrose (2011), o dinheiro
tem a capacidade de revelar o contexto político em que circula e, seguindo esse
argumento, podemos dizer o dinheiro é um artefato capaz de revelar paisagens
políticas.

Dentre a pluralidade temática do dinheiro e das moedas, há a recorrência


de símbolos estatais e dos ditos grandes personagens da história. A tabela
elaborada por Jacques E.C. Hymans (abaixo) demonstra as diferentes épocas
na iconografia monetária da Europa.

13
Tabela 1 – Iconografia monetária europeia durante o século XX

Período/Design/Europa Ator

_______________________________________________________________
Estado Sociedade Indivíduo Elementos principais

_______________________________________________________________
Antes de 1920 80% 9% 11% Símbolos estatais e

míticos

1920-1949 53% 36% 11% Sociedade, alegorias,

paisagem

1950-1979 45% 15% 29% Atores do Estado,

Retratos

1980-2000 35% 7% 58% Cientistas, artistas,

personalidades femininas

2000-atual - - - Pós-moderno, tendência

de abandonar retratos

____________________________________________________________________________

Panorama preparado por Hymans sobre os 5 períodos diferentes de design (ou épocas de temas
monetários) das cédulas europeias usadas pelos 15 países integrantes da União Europeia em
2004.

Estado = símbolos estatais (Exemplo: deuses clássicos, atores do Estado, realeza).

Sociedade = representação clássica (Exemplo: figuras alegóricas, cenas pastoris, crianças


jogando basquete).

Indivíduo = atores de relevância histórica sem ligação direta com o Estado (Exemplo: Aristóteles,
Henry Ford, Albert Einstein).

Tabela adaptada de Hymans (2005) apud Heiji (2011, p. ii)

Percebemos na tabela elaborada por Jacques Hymans que a iconografia


monetária europeia passa, dos anos anteriores a 1920 aos dias atuais, de uma
representação muito ligada a símbolos estatais para uma imagística que tende
a despersonalizar a representação do Estado e a “abandonar retratos”, tal como
indica a tabela. Esse estudo de Hymans sobre a classificação temática da

14
iconografia europeia pode servir para abrir frentes de análise sobre outros
contextos nacionais.

O mesmo autor da tabela acima já realizou um estudo sobre a iconografia


monetária a partir de um contexto não europeu, tendo se concentrado sobre as
cédulas do Japão (ver Hymans, 2005). Além dele outros autores focalizaram
suas investigações a respeito da iconografia do papel-moeda sob diversos
contextos nacionais (ver Lauer, 2008 e Karakaş; Anameriç; Rukancı, 2008).

1.2 O dinheiro como condição de legitimação da nação: uma análise de duas


discussões em torno da criação de novas moedas nacionais no período pós-
Guerra Fria

Esta seção visa a discutir o dinheiro como meio e condição para a


consolidação das nações como entidades sociais dotadas de legitimidade
política no plano nacional e internacional. Desse modo, o objetivo do subcapítulo
é relacionar geopolítica, dinheiro e discurso na perspectiva da geopolítica crítica
que surge a partir da década de 1990 (ver Ó’Tuathail; Agnew, 1992). A
“geopolítica crítica” seria um campo preocupado tanto com a influência de
imaginações geopolíticas na construção de políticas de identidade, quanto com
os contextos situados produção do conhecimento geopolítico (Dodds; Atkinson,
2000, p.10-11). Essa perspectiva crítica da geopolítica dá importância ao papel
dos discursos na prática da política internacional e na distribuição de poder
social.

O aparecimento da “geopolítica crítica” no início da década de 1990 foi


impulsionado pelas discussões suscitadas com o fim da Guerra Fria. Ficou claro
após seu que se tratou de um conflito dominado principalmente por discursos e
não por confrontos armados conforme os moldes tradicionais. No entanto, ao
final da Guerra Fria, muitos autores ainda pensavam ser a geopolítica um campo
dominado pela “prática e não discurso” (Ó’Tuathail; Agnew, 1992, p. 191).

15
No entanto, a visão da geopolítica defendida por Ó’Tuathail e Agnew
(1992) concede maior importância a atuação dos discursos na definição de
práticas geopolíticas, pois como afirmam os autores:

É através dos discursos que os líderes agem, através


da mobilização de determinados conhecimentos
geográficos simples que as ações em política externa
são explicadas e através de um raciocínio
geograficamente infundido e “pronto” que as guerras
se tornam significativas.5 (Ó’Tuathail; Agnew, 1992, p.
191) – Tradução livre do autor.

A discussão da geopolítica como prática discursiva desenvolvida por


Ó’Tuathail e Agnew (1992) oferece aportes teóricos importantes para o estudo
da iconografia do dinheiro em diferentes contextos históricos. Em sua tese de
doutorado defendida sob a orientação de John Agnew, Ó’Tuathail (1989)
argumenta pela definição de geografia – que é estendida à geopolítica – como
um “discurso histórico que está sempre intimamente ligado à questões políticas
e ideológicas” (Ó’Tuathail, 1989 apud Ó’Tuathail e Agnew, 1992, p. 192).

Para os autores, a geopolítica crítica que propõem seria “o estudo dos


recursos e regras socioculturais pelas quais as geografias da política
internacional são escritas” (Op.cit., p. 193). Dessa maneira, Agnew e Ó’Tuathail
(1992) propõem um estudo do aparelho de Estado (statecraft) como “um
conjunto de práticas sociais” (Idem). Assim, entendemos que a construção da
iconografia de uma moeda nacional é perpassada por práticas sociais do
conjunto de agentes envolvidos, os quais promovem através da circulação
monetária determinadas ideologias nacionalistas e revelam “paisagens políticas”
que caracterizam o período de circulação (Penrose, 2011).

Utilizando a fundamentação teórica da “geopolítica crítica”,


apresentaremos duas matérias publicadas em 1994 pelo The New York Times,
onde são expostas discussões em torno do processo de independência da
Croácia e da Palestina e da criação de suas respectivas moedas nacionais, de

5
Citação original: “It is through discourse that leaders act, through the mobilization of certain simple
geographical understandings that foreign-policy actions are explained and through ready-made
geographically-infused reasoning that wars are rendered meaninful.” (Ó’Tuathail; Agnew, 1992, p. 191)

16
modo que a primeira veio a se tornar um país independente enquanto a segunda
ainda busca conquistar o status de Estado-nação.

Ao apresentar e discutir essas duas reportagens do The New York Times,


objetivamos ressaltar a centralidade que o dinheiro assume no processo de
independência de um país, ou seja, na invenção de um Estado-nação ou na
formação na “comunidade imaginada” (Anderson, 2008 [1983]). Além disso, a
ideia desse subcapítulo é demonstrar a ligação entre circulação do signo
monetário e discurso nacionalista.

A matéria do The New York Times sobre as discussões entre Israel e


Palestina acerca da independência e da criação de uma nova moeda para a
última foi publicada em 30 de abril de 1994, tendo sido assinada pela jornalista
Marlise Simons. Através da leitura da reportagem, fica evidente as explicações
de ordem econômica usadas por Israel para dissuadir a Palestina de criar uma
nova moeda e, consequentemente, de se tornar uma nação soberana.

Enquanto que a outra matéria do mesmo jornal versa sobre a renomeação


da moeda croata, a qual passaria a se chamar “kuna” e deixaria a denominação
“dinar” vigente durante a Guerra Fria quando a Croácia pertencia à extinta
Iugoslávia. O título da reportagem publicada em 28 de maio de 1994 poderia ser
traduzido por “Nome da moeda croata protestado” (Croatia Currency’s Name
Protested). Rapidamente percebemos que há um problema com o novo nome
proposto para a moeda croata e, ao ler a matéria, fica claro que os protestos
ocorrem devido à menção ao regime fascista do Governo Ustache de Ante
Pavelic (1941-1945). Os protestos contra o retorno ao nome da antiga moeda
croata (kuna) são capitaneados pelos judeus e sérvios, povos que foram
largamente vítimas de massacres do governo nazifascista de Ante Pavelic
durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

O estudo dessas duas discussões estarão presentes no texto final da


dissertação de mestrado, de modo que para a qualificação apresentamos
apenas um breve panorama das ideias mobilizadas por esses processos
políticos de independência e criação de novas moedas nacionais. A partir dos
aportes teóricos trazidos pela “geopolítica crítica”, poderemos analisar com mais

17
consistência os discursos e práticas geopolíticas que permearam esses
processos políticos em dois contextos diferentes.

2. Fundamentação teórico-metodológica

A fundamentação teórico-metodológica do presente trabalho engloba


duas abordagens da iconografia do dinheiro, uma que pode ser dita mais
“materialista” e outra que pode ser definida como “interpretativa-textualista”. Com
a primeira abordagem, pretendo analisar os agentes e práticas envolvidas na
produção do dinheiro. Enquanto que, com a segunda abordagem, intento realizar
um estudo da mobilização de significados sociais que ocorre no momento do
concepção e da circulação das cédulas. Na primeira seção, vou começar
identificando as relações travadas pela geografia e por outras disciplinas com as
imagens visuais. Ainda na primeira seção, identificarei algumas teorias
propostas por geógrafos que se fundamentam em estudos de cultura material
para propor uma “hermenêutica materialista” da paisagem e dos objetos. Na
segunda seção, apresento a “abordagem interpretativa-textualista” em geografia
aplicada ao estudo das imagens visuais proposta por Gillian Rose (2001). Ainda
na segunda seção, apresentarei os casos de intertextualidade entre imagens
visuais de diferentes modalidades – esculturas, pinturas e fotografias – usadas
como base para a confecção das estampas das cédulas.

2.1. Geografia, imagem visual e cultura material: entre história disciplinar e


metodologias “rematerialistas”

Tornou-se praticamente trivial afirmar que o mundo ocidental


contemporâneo é marcado por uma crescente centralidade das imagens visuais
e que, por este motivo, vivemos uma “civilização da imagem” (Barthes, 1960).
Desde o século XIX, com a invenção da fotografia e do cinema, a reprodução de
imagens vem crescendo rapidamente e ocupando cada vez mais espaço no
cotidiano das sociedades ocidentais.
18
Essa importância crescente das imagens na vida social motivou, no início
do século XX, o aparecimento de teorias interpretativas de objetos visuais tais
como aquelas cunhadas pelo historiador da arte alemão Aby Warburg e pelo
semiótico estadunidense Charles Sanders Peirce. Ainda na primeira metade do
século XX filósofos, sociólogos e historiadores da arte vão se interessar pelas
questões de autenticidade das obras de arte levantadas pelas imagens técnicas,
sobretudo pela fotografia e pelo cinema (ver Benjamin, 1955 [1936]).

Na segunda metade do século XX, o debate sobre as imagens ganha


espaço em disciplinas como a história e a antropologia. Na história, até pelo
menos a década de 1980, as fontes não-escritas – como a imagem fotográfica
por exemplo – enfrentam a resistência dos historiadores em considerá-la um
documento histórico. Na antropologia, a imagem passa a ser analisada como
meio de construção de alteridade e identidade social. Em ambos domínios do
saber, a imagem visual operou uma mudança de paradigma e deu origem a
novos subcampos interessados na relação sociedade-imagem como, por
exemplo, a antropologia visual.

É interessante notar que, no caso da geografia, a incorporação de imagens


na prática científica ocorre de forma acrítica desde a institucionalização da
disciplina no século XIX. Paradoxalmente, a geografia foi uma disciplina que
desde a Antiguidade grega utilizou um tipo de imagem específica para visualizar
e interpretar fenômenos espaciais: o mapa. Na primeira metade do século XIX,
logo que a fotografia foi inventada a partir da técnica do daguerreótipo, Humboldt
teria se interessado em financiar as pesquisas de Daguerre e teria comprado
alguns daguerreótipos acreditando que estes pudessem ser grandes aliados na
pesquisa de campo (Novaes, 2011). Além de Humboldt – que não se reconhecia
como geógrafo – a própria Royal Geographical Society inglesa usou largamente
a fotografia em expedições de exploração durante o século XIX (Lutz; Collins,
1993).

A partir da década de 1980, com a renovação da geografia cultural


anglo-saxã, novas abordagens têm surgido no intuito de aproximar os geógrafos
de teorias interpretativas da imagem, cuja origem está tanto na história da arte,
como é o caso da iconologia (Cosgrove; Daniels, 1987), quanto na linguística,
como é o caso da semiologia (Duncan, 1990). Desde então, temos visto um
19
crescimento bastante tímido no Brasil de pesquisas em geografia que se utilizam
dos métodos iconológico e semiológico para analisar os significados culturais
das paisagens.

Embora utilizem métodos diferentes, as abordagens das representações


visuais da paisagem que aparecem nos anos 80 na geografia cultural anglo-saxã
são marcadas por operações metodológicas similares fundamentadas na noção
de paisagem como um “objeto” a ser decifrado, como um texto a ser lido. Dessa
forma, podemos dizer que as obras de Cosgrove e Daniels (1987), Peter Jackson
(1989) e James Duncan (1990) possuem uma forte tendência interpretativa-
textualista, na medida em que estes autores propõem uma hermenêutica
imaterial da paisagem que visa investigar os significados simbólicos desta a
partir de seus marcos materiais e representações visuais.

Uma outra renovação na geografia cultural tem início com a virada do


milênio, trazendo à tona críticas às abordagens interpretativas-textualistas de
análise da paisagem. De modo geral, os críticos dessas abordagens
argumentam que há nelas um apelo excessivo ao caráter representacional da
paisagem. Para autores como Peter Jackson (2000), Chris Philo (2000) e Loretta
Lees (2002) esse apelo ao representacional teria levado os geógrafos a construir
análises excessivamente preocupadas com os simbolismos e jogos de poder
envolvidos na atribuição de valor à paisagem, todavia, menos interessadas com
as questões de ordem material que servem à mobilização e difusão de conteúdos
paisagísticos.

Nesse sentido, apesar da sobreposição atual dessas duas tendências de


análise hermenêutica da paisagem na geografia brasileira, isto é, a tendência
interpretativa-textualista e a tendência materialista há ainda uma influência
marcante da primeira abordagem, notada pelo uso recorrente de autores como
Denis Cosgrove e James Duncan.

Diante do exposto, afirmamos que nesse trabalho fizemos uso das duas
tendências em momentos distintos visando ressaltar aspectos da produção do
dinheiro brasileiro (tendência de rematerialização) e aspectos de conteúdo da
iconografia das estampas (tendência interpretativa-textualista). No entanto, é
preciso esclarecer que essas abordagens são direcionadas à interpretação

20
direta da paisagem e, no caso deste trabalho, analisamos a representação da
paisagem através de imagens de estampas de papel-moeda que mediaram e
associaram simbolismos a determinadas paisagens do Brasil. Mas, de toda
forma, as duas tendências nos ajudam a interpretar a paisagem ressaltando ora
os aspectos de produção da imagem que interferem na sua mediação ora as
questões de ordem simbólica subjacentes à sua representação.

Essa tendência de rematerialização na geografia britânica que começa a


tomar corpo no início dos anos 2000 motivou, além de análises rematerialistas
sobre a paisagem, estudos envolvendo a história da disciplina (Mayhew, 2007)
e a chamada geografia do livro (Withers; Ogborn, 2010). Esses dois trabalhos,
bem como outros que seguem essa tendência teórico-metodológica, têm como
inspiração os estudos sobre cultura material que emergem na década de 1980,
dos quais o antropólogo David Miller é um expoente reconhecido por suas obras
Artefacts as Categories: A Study of Ceramic Variability in Central India (1985) e
Material Culture and Mass Consumption (1989).

Dentre os geógrafos britânicos que se engajam no que se pode chamar


de tendência de rematerialização, Robert Mayhew aparece como um autor que
contribui de maneira importante para o desenvolvimento das discussões em
torno do assunto. Mayhew afirma que o objetivo principal de seu ensaio é
“relacionar geografia, textualidade e espaço de uma maneira diferente e mais
histórica”6 (Mayhew, 2007, p. 467). Para demonstrar o papel do que ele chama
de “hermenêutica materialista” sobre as narrativas construídas na história do
pensamento geográfico, o autor se concentra no “formato impresso dos livros da
geografia britânica na era 1500-1900” (Mayhew, 2007, p. 466).

O ensaio de Mayhew mostra que nesse período conhecido como “era das
descobertas”, isto é, no período entre o século XVI e XIX o conhecimento
geográfico e sua difusão estiveram muito atrelados às gramáticas da disciplina.
Estas, por sua vez, seguiam um modelo de “paratextos” através dos quais era
possível adicionar sempre que necessário uma nova nota. Esse espaço em
branco deixado nas gramáticas de geografia durante os séculos XVI e XIX

6
“I wish to tie geography, textuality and space together in a rather different and more historical way”.
(Mayhew, 2007, p. 467)

21
expressa a própria construção do conhecimento geográfico nessa época, a qual
era perpassada pela ideia de que ainda havia espaços “vazios” ou
desconhecidos no mundo. Por este motivo então deixar os espaços para os
paratextos nas gramáticas, pois esses espaços textuais simbolizavam um
conhecimento geográfico do mundo inconcluso.

Uma mudança metodológica na análise da história da geografia é,


portanto, proposta por essa perspectiva rematerialista. Pois, sem desconsiderar
as diferentes correntes de pensamento que contribuem para a construção do
conhecimento geográfico, os geógrafos engajados com a tendência de
rematerialização ressaltam a centralidade do papel e de seus produtos
impressos (mais especificamente os livros de geografia) na difusão de um
conhecimento do mundo que se estrutura a partir de espaços textuais, que
Mayhew (2007) encara como o próprio “espaço da página impressa”.

Antecipando algumas preocupações da perspectiva teórica que Mayhew


(2007) vai denominar alguns anos depois de “hermenêutica materialista”, isto é,
aquela que considera questões de textualidade e espacialidade na construção
de formas de difusão do conhecimento, Didier Mendibil (1999) desenvolve artigo
sobre o uso de imagens em alguns livros escritos por geógrafos franceses que
em sua maioria são considerados clássicos. Mendibil (1999) destaca o papel
pedagógico que as imagens desempenharam na difusão de conhecimentos
geográficos específicos, tanto em livros mais generalistas de grande circulação
como livros didáticos.

Um outro trabalho em geografia que contribuiu para ampliar o debate


sobre as abordagens “rematerialistas” é, sem dúvida, o livro organizado por
Charles Withers e Miles Ogborn intitulado Geography of the book (2010). A obra
conta com dez capítulos, cada um assinado por um geógrafo diferente que se
encarrega de discorrer sobre temáticas ligadas à geografia da produção,
circulação ou recepção do livro. Essa divisão que Withers e Ogborn (2010)
propõem expressa a metodologia que defendem, isto é, de que os livros ou até
mesmo outros objetos impressos devem ser analisados tendo em conta sua
natureza material (produção e circulação) e sua leitura ou uso social (recepção).

22
Este trabalho tem a intenção de ressaltar os aspectos ligados à produção
gráfica do papel-moeda brasileiro no período de redemocratização, buscando
apontar as imaginações geográficas que podem ter guiado as escolhas de
imagens para as estampas. Não são investigados, portanto, os contextos de
circulação e recepção do dinheiro porque exigem uma análise densa que
demanda uma pesquisa precisa de fontes históricas e, na maior parte dos casos
envolvendo o dinheiro brasileiro, estas são escassas ou inexistentes.

Além da fundamentação teórico-metodológica perspectivas do


movimento de rematerialização da geografia britânica, utilizamos na análise da
“imagem por ela mesma” (Rose, 2001) aportes teóricos surgidos na renovação
da geografia cultural a partir do fim da década de 1980 que possuem uma
marcante tendência interpretativa-textualista, que está mais preocupada com
questões de “significado, identidade, representação e ideologia” (Jackson, 2000,
p. 9). Em outras palavras, ao analisar as imagens das estampas do dinheiro
brasileiro objetivamos, em primeiro lugar, saber como se dá a representação dos
símbolos, personagens, paisagens e tipos étnicos-regionais do Brasil e, além
disso, de que maneira esse modo de representar que é o dinheiro constrói uma
determinada ideologia ou identidade nacional.

Nesse sentido, a presente pesquisa possui uma fundamentação teórico-


metodológica mista que congrega uma abordagem mais materialista e outra
mais interpretativa-textualista. A partir dessas perspectivas teóricas é possível
vislumbrar alguns caminhos que viabilizem a proposição de um método de
análise das estampas de papel-moeda. Essas duas abordagens são importantes
para definir em que medida a materialidade e a imaterialidade do dinheiro atuam
na construção de representações simbólicas da nacionalidade brasileira durante
o recorte temporal escolhido.

23
2.2. Geografia, metodologias visuais e abordagem “interpretativa-textualista”

Para efetuar uma análise das imagens visuais mobilizadas pelo signo
monetário é preciso recorrer a teorias da imagem que nos possibilitem ressaltar
os significados atribuídos aos símbolos dispostos no espaço plástico das
cédulas. Para tanto, utilizamos alguns métodos de análise imagética descritos
pela geógrafa britânica Gillian Rose no livro Visual Methodologies (2001). Ao
longo dos capítulos que compõem seu livro, Rose descrimina diferentes vias de
análise dos objetos visuais, de modo que resume em um esquema as
possibilidades metodológicas que apresenta em sua obra, tal como vemos na
figura abaixo.

Fonte: Esquema adaptado por Seemann (2009, p. 48) a partir de Rose (2001, p. 67)

De acordo com o esquema elaborado por Rose (2001), percebe-se que


há três caminhos metodológicos gerais de análise de imagens visuais que se
encontram fora do círculo maior, a saber, o lugar de produção da imagem, o lugar
da imagem por ela mesma e o lugar audiência. Conforme olhamos para dentro
do esquema, percebemos que há mais três camadas de análise dos objetos

24
visuais, isto é, a modalidade social, a composicional e a tecnológica. Esses dois
conjuntos de vias de análise podem ser conciliadas de acordo com o objetivo de
cada pesquisador.

Dessa forma, a presente pesquisa busca, em primeiro lugar, analisar o


lugar de produção da cédulas brasileiras a partir da modalidade social, na
medida em que um dos objetivos específicos é identificar os critérios de seleção
utilizados pelos agentes de produção monetária para compor os ícones das
estampas.

Por outro lado, os demais objetivos da pesquisa conduzem a análise para


o que Rose (2001) chama de “lugar da imagem por ela mesma”. Neste caso,
temos a intenção de investigar primeiro, a modalidade composicional e, assim,
desenvolver uma interpretação composicional a partir dos símbolos destacados
no espaço plástico das cédulas. Essa análise composicional visa destacar em
algumas cédulas uma composição intertextual, isto é, indicar outros tipos de
imagem visual – como fotografias e pinturas – que foram utilizadas como
modelos para a confecção do design (desenho) das estampas. Em segundo
lugar, visamos estudar a imagem “por ela mesma” a partir da modalidade social,
que pode viabilizar a compreensão de determinados significados visuais.

Além de uma metodologia que ajude a definir e destacar a natureza


material e imaterial do dinheiro e uma metodologia visual que auxilie na
interpretação das estampas das cédulas, é preciso, todavia, de uma metodologia
que dê conta da análise das entrevistas que serão realizadas com os informantes
Amaury Fernandes da Silva Junior e Dalila Cerqueira. Amaury atualmente é
professor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(ECO-UFRJ) e trabalhou no setor de projetos da Casa da Moeda do Brasil
durante a década de 1980 e início de 1990. Já Dalila Cerqueira é hoje professora
de desenho da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(EBA-UFRJ) e na década de 1980 trabalhou como gravadora na Casa da Moeda
do Brasil.

Ao entrevistar os ex-funcionários da Casa da Moeda do Brasil, objetivamos


nos aproximar do contexto de produção específico entre a década de 1980 e o
início da de 1990. A partir da análise das entrevistas, poderemos talvez identificar

25
algumas “geografias imaginadas” que nortearam a produção iconográfica do
papel-moeda brasileiro no período de redemocratização. No entanto, como ainda
não fizemos as entrevistas com os informantes, apenas um primeiro
reconhecimento, iremos apresentar algumas cédulas que serão analisadas na
pesquisa, desenvolvendo alguns comentários acerca da composição e de alguns
significados possíveis de serem associados aos ícones dispostos nas estampas.
As demais cédulas que compõem o conjunto de cédulas analisadas podem ser
consultadas no anexo 2.

A primeira cédula apresentada é a de 100 mil cruzeiros, emitida pelo


Banco Central do Brasil e fabricada pela Casa da Moeda do Brasil em 1986. A
cédula traz em seu anverso (frente) a efígie de Juscelino Kubitschek em primeiro
plano. Ao fundo percebemos um desenho que possui em primeiro plano uma
estação de energia elétrica e em segundo plano um espaço desocupado que se
assemelha à paisagem do Cerrado brasileiro, mais especificamente do Planalto
Central. A composição desse jogo de planos do desenho central do anverso da
cédula, podemos ter a impressão de que ele simboliza o processo de ocupação
do planalto central brasileiro, que vai avançando cada vez mais para o centro do
país levando a modernidade que aqui está sendo representada pela energia
elétrica.

Como lembra a historiadora Monica Kornis, o plano de fundo da cédula


de Cr$ 100.000,00 representa as principais características da política econômica
de Juscelino Kubitschek, isto é, “a abertura de estradas, o desenvolvimento
agrícola, o impulso à industrialização e o incremento da energia elétrica” (Kornis,
2003, p. 63).

26
Ainda no anverso (acima) da cédula de Cr$ 100.000,00, podemos ver à
esquerda da efígie de Juscelino Kubitschek a estátua “Dois guerreiros” de autoria
de Bruno Giorgi, popularmente conhecida como “Os candangos”, em menção
aos trabalhadores imigrantes que participaram da construção da nova capital
brasileira. O monumento em bronze de Giorgi mede oito metros e está localizado
na Praça dos Três Poderes, sendo reconhecido como um dos símbolos da
cidade de Brasília.

Escultura “Candangos” (1960) de Bruno


Giorgi

Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra15156/candangos. Acesso em: 04 de


Junho de 2019.

27
No reverso da cédula de Cr$ 100.000,00 (acima), podemos observar
novamente o processo de ocupação e transformação da paisagem do planalto
central. O desenho tem dois planos bem definidos, isto é, na esquerda vemos
como era a paisagem hoje ocupada por Brasília, enquanto na direita observamos
a paisagem atual da capital brasileira com o Palácio do Planalto, construído para
ser a residência presidencial.

Desse modo, concordamos com Monica Kornis quando afirma que,

A síntese operada por esta cédula – desenvolvimento


econômico, e democracia política, emoldurados pela
ousadia arquitetônica da capital da República –
exprime um projeto de nação que retoma o passado
num projeto para o presente e para o futuro, através da
figura de um personagem – Juscelino Kubitschek –
transformado em herói [...]. (Kornis, 2003, p. 64)

Como já discutiram Kornis (2003) e Junior (2008) em seus respectivos


trabalhos, esta cédula de Cr$ 100.000,00 emitida em 1986 constitui um divisor
de águas na iconografia do dinheiro brasileiro, de modo que é a partir de sua
emissão que um novo padrão visual é inaugurado. Como lembra a historiadora
Monica Kornis, a iconografia do papel-moeda brasileiro até 1986 “se restringiu
às personalidades clássicas da história nacional, definidas pelos marcos da
historiografia oficial [...]”, embora haja exceções em dois momentos da história
brasileira em que o dinheiro é utilizado como instrumento de “auto-consagração”,

28
isto é, com Getúlio Vargas durante o Estado Novo (1937-1945) e com o “ex-
presidente Castelo Branco, homenageado ainda durante a vigência do regime
militar” (Kornis, 2003, p. 64).

Através de uma análise semiológica e do discurso, é possível destacar


diferentes significados visuais possíveis de serem atribuídos às imagens
dispostas no espaço plástico do papel-moeda. A identificação dos significados
visuais potenciais da cédula, encaminha o estudo para uma análise do “lugar da
imagem” (Rose, 2001). Por outro lado, a análise dos discursos subjacentes ao
papel-moeda demanda um estudo mais cuidadoso sobre o contexto, os agentes
e as práticas envolvidas na produção da nota, tal como indica o esquema
adaptado de Rose (2001) anteriormente apresentado.

Ao observar as cores da cédula de Cr$ 500.000,00 (acima), percebemos


que há a predominância de cores nos tons azul e amarelo. Como lembra Amaury
Fernandes, “essa coloração é escolhida por remeter à bandeira nacional, mas
irá se repetir de forma regular ao longo do período, especialmente nos trabalhos
concebidos por Álvaro Martins” (Junior, p. 197). Aqui a análise se volta para
questões ligadas à concepção e produção da nota e à escolha da sua
composição, o que nos aproxima de uma abordagem “materialista” da
iconografia do papel-moeda.

A cédula abaixo é a de Cz$ 500,00, emitida em 1986 pelo Banco Central


e produzida pela Casa da Moeda. Em seu anverso (frente), podemos ver a efígie
de Villa-Lobos em primeiro plano e no segundo plano se nota um desenho de
vitórias-régia, planta típica da região amazônica. A associação de Villa-Lobos
com uma planta característica da fauna amazônica pode ser entendida como
uma alusão aos regionalismos presentes em muitas obras musicais produzidas
pelo maestro brasileiro.

29
Em termos semiológicos, ao relacionar tanto a imagem (significante)
quanto o conceito de vitória-régia (significado) – na condição de planta
predominante do bioma amazônico – à figura de Villa-Lobos, a iconografia da
cédula em questão permite o acesso ao chamado “sistema semiológico de
segunda ordem” (Barthes, 1957; 1964a), isto é, o nível da conotação ou da
construção da significação.

No reverso da cédula podemos observar, em primeiro plano, Villa-Lobos


exercendo seu trabalho de regência e, ao fundo, um desenho representando
uma floresta tropical. Essa imagem ao fundo foi projetada com base na obra “A
Mantiqueira” do pintor alemão Johann Moritz Rugendas (1802-1858). Dessa

30
forma, assim como a primeira cédula apresentada, esta também possui em sua
composição um caso de “intertextualidade” entre modalidades diferentes de
imagem, devido à adaptação de uma pintura por meio do desenho técnico em
papel-moeda.

Além desse, outros casos de intertextualidade podem ser identificados nas


cédulas dessa época, revelando o trabalho de pesquisa iconográfica realizado
pelos funcionários da Casa da Moeda do Brasil durante o período, tal como
informou o professor Amaury Fernandes em entrevista concedida ao autor em
junho de 2019.

“A Mantiqueira” de Johann Moritz Rugendas (Oléo sobre tela)


Disponível em: http://poeticatecnologica.blogspot.com/2012/09/imagens-da-escravidao.html
(Acesso em 18/02/2019)

A cédula abaixo é a de Cz$ 1.000,00 emitida em 1987. No anverso


observamos a efígie de Machado de Assis, com o detalhe ao seu lado direito da
marca de segurança que traz o símbolo do brasão imperial, demonstrando a
afeição explícita que o escritor tinha com o regime monárquico. Do lado esquerdo

31
do célebre escritor brasileiro, notamos o emblema da Academia Brasileira de
Letras, corroborando sua relação intrínseca com a instituição que ajudou a
fundar.

No reverso da cédula notamos uma vista da Rua Primeiro de Março,


localizada no centro da cidade do Rio de Janeiro. Esse desenho também revela
um caso de intertextualidade, haja vista que o desenho foi projetado baseado
em uma fotografia datada de 1915 de autoria de Augusto Malta (1864-1957).

32
Fotografia de Augusto Malta tirada em 1915, com destaque para a Rua 1º de Março – Rio
de Janeiro
Fonte: http://brasilianafotografica.bn.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/2778 (Acesso em:
15/02/2019)

A cédula abaixo foi emitida em 1988 e traz em primeiro plano uma imagem
do pintor brasileiro Cândido Portinari (1903-1962). Em seu lado esquerdo, pode-
se notar um trecho de seu painel “Tiradentes”, produzida entre 1948 e 1949. É
importante notar que “os fundos são trabalhados com motivos de alguns azulejos
de Portinari” (Junior, 2008, p. 202). Além disso, na extremidade direita inferior
podemos observar um pote de pincéis e “na extremidade esquerda se vê uma
mancha irregular azul, ali colocada a guisa de pincelada livre” (Idem).

33
Painel de Cândido Portinari “Tiradentes” (1948-1949)
Fonte: https://gianzinho-culturabrasil.blogspot.com/2016/05/candido-portinari-pittura.html
(Acesso em: 20/04/2019)

Detalhe do trecho direito do painel “Tiradentes” de Portinari, parte da composição da


cédula de 5 mil cruzados emitida em 1988
Disponível em: http://obviousmag.org/pintores-brasileiros/candido_portinari/os-paineis-de-
candido-portinari.html (Acesso em: 20/04/2019)

No reverso da mesma cédula podemos ver Portinari ao centro pintando


baianas e, à sua direita, notamos elementos do painel “Paz” que foi
confeccionado entre 1952 e 1956 juntamente com outro painel chamado

34
“Guerra”, sendo ambos mais conhecidos de maneira conjunta sob o título de
“Guerra e Paz”.

Painel “Guerra e Paz” de Cândido Portinari produzido entre 1952 e 1956


Disponível em: https://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/bruno-astuto/noticia/2015/09/apos-4-
anos-paineis-de-portinari-voltam-sede-da-onu.html (Acesso em: 29/01/2019)

35
A cédula abaixo de Cr$ 200,00 foi emitida em 1989 e seu anverso (abaixo)
traz em primeiro plano a efígie da república brasileira e, ao fundo, vemos os
republicanos Silva Jardim, Benjamin Constant, Marechal Deodoro da Fonseca e
Quintino Bocaiúva. Como lembra Amaury Fernandes Junior (2008, p. 210), a
cédula representa um marco comemorativo ao Centenário de Proclamação da
República.

Observando a cédula e fazendo uma simples análise da “imagem por ela


mesma” (Rose, 2001), podemos confirmar o argumento de Kornis (2002) sobre
o movimento de retorno a personagens do passado para projetar “a nova
república” democrática no presente e para o futuro. A figura dos primeiros
republicanos torna evidente a intenção do Estado e de seus agentes monetários
em reformular a identidade nacional brasileira no período pós-regime militar.
Notamos também no anverso da cédula a efígie da República do Brasil que, a
partir do Plano Real (1994), passará a compor sistematicamente todas as
cédulas nacionais.

36
No reverso da mesma cédula de Cr$ 200,00 notamos ao centro a
reprodução do quadro “A pátria” produzido em 1919 por Pedro Bruno. A menção
a Bruno e sua obra pode ser vista na parte superior do lado esquerdo do reverso,
de modo que nem todas as cédulas do período entre 1986 e 1993 traziam por
escrito as figuras e efígies das estampas.

Quadro “A Pátria” de Pedro Bruno (1919)

Disponível em: https://www.pinturasdoauwe.com.br/2014/08/a-patria-pedro-bruno.html (Acesso


em: 14/01/2019)

Em relação à produção da cédula de Cr$ 200,00 apresentada acima, é


importante ressaltar o contexto de transformação nas práticas institucionais da
Casa da Moeda do Brasil em que ela é fabricada. Conforme conta Amaury
Fernandes, a partir de 1989 a Casa da Moeda “passa a enviar equipes ao Centro
de Treinamento De la Rue – Giori – Koebau, na Suíça”, onde os projetistas
brasileiros de papel-moeda desenvolvem em conjunto com os suíços
“equipamentos mais modernos, fundos de segurança e outros elementos
gráficos para as cédulas” (Junior, 2008, p. 210).

37
3. Cronograma

AGO SET OUT NOV DEZ JAN FEV


ATIVIDADE 2020
2019 2019 2019 2019 2019 2020

Encontros
com o
orientador

Entrevistas
com os
informantes
da Casa da
Moeda
(Amaury
Fernandes
da Silva
Junior e
Dalila
Cerqueira)

Transcrição e
análise das
entrevistas

Leituras e
elaboração
de resumos

Revisão
bibliográfica
complementa
r

38
Coleta de
dados
complementa
res

Redação da
dissertação

Revisão e
entrega
oficial do
trabalho

Apresentaçã
o do trabalho
em banca

39
Bibliografia

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43
ANEXO 1

Tabela – Iconografia das cédulas do Brasil desde 1875*

Ano de Valor da Instituição Instituição Elementos


emiss cédula e de emissão de visuais em
ão padrão produção destaque
monetário
1873 50 mil réis Império do American Ao centro da
Brasil Bank Note nota, uma figura
Company alegórica, à
esquerda uma
imagem de D.
Pedro II jovem e
à direita o
brasão imperial.
1875 200 mil réis Banco do American Figuras
Brazil Bank Note alegóricas e
Company representações
da natureza
tropical
1877 200 mil réis Império do American Ao centro da
Brasil Bank Note cédula, a efígie
Company de D. Pedro II, à
esquerda um
coqueiro e à
direita o brasão
imperial.
1881 5 mil réis Império do American Efígie de D.
Brazil Bank Note Pedro II ao
Company centro e em
ambos os lados
figuras de
campesinos, na
esquerda uma
mulher que se
apoia num ramo
de palha e na
direita um
homem que

44
segura próximo
a ovelhas uma
bandeira com o
brasão imperial
1883 500 mil réis Império do American Ao centro da
Brazil Bank Note nota, a efígie de
Company D. Pedro II, à
esquerda o
brasão imperial
e à direita uma
figura alegórica
com caravelas
ao fundo
1885 2 mil réis Império do American À esquerda da
Brazil Bank Note cédula, a efígie
Company de D. Pedro II e
à direita o
brasão imperial.
1888 Mil réis Império do American À direita da nota,
Brazil Bank Note a efígie de D.
Company Pedro II e, à
esquerda, a
residência
imperial em
Petrópolis.
1888 2 mil réis Império do American À esquerda da
Brazil Bank Note nota a efígie de
Company D. Pedro II e à
direita uma
imagem da atual
Praça XV de
Novembro
(então Largo do
Paço Imperial)
1889 20 mil réis Banco do American Figuras
Brazil Bank Note alegóricas
Company
1889 100 mil réis República dos American À esquerda da
Estados Bank Note nota vista da
Company Igreja Nossa

45
Unidos do Senhora do
Brazil Carmo e da Rua
1º de março. À
direita navios a
vapor.
1890 Mil réis República dos American À esquerda da
Estados Bank Note nota, a antiga
Unidos do Company residência
Brazil imperial de
Petróplis e à
direita uma
figura alegórica
de uma criança
sobre uma
baleia
1890 2 mil réis República dos American À esquerda uma
Estados Bank Note figura alegórica
Unidos do Company segurando em
Brazil uma das mãos
uma espada e
na outra uma
bandeira. À
direita uma
imagem da
Praça XV de
Novembro,
semelhante
àquela usada na
cédula de 2 mil
réis emitida em
1888 pelo
Império.
1890 30 mil réis Banco dos American À esquerda uma
Estados Bank Note figura alegórica
Unidos do Company e uma caravela
Brazil e, à direta, outra
figura alegórica
1890 50 mil reís Banco dos American Duas figuras
Estados Bank Note alegóricas
Company femininas em

46
Unidos do ambos os
Brazil extremos das
cédula
1890 500 mil réis Banco dos American Alegoria da
Estados Bank Note justiça ao centro,
Unidos do Company caravela à
Brazil esquerda e outra
figura alegórica
à direita.
1891 10 mil réis Banco do American Vista do Morro
Crédito Bank Note Dois Irmãos a
Popular do Company partir do Jardim
Brazil Botânico
1891 500 mil réis Banco do American Figura alegórica
Crédito Bank Note de costas para
Popular do Company um globo
Brazil terrestre e com
uma pena na
mão
1891 20 mil réis Banco do American Mulata em uma
Crédito Bank Note conoa ao centro
Popular do Company
Brasil
1891 50 mil réis Banco do American Figura alegórica
Crédito Bank Note à direta
Popular do Company segurando um
Brasil ramo de trigo e à
esquerda um
saco, um balde e
uma pá
centralizados e
uma árvore e um
morro ao fundo
1891 200 mil réis Banco do American Ao centro da
Crédito Bank Note cédula, cena
Popular do Company uma
Brasil peregrinação
dos campesinos
e ao fundo uma
locomotiva. À

47
esquerda da
cédula, uma
figura alegórica
que suspende
com a mão
direita uma luz.
1891 100 mil réis Banco Emissor American Figura alegórica
do Norte Bank Note à direita da
Company cédula e, ao
centro, o brasão
da república
brasileira.
1891 100 mil réis Banco dos American À esquerda da
Estados Bank Note nota, uma figura
Unidos do Company alegórica divide
Brazil a cena com
plano de fundo
de um globo
escrito “Ordem e
progresso”, tal
como se vê na
bandeira do
Brasil. À direita,
observa-se uma
figura alegórica
que se apoia no
brasão da
república
brasileira.
1892 10 mil réis Banco da American Figura alegórica
Bahia Bank Note ao centro da
Company cédula escorada
em um barril que
possui uma faixa
escrita
“Liberdade” e,
através da
alegoria, pode-
se ver bandeiras
e canhões.

48
1892 50 mil réis Banco Emissor American Figura alegórica
da Bahia Bank Note segurando uma
Company bandeira e
sentada sobre
um leão
1907 5 mil réis República dos American Figura alegórica
Estados Bank Note feminina à
Unidos do Company esquerda da
Brazil cédula
1912 5 mil réis República dos American Efígie do Barão
Estados Bank Note do Rio Branco
Unidos do Company ao centro
Brazil
1923 1 conto de réis República dos American Efígie de D.
Estados Bank Note Pedro I ao
Unidos do Company centro
Brazil
1924 50 mil réis República dos American Efígie do então
Estados Bank Note presidente Artur
Unidos do Company Bernardes
Brazil
1927 5 mil réis República dos American Efígie do Barão
Estados Bank Note do Rio Branco à
Unidos do Company esquerda da
Brazil nota
1929 500 mil réis Banco do Café American Duas figuras
Bank Note alegóricas com
Company brasão em
branco ao centro
1931 500 mil réis República dos American Efígie de José
Estados Bank Note Bonifácio de
Unidos do Company Andrade e Silva
Brazil
1942 5 mil cruzeiros República dos American Efígie de
Estados Bank Note Tiradentes ao
Unidos do Company centro da nota
Brazil
1942 10 mil cruzeiros República dos American Efígie de Santos
Estados Bank Note Dumont ao
Company centro da nota

49
Unidos do
Brazil
1943 100 cruzeiros República dos American Efígie de D.
Estados Bank Note Pedro II
Unidos do Company
Brasil
1943 200 cruzeiros República dos American Efígie de D.
Estados Bank Note Pedro I
Unidos do Company
Brasil
1943 Mil cruzeiros República dos American Efígie de Pedro
Estados Bank Note Álvares Cabral
Unidos do Company
Brasil
1967 10 mil cruzeiros Banco Central Thomas de Efígie de Santos
do Brasil La Rue Dumont
Company
1967 10 mil cruzeiros Banco Central American Efígie de Santos
do Brasil Bank Note Dumont
Company
1967 5 mil cruzeiros Banco Central American Efígie de
do Brasil Bank Note Tiradentes
Company
1967 Mil cruzeiros Banco Central American Efígie de Pedro
do Brasil Bank Note Álvarez Cabral
Company
1967 500 cruzeiros Banco Central American Efígie de D.
do Brasil Bank Note João VI
Company
1967 100 cruzeiros Banco Central American Efígie de D.
do Brasil Bank Note Pedro II
Company
1967 50 cruzeiros Banco Central American Efígie da
do Brasil Bank Note Princesa Isabel
Company
1967 10 cruzeiros Banco Central American Efígie de Getúlio
do Brasil Bank Note Vargas
Company

50
1970 100 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Juscelino
Brasil Kubitschek
1970 50 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Oswaldo Cruz
Brasil
1970 10 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de Rui
do Brasil Moeda do Barbosa
Brasil
1970 5 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Castello Branco
Brasil
1970 500 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Deodoro da
Brasil Fonseca
1970 200 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do Princesa Isabel1
Brasil
1970 100 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de Duque
do Brasil Moeda do de Caxias
Brasil
1970 Mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie do Barão
do Brasil Moeda do do Rio Branco
Brasil
1970 500 cruzeiros Banco Central Casa da Evolução étnica
do Brasil Moeda do do Brasil
Brasil
1970 100 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Floriano Peixoto
Brasil
1970 50 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Deodoro da
Brasil Fonseca
1970 10 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de D.
do Brasil Moeda do Pedro II
Brasil
1970 5 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de D.
do Brasil Moeda do Pedro I
Brasil

51
1970 1 cruzeiro Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república
Brasil brasileira
1986 10 mil cruzados Banco Central Casa da Efígie de Carlos
do Brasil Moeda do Chagas
Brasil
1986 5 mil cruzados Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Cândido
Brasil Portinari
1986 Mil cruzados Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Machado de
Brasil Assis
1986 500 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de Villa-
do Brasil Moeda do Lobos
Brasil
1986 100 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Juscelino
Brasil Kubitschek
1986 50 cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Oswaldo Cruz
Brasil
1986 10 cruzados Banco Central Casa da Efígie de Rui
do Brasil Moeda do Barbosa
Brasil
1989 500 cruzados Banco Central Casa da Efígie de
novos do Brasil Moeda do Augusto
Brasil Ruschi1
1989 200 cruzados Banco Central Casa da Efígie da
novos do Brasil Moeda do república
Brasil brasileira
1989 100 cruzados Banco Central Casa da Efígie de Cecília
novos do Brasil Moeda do Meireles
Brasil
1989 50 cruzados novos Banco Central Casa da Efígie de Carlos
do Brasil Moeda do Drummond de
Brasil Andrade
1989 10 cruzados novos Banco Central Casa da Efígie de Carlos
do Brasil Moeda do Chagas
Brasil

52
1989 5 mil cruzados Banco Central Casa da Efígie de
novos do Brasil Moeda do Portinari
Brasil
1989 Mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de
do Brasil Moeda do Machado de
Brasil Assis
1993 50 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de uma
reais do Brasil Moeda do baiana
Brasil
1993 5 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de um
reais do Brasil Moeda do gaúcho
Brasil
1993 Mil cruzeiros reais Banco Central Casa da Efígie de Anísio
do Brasil Moeda do Teixeira
Brasil
1993 500 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de Mario
reais do Brasil Moeda do de Andrade
Brasil
1993 100 mil cruzeiros Banco Central Casa da Meio ambiente e
reais do Brasil Moeda do desenvolviment
Brasil o
1993 50 mil cruzeiros Banco Central Casa da Efígie de Luís da
reais do Brasil Moeda do Câmara
Brasil Cascudo
1994 100 reais Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república
Brasil brasileira
1994 50 reais Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república
Brasil brasileira e a
onça-pintada
1904 20 reais Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república e
Brasil mico-leão-
dourado
1994 10 reais Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república e arara
Brasil

53
1994 5 reais Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república
Brasil brasileira e
garça
1994 2 reais Banco Central Casa da Efígie da
do Brasil Moeda do república
Brasil brasileira e
Tartaruga

* Tabela criada pelo autor com base no catálogo de cédulas Latin American Bank Notes (2005),
organizado por Ricardo Mangan, na lista de temas elaborada por Amaury Fernandes da Silva
Junior em sua tese de doutorado Uma etnografia do dinheiro: os projetos gráficos do papel-
moeda no Brasil após 1960 (2008) e na lista de cédulas da página oficial do Banco Central do
Brasil (https://www.bcb.gov.br/).

54
ANEXO 2 - Demais cédulas do conjunto analisado na pesquisa

• Cédula de 10 mil cruzados (1988) – Carlos Chagas

55
• Cédula de 500 cruzeiros (1990) – Augusto Ruschi

• Cédula de 5 mil cruzeiros (1990) – Carlos Gomes

56
• Cédula de mil cruzeiros (1990) – Marechal Rondon

57
• Cédula de 50 mil cruzeiros reais (1993) - Baiana

58
• Cédula de 5 mil cruzeiros reais (1993) - Gaúcho

59
• Cédula de 500 mil cruzeiros (1993) – Mario de Andrade

60

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